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PERSPETIVAS
from LusiNews n.º57
Das exigências de sustentabilidade ambiental a uma forma de vida ecológica
Atualmente, as exigências de sustentabilidade ambiental estão na ordem do dia dos debates públicos, no planeamento da atividade de organizações e de empresas e nas preocupações quotidianas dos indivíduos. É adquirido por todos que o desenvolvimento tem de ser sustentável a nível pessoal, comunitário, local e global. Sem dúvida que existe, atualmente, uma muito maior consciência ambiental, com cidadãos e empresas a adotarem medidas “verdes”, procurando minimizar a poluição, reduzir o consumo de água e de outros recursos naturais, abrandar o consumo, entre muitas outras opções.
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Mas é certo também que se impõe uma opção mais fundamental: tornarmo-nos “verdes” intrinsecamente, assumindo estilos de vida ecológicos. Necessitamos que a ecologia se transforme numa forma de vida, já que os grandes desafios que resultam dos desequilíbrios ambientais e económicos exigem que tenhamos uma consciência mais abrangente e que aceitemos transformar o nosso modo de vida.
Os desafios globais têm de ser respondidos a dois níveis: na mudança de atitudes e de comportamentos individuais, mas também na alteração de modelos de sociedade e de políticas públicas. Nos últimos anos, com as crises financeira, alimentar e ambiental, tornou-se evidente que algo está a falhar nas políticas de sustentabilidade, que parecem valorizar muitíssimo o pilar económico, desequilibrando o social e o ambiental.
Precisamos de adotar um estilo de vida ecológico. Isto nasce, antes de mais, da consciência de que não estamos isolados no mundo, somos parte de uma humanidade e somos criaturas de um mundo vasto, somos habitantes de uma “casa comum”. É aqui, neste espaço comum, partilhado por inúmeras comunidades do planeta e por muitas gerações ao longo da história, que cada um de nós é acolhido – numa terra, numa comunidade, numa história. A consciência disto leva-nos a uma atitude de agradecimento e de missão. Agradecimento, porque herdamos o fundamental daquilo que temos, os recursos de que dispomos; missão, para que esta vida seja possível para outros seres humanos e para as gerações futuras. Uma consciência ecológica interpela-nos, primeiro, a olhar à volta, a (re)conhecermo-nos a nós, aos outros e ao planeta, e a valorizarmos o que somos a partir desta perspetiva holística. É esse reconhecimento que nos permite desenvolver um sentimento de gratidão e de responsabilização pelas coisas, tomar consciência do tanto que nos envolve e nos une a todos e ao planeta.
O facto de nos sentirmos parte de um todo maior e de sabermos que os recursos do mundo pertencem a toda a humanidade leva-nos a cuidar deles e a ser responsáveis no uso que fazemos deles,

— Engenheira florestal — Co-Fundadora e Diretora da Associação Casa Velha – Ecologia e Espiritualidade (Ourém) — Vencedora do Prémio “Terre de Femmes”, da Fundação Yves Rocher
ECOLOGIA É ISTO MESMO: CUIDAR DA CASA COMUM, QUE É DE TODOS NÃO BASTA RECICLAR SE NÃO SE REDUZ; NÃO BASTA REDUZIR SE NÃO SE PARTILHA
porque não são exclusivamente nossos. Ecologia é isto mesmo: cuidar da casa comum, que é de todos e que eu também habito. Somos seres que pertencem a esta casa, que podem crescer neste sentido de pertença; o nosso bem individual não está separado do bem comum. Isto implica cuidar de tudo, de cada coisa e do todo, da globalidade: do ambiente, dos recursos naturais, da terra, das pessoas, das relações. O que está em causa é gerir o que nos foi confiado. Uma consciência ecológica assim integra-nos e torna-se integral e global.
Esta perspetiva de uma ecologia integral, de um estilo de vida ecológico, reflete-se também nas relações que temos uns com os outros. As preocupações por ter uma forma de vida com baixo consumo e com reduzida pegada ecológica têm de estar associadas a uma preocupação pelas condições de vida dos outros, por uma responsabilidade mútua. Cuidar da natureza exige cuidar dos outros. Percebemos isto mais claramente, quando nos damos conta de que uma parte dos problemas ambientais está relacionada com a desflorestação, motivada pelas necessidades de sobrevivência de populações locais, ou com o facto de comunidades inteiras se terem visto forçadas a abandonar zonas que ficam, assim, desertificadas e não são cuidadas, dando origem a incêndios florestais, apenas para dar estes exemplos. Se não cuidarmos das pessoas, a natureza acaba prejudicada. Cuidar da “Casa comum” passa, em primeiro lugar, por uma reciclagem interior, por cuidar das relações connosco próprios, com os outros e com Algo que nos transcende. Esta disponibilidade para sair de si próprio e para promover o bem, ao qual podemos chamar bem comum, é a base desse estilo ecológico de vida, que referi; tem origem na consciência do nosso limite, de sermos interdependentes, de fazermos parte de um todo maior. A Natureza, que integramos, ensina-nos a equilibrar as nossas opções, a moderar as nossas necessidades e a cuidar desta casa comum que nos sustenta com tanta generosidade.
Precisamos de aprender ritmos e estilos de vida mais sustentáveis e ecológicos. Para isso são úteis os 5 “rr”, como guias transversais do nosso comportamento: Repensar, Reduzir, Recusar, Reutilizar e Reciclar. Não basta reciclar se não se reduz; não basta reduzir se não se partilha.
A falta de estilos de vida mais sustentáveis é também uma consequência de atitudes individualistas e demasiado competitivas, que evidenciam a falta de tempo para as relações humanas e valorizam os bens em detrimento dos valores, enfatizam lógicas autocentradas, impelindo mais para a concorrência e a competição do que para a colaboração e o cuidado. Este contexto reforça as dificuldades em lidar com o fracasso e com os resultados a médio e a longo prazo, evidenciando abordagens epidérmicas em relação ao ambiente e às relações sociais, com pouco sentido de responsabilidade para com as gerações futuras.
Claro que também a sociedade e as organizações precisam de ser transformadas por este modo ecológico de vida, que resulte de mudanças coletivas e da reconfiguração das formas de organização social. As empresas, na sua grande maioria, estão já conscientes desta necessidade. É importante, neste contexto, que as empresas vejam o lucro como um meio e não como um simples fim. Além do mais, o assumir de uma consciência ecológica por parte das empresas, relativamente aos modelos de produção e à forma de gerir a sua atividade, não é um custo ou um obstáculo ao lucro, é, antes, uma mais-valia para assegurar a viabilidade a longo prazo e para estar em condições de responder às exigências dos consumidores, concretizando, deste modo, a sua responsabilidade social. Isto implica envolver todos os membros da organização, repensar os procedimentos, fazer opções quanto aos processos de produção, rever as relações com as comunidades locais.
Práticas ambientalmente sustentáveis precisam de um estilo de vida ecológico, de uma relação empática com o Mundo, que inclui a natureza e todos os seres humanos, para que ele seja lugar de relação, catalisador de uma consciência ecológica.