Comunicação e música: a (re) invenção da tradição do samba e do choro no circuito cultural da Lapa

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Vagalume constrói a memória do samba tomando um caminho crítico e problemático: confronta-o com a indústria cultural emergente. Coloca de um lado os sambistas diretamente ligados à roda do samba, os maestros - suas características de vida familiar, religiosas, enfim, suas condições sócioeconômicas possibilitaram-lhes a vivência festiva e prazerosa produzida nas organizações festivo-religiosas das comunidades (as "tias", o candomblé, os ranchos e escolas de samba etc.). Este é o argumento maior, o selo de validade e autenticidade daquilo que Vagalume entendia como samba. Estar associado à roda era orgânico, indispensável. Do outro lado, os sambistas industriais, que sem necessariamente terem articulado sua visibilidade de produtores pelos juízos das comunidades do samba, ligavam-se diretamente à industria cultural emergente.36

Refletindo sobre esse aspecto no contexto atual do samba-choro, podemos afirmar que o nicho de mercado que se abre agora para o choro já nasce dentro dos princípios da tradição; no caso do samba, o gênero se reformula tentando buscar, através da articulação com o choro, o seu espaço como “tradicional”, e não apenas comercial, como foi vendido na década de 80. Segundo Pereira (1995, p. 202), “tradição” está diretamente ligada à idéia de repetição e de continuidade com um passado determinado. O autor afirma: esses discursos que se articulam às tradições (novas, inventadas ou reinventadas) se revestem necessariamente de um caráter de antiguidade, de continuidade na medida que partem de um passado, de uma ordenação simbólica preexistente e já essencialmente significativa para o grupo. É como se fundasse um novo enredo com o passado. (PEREIRA, 1995, p. 203)

Mas o autor evidencia que esse processo de reconstrução da tradição não acontece aleatoriamente. Existem pontos fundamentais a serem observados nesse processo, como, por exemplo, a questão da modernização, que envolve:

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BRAGA, 2000. Música urbana no Rio de Janeiro entre 1930 e o final do Estado Novo: a construção de uma memória. Disponível em: http://brazilianmusic.com/articles/braga.html. Acesso em: 20 ago. 2006


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