Ministério da Cidadania apresenta e Santander apresenta e patrocina
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD
F237r
Farol Santander
Roda Gigante / apresentado e patrocinado por Farol Santander; criado por Carmela Gross; curador convidado Paulo Miyada. — Porto Alegre: Farol Santander, 2019. 159 p., il.: color.
ISBN: 978-85-63916-02-0
1. Arte contemporânea. 2. Artes visuais. 3. Cinema. 4. Arquitetura. 5. Exposições. I. Gross, Carmela. II. Miyada, Paulo. III. Título.
CDU 069.9:72/73(083.824)
Elaborado por Charlene Cardoso Cruz — 1/2909
Patrocínio Realização Produção
CARMELA GROSS
RODA GIGANTE
Organização André Severo e Paulo Miyada Edição 4 Art Produções Culturais 2019
Com um trabalho de caráter multimidiático, que lida diretamente com a tensão entre a expressão popular e o rigor erudito, Carmela Gross é certamente uma das artistas mais inquietas e inspiradoras do país. Demonstrando capacidade peculiar de captar impressões e códigos das situações mais distintas, sua produção se desvela por meio de diferentes esferas – em uma gama de atuação que abarca desde exibições em espaços institucionais até intervenções urbanas de cunho temporário ou permanente.
Para esta exposição inaugural, Carmela Gross preparou uma obra inédita. Intitulada RODA GIGANTE, ela é uma instalação de dimensões monumentais que lida com a ideia de peso, contrapeso e ancoragem para propor uma reflexão sobre a precariedade da vida nas grandes cidades. Tendo como interlocutor convidado o curador Paulo Miyada, a exposição apresenta, ainda, um panorama com obras dos últimos anos de produção da artista.
É com uma mostra desta envergadura que o Farol Santander abre suas portas para a cidade de Porto Alegre, oferecendo um espaço capaz de fomentar novas e criativas conexões e promover oportunidades inéditas de cultura, empreendedorismo e lazer.
Patrícia Audi
Vice-presidente executiva de Comunicação, Marketing, Relações Institucionais e Sustentabilidade
5
GIRAR PELOS ARES; NÃO SAIR DO LUGAR
1. RODA GIGANTE
O subtítulo desta exposição foi emprestado da nova instalação concebida por Carmela Gross para o vão central do edifício que abriga o Farol Santander de Porto Alegre. Originalmente construído para sediar uma suntuosa agência bancária, o prédio tem como trunfo o ambiente de dimensões agigantadas, coroa do por vitrais zenitais em que se leem palavras como Troca, Progresso, Trabalho e Fortuna. Sob essas divi sas que um dia funcionaram como simultâneas meta e promessa, Carmela trama agora um ambiente que, como as mesmerizantes rodas gigantes, sugere mo vimento, tensão e suspensão: centenas de cordas amarram-se nas balaustradas e colunas do andar su perior do edifício e atravessam o grande vão em um emaranhado de diagonais; cada uma dessas cordas amarra-se a um objeto prosaico, que por um motivo ou outro costuma passar despercebido em nosso co tidiano, ocupando apenas a periferia dos olhares que raramente se dão conta de pneus, pilhas de livros, baldes, vigas e outros tantos elementos que integram a infrapaisagem urbana. Agora, tensionados pelas cordas presas à arquitetura, esses objetos ganham a cena, fazendo as vezes de lastro do desenho que atravessa o espaço.
Cordas e objetos balizam o deslocamento do público que adentra a exposição e percorre o saguão. A per cepção espacial é alterada ainda pela iluminação âm bar que a artista soma à luz que atravessa os vitrais. O ambiente é familiar, mas parece deslocado do espaço -tempo usual.
Trata-se, então, de um espaço virtual, imaginário? Uma roda gigante que entretém com sua ilusão de mobilidade, girando e girando sem sair do lugar? Alguém poderia argumentar que o edifício intei ro já havia sido construído para dar corpo a noções abstratas: o dinheiro e seus rendimentos e juros, ou
o Crédito, a Economia e a Justiça (outras dentre as palavras gravadas nos seus vitrais). É possível ir mais longe e lembrar o quanto nossas cidades inteiras se converteram em uma parafernália histriônica que dis puta nossa atenção, enquanto os substratos que de fato a movimentam permanecem ocultos de nossa linha de visão. Ou mesmo dizer que a totalidade da sociedade global contemporânea opera como um espetáculo de imagens e especulações em que os valores há muito perderam tangibilidade. Mas tudo isso pode ser divagação, pois, na realidade objetiva, a obra não é mais que coisas e cordas, amarras e pe sos em equilíbrio – nada se move senão a errância do pensamento que se faz enquanto o corpo deambula entre as linhas oblíquas.
2. Desmaterialização
As anotações sobre a arte conceitual feitas entre 1966 e 1972 pela crítica e escritora norte-americana Lucy Lippard1 sintetizam o tom de um amplo debate acer ca da “desmaterialização da obra de arte” no âmbito da arte conceitual. Sem propor uma definição muito restrita do termo, Lippard registrou os pontos comuns que empregou para montagem de seu panorama da arte conceitual:
“Arte Conceitual, para mim, significa o trabalho no qual a Ideia é soberana e a forma material, se cundária, leve, efêmera, barata, despretensiosa e/
33
| PAULO MIYADA
1. LIPPARD, Lucy. Six Years: The dematerialization of the art object from 1966 to 1972. Los Angeles: California Press, 1997 (ed. or. 1973).
ou ‘desmaterializada’ (...) por falta de termo me lhor eu continuei a me referir a um processo de desmaterialização, ou um rebaixamento de seus aspectos materiais (originalidade, permanência, atratividade decorativa)”.2
De fato, as décadas de 1960 e 1970 – durante as quais Carmela Gross viveu seus estudos e primeiros anos de atuação como professora e artista – foram perme adas por iniciativas que visavam desatrelar o valor artístico de parâmetros plásticos enraizados no sa ber-fazer das linguagens tradicionais da pintura, da gravura e da escultura, o que passava por conceber obras que existiam e circulavam como ideia, infor mação, comunicação e conceito, muitas vezes com caráter precário ou efêmero.
Pensar nessa arte como uma expressão desmateriali zada, porém, nos leva a um panorama repleto de pa radoxos e miragens. Um dos problemas é que, mesmo quando não resulta em objetos materiais duráveis, armazenáveis e transportáveis, a arte não deixa de se comportar como se fosse material – os conceitos, mesmo quando não estão ancorados em um corpo objetual, são moldados, esculpidos, trocados, guarda dos; eles existem.
Outro porém reside no paralelismo do debate sobre a desmaterialização da arte com o fenômeno da des materialização do capital financeiro, que atravessou o século XX e culminou no começo da década de 1970, quando os Estados Unidos romperam unilate ralmente o acordo de Bretton Woods de gerencia mento econômico internacional, acabando com a convertibilidade de dólar em ouro e, assim, livrando as moedas de seu último lastro concreto rumo ao frenético território da especulação financeira. Diante dos impactos incomensuráveis da desmaterialização da economia, a desmaterialização da arte pode pa
recer um detalhe de menor importância ou até um efeito colateral involuntário.
Não obstante, os efeitos da financeirização da eco nomia, centenas ou milhares de vezes nos últimos 50 anos, têm nos ensinado que por trás da aparente desmaterialidade existe uma espécie de superma terialidade. Explico: à medida que os valores se li beram de lastros físicos concretos, nada mais pode pertencer exclusivamente ao campo das ideias, das abstrações ou da informação: tudo passa a ser tão comprável, trocável, acumulável e especulável quan to uma barra de ouro ou uma fazenda, incluindo os títulos de “barris de petróleo futuros”, o potencial de renovação da camada de ozônio e toda a sorte de informações privilegiadas. A considerável vertigem diante das convulsivas movimentações de uma bolsa de valores – antes ilustrada pelo olhar entre angus tiado e robótico dos operadores empilhados em Wall Street e hoje abstraída pelos impulsos eletrônicos de bilhões de trocas digitais – é a metáfora perfei ta para uma época menos “desmaterializada” e mais “supermaterial”. Ou seja, o que pareceria, de longe, uma transcendência da esfera dos objetos e das ma térias-primas concretas revela-se, de perto, como um aterramento que traz ao chão comum dos materiais (e das mercadorias) aquilo que se supunha aéreo, conceitual ou abstrato.3
3. Lastro
“Arte é isso aí: pensar em construir criticamen te dentro da linguagem (...) sempre produzir um avesso”.4
Carmela Gross não projetou a instalação RODA GI GANTE por causa das considerações que apresen to. Seu processo criativo, por sinal, raramente nasce de um discurso teórico prefixado. No princípio, está
2.
3.
34
Op. cit, página vii e página 5. Tradução livre pelo autor.
Esta passagem desdobra algumas ideias que formulei anteriormente no ensaio “Yoko Ono: A arte das instruções na era dos algoritmos”, In: Yoko Ono: o céu ainda é azul, você sabe.../Yoko Ono: the sky is still blue, you know... Curador: Gunnar B. Kavan (tradução inglês: Julia Lima). São Paulo: Instituto Tomie Ohtake, 2017.
4. Carmela Gross na Aula Magna da Escola Entrópica, 21 de fevereiro de 2019, no Instituto Tomie Ohtake.
o traço, o desenho que apreende o espaço e o arre messa em uma nova configuração. Antes, ainda, está uma espécie de desenho de observação da cidade e da sociedade circundante, que a artista alimenta em sua constante observação das dinâmicas contempo râneas de troca, opressão, circulação e conflito.
Qual “desenho de observação” é esse? De que forma atua na concepção de RODA GIGANTE? E, então, em que medida isso conduz à reflexão sobre a materiali dade, a desmaterialidade e a supermaterialidade da sociedade contemporânea?
Bem, será preciso avançar por etapas.
Um exemplo. Em 1968, Carmela Gross e alguns dos amigos que se conheceram no curso de graduação em Artes5 cumpriam a sugestão do professor Flávio Motta e percorriam o que era então a periferia de São Paulo, estudando as pinturas e sinalizações manuais feitas pelos artesãos que criavam espontaneamente uma linguagem pictórica vernácula local. Em dado momento, a artista resolveu intervir em um barranco criado pela urbanização gradual e pouco planejada do eixo sudeste de crescimento da cidade. Com um spray de tinta preta, traçou rapidamente o desenho de uma escada, uma redundância gráfica que se fazia enquanto o corpo subia os degraus da topografia es calonada do terreno.
Essa linha rabiscada com o corpo inteiro é um dese nho de observação da cidade, que apreende o con torno de uma de suas particularidades e o explicita como um projeto aplicado ao próprio espaço urbano. Há muitas outras obras, feitas nas últimas cinco déca das, em que Carmela Gross exercita operações de ob servação/projeção. Em algumas delas, como em ES CADA (1968) ou em EU SOU DOLORES (2002/2016), isso se dá como uma dobra que retorna à paisagem
5.
6. Todos incluídos nesta exposição; discutidos em mais detalhes adiante.
da cidade. Em outras, como em A CARGA (1968), MONUMENTOS (2001), 13 PASSANTES (2016) e FI GURANTES (2016)6, o ciclo se completa no espaço expositivo, que atua como um duplo da cidade elabo rado no campo da linguagem.
É nesse último grupo de obras que se pode analisar a instalação RODA GIGANTE. A seleção das cente nas de objetos que ocupam o vão central do edifí cio pressupõe a atenção constante para a cidade e, especificamente, para os elementos mais ou menos funcionais que a integram, sem chamar atenção para si: não os monumentos e as propagandas, mas as mi croinfraestruturas do cotidiano. Juntos, eles formam uma lista absurda, que abrange de malas de viagem a pedaços de concreto improvisados para impedir
35
Esse curso de graduação antecede o modelo que foi posteriormente implantado e segue vigente (com muitas adaptações) até hoje. Na época, ele seguia a proposta pedagógica desen volvida pelo professor Flávio Motta, em 1956, como adaptação do Curso de Formação de Professores de Desenho implantado no Museu de Arte de São Paulo (MASP), em 1953.
a entrada de automóveis. Juntos, eles formam uma multidão. E essa multidão avança pelo espaço, an corando a massiva arquitetura simbólica de poder e estabilidade. Não são os balaústres e as colunas que sustentam os objetos (já firmemente apoiados sobre o piso), mas sim os objetos que lastreiam a tensão das cordas que se multiplicam pelos ares. Aí, também atua a observação da artista, que percebe que todo o aparato simbólico contemporâneo se apresenta como se fosse ele que sustentasse a vida, enquanto é a vida (dos objetos e das pessoas) que, na verdade, alimenta o poder e seus simbolismos.
É até aí que a artista avança: ela percebe um aspecto estruturante da realidade enquanto exercita um de senho projetivo que terminará por absorver o espec tador, seu corpo, sua atenção e sua fantasia. A partir daí, somos nós, os públicos7, que podemos nos lançar no corpo a corpo com a obra e aproveitar sua forma única de encadeamento de ideias e materiais para re fletirmos sobre o que nos impedia de perceber aquilo que Carmela Gross percebia e o que isso diz sobre nós, sobre a linguagem e sobre o mundo. No meu caso, a proliferação de linhas de força que ligam a antiga sede bancária aos objetos banais, sob palavras de ordem de progresso e em meio a uma inusual luminosidade, faz pensar nas transformações da materialidade na era da desmaterialização da arte e da economia.
4. Como projetar um vulto
Em dado momento, após atravessar os espaços não saturados por cordas e objetos dispostos pelo saguão central do edifício, o visitante escoa da instalação para a franja lateral do espaço, onde o pé-direito é mais bai xo e a luz âmbar chega mais tênue. Ali, estão reunidas obras produzidas entre 1968 e 2019. Procurou-se criar
um tabuleiro de peças que vão e vêm entre os proce dimentos de desenho, projeto e síntese recorrentes na trajetória de Carmela Gross. Há especial atenção para os modos como se podem construir opacidades visu ais, produzindo buracos, vultos e volumes de conte údo incerto, que aludem mais ou menos diretamente aos aspectos da vida e da cidade de praxe obscureci dos, compreendidos como entulho cognitivo.
Em ambas as esferas, da vida e da cidade, tudo o que não conseguimos ou não queremos enxergar pode, a algum momento, emergir como estorvo, enigma ou ameaça.
As duas obras que coordenam esse tabuleiro (não por acaso, aquelas que foram, desde o princípio, elencadas para integrar essa seleção) são A CARGA e A NEGRA (1997). Na primeira, uma grande lona cinza-esverdea da recobre uma estrutura metálica avultada. Na língua inglesa, alguém poderia dizer que se trata de um ob jeto “bulky” – em português, é preciso somar algumas palavras: algo avolumado, espaçoso, que parece estar sempre no meio do caminho. Com 2,5 metros de al tura e 3 metros por 5 metros de extensão, ele é maior do que nós, mas um pouco baixo e pequeno para ser uma casa.8 É como um quarto que só pode ser visto de fora, ou como uma caçamba deixada para trás. Por outra metáfora: é o bode (o elefante) no centro da sala, que impõe sua premeditada presença desconfortável enquanto seu conteúdo permanece uma incógnita, um tesouro ou uma ameaça indeterminável.9 Já em A NE GRA, inicialmente concebida como escultura urbana móvel apta a circular pelo canteiro central da Aveni da Paulista, a artista recobre uma estrutura metálica de 3,3 metros de altura com um abundante tule negro que, em seu excesso, configura uma silhueta indistinta e irredutível. Pensada para circular entre arranha-céus,
7. Isso é assunto para outra ocasião, mas gostaria de salientar a importância de entender críticos e curadores como parte dos públicos, ainda que em uma posição muito dedicada e especia lizada. Acredito que o crítico é uma variação do espectador, mais do que uma paráfrase do artista.
8. Com exceção dos barracos feitos diretamente sobre a calçada, o que é significativo.
9. Do ponto de vista histórico, convém sublinhar que se trata de uma obra realizada em 1968, na iminência do Ato Institucional Número 5, que agravou a política repressiva da ditadura militar brasileira vigente desde 1964. Naquele contexto, todo desconhecido era socialmente percebido como uma ameaça ao regime, uma possibilidade subversiva e, simultaneamente, como um risco de violência de Estado.
36
automóveis, pedestres, sinalizações e propagandas da avenida mais célebre da maior metrópole do país, A NEGRA não almeja ser mais um signo comunicante desejoso de atenção. Ela é um vazio, um ponto cego móvel na paisagem. É uma alegoria da parcela da cida de que não se deixa apreender pelas estatísticas, pelos dispositivos de vigilância, pelas pesquisas de opinião, pelos perfis demográficos. Uma caverna onde cabe aquilo que os aparatos do poder não fazem questão de ver, mas que pode abruptamente surpreendê-los.10
Como pensamento constitutivo, A CARGA rebate -se na criação dos MONUMENTOS de Carmela Gross, também incluídos na exposição. Trata-se de esquemas geométricos definidos por linhas elásticas presas à pa rede – contornos ocos de algum simbolismo que acon tece em hiato. Já a concreção de A NEGRA é anteci pada pela realização dos QUASARES (1983), obra em que a artista selecionou 11 ilustrações retiradas de catá logos de venda, almanaques variados e enciclopédias e as submeteu a múltiplos processos de reprodução técnica de imagens (fotocópia, fotografia, ampliação fotográfica, impressão offset), ampliando-as e borran do seus contornos até que perdessem sua legibilidade e se transformassem em vultos construídos.11
Existe um pensamento projetual embutido nesse tra tamento gráfico que transforma uma imagem em um vulto, o qual, por sua vez, também ecoa na conforma ção de X (1989) e ASA (1995) – duas presenças fantas magóricas que se infiltram no espaço, transformando a imprecisão gestual da forma desenhada em massas de materialidade inequívoca.
5. SUL
Às já sublinhadas palavras de ordem traduzidas pe los vitrais zenitais do edifício, a exposição de Carmela Gross soma outras palavras advindas do seu léxico. Um neon de 3 metros de largura anuncia em letras garra fais (delineadas pelo traço da artista): SUL. Trata-se de uma coordenada geográfica, mas também de um norte simbólico, com o perdão pelo jogo de palavras. Com sua claridade, a obra coloca em evidência o lugar de onde fala a artista, tantas vezes tratado como sinônimo de dependência econômica, política e cultural.12 O esta do periférico é assim desafiado pela ênfase linguística, o que se repete no letreiro de luz LED FIGURANTES (2016). Nele deslizam, uma por uma, as “profissões” originalmente enumeradas por Karl Marx na descrição do lumpesinato (o proletariado aos trapos), amealhado como massa de manobra por Napoleão III em sua re volução farsesca: herdeiros decadentes, degenerados, arrivistas, nulos, vagabundos, soldados exonerados, ex-presidiários, desertores, gatunos, jogadores, lazaro nes, batedores de carteira, prestidigitadores, trapacei ros, cafetões, donos de bordel, carregadores, literatos, tocadores de realejo, trapeiros, amoladores de tesoura, funileiros, mendigos e traficantes.
10. Para uma leitura mais extensa de A NEGRA, ver meu ensaio “A geógrafa, a má revisora e a espeleóloga”, In: FREITAS, Douglas de (org.). Carmela Gross. São Paulo: Cobogó, 2018.
11. No ensaio citado na nota anterior, esbocei uma interpretação do título dessa série de impressões: “Carmela Gross nomeou-os como QUASARES, os maiores emissores de energia do uni verso, maiores do que estrelas e menores do que galáxias, cuja definição ainda estava em disputa naquele momento. / Parece pertinente que esse potente e misterioso fato cósmico tenha emprestado seu nome como introdução às estranhas figuras laboriosamente construídas pela artista. Esse acerto, porém, não deve evitar que se faça uma pergunta: o que efetivamente torna essas imagens tão magnéticas? Não pode ser a simples ausência de referencialidade, afinal são muitas as manchas e borrões ocasionais que não possuem qualquer significação evidente e nem por isso atraem o olhar por mais de um instante. Uma hipótese é que a centralidade das sombras nos papéis, sua tendência (nunca completa) à simetria e a alta definição de sua impressão fazem com que a figura, por mais indefinida que seja, identifique-se como algo construído, produzido com propósito: desenhado”.
12. Para além dos argumentos retóricos, a arte e a poesia visual contam com ênfases visuais como transformadoras do sentido de um signo. No caso de SUL (2019), a soma de traços paralelos ondulados transpostos em neon faz da palavra um campo de ressonância que se expande pelo espaço. Em outro trabalho, de 2002, Carmela Gross imprime as letras S – U – L em três folhas. Nelas, o que se vê é resultado de inúmeros sulcos da ponta seca sobre a chapa da gravura em metal. As finas linhas insistentes e convulsivas se avolumam em espessas grafias que convertem a sutileza em potência, a fragilidade em imposição.
37
Para Marx13, a precariedade marginal dessa multi dão de desempregados boêmios impedia a forma ção de sua consciência de classe, deixando-a sus cetível a mitomanias reacionárias que terminariam por ir contra os próprios interesses. Para Carmela Gross, esses antecedentes históricos atuam tam bém como metonímia das parcelas das cidades que escolhemos não ver, com seus objetos, corpos e vi das constantemente ignorados pelo planejamento e pelo progresso.
Nesta exposição, portanto, o letreiro luminoso constantemente remete ao equivalente humano da massa de restos cognitivos amealhados pela RODA GIGANTE. As vicissitudes dessa multidão são, ainda, sublinhadas pela animação 13 PASSAN TES (2016), com seus personagens anônimos que caminham, tropeçam e flanam sobre uma malha quadriculada, enquanto sua violência disruptiva inerente é evocada pelo vídeo LUZ DEL FUEGO II (2018), com seu fluxo-devir de destruição, tragédia e cataclismo.14
Com esses trabalhos, a exposição enfatiza o sentido sociopolítico que está sempre patente na produção de Carmela Gross.15 Assim, está aberto o caminho para o ato final da mostra, dois andares acima.
6. Verdadeiras pessoas de mentira
Não é por acaso que, ao subir ao moderno hall cons truído sobre o edifício histórico ocupado pelo Farol Santander, o visitante encontra a instalação REAL PEOPLE / ARE DANGEROUS, parcialmente realizada em 2008 e agora instalada pela primeira vez em sua forma e dimensão integrais.16 Nessa obra, 292 lâmpa das vermelhas são articuladas pela artista de modo a formar dois grandes painéis suspensos. Atravessando o hiato da largura do hall, é possível completar a sen tença que nos lembra de que as pessoas de verdade são perigosas, ou que são perigosas as pessoas reais.
Quem são as pessoas reais? Ou, ainda, quem seriam as pessoas de mentira, falsas ou irreais? Essas são per guntas que cada visitante terá que levar consigo.
13. No célebre ensaio, escrito no calor do momento, “O 18 de Brumário de Luís Bonaparte” (1852).
14. Nesses dois vídeos, a operação constitutiva se faz pela justaposição de imagens: no primeiro, como sucessão de frames de singelos bonecos feitos com fita adesiva preta sobre as páginas de um caderno; no segundo, como interpolação de dezenas de fotografias retiradas de mídias impressas.
15. É importante sublinhar que a linearidade do texto força uma progressão temática e formal pelas obras em exposição, mas toda a montagem, tomando partido da arquitetura do espaço, privilegiou a concatenação de um espaço não linear, em que os pareamentos aqui apresentados na verdade se dão por diagonais cruzadas entre coordenadas diversas. Por isso, acima, foi dito que essas obras conformam um “tabuleiro”.
16. A proposta original desta obra se deu no projeto de arte urbana “SCAPE” (2008), também conhecido como “Christchurch Biennial of Art in Public Space”. A intervenção ocuparia duas passarelas, mas, diante da apreensão dos organizadores neozelandeses, apenas a primeira metade da obra foi realizada e instalada.
38
RODA GIGANTE
2019
Instalação composta por cerca de 300 objetos Área: 370 m² / Altura: 10 m
FERRIS WHEEL
2019
Installation consisting of about 300 objects Area: 370 m² / Height: 10 m
41
SUL 2019
Neon e estrutura metálica 1,55 x 3,05 m
SOUTH 2019
Neon and metal structure 1.55 x 3.05 m
43
MONUMENTOS
2001
Série de 9 desenhos Elástico e pregos Medidas variadas
MONUMENTS 2001
Set of 9 drawings Elastic and nails Varying measures
45
A CARGA
1968
Lona e estrutura de ferro 3 x 4 x 3 m
Coleção particular, EUA
THE LOAD
1968
Canvas and iron structure 3 x 4 x 3 m
Private collection, USA
49
13
PASSANTES
2016 Vídeo 4’47”
13 PASSERS-BY 2016 Video 4’47”
53
FIGURANTES
2016 Painel de LED 1,14 x 2,33 x 0,10 m
EXTRAS
2016 LED panel 1.14 x 2.33 x 0.10 m
55
LUZ DEL FUEGO II 2018 Vídeo 11’24’’
LUZ DEL FUEGO II 2018 Video 11’24”
59
60
61
X 1989
Latão pintado 3,78 x 2,69 m X 1989 Painted iron rods 3.78 x 2.69 m
63
ASA 1995
Ferro articulado, tecido e betume
1,14 x 2,72 x 0,20 m
WING
1995
Articulated iron, fabric and bitumen 1.14 x 2.72 x 0.20 m
67
QUASARES
1983
Série de 11 gravuras
Offset sobre papel 1 x 0,70 m (cada)
QUASARS
1983
Set of 11 prints
Offset on paper 1 x 0.70 m (each)
71
A NEGRA 1997
Filó de náilon e estrutura de ferro sobre rodas
3,30 x 2,00 x 2,00 m
THE BLACK WOMAN
1997
Nylon net and iron structure on wheels
3.30 x 2.00 x 2.00 m
75
REAL PEOPLE / ARE DANGEROUS 2008 / 2019
292 lâmpadas tubulares de LED e estrutura metálica 2,5 x 16 m e 2,5 x 21 m
REAL PEOPLE / ARE DANGEROUS 2008 / 2019
292 LED tubular lamps and metal frame 2.5 x 16 m and 2.5 x 21 m
79
86
ENSAIOS
87
ESTRATÉGIAS EXCÊNTRICAS
| ANDRÉ SEVERO
Eis uma ideia penosa: que, para além de um certo ponto preciso do tempo, a história teria deixado de ser real. Sem se dar conta disso, a totalidade do gênero humano ter-se-ia, de repente, afastado da realidade. Desde então, tudo o que se teria passado, teria deixado de ser verdadeiro, mas não poderíamos aperceber -nos disso. A nossa tarefa e o nosso dever seriam agora descobrir esse ponto, e, na medida em que não nos fosse possível fazê-lo, teríamos de perseverar na destruição atual.
Elias Canetti
Meios que desenvolvemos para conseguir alguma coisa; forma de obtenção de algo; habilidade, astúcia, esperteza, contorno das dificuldades: estratégia. Objeto é toda coisa material que pode ser percebida pelos sentidos; é a causa, o motivo, o senti mento vinculado a uma ação; é o assunto, a matéria de uma área de conhecimento; é desígnio, fim, motivo, pretexto, propósito; e é também mercadoria, artigo, bem de consumo, coisa. Em As estratégias fatais, Jean Baudrillard pondera sobre um proble ma que ainda hoje, talvez mais do que nunca, se coloca ao homem contemporâneo: o de saber como se relacionar com o mundo, com o espaço, com os objetos, com as coisas que nos rodeiam e que estão em permanente mutação. Sentimo-nos reféns dos objetos, obesos em relação ao espaço, deslocados em um mundo com o qual a nossa relação não pode mais ser pensada em termos de radicalidade absoluta.
Questionando-se sobre a existência de estratégias que nos possibilitariam um melhor relacionamento com essa realidade, que parece instaurar um processo de libertação – de corte do cordão umbilical – que a liga ao ser humano, Baudrillard levanta uma hipótese: e se, cansadas da dialética do sentido, as coisas, os objetos, houvessem encontrado um meio para lhe escapar? Na ponderação do sociólogo, filósofo, fotó grafo e poeta francês (que, em sua obra, sempre nos convidou a mantermos acesa a chama do inconformismo – motor que move o homem – em busca de um porvir que não viesse a nos assombrar), esse meio estaria na possibilidade tropológica de os objetos, as coisas proliferarem até o infinito, na de se potencializarem, na de se sobreporem à sua essência numa escalada até os extremos, numa obscenidade que lhes serviria, doravante, de finalidade imanente e de razão insensata.
Tomada como uma metáfora de ampliação de nossa perspectiva a respeito dos efeitos da fragmentação do sujeito no mundo e da necessidade de construção de novas estratégias para a convivência com as diferenças, acredito que a hipótese de
89
Baudrillard nos sugere, no mínimo, um meio para tentarmos contornar a evidência de que, ainda atualmente, a aparente racionalidade de nossas ações segue invadin do todas as coisas. É fato que, mesmo em uma época de transição – em que esta mos beirando a singularidade (quando todas as transformações do último milhão de anos estão para ser superadas pelas mudanças que ocorrerão nos próximos quinze minutos) –, ainda vemos constantemente instalar-se em nosso cotidiano o desejo de sermos cada vez mais exatos, de cada vez mais enxergarmos um sentido objetivo para nossas motivações. Ao que parece, mesmo em um contexto em que a inteligência artificial está para superar a humana (e talvez até mesmo tornar-se in distinguível desta última), continuamos tentando racionalizar a vida, torná-la cada vez mais eficaz e especializada. Porém, ao mesmo tempo, vemos crescer em nós uma certa incapacidade de podermos imaginar qual rumo seguiremos, qual direção tomaremos quando tivermos tudo entendido, examinado, organizado, classificado, transformado em padrões e normas de comportamento – empresa que, não obs tante, se mostra cada vez mais impraticável.
Temos consciência de que nossa visão de nós mesmos, do outro, das coisas e do mundo em que estamos inscritos muda a cada dia; e de que mesmo os contextos da quilo o que imediatamente nos rodeia (e que acreditamos serem instâncias estáveis) estão em permanente transformação. É também, para nós, pacífico que procuramos estar o mais abertos possível para novas experiências, para maneiras distintas de pensar e de relacionarmo-nos com a realidade – todavia, o simples fato de vivermos a transição e, ainda assim, nos envolvermos preferencialmente com o lado racional de nossas atividades faz com que pareçamos estar longe de alcançarmos nossos propósitos ou nossas metas existenciais mais profundas. Quero dizer com isso que não deixa de ser espantoso que, mesmo em uma época em que as chamadas lógicas heterodoxas (como a lógica difusa, a lógica intuicionista ou mesmo a lógica paracon sistente do matemático brasileiro Newton da Costa) desmontam alguns pilares da lógica clássica – como o princípio da contradição, por exemplo –, ainda estamos de sacostumados a um raciocínio não padronizado e parece que, para cada pensamento um pouco mais aberto que possamos desenvolver, existe sempre um pensamento objetivo como contraponto; para cada inclinação livre que temos, uma inclinação funcional que se lhe opõe. Mas será que somos realmente capazes, ou melhor, será que existe, efetivamente, a necessidade de continuarmos avaliando as coisas apenas de forma prática, de formar juízo, de encontrarmos sempre algum sentido objetivo naquilo que observamos, experimentamos ou realizamos?
Tomando por base essas indagações e também a imagem da instalação artística que dá o contexto imediato para esta redação, talvez fosse o caso de pensarmos: e se esses objetos, essas coisas – que, na conjectura de Baudrillard, poderiam se proliferar até o infinito –, não fossem quaisquer objetos? Ou melhor, e se as coisas que estariam já cansadas da dialética do sentido (e que, por força mesmo de sua obsolescência, já seriam as que estariam habilitadas para lhe escapar) não fossem os objetos a que nos apegamos ao longo da vida, não fossem as coisas a que atribuímos valor, mas sim os
90
restos, as sobras de tudo aquilo o que efetivamente damos atenção no decurso mais ordinário de nosso percurso existencial? Tal conjectura, além da ponderação mais óbvia sobre aquilo que esses objetos poderiam revelar sobre nós mesmos e sobre nosso agir no mundo, nada obstante, já me conduz também a repetir aqui algumas indagações que me fiz em contextos similares de especulação – a saber: em que se basearia a convicção, o dever ou a necessidade de nosso agir moral se não levásse mos sempre em conta nossos apelos a um absoluto? Quais seriam os resultados ime diatos de nosso envolvimento direto com as coisas, os pensamentos e as situações que habitualmente colocamos à margem de nossas experiências? Como sabermos o que hoje pode, de fato, ser entendido como racional e compreensível? Qual a utilida de desta ou daquela ação? Qual o resultado de nosso embate criativo com as coisas e com o mundo (e o que sobraria deste encontro)? E, finalmente, considerando-se aí a circunstância imediata de elaboração deste escrito, qual a relação entre as propo sições do artista, o local de apresentação da arte e o verdadeiro envolvimento (se é que ele é almejado) com seu espectador ou participante?
Sem resposta imediata a nenhuma dessas questões (que, creio, poderiam, todas elas, ser substituídas apenas por uma indagação mais abrangente sobre o que fundaria, realmente, a dignidade e a determinação humanas senão o fato de que cada ser humano é uma pessoa aberta para algo mais alto e maior ou, no mínimo, diferente do que ela própria é), justifico que elas são relacionadas aqui apenas para pontuar, mais uma vez, que – mesmo em um contexto antropossocial em que se considera que um novo conceito de ser humano já está para surgir – toda intuição, toda ação não funcional, todo pensamento nômade e toda lógica não ortodoxa continuam en contrando no intelecto motivos para serem rejeitados ou condenados (assim como seus opostos mais estruturados, para serem defendidos e exaltados). Além disso, não parece configurar, para nós, nenhuma novidade o fato de que, geralmente, nem percebemos nada disso, pois mudamos tão constantemente, tão rapidamente, que, muitas vezes, nem chegamos a completar um movimento despretensioso, um pensa mento impreciso, um pressentimento dúbio antes de nos envolvermos diretamente com seu oposto – deixando de lado as experiências que poderíamos ter com o que se encontra entre os polos desse raciocínio. Nenhuma ilusão ou condenação aqui. Penso, contudo, que talvez seja justamente entre esses equivalentes, no intervalo desses aspectos opostos, que oscila o dinamismo de nosso pensamento; ou melhor, nossa capacidade de abandonarmos os preconceitos do senso comum e buscarmos uma nova compreensão de tudo aquilo que nos rodeia.
Dito de maneira equivalente: é certo que nunca poderemos almejar total clareza quanto às questões mais importantes relacionadas aos nossos aspectos vitais, essen ciais e existenciais. Porém meu ponto aqui é se não seria o caso de, neste momento, nos questionarmos não apenas sobre as consequências de nossas ações racionais, sobre os efeitos de nossas atividades funcionais e sobre o que admitimos e alcança mos de uma situação prática, mas sim sobre o sobejo, o excesso, o que fica depois que retiramos o que aparentemente consideramos necessário ou principal de uma
91
ação ou situação, enfim, sobre aquilo que é por nós rejeitado durante nosso embate ordinário com o mundo? Sendo para nós, de qualquer modo, impossível viver apenas de maneira exata (e considerando-se que ainda não podemos ter certeza de que a iminência do advento da singularidade – que, em termos evolutivos, considera que o atual estágio de desenvolvimento do ser humano está longe de ser o último ou o definitivo – irá unir o humano ao maquínico), talvez seja finalmente o momento (qui çá, inclusive, nossa última chance) de nos preocuparmos com os dados iminentes, de potencializarmos nossa criatividade e nossa intuição, de nos entregarmos às experi ências com a arte e acionarmos nossa inteligência espiritual.
Tal seria, acredito, o efeito mental do desvio para aquilo o que é externo ao centro; to davia, para além das complementações (que seriam, efetivamente, necessárias) para a sustentação destes argumentos, creio que vale dizer, ainda, que tenho ciência das correntes epistemológicas que postulam que o universo não é, efetivamente, dialéti co; das filosofias que sustentam que estamos, todos, fadados não ao equilíbrio, mas aos extremos; das teorias que asseveram que estamos condenados ao antagonismo radical e não à reconciliação ou à síntese. Entretanto, como contraponto, posso pon derar que estes me parecem ser princípios que se exprimem, justamente, não na for ma extática, mas sim na estática do objeto puro, do concêntrico e não do excêntrico, dos princípios ortodoxos e das coisas que, encerradas em uma polaridade interna, já não se relacionam com o que é outro, diferente. Dito isso, penso que a possibilidade de ajuste, se é que ela existe, talvez esteja, como suspeitava Baudrillard (ainda que a sua via de especulação também o conduzisse, invariavelmente, aos extremos), não nas polaridades e nem nas sínteses, mas na obtenção de formas sutis de radicali zação das qualidades secretas para combater o deletério por meio da potência do superlativo e da união excêntrica das causas e dos efeitos: não opor o visível ao ocul to – procurar o segredo; não contrapor o fixo ao móvel – buscar a metamorfose; não antagonizar o belo ao feio – procurar entender o informe; não distinguir o verdadeiro do falso – aceitar a ilusão e perceber a iminência.
Conforme acredito, há uma diferença radical entre esse caminho (que, em última ins tância, nada mais é do que a senda da vivência com a arte e a vereda da criatividade e da intuição) e os métodos objetivantes da lógica ortodoxa, das epistemologias pro loquiais ou mesmo dos adágios da tecnociência; todavia a estratégia excêntrica, aqui, seria simplesmente a de anuirmos que o caminho rumo ao que não se experimenta, ao que corre ao largo de nossas expectativas primevas, ainda configura os campos mais férteis para plantarmos as sementes de um raciocínio não ortodoxo, de uma ló gica sensível, de uma ação intuitiva, de um pensamento-ação que não apenas aceite e obedeça às normas de funcionalidade ou produtividade e que – nada obstante –nos aproxime de uma experiência que não precise, para ter validade ou ganhar visi bilidade, se mostrar rigidamente orientada numa ou noutra direção.
Da utopia, que no horizonte da filosofia da história constituía um horizonte me ta-histórico necessário – uma ulterioridade metatemporal –, resta, ao contrário,
92
algo que insiste profundamente no tempo, na própria estrutura do tempo, e é aquele presente que carregamos por dentro. Não é esse o presente que morre, que se apaga porque é engolido pelo passado ou que cessa de ser porque já é futuro. Utopia, nesse sentido, é uma experiência íntima da temporalidade e, portanto, não implica colocarmo-nos do lado de fora ou além, não evoca uma transcendência, mas sim um estabelecer-se deste lado, no interior do mundo.
Ferruccio Masini
Tempo atual; o que acontece ou tem seu início no presente; o que habitou ou teve seu começo na mesma época; algo ou alguém que fez parte de um mesmo período de tempo; algo ou alguém que se inscreve, indiscutivelmente, no presente: contemporâ neo. Conforme pondera Giorgio Agamben em seu ensaio O que é o contemporâneo?, o poeta, o artista, deve manter fixo o olhar no seu tempo. Questionando-se sobre o que efetivamente enxergaria quem vê o seu tempo – quiçá o sorriso demente do seu próprio século? –, o filósofo italiano propõe algo que ele chama de uma segunda defi nição da contemporaneidade: contemporâneo seria aquele que manteria fixo o olhar no seu tempo para nele perceber não as luzes, mas o escuro. Tendo em vista que, para Agamben, o contemporâneo que se pode entrever na temporalidade do presen te é sempre retorno – não cessa de se repetir – e, portanto, como a poesia e a arte, nunca funda uma origem; e que, nada obstante, para esse autor todos os tempos são (para quem deles experimenta contemporaneidade) obscuros, contemporâneo seria somente aquele que tem coragem de encarar essa obscuridade, aquele que é capaz de olhar para o não vivido no que é vivido, aquele que consegue entrever um limiar inapreensível entre um ainda não e um não mais, e compreender o presente como sendo, ao mesmo tempo, imemorial e pré-histórico.
Sem intentar ou ter ao que imputar embargo imediato, começo a ponderar – a partir de um entendimento particular (ou, quiçá mais precisamente, de um mau entendi mento) das postulações desse pensador (cuja produção se concentra nas relações entre a filosofia, a literatura, a poesia e a política, mas que, ao mesmo tempo, esforça -se para manter suas conjecturas fundadas no apontamento de uma ligeira diferença, um mínimo deslocamento das coisas, entre o mundo profano e o mundo messiânico) – que contemporâneo não seria, definitivamente, aquele que força a entrada pela porta de um novo e eterno mundo – o mundo pós-histórico –, mas sim aquele que, in dependentemente das ferramentas de que dispõe ou da forma de que se utiliza para inscrever seu pensamento no real, consegue manter as coisas exatamente (ou quase exatamente) como elas são – só que um pouco fora de lugar. Ou seja, contemporâneo seria, nessa ótica, aquele que persegue uma sensação vertiginosa de verdade nas fra turas, nas cisões do tempo; aquele que ultrapassa a forma estética na forma extática da metamorfose incondicional; aquele que mergulha nos temas e os arranca às suas causas objetivas para os entregar ao poder dos efeitos desencadeadores; aquele que, enfim, consegue ir contra a aceleração dos canais e dos circuitos, aquele que
93
atua na lentidão – não a lentidão nostálgica do espírito, mas a imobilidade em potên cia de distensão –, no excêntrico, no mal escrito, no súbito absoluto ou, simplesmente, naquilo que Baudrillard chamaria de radicalização das qualidades secretas
Contemporâneo seria, assim, efetivamente, o poeta, o artista que, conforme acredito, é aquele (talvez o único que restou no atual contexto cultural, político e antropos social em que nos sustentamos) que ainda consegue fazer com que a inércia ou o silêncio tornem-se estratégias de ação e comunicação. Contemporâneo seria, pois, aquele que consegue, a partir da verticalidade de sua entrega para a pesquisa e investigação criativas, emular o efeito mental da catástrofe – só que sem a desgra ça, sem a calamidade, sem as consequências desastrosas do acontecimento funesto factual. Contemporâneo é, assim, aquele que aceita a consciência errante, a deriva de sentidos, o entrecruzamento de fronteiras; aquele que, contra a transparência geral (e sem fazer acelerar uma sentença de morte e de indiferença), quer intimar as coisas a reencontrarem seu sentido. Contemporâneo é, ainda, aquele que não busca apagar o real em benefício do imaginário, mas aquele que almeja a fração parafactual da realidade; aquele que percebe que no contexto atual já não há mais transcendência e que aquilo que restou dela é não mais do que a superfície imanente do desenrolar das operações e da comunicação; aquele que entende que o presente que a contem poraneidade pode conceber tem, desde já, o horizonte cindido (e que é exatamente no ponto de quebra desse horizonte em que nos equilibramos). Contemporâneo é, finalmente e sem sombra de dúvidas, o artista que enfrenta o real e, sem descarac terizá-lo, infere uma sutil mudança; contemporâneo é o poeta que consegue fazer parar as coisas – antes que cheguem ao fim – e mantê-las assim, em distinção de iminência, no instante de suspensão da própria aparição.
Sem que seja preciso detalhar mais pontos de reconhecimento, justifico que tais pos tulações se ressalvam agora, pois, conforme acredito, o que a investigação artística parece poder, em última instância, nos oferecer é, antes, uma ocasião para se refletir sobre a experiência que vivemos ante um pensamento materializado em um lugar e um momento determinados. No fim das contas, é isso o que torna contemporâneo um artista – e não estou me referindo aqui, obviamente, a qualquer artista (pois não pretendo colocar foco, neste momento, sobre artistas que, mesmo com um trabalho consolidado pelo sistema de circulação vigente, parecem estar em estado de anomia; e menos ainda àqueles que, para manter suas trajetórias em evidência, simplesmente acatam os acordos da gramática visual contemporânea), mas sim àqueles artistas que fazem de seu movimento no campo de investigação com a arte uma cruzada de ponderação existencial, política, cultural, social e humana. Estou, em suma, tentando refletir sobre aquele artista que procura, a seu modo, desamarrar o sentido da funcio nalidade que normalmente aplicamos às nossas experiências e expectativas habitu ais; aquele que entende, efetivamente, a necessidade de os objetos abandonarem a dialética dos sentidos (e que, por isso mesmo, muitas vezes, somente se envolve com espaços, objetos ou situações quando percebe que, por alguma razão, esse espaço, esse objeto, essa situação está condenada a não ser algo, a sobrar – quando per
94
cebe conjunturas que foram colocadas à margem da nossa experiência ou atenção cotidianas). E aí há, novamente, um ponto crucial, pois, conforme acredito, para esse artista (o poeta, o contemporâneo), são as realidades e as circunstâncias cotidianas, despertadas por uma forte intuição que dificilmente se engana, que acendem sua curiosidade – o que não é notado, o que é percebido com desinteresse, o desapro vado, o rejeitado, o desprezado, as degradações de determinadas situações que se podem revelar, para esse artista, subitamente, como os terrenos mais propícios para uma investigação particular sobre o escoar da nossa existência.
Mas, também aí, há um segredo, pois, a meu ver, a fluidez do processo criativo é a essência de uma experiência de operação no real; uma operação que assume com facilidade a variedade de condições inerentes ao mundo, alterando-as, minimamente, justamente pela inter-relação de circunstâncias que acompanha cada fato ou situa ção. Nesse sentido, o artista que liga sua imaginação criadora a contextos urbanos, por exemplo, e se utiliza das vinculações recíprocas entre arte e vida como potenciais elementos criadores de uma reflexão conceitual (de linguagem plástica caracterizada por um grande domínio espacial, mas também, muitas vezes, por uma construção intencionalmente reduzida em nível estrutural) produz algo que não nasce apenas de uma crença na forma, mas de uma consequência metódica que trata de descobrir elementos determinantes para a vida e na própria vida, e de fixá-los em manifesta ções mundanas e em reflexões existenciais determinadas por um envolvimento total no desdobramento de seu pensamento criativo. Esse artista, que normalmente não parece acreditar em um espaço próprio para a arte, ou, pelo menos, que não parece acreditar em um espaço onde a arte se apresente desligada da vida, da experiência humana e mesmo da situação cotidiana, aposta, sim, em uma reflexão arejada e livre de vícios processuais e institucionais. Por consequência, o desenvolvimento conse cutivo de seu trabalho plástico não é aquele que se dá aos saltos, pois se trata de alguém que trabalha, invariavelmente, sem rede de segurança, que prefere as transi ções e que se movimenta sempre por territórios diversos, revogando, tornando sem efeito, anulando constantemente tudo o que já fez e empregando outra coisa em seu lugar – daí por que suas indagações, com frequência, ecoam para além do campo da arte e circulam com total liberdade por outros terrenos especulativos.
Com isso em perspectiva, poderíamos ponderar também que os elementos essen ciais na investigação plástica de qualquer artista deveriam ser, pois, a mudança de contextos e procedimentos e o abandono das certezas instituídas – elementos esses que poderão adquirir um sentido especial em seu processo criativo, principalmente por favorecerem o desligamento em relação às situações estabelecidas. Digo isso pois, para mim, qualquer movimento no campo artístico deveria configurar uma ins tância insigne de experimentação – mas não no sentido de o artista não produzir trabalhos completos ou complexos, pois a completude e a complexidade das investi gações artísticas se revelam (ou deveriam se revelar, penso eu), antes de tudo, em um exercício de aproximar-se de determinada experiência, envolver-se nela, percebê-la, vivenciá-la, antes que ela possa ser assimilada completamente. Ou seja, a meu ver,
95
a prática de arte deveria, invariavelmente, ser configurada como uma investigação que não nega seu caráter experimental de embate, confronto e intercâmbio de co nhecimento, pois, até onde acredito compreender os fenômenos de elaboração do raciocínio criativo, posso afirmar que o trabalho que não nega seu cunho de expe rimentação é sempre um trabalho potente – haja vista que possui uma qualidade necessária para o desenvolvimento de qualquer pensamento criativo e reflexivo (seja ele artístico ou não), que é a de não se preocupar em dar destaque para um procedi mento ou enfatizar gratuitamente uma poética a não ser no sentido de trazer à tona, de chamar a atenção para uma inquietação, de liberar algo em que o artista acredite ou que ele intua como relevante para potencializar a discussão que propõe.
Sem embargo evidente, justifico que isso também somente se salienta, pois, a meu ver, o que faz das proposições artísticas algo mais do que um ajuntamento de ma teriais, um simples jogo formal de sedução, é justamente a capacidade do artista de abrir um pensamento, de produzir linguagem e oferecer operações diferenciadas e infinitas de suas indagações. Penso, também, que a própria disponibilidade da arte para se constituir como um espaço de reflexão existencial, um campo de encontro dos questionamentos humanos, já seria suficiente para dar sentido a esse movimen to – principalmente por ser, creio, no terreno de reflexão artística onde podemos mais facilmente nos desligar do raciocínio exato, restaurarmos nossa mobilidade de pensamento e nos abrirmos para a impermanência das coisas. Ao discutir, por meio do seu trabalho, as maneiras de apresentação da arte, ao romper o enclausuramento individual, ao ultrapassar os limites das estabilidades identitárias e ao se abrir para a impermanência das coisas, o artista (o contemporâneo) demonstra uma preocupa ção de que sua investigação (e, consequentemente, sua proposição), sob qualquer forma ou em qualquer lugar que se apresente, não se reduza a um mero jogo formal ou material, mas que se atenha ao dinamismo e à força das trocas humanas, dos encontros objetivos e subjetivos que ampliam a liberdade de nossos pensamentos e dos relacionamentos individuais e consociais que mantemos.
Conforme posso ponderar, o sucesso (ou, quiçá, principalmente a falha) da realização das proposições de um artista que encare a investigação em arte dessa maneira pode demonstrar, inclusive, que a arte definitivamente não exige espaços padronizados de exibição, modelos uniformes de demonstração, ou melhor, ambientes de exclusi vidade onde os pensamentos artísticos possam ser inseridos e apresentados. O que existe são, no máximo, modos particulares de cada artista interpretar e espacializar os problemas, de incorporá-los e devolvê-los ao mundo como reflexões, possibilida de de comunicação ou reciprocidade de relações. Por meio do envolvimento com as situações rejeitadas pelo pensamento ordinário e por um interesse genuíno em situações pelas quais há definitivamente um desacordo, o artista aprofunda-se nas questões relativas aos modos de apresentação de um pensamento plástico e procura alcançar as razões não ditas que estão por detrás das vivências mundanas. Manten do o olhar fixo no seu tempo, percebendo dentro da realidade não as luzes, mas a obscuridade, trabalhando com a possibilidade de ir além da imposição de valores em
96
direção ao mistério do questionamento humano ou de nosso verdadeiro embate com o mundo, o artista torna-se, efetivamente, contemporâneo – talvez apenas para nos revelar (ou nos fazer lembrar mais uma vez) a importância de tentarmos, mesmo que eventualmente, nos utilizarmos de estratégias excêntricas para encontrar algo entre as antíteses de nossos pensamentos e assim ampliarmos, como pudermos, nossos horizontes sensíveis e intelectuais.
Qualquer história, conto, biografia, está inscrita na temporalização da própria presença. No encontro com o outro, que é sempre o encontro com o tempo (mesmo no cone de sombra do sofrimento), o homem se constitui, a cada vez, como autor do próprio texto da vida. Na experiência vivida da própria biografia, torna-se a pôr em jogo as articulações da temporalidade, novas alquimias, du rante as quais ou ao findar delas poderá surgir uma história inédita, imprevista, não mais somente uma reconstituição do passado, mas uma história inscrita no devir, que já começa a escrever-se no presente.
Mauro Maldonato
Não concêntrico; que não se enquadra em padrões; que age de modo estranho ou incomum; que pensa de modo extravagante; que se distancia ou se extravia do cen tro; que se localiza de modo externo ao centro ou que não possui nem comparti lha centralidade. Em uma realidade em que vemos o ritmo da mudança tecnológica ocorrer de forma cada vez mais célere (e causando impactos tão profundos na vida humana), não há como deixar de se pensar que as mutações decisivas dos objetos e do contexto consocial contemporâneo – que, ao que parece, também derivaram de uma tendência para a abstração formal e operacional (dos elementos e das funções) – contribuíram para a sua homogeneização na virada corrente para o virtual. Bau drillard, como vimos, quando pensava sobre o escape das coisas frente à dialética do sentido, sobre a possibilidade de os objetos se potencializarem, se sobreporem à sua essência e proliferarem até o infinito, ponderava que tudo aquilo que foi, um dia, constituído em objeto por um sujeito representa para ele uma ameaça virtual de morte. Ponderava também que o objeto não aceita a sua objetividade forçada mais do que um escravo aceita sua servidão; que o sujeito (que não pode ter mais do que um domínio imaginário, de qualquer modo efêmero, sobre o objeto) não escapará de sua ressurreição e que a única revolução nas coisas não estará, jamais, no seu sucesso dialético, mas em sua potencialização extática.
Trata-se de ponderações, sem dúvida, contundentes (tão contundentes que me es forcei por dar sequência, ao longo de todo este escrito, ao impacto que elas tiveram sobre mim desde a primeira leitura); todavia, pensando com um pouco mais de cui dado sobre essas elucubrações e colocando-as em contraste com a imagem da ins talação RODA GIGANTE, de Carmela Gross – motor primevo desta reflexão –, acabou
97
também por me ocorrer (mais correto seria dizer me atravessar) a lembrança de uma outra sentença, elaborada em A subversão do ser, por Mauro Maldonato: “Quem sabe constituir objetos não teme o vazio dos objetos; quem sabe ver formas não teme o in forme, nem teme o surgimento do absurdo ou a ocultação dos significados”. Com essa colocação em mente (e pensando novamente sobre o relacionar-se do homem com o mundo, com o espaço e com as coisas que o rodeiam em um estado de permanente mutação), pude perceber, finalmente, que, no balanço derradeiro, a experiência indivi dual de cada um de nós é, ao mesmo tempo, o único sujeito e o único objeto de nosso acontecer. E essa ponderação – que talvez pareça primária para alguns – acabou, outrossim, por me fazer entender (algo que pode soar também um tanto óbvio) que os objetos comuns possuem uma diferença crucial em relação àqueles produzidos no contexto da pesquisa artística – pois, ao contrário dos primeiros (coisas materiais pas síveis de serem apreendidas em sua concretude e por sua funcionalidade – ou mesmo pela perda dessa funcionalidade), estes últimos não são (jamais foram e nem poderão algum dia vir a ser), efetivamente, mais do que tropologias.
Da mesma maneira que os vínculos entre as palavras na poesia, o objeto artístico somente existe enquanto potência; sua finalidade imanente é, para nós, ser hipótese, ser metáfora – e se ele parece existir para além da translação, é somente porque, mui tas vezes, consegue exercer um fascínio momentâneo, porque nos deixa vislumbrar, ainda que de relance, no instante iminente de sua desaparição, algo de oculto ou de menos evidente naquilo que somos (ou naquilo que acreditamos ser). Não há como –e nem porque – se negar o quão admirável e espantosa é, para nossa intelecção e para nossos sentidos, a presença tátil dos objetos que percebemos como componentes de um trabalho artístico, a sua iminência, a sua suspensão, a sua cotidianidade – con junção do súbito, da banalidade da realidade comezinha e da imanência de um outro tempo, de um outro corpo. Todavia, como vimos, ao que se afigura, mesmo dentro da experiência com a arte, talvez não haja para nós nada além de nossa experiência de nós mesmos no mundo. Nenhuma teoria, nenhum dado: apenas a experiência indivi dual (mesmo quando nos convencemos de que ela pode ser compartilhada). Tendo isso em perspectiva, não parece nos restar muito mais além da anuição de que aquilo que intuímos concretamente, das coisas, dos objetos – investidos ou não de conte údo artístico –, talvez não seja, efetivamente, mais do que uma percepção particular (uma cor, um som, um cheiro, um volume, um peso) que nos coloca em suspensão e gera, em nós, a possibilidade insigne de inscrevermos, nessa singela sensação, uma série interminável de indagações pessoais e ponderações existenciais.
Com efeito, se concordamos que o modo como percebemos o mundo e nos relacio namos com seus fenômenos é, necessariamente, por meio das nossas avaliações das situações em que estamos mergulhados, torna-se evidente que nem a funcionalida de, nem a monumentalidade (tampouco a beleza) seriam essenciais aos objetos que percebemos como arte – essencial seria somente a intimidade fatal que conseguimos desenvolver com as coisas que nos tocam e sobre as quais (ou, a partir das quais) podemos projetar a fascinação do vislumbre do relevo de topologia moebiana em
98
que se inscrevem nosso nascimento e nossa morte. E isso já se aponta, pois acredito que é apenas desse modo, como potencialização extática, que a experiência indivi dual (que, antes de tornar-se percepção, chega até nós sempre em forma de choque com os objetos, colisão com o outro, confusão com a realidade circundante) aca ba também por se configurar vivência e conhecimento. Ou seja, é somente a partir do impacto com aquilo (diferença irredutível, ulteridade insuprimível) que tentamos, mesmo que involuntariamente, perpetuar em nosso pensamento e em nossa reali dade imediata que reorganizamos a arquitetura estrutural de nossa consciência – e, quiçá, de nossa contínua presentificação. Sem contraste, sem conciliação: ao que se afigura, é assim mesmo que as coisas procuram, hoje, de maneira simultânea, sair de si mesmas e negar-se a si mesmas – e, quanto mais notamos esse antagonismo radical, mais percebemos a necessidade de criarmos estratégias excêntricas, que nos proporcionem a obtenção de formas sutis de aproximação das qualidades secretas de nós mesmos e dos objetos.
A partir destas pontuações, e tentando agora voltar o foco para os temas que elegi para conduzir esta redação a seu termo, arriscaria ainda dizer que nossa atitude em relação a um espaço, a um objeto (ou, no caso da instalação que serve como vetor de validação da lógica alotrópica desta redação, a uma série de objetos apresentados sem um espaço conscientemente manipulado), está normalmente determinada pelo contexto em que nos encontramos – e é, talvez por isso, que o valor, ou melhor, o significado de um trabalho de arte como RODA GIGANTE somente possa se revelar no momento mesmo de nosso embate com o resultado final da experiência que nos é proposta. Digo isso pois, nessa instalação, a artista se apoderou de uma grande quantidade de objetos – que tiveram suas funções originais descontinuadas (mas que, nada obstante, ainda carregam suas formas, suas histórias, seus contextos) – e os transportou até uma zona livre (mas não um espaço comum, uma vez que se trata de uma edificação quase centenária, que possui um histórico como instituição financeira e que, hoje, abriga um centro cultural recém-remodelado) para construir com eles reflexões de dimensões artísticas e existenciais profundas. Trata-se de re flexões pessoais, é verdade, mas que, por se darem a partir de objetos descartados e garimpados em lugares destinados a armazenar coisas de qualquer tipo para troca ou comercialização – e por, paradoxalmente, tratarem esses objetos como estruturas plenas –, exemplificam bem não somente a pregnância e a força do que é ambíguo, mas também a imagem tropológica da potencialização extática das coisas que esca lam até os extremos, que proliferam ao infinito.
Segundo creio, para que enxerguemos sentido em algo, é preciso que tenhamos uma perspectiva (momento ou ação que ofereça o que quer que seja de extraordinário); e para que haja uma perspectiva, é preciso uma pequena distorção de percepção –um mínimo de ilusão, de desafio ao real, que nos conquiste, que nos seduza, que nos estranhe, que nos revolte –; e é essa, a meu ver, a dimensão realmente estética da criatividade. Não parece haver a que se impor embargo, todavia, em RODA GIGAN TE; tudo parece estar, para nossa percepção imediata, efetivamente à superfície (e
99
já não parece haver segredo nessas coisas superficiais). Além disso, o que poderia ser conservado secreto aqui – posto que se trata de uma instalação artística – parece estar sendo forçado cada vez mais para dentro do real. Operação de inversão: pelo que somos impactados, então, se a ilusão mínima parece também ter desaparecido (ou ter sido intencionalmente removida)? Mais uma vez, não há resposta evidente; pois, por paradoxal que se afigure, tudo é metafísico nessa obra – até mesmo sua ge ometria sonhadora, que não é a do espaço, mas uma geometria mental, a do desenho de labirintos. Ou seja, trata-se de um trabalho que, apesar da concretude de todas as peças que o compõem (inclusive a edificação monumental em que se ancora e onde os objetos se amarram), não se esforça por ser objetivo, mas, ao contrário, força a experiência subjetiva, individual e coletiva, e estimula a indagação existencial e o envolvimento com a paisagem (mais precisamente, com a série interminável de pai sagens que não estão lá, mas para aonde cada um daqueles objetos parece apontar), impulsionando o raciocínio desarticulado, o processo de abandono da construção exata de nosso pensamento e da nossa maneira de perceber e interatuar no mundo.
E, de fato, uma das características mais marcantes de uma obra assim é que ela pa rece não poder ser apreendida na sua totalidade, uma vez que não é apenas o resul tado da instalação ou da disposição metódica de uma série de objetos arranjados de um modo determinado em um local específico – é, sim, uma operação plástica com plexa, na qual a artista, como parece ser costume em sua poética, mergulha no senti do obtuso das situações de controle para desestabilizar nossas certezas assentadas e nossos raciocínios exatos. Além disso, nenhuma relação nessa situação semelha ser evidente; ou seja, no resultado final dessa instalação, o impetuoso encontro com o cotidiano gera uma situação de negação do senso óbvio de nossas ações ordinárias. Mesmo o toque da artista, como ato de expressão único, não semelha ter aqui a im portância que vemos tantas vezes exaltada na maioria das proposições artísticas – a obra se revela como uma construção intrincada que, no entanto, parece comportar algo interrompido, algo descontinuado e suspenso, algo que se oculta para cada pessoa dentro desse labirinto de cordas e objetos; algo que, para cada pessoa, estará sempre na iminência de ser revelado. Ao eleger uma quantidade incontável (uma vez que os objetos que compõem a instalação não são, efetivamente, somente os objetos que lá estão, mas também todos aqueles que ali poderíamos projetar) de coisas para serem deslocadas, recontextualizadas e compartilhadas, a artista recusou a criação de uma forma única e intransferível de comunicação plástica e visou estatuir um espaço a ser dividido com o outro. Todos aqui são agentes da construção de uma reflexão que procura, na abertura para a alteridade, a extensão das fronteiras de arti culação e estruturação de uma linguagem plástica.
Talvez por estar ciente disso, a estratégia (excêntrica) de Carmela Gross foi abando nar qualquer intenção de mero comentário das relações entre as coisas, suas impor tâncias e significados, e analisar situações de valor semelhante. Aqui, a justaposição simultânea de objetos nos revela que, por meio da ligação entre partes em que não há consenso, podemos alcançar uma liberdade de pensamento baseada na mobili
100
dade da experiência – condição esta que, insisto, pode nos levar para além do nosso conhecimento e de nossas tentativas e expectativas individuais. Conforme acredito, relacionar-se com uma proposta assim é mais do que entender a sobreposição de coisas e contextos ou experimentar o sentimento de acúmulo que o trabalho incita; é, antes, uma abertura tropológica para o desligamento em relação ao ordenado e ao estabelecido, é como repousar sobre a insuficiência e observar a precipitação simultânea de muitas realidades. De resto, em conjectura derradeira, o trabalho de monstra um jogo de contaminação e experimentação e se apresenta como uma estrutura em contínua realimentação – pois, em sintonia, esse trabalho parece de monstrar que, mesmo dentro dos limites de nossa experiência cotidiana, de nosso choque ordinário com o mundo e por meio da experiência com a arte, não somos, ainda, capazes de entender, principalmente por tentarmos sempre conduzir nosso pensamento para o exato, os rejeitos de nossas expectativas, os espaços não preen chidos de nossos pensamentos.
Assim, sem muito mais o que acrescentar neste momento, somente espero que fique evidente no final desta excogitação que ela não guarda a intenção sub-reptícia de defender qualquer necessidade, ou vontade, de atacar a objetividade, o encadea mento lógico de ideias; mas, ao contrário, almeja nos ajudar a apostar firmemente no desdobramento de estratégias que nos possibilitem alcançar outros horizontes inte lectuais. Isso se justifica e se apresenta relevante no encerramento deste escrito so mente para deixar sublinhado, uma vez mais, que defendo aqui – e o que a instalação RODA GIGANTE me parece ajudar a demonstrar – que, nos desvios excêntricos dos pensamentos exatos e das autocertezas estabelecidas, talvez exista ainda a possibi lidade de desenvolvermos outras maneiras, modos diferentes de nos relacionarmos com a vida e, talvez, com a arte. Podemos, quem sabe, a partir dessa obra, considerar que possuir uma personalidade espiritual e desenvolver um raciocínio que não seja necessariamente orientado para a objetividade possa revelar-se como possibilidade de entendermos as coisas de maneiras distintas, de acreditarmos nas novas orienta ções que podem chegar. Por fim, só o que fica é, mais uma vez, a pergunta: sabe-se lá quantas coisas novas enxergaríamos, quantas coisas diferentes se fundamentariam intimamente se desenvolvêssemos, cada um de nós, de maneiras absolutamente par ticulares, estratégias excêntricas que nos dessem a capacidade, por alguns instantes que seja, de deixarmo-nos persuadir contra nossas crenças, de colocarmos parte de nossa consciência determinadas verdades tidas por nós como absolutas e tentar transformá-las, ampliá-las em novas e abertas convicções?
101
1.
CUMULUS CONGESTUS – SOMBRAS NO CHÃO
| EDSON LUIZ ANDRÉ DE SOUSA
“− a nossa solidão convulsa é a nossa sombra no chão nossa margem de erro: a sobra das coisas...”
Manoel Ricardo de Lima1
Cumulus congestus é uma das formas de nuvens classificadas no estágio baixo, que estão a 2 quilômetros da superfície. Essas nuvens são descritas como formações com bordas protuberantes no topo e considerável desenvolvimento vertical, indicando forte ascensão. Sua existência revela camadas profundas de instabilidade. Carmela Gross esboça em sua exposição RODA GIGANTE um pensamento sobre ascensão e queda, erupções vulcânicas da linguagem invadindo espaços esvaziados de palavra, cartografando inúmeras zonas de instabilidade. Suas estratégias artísticas entram como vapores inquietos pelas frestas da maquinaria da linguagem, dissolvendo ima gens-clichês, interpelando o signo, desvelando estratégias de poder, confrontando a forma em um movimento que poderíamos nomear como contra imagem. Essa afi nidade com as nuvens vem de longa data, pois, já em 1967, Carmela Gross elaborou o trabalho NUVENS, peças de madeira recortadas e pintadas com esmalte sintético azul. Como evoca Ana Maria Beluzzo, “envia nuvens ao chão, trazendo o impalpável ao alcance das mãos”.2 Se por um lado um pensamento nuvem indica lugares tran sitórios, frágeis e etéreos, por outro, esse mesmo espírito volátil indica movimento, força e desfaz uma ideia de mundo que volta sempre ao mesmo lugar. Fixar luga res sempre esteve em pauta na lógica do poder, instaurando realidades e tentando congelar os lugares de significação. Assim, o sentido que precisamos buscar será sempre aquele por vir, parcial, enigmático, incompleto. Nesse ponto, Carmela Gross se aproxima muito do Hamlet de William Shakespeare quando ele interpela Polônio em sua subserviência à palavra do Outro. Hamlet, apontando para as nuvens, diz a Polônio: “Estás vendo aquela nuvem ali, quase em forma de camelo?”. Polônio reage afirmando tratar-se efetivamente de um camelo. Mas, em seguida, Hamlet continua: “Pois me parece mais um esquilo”. Polônio o segue sempre servilmente: “É, tem a corcova de um esquilo”. Hamlet o provoca ainda mais: “Ou será uma baleia?”.3 Hamlet desvela, assim, um modo de relação parasita à linguagem e que lembra o espírito da servidão voluntária tão magistralmente dissecada por Etienne de la Boétie. O seu
2.
3.
77.
103
LIMA, Manoel Ricardo. Geografia Aérea. Rio de Janeiro: Editora 7 Letras, 2014.
BELLUZO, Ana Maria. Carmela Gross. São Paulo: Cosac & Naify, 2000, p. 10.
SHAKESPEARE, William. Hamlet. Tradução de Millôr Fernandes. Porto Alegre: L&PM, 1997, p.
ato de quebrar espelhos funciona como uma interpretação analítica, pois faz vacilar sentidos estabelecidos. Carmela Gross põe suas nuvens em movimento e sua expo sição nos obriga a percorrê-la como os treze passantes em seu vídeo de animação (2016), no qual cada um busca seu ponto de equilíbrio em uma gramática singular que sustente uma travessia no mundo. O tropeço de uma das figuras, que se des monta no espaço, nos indica um caminho possível. Estamos sempre tropeçando na linguagem e é a partir dessa queda que poderemos recolher os vapores de novas imagens. Precisamos, cada vez mais, de imagens que recuperem espaços de enigma, que nos coloquem diante de novas perguntas, acionando assim territórios de espe rança. Circunscrever nossas escuridões nos obriga a buscar a direção das raízes que nos sustentam não para reverenciá-las como heranças imutáveis, mas para podermos também abrir novos espaços de sustentação. Ernst Bloch inaugura sua clássica trilo gia Princípio Esperança, dedicada à reflexão sobre o lugar do pensamento utópico, com a afirmação contundente de que “pensar é transpor”.4 Sabemos bem que essas transposições não se fazem sem perturbação, pois, como evoca o poeta Rainer Maria Rilke, “a arte nada fez senão mostrar-nos a confusão na qual quase sempre nos en contramos. Ela nos inquietou, em vez de nos fazer silenciosos e calmos”.5
Na instalação RODA GIGANTE, que dá nome à exposição, o espectador é instigado, com seu olhar, a traçar linhas verticais no espaço, buscando nas extremidades das cordas os pontos de amarração. As linhas se tensionam com a força magnética dos objetos fora de lugar, em suas histórias de deriva e abandono e que parecem puxar as colunas para o chão. São muitas as narrativas condensadas nessa trama discursiva que tenta nos contar uma história dos restos, das margens, dos esquecimentos. O espaço recortado por fios desenha um mapa de linhas e me faz lembrar a definição de espaço feita por Milton Santos quando propõe pensar o espaço como um conjunto indisso ciável de sistemas de objetos e de sistemas de ações.6 Carmela Gross aciona, portan to, na visualidade dessas formas, gestos armazenados de esquecimento. Mas, para a artista, não é suficiente apontar esses lugares de abandono. Ela rasga o espaço para que possamos ver os figurantes que nem sempre aparecem. Temos, assim, um imenso memorial, uma espécie de melodia do mundo por meio de um inventário de objetos. Cada objeto instaura uma narrativa possível, um horizonte de imagens no espírito da consciência utópica blochiana que buscava enxergar bem longe, mas, no fundo, ape nas para atravessar a escuridão próxima do instante que acabou de ser vivido.7
Para poder ver os figurantes que surgem lentamente no plano de fundo das cenas do mundo é preciso escutar o ruído dos bastidores, recusar a fascinação imediata da pri meira imagem que se mostra e aguardar o tempo do que está no segundo plano. As
4. BLOCH, Ernst. O Princípio Esperança. Tradução de Nélio Schneider. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, 2005, p. 14.
5. RILKE, Rainer Maria. A melodia das coisas. Tradução de Claudia Cavalcanti. São Paulo: Estação Liberdade, 2011, p. 125.
6. SANTOS, Milton. A natureza do espaço. São Paulo: Editora Edusp, 2002, p. 21.
7. BLOCH, Ernst. Op. cit., p. 23.
104
sim surgem os FIGURANTES, um a um, que a artista recita visualmente com seu neon luminoso na cor vermelha, letra a letra. Lemos, dessa forma, o “18 de Brumário de Luís Bonaparte”, de Karl Marx, como o letreiro de um filme em que a história é feita pelos coadjuvantes: nulos, vagabundos, desertores, gatunos, trapaceiros, cafetões, catado res, trapeiros, traficantes, mendigos... Podemos imaginar essa linha contínua de pala vras como uma roda gigante horizontal, a qual coloca a pergunta sobre o que é uma leitura. Como poder ler a partir daquilo que está na sombra? Rilke, em um fragmento de seu texto O Testamento, chama a atenção, na pintura de Jan Van Eyck “Madona de Lucca”, para duas pequenas maçãs quase invisíveis no parapeito de uma janela e diz que gostaria de poder ser não uma das maçãs, mas sua “modesta sombra”.8 Carmela Gross busca circunscrever essas sombras e recolocá-las em cena.
Assim, o trabalho LUZ DEL FUEGO II nos apresenta os incêndios que ainda queimam e dos quais não nos aproximamos o suficiente para identificar a origem desse fogo, razão pela qual continuarão queimando. Testemunhamos atônitos inúmeras imagens de violência de Estado, tentando silenciar tantas revoltas legítimas. O vídeo recupe ra fotos de jornais de fevereiro de 2012 a novembro de 2016; conflitos na Líbia, na Síria, no Egito, na Palestina, em Israel, no México, bem como em outros países. Traz, também, confrontos nas ruas de Atenas, Roma, Santiago e em tantas outras, e ainda manifestações em inúmeras cidades brasileiras em junho de 2013. Cada imagem con ta uma história que me faz lembrar Jimmy Hendrix em sua canção de 1968 “Up from the skies”, em que evoca o “cheiro do mundo que queimou”.9 Mais do que nunca, precisamos retornar para perto dessas cinzas, buscar lê-las, para minimamente po dermos responder à provocação proposta por Jack London: “Como alguém poderia encontrar as palavras para descrever um pesadelo?”.10 A exposição Roda Gigante, de Carmela Gross, nos deixa algumas pistas.
8.
9. Agradeço a Carlo Pianta a lembrança dessa música no seminário que realizou na Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA), em abril de 2019.
10. LONDON, Jack. O pagão. Rio de Janeiro: Editora Dantes, 2000, p. 12.
105
RILKE, Rainer Maria. O testamento. Tradução de Tercio Redondo. São Paulo: Editora Globo, 2009, p. 139.
COMO FAZER O MUNDO RODAR
| TANIA RIVERA
Carmela Gross multiplica o olhar, corta o espaço, suspende o lugar e a significação de imagens e objetos.
Concebida especialmente para o Farol Santander de Porto Alegre, a instalação RODA GIGANTE é particularmente reveladora das complexas operações poéticas que a artista vem modulando, em meios e de modos variados, ao longo de mais de 50 anos. No átrio do prédio que outrora foi uma agência bancária, temos um conjunto de objetos diversos, como rodas de carro, botijões de gás, pilhas de livros e jornais, malas e sacolas diversas, correntes de ferro, caixas de madeira e isopor, pacotes, um saco de boxe e pesos, muitos pesos de ferro. Uma televisão, uma má quina de escrever, um troféu, panelas, três anões, uma Branca de Neve e animais em cimento poderiam remeter à ideia de entulho ou sucata. Porém a disposição é meticulosa e tudo está em bom estado, mesmo quando um pouco desgastado ou enferrujado. Não se trata de acumular dejetos, mas de realizar uma estranha ope ração de construção, como atestam baldes, tijolos, carrinhos, blocos e cilindros de ferro, sacos de brita e cimento e algumas latas de tinta.
O conjunto não destoa de nossa paisagem urbana cotidiana, que mistura com fre quência edificação e ruína, material e restos de construção. A rua, o exterior, toma o interior do prédio, e a cidade parece invadir a imponente arquitetura eclética do centro cultural. Mas isso não basta: RODA GIGANTE ata, com cordas de cores variadas e complexos nós de marinheiro, cada um dos objetos a um ponto do guar da-corpo ou das colunas do mezanino que os circunda, desenhando no espaço um emaranhado de traços que partem em muitas direções. Cada elemento pesa e se impõe no tensionamento com a arquitetura, enquanto meu olhar, pulando de um a outro, revira – faz rodar – o prédio, ao sabor da simplicidade de cada elemento comum, pondo em questão a relação entre nós, os lugares e as coisas – entre mim, cada lugar, cada coisa.
Na edificação imponente, cheia de curvas e ornatos, o traçado suspenso de linhas retas constrói entrecruzamentos que reverberam o X da obra de 1989, presente na galeria que circunda o átrio. Os raios-esculturas em ferro dessa obra, pregados na parede, aludem ao signo gráfico que habitualmente representa uma explosão. Os xis dos cruzamentos das cordas de RODA GIGANTE talvez também se expan dissem de repente, com uma força que lançaria aos ares a arquitetura e os objetos em seu interior. Ou, talvez, o peso de cada objeto fosse capaz de puxar violen tamente as colunas e o guarda-corpo, pondo abaixo paredes e teto, demolindo, assim, toda a construção.
107
Em meio a essa profunda, porém exata, desconstrução, à movimentação e singu larização que ela impinge ao meu olhar nessa espécie de desarquitetura, algo se destaca, subitamente, ao fundo: uma pequena escada. É como se ela desse uma piscadela para o espectador familiarizado com sua presença em diversas obras de Carmela, desde o desenho de ESCADA (1968) sobre um barranco, situado na periferia de São Paulo, cujo relevo, provavelmente talhado por máquinas pesadas, já formava degraus em ascensão. Nesse trabalho do início da carreira da artista, a escada se marcava, soberana, como uma espécie de arquitetura mínima a se cons truir entre natureza e representação, entre coisa e linguagem.
Tensionando esses dois polos, talvez toda a obra da artista consista em um gesto semiótico, preciso e sutil, que realiza a façanha de pôr em questão a representação, para suspendê-la em poesia. Transitando entre objeto e signo, a poética de Carmela é assim capaz de transformar o que já está lá – relevo, traço, objeto – em coisa de arte, ao mesmo tempo em que o mantém no mundo.
Para melhor explicitar esse ponto, voltemos à RODA GIGANTE. De repente, vemos tomar forma e se isolar do conjunto, tão subitamente quanto a escada, um elemento pouco frequente em nossa vida cotidiana, mas icônico na história da arte: um secador de garrafas que lembra um ouriço, com suas hastes de metal voltadas para cima (for mando traços que não deixam de dialogar com as cordas da instalação, diga-se de passagem). A artista se apropria, assim, de um dos primeiros ready-mades de Marcel Duchamp, o Porta-Garrafas, de 1914, para retomar, à sua maneira, o gesto de fazer de um objeto qualquer uma obra de arte, ao designá-lo como tal. Porém Gross age a contrapelo de tal elevação, fazendo o ready-made voltar a ser um mero secador de garrafas em meio a tantos outros objetos prosaicos dessa instalação. A operação é notável e poderia denominar-se contra ready-made. Ou, talvez, forçando a expressão inglesa a aceitar um neologismo, ready-dismade. Mas ela vai além: não apenas critica e desfaz o lugar do objeto de arte, como ataca o estatuto de qualquer objeto. Arte ou utensílio doméstico, em si mesmo ele não é grande coisa, se não se ligar – com cordas explícitas ou por linhas invisíveis, linhas de linguagem – a outros elementos da arquitetura do mundo, e, assim, tomar lugar em uma cena complexa e prestes a se pôr em movimento, como uma roda gigante.
O dispositivo que aqui tento destrinchar, a duras penas e sem dúvida de manei ra insuficiente, é absolutamente vertiginoso e, no entanto, mantém uma elegância ímpar. De seu vigor conceitual podemos tentar extrair algumas lições, parciais e fragmentadas, pessoais e provisórias. Tentarei esboçar algumas delas.
1. O olhar, assim como o desenho, consiste em um conjunto de traços.
A perspectiva artificialis já o demonstrava, sistematizando a ordem da representa ção de modo a revelar que o mundo nunca corresponde à natureza empírica, mas é sempre fato de linguagem, artifício. Cada olhar segue traçados já dados, porém
108
pode, em sua singularidade, redesenhá-los, transformando a cena do mundo e alte rando os protocolos de significação convencionais. Convocado pelos agenciamen tos semióticos da artista, meu olhar pode tornar-se um motor que a faz girar.
Um dos modos possíveis de agenciamento consiste em fazer com que o traço ne gue a neutralidade da superfície (como em ESCADA) para se dar diretamente na cena do mundo, transitando e mantendo uma tensão entre ambos. Em uma ope ração análoga, também uma palavra pode tornar-se, ao mesmo tempo, signo e objeto a se inscrever na cidade, negando a parede de museu na qual se encontra. Ou, ainda, retas de elástico tensionado na parede formando desenhos geométricos (que talvez declinem a arquitetura mínima da escada) podem saltar da superfície para se tornarem MONUMENTOS (2001) – emergindo para a tridimensionalidade e o mundo cultural por força desse título, mas também do fato de que desafiam a escala humana, sendo maiores do que o tamanho que me permitiria vê-las integral mente dispostas na parede, em perspectiva.
Na vigorosa exploração das próprias condições de construção de toda represen tação realizada por Carmela, pode-se ainda destruir a mimese, revelando que cada imagem não se faz sobre uma tabula rasa, mas provém de outras imagens já dadas (como as ilustrações presentes em enciclopédias, por exemplo), que se podem ma nipular até que seja aniquilada sua relação com o referente. De meio de reprodução, a gravura torna-se, assim, nos QUASARES (1983) de Gross, formas poéticas aber tas, nas quais pulsa a “pura” potência de significação, digamos.
Ao retomar, criticar e explorar de maneiras diversas as condições básicas da cons trução de signos e da cena na qual eles se apresentam, Carmela talvez refaça, a cada obra, o gesto preciso pelo qual os/as artistas pré-históricos faziam suas pinturas –sempre em jogo com as cores e o relevo das paredes das cavernas, assimilando-as ao que lá já estava (assim como a ESCADA de 1968, para insistir nesse ponto). Do traço ao mundo e do mundo ao traço, desenhos, objetos, esculturas e instalações da artista são sempre inscrições, no sentido forte do termo. Inscrições com as quais nos deparamos como uma pintura rupestre, como algo que nos é endereçado e nos incita a rever mundo e linguagem, que nos convida a reconstruí-los poeticamente, como promete, por exemplo, o belo PROJETO PARA A CONSTRUÇÃO DE UM CÉU, de 1981. (Devemos, talvez, olhar para cima e subir, convidados pelas escadas de Carmela. E, para tal ascensão, provavelmente, precisaremos de pelo menos uma ASA, 1995. Ou, talvez, já tenhamos caído, e a ASA seja uma espécie de monumento dessa queda, na medida em que a leveza de seu tecido é desfeita pelo betume que o reveste.)
2. Não existe superfície.
Ou: diante de uma superfície, trata-se de torná-la viva.
O X (1989) traçado com ferro sobre a parede, ao qual já me referi como alusão ao signo gráfico de explosão, também poderia ser tomado como gesto básico de ins
109
crição, de marcação de um lugar, como aquele em que eu me encontro, diante de um mapa do local. Ou poderia servir de referência para que se iniciem os trabalhos de representação ou cartografia, estabelecendo o ponto de fuga da perspectiva e da posição do olho que lhe corresponderia, fora do quadro. Carmela, porém, espaça e enviesa seus raios, de modo a desestabilizar seu trajeto e salientar o vazio central de onde partem. Em vez de servir de ponto de origem para o estabelecimento de um espaço imaginário da representação – da janela aberta sobre o mundo que a perspectiva mimetizaria –, o traço multiplica-se e expande-se, a empurrar para o mundo traço e letra, escultura e objeto. Ele rompe a parede para criar espaço, fa zendo surgir uma cena mínima, digamos, nada além de um gérmen de cena. O que ela apresenta e me lança como convite é nada menos que a própria potência bruta de linguagem e construção de mundo.
Ou melhor seria dizer, talvez, que se trata da letra X – que também denota uma incógnita e um signo de indeterminação, é bom lembrar –, e de movimentá-la e instabilizá-la como conjunto de traços. Ela pode, então, tornar-se gente, como os 13 PASSANTES da animação de 2016. Desenhados com simples traços de fita iso lante, seus personagens tomam vida em um gestual preciso, que os caracteriza a caminhar, cada um, em absoluta singularidade. Um deles tropeça e se ergue no vamente; outro é capaz de derrubar um grande traço, triunfante. Com tais gestos simples, porém belos, como coreografias cotidianas, tomam a dianteira da cena do mundo os FIGURANTES – como aqueles nomeados por Marx como degenera dos, vagabundos, traficantes, prostitutas, tocadores de realejo etc., retomados por Carmela em obra do mesmo ano, em painel de LED que os inscreve letra a letra, fazendo a eles se dobrar o próprio alfabeto, a linguagem e, sobretudo, nossa leitura.
Nessa linha de reflexão, podemos também considerar cada escrita em neon ou grandes letras que parodiam a linguagem publicitária como um x, uma inscrição instauradora que Gross realiza na cidade de modo a marcar nela seu lugar, ao mes mo tempo em que torna o espaço urbano uma superfície infinita, uma volumosa caverna na qual se misturam coisas, língua e gente. As inscrições em neon AURORA (2003), LUZIA (2004) e EU SOU DOLORES (2002) trazem nomes de mulheres que também são verbos ou substantivos (no caso da última, mulher e dor confundem -se, em espanhol). Algumas delas estão no interior de uma arquitetura, mas podem ser vistas de fora, ao menos parcialmente. Essas mulheres não são exatamente pes soas, mas acontecimentos humanos, palavras e imagens que quebram as paredes e gritam – ao modo da estratégia de marketing e, eventualmente, empregando a intensidade da luz e da cor vermelha.
Entretanto, essas mulheres-acontecimentos gritam outra coisa que não a mercado ria a ser consumida. Afinal, “pessoas reais são perigosas”, como afirma no mezanino do Farol Santander, em inglês, a obra projetada em 2008, que não pôde ser plena mente montada na ocasião, pois as duas últimas palavras foram interditadas pela organização do evento que teve lugar na Nova Zelândia, em episódio que confirma
110
a força do trabalho em fazer das letras, pessoas (e perigosas!). Elas poderiam aqui gritar, eventualmente, a palavra SUL (de 2002, na versão em gravuras), em afirma ção geopolítica. E na confusa cena da pólis – na modernidade periférica, desloca da, que tem seu “norte” em um “sul” sempre inacabado, que é promessa ou tarefa sempre a se construir –, de repente, em meio a tudo isso, à violência que sempre espreita, ao fogo que sempre pode subitamente queimar (como revela LUZ DEL FUEGO II, 2018), poderia também passar uma NEGRA (1997) sem rosto, de formas vaporosas e deslizantes, em seu tule preto e sua escala que, pouco acima da nossa, faz dela um estranho monumento, apesar das rodinhas e do suporte que poderiam nos convidar a levá-la a passear pela cidade.
3. Para terminar: a cena nunca está lá.
Ela se faz em agenciamentos poéticos muito precisos, com signos, objetos e gente; com inscrições, luz e gestos, na cidade, nos prédios; dentro ou fora, ou melhor, pas sando do interior ao exterior, do espaço institucional à cidade, da arte à vida e vi ce-versa. Por isso, ela é tão exata quanto incomensurável – pois se alastra para fora de si mesma, relacionando-se de forma muito complexa com o mundo e a história, e se reconstrói a cada olhar, diante de traços, objetos ou imagens que a capturem e ponham em movimento.
Ela é um acontecimento.
Além disso, e fundamentalmente, é necessário assinalar que algo nela se oculta. Como em A CARGA, de 1968, algo fica por debaixo dos panos, construindo uma espécie de dobra na cena. Nela pulsa uma tragédia que não cessa de se repetir, re sistindo a qualquer representação – no entanto, ao mesmo tempo, ela não passa de sua superfície, mera lona de caminhão, com cesuras que são como belos bordados.
Cabe à arte tornar material tal pulsação – e nos chamar, diante dela, hoje, a tomar posição.
111
ENTREVISTA CARMELA GROSS
EM POUCAS PALAVRAS, RODA GIGANTE TRATA DE QUÊ?
RODA GIGANTE é uma instalação concebida especialmente para o espaço interno do Farol Santander de Porto Alegre. Trata-se de um conjunto de cerca de 300 objetos que serão dispostos no chão do saguão principal do edifício. Cada um dos objetos será amarrado, por meio de cordas, ao alto das colunas e dos balaústres. Assim, todo o vão livre será ocupado pelas cordas entrecruzadas em muitas direções, criando visualmente uma espécie de trama irregular de muitas cores e espessuras variáveis.
COMO ESTÁ SENDO O PROCESSO DE CRIAÇÃO DE RODA GIGANTE? COMO A IDEIA SURGIU? É POSSÍVEL LOCALIZAR UM MOMENTO DISPARADOR DA IDEIA? QUAL FOI SEU PRIMEIRO PASSO APÓS A IDEIA?
Para mim, RODA GIGANTE tem um sentido experimental, de obra em processo, cuja armação e cuja construção vão ainda passar por muitas etapas, vários ajustes, por pesquisas de materiais e soluções técnicas e operacionais de diferentes ordens. Em poucas palavras, RODA GIGANTE está em processo de elaboração e acho que esse processo vai se estender até a abertura da exposição ou talvez até depois dela. É um canteiro de obras.
COMO RODA GIGANTE SE RELACIONA COM O MOMENTO ATUAL DO BRASIL OU DO MUNDO?
RODA GIGANTE tem a ver com a precariedade da vida nas grandes cidades, seja de seus habitantes, seja daqueles que moram nas ruas. O morador de rua ou o vendedor ambulante, por exemplo, tem que improvisar jeitos de viver, inventar um habitar nômade e incerto a cada dia, entre coisas achadas, objetos e móveis descartados, e recombiná-los num equilíbrio frágil num vão qualquer da rua, encostados a um muro ou embaixo de um viaduto.
CONSIDERANDO OS OBJETOS QUE VOCÊ TEM ELEGIDO PARA COMPOR A INSTALAÇÃO, QUAIS SÃO ELES E QUAIS AS RAZÕES DAS SUAS ESCOLHAS? PARA VOCÊ, QUAL O PERCURSO DE UM OBJETO ATÉ SE TRANSFORMAR EM OBRA DE ARTE?
Os objetos ainda estão sendo procurados em ferros-velhos, em depósitos de coisas usadas ou abandonadas – borracheiros, oficinas mecânicas, lojas de materiais de construção etc. Talvez a característica comum deles seja o volume opaco, de dimensões médias e pequenas, massa pesada e condensada, de modo a tensionar as cordas no vão do edifício. Mas eles não têm nada de especial, no sentido de belo ou encantador, pelo contrário,
112
são objetos que nos são indiferentes ou sem utilidade, fora de uso ou obsoletos, que podem ser reconhecidos como fragmentos de um todo ausente, brutos, de cor indefinida, rústicos, falsos, utensílios banais para trabalhos desvalorizados, como baldes, tambores, trouxas, peças mecânicas, contrapesos, enfim, uma monstruosa coleção de mercadorias baratas.
HÁ UMA OU MAIS OBRAS SUAS COM AS QUAIS RODA GIGANTE SE RELACIONE DE FORMA MAIS ÍNTIMA?
Todo o meu trabalho como artista procura pensar o mundo de modo crítico e avançar nas questões políticas e sociais do meu tempo. É certo que os trabalhos já realizados, em diferentes momentos da minha trajetória, não se parecem entre si, não têm uma unidade formal reconhecível de imediato. O princípio formador deverá ser buscado não na forma, na aparência, mas no sentido deles, para onde eles apontam – para fora deles, para a realidade. Assim, RODA GIGANTE conversa de perto com SE VENDE, com US CARA FUGIU CORRENDO, EU SOU DOLORES, A NEGRA, A CARGA, MIGRANTES, HOTEL e FIGURANTES, entre outros.
A IMAGEM DE UMA RODA GIGANTE, EM PRINCÍPIO, É POSITIVA, LÚDICA, PODE REMEMORAR A
INFÂNCIA. QUE OUTRAS ATRIBUIÇÕES PODEMOS DESCOBRIR COM A SUA RODA GIGANTE?
Sim, uma roda gigante pode evocar um sentido lúdico e encantatório, inscrito no seu próprio nome e mesmo na sua designação em outras línguas: “wonder wheel”, roda da maravilha, em inglês, e “rueda de la fortuna”, roda da fortuna, em espanhol. Com suas luzes coloridas e seu movimento giratório, rodas gigantes estão situadas, quase sempre, em parques de diversão, junto com tantas outras atrações que estimulam o sonho e a imaginação próprios da infância. Mas, ela pode ser vista, também, como uma engrenagem que promete movimento, com seu mecanismo giratório, mas que não sai do lugar e só faz oscilar, repetindo e repetindo infinitamente o mesmo, ora em cima, ora embaixo, de modo hipnótico e vazio. O título aponta para um lugar encantado, mas o que está expresso no âmbito material da exposição convoca o espectador a uma reflexão crítica, a uma dialética do olhar.
É POSSÍVEL QUE O PÚBLICO SE RECONHEÇA NA RODA GIGANTE? EM RELAÇÃO A QUE ASPECTO?
Não há como se reconhecer neste trabalho. RODA GIGANTE não se mostra como espelho identitário, talvez mesmo não se preste a selfies. RODA GIGANTE só carrega nas tintas daquilo que se vê todos os dias, nas grandes cidades do mundo.
113
CRONOLOGIA SELECIONADA
1966
II Encontro Universitário de Artes Plásticas, São Paulo - 1º Prêmio, Escultura.
2º Salão de Arte Contemporânea de Campinas, São Paulo. Uma das criadoras do grupo Arte na praça – atividades com crianças em praças públicas. Praça Dom José Gaspar, São Paulo, entre 1966 e 1971.
1967
IX Bienal Internacional de São Paulo.
6 Artistas, Rex Gallery & Sons, São Paulo.
1968
IV Salão de Arte Moderna do Distrito Federal, Brasília, DF. Bandeiras na Praça General Osório, Rio de Janeiro. Intervenção Escada, desenho em um barranco da periferia de São Paulo.
Participação no Projeto do Pavilhão do Brasil, de Paulo Mendes da Rocha, Feira Internacional de Osaka, Japão.
1969
X Bienal Internacional de São Paulo.
II Bienal Nacional de Artes Plásticas, Salvador, BahiaMenção Honrosa. Gradua-se no Curso para Formação de Professores de Desenho da Fundação Armando Álvares Penteado, São Paulo.
1970
4ª Exposição Jovem Arte Contemporânea, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo - Prêmio Aquisição.
6º Salão de Arte Contemporânea,
Museu de Arte Contemporânea de Campinas, São Paulo –Prêmio Aquisição.
1972
Professora do Curso de Artes Plásticas da Universidade de São Paulo. Atividade desenvolvida até hoje.
1977
Desenhos, Gabinete de Artes Gráficas, São Paulo. Vídeo Mac, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
1978
Carimbos, Gabinete de Artes Gráficas, São Paulo.
Objeto na Arte - Brasil anos 60, Museu de Arte Brasileira, Fundação Armando Álvares Penteado, São Paulo.
Livro de Artistas, Gabinete de Artes Gráficas, São Paulo. Vídeo-Arte, Museu da Imagem e do Som, São Paulo. Exposição de Gravuras, Cooperativa de Artistas Plásticos, São Paulo.
1979
I Mostra do Desenho Brasileiro, Museu de Arte do Paraná, Curitiba, Paraná - Prêmio Aquisição.
O Desenho Como Instrumento, Cooperativa de Artistas Plásticos, Pinacoteca do Estado de São Paulo.
Multimedia Internacional, Escola de Comunicações e Artes –Universidade de São Paulo.
O Artista e a Criança, Pinacoteca do Estado de São Paulo.
1980
Carimbos, Espaço N.O., Porto
Alegre, Rio Grande do Sul. Gerox, Pinacoteca do Estado de São Paulo.
1981
XVI Bienal Internacional de São Paulo.
Bienal Americana de Artes Gráficas, Cali, Colômbia.
Arte Pesquisa, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo. Exposição de Heliografias, Pinacoteca do Estado de São Paulo. Obtém o título de Mestre em Artes pela Universidade de São Paulo.
Professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Escola de Belas Artes, entre 1981 e 1984.
1982
Projeto Para a Construção de um Céu, Brazilian-American Cultural Institute, Washington, DC.
Arte Micro, Museu da Imagem e do Som, São Paulo.
Arte pelo Telefone, Museu da Imagem e do Som, São Paulo.
1983
Quasares, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Quasares, Centro Cultural São Paulo.
XVII Bienal Internacional de São Paulo.
6a Bienal de Valparaiso, Chile. Arte na Rua I, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
1984
Pinturas, Montagens, Cartazes, Galeria Luisa Strina, São Paulo. Galeria Zona, Florença, Itália.
114
Tradição e Ruptura, Fundação Bienal de São Paulo.
Poesia Evidência, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo.
O Desenho Brasileiro, Fundação Cândido Mendes, Rio de Janeiro.
1985
Caligrafias e Escrituras, Galeria Sergio Milliet, Funarte, Rio de Janeiro.
Arte Tecnologia, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
Novos Meios/Multimeios - Brasil 70/80, Museu de Arte Brasileira, Fundação Armando Álvares Penteado, São Paulo.
1986
Quasares, Espaço LatinoAmericano, Paris, França.
Pinturas, Galeria Luisa Strina, São Paulo.
Projeto Vermelho - Proggetto Rosso, Museu de Arte Brasileira, Fundação Armando Álvares Penteado, São Paulo.
XX/XXI - Uma Virada no Século, Pinacoteca do Estado de São Paulo.
1987
Pintura-desenho, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
A Trama do Gosto, Fundação Bienal de São Paulo.
Obtém o título de Doutor em Artes pela Universidade de São Paulo.
1988
Pintura-objeto, Museu de Arte do Rio Grande do Sul.
Pintura-objeto, Galeria São Paulo, São Paulo.
1989
Objetos Bestas, Galeria Espaço Capital, Brasília, DF.
XX Bienal Internacional de São Paulo.
1990
Objetos, Galeria São Paulo, São Paulo.
Latinoamerica Presente, Museo Nacional de Bellas Artes, Santiago, Chile.
Panorama da Arte Atual Brasileira, Museu de Arte Moderna, São Paulo.
Gente de Fibra, Sesc Pompeia, São Paulo.
Prêmio Brasília de Artes Plásticas, Museu de Arte de Brasília, DF.
1991
Latin-American Drawings Today, San Diego Museum of Art, Califórnia.
Panorama da Arte Atual Brasileira, Museu de Arte Moderna de São Paulo.
2a Exposição Internacional Esculturas Efêmeras, Fundação Demócrito Rocha, Fortaleza, Ceará.
O Que Faz Você AgoraGeração 60, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
Prêmio Bolsa Vitae de Artes Plásticas, São Paulo. Figurinos da ópera A Queda da Casa de Usher, de Philip Glass. Fundação Cultural São Luiz, São Paulo.
1992
Desenhos, MASP - Museu de Arte de São Paulo. Pinturas, Galeria São Paulo, São Paulo. Instalação, Museu de Arte da
Cidade - Capela do Morumbi, São Paulo.
Arte Brasileira na Coleção: Anos 70/90, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
O Branco Dominante, Galeria São Paulo, São Paulo.
1993
Hélices, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Hélices, Galeria de Arte da Universidade Federal Fluminense, Niterói.
Outdoors/Exposição Comemorativa do Centenário de Mário de Andrade, Centro Cultural São Paulo, São Paulo.
Um Olhar sobre Joseph Beuys, Museu de Arte de Brasília, DF. Figurinos e cenário do espetáculo A Dança dos Duplos, de Eduardo Seincman e Sílvia Bittencourt. Anfiteatro de Convenções Camargo Guarnieri, São Paulo.
1994
Facas, Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro.
Facas, European Ceramic Work Centre, s’Hertogenbosch, Holanda.
Larvas, Galeria Ido Finotti, Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais.
Arte-Cidade - A Cidade Sem Janelas, antigo Matadouro Municipal, São Paulo.
Bienal Brasil Século XX, Fundação Bienal de São Paulo. Cenário-vídeo da ópera Espaços Habitados, de Conrado Silva. Teatro Sérgio Cardoso, São Paulo.
1995
Carmela Gross, Gabinete de Arte
115
Raquel Arnaud, São Paulo.
Facas, Museu de Arte Moderna de São Paulo.
V Bienal Nacional de Santos, Santos, São Paulo.
II Bienal de Barro de América, Museo de Arte Contemporáneo de Caracas Sofía Ímber, Venezuela.
Garner Tullis Workshop, Museu de Arte Moderna de São Paulo.
XI Mostra da Gravura de Curitiba, Fundação Cultural de Curitiba, Paraná.
1996
United Artists II - Utopia, Casa das Rosas, São Paulo.
Beelden uit Brazilie, Stedelijk Museum Schiedam, Holanda. Projeto Contato, Sesc, São Paulo.
IV Studio de Tecnologias de Imagens, Sesc Pompeia, São Paulo.
1997
Feche a porta e Projeto para a construção de um céu, Centro Cultural São Paulo. Diversidade da Escultura Brasileira Contemporânea, Itaú Cultural, São Paulo. Re-Aligning Vision-Alternative Currents in South American Drawing, El Museo del Barrio, NY.
1998
300 Desenhos, Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
XXIV Bienal Internacional de São Paulo
30ª Anual de Arte, Museu de Arte Brasileira, Fundação Armando Álvares Penteado.
A Gravura da LinguagemPensar Gráfico, Paço Imperial, Rio de Janeiro.
1999
Em vão, Oficina Cultural Oswald de Andrade, São Paulo.
Comedor de luz, Gabinete de Arte Raquel Arnaud, São Paulo. Projéteis, Paço das Artes, São Paulo.
Por que Duchamp?, Paço das Artes, São Paulo.
De Brasil - Alquimias e Processos, Biblioteca Luis Ángel Arango, Bogotá, Colômbia.
Território Expandido - Prêmio Multicultural Estadão, Sesc Pompeia, São Paulo.
2000
Alagados, Centro Universitário Maria Antonia, São Paulo.
Us Cara Fugiu Correndo, Museu de Arte Moderna de São Paulo.
O Trabalho do Artista, Itaú Cultural, São Paulo.
Brasil + 500 – Mostra do Redescobrimento, Fundação Bienal de São Paulo. Situações – Arte Brasileira/Anos 70, Fundação Casa França-Brasil, Rio de Janeiro.
2001
Projeto Fronteiras, Itaú Cultural, São Paulo. Intervenção permanente Fronteira, Fonte, Foz, Laguna, Santa Catarina. Monumentos e Alagados, Celma Albuquerque Galeria de Arte, Belo Horizonte, Minas Gerais.
II Mostra do Programa de Exposições 2001, Centro Cultural São Paulo.
Anos 70: Trajetórias, Itaú Cultural, São Paulo.
Trajetória da Luz na Arte Brasileira, Itaú Cultural, São Paulo.
Experiment Experiência/Art in Brazil 1958–2000, Museum of
Modern Art Oxford, Reino Unido. Politicas de la Diferencia – Arte Iberoamericano fin de siglo, Centro de Convenções, Recife, Pernambuco.
O Espírito da Nossa Época –Coleção Dulce e João Figueiredo Ferraz, Museu de Arte Moderna de São Paulo.
2002
ArteCidadeZonaLeste, Sesc Belenzinho, São Paulo.
XXV Bienal Internacional de São Paulo. Matéria-Prima, Museu Oscar Niemeyer, Curitiba, Paraná. Caminhos do Contemporâneo –1952/2002, Paço Imperial, Rio de Janeiro.
Genius Locchi, Centro Universitário Maria Antonia, São Paulo.
Nefelibatas, Museu de Arte Moderna de São Paulo. Ceará Redescobre o Brasil, Museu de Arte Contemporânea do Dragão do Mar, Fortaleza, Ceará.
2003
Carmela Gross, Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, Recife, Pernambuco. Hotel Balsa, Gabinete de Arte Raquel Arnaud, São Paulo. Atelier Finep, Paço Imperial do Rio de Janeiro.
Interfaces Contemporâneas, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo. A Subversão dos Meios, Itaú Cultural, São Paulo. Imagética, Fundação Cultural de Curitiba, Paraná.
2004
Intervenção permanente BleuJauneRougeRouge, École
116
René Binet, Paris, França
Aurora, Galeria Olido, Secretaria Municipal de Cultura, São Paulo. Luzia, Centro Universitário Senac, São Paulo.
Arte Contemporânea no Acervo Municipal, Centro Cultural São Paulo.
2005
5ª Bienal do Mercosul.
Intervenção permanente Cascata, Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
Karakoy Pedestrian Exhibition 2, Istambul, Turquia. L’Autre Amerique. Art Contemporain du Brésil, Passage de Retz, Paris, França.
2006
Intervenção permanente Araucária, Curitiba, Paraná. Carne, Projeto Arte Passageira, Centro Universitário Maria Antonia, São Paulo.
O Fotógrafo, Sesc Ribeirão Preto, São Paulo.
Sul, Instituto Tomie Ohtake, São Paulo.
Paralela 2006, Pavilhão Armando Arruda Pereira, Parque do Ibirapuera. Manobras Radicais, Centro Cultural Banco do Brasil, São Paulo.
MAM [na] OCA, Pavilhão Oca, Parque do Ibirapuera, São Paulo.
2007
Uma Casa, Gabinete de Arte Raquel Arnaud, São Paulo.
II Bienal de Arte Contemporânea, Moscou, Rússia.
Encuentro entre dos Mares: Bienal São Paulo-Valencia, Valência, Espanha.
2008
Se vende, Matadero Madrid - Centro de Creación Contemporánea, Madri, Espanha. SCAPE 2008, Christchurch Biennal of Art in Public Space, Nova Zelândia.
Alguns Aspectos do Desenho Contemporâneo, Sesc Pinheiros, São Paulo.
Arte Contemporânea Brasileira, Estação Pinacoteca, São Paulo.
2009
Arte à Mão Armada, Galeria Cilindro, Praça Clementino Procópio, Campina Grande, Paraíba.
Os Mágicos Olhos das Américas, Museu Afro Brasil, São Paulo. 5a Bienal Vento Sul, Curitiba, Paraná.
2010
Carmela Gross – Um Corpo de Ideias, Estação Pinacoteca, São Paulo.
2011
Arte no Brasil - Uma história na Pinacoteca de São Paulo, Pinacoteca do Estado de São Paulo.
Europália, Centre de la Gravure et de l’Image imprimée, Bruxelas, Bélgica.
Zona Letal, Espaço Vital, Museu de Arte Contemporânea de Elvas, Portugal. =748.600, Paço das Artes, São Paulo.
Premio Bravo! de melhor exposição - Carmela Gross –Um Corpo de Ideias, Estação Pinacoteca, São Paulo.
2012
Serpentes, Galeria Vermelho,
São Paulo. Escadas, Projeto Vão, Sesc Belenzinho, São Paulo.
La Carga, Museo Experimental El Eco, Ciudad de México, México. Arte de contradicciones. Pop, realismos y política. Brasil –Argentina 1960, Fundación Proa, Buenos Aires, Argentina.
Percursos Contemporâneos, Museu de Arte Contemporânea de Sorocaba. Mário - Eu sou um Tupi Tangendo um Alaúde, Museu Afro Brasil, São Paulo.
2013 Escadas, Casa França-Brasil, Rio de Janeiro.
30x Bienal, Transformações na arte brasileira da 1a à 30a edição, Pavilhão da Bienal, São Paulo. Universo Poliédrico, MuVIM - Museo Valenciano de la Ilustración y la Modernidad, Valencia, Espanha. América do Sul, A Pop Arte das Contradições, Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro. Escavar o futuro, Palácio das Artes, Belo Horizonte, Minas Gerais.
Visible Differences, The Jordan National Gallery of Fine Arts, Amman, Jordânia.
2014 Migrantes, Museu de Arte Moderna de São Paulo. Experimentando Espaços 2, Museu da Casa Brasileira, São Paulo.
A serpente no imaginário artístico, Museu Afro Brasil, São Paulo.
Sentido em deriva – Obras da coleção da Caixa Geral de Depósitos, Culturgest, Porto,
117
Portugal.
Selections from the Museum’s Collection: Modern and Contemporary Art, The Museum of Fine Arts, Houston, Estados Unidos.
2015
Contingent Beauty: Contemporary Art from Latin America, The Museum of Fine Arts, Houston, Estados Unidos. Matéria do Mundo: Projeto Arte e Indústria, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
2016
Arte à Mão Armada, Museu da Cidade – Chácara Lane, São Paulo.
Um, Nenhum, Muitos, Galeria Vermelho, São Paulo.
Brazil, Beleza, Museum Beelden aan Zee, Den Haag, Holanda. The winter of our discontent, Galerie Martin Janda, Viena, Áustria.
2017
O Fotógrafo, Kunsthalle Bratislava, Eslováquia Grande Hotel. Instalação permanente, Sesc 24 de Maio, São Paulo.
Yoko Ono: o céu ainda é azul, você sabe..., Instituto Tomie Ohtake, São Paulo. Pedra no Céu – arte e a arquitetura de Paulo Mendes da Rocha, Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia, São Paulo. Osso - Exposição-apelo ao amplo direito de defesa de Rafael Braga, Instituto Tomie
Ohtake, São Paulo. Modos de Ver o Brasil: Itaú Cultural 30 Anos, Pavilhão Oca, São Paulo.
Radical Women: Latin American Art, 1960–1985, Hammer Museum, Los Angeles.
On anam? (¿Where are we going?), Es Baluard Museu d’Art Modern i Contemporani de Palma, Palma de Maiorca, Espanha.
Past/Future/Present: Contemporary Brazilian Art from the Museum of Modern Art of São Paulo, Phoenix Art Museum, EUA.
Radical Women: Latin American Art, 1960-1985, Hammer Museum, Los Angeles, EUA.
2018
Real People Are Dangerous, Auroras, São Paulo. Brasile. Il coltello nella carne, Padiglione d’Arte Contemporanea, Milão, Itália. Mulheres Radicais: Arte Latino-Americana, 1960-1985, Pinacoteca de São Paulo, São Paulo.
O tridimensional na Coleção Marcos Amaro, Fundação Marcos Amaro, Itu, São Paulo. Invenção de Origem, Estação Pinacoteca, São Paulo.
2019
Passado/Futuro/Presente: Arte contemporânea brasileira no acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu de Arte Moderna, São Paulo.
Da tradição à experimentação, Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
COLEÇÕES PÚBLICAS
Acervo Sesc de Arte Brasileira, São Paulo, Brasil
Biblioteca Luis Ángel Arango, Bogotá, Colômbia Coleção de Arte da Cidade de São Paulo, Brasil
Coleção Instituto Figueiredo Ferraz, São Paulo, Brasil
Culturgest – Caixa Geral de Depósitos, Lisboa, Portugal
Fundação Padre Anchieta –Rádio e Televisão Cultura, São Paulo, Brasil
Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, Brasil
Museu de Arte Contemporânea de Campinas, São Paulo, Brasil
Museu de Arte de Brasília, DF, Brasil
Museu de Arte do Paraná, Curitiba, Brasil
Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, Recife, Brasil
Museu de Arte Moderna de São Paulo, Brasil
Museum of Fine Arts, Houston, EUA Museum of Modern Art, Nova York, EUA
Pinacoteca do Estado de São Paulo, Brasil
118
ENGLISH VERSIONS
119
With a style of a multimedia nature that deals directly with the tension between colloquialism and scholarly discipline, Carmela Gross is certainly one of the country’s most restless and inspiring artists. Reflecting a unique ability to capture impressions and codes from very different circumstances, her efforts are revealed by means of multiple spheres –covering a range of activities that embrace from exhibitions held in institutional facilities to urban actions of a temporary or permanent nature.
In this inaugural exhibition, Carmela Gross prepared a groundbreaking work of art. Named the FERRIS WHEEL, this installation of monumental dimensions evokes the notion of weights, counterweights and anchoring in order to give rise to thoughts on the precariousness of life in large cities. With curator Paulo Miyada as invited speaker, the exhibition also includes a panorama of works by the artist in recent years.
It is with a sampling of such dimensions that Farol Santander opens its doors to the city of Porto Alegre, making available facilities with the purpose of encouraging new and creative connections and of providing unprecedented opportunities in culture, entrepreneurship and leisure.
| Patrícia Audi Executive Vice President for Communications, Marketing, Institutional Relations and Sustainability
beams and other elements that integrate the urban infra scenery. Now, connected to architecture, these objects earn the scene, taking on the role of ballast of the design, which runs through space.
Ropes and objects mark the movement of the public that enters the exhibition and runs through the lobby. The perception of space is still altered by the amber lighting the artist adds to the light that comes through the stained glass windows. The environment is familiar, but it seems out of the ordinary time-space.
SPINNING IN THE AIR, SPINNING IN PLACE
| Paulo Miyada
1. FERRIS WHEEL
The subtitle of this exhibition was borrowed from the new installation designed by Carmela Gross for the central span of the building that houses Farol Santander in Porto Alegre. Originally built to house a sumptuous bank branch, the building has an ambiance of large dimensions crowned by zenith stained glass windows in which we read words such as Exchange, Progress, Work and Fortune. Under these currencies that once worked simultaneously as goal and promise, Carmela now weaves an environment that, like the mesmerizing Ferris wheels, suggests movement, tension, and suspension: hundreds of strings are tied to the balustrades and columns of the upper story of the building and cross through the large span in a tangle of diagonals; each one of these strings is attached to a prosaic object, which for some reason usually go unnoticed in our daily life, caught only by a side glance that rarely notices tires, piles of books, buckets,
Is it then a virtual, imaginary space? A Ferris wheel entertaining with its illusion of mobility, spinning and turning yet still in its place? One could argue that the entire building had already been built to give substance to abstract concepts: money and its earnings and interest, or Credit, Economy, and Justice (which are other words among the ones etched in its stained glass). It is possible to go further and remember how entire cities have become histrionic paraphernalia that challenges our attention while the substrates that actually move it remain hidden from our sight. It is possible to go further and remember how our cities have become a paraphernalia that challenges our attention while the substrates that actually move them remain hidden from our eyes. Or we can even say that global society operates as a spectacle of images and speculations in which values have lost their tangibility long ago. But one can only wonder, because, as far as an objective reality, the work is really nothing else than things and strings and weights in balance – nothing moves besides wandering thoughts that are inspired by the wandering of the body among oblique lines.
2. Dematerialization
The notes on conceptual art made between 1966 and 1972 by American critic and writer Lucy Lippard1 synthesize the tone of a broad debate about the “dematerialization of the work of art” within the framework of conceptual art. Lippard recorded the common points she employed in assembling her conceptual art panorama without suggesting too narrow a definition of the term:
“Conceptual Art, for me, means the work in which the Idea is sovereign, and the material form is secondary, light, ephemeral, cheap, unpretentious and/or ‘dematerialized’ (...) for lack of a better term I continued to refer to a process of dematerialization, or a downgrading of its material aspects (originality, permanence, decorative attractiveness)”.2
In fact, the 1960s and 1970s – during which Carmela Gross lived her studies and her first years as a teacher and artist
120
sss
– were permeated by initiatives aimed at unraveling the artistic value of plastic parameters rooted in the know-how of traditional painting, engraving and sculpture languages, which went on to conceive works that exist and circulate as ideas, information, communication and concept, often with precarious or ephemeral character.
To think of this art as a dematerialized expression, however, leads us to a panorama full of paradoxes and mirages. One of the problems is that, even when it does not result in durable, storable and transportable material objects, art does not cease to behave as if it were material – concepts, even when not anchored in an object body, are shaped, sculpted, saved; they exist.
Another problem, however, lies in the parallelism of the debate about the dematerialization of art with the phenomenon of the dematerialization of financial capital that happened throughout the twentieth century and culminated in the early 1970s, when the United States unilaterally broke the Bretton Woods agreement on international economic management, ending the convertibility of the dollar to gold and thereby ridding the currencies of their final concrete ballast freeing them to the frenzied territory of financial speculation. Dematerialization of art may seem like a minor detail or even an involuntary side effect before the immeasurable impacts of dematerialization of the economy.
Nevertheless, the effects of the financialization of the economy, multiplied hundreds or thousands of times in the last 50 years, have taught us that behind the apparent demateriality there is a kind of super materiality. I’ll explain: As values are released from concrete physical ballasts, nothing else can belong exclusively to the field of ideas, abstractions or information: everything becomes as profitable, exchangeable, accumulable and speculative as a gold bar or a farm, including shares of “future oil barrels”, the potential for renewal of the ozone layer and all sorts of privileged information. The considerable vertigo in the face of the frenzied movements of a stock market – once illustrated by the distressed and robotic gaze of the operators piled on Wall Street and now abstracted by electronic impulses of billions of digital exchanges – is the perfect metaphor for a less “dematerialized” and more “super materialized” age. That is, what would seem by far a transcendence of the realm of objects and concrete raw materials reveals itself, at a closer look, as a grounding that brings to the common ground of materials what was supposed to be aerial, conceptual or abstract.3
3. Ballast
“Art is this: to think about building critically within language (...) to always produce a reverse side”.4
Carmela Gross did not design FERRIS WHEEL installation because of the considerations I present. Her creative process, by the way, is rarely born out of a theoretical discourse fixed in advance. In the beginning, there is the trace, the drawing that seizes the space and throws it in a new configuration. First, there is a kind of observation drawing of the city and the surrounding society, which the artist nourishes in her constant observation of the contemporary dynamics of exchange, oppression, circulation and conflict.
Which “observation drawing” is this? How does it work in the conception of FERRIS WHEEL? And then, to what extent does this lead to reflection on the materiality, demateriality, and super materiality of contemporary society?
Well, we need to proceed step by step.
An example. In 1968, Carmela Gross and some of the friends she made in the undergraduate course in Arts5 followed Professor Flávio Motta suggestion and traveled through what was then the outskirts of São Paulo, studying the paintings and manual signs made by craftsmen who spontaneously created a vernacular local pictorial language. At one point, the artist decided to intervene in a cliff created by the gradual and unplanned urbanization of the growing southeast axis of the city. She traced quickly the design of a ladder with a spray of black paint. It was a graphical redundancy that would happen as the body climbed the steps of the stepped topography of the terrain.
This scrawled line with the whole body is a drawing of observation of the city, which apprehends the outline of one of its particularities and explains it as a project applied to the urban space itself. Carmela Gross exercises observation/ projection operations in many other works from the last five decades. In some of them, such as STAIRS (1968) and I AM DOLORES (2002/2016), it is like a fold that returns to the city landscape. In others, as in THE LOAD (1968), MONUMENTS (2001), 13 PASSERS-BY (2016) and EXTRAS (2016)6, the cycle is completed in the exhibition space as a twofold city elaborated in the field of language.
It is in this last group of works that one can analyze the installation FERRIS WHEEL. The selection of the hundreds of objects that occupy the central span of the building presupposes constant attention to the city and specifically to the somewhat functional elements that integrate it, without calling attention to themselves – not monuments and billboards, but the micro infrastructures of daily life. Together, they form an unbelievable list, from suitcases to improvised pieces of concrete to prevent entry of vehicles. Together, they are a crowd. And this crowd moves through space, anchoring the massive symbolic architecture of power and stability. It is not the balusters and columns that
121
support the objects (already firmly resting on the floor), but the objects that support the tension of the ropes that are multiplied in the air. There artist’s observation is also there, as she perceives that the whole contemporary symbolic apparatus presents itself as if it was the very thing that sustains life, nevertheless it is life itself (of objects and people) that, in fact, feeds power and its symbolisms.
The artist advances up to this point: she perceives a structuring aspect of reality when she does a projective drawing that will eventually absorb the viewer, their body, attention and fantasy. From that point on, it is up to us, the publics7, to launch ourselves in the hand-to-hand connection with the work and enjoy its unique way of linking ideas and materials to reflect on what has prevented us from perceiving what Carmela Gross perceived, and see what this tells about us, about language and about the world. In my case, the proliferation of lines of force linking the old bank building to commonplace objects, under keywords of progress and in the midst of an unusual red lighting, makes me think of the transformations of materiality in the era of dematerialization of art and economy.
4. How to design a shape
At some point, after crossing the unsaturated spaces by ropes and objects arranged at the central hall of the building, the visitor flows from the installation to the lateral fringe of the space, where the ceiling height is lower and the red lighting is not as bright. That’s where we find the works produced between 1968 and 2019. The intention was to create a board of pieces that come and go between the procedures of design, project and synthesis recurrent in Carmela Gross career. Particular attention is given to the ways in which visual opacities can be constructed, producing holes, shapes, and volumes of uncertain content, alluding somewhat directly to the aspects of life and the city usually obscured and understood as cognitive debris.
In both spheres, of life and the city, everything that we can not or do not want to see may at some point emerge as an obstacle, an enigma or a threat.
The two works that coordinate this board (and they were not listed by chance from the beginning to integrate this selection) are THE LOAD and THE BLACK WOMAN (1997).
In the first, a large gray-green canvas covers a large metal structure. In the English language, one could say that it is a “bulky” object - in Portuguese, it is necessary to add a few words: something large, spacious, that seems to be always in the way. With 2.5 meters high and 3 meters x 5 meters long, it is something larger than us but a bit low and small to be a home.8 It’s like a room that can only be seen from the outside, or like a waste container left behind. Another metaphor: it
is the goat (the elephant) in the center of the room, which imposes its premeditated uncomfortable presence while its content remains unknown, a treasure or an indeterminable threat.9 On the other hand, in THE BLACK WOMAN, initially conceived as urban mobile sculpture able to circulate through the central space of Avenida Paulista, the artist covers a metallic structure of 3.3 meters in height with an abundant black tulle that configures an indistinct and irreducible silhouette in its excess. Designed to circulate among skyscrapers, automobiles, pedestrians, signs and billboards of the most famous avenue in the largest metropolis in the country, THE BLACK WOMAN does not aim to be another communicating icon desiring attention. It is an emptiness, a moving blind spot in the landscape. It is an allegory of the part of the city that cannot be grasped by statistics, surveillance devices, opinion polls, demographic profiles. A cave where what the apparatuses of power do not make a point of seeing fits, but that can abruptly surprise them.10
As a constitutive thought, THE LOAD can be seen in the creation of MONUMENTS of Carmela Gross, also included in the exhibition. They are geometric schemes defined by elastic lines attached to the wall – hollow outlines of some symbolism that happens in hiatus. The concretion of THE BLACK WOMAN is anticipated by QUASARS (1983). The artist selected 11 illustrations from sales catalogs, various almanacs and encyclopedias and subjected them to multiple processes of technical reproduction of images (photocopy, photographic enlargement, off-set printing), enlarging them and blurring their outlines until they lost their readability and became constructed figures.11
There is a projective thought embedded in this graphic treatment that transforms an image into a figure, which, in turn, also echoes in the shapes of X (1989) and WING (1995) – two ghostly presences infiltrating space, transforming the gestural imprecision of the shape drawn into masses of unequivocal materiality.
5. SOUTH
Carmela Gross exhibition adds other words to the key words translated by the zenithal stained glass of the building, coming from the lexicon itself. A 3-meter wide neon announces in bold letters (outlined by the artist’s trace): SOUTH. It is a geographical coordinate, but also a symbolic north, excuse me for my playing on words. The work highlights with its light the place from which the artist speaks, often treated as synonymous of economic, political and cultural dependence.12 The peripheral state is thus challenged by the linguistic emphasis, which is repeated in the led sign EXTRAS (2016). On this led luminous sign slide the “professions” originally enumerated by Karl Marx in the description of
122
the lumpenproletariat (the proletariat in rags), hoarded by Napoleon III in his ridiculous mischievous revolution: decadent, degenerate heirs, social climbers, crooks, exonerated soldiers, ex-prisoners, deserters, gamblers, pick pocketers, jugglers, pimps, brothel owners, goods carriers, writers, barrel organ players, rag pickers, scissors grinders, tinkers, beggars, beggars and traffickers.
For Marx13, the marginal precariousness of this multitude of unemployed Bohemians prevented the formation of their class consciousness, leaving it susceptible to reactionary mythomanias that would eventually go against their own interests. For Carmela Gross, this historical background also acts as metonymy of the portion of the cities we choose not to see, with their objects, bodies and lives been constantly ignored by all planning and progress.
In this exhibition, therefore, the luminous sign constantly refers to the human equivalent of the mass of cognitive remains gathered by FERRIS WHEEL. The vicissitudes of this crowd are also underlined by the animation 13 PASSERS-BY (2016), with their anonymous characters who walk, stumble and flick over a checkered mesh, while their inherent disruptive violence is evoked by the video LUZ DEL FUEGO II (2018), with its flow-from-destruction, tragedy and cataclysm.14
With these works, the exhibition emphasizes the sociopolitical sense always evident in Carmela Gross production.15 The way is therefore open to the final act of the show two floors above.
6. TRUE FAKE PEOPLE
It is not by chance that, when they go up to the modern hall built on the historical building occupied by Farol Santander, the visitor finds the installation REAL PEOPLE/ ARE DANGEROUS, partially made in 2008 and now installed for the first time in its integral form and dimension.16 292 red lamps are articulated by the artist in this work to form two large hanging panels. Crossing the gap in the width of the hall, it is possible to complete the sentence that reminds us that real people are dangerous, or that there are dangerous real people.
Who are the real people? Or, who would be the liars, false or unreal people? These are questions that every visitor will have to take with them.
1. LIPPARD, Lucy. Six Years: The dematerialization of the art object from 1966 to 1972. Los Angeles: California Press, 1997 (ed. or. 1973).
2. Op. cit., page vii and page 5. Free translation by author.
3. This passage talks about some ideas I mention previously on the essay “Yoko Ono: The art of instructions in the era of algorithms”, published on Yoko Ono: The sky is blue, you know... Curator: Gunnar B. Kvan [english translation: Julia Lima]. São Paulo: Institute Tomie Ohtake, 2017.
4. Carmela Gross in a Master Class at Escola Entrópica, February 21, 2019, at Tomie Ohtake Institute.
5. This undergraduate course precedes the model that was later implemented and is still current (with many adaptations) up to this day. At the time, it followed the pedagogical proposal implemented by Professor Flávio Motta in 1956, as an adaptation of the Drawing Teachers Course, implemented at São Paulo Art Museum (MASP) in 1953.
6. They are all included in this exhibition. They will be discussed more in detail further down.
7. This is a subject for another occasion, but I would like to stress the importance of understanding critics and curators as part of the public, albeit in a very dedicated and specialized position. I believe the critic is a variation of the spectator, rather than a paraphrase of the artist.
8. Except for the tends made straight on sidewalks, which holds a lot of meaning.
9. From a historical point of view, it should be emphasized that this is a work carried out in 1968, in the imminence of Institutional Act Number 5, which aggravated the repressive policy of the Brazilian military dictatorship in force since 1964. In that context, every unknown person was socially perceived as a threat to the regime, a subversive possibility and, simultaneously, as a risk of State violence.
10. For a more extensive reading of THE BLACK WOMAN, see my essay “The geographer, the bad reviewer and the speleologist”, In: FREITAS, Douglas of (org.). Carmela Gross. São Paulo: Cobogó, 2018.
11. In the essay quoted in the previous note, I drafted an interpretation of the title of this series of print: “Carmela Gross named them QUASARS, the largest emitters of energy in the universe, larger than stars and smaller than galaxies, whose definition was still in dispute at that time. / It seems pertinent that this powerful and mysterious cosmic fact lent its name as an introduction to the strange figures laboriously constructed by the artist. But this should not prevent a question from being asked: What actually makes these images so magnetic? It cannot be the simple absence of referentiality, after all, there are many occasional smudges and blots that have no obvious meaning and do not attract the eye for more than an instant. One hypothesis is that the centrality of the shadows on the paper, their movement (never complete) towards symmetry, and the high definition of their print, make the figure, no matter how indefinite, be identified as something constructed, produced with a purpose: drawn”.
12. In addition to rhetorical arguments, art and visual poetry rely on visual emphases as transformers of the meaning of a sign. In the case of SOUTH (2019), the sum of corrugated parallel traces transposed into neon makes the word a resonance field that expands through space. In another work of 2002, Carmela Gross prints the letters S – U – L on three sheets. In them, what is seen is the result of innumerable grooves made by a dry pointed object on the metal engraving plate. The fine insistent and convulsive lines grow into thick ones that convert subtlety into power, frailty into imposition.
13. In the famous essay, written in the heat of the moment, “The Eighteen Brumaire of Louis Bonaparte” (1852).
14. In these two videos, the constitutive operation is done by the juxtaposition of images: in the first, as a succession of frames of simple dolls made with black adhesive tape on the pages of a notebook; in the second, as interpolation of dozens of photographs taken from printed media.
15. It is important to emphasize that the linearity of the text forces a thematic and formal progression through the works on display, but all the assembly, taking advantage of the architecture of the space, privileged the concatenation of a non-linear space, one in which the pairs presented here actually occur by cross diagonals between different coordinates. That’s why it was mention previously that these works make up a “board”.
16. The original proposal of this work was given in the urban art project “SCAPE” (2008), also known as “Christchurch Biennial of Art in Public Space”. The intervention would occupy two walkways, but, due to the concerns of the New Zealand organizers, only the first half of the work was made and installed.
123
EXCENTRIC STRATEGIES
| André Severo
Here is a painful idea: that, beyond a given precise moment in time, history would have ceased to be real. Without realizing it, the totality of the human race would suddenly be removed from reality. Since then, everything that has happened would have ceased to be true, but we could not be able to realize it. Our task and our duty would now be to find out this turning point, and whenever we could not do so, we would have to persevere in the present destruction.
Elias Canetti
Means we have developed to achieve something; way of obtaining something; skill, cunning, cleverness, getting around difficulties: strategy. Object is every material thing that can be perceived by the senses; it is the cause, the motive, the feeling attached to an action; it is the subject matter of an area of knowledge; it is fate, objective, motive, justification, purpose; and it is also commodity, item, consumer product, thing. In Fatal Strategies, Jean Baudrillard ponders a problem that even today, perhaps more than ever, is set against contemporary man: that of knowing how to relate to the world, to space, to objects, to things that surround us and are in constant change. We feel hostage to objects, obese in relation to space, displaced in a world with which our relationship can no longer be thought in terms of absolute radicality.
When questioning the existence of strategies that would enable us to have a better relationship with this reality, which seems to set in motion a process of liberation a cut of the umbilical cord that links it to the human being, Baudrillard raises a hypothesis: what if, tired of the dialectic of meaning, things, objects, they had found a way to escape? In his considerations, the French sociologist, philosopher, photographer and poet (who in his work has always invited us to keep the flame of nonconformism alive – the motor that drives man – in search of a future that would not come to astonish us), the way to do this would reside in the tropological possibility of objects, things, proliferate to the infinite, potentializing themselves, overcoming their essence in an escalation to the extremes, in an obscenity that would serve them henceforward of immanent purpose and senseless reason.
Taken as a metaphor for expanding our perspective on the effects of the fragmentation of the subject in the world and the need to construct new strategies for coexistence with differences, I believe that Baudrillard’s hypothesis suggests at least a means for us to try circumvent the evidence that, even today, the apparent rationality of our
actions continues to invade all things. It is a fact that even in a time of transition – when we are on the brink of uniqueness (when all the transformations from the last million years are to be overcome by the changes that will occur in the next fifteen minutes) –, we are still constantly settling into our everyday life the desire to be more and more exact, to see more and more an objective sense for our motivations. It seems that even in a context in which artificial intelligence is about to surpass the human (and perhaps even become indistinguishable), we continue to try to rationalize life, make it more effective and specialized. But at the same time, we see a growing inability to imagine what direction we will follow, what direction we will take when we have everything understood, examined, organized, classified, transformed into standards and norms of behavior – something that nonetheless seems to be increasingly impractical to occur.
We are aware that the way we see ourselves, the others, the things and the world in which we are inscribed change daily; and that even the contexts of what immediately surrounds us (and which we believe to be stable instances) are in permanent transformation. For us it is also a sure thing that we try to be as open as possible to new experiences, to different ways of thinking and relating to reality however, the simple fact of living the transition and yet getting involved with the rational side of our activities makes us appear to be far from reaching our deepest existential goals and objectives. By this I mean that it is not surprising that even at a time when the so-called heterodox logic (such as diffuse logic, intuitionist logic, or even the paraconsistent logic of the Brazilian mathematician Newton da Costa) dismantle some pillars of classic logic – such as the principle of contradiction, for instance –, we are still unaccustomed to non-standard reasoning and it seems that for every somewhat more open thought we can develop, there is always a counterpart objective thought; for every free inclination we have, there is an opposing functional one. But are we really capable, or rather, is there actually a need to continue to evaluate things only in a practical way, to form judgment, to always find some objective sense in what we observe, experience, or accomplish?
On the basis of these inquiries, as well as the image of the artistic installation, which is the immediate context for this essay, perhaps it would be the case to think: what if these objects, which, – in Baudrillard’s conjecture, could proliferate to infinity, – were not any objects? Or rather, if the things that were already tired of the dialectic of meaning (and which, by their very obsolescence, would already be the ones that would be able to escape it) were not the objects we cling to throughout life, not were the things to which we attribute value; but the remains, the remnants of all that we actually pay attention to in the most ordinary course of our existential journey? Such a conjecture, in addition to the more
124
obvious consideration of what these objects might reveal about ourselves and our actions in the world, nevertheless, leads me to repeat here some of the wonderings I had in similar contexts of speculation – namely: in what we would base our conviction, sense of duty, or the need of our moral action if we did not always take into account our appeals to an absolute? What would be the immediate results of our direct involvement with things, thoughts, and situations we usually put aside our experiences? How can we know what can, in fact, be understood today as rational and understandable? What is the use of this or that action? What is the result of our creative clash with things and the world (and what about this encounter)? And finally, considering the immediate circumstance of writing this article, what is the relation between the artist’s propositions, the place where the art is presented, and the true involvement (if it’s at all desired) with its spectator or participant?
Without any immediate answer to none of these questions (which, I believe, could all be replaced only by a more comprehensive inquiry into what would really ground human dignity and determination but the fact that every human being is a person open to something higher and greater than themselves, or at least different from them), I justify that they are related here only to point out, once again, that – even in an Anthropos social context in which a new concept of human being is considered about to emerge – every intuition, every nonfunctional action, every nomadic thought, every unorthodox logic continues to find motives to be rejected or condemned by the intellect (as well as their more structured opposites, to be defended and exalted). Moreover, it seems to us that there is nothing new about the fact that we generally do not perceive any of this, for we change so constantly, so rapidly, that we often do not even complete an unpretentious movement, an imprecise thought, a dubious foreboding before we engage right away in its opposite – leaving out the experiences we might have with what lies between the poles of this reasoning. There is no delusion or condemnation here. I think, however, that it is perhaps among these equivalents, in the interval of these opposing aspects, that the dynamism of our thought oscillates; or rather, our ability to abandon the preconceptions of common sense and seek a new understanding of everything around us.
In other words: for sure we can never expect to attain total clarity on the most important issues related to our vital, essential and existential aspects. But my point here is whether it would not be the case at this moment in time to question not only the consequences of our rational actions, the effects of our functional activities and what we admit and achieve from a practical situation, but rather about the surplus, the excess, what remains after we withdraw what we seem to consider necessary or most important
from an action or situation, in other words, what do we reject throughout our ordinary encounter with the world? Since it is impossible for us to live only in an exact way (and considering that we cannot yet be certain of the imminence of the advent of singularity – which, in evolutionary terms, considers that the present stage of development of the human race is far from being the last or definitive one – it will unite the human to the machinic), perhaps it is finally the moment (maybe even our last chance) to worry about the imminent data, to potentialize our creativity and our intuition, to surrender ourselves to experiences with art and to trigger our spiritual intelligence.
This would be, I believe, the mental effect of the deviation of what is external to the center; however, in addition to the complements (which would actually be necessary) for the support of these arguments, I think it is worth saying that I am aware of the epistemological currents that postulate that the universe is not effectively dialectical; of the philosophies that support the idea that we are all doomed not to balance but to extremes; of the theories which assert that we are condemned to radical antagonism and not to reconciliation or synthesis. However, as a counterpoint, I may consider that these seem to me to be principles which express themselves, precisely, not in the ecstatic form, but in the inactiveness of the pure object, the concentric and not the eccentric, the orthodox principles and the things that, enclosed in an internal polarity, no longer relate to what is different, with another. Having said that, I think that the possibility of adjustment, if there is any, may be, as Baudrillard suspected (though his mean of speculation would also invariably lead him to extremes), not in polarities neither in syntheses, but in obtaining subtle forms of radicalization of the secret qualities to combat the deleterious through the power of the superlative and the eccentric union of causes and effects: not opposing the visible to the concealed –seeking the secret; not contrasting what is fixed to what is mobile –, seeking the metamorphosis; not antagonizing the beautiful before the ugly – trying to understand the coarse; not distinguishing the true from the false – accepting the illusion and perceiving imminence.
I believe there is a radical difference between this path (which, in the final analysis, is nothing more than the road of living with art and the way of creativity and intuition) and the objectifying methods of orthodox logic, proverbial epistemologies, or even the adages of technoscience; nevertheless, the eccentric strategy here would simply be to assert that the way to what is not experienced, to what sails smoothly by our primeval expectations, still configures the most fertile fields to plant the seeds of unorthodox reasoning, a sensible logic, an intuitive action, an actionthought that not only accepts and obeys the norms of functionality or productivity and that – nevertheless – brings
125
us closer to an experience that does not need to show itself rigidly oriented in one direction or another in order to be valid or gain visibility.
From the utopia, which on the horizon of philosophy of history constituted a necessary meta-historical horizon – a metatemporal ulteriority – there remains, on the contrary, something that insists profoundly on time, on the very structure of time, and that is the present that we carry within us. This is not the present that dies, which is extinguished because it is swallowed up by the past or ceases to be because it is already future. Utopia, in this sense, is an intimate experience of temporality, and therefore does not imply putting oneself outside or beyond, it does not evoke transcendence, but rather establish itself on this side, in the inner side of the world.
Ferruccio Masini
Current time; what happens or has its beginning in the present; what inhabited or had its beginning at the same time; something or someone who was part of the same period of time; something or someone who enrolls, unquestionably, in the present: contemporary. As Giorgio Agamben ponders in his essay What is the Contemporary?, the poet, the artist, must keep his gaze fixed in his time. Wondering what would actually see the one who sees his time –perhaps the demented smile of their own century? – the Italian philosopher proposes something he calls a second definition of contemporaneity: contemporary would be the one who would keep the gaze fixed in their time in order to perceive not the lights, but the darkness. Considering that, for Agamben, the contemporary that can be seen in the temporality of the present is always a comeback – it never ceases to repeat itself – and, just like poetry and art, it can never establish an origin; and, nevertheless, for this author all times are (for those experiencing their contemporaneity) obscure, – contemporary would be only the one who has the courage to face this obscurity, the one who is able to see the non-lived in what is lived, who can perceive an inapprehensible threshold between a going to be and a has-been, and understand the present as being at once immemorial and prehistoric.
Without attempting or having to impute an immediate embargo, I begin to consider – from a particular understanding (or, maybe to be more precise, from a misunderstanding) – the postulations of this thinker, whose production focuses on the relations between philosophy, literature, poetry, and politics – but which at the same time strives to maintain its conjectures based on a slight difference, a minimum displacement of things between the profane world and the messianic world – which would definitely not be contemporaneous, the one who forces
entrance through the door of a new and eternal world – the post-historical world –, but rather the one who, regardless of the tools at his disposal or the way he uses his insight into the real, manages to maintain things exactly (or almost exactly) as they are, – although a little out of place. In other words, contemporary would be, in this perspective, the one who pursues a vertiginous sensation of truth in the fractures, in the splits of time; the one who transcends the aesthetic form in the ecstatic form of unconditional metamorphosis; the one who delves into the themes and pulls them to their objective causes to deliver them to the power of the triggering effects; the one who, finally, can go against the acceleration of channels and circuits, the one who acts in slowness – not the nostalgic sluggishness of the spirit, but the immobility before the possibility of distension – in the eccentric, in the bad writing, in the absolute sudden or, simply, in what Baudrillard would call the radicalization of the secret qualities.
Contemporary, therefore, would be the poet, the artist who, I believe, is the one (perhaps the only one left in the current cultural, political and Anthropos social context in which we stand) that still manages to make inertia or silence strategies for action and communication. Contemporary would therefore be the one who can emulate the mental effect of the catastrophe from the verticality of his surrender to creative research and investigation – but without suffering, without calamity, without the disastrous consequences of the dreadful factual. Contemporary is thus the one who accepts the wandering consciousness, the drifting of senses, the crisscrossing of boundaries; the one who, against general transparency (and without accelerating a death and indifference sentence), wants to summons things to regain their meaning. Contemporary is still one who does not seek to erase the real for the benefit of the imaginary, but the one who craves for the paraphrase of reality; the one who realizes that in the current context there is no more transcendence and what is left of it is no more than the immanent surface of the unfolding of operations and communication; the one who understands that the present contemporaneity can conceive has, from the outset, a split horizon (and that it is exactly at the breaking point of this horizon that we find our balance). Contemporary is, ultimately and without a shadow of a doubt, the artist who faces what is real and, without uncharacterizing it, infers a subtle change; contemporary is the poet who can stop things – before they come to an end – and keep them like this, at the distinction of imminence, at the moment of suspension of its own appearance.
Without further details of recognition, I would justify that these postulations stick out now, because, as I believe, what artistic investigation ultimately seems to offer us is rather an occasion to reflect on the experience that we live when faced with a materialized thought in a certain place and
126
moment. After all, this is what makes an artist contemporary – and I am not referring here, obviously, to any artist (since I do not intend to focus on artists who, even with a work consolidated by the current circulation system, seem to be in a state of anomie, least of all those who, in order to keep their careers in evidence, simply obey the agreements of contemporary visual grammar) – but rather to those artists who make their movement in the field of investigation with art a crusade of existential, political, cultural, social and human pondering. I am, in short, trying to reflect on that artist who seeks, in his own way, to unleash the sense of functionality we normally apply to our usual experiences and expectations; one who effectively understands the need for objects to abandon the dialectic of the senses (and therefore often only engages with spaces, objects or situations when he/she realizes that for some reason this space, this object, this situation is not doomed to be something which remains – when he/she perceives conjunctures that have been put aside from our everyday experience or attention). And there is again a crucial point right there, since, as I believe, for this artist (the poet, the contemporary), the realities and everyday circumstances, awakened by a strong intuition that are hardly deceived, is what ignite his curiosity – what is not noticed, what is perceived with lack of interest, the disapproved, the rejected, the despised, the degradations of certain situations is what may reveal itself suddenly, for this artist, as the most favorable terrain for a particular investigation on our trickle existence.
But there too, there is a secret, because, in my point of view, the fluidity of the creative process is the essence of an experience of operating in reality; an operation that easily takes on the variety of conditions inherent to the world, altering them, minimally, precisely by the interrelation of circumstances that accompanies each fact or situation. In this sense, the artist who connects his creative imagination to urban contexts, for example, and uses reciprocal links between art and life as potential creative elements of a conceptual reflection (of aesthetic language characterized by a great spatial mastery, but also, many times, by an intentionally reduced construction at the structural level) produces something that arises not only from a belief in form, but from a methodical consequence which seeks to discover elements that are determinant for life, and in life itself, and to fix them in mundane manifestations and existential reflections determined by a total engaging in the unfolding of his creative thinking. This artist, who normally does not seem to believe in an art space, or at least does not seem to believe in a space where art presents itself disconnected from life, from human experience and even from the everyday situation, bets in a aerated reflection, free of procedural and institutional defects. Consequently, the consecutive development of his art work is not the one that occurs at leaps and bounds, because this artist
is someone who works, invariably, without a safety net, who prefers transitions and who always moves through different territories, repealing, rendering ineffective, constantly abrogating everything he/she has already done and employing something else in its place – hence why their inquiries often echo beyond the field of art and circulate freely in other speculative terrains.
With this in perspective, we could also consider that the essential elements in the artistic investigation of any artist should be, therefore, the change of contexts and procedures and the abandonment of the certainties instituted –elements that can acquire a special meaning in their creative process, mainly because they favor disconnection in relation to established situations. I mean, for me, any movement in the artistic field should configure a noteworthy instance of experimentation – but not in the sense that the artist does not produce complete or complex works, since the completeness and complexity of artistic investigations reveal themselves (or should reveal themselves, I think), first of all, in an exercise of approaching certain experience, engaging in it, perceiving it, experiencing it, before it can be fully assimilated. That is, in my opinion, the practice of art should invariably constitute an investigation that does not deny its experimental character of clash, confrontation and exchange of knowledge, because, as far as I believe I understand the phenomena of elaboration of creative reasoning, I can affirm that work that does not negate its characteristic of experimentation is always a powerful one – since it has a necessary quality for the development of any creative and reflective thought (be it artistic or not): that is, not to worry about emphasizing a procedure or a poetic wantonly, except in the sense of bringing to the fore, to call attention to a restlessness, to release something in which the artist believes or perceives as relevant to enhance the discussion he or she proposes.
Nevertheless, I support that this is also emphasized, since, in my opinion, what makes artistic propositions more than a collection of materials, a mere formal game of seduction, is precisely the artist’s ability to open a thought, to produce language and to offer differentiated and infinite operations of their inquiries. I also think that the very availability of art to constitute itself as a space for existential reflection, a field of encounter of human questions, would be enough to give meaning to this movement – especially for being, I believe, in the field of artistic reflection where we can more easily detach ourselves from the logical reasoning, restore our mobility of thought, and open ourselves to the impermanence of things. By discussing through their work the ways of presenting art, by breaking individual cloisters, overcoming the limits of identity balances, and by opening themselves to the impermanence of things, the artist (the contemporary) demonstrates concern that their
127
investigation (and hence their proposition), in any form or in any place, is not reduced to mere formal or material game, but rather stick to the dynamism and strength of human exchanges, to objective and subjective relationships that broaden the freedom of our thoughts and the individual and societal relationships we keep.
I wonder if maybe success (or perhaps, mainly failure) on achieving an artist’s propositions that views art investigation this way may even demonstrate that art definitely does not require standardized exhibition spaces, uniform models of demonstration, or rather, exclusive environments where artistic thoughts can be inserted and presented. What exists is, at most, particular ways each artist interprets and spatializes the problems, to incorporate them and to return them to the world as reflections, possibility of communication or reciprocity of relations. By engaging in situations rejected by ordinary thinking and through a genuine interest in situations where there is definitely disagreement, the artist delves into the questions about the modes of presenting an aesthetic thought and seeks to achieve the untold reasons behind worldly experiences. Keeping his eyes fixed in his time, perceiving within reality not the lights, but darkness, working with the possibility of going beyond the imposition of values towards the mystery of human questioning or of our true encounter with the world, the artist becomes, effectively, contemporary – maybe only to reveal to us (or remind us once again) of the importance of trying, even if eventually, to use eccentric strategies to find something in the antitheses of our thoughts and thus broaden, as much as we can, our sensitive and intellectual horizons.
Any history, tale, biography, is inscribed in the temporalization of one’s own presence. In the encounter with the other, which is always an encounter with time (even in the cone of shadow of suffering), man is constituted each time as author of his own text of life. In the lived experience of his owns biography, the articulations of temporality, new alchemies, are again jeopardized, and through them or at the end of them an unprecedented, unforeseen history may arise, no longer only a reconstitution of the past, but a history inscribed in the future, which has already started to be written in the present.
Mauro Maldonato
Not concentric; which does not fit into standards; which acts in a strange or unusual way; who thinks extravagantly; which distances or strays from the center; which is located outside the center or does not have nor share centrality. In a reality where we see the pace of technological change occurring faster and faster (and causing such profound impacts on human life), we cannot avoid thinking that the decisive mutations
of objects and the contemporary social context – which seem to have also stemmed from a trend towards formal and operational abstraction (of elements and roles) – has contributed to their homogenization in the current switch to virtual. Baudrillard, as we have seen, when thinking about how things would escape from the dialectic of meaning, and the possibility of objects enhancing themselves, going beyond their essence and proliferating to infinity, pondered that everything that was once determined as object by a subject represents to the latter a virtual threat of death. He also considered that the object does not accept its forced objectivity more than a slave accepts its servitude; that the subject (who can have no more than an imaginary domain, however ephemeral, over the object) will not escape from his resurrection, and that the only revolution things will go through will never be in their dialectical success, but in their ecstatic enhancement.
These are undoubtedly striking considerations (so striking that I have endeavored to follow through on the impact they have had on me since the first reading); however, thinking a bit more carefully on these speculations and contrasting them with the image of FERRIS WHEEL installation, Carmela Gross – the primeval motor of this reflection –, it has also just occurred to me (it would be more correct to say it has just crossed me) the reminisce of another sentence, elaborated in A Subversão do Ser, by Mauro Maldonato: “Who knows how to constitute objects does not fear the emptiness of them; who knows how to see forms does not fear the formless, neither fear the appearance of absurdity nor the concealment of meanings”. With this statement in mind (and thinking again about man’s relationship with the world, with space and with things that surround them in a state of permanent mutation), I finally realized that, in the final balance, the individual experience of each of us is, at the same time, the only subject and the sole object of our becoming. And this consideration – which may seem primary to some – has likewise made me understand (something that may also seem somewhat obvious) that ordinary objects have a crucial difference from those produced in the context of artistic investigation – because, contrary to the former (material things are apt to be understood in their concreteness and by their functionality – or even by the loss of that functionality), the latter are not (never could and cannot ever be), effectively anything besides tropologies.
Just like the links between the words in a poetry, the aesthetic object only exists as power, its immanent purpose for us is to be a hypothesis, to be a metaphor – and if it seems to exist beyond translation, it is only because, often, it is able to exert a momentary fascination, because it lets us have a glimpse, even at a glance, at the imminent moment of its disappearance, something hidden or less evident in
128
what we are (or in what we believe to be). There is no way – neither why – to deny how admirable and amazing is, for our intellection and for our senses, the tactile presence of the objects we perceive as components of an artistic work, its imminence, its suspension, its everyday presence – a combination of suddenness, banality of the reality, and the immanence of another time, of another body. Yet, as we have seen, it seems, even within the experience of art, there may be nothing for us but our experience of ourselves in the world. No theory, no data: only individual experience (even when we convinced ourselves that it can be shared). With this in mind, there seems to be little left over from the assertion that what we concretely sense, of things, of objects – invested or not in artistic content – perhaps it’s not, effectively, nothing but a particular perception (a color, a sound, a smell, a volume, a weight) that gets us suspended and generates, in us, the distinguished possibility of inscribing in this simple sensation an endless series of personal inquiries and existential considerations.
Indeed, if we agree that the way we perceive the world and relate to its phenomena is inevitably through our assessments of the situations in which we are immersed, it becomes evident that neither functionality nor monumentality (nor beauty) would be essential to the objects we perceive as art – essential would be only the fatal intimacy that we manage to develop with the things that touch us and on which (or from which) we can project the fascination of the glimpse of relief of Moebian topology in which our birth and death are inscribed. And this is already pointed out, for I believe that it is only this way, as ecstatic potentiation, that individual experience (which, before becoming perception, comes to us always in the form of a shock with the objects, collision with one another, confusion with the surrounding reality) also ends up shaping experience and knowledge. That is, it is only from the impact with this (irreducible difference, insuperable ulteriority) that we try, even if involuntarily, to perpetuate in our thinking and in our immediate reality that we reorganize the structural architecture of our consciousness – and, perhaps, our continuous presentification. Without contrast, without conciliation: it seems that this is the way things today are trying to come out of themselves and deny themselves simultaneously –and the more we notice this radical antagonism, the more we perceive the need to create eccentric strategies that provide us with subtle ways of approaching our own secret qualities with the ones of the objects.
From these scores, and trying now to focus on the topics I have chosen to guide this essay to its end, I would venture to say that our attitude towards a space, an object (or, in the case of the facility that serves as vector of validation of the allotropic logic of this essay, to a series of objects presented
without a consciously manipulated space), is usually determined by the context in which we find ourselves –and perhaps that’s why the value, or rather the meaning of a work of art like FERRIS WHEEL can only be reveal at the very moment of our encounter with the final outcome of the experience that is suggested us. And this I say because, in this installation, the artist seized a large number of objects – which had their original functions discontinued (but nevertheless still had their forms, their histories, their contexts) – and transported them to a free zone (but not any ordinary space, since it is an almost centennial building which has a history as a financial institution and now houses a newly refurbished cultural center) to construct with them reflections of profound artistic and existential dimensions. It is true that they are personal reflections, but since they come from objects once discarded, mined in places destined to store things of any kind for exchange or commercialization – and because they paradoxically treat these objects as full structures – they exemplify very well not only the prägnanz and strength of what is ambiguous, but also the tropological image of the ecstatic potentiation of things that climb up to extremes, which proliferate to infinity.
I believe that for us to see any sense in something, we must have a perspective (moment or action that offers anything extraordinary); and to have such a perspective it takes a small distortion of perception – a minimum illusion of defiance to what is real that conquers us, that seduces us, that strangers us, that revolts us –; and this is, in my point of view, the really aesthetic dimension of creativity. There is nothing that seems to deserve our embargo, however, in FERRIS WHEEL, everything seems to be there for our immediate perception, effectively on the surface (and does not seem to be any secrecy in these superficial things anymore). Moreover, what could be kept secret here – since it is an art installation – seems to be forced more and more into the real. Inversion Operation: So, what does impact us, then, if the minimal illusion also seems to have disappeared (or been intentionally removed)? Again, there is no obvious answer; because, paradoxical as it may seem, everything is metaphysical in this work – even its dreamy geometry, which is not that of space, but a mental geometry, that of labyrinths’ design. That is to say, it is a work that, despite the concreteness of all the pieces that compose it (including the monumental building where it is anchored and the objects are tied up), it does not strive to be objective, but, on the contrary, forces individual and collective subjective experience and encourages existential inquiry and engagement with the landscape (more precisely, with the endless series of landscapes that are not there, but that each of those objects seems to point to), propelling the disarticulated reasoning, the process of abandoning the exact construction of our thinking and our way of perceiving and interacting in the world. And indeed,
129
one of the most striking features of such a work is that it does not seem to be possible to be apprehended in its entirety, since it is not only the result of the installation or methodical disposition of a series of objects arranged in a certain way in a specific place – is rather a complex aesthetic operation, where the artist, as seems to be customary in her poetics, plunges into the narrow sense of control situations to destabilize our established certainties and our logical reasonings. Moreover, no relation in this situation seems to be evident; that is, in the final outcome of this installation, the impetuous encounter with daily life generates a situation of denial of the obvious meaning of our ordinary actions. Even the artist’s touch, as an act of single expression, does not seem to have here the importance we see so often exalted in most artistic propositions – the work reveals itself as an intricate construction that nevertheless seems to hold something interrupted, discontinued and suspended, something that is hidden for each person within this labyrinth of strings and objects; something that, for each person, will always be on the verge of being revealed. By choosing an unmeasurable amount (since the objects that make up the installation are not only the objects there present, but also all those that we could project there) of things to be displaced, re-contextualized and shared, the artist refused to create a unique and non-transferable form of aesthetic communication and aimed to establish a space to be shared with another. Everything here is an agent of the construction of a reflection that seeks, in the opening for otherness, the extension of the boundaries of articulation and structuring of an aesthetic language.
Maybe, since she was aware of this, Carmela Gross’s (eccentric) strategy was to abandon any intention of merely commenting on the relations between things, their importance and meanings, and analyzing situations of similar value. Here, the simultaneous juxtaposition of objects reveals that through the link between parts in which there is no consensus, we can achieve a freedom of thought based on the mobility of experience – a condition that, I insist, can take us beyond our knowledge and our individual attempts and expectations. I believe that
relating to such a proposal is more than understanding the overlapping of things and contexts or experiencing the feeling of accumulation that the work urges; it is rather a tropological opening for detachment from the orderly and established, it is like resting on insufficiency and observing the simultaneous appearances of many realities. Moreover, in a final conjecture, the work demonstrates a game between contamination and experimentation, and presents itself as a structure in continuous feedback – because this work is in sync and seems to demonstrate that, even within the limits of our everyday experience, our regular shock with the world and our experience with art, we are not yet able to understand, especially as we always try to direct our thinking to the exact, the rejections of our expectations, the unfilled spaces of our thoughts.
So without much else to add at this moment, I only hope it will be evident at the end of this excogitation that it does not have the surreptitious intention of defending any need, or will, to attack objectivity, the logical chain of ideas; but on the contrary, it aims to help us to firmly bet on the unfolding of strategies that allow us to reach other intellectual horizons. This is justified and presents itself relevant at the closing of this paper only to emphasize, once again, that I defend here – and what FERRIS WHEEL installation in my opinion seems to help demonstrate – that, in the eccentric deviations of the exact thoughts and established selfcertitudes, perhaps there is still the possibility of developing other ways, different ways, of relating to life and, perhaps, to art. We may, who knows, from this work, consider that having a spiritual personality and developing a reasoning that is not necessarily objectivity-oriented may reveal itself as a possibility of understanding things in different ways, of believing in new directions that may come. Finally, all that remains is, once again, the question: how many new things can we see, how many different things would be intimately grounded if each of us would develop, in very particular ways, eccentric strategies that would enable us, for a few moments at least, to allow ourselves to be persuaded against our beliefs, to cast aside from our conscience certain truths held by us as absolute, and to try to transform them, to expand them into new and open convictions?
130
CUMULUS CONGESTUS – SHADES ON THE FLOOR
| Edson Luiz André de Sousa
“
It’s our disturbing solitude
It’s our shade on the floor our margin of error: the leftover things...”
Manoel Ricardo de Lima
1
Cumulus congestus is one of the classifications of clouds, they are in the low height ranges, the ones about 2 km from the surface of the earth. These clouds are described as formations with protruding edges at the top and considerable vertical development, indicating strong ascension. Its existence indicates deep layers of instability. Carmela Gross sketches in her Roda Gigante exhibition a thought about ascension and fall, volcanic eruptions of language invading spaces emptied of word, mapping innumerable zones of instability. Her artistic strategies come in like restless vapors through the gaps of the language machinery dissolving cliché images, challenging the sign, unveiling strategies of power, confronting form in a movement that we could name as counter-image. This affinity with the clouds comes from a long time, it dates as far back as 1967, when Carmela Gross elaborated the work CLOUDS, pieces of wood cut and painted with synthetic blue enamel. As Ana Maria Beluzzo evokes, “she sends clouds to the ground, bringing the impalpable within our hands reach”.2 If on one hand a cloud thought indicates transitory, fragile and ethereal places, on the other hand, this same volatile spirit indicates movement, strength and undoes the idea of a world that always returns to the same place. Securing places has always been on the agenda of the logic of power, establishing realities and trying to freeze places of meaning. Thus, the sense we need to seek is always the one to come, partial, enigmatic, incomplete. At this, Carmela Gross comes very close to William Shakespeare’s Hamlet when he challenges Polonius in his subservience to the word of the Other. Hamlet, pointing to the clouds, says to Polonius: “Do you see the younder cloud that’s almost in shape of a camel?”. Polonius reacts by claiming it’s like a camel indeed. But then Hamlet continues: “Methinks it is like a weasel”. Polonius always follows him slavishly: “It is backed like a weasel”. Hamlet provokes him further: “Or like a whale?”.3 Hamlet thus reveals a mode of parasitic relation to language and reminiscent of the spirit of voluntary servitude so masterfully dissected by Etienne de la Boétie. His act of breaking mirrors works as an analytical interpretation, because it causes established senses to waver. Carmela Gross sets her clouds in motion and her exhibition compels us to run across them, like the 13 PASSERS-BY in her animated video (2016), where each one seeks its balance point in a unique grammar
that sustains a crossing in the world. The stumbling of one of the figures, which dismounts in space, suggests a possible path. We are always stumbling into language and it is from this fall that we can collect the vapors of new images. We need, more and more, images that recover spaces of enigma, that place us before new questions, thus triggering territories of hope. To circumscribe our darkness obliges us to seek the direction of the roots that sustain us, not to reverence them as immutable inheritances, but to help us open new spaces for sustenance as well. Ernst Bloch inaugurates his classic trilogy The Principle of Hope, dedicated to reflection on the place of utopian thought, with the forceful statement that “to think is to transpose”4 We know very well that these transpositions are not done without disturbance, because, as the poet Rainer Maria Rilke evokes, “Art did nothing but show us the confusion in which we almost always find ourselves. It upset us, instead of making us silent and calm”.5
At FERRIS WHEEL installation, which gives its name to the exhibition, the spectator is instigated to trace vertical lines in space with their gaze, by looking for mooring points at the ends of the ropes. The lines are tensed with the magnetic force of the objects out of place, holding stories of drift and abandonment which seem to pull the columns to the ground. There are many narratives condensed in this discursive plot that tries to tell us a history of the remains, the margins, the forgetfulness. The space cut out by wires draws a map of lines and reminds me of the definition of space by Milton Santos when he suggests us to think of space as an inseparable set of systems of objects and systems of actions.6 Thus, in the visuality of these forms, Carmela Gross activates stored gestures of forgetfulness. But for the artist, it is not enough to point out these places of abandonment. She rips the space so we can see the extras that do not always appear. We, therefore, have an immense memorial, a kind of melody of the world through an inventory of objects. Each object establishes a possible narrative, a horizon of images in the spirit of the utopian Blochian consciousness that sought to see far away but, deep down, only to cross the darkness very close to the instant that has just been lived.7
In order to see the extras that appear slowly in the background of the scenes of the world you have to listen to the noise behind the scenes, to refuse to be immediately fascinated by the first image that is shown and wait for the time of the one in the background. Thereby EXTRAS appear, one by one, and the artist recites them visually with her luminous neon in red color, letter by letter. We read, therefore, Karl Marx’s “Eighteen Brumaire of Louis Bonaparte,” as the sign of a film in which the story is made by the supporting actors: nothings, deserters, robbers, cheaters, pimps, scavengers, muggers, traffickers, beggars... We can imagine this continuous line of words as a horizontal
131
Ferris wheel, which raises the question of what a reading is. How can we read from what is in the shadow? Rilke, in a fragment of his text The Testament, draws attention, in the painting of Jan Van Eyck “Madonna of Lucca”, to two small almost invisible apples on a window sill and says he would like to be not one of the apples, but its “humble shadow”.8 Carmela Gross seeks to circumscribe these shadows and put them back on the scene.
Thus, the work LUZ DEL FUEGO II presents the fires that are still burning and from which we have not yet been close enough to identify the origin of it, this being the reason why they will continue to burn. We witnessed astonished scores of images of State violence trying to silence so many legitimate revolts. The video retrieves photos from the news, from February 2012 to November 2016; conflicts in Libya, Syria, Egypt, Palestine, Israel, Mexico, as well as in other countries. It also brings clashes on the streets of Athens, Rome, Santiago and many others, as well as demonstrations in countless Brazilian cities in June 2013. Each image tells a story that reminds me of Jimmy Hendrix in his 1968 song “Up from the skies”, in which he evokes “the smell of a world that has burned”.9 More than ever, we must return to these ashes, seek to read them, so that we can at least respond to the provocation proposed by Jack London: “How could anyone find the words to describe a nightmare?”10 The exhibition Roda Gigante, by Carmela Gross, gives us some clues.
HOW TO MAKE THE WORLD GO ROUND | Tania Rivera
Carmela Gross multiplies the gaze, cuts the space, suspends the place and the meaning of images and objects.
Conceived especially for Farol Santander of Porto Alegre, FERRIS WHEEL installation reveals particularly the complex poetic operations that the artist has been modulating, in different means and ways, for more than 50 years. In the atrium of the building that was once a bank branch, we have a set of objects such as car wheels, gas cylinders, stacks of books and newspapers, various suitcases and bags, iron chains, wooden and styrofoam boxes, a boxing bag and weights, many weights of iron. A television, a typewriter, a trophy, pans, three dwarfs, a Snow White, and animal figures in cement that could refer to the idea of rubble or scrap. However, the layout is meticulous and everything is in good condition, even when it is a little worn or rusty. It is not a question of accumulating waste but of carrying out a strange construction operation, as shown by buckets, bricks, carts, iron blocks and cylinders, sacks of gravel and cement and a few cans of paint.
The whole set does not depart from our everyday urban landscape, which often mixes building and ruin, material and remains of construction. The street, the exterior, takes the interior of the building, and the city seems to invade the imposing eclectic architecture of the cultural center. But that is not enough: FERRIS WHEEL, with ropes of varied colors and complex sailors’ knots, binds each one of the objects to the guardrails or the columns of the mezzanine that surrounds them, drawing in the space a tangle of traces in many directions. Each element weighs on the tension and imposes itself onto the architecture, while my gaze goes from one to the other, turns and makes the building rotate, flowing with the simplicity of each ordinary element, questioning the relationship between us, places and things –between me, every single place, every single thing.
1. LIMA, Manoel Ricardo. Geografia Aérea. Rio de Janeiro: Editora 7 Letras, 2014.
2. BELLUZO, Ana Maria. Carmela Gross. São Paulo: Cosac & Naify, 2000, p. 10.
3. SHAKESPEARE, William. Hamlet. Translation by Millôr Fernandes. Porto Alegre: L&PM, 1997, p. 77.
4. BLOCH, Ernst. O Princípio Esperança. Translation by Néli Schineider. Rio de Ja neiro: Editora Contraponto, 2005, p. 14.
5. RILKE, Rainer Maria. A melodia das coisas. Translation by Claudia Cavalcanti. São Paulo: Estação Liberdade, 2011, p. 125.
6. SANTOS, Milton. A natureza do espaço. São Paulo: Editora Edusp, 2002, p. 21.
7. BLOCH, Ernst. Op. cit., p. 23.
8. RILKE, Rainer Maria. O testamento. Translation by Tercio Redondo. São Paulo: Editora Globo, 2009, p. 139.
9. I thank Carlo Pianta for reminding me of this song at the seminary in the Psycho analytic Association of Porto Alegre (APPOA) on April 2019.
10. LONDON, Jack. O pagão. Rio de Janeiro: Editora Dantes, 2000, p. 12.
In the majestic building, full of curves and ornaments, the suspended outline of straight lines builds crosses that reverberate the X from 1989 work, exhibited in the gallery that surrounds the atrium. The iron-sculpted rays of this work, nailed to the wall, allude to the graphic sign that usually represents an explosion. The Xs of the crosses of FERRIS WHEEL’s strings might also expand suddenly, with a force that would throw the architecture and the objects inside to the air. Or, perhaps, the weight of each object could pull violently the columns and the guardrail, putting down walls and ceiling, demolishing, thereby, all the construction.
Amid this deep but precise deconstruction, the movement and singularization that it foists upon my gaze in this kind
132
of disarchitecture, something suddenly stands out in the background: a small ladder. It is as if it would wink at the spectator, familiar with her presence in several works of Carmela, from the design of STAIRS (1968) on a slope, located on the outskirts of São Paulo, whose gradient, probably carved by heavy machinery, already formed ascending steps. In this work from the beginning of the artist’s career, the staircase posed itself sovereign, as a kind of minimal architecture to be built between nature and representation, between thing and language.
Tensioning these two poles, the whole work of the artist consists perhaps of a semiotic, precise and subtle gesture, which performs the great feat of questioning the representation, to suspend it in poetry. Moving between object and sign, Carmela’s poetics is thus able to transform what is already there – gradient, trace, object – into a thing of art, while keeping it in the world.
To make this point clearer, let us return to FERRIS WHEEL. Suddenly, we see taking shape and isolating itself from the whole, as suddenly as the staircase, an uncommon element in our daily lives, nevertheless iconic in the history of art: a bottle dryer that resembles a hedgehog with its metal rods directed upward (forming traces that do not cease to dialogue with the ropes of the installation, by the way). The artist thus appropriated one of the first ready-mades of Marcel Duchamp, Bottle Rack, from 1914, to return, in her own way, to the gesture of making any object a work of art by designating it as such. However, Gross acts against the grain of such elevation, making the ready-made again a mere dryer of bottles among so many other prosaic objects of the installation. The operation is remarkable and could be denominated against ready-made. Or, perhaps, forcing the English expression to accept a neologism, ready-dismade But it goes beyond: it not only criticizes and undoes the place of the art object, but it also attacks the status of any object. Art or household utensil, in itself is no great thing, if it is not bound – by explicit strings or invisible lines, lines of language – to other elements of the world’s architecture, and thus take place in a complex scene, that is about to set itself in motion, like a ferris wheel.
The device that I try to unravel here, with great difficulty and undoubtedly not doing the subject justice, is absolutely vertiginous and, nevertheless, has a unique elegance. We can try to extract from its conceptual strength some lessons, partial and fragmented, personal and provisional. I’ll try to sketch some of them.
1. The gaze, like the drawing, consists of a set of traces.
The perspectiva artificialis demonstrated it, systematizing the order of representation in order to reveal that the world
never corresponds to empirical nature, but is always a fact of language, an artifice. Each gaze follows traces that had already been shown, but can, in its singularity, redraw them, transforming the scene of the world and changing protocols of conventional significance. Summoned by the artist’s semiotic agencement, my gaze can become an engine that makes it spin.
One of the possible modes of agencement is to make the trace deny the neutrality of the surface (as in STAIRS) to then take place right at the scene of the world, transiting and maintaining a tension between them. In an analogous operation, a word can also become a sign and object to be inscribed in the city, denying the museum wall in which it is found. Or yet, strained elastic lines on the wall forming geometric designs (which may decline the minimal architecture of the staircase) may jump from the surface to become MONUMENTS (2001) – emerging into threedimensionality and the cultural world by virtue of this title, but also from the fact that they challenge the human scale, being larger than the size that would allow me to see them integrally arranged on the wall in perspective.
In the vigorous exploration of the very conditions of construction of all representation performed by Carmela, one can still destroy the mimesis, revealing that each image is not made on a tabula rasa, but comes from other images already given (such as illustrations present in encyclopedias, for example), which can be manipulated until their relationship with the referent is annihilated. Thereby, the picture from a means of reproduction becomes, as in Gross’s QUASARS (1983), open poetic forms, in which it pulsates the “pure” power of signification, so to speak.
By revisiting, criticizing, and exploiting in various ways the basic conditions of construction of signs and the scene in which they present themselves, Carmela may, in each work, restores the precise gesture by which prehistoric artists made their paintings – always playing with colors and the relief of cave walls, assimilating what was already there (as well as the 1968 STAIRS, to insist on that point). From the trace to the world and from the world to the trace, the artist’s drawings, objects, sculptures and installations are always inscriptions, in the strong sense of the term. Inscriptions with which we come across as a rock art or painting, as something that is addressed to us and urges us to revise the world and language, which invites us to reconstruct them poetically as it is promised, for example, by the beautiful PROJECT FOR THE CONSTRUCTION OF A SKY, from 1981. (perhaps we should look up and go up, invited by Carmela’s stairs, and for this ascension we will probably need at least one WING, 1995. Or, perhaps, we have already fallen, and the WING is a kind of monument for that fall, insofar as the lightness of its fabric is undone by the bitumen that covers it.)
133
2. There is no surface. Or: when one is before a surface, it is all about making it alive.
X (1989) traced by an iron on the wall, to which I have already referred to as an allusion to the graphic explosion sign, could also be considered a basic gesture of inscription, of marking a place, such as the point I find myself on a map of the place. Or it could serve as a reference to give start to the works of representation or cartography, establishing the vanishing point of the perspective and the position of the eye that would correspond to it, outside the frame. Carmela, however, spaces and crosses her rays, in order to destabilize her path and to emphasize the central emptiness from which they depart. Instead of serving as the point of origin for the establishment of an imaginary space of representation – from the open window in the world that perspective would mimic – the trace multiplies and expands itself, pushing to the world stroke and letter, sculpture and object. It breaks through the wall to create space, creating then a minimal scene, so to speak, nothing more than an embryonic one. What it presents and throws as an invitation is nothing less than the brute power of language and construction of the work itself.
Or better saying, perhaps, it is a matter of moving and destabilizing the letter X – which is worth remembering, also denotes an unknown and a sign of indetermination –as a set of strokes. It can then become people, like the 13 PASSERS-BY animation from 2016. Designed with simple traces made from insulation tape, its characters come alive in a precise gesture, that makes them walk, each one, in absolute singularity. One of them stumbles and rises again; another can take down triumphantly a great trace. With such simple but beautiful gestures, as daily choreographies, EXTRAS take the lead of the world – as those called by Marx as degenerates, vagabonds, traffickers, prostitutes, barrel organ players, etc., revisited by Carmela in a work of the same year, in a LED panel that shows them letter by letter and makes the alphabet itself, the language and, above all, our reading of it, to bend before them.
Along this line of reflection, we can also consider each writing in neon or large letters that parody the advertising language as an x, an instituting inscription that Gross performs in the city in order to mark their place in it, while at the same time making urban space an infinite surface, a voluminous cave in which things, language and people mix.
The neon signs AURORA (2003), LUZIA (2004) and I AM DOLORES (2002) show names of women who are also verbs or nouns (in the case of the latter, a mixture of a woman’s name and the word pain, in Spanish). Some of them are inside
an architecture, but can be seen from the outside, at least partially. These women are not exactly people, but human events, words and images that break the walls and scream – like a marketing strategy and, eventually, employing the intensity of light and the red color.
However, these event-women cry out for something other than the commodity to be consumed. After all, “real people are dangerous,” as affirmed by the work projected in 2008, exhibited in Farol Santander mezzanine, a work which could not be fully assembled at the time, since the last two words were blocked by the organization of the event that took place in New Zealand, an episode that confirms the strength of the work in making letters people (and dangerous!). They could shout here, eventually, the word SOUTH (from 2002, etching print version), in a geopolitical affirmation. And in the confused scene of the polis – in the displaced peripheral modernity, which has its “north” in an always unfinished “south”, which is a promise or task always to be built – suddenly, in the midst of all this – the violence that always lurks, the fire that can always suddenly burn (as LUZ DEL FUEGO II, 2018, reveals), could pass by a faceless BLACK WOMAN (1997) of vaporous and sliding forms, in its black tulle and its scale that is just above of ours and makes it a strange monument, despite the wheels and the support that could invite us to take a stroll around the city.
3. To conclude: the scene is never there.
It is done in very precise poetic agencements, with signs, objects and people; with inscriptions, light and gestures, in the city, in the buildings; inside or outside, or better yet, moving from the interior to the exterior, from the institutional space to the city, from art to life and vice versa. Hence it is as accurate as it is immeasurable – for it spreads outwardly and relates in a very complex manner with the world and history, and is reconstructed at every glance, before traces, objects or images that capture it and set it in motion.
It is an event.
In addition, and fundamentally, it is necessary to point out that something in it is hidden. As in THE LOAD, 1968, something gets underneath the rags, building a sort of fold in the scene. There beats a tragedy that never ceases to repeat itself, resisting any representation – however, it is at the same time nothing but a surface, a mere truck tarpaulin, with caesuras that are like beautiful embroideries.
It is up to art to turn such a pulsation into something material – and to invite us to stand before it, today, to take a stand.
134
Carmela Gross interview
In a few words, what is FERRIS WHEEL all about?
FERRIS WHEEL is an installation specially designed for the internal space of Farol Santander in Porto Alegre. It is a set of about 300 objects that will be arranged on the floor of the main hall of the building. Each of the objects will be tied by ropes to the top of the columns and balustrades of the building. Thus, all free space will be occupied by the cords crisscrossed in many directions, visually creating a kind of irregular pattern of many colors and varying thicknesses.
How is the FERRIS WHEEL creation process being done? How did the idea come about? Is it possible to pinpoint when this idea was triggered? What was the first thing you did after having the idea?
FERRIS WHEEL has an experimental feeling to me of a work in process, whose frame and construction will still go through many stages, various adjustments, research of materials and different technical and operational solutions. In a nutshell, FERRIS WHEEL is in the process of being designed and I think the process will extend itself until the opening of the exhibition, or maybe even after that. It is a construction site.
How does FERRIS WHEEL relate to the times we’re living in Brazil and the world now?
FERRIS WHEEL has to do with the precariousness of life in the big cities, whether it be of its inhabitants or of those who live on the streets. Street dwellers or vendors, for example, must improvise ways of living and create a nomadic and uncertain dwelling place every day with the things they find, like discarded objects and furniture, and recombine them in a fragile balance in any empty space they find, be it leaning them against a wall or assembling them under an overpass.
As far as the objects you have chosen to compose the installation, what are they and for what reasons have you chosen them? For you, what is the path of an object until it becomes a work of art?
Objects are still being sought after in junkyards and warehouses of used or abandoned objects repair shops, mechanical workshops, hardware stores, etc. Perhaps the common feature in all of them is the opaque volume, medium and small size, heavy and condensed mass, to strain the ropes in the span of the building.
But they are nothing special, as far as beauty or charm, on the contrary, they are objects that are indifferent or useless to us, things that are out of use or obsolete, and that can be recognized as fragments of an absent whole. They are crude, indefinite, rustic, false, mundane utensils for devalued services such as buckets, drums, bundles, mechanical parts, counterweights, in short, a monstrous collection of cheap goods.
Are there one or more works of yours to which FERRIS WHEEL is related to in a more intimate way?
All my work as an artist seeks to think about the world critically and advance the political and social issues of my days. It is true that the works I’ve done at different points in my career do not resemble one another, they are not in a formal unity that can be easily recognized. The forming principle should be sought not in form, in appearance, but in their direction, where they point out – outside them, into reality. FERRIS WHEEL, therefore, converses closely with FOR SALE, THE DUDEZ BEAT IT, I AM DOLORES, THE BLACK WOMAN, THE LOAD, MIGRANTS, HOTEL and EXTRAS, among others.
The image of a Ferris Wheel is, in principle, a positive and playful one, and can recall one’s childhood. What other attributions can we discover with your FERRIS WHEEL?
Yes, a Ferris wheel can evoke a playful and enchanting meaning, inscribed in its own name and even in its designation in other languages: “wonder wheel”, in English, and “rueda de la fortuna” (wheel of fortune), in Spanish. Ferris wheels with its colorful lights and spinning wheels are almost always located in amusement parks, along with so many other attractions that stimulate the dream and imagination of childhood. But it can also be a gear that promises movement, with its rotating mechanism, but which does not move, only oscillates, repeating infinitely the same movement, sometimes above, sometimes below, in a hypnotic and empty way. The title points to an enchanted place, but what is expressed in the material scope of the exhibition summons the viewer to a critical reflection, a dialectic of the artistic look.
Is it possible for the public to relate to FERRIS WHEEL? In what respect?
There is no way to see oneself in this work. FERRIS WHEEL doesn’t show itself as a relatable mirror, it might not even be one for selfies. FERRIS WHEEL just carries in the paints some of what is seen everyday in the big cities of the world.
135
136
137
138
139
140
141
142
143
144
145
146
147
148
149
150
151
152
153
Sérgio Rial Presidente President
Patrícia Audi
Vice-presidente executiva de Comunicação, Marketing, Relações Institucionais e Sustentabilidade
Executive Vice President, Communication, Marketing, Institutional Relations and Sustainability
Bibiana Berg
Superintendente executiva de Eventos, Patrocínios e Cultura Executive Superintendent of Events, Sponsorships and Culture
Karyna Nardelli
Coordenadora geral Farol Santander General Manager Farol Santander
André Severo
Coordenador Farol Santander Porto Alegre Head of operations Santander Porto Alegre
Mariele Salgado Duran
Conselheira de Marketing Farol Santander Porto Alegre Marketing Advisor Farol Santander Porto Alegre
Daniel Cardoso Vitt
Analista de Marketing Farol Santander Porto Alegre Marketing Analyst Farol Santander Porto Alegre
Francielle Prestes Bueno
Analista de Facilities Gestão Predial Facilities Management Building analyst
Patrocínio/Sponsorship
Banco Santander Brasil
Realização/Achievement Ministério da Cidadania Farol Santander de Porto Alegre
Concepção e projeto/Conception and project André Severo 4 Art Produções Culturais
Curador convidado/Curator Paulo Miyada
Direção de produção/Director of production 4 Art Produções Culturais Daiana Castilho Dias
Produção executiva/Production
Plano B Arte e Projeto Áurea Liz Carvalho Marcelo Braga Gelly Saigg Moara Ribeiro
Produção local/Local production Melanina Cultural Melanie Graille Juliana Biscalquin
Assistência de produção/Assistant production Plano B Arte e Projeto Ana Paula Castro Rozália Gonçalves Marcos Cintra
Pesquisa, documentação e coordenação de projetos/ Research, documentation and coordination of projects Ateliê Carmela Gross Carolina Caliento
Desenvolvimento de projeto executivo e edição de vídeo/ Executive project development and video editing Ateliê Carmela Gross Pedro Perez Machado
Audiodescrição/Audio description Mahéva Santos
Projeto expográfico/Exporghaphic project Gustavo Goes Camila Harumi
Museologia/Museology
Arribada Consultoria Bernardo Arribada Tatianne Neves
Programa educativo/Educational program
Acontemporânea Projetos Culturais Marcela Tiboni Juliana Biscalquin Márcio Melnitzki
Programação visual/Graphic design Isabela Rodrigues – Mangasanta
Fotografia/Photography Vicente de Mello
Marketing digital/Social media Moara Ribeiro
Fotos montagem/Photography montage Carmela Gross Luiz Renato Martins Pedro Perez Machado
Projeto de vídeo interação/Video installation project Tiago Keise Guem Uchida Takenouchi Luis Rocha
Vídeo release/Video release Filmes Fritos Suellen Vasconcelos Tatiana W. Franklin
Iluminação/Lighting designer T19 Projetos Carlos Peukert Jó Calipóteo Guedes Jhone Guedes Emmanuel Queiroz Anilton de Souza
Montagem de obras/Exhibit set up D’Arte Montagens João Nascimento Manoel Oliveira Natália Martins Freire Paulo Gomes Rozália Gonçalves
Preparação técnica das obras/Technical preparation Allen Roscoe Jacarandá Montagens Marcenaria Polovinas Priscila Alegre Ana Nakandakare D’Arte Montagens Ana Paula Castro Plano B Arte e Projeto
Intérprete de Libras/Accessibility specialist Bárbara Barbosa
Revisão catálogo/Catalog review Regina Araki
Preparação técnica das galerias/ Technical preparation of the galleries LM Montagens de Cenário D’Arte Montagens
Plotagem/Plotting WL Comunicação
Coordenação geral e imprensa nacional/ General coordination and national press Meio e Imagem Comunicação
Apoio Logístico/Logistical support Marcos Cintra Renan Cintra
Seguro/Insurance
Affinite Seguros
Transporte/Transportation Millenium Transportes
Agradecimentos especiais/Special thanks Galeria Vermelho Valeria Cabral