Comunicação e música: a (re) invenção da tradição do samba e do choro no circuito cultural da Lapa

Page 27

A descrição que Gonçalves Pinto faz do ambiente por onde circulavam os chorões – as festas oficiais, os encontros regados a “comes e bebes”, como batizados e casamentos – nos leva a acreditar que a origem da formação da música popular urbana no Rio de Janeiro está na troca de experiências que aconteciam nessas reuniões e encontros. Durante 50 anos, os conjuntos de chorões se formaram com elementos que representavam quase que exclusivamente a baixa classe média do Segundo Império e da Primeira República. Eram, em geral, funcionários públicos – militares e civis, empregados de repartições federais e municipais. Depois dos Correios, as instituições de onde mais saíam músicos para os choros cariocas eram as bandas militares. Dentre esses importantes núcleos formadores de músicos, podemos citar as bandas do Corpo de Fuzileiros Navais, do Corpo Policial da Província do Rio de Janeiro, a da Guarda Nacional, a Guarda do Batalhão Municipal, a antiga Guarda da Escola Militar e, principalmente, a Guarda do Corpo de Bombeiros, organizada pelo maestro Anacleto de Medeiros. No Rio de Janeiro do século XIX, por volta de 1870, a palavra choro designava o grupo instrumental formado por flauta, que fazia o solo, violão, que executava a “baixaria”, e cavaquinho, que fazia a harmonia, e cuja principal característica era o improviso. Esses conjuntos animavam festas familiares e acompanhavam o canto das modinhas pelas ruas da cidade. Choro também era o local onde se ouvia as danças vindas da Europa, como a polca, o schottish, além do lundu, do tango brasileiro, do maxixe, da valsa brasileira, da quadrilha e do choro-samba. Antes de se tornar um gênero musical, o choro designava apenas uma forma nova e abrasileirada de executar esses gêneros musicais de origem européia. Esse ambiente de encontro é bem retratado nas palavras de Tinhorão: “chorões do luar, os bailes das casas de família, aquelas festas simples onde imperava a sinceridade, a alegria espontânea, a hospitalidade, a comunhão de idéias e a uniformidade de vida” (TINHORAO, 1997, p. 95). O flautista e compositor Joaquim Callado, reconhecido como o “pai dos chorões”, foi um dos primeiros músicos a constituir um conjunto com tal formação já definida, chamado Choro Carioca. Já na última década do século XIX, o maestro Anacleto de Medeiros fundou a Banda do Corpo de Bombeiros, constituída basicamente por muitos músicos de choro. Este fato revela que, no final do século retrasado, a formação instrumental dos conjuntos de choro já havia incorporado novos instrumentos, como o clarinete, o oficleide, o trompete, o trombone e o bombardino. A maestrina Chiquinha Gonzaga também participou dessa fase de sedimentação do choro como gênero musical. É de sua autoria o tango Gaúcho que ficou famoso como Corta-Jaca. Outro


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.