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OS MUSEUS COMO AGENTES DE INCLUSÃO SOCIAL Cristina Da Milano Eccom – Centro Europeu para a Organização e Gestão Cultural INCLUSÃO SOCIAL E CULTURAL: MECANISMO E ACÇÕES Não obstante as diferenças conceptuais que sustentam a nossa compreensão sobre exclusão social, alguns elementos que integram este conceito são comuns a todas as suas definições e percepções. Em primeiro lugar, exclusão social “representa o oposto de integração social. Em segundo, refere­se tanto a um estado como a um processo e, em terceiro lugar, o conceito é multidimensional, estendendo­se para lá das definições tradicionais de pobreza e privação.” (Sandell, 1998). A exclusão social pode ser considerada um estado e/ou um processo dinâmico que impede um indivíduo de participar nos sistemas do seu país. Aos que são excluídos não é permitida a participação na vida social, política e económica de uma nação; obviamente, estas três dimensões podem facilmente sobrepor­se dada a sua natureza inter relacionada e a exclusão ocorre quando um indivíduo é parcial ou totalmente posto fora de um ou mais destes sistemas. Muito recentemente, foi identificado um quarto sistema, dentro do qual a exclusão pode ocorrer e, consequentemente, ser combatida: a cultural (Sandell, 1998). A integração da esfera cultural no debate sociológico sobre a exclusão social tem constituído o ponto de partida para a análise do papel que o património pode desempenhar no combate e minimização deste fenómeno. O sector cultural e os museus em particular têm sido considerados, tradicionalmente, como um ambiente exclusive: são “produtos do sistema e autenticam os valores e a imagem oficiais ou estabelecidos de uma sociedade de diversos modos: directamente, através da promoção e afirmação de valores dominantes; indirectamente, pela subordinação ou rejeição de valores alternados” (Sandell, 1998). Existem três aspectos fundamentais que representam o modo como o património (e particularmente os museus) actuam na qualidade de agente de exclusão social: acesso, representação e participação. O problema do acesso é crucial, visto não dizer apenas respeito ao acesso físico mas, provavelmente de um modo menos visível, também ao acesso cultural. As instituições culturais eram normalmente concebidas como produto de uma elite instruída nunca tendo, nessa condição e até há muito pouco tempo, de lidar com a questão da democratização da cultura. A questão da representação está, de novo, estritamente relacionada com a sua história: são o produto de uma concepção “eurocêntrica” do Mundo e reporesentam os valores dominantes da sociedade europeia instruída dos sécs. XVIII e XIX. Quite Muito claramente, na maioria dos casos, não reflectem os valores actuais do nosso mundo multicultural e muitas pessoas vêem­nos como instituições exclusivas. A participação no processo de criação da produção cultural é o terceiro elemento capaz de gerar exclusão no sistema cultural de uma sociedade, sendo, ainda, em vários aspectos, o que mais mudou nos últimos anos. A produção de arte contemporânea é, nos dias de hoje, bastante aberta a pessoas de diferentes contextos sociais, mesmo que esta abertura se depare por vezes com a dificuldade de ter o produto (uma peça, uma escultura ou um quadro) representado e acessível ao público. As barreiras implicadas nestes três aspectos relativos ao uso de serviços culturais pelo público podem ser geradas por factores institucionais (horários de abertura restritivos, atitude inapropriada do pessoal, políticas de cobrança, ausência de sinalética dentro e


fora do edifício, etc.), por factores individuais e sociais (falta de competências básicas de leitura, pobreza), por barreiras relacionadas com a percepção e cognição (como por exemplo, pessoas educacionalmente desfavorecidas olham os museus como algo que lhes é estranho) e por factores ambientais, como sejam dificuldades de acessibilidade, isolamento ou a fraca ligação a transportes (DCMS, 2000). Para suster a exclusão social é necessária uma abordagem holística: todas as instituições envolvidas a vários níveis devem trabalhar em conjunto de uma forma cooperativa e transversal. Deverão perseguir o seu objectivo comum – a luta contra a exclusão social – cada um sob o seu prisma específico e com as suas ferramentas próprias enquadradas numa acção comum. Deve ser referida numa política nacional clara, declarando o seu fim, objectivos e estratégias. Uma definição clara sobre quem são os grupos socialmente excluídos e de onde e quando a exclusão pode ser gerada deverá constituir a base de tal política, de forma a evitar a confusão e a incerteza. Dentro desta política nacional, as instituições culturais (tal como as sociais) devem desenvolver as suas linhas de orientação específicas, indicando como encarar as questões de representação, acesso e comunicação dos museus e património cultural em geral e disponibilizando instrumentos de resolução eficaz destes problemas. Estas orientações devem também ter em conta a necessidade de cooperação com outras instituições e fornecer padrões de práticas de documentação e classificação que visem a avaliação de resultados obtidos, com vista à reprodução ou melhoramento das actividades praticadas. Por último, mas não menos importante, as instituições devem divulgar as suas iniciativas e resultados ao público. MUSEUS E INCLUSÃO SOCIAL Apesar de ser a cultura material aquilo que, certamente, fornece um ponto de partida para o processo de aprendizagem nos museus, é a criação de relações sociais e significados partilhados que o define. É, por isso, vital que as equipas dos museus saiam para lá das quatro paredes do edifício e experimentem a sociedade como tal. O hiato entre os museus e o seu público era, provavelmente, menor no séc. XIX. Nesse tempo, os museus desempenhavam um papel específico na sociedade (execução do poder, identidade nacional, educação das massas). Hoje, o papel dos museus é contestado. Por outro lado, é­lhes requerido que sejam agentes de transformação social, com responsabilidades quer ao nível comunitário, quer no desenvolvimento científico e contribuindo para a agenda de formação contínua ao longo da vida. (ICOM, 2002); no conjunto, há uma crescente noção do papel educativo que os museus podem desempenhar na memória cultural de uma sociedade, baseado no grande poder visual dos objectos e do património no seu amplo sentido. Porém, muitos são os que não visitam museus e os que o fazem não apreendem necessariamente o que o pessoal dos museus lhes transmite: isto sucede pelo gfacto de os museus constituírem centros de aprendizagem pessoal, não obrigatória, e informal. Para além disso, em muitos países o papel educativo dos museus é ainda entendido como algo estritamente relacionado com a educação escolar. O seu papel como importantes agentes de formação contínua, bem como favorecedores de diálogo intercultural e integração cultural não está claramente definido em todo o lado. A aprendizagem nos museus é diferente da aprendizagem em estabelecimentos de ensino formal, sendo os utentes dos museus, na sua maioria, informais. Estes podem ser indivíduos, grupos familiares ou grupos de amigos. Entre os museum learners existe uma diversidade de learning agendas e estilos: as pessoas gostam de aprender de diferentes modos (através da leitura, da interacção com outros, do


manuseamento ou do fazer/experimentar). De modo geral, o desenvolvimento de actividades de aprendizagem nos museus e galerias é apreciado porque: Cristina Da Milano 3

- Se considera que o contexto estimula e inspira a aprendizagem. ­ a exposição de peças e quadros êm relevância directa para a natureza das actividades. No seu conjunto, os museus desconhecem os objectivos de aprendizagem dos seus visitantes: podem visitar por lazer ou por prazer. Muitos visitantes podem nem ver a sua visita como uma experiência de aprendizagem, ainda que aprendam e facto enquanto gozam a experiência. Os participantes nestas actividades são atraídos pelo facto de elas não serem de duração prolongada nem exigirem grande compromisso. O interesse pelo objecto e a possibilidade de interacção social são outras das motivações possíveis, bem como o desenvolvimento profissional, o carácter recreativo ou o valor terapêutico das actividades. Os resultados destas experiências de aprendizagem são, igualmente, variados. Podem incluir o aumento de conhecimento, o desenvolvimento de aptidões e competências ou a inspiração para aprender mais. Invariavelmente, os utentes usam os museus para reforçar os conhecimentos que já possuem. Aprender nos museus é, por tudo isto, uma questão complicada. Não nos surpreende que a dificuldade de medir/quantificar a aprendizagem em contextos informais seja continuamente debatida. Acresce que muitos dos resultados da aprendizagem proveniente desses contextos são os chamados resultados “subjectivos” (atitudes, valores, emoções e crenças), os quais muitas vezes não são sequer considerados como prova de aprendizagem, visto que a ênfase é dada a factos “concretos” e a competências demonstráveis (RESOURCE, 2003). Além do mais, seria inapropriado os museus definirem para os seus visitantes expectativas de resultados de aprendizagem específicos, visto ignorarem o conhecimento à priori de cada visitante. Ao contrário da educação formal, os museus não serão capazes de avaliar nem a aprendizagem dos seus utentes nem os seus progressos. Contudo, os próprios utentes serão capazes de ajuizar sobre a sua aprendizagem. Capazes de exprimir o que descobriram e se isso corresponde ao que procuravam. Capazes de dizer se se sentiram inspirados ou se passaram um tempo aprazível. Reunir provas de resultados de aprendizagem nos museus implica, pois, auscultar os utentes sobre o que sentem relativamente ao seu próprio processo de aprendizagem. Aqui estão alguns indicadores que podem ser utilizados para medir o impacto da aprendizagem em museus:

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Aumento de conhecimento e compreensão. Aumento de competências Mudança de atitudes ou valores Demonstração de prazer, inspiração e criatividade Demonstração ao nível da actividade, comportamento e progressão Interacção social e coesão


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Auto­confiança Compreensão reforçada dos temas Competências técnicas Desenvolvimento pessoal

Empowerment comunitário Identidade e imagem locais Saúde e bem­estar Os princípios básicos da educação museológica, foram definidos por códigos internacionais para serem aplicados e reconhecidos em todo o mundo. “Os museus prestam serviço à sociedade ao oferecer uma compreensão e uma apreciação do bem cultural e natural comuns através de exposições, da investigação, de bolsas, publicações e actividades educativas. Estes programas executam a missão do museu, dando resposta às preocupações, interesses e necessidades da sociedade.” (AAM, 2000); “O museu deve aproveitar todas as oportunidades para desenvolver o seu papel de recurso educativo usufruido por todos os tipos de população ou grupo especializado ao qual o museu se destine. Em conformidade com o programa e compto do museu, o pessoal especializado com competências e habilitação específica em serviço educativo é o indicado para este fim. O museu tem o importante dever de atraír novos e diversificados públicos de entre todos os sectores da comunidade ou grupo que procure servir... (ICOM, 2002). A bem da sua eficácia, estes princípios devem ser apoiados por outras linhas orientadoras e padrões tendo em conta a situação específica de cada país. As linhas orientadoras do serviço educativo podem ser agrupadas sob dois aspectos: a) Política Geral Optimização da relação museu­comunidade, assente nos princípios de desenvolvimento sustentável, equidade, participação e respeito mútuo; Inclusão nos museus (sobretudo históricos, antropológicos, cívicos ou regionais) de objectos representativos de todos os actores sociais; Estudo das necessidades da população; Formação de pessoal; Desenvolvimento de programas que apoiem a missão do museu; Utilização de estudos de público para definir as formas de disponibilização da informação e serviço educativo ao visitante; Consideração das diferenças físicas entre visitantes (altura, prisma focal, etc); Consideração das diferenças intelectuais entre visitantes. b) Política Educativa Coordenação e coerência com a política cultural; Coordenação com outros services educativos; Adopção de um modelo educacional construtivista; Inclusão de actividades em que a aprendizagem ocorre por via lúdica; Consideração de requisitos linguísticos; Aprovisionamento de espaços e actividades adequados;


Oferta de serviços não só a escolas e outras instituições educativas, mas também a adultos, famílias, organizações culturais e a diferentes tipos de grupo ou indivíduos; Acessibilidade e integridade intellectual dos programas. Com o objectivo de identificar o que pode ser considerado como boa prática no serviço educativo, foram desenvolvidos uma série de parâmetros e princípios, sobretudo no Reino Unido e nos Estados Unidos. Estes podem ser organizados em três areas: Acessibilidade, accountability and advocacy (table 1)1. 1 Nesta tabela estão listados parâmetros especificamente dedicados a programas de aprendizagem de adultos e

parâmetros para actividades educativas em geral. Table 1. Standards in museum education Accessibility Engage a comunidade e prestar serviço ao público dos museus Criação de uma atmosfera acolhedora e relaxante informal /ambiente educativo informal que proporcione uma experiência interactiva de aprendizagem com oportunidades de envolvimento prático.

Accountability Garantia de recursos (humanos e financeiros) Revelação da excelência no conhecimento dos conteúdos.

Advocacy Promoção da educação como central na missão do museu Localização de parcerias fortes e significativas

Manifestação de interesse pelas pessoas e respeito pela comunidade.

Procura do compromisso a longo prazo.

Comunicação interna e externa da/à instituição

Garantia de acesso a exposições e mostras que apoiem o processo de aprendizagem. Demonstração de entusiasmo e empenho.

Adopção duma monitorização e avaliação exaustivas.

Envolvimento na auscultação da comunidade

Emprego de uma equipa executiva e de coordenação de grande qualidade e nível de especialização.

Definição de metas e objectivos mensuráveis e adopção de estratégias a atingir, devidamente documentados.

Emprego e Address de perspectivas diversas.

Reflecção sobre a posição do museu na sociedade.

Promoção de desenvolvimento professional entre a comunidade do museu

Desenvolvimento de actividades Incorporação da investigação educacional Promoção de um espírito de auscultação e relacionadas com a vida dos visitantes e e da aprendizagem na prática. abertura a novas ideias e abordagens. com a história e cultura da sua comunidade. Emprego de diversas ferramentas educativas Influência sobre políticas públicas de apoio à aprendizagem nos adequadas à promoção da aprendizagem. museus.


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