O samba em pessoa: narrativas das Velhas Guardas da Portela e do Império Serrano

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considerado um dos “grandes” da MPB, não se restringindo ao samba. Havia ainda a sua produção como compositor, cujo samba talvez mais conhecido e regravado tenha sido O samba é meu dom, em parceria com Paulo César Pinheiro26. A edição de janeiro/fevereiro de 2010 da revista Continuum, do Itaú Cultural, trazia a entrevista intitulada “De pajé para curumim”, em que Wilson era entrevistado pelo também baterista Curumin. O parágrafo inicial o apresentava assim: Nascido na Glória, no Rio de Janeiro, bisneto de escravos e com 55 anos de trabalho como baterista, Wilson das Neves tem na carreira gravações com mais de 600 músicos do Brasil e do exterior. Prestes a lançar o terceiro trabalho solo, Para a Gente Fazer Mais um Samba, é definido pelo amigo Chico Buarque, com quem toca há 26 anos, como “o pulso da banda, termômetro, técnico do time, rei da anedota e pajé”, conforme escreveu o poeta no texto da contracapa do CD. Colecionador de plantas, pai de quatro filhos, marido de Silvia, avô de quatro netos e bisavô de João, Wilson é também inspiração para bateristas e cantores da nova geração (...). (p. 16).

O primeiro contato com ele aconteceu no dia 11 de outubro de 2009, a mesma data da entrevista. Eli me acompanhou até a residência de Wilson, no Jardim Guanabara. Conversamos rapidamente, expliquei do que se tratava o projeto e iniciamos a gravação. Suas respostas eram sempre diretas e simples, mas capazes de transmitir uma compreensão profunda sobre o que observa na escola. O principal argumento expresso na entrevista foi o de que a escola de samba não é mais escola, porque não forma mais ninguém. Fica muito marcada a oposição entre passado e presente, amor e dinheiro, permanecendo o amor pela escola apenas na velha guarda, na bateria e alguns compositores. Não se diz contrário à idéia de modernização, mas sim à deturpação dela decorrente. A transcriação, produzida no início de 2010, foi também enviada por correio para aprovação. Num primeiro momento, Wilson não sentiu necessidade de ler, dizendo que se eu tinha escrito o que tinha sido dito durante a entrevista não haveria maiores complicações. Insisti um pouco e, após a leitura, ele acabou fazendo correções pontuais que de fato tornaram algumas informações mais precisas.

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Essa canção aproxima-se do processo de colaboração na história oral: Pinheiro escreve “em nome de” das Neves, sendo que este último canta a música, em primeira pessoa. Está presente na letra o tributo a grandes nomes, os que fizeram “samba bom”, que como que avalizam a importância do compositor para o mundo do samba. Além de associá-lo à bateria, seu instrumento, e ao Império Serrano, sua escola, também é reforçada a sua importância como sambista, no verso final: “Pois quem é do samba meu nome não esquece mais não”. Paulo César Pinheiro (2010, p. 174) comenta: “E digo nela o que ele diria se escrevesse versos. É um autobiográfico, em mim incorporado, como se eu fosse seu cavalo, seu veículo”.


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