Samba e mercado de música nos anos 1990.

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Em Verdade (Nelson Rufino/ Carlinhos Santana), lançada em 1996 no

CD

Deixa clarear, a

declaração é o mote [CD ANEXO: faixa 18]: Descobri que te amo demais Descobri em você minha paz Descobri sem querer a vida Verdade! Essa letra, que poderia muito bem integrar o repertório do Raça Negra, é uma declaração direta de amor, fundada principalmente na possibilidade concreta de sua realização. Ao declarar a “verdade” desse amor, o autor afirma que não pode “pensar em perder” sua amada e busca a felicidade a partir desse encontro. Mais interessante, contudo, é a adoção, nesta obra, de forma camuflada, do padrão Benjor, executado pela percussão (caixas). Apesar do padrão não estar em evidência, os apoios rítmicos destacam com recorrência os pontos cruciais da levada de Jorge Benjor, utilizada com freqüência pelos grupos de pagode romântico. Trata-se de uma canção dotada de enorme potencialidade comercial que, sendo lançada por um artista com nome consagrado, tinha tudo para se consolidar como um grande sucesso. A animação, o amor verdadeiro e feliz, a levada “da moda”. Por outro lado, há uma parte do repertório de Zeca que retrata o amor de forma bastante conflituosa, como arena de frustrações, desentendimentos e tristeza, análoga à que o repertório do samba havia sedimentado no imaginário do gênero até os anos 1990. Um ótimo exemplo disso é o samba Vai vadiar (Monarco/ Alcino Corrêa), gravado em 1998 com enorme sucesso no CD que leva seu nome na capa. Eu quis te dar um grande amor Mas você não se acostumou à vida de um lar O que você quer é vadiar Vai vadiar, vai vadiar Vai vadiar, vai vadiar Ao mandar a amada “ir vadiar”, os autores tentam se livrar do inconveniente deste amor, mas adotam uma postura incrédula sobre “quem gosta da orgia”, não havendo nenhuma dose de otimismo para um reencontro ou um novo amor. A base rítmica que acompanha essa música, obviamente, está centrada no padrão polirrítmico clássico do samba, baseado no paradigma do Estácio. O mesmo pessimismo com relação ao amor descrito com humor semelhante pode ser encontrado no partido Ninguém merece (Arlindo Cruz/ Jorge David/ Acyr Marques), gravado no mais recente CD de Zeca, À vera (Universal, 2005) [CD ANEXO: faixa 19]:


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