Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 40, fev. 2010
CENTRALIDADES DO CARNAVAL PAULISTANO: Formação, explosão e negação Rodrigo Linhares1 Resumo: Este artigo apresenta a festa carnavalesca paulistana em três momentos: há a festa como centralidade ausente – o entrudo; a seguir, implementada como centralidade complexa e eventualmente descontrolada, a festa carnavalesca do século XIX. Neste passo, o projeto da burguesia cafeeira paulista era o de varrer fora o entrudo; fracassado e revisto, porém, o projeto retorna como incentivo às novas manifestações festivas surgidas do atrito entre Sociedades e Entrudo, mas desde que disciplinadas. Por fim, no movimento de metropolização e desgaste da vida de bairro, o carnaval reconstitui-se como falsa centralidade, como espetáculo carnavalesco no “sambódromo”. Palavras-chave: Carnaval. Cidade. Escola de Samba.
1. O Carnaval Espetáculo: a centralidade negada
Pode-se dizer que a festa que hoje conhecemos teve como centralidade inicial, no final da década de 1960, a Avenida São João. Lá foram erguidas as arquibancadas e os palanques da primeira competição unificada de agremiações carnavalescas. Anos depois, em 1977, o desfile foi transferido para a Avenida Tiradentes. As interferências no trânsito desta via, porém – impostas pela realização das festividades –, logo tornaram precário este novo endereço. Em 1991, a centralidade dos desfiles carnavalescos transfere-se para o “sambódromo”, no Parque Anhembi, onde permanece até hoje. Este equipamento urbano peculiar, o sambódromo, foi concebido segundo uma oposição fundamental entre, de um lado, os desfilantes – que percorrem a avenida – e, de outro, a plateia – que ocupa as arquibancadas que a ladeiam. Nas extremidades deste conjunto linear existem dois largos pátios: mais a leste, a concentração – onde permanecem organizadamente os carros alegóricos até que a escola de samba, então em desfile, venha retirá-los –; mais a oeste, a dispersão – ocupada pela escola que, terminando sua apresentação, precisa agora “desarmar-se”. Mas a separação não é apenas entre avenida e plateia, partida e chegada – ela se propaga em vários níveis. Na avenida, exemplarmente, sob a aparência de uma unidade linear movente encontramos algumas divisões: os que desfilam no chão, os que desfilam em cima dos carros e os que desfilam em lugares privilegiados na organização dos elementos cênicos do carro. Há uma espécie de hierarquia 1
Bacharel e licenciado em Ciências Sociais pela FFLCH-USP. Mestre em Geografia Urbana pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana do Departamento de Geografia da FFLCH-USP com a dissertação: “Da Festa da Representação à Representação: apontamentos sobre a transformação do tempo-espaço carnavalesco”. O artigo aqui apresentado inspira-se nesta dissertação.
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