Samba e mercado de música nos anos 1990.

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187 O Raça Negra foi o responsável pela explosão do samba em um outro nível. Eles já começaram com uma equipe, uma estrutura diferente, mais condizente com todo o profissionalismo que estávamos buscando. Depois deles até as gravadoras mesmo, até a EMI já passou a ver o samba com outros olhos e querer lançar sambistas (entrevista ao autor em 31/1/2005).

Na estratégia de aumento de cacife simbólico e prestígio social, os sambistas dos grupos de pagode romântico dedicaram atenção especial ao vestuário. Com isso, um outro foco de disputas se abriu, caracterizando esses sambistas como “mauricinhos” ou, ainda mais pejorativamente, “mauriçolas”. Silvio Essinger, em sua descrição de “pagode” para o site Clique Music é taxativo: Esse pagode suingado, também conhecido como samba mauriçola (por causa da opção dos músicos pelos símbolos de status da classe alta – roupas finas, telefones celulares e namoradas louras) foi um dos grandes sucessos ao longo da década, com músicas de refrões fáceis e romantismo deslavado (não raro encomendadas a hitmakers profissionais), predominância de instrumentos eletrônicos e coreografias de gosto duvidoso. Como se houvesse uma linha de montagem, os grupos se multiplicaram por todo o país.

O jornalista elege os bens de consumo como argumentos para uma desvalorização estética. Note que na preocupação de desqualificar o texto reforça preconceitos e estereótipos associando “namoradas louras” a “telefones celulares”. É como se os símbolos de status da classe alta não pudessem ser utilizados por cantores de samba, caracterizando um rebaixamento estético e social. Ora, os músicos desses grupos, de fato, pertencem à classe alta e a utilização de símbolos de consumo não é nenhuma incongruência e nem pode ser tomada como critério de desvalorização. Por outro lado, é verdade que, ao ascenderem social e comercialmente, os protagonistas dos principais grupos de pagode romântico passaram a cultivar uma grande preocupação com os figurinos e com sua imagem. Porém, como vimos, essa preocupação deriva muito mais de uma opção comercial de inserção no mercado do que em um símbolo de ostentação. Em entrevista ao jornal O Dia, Alexandre Pires conta que a opção de vestuário adotada pelo grupo (terno e gravata) “virou sinônimo de elegância e respeito ao público” (grifo meu). Na mesma reportagem, a jornalista Márcia Disitzer comenta o trabalho de figurinistas que passaram a atuar nesse mercado, identificando detalhes estéticos que norteiam a relação entre roupas, showbizz e pagode romântico. Segundo a reportagem, conter o uso excessivo de roupas coloridas e brilhosas, evitar peças de gosto duvidoso e criar um estilo próprio são algumas tarefas dos figurinistas que cuidam do visual dos pagodeiros. O exemplo mais feliz dessa união é o trabalho feito pela estilista pessoal Fabiana Kherlakian com o grupo Só Pra Contrariar: o


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