A herança simbólica da azulejaria na arte sacra: Análise iconográfica e iconológica dos painéis

MARIA LUIZA XAVIER CHAVES HERANÇA SIMBÓLICA DA AZULEJARIA NA ARTE SACRA: ANÁLISE ICONOGRÁFICA E ICONOLÓGICA DOS PAINEIS NO CONVENTO DE SANTO ANTÔNIO NA PARAÍBA

CENTRO UNIVERSITÁRIO DE JOÃO PESSOA UNIPÊ ARQUITETURA E URBANISMO

MARIA LUIZA XAVIER CHAVES A HERANÇA SIMBÓLICA DA AZULEJARIA NA ARTE SACRA: ANÁLISE ICONOGRÁFICA E ICONOLÓGICA DOS PAINEIS NO CONVENTO DE SANTO ANTÔNIO NA PARAÍBA

Trabalho Final de Graduação apresentado à Banca examinadora Final do Curso de Arquitetura e Urbanismo, como requisito para obtenção do título de bacharel em Arquitetura e Urbanismo pelo Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ, sob orientação do Professor Fhilipe Germano Bezerra e co-orientação da Professora Mirella Braga.

Orientador: Prof. Me. Fhillipe Germano Bezerra Lima Coorientadora: Profa. M.ª Mirella de Almeida Braga

João Pessoa | Novembro de 2020

João Pessoa | 18 de Novembro de 2020

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________ Prof. Fhillipe Germano Bezerra Lima Professor Orientador Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ C512h Chaves, Maria Luiza Xavier.

A herança simbólica da azulejaria na arte sacra: Análise iconográfica e iconológica dos painéis no Convento de Santo Antônio na Paraíba /Maria Luiza Xavier Chaves - João Pessoa, 2020.

183f.

______________________________________ Prof. Maiara Ateciene dos Santos Belo Membro da Banca 1

Orientador: Prof. Fhillipe Germano Bezerra Lima

Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ

Coorientadora: Prof. Mirella de Almeida Braga Monografia (Curso de Arquitetura e Urbanismo) – Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ.

______________________________________ M.ª Natállia Azevêdo

1. Azulejaria. 2. Narrativa Visual. 3. Análise iconográfica e iconológica. I. Título.

Membro da Banca 2 Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ

UNIPÊ / BC

CDU - 726:2-523.6

Dedico à todas as pessoas amadas que encorajaram e acreditaram na minha busca e amor pelo conhecimento.

AGRADECIMENTOS Gratidão primeiramente à Deus, o arquiteto da vida e das mais belas dádivas, pois sem Ele nada seria possível. Agradeço a Nossa Senhora e todos irmãos de luz que abençoados por Deus me guiaram e me fortaleceram permitindo que chegasse até aqui. Sou grata por toda jornada e por toda fé que me faz acreditar que Deus estará sempre comigo.

Aos meus pais, André e Andréia Xavier, meus eternos alicerces, agradeço por todo apoio, coragem e luta diária sem medir esforços para que eu e minha irmã tenhamos um futuro brilhante e repleto de amor. De forma especial agradeço a minha amada mãe, meu maior amor traçado desde à maternidade e de outras vidas, por todos os ensinamentos, por ser uma mulher forte e pela coragem de nunca desistir. À minha amada voinha, Analdina, por todo amor, conselhos e por deixar os dias mais leves, sempre com um cafezinho quente e chocolate acompanhando um filme de terror. Sou grata pela dádiva de ser sua neta e por me ensinar todo dia sobre as belezas da vida. Ao meu vô in memoriam, Luiz Carlos, pelo amor, companheirismo de encobrir minhas traquinagens da infância e me guiar, sempre estará marcado no meu coração. À minha irmã, Marrara, minha eterna companheira, a qual tive o privilégio de dividir o mesmo quarto e momentos ímpares, que sempre esteve ao meu lado me acompanhando nas maiores maluquices, me fazendo rir e incentivando a ser a melhor versão de mim mesma da forma mais leve.

Aos meus tios, Andressa e Isaac, por sempre acreditarem e incentivarem os meus sonhos, me aconselhando sobre decisões sobre a vida adulta e pela felicidade das inúmeras risadas com os pestinhas que amo imensamente. Aos demais familiares, agradeço por todo amor e felicidade que sempre me proporcionaram.

Não poderia começar a agradecer aos meus amigos sem lembrar do meu eterno quarteto fantástico, minhas amigas Larissa, Lara e Natália por compartilharem comigo momentos de desespero, viradas de noite, brigas, estresses e, sem dúvidas, muitos risos e companheirismo!

Agradeço por terem aberto sempre as portas das casas e vidas comigo! Agradeço também aqueles que se fizeram presente durante toda jornada: João (meu companheiro de caronas

diárias e aperreio!), Vinicius, Maria e Camila.Vocês, sem dúvida, são amizades que a faculdade me presenteou e pretendo levar por toda vida, com os risos, brincadeiras e felicidades. Sou grata também a Natália Vieira, grande amiga que a faculdade me deu, obrigada pelas cobranças para produção do trabalho e conselhos! À Igor Neves, amizade vinda do estágio e que perdurou para o tcc, sou grata pela imensa ajuda na produção da diagramação e por me acalmar.

Aos meus amigos de longas datas e de jornadas anteriores a faculdade, minha eterna amiga da escola Victória Genuíno, em que a amizade cresce sempre e compartilhamos nossas novas experiências e conquistas; baixinha mais fofa Amanda Soares pela amizade que fez meu ensino médio mais feliz com nossos almoços na padaria e as aulas de dança; e ao meu amigo Gabriel Faheina por sempre escutar meus desabafos, crises existências e as teorias louca.

Agradeço a todos os professores com quem tive contato durante a graduação, em especial ao meu orientador, Fhillipe Germano, meu muitíssimo obrigada por ter exercido seu papel com tanta maestria, compartilhando seu conhecimento, disponibilizando assistência e contribuindo na construção desse trabalho com paciência em todas as orientações. Agradeço por ter me acolhido tão bem como orientanda e como aluna durante os anos de graduação.

Não poderia esquecer da minha querida amiga e coorientadora Mirella Braga, sou grata pelo carinho, compreensão e ajuda desde o primeiro encontro e que foram imprescindíveis para minha construção acadêmica. Agradeço pelas inúmeras e valiosas orientações, por despertar meu amor pelo patrimônio e me incentivar a continuar escrevendo sobre o que tanto amo, pois, sua ajuda foi primordial para construção desse trabalho. Obrigada por tudo, de todo coração, e toda a minha admiração por você como profissional e pessoa.

Agradeço aos membros da banca, professora Maiara Belo e M.ª Natállia Azevêdo, por aceitarem contribuir com esse trabalho. Gratidão à professora Maiara também por ter me feito ansiar pelas aulas de história, almejando sempre mais conhecimentos. Sem dúvidas, sou grata por ter sido sua aluna e ter sido contagiada com seu amor pelo ensino.

Agradeço ao Eduardo e Mariana, por todo aprendizado no estágio, conselhos, paciência nos ensinamentos e momentos de descontração que ficaram sempre marcados comigo.

Por fim, com muito amor, agradeço a todos que me fizeram ser a pessoa que sou hoje, por serem como pequenas e coloridas peças de azulejos que formam o silhar da minha vida.

“Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.

E eu me sinto completamente feliz.

Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.”

(Cecília Meireles)

RESUMO Este trabalho de conclusão de curso pretende analisar as imagens dos azulejos lusitanos no Brasil, com atenção específica as peças presentes no Convento de Santo Antônio, que se localiza no terceiro polo histórico mais antigo do Brasil, cidade de João Pessoa, na Paraíba. No início em 1589, a obra se fez singela, de taipa com apenas um claustro e doze celas, posteriormente, passa por ocupações diversas e ampliações, que permite a criação de novas linhas arquitetônicas com características do barroco tropical que se tornam definitivas ao longo do século XVII. O convento apresenta um complexo acervo artístico, com pinturas, detalhes esculpidos em pedra calcária e azulejos inseridos em múltiplos recortes temporais. Pretende-se estabelecer uma perspectiva histórica relacionada à cronologia do azulejo como elemento decorativo e de revestimento do surgimento ao Brasil nos séculos XVI, XVII e XVIII, advindo do processo de aculturação pela colonização portuguesa, assim, com o mesmo gosto, técnica e matérias da matriz e com um simbolismo de um traço da herança construtiva da época. A investigação de caráter exploratório pretende o estudo desses elementos artísticos, percorrendo as searas dos recortes temporais e influências por meio de uma narrativa visual memorizada em cada painel azulejar presente em diversos ambientes do convento, com início no adro com os nichos decorados com a narrativa da Via Sacra, os azulejos policromáticos do galilé e claustro e os monocromáticos da nave da Igreja de São Francisco. Simultaneamente, traçando uma trajetória da análise iconológica e iconográfica com enfoque nas peças da nave, o maior conjunto azulejar figurativo do convento com 23 metros de representações figurativas narrando a saga de José do Egito produzidas pelo mestre azulejar Teotónio dos Santos, que percebese as semelhanças com fontes e manuais iconográficos que foram amplamente difundidos e utilizados na América Portuguesa e Europa, para a criação de obras com temáticas com atributos e personificações específicos.

Palavras-chave: Azulejaria; Narrativa visual; análise iconológica e iconográfica.

ABSTRACT This work analyzes the images of Portuguese tiles in Brazil, bringing especific attention to the pieces present in the Convento de Santo Antônio, located in the third oldest historical pole in Brazil, city of João Pessoa, Paraíba. In the beginning in 1589, the work was simple, made of mud with only one cloister and twelve cells, later, it went through different occupations and extensions, which allowed the creation of new architectural lines with characteristics of the tropical baroque that became definitive throughout the XVII century. The convent has a complex artistic collection, with paintings, details sculpted in limestone and tiles inserted in multiple time frames.

It intends to establish a historical perspective related to the tile chronology as a decorative and covering element of the emergence to Brazil in the 16th, 17th and 18th centuries, arising from the process of acculturation by Portuguese colonization, thus, with the same kind, technique and materials from the matrix and with a symbolism of a trace of the constructive heritage of the time. The exploratory investigation intends to study these artistic elements, going through the fields of temporal cutouts and influences through a visual narrative memorized in each tile panel present in different environments of the convent, beginning in the churchyard with the niches decorated with the narrative of the Via Sacra, the polychromatic tiles of the galilee and cloister and the monochromatic tiles of the nave of the Igreja de São Francisco. Simultaneously, tracing a trajectory of iconological and iconographic analysis with a focus on the nave’s pieces, the largest set of figurative tiles in the convent with 23 meters of figurative representations narrating the saga of José do Egito produced by the tile master Teotónio dos Santos, who perceives the similarities with iconographic sources and manuals that were widely disseminated and used in Portuguese America and Europe, for the creation of works with themes with specific attributes and personifications.

Key Words: Tiles; Visual narrative; Iconological and iconographic analysis.

LISTA DE FIGURAS Figura 1: Linha do tempo com mapas cartográficos de 1609 -1645.....................................................46 Figura2: Linha do tempo das atividades diversificadas no Convento de Santo Antônio.......................................................................................................................................................................50 Figura 3: Carotanha com feições indígenas e cabelo em friso ...............................................................52 Figura 4: Planta baixa com registros fotográficos e explicações dos principais ambientes do conjunto franciscano............................................................................................................................................ 53 Figura 5: Imagem do frontispício do Convento de Santo Antônio........................................................57 Figura 6: Painel com pintura em óleo sobre forro de madeira...............................................................59 Figura7:Representações

gráficas

bidimensionais

da

cripta

funerária

subterrânea...............................................................................................................................................................61 Figura 8: Poligonal de tombamento na instância federal..........................................................................63 Figura9: Delimitação do Centro Histórico Inicial de João Pessoa pela instância estadual......................................................................................................................................................................65 Figura 10: A) Azulejo da Coleção do Museu de Évora em Lisboa, Portugal; B) Azulejo da Igreja de N. Senhora da Graça e Colégio Jesuítico em Olinda, Pernambuco........................................................69 Figura11: Linha do tempo com a cronologia azulejar do século XV - XIX...........................................72 Figura12: de São

Representação da planta baixa do Adro do Conjunto Francisco, com identificação dos locais e tipos dos

Cultural azulejos

presentes....................................................................................................................................................................76 Figura13:

Colunas

embutidas

com

enxadrezados

com

cimeiras

e

volutas

trabalhadas................................................................................................................................................................77

Figura 14: A) Deterioração aparentemente causada por chamas de velas; B) Danos gerados aos azulejos com as faces dos algozes de Cristo....................................................................................................79 Figura 15: Nichos simétricos locados nas laterais narrando os primeiros momentos da Paixão de Cristo...........................................................................................................................................................................80 Figura 16: Últimos nichos locados nas laterais narrando os momentos finais e a ressureição de Cristo...........................................................................................................................................................................82 Figura 17: Representação da planta baixa do Galilé do Conjunto Cultural de São Francisco, com identificação dos locais e tipos dos azulejos presentes............................................................................85 Figura 18: Painel figurativo presente no nicho 01 no ambiente do Galilé.........................................86 Figura 19: Esboço do movimento de expansão e contração da forma na arte islâmica com base nos desenhos no livro de Sylvia Leite (2007)...............................................................................................88 Figura 20: Painel Azulejar presente no Galilé do Convento de Santo Antônio................................89 Figura 21: Esboço da criação do octógono com pontas e da forma circular derivado dele.......90 Figura 22: Esquema da relação das formas do azulejo presente no Galilé, primeiro com a base estrutural e, segundo, apenas os elementos. ................................................................................................91 Figura 23: Friso azulejar presente em tumba do complexo Shaki Zinda em Samarcanda, Uzbequistão, do século XIV..................................................................................................................................93 Figura 24: Representação da malha com alternância de estrela e cruz................................................93 Figura 25: A)Lado direito azulejo presente no galilé e claustro do Convento de Santo Antônio; B) Azulejo presente em Lisboa, Portugal.............................................................................................................93 Figura 26: Representação da planta baixa do Claustro Conventual do Conjunto Cultural Franciscano, com a marcação da localização dos azulejos.....................................................................95

Figura 27: Azulejo policromático presente no claustro...............................................................................96

Figura 42: Azulejo holandês da Casa do Poço, Lisboa..............................................................................134

Figura28: Claustro com pátio central cercado por arcadas e colunas com duas

Figura 43: A) Azulejo da Nave da Capela da Jaqueira; B) Azulejo da Igreja de Nossa Senhora da

séries............................................................................................................................................................................97

Saúde........................................................................................................................................................................135

Figura 29: Representação da planta baixa da Nave da Igreja de São Francisco, com a marcação com a

Figura44:

linha azul de onde estão locado os azulejos...................................................................................................117

prisioneiros.............................................................................................................................................................137

Figura 30: A) Representação azulejar de uma arquitetura imponente com caráteres do Barroco

Figura 45: A) Representação do sonho do Copeiro; B) Sonho do padeiro-mor.............................138

Romano; B) Detalhe de representação de vegetação..................................................................................121

Figura 46: Cena de José decifrando sonhos na Bíblia Demarne..........................................................139

Figura 31: Detalhe da cercadura com anjo com folhas e anjo em pilastra..........................................121

Figura 47: Azulejo da Igreja de Nossa Senhora da Saúde.........................................................................139

Figura 32: Painel azulejar com a cena dos irmãos de José colocando-o dentro da cova no

Figura 48: Banquete do dia do nascimento do Faraó...............................................................................141

deserto......................................................................................................................................................................123

Figura 49: O sono do Faraó................................................................................................................................141

Figura 33: Painel azulejar com a cena dos irmãos de José retiram-o do poço para vender aos

Figura 50: Ampliação dos sonhos do Faraó..................................................................................................142

Madianitas, com Judá no centro da representação negociando.........................................................124 Figura 34: A) Ampliação do azulejo; B) “Amor Domato” representado por Cesare Ripa..............126 Figura 35: Painel azulejar representando os irmãos de José tingindo sua túnica com sangue......................................................................................................................................................................127 Figura 36: Irmãos de José entregando ao pai a túnica suja de sangue................................................128 Figura 37: Painel histórico com José fugindo da mulher de Putifar.....................................................128 Figura 38: A) Gravura da Bíblia de Jean de Tournes; B) Gravura da Bíblia de Giullame Rouillé; C) Bíblia de Melchior Küsel......................................................................................................................................131 Figura39:Gravura

de

Michel

Demarne

com

José

fugindo

da

mulher

de

Putifar........................................................................................................................................................................132 Figura 40: Gravura de artistas eslovacos........................................................................................................133 Figura 41: Pintura representando José e a mulher de Pufitar.................................................................133

Painel

de

azulejo

com

José

na

prisão

decifrando

os

sonhos

dos

Figura 51: José se encontrando com o Faraó...............................................................................................143 Figura 52: José se encontrando com o Faraó.............................................................................................145 Figura 53: José do Egito montado em um belo cavalo...........................................................................146 Figura 54: José percorrendo as terras do Egito para incrementar a produção..............................148 Figura 55: José entregando sacos de trigo aos necessitados...............................................................151 Figura56: José, como administrador do Egito, recebendo os irmãos que vão comprar trigo...........................................................................................................................................................................153 Figura57: José, como administrador do Egito, recebendo os irmãos que vão comprar trigo...........................................................................................................................................................................156 Figura 58: José conhecendo seu irmão caçula, Benjamim. ...................................................................157 Figura 59: José no banquete com seus irmãos.............................................................................................157

LISTA DE MAPAS Mapa 1: Mapa holandês ilustrando a cidade de Frederica durante o período de dominação holandesa..................................................................................................................................................................41 Mapa 2: Mapa de localização com o mapa do Brasil destacando a Paraíba, posterior o mapa de João Pessoa, capital paraibana, com marcando o centro da cidade e, por fim, a localização do convento....................................................................................................................................................................48

LISTA DE SIGLAS IPHAEP

Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba

IPHAN

Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

SPHAN

Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

AECI ACEHRVO PRODETUR DEPAM

Agência Espanhola de Cooperação Internacional Associação Centro Histórico Vivo Programas Regionais de Desenvolvimento do Turismo Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização

Já durante a Ditadura Civil-Militar nos anos de 1964-1985, criou-se o Centro Nacional de Referência Cultural (CNRC) em 1975, devido as metas politicas utilizarem a cultura como meio de expansão para o desenvolvimento social, assim, baseado na concepção antropológica de Cultura, introduziu o conceito de “bem cultural”, ampliando a compreensão do que é patrimônio. (NOGUEIRA; FILHO, 2020) O patrimônio religioso brasileiro da Era Vargas2 é formado por uma diversidade de igrejas, conventos e capelas presentes em diversos locais, como Salvador e Recife, pontos de grande circulação do capital financeiro enquanto colônias. A dimensão estilística do barroco teve ampla expressão no período colonial e se fez presente nessas construções, atuando, segundo Souto Maior (1988) apud Burity (2008), de forma dinâmica, ampliando seus limites além do âmbito artístico e aprofundando-se em esferas políticas, culturais e sociais por meio da propagação visual da dramatização de temas religiosos com objetivo de catequisar, doutrinar e emocionar os expectadores por meio de elementos alegóricos, como o azulejo.

N

o Brasil, durante o Estado Novo (1937-1945), ocorreu a criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), que, por meio do Decreto-Lei nº25 de 30 de novembro de 1937, criou o instrumento de tombamento, fazendo dele sinônimo de preservação incidindo sobre bens materiais. Por muito tempo na política de patrimônio brasileiro, as ações privilegiaram dois âmbitos: o primeiro o patrimônio em pedra e cal, como igrejas, chafarizes, fortes, prédios e conjuntos urbanos representantes de uma dada escola, como o barroco no período colonial; e em segundo, as expressões culturais de classes dominantes, como da tradição de herança luso-colonial. Com isso, acabaram por excluir expressões e manifestações que não tinham natureza material ou que tivesse origem em senzalas ou quilombos (NOGUEIRA; FILHO, 2020)1.

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1 Módulo 01 “Afinal, o que é patrimônio? Conceitos e suas Trajetórias” do curso Formação de Mediadores de educação para Patrimônio ofertado pela Universidade do Ceará no ano de 2020.

Cavalcanti (1963) informa que o surgimento da pedra lisa e escorregadia azulada denominada de azulejo veio dos mesopotâmicos devido as necessidades construtivas para impedir a impermeabilidade de água e a abundância de solo úmido. Alcântara (2001), posteriormente, afirma que o elemento passou a ser assimilado pela civilização islâmica e introduzida na Península Ibérica, com Málaga sendo uma grande produtora e exportadora de azulejos, logo após para Espanha, Ilha de Majorca, Itália e o restante da Europa, incluindo Portugal, que foi um marco na valorização e desenvolvimento desse elemento. Utilizado como ícone da cultura de Portugal e transmitido para terras brasileiras por meio do processo colonizar português, logo ocorreu o uso em larga escala no século XVI, XVII e XVIII e recebidos os melhores exemplares, como os que decoram o interior da igreja de Nossa Senhora dos Prazeres nos Montes Guararapes, em Pernambuco, como citado por Simões (1980).

2 A Era Vargas refere-se ao período de governo de Getúlio Vargas, com primeiro com a chegada de Vargas ao poder em 1930; o Governo Constitucional dos anos 1934 a 1937; o golpe do Estado Novo em 1937; e sua deposição em 29 de outubro de 1945. (AMORIM, 2010)

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O objeto de estudo é um exemplar barroco, o Convento de Santo Antônio ordem Franciscana, também conhecido como o Conjunto Cultural de São Francisco, localiza-se no terceiro polo histórico mais antigo do Brasil, cidade de João Pessoa, na Paraíba. Inicialmente, foi construído de taipa e com uma planta simples em 1589, passando por processo de ocupação por holandeses que utilizaram como fortim em 1634 e, no século XVII, depois da expulsão dos invasores, foi ampliado e com as paredes substituídas por alvenaria de pedra calcária, matéria-prima extraída das suas próprias instalações (OLIVEIRA, 2008).

O convento apresenta um complexo artístico de grande notoriedade, são adornos feitos em pedra calcária, no forro da nave as pinturas trompe l’oeil3, no forro do altar-mor as vinte cenas da vida de Santo Antônio de Pádua e conferindo particular atenção, os azulejos que foram aplicados em diferentes períodos de formação do Conjunto Cultural de São Francisco e que apresentam elementos característicos da tradição franciscana que serão descritos e representados por meio de fotografias no capítulo 02, podendo citar os policromáticos do estilo tapete do século XVII que decoram o galilé e pátio; no século XVIII, com o azulejo figurativo com monocromia azul presente no adro com seis nichos representando a Via Sacra; e um conjunto de 23 metros que decoram as paredes da nave conventual narrando a saga de José do Egito, personagem bíblico do antigo testamento.

Simões (1980) apud Nóbrega (1974) destaca o adro do convento como um exemplar notável e o maior do seu gênero, com paredes laterais azulejadas com ladrilhos brancos e azuis e nichos com painéis de azulejos que narram a Via Sacra, porém, ressalta a existência do desgaste sofrido pelas peças pelo tempo e pelos vândalos. É existente a problemática da desvalorização e desgaste de elementos e documentos que narram o pertencimento e consolidação da nossa cultura devido 30

3 Técnica artística na qual utiliza truques de perspectiva para criar ilusão ótica, inspiração vem de Leonardo da Vinci (1452-1519) e Miguelangelo (Buonarroti, 1475-1564). (BURITY, 2008, p. 118)

ao descaso e ausência de cuidado com os mesmos, pode-se citar Humberto Nóbrega (1974) fala sobre a existência de um patrimônio artístico e arquitetônico maior no passado, devido a ação deteriorava do tempo e ausência s de medidas de proteção e preservação dos poderes públicos e autoridades eclesiásticas, citando, por exemplo, o caso de fortes históricos que atualmente perduram apenas na memórias, como o Forte Velho (Forte de Santo Antônio 4). É possível destacar materiais existentes que classificam os elementos presentes no convento, como o Inventário dos Azulejos do Convento de Santo Antônio elaborado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba (IPHAEP), que tem como foco a classificação alvo dos azulejos da metade do século XVIII criados pelo mestre azulejar Teotônio dos Santos que narra a história de José do Egito.

No entanto, existem outros tipos de azulejos com igual importância devido ao seu período histórico e sua produção, como no caso dos azulejos policromáticos do estilo tapete do século XVII presente no Claustro, e a ausência de documentos que desenvolvam uma análise aprofundada considerando a iconografia e a iconologia presente no silhar azulejar do Convento de Santo Antônio.

A pesquisa em questão utilizará de conceitos que envolvem a educação patrimonial para os usuários e visitantes, prática sociocultural que aflora as relações de pertencimento e identidade dos diversos segmentos da sociedade, bem como utiliza de conceitos da arquitetura religiosa.

4 O Forte Velho, também conhecido como Forte de Santo Antônio ou denominado como “Castrum Boréale”, localizava-se à margem esquerda da barra do Rio Paraíba do Norte, no estado da Paraíba, Brasil, segundo Nassau (1638) apud Barléu (1974), uma construção de base quadrada com quatro baluartes.

Inicialmente, com a Guerra Holandesa (1630-54), era um simples reduto construído no na de 1631 em frente ao Forte do Cabedelo, comandado pelo Capitão Duarte Gomes da Silveira e, ampliado e reforçado em 1633, pelo Engenheiro militar Diogo Paes (BARRETTO, 1958). Barléu (1974) relata sobre o abandono do forte devido as grandes despesas.

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O presente estudo visa como objetivo geral a proposição de um estudo iconográfico e iconológico dos azulejos portugueses na nave da Igreja de São Francisco e correlacionar os distintos recortes temporais dos azulejos presente no Convento de Santo Antônio na Igreja de São Francisco na cidade de João Pessoa, Paraíba, acompanhado dos objetivos específicos que pretende compreender a cronologia do azulejo português e sua inserção na cultura brasileira, investigar os azulejos presentes na área de estudo, como adro, galilé e o claustro, assim como classificar os mesmos de acordo com o período histórico e influência e compreender o local de estudo, incluindo a implantação e locação na cidade no período colonial. Além disso, será proposto um glossário ao final do trabalho, com intuito de facilitar o entendimento dos termos arquitetônicos e gerais usados no decorrer do trabalho.

Pode-se resumir, que o primeiro capítulo discutirá a visão histórica e social do desenvolvimento da Capitania Real da Parahyba e a vinda dos Frades Menores de São Francisco, assim como trará o objeto de pesquisa, Convento de Santo Antônio, apresentando o contexto socioespacial do surgimento e implantação, assim como características arquitetônicas e ambientes.

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Em seguida, no segundo capítulo trata-se da contemplação dos azulejos, iniciará com a história do mesmo, contando sua origem e cronologia, visando compreender sua inserção na cultural brasileira, assim como, posteriormente, será apresentado os recortes temporais e históricos dos azulejos presentes no Adro, Galilé e Claustro. Já o terceiro apresentará primeiramente uma discussão sobre o uso da imagem, com suas abordagens e eventos da Igreja que foram realizados com intuito de debater sobre a iconoclastia; assim como, será apresentado as metodologias para análise da imagem; e, por fim, a análise iconográfica e iconológica dos painéis azulejares monocromáticos figurativos presentes na nave da Igreja de São Francisco, abordando as cenas pictóricas e as respectivas passagens bíblicas que deram origem a pintura, assim como gravuras e ilustrações que possam ter servido de subsídio para criação das cenas, nessa análise.

A metodologia está baseada na Pesquisa exploratória definida por Prodanov e Freitas (2013), que consiste em uma pesquisa que, quando se encontra na fase preliminar, busca informações sobre a temática investigada, com definições e delimitação do tema, com intuito de fixar os objetivos, formular hipóteses ou a descoberta de um novo tipo de enfoque para o assunto em questão. Pode citar formas de realizar esse tipo de pesquisa, como, por exemplo, o levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que analisaram o tema e análise de exemplos que auxiliem na compreensão.

Com base no levantamento bibliográfico orientado para a pesquisa de caráter exploratório, será construído uma base teórica coletada por meio de livros, dissertações de mestrado, teses de doutorado e artigos publicados.

O aporte teórico que subsidiará no resultado será realizado através de uma revisão bibliográfica a respeito inicialmente do azulejo português, como elemento identitário, ressignificado e consolidador da cultura brasileira, incluindo a sua origem, seus diversos tipos e sua inserção no âmbito arquitetônico e religioso.

Será estudada referências bibliográficas relacionadas a temáticas anteriormente expostas, podendo citar, por exemplo, as obras de João Miguel dos Santos Simões (1980), Dora Alcântara (1980), Sylvia Tigre de Hollanda Cavalcanti (2002), Ingrid Moura Wanderley (2006), Patrícia Sarrico (2009).

Com relação aos aspectos teóricos introdutórios relacionado a historiografia pessoense foram utilizados autores como Aguiar (1985), Glauce Burity (2008), Carla Mary S. Oliveira (2008) e Michael Douglas dos Santos Nóbrega (2015), com intuito de analisar o surgimento da Capitania real da Parahyba, a vinda da Ordem dos Frades Menores de São Francisco e a origem do Convento de Santo Antônio. Assim

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como foi utilizado autores para o entendimento da evolução urbana da cidade de João Pessoa e o impacto na área estudada, como Scocuglia (1999) e Moura Filha (2005).

Encontra-se também autores voltados para às pesquisas analíticas sobre pigmentação dos azulejos, assim como o estudo das teorias semióticas e da simbologia da cor, podendo citar autores como Saussure (2006), Panofsky (1976), Peirce (2005), Heller (2013), Panofsky (2007) Pedrosa (2010) e Dugnani (2012), que apresenta uma análise iconológica dos painéis do claustro da igreja de São Francisco da Bahia, na qual afirma que “entender os azulejos setecentistas é construir uma parte da identidade histórica à luz de novas interpretações” (DUGNANI, 2012, p. 21).

Além da pesquisa bibliográfica e exploratória, será realizada visitas in loco de suma importância para o aprofundamento os conhecimentos e análises iconográficas e espaciais do objeto de estudo.

Com isso, para atender os objetivos do trabalho em questão, serão feitas visitas ao convento para realizar o levante fotográfico do acervo azulejar do adro, galilé e pátio a fim de permitir a análise e identificação das peças azulejares com suas respectivas importâncias e contribuições para o patrimônio material presente no convento, assim como redesenhos para compreender os azulejos estudados.

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Dessa forma, a pesquisa terá como foco o entendimento da evolução dos azulejos inseridos em recortes temporais distintos do Convento de Santo Antônio da ordem Franciscana, de forma a compreender as múltiplas camadas que resultam no percurso do desenvolvimento da obra facilitando o entendimento do conjunto arquitetônico como um todo e ressaltar a necessidade de propor o estudo iconográfico e iconológico, que permita o entendimento do contexto social, histórico e cultural possibilitando a difusão do conhecimento e valor desse patrimônio religioso, artísticos e cultural.

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1.1 A Capitania real da Parahyba e a Ordem dos Frades menores de São Francisco

N

os séculos XV e XVI, as expansões marítimas dos impérios europeus, como Portugal, Espanha e França, estavam evidência segundo Seabra5 (2014, p.2325), nesse mesmo contexto histórico, está o processo de descobrimento e colonização sofrido pelo Brasil. Para melhor defesa e ocupação da costa do Brasil, foi imposto um sistema de Capitanias Hereditárias pelo Dom João III, com limites do litoral ao Meridiano de Tordesilhas e divisão em 14 lotes com a governança dada a capitães donatários com caráter vitalício e hereditário, como descrito pelo mesmo autor. Com particular atenção ao Nordeste, a ocupação pode ser caracterizada em dois momentos: a tomada de posse dos donatários e a presença dos franceses em busca de pau-brasil (MOURA FILHA6, 2005).

A Capitania Real da Parahyba teve sua origem em 1574 com limite ao sul do rio Abiaí até a Baía da Traição, devido ao desmembramento da Capitania de Itamaracá por motivos de declínio econômico e conflitos entre portugueses e potiguara. Para garantir a posse da capitania e combater os Potiguara foram realizadas quatro expedições, a primeira chefiada pelo ouvidor-geral e provedor-mor de Pernambuco Fernão da Silva, a segunda e terceira pelo comerciante português Frutuoso Barbosa e a última por Martim Leitão, “partiu de Pernambuco em direção ao Estuário do Rio Parahyba, à frente de 500 combatentes, somados a centenas de índios domesticados e escravos” (SEABRA, 2014, p. 31), no qual dominaram os Tabajara e portugueses, os nativos criaram uma aliança para lutar contra os Potiguara.

O pacto foi celebrado em 5 de agosto de 1585 por intermédio de João Tavares às margens do Rio Sanhauá, local onde foi construindo o forte de madeira e fundada a cidade de Nossa Senhora das Neves com posição estratégica de defesa, inicialmente chamada

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5 Pós-Dr. Giovanni de Farias Seabra, professor titular da Universidade Federal da Paraíba e Professor Visitante da Universidade Federal de Roraima.

6 Citação indireta do trabalho para conclusão do doutorado De Filipéia à Paraíba: Uma cidade na estratégia da colonização do Brasil séculos XVI-XVIII de Maria Berthilde Moura Filha, graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Paraíba (1986), com mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia (1997), doutorado em História da Arte pela Universidade do Porto (2005) e pós-doutorado na UFRN(2015).

de Filipéia de Nossa Senhora das Neves para homenagear o Rei da Espanha Filipe II; em 1634 denominada de Frederica, devido ao domínio holandês; em 1654, de Parahyba com a restauração; e, a partir de 1930, chamada de João Pessoa.

A cidade de Nossa Senhora das Neves possui um planejamento urbanístico resultante da junção de fatores históricos, geográficos e geológicos, podendo exemplificar ao reproduzir os moldes das colônias portuguesas devido a influência de Portugal, no qual apresenta um traçado bipartido, com cidade baixa, destinada ao comércio e atividade portuária, e cidade alta, ao centro administrativo e religioso; assim como das colônias espanholas devido ao traçado retangular da cidade alta, cercado por edificações que representam o poder da época; e localização privilegiada devido a abundância de água e pedra calcária (PEREIRA; AMARAL, 2014). Com isso, é possível observar que a cidade contraria o urbanismo “desleixo” e sem planejamento descrito na obra de Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil (1936), o povoamento é consolidado com fácil acesso as riquezas.

No período holandês7 na cidade de Nossa Senhora das Neves, instalaram-se quatro ordens religiosas na cidade alta: os franciscanos, jesuítas, beneditinos e carmelitas, conjuntura essa que “transformaria de forma efetiva os dispositivos e construção da cidadela onde estariam sendo erguidas as principais construções religiosas” (BARBOSA, 1953 apud PEREIRA; AMARAL, 2014, p.11) e “principal veículo de transmissão dos padrões estéticos e 7 A invasão holandesa foi persistente e obtiveram domínio da maior parte das capitanias do Nordeste do Brasil, se apropriaram de estruturas edificadas que eram favoráveis e aniquilaram as que eram favoráveis aos seus antigos ocupantes, como incendiaram Olinda e na Paraíba instalaram nos fortes e mosteiros. Moura Filha (2010) cita um relato da época que dá uma contextualização sobre o caos na cidade “(...) los mercadores que de la Parahiba avian sacado sus mercadorias, conociendo que todo yba a cair em manos de los holandeses lo querian dar todo para que los defendiessen y amparassen com las armas, y em la esperança de que em algun tempo se les pagaria lo que daban,(...) y desenganados los moradores, y pustas sus famílias em parte segura” (B. N. M – MSS 2.365 – fl. 9-12v apud MOURA FILHA, 2010, p. 235) Na primeira tentativa de invasão holandesa ao Convento de Santo Antônio faleceu o guardião Frei Manuel da Piedade na Fortaleza de Santa Catarina em combate com os invasores e, com a segunda invasão holandesa e abandono do convento pelos franciscanos, os holandeses fizeram do convento seu quartel general e residência do governador, a edificação foi fortificada para servir de asilo ou refúgio em caso de necessidade e construíram em torno uma trincheira com bateria em frente à igreja para dominação da entrada. Com a dominação holandesa e força da invasão batava e ocupação, o convento encontrava-se danificado e, em 1655, ocorrendo a Restauração Pernambucana, foi o Frei Manuel dos Mártires e, em 1656-57, reocupação do convento e reinício das obras (BURITY, 2008).

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do ideal de monumentalidade característico da arquitetura no Brasil então” (MOURA FILHA, 2005, p.38). Com isso, surgiram edificações com o intuito de representar o poder dos quatros segmentos eclesiásticos, como igrejas e mosteiros, e da Coroa Portuguesa, ainda conforme a visão de Moura Filha (2005, p.12) que atuariam com uma “montagem da teia de relações com os demais elementos morfológicos que constituem a cidade”, como as ruas, becos e largos da cidade.

Em João Pessoa, a igreja representava o seu poder de forma marcante enquanto configuração arquitetônica e urbanística, formando um traçado em cruz com cada ordem religios (as ordens fransciana, jesuíta, beneditina e carmelita) ocupando um extremo confirmando a intenção de ortogonalidade da planta e condicionando o posicionamento de quadras e lotes. O traçado urbano regular de cidades reais subordinadas diretamente a Portugal foi inspirado nas ideias urbanas renascentistas cumprindo os objetivos políticos de controlo do território e afirmação do poder real (TEXEIRA, VALLA, 1999 apud MARTINS, 2011).

Em uma sequência, a urbanização e os monumentos da cidade de Nossa Senhora das Neves foram iniciados com a ladeira de São Francisco, que ligava o forte no Varadouro à igreja de Nossa Senhora das Neves; posterior a matriz, surge o Convento de Santo Antônio da Ordem Franciscana; transversal à ladeira, origina-se a segunda rua denominada de Rua Nova, com casas de pedra e cal; e outros monumentos de ordens religiosas, como o Mosteiro de São Bento, o Convento de Nossa Senhora do Carmo, Igreja da Misericórdia e a Capela de São Gonçalo.

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Pode ser observado no mapa holandês intitulado de “AFBEELDINGHE van PARIBA ende FORTEN” (1634) abaixo a representação do sitio urbano de Frederica (mapa 01), com a representação de edificações, como do Convento de Santo Antônio na letra A, que durante a dominação holandesa atuava com função de fortaleza e possuía uma muralha cercando a edificação (BURITY, 2008); a Igreja Matriz na letra B; o Mosteiro de São Bento na letra C; e a Santa casa de Misericórdia na letra D. As primeiras ruas são a Nova e a Direita8, respectivamente, marcadas nas letras E e F, a ladeira de São Francisco na letra H e o Rio Sanhauá na letra 8 Atualmente, a Rua Nova é denominada de Avenida General Osório e a Rua Direita de Rua Duque de Caxias.

Mapa 1: Mapa holandês ilustrando a cidade de Frederica durante o período de dominação holandesa editada com a numeração.

Fonte: MARTINS, 2011, p. 7.

G. A autora Martins (2011) relata que os mapas denotam a ênfase daquilo que a imagem se

ocidental, como o ensino da língua portuguesa, porém, o Prelado de Pernambuco passou a

propõe a destacar, como as figuras humanas no canto inferior direito representando a tomada da cidade pelos holandeses.

missão de catequese a representantes do Clero Secular, mas não houve desenvolvimento no

A cidade possuía como base econômica a atividade da cana de açúcar e com a fé cristã difundida pelas ordens religiosas, como a franciscana, que, em 1589, iniciava a construção do Convento de Santo Antônio. A relação dos franciscanos com a história da cidade vai além do âmbito religioso e da catequese, atuando também em ações educativas e culturais, como, por exemplo, a arquitetura, pintura, cantaria, talhas e azulejarias (BURITY, 2008).

O primeiro convento franciscano fundado foi em Olinda devido concentração de engenhos de açúcar e riqueza, vila-sede da capitania de Pernambuco. Ao decorrer de dois séculos, foram construídos mais vintes e dois conventos pelo Brasil, atualmente, ainda restam dezenove, com treze sendo localizados no nordeste, no qual são “focos de referência histórica e interação sociocultural nos sítios onde foram construídos” (CARVALHO, 2009, p.30) e apresentaram soluções inéditas relacionadas as composições dos frontispícios e conjuntos de painéis azulejares descrito como “um dos mais significativos acervos de Arte no Brasil, cujo programa iconográfico é uma importante fonte de entendimento, não só da história dessa Ordem, mas também do período barroco e rococó no mundo luso-brasileiro” (CARVALHO, 2009, p. 30).

Os franciscanos estavam presentes desde o descobrimento, sendo de 1500 a 1549 “os únicos religiosos que, motivados pelo espírito de propagação da fé e dilatação do cristianismo, fincaram as bases de uma ação missionária” (BURITY, 1988, p.31), porém ao comparar com outros autores, ocorre divergência de datas, como o relato que “A Ordem franciscana chegou à Terra de Santa Cruz nos idos de 1587, atraída pelas gestões de D. Antônio Barreiros” (NÓBREGA, 1974, p. 13) e sobre a fixação definitiva da Ordem dos Frades Menores de São Francisco no século XVI (CARVALHO, 2009), que foi de grande importância para o processo de conquista e instalação da Capitania Real da Paraíba como descrito por Oliveira (2006), com a existência de disputas por espaço e influência com os jesuítas e beneditinos.

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Segundo Burity (2008), as ações missionárias dos franciscanos iniciaram uma nova época na teoria e na metodologia da evangelização, com objetivo a conversão da população indígena à fé católica e pacificação, condicionado ao projeto colonizador, onde ocuparam cinco aldeias indígenas: Almagra, Praia, Assento de Pássaro, Joanne e Mangue. O método dos franciscanos possui fatores importantes a iniciação da catequese pelas crianças para depois chegar nos adultos e o uso da língua indígena, onde pode-se citar Frei Bernardino das Neves que dominava a língua vernácula e indígena (ILHA, 1975 apud BURITY, 2008). O Convento de Santo Antônio foi o fulcro das ações missionárias de 1589 a 1619, no qual, os franciscanos ocuparam com zelo e dedicação atuando além do seu objetivo e transmitindo fontes da civilização

trabalho catequético como visto por Burity (2008).

Nóbrega (1974) fala sobre a existência de um patrimônio artístico e arquitetônico maior no passado, devido a ação deteriorava do tempo e ausências de medidas de proteção e preservação dos poderes públicos e autoridades eclesiásticas, citando, por exemplo, o caso de fortes históricos que atualmente perduram apenas nas memórias, como o Forte Velho (Forte de Santo Antônio) e o Forte do Varadouro ou Forte de Nossa Senhora das Neves. Assim também ocorreu com duas das três Casas da Pólvora e dos Armamentos, as duas mais antigas arruinaram-se, com a primeira localizada na Rua Nova e a segunda no chamado Passeio Geral, atualmente Rua Rodrigues Chaves, porém a da Ladeira de São Francisco permanece; e com os pontos fontanários, com quase todos acabados, como a Bica do Gravatá, na confluência das Ruas das Convertidas com a da Palha (Rua Duarte Lima) construída em 1785, e a Bica de Tambiá, de 1782 por feita por donativos e contribuição popular.

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O material utilizado em muitos dos marcos históricos presente na região central

A produção da cartografia era de fundamental importância para o conhecimento e

do município de João Pessoa foi o calcário da Formação Gramame, sedimento presente ao oeste da cidade, com registros bibliográficos e históricos que constam a utilização desse elemento no período colonial, como, por exemplo, Gazeta da Parahyba descreve em 1888: “[...] Cidade de mármore e de granito, tu és a mais formosa entre as cidades do mundo” e “[...] Lodo e lama são, de resto, oh Parahyba, os calcários valiosos que caracterizam a tua forma material”. (GAZETA DA PARAIBA apud PEREIRA; AMARAL, 2014, p. 13) ou na poesia de Jomar Moraes de Souto, em um dos versos descrevendo “’Senhora de um grande porto’, com excelente água e pedra de cal para construção” (SOUTO, 1970 apud AGUIAR, 1986, p. 40).

controle do território, contribuindo para a política colonizadora portuguesa por favorecer na apropriação territorial. O autor Bueno (1998) apud Martins (2011) ainda relata que essa forma artística de representação do continente também era uma forma registrar e transportar objetos de formas impropriáveis, revelando uma nova maneira de conhecer um continente recém-descoberto ladeado de lendas do imaginário europeu.

A matéria-prima foi utilizada de forma diversificada, como argamassa, cal ou blocos rochosos para alvenaria e elementos decorativos, uma técnica construtiva vernácula presente desde a construção da Fortaleza de Santa Catarina em Cabedelo e usada e transportada para Olinda, onde ocorreu a aplicação em arcos, retábulos e altares, como na Igreja de Nossa Senhora das Graças (OLIVEIRA; GHETTI; ALVES; 2016). Dessa forma, é notório a utilização do material advindo da bacia sedimentar do município, que proporcionou sedimentos e matéria-prima que influenciaram na arquitetura da época, como a Casa da Polvóra e dos Armamentos, a Igreja da Santa Casa da Misericórdia e o Convento de Santo Antônio.

Muitas informações obtidas da formação brasileira e da Capitania Real da Parahyba durante os meados do século XVI e XVII advém da produção cartográfica, que pode ser analisado como qualquer outro objeto da cultura material, considerando seu contexto social de produção, circulação e consumo. No entanto, muitas vezes, os mapas não eram resultante de uma observação direta, “pois, quando as localidades eram muito distantes, este trabalho era feito pelos viajantes, pilotos ou locais cabendo ao cosmógrafo a preparação e iluminação das cartas e atlas manuscritos” (BUENO, 1998, p. 95 apud MARTINS, 2011, p. 2).

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A Filipéia de Nossa Senhora das Neves possui um rico acervo de mapas e vistas da iconografia portuguesa e holandesa retratando os primeiros séculos de fundação da capitania. A produção cartográfica e de manuscritos holandesa contemplando Paraíba e Pernambuco foi resultado da presença neerlandesa no Norte do Brasil. No século XVII, foi aprimorado o sistema de representação com a impressão das cartas nos Países Baixos auxiliando na atividade mercantil da Companhia das Índias Ocidentais e com a vinda do Conde João Maurício de Nassau possibilitou a primeira expedição científica e artística às terras brasílicas, com objetivo de registrar o novo sob domínio holandês.

A autora Dayse Martins (2011) discorre sobre a produção cartográfica destacando os mapas produzidos pelos cosmógrafos João Teixeira Albernaz, o Velho (1602 – 1666) e João Teixeira Albernaz, o Moço (1627 – 1675) a serviço do Rei Portugal e o cartógrafo Johannes Vingboons, que elaborou o Atlas Geral do Brasil Holandês sob governo do Conde Nassau.

Para compreensão da temática da iconografia relacionada ao universo de produção cartográfica e o contexto histórico de João Pessoa, foi desenvolvido uma linha do tempo (Figura 01) com imagens dos mapas produzidos no período de 1609 a 1645.

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Figura 1: Linha do tempo com mapas cartográficos de 1609 -1645.

Fonte: Elaborado pela autora, 2020.

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1.2 O Convento de Santo Antônio da ordem Franciscana O Convento de Santo Antônio da ordem Franciscana localiza-se no Largo de São Francisco no centro da cidade de João Pessoa, capital paraibana, próxima a construções históricas, como a Casa da Pólvora e a Igreja da Ordem Terceira do Carmo.

Potiguares; aí fizeram e muito mais do zelo da salvação das almas, recebeu esta casa com intento de aproveitar não somente aos portugueses, que novamente fundavam esta cidade, mais ainda aos índios ensinando-lhes os nossos Religiosos a santa doutrina, como fizeram em muitas aldeias. (LIVRO DOS GUARDIÕES DO CONVENTO DE SANTO ANTÔNIO, 1986, p. 257)

Os primeiros guardiões foram o Frei Antônio do Campo Maior (1590) e o Frei Melchior (Padre Custodio) eleitos pelo primeiro Prelado da Paraíba, e o Frei Francisco dos Santos foi o responsável pelo traçado da primeira planta do convento, que “(...) se concluoi em breve tempo uma casa ou recolhimento com doze cellas, claustro e oficinas, com seu oratório. Nesse se recolheram os Religiosos, tratando de levantar Igreja que acabarão brevemente, dedicada ao glorioso Santo Antônio, que se havia escolhido por Patrão da Custodia” (JABOATÃO, 1761, p. 138 apud MOURA FILHA, 2010, p. 154).

Mapa 02: Mapa de localização com o mapa do Brasil destacando a Paraíba, posterior o mapa de João Pessoa, capital paraibana, com marcando o centro da cidade e, por fim, a localização do convento. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

O convento foi executado com objetivo de servir ao atendimento religioso e auxiliar na doutrinação das tribos potiguaras e na pacificação entre os nativos e colonos, a data da fundação é encontrada no Livro dos Guardiões do Convento de Antônio da Paraíba (1986):

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FUNDAÇÃO E PRINCÍPIO DESTE CONVENTO DE SANTO ANTÔNIO DA PARAÍBA. No ano de mil quinhentos e noventa, aceitou esta casa de Santo Antônio da Paraíba o Irmão Frei Melchior de Santa Catarina, primeiro Prelado e fundador desta Custódia, o qual obrigado a instância, que o Capitão Frutuoso Barbosa, e outros conquistadores desta Capitania, que até aquele tempo estava ocupada de índios

Em 1608 foi datado o término da construção do primitivo convento e igreja para 12 frades citado anteriormente pelo Frei Jaboatão , posteriormente, são criadas novas linhas arquitetônicas que se tornam definitivas ao longo do século XVII e, para “no século seguinte, atingir o apogeu de sua beleza barroca, com a construção da igreja” (BURITY, 2008, p.36). O convento foi construído simultaneamente com a igreja, ambos possuíam caráter provisório com convento ocupando a parte leste e igreja nordeste, estima-se que a data do fim da construção seria o ano de 1779 inscrição presente na fachada da obra e 1783 a data de finalização da torre sineira azulejada, com data locada na cúpula presente no frontispício.

O local foi utilizado para fins diversificados ao silhar dos séculos devido as dominações e atividades vigentes, como abrigo, hospital, seminário, escola e até fortaleza com muros e doze peças de artilharia durante a dominação holandesa, como descrito por Flávio Tavares no livro de Glauce Burity (2008). Com base nas informações retiradas do livro de Humberto Nóbrega (1974), criou-se uma linha temporal com acontecimentos e anos (Figura 2).

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Figura 2: Linha do tempo das atividades diversificadas no Convento de Santo Antônio.

Fonte: Elaborado pela autora, 2020.

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Inicialmente, a construção do convento foi de forma singela e utilizando da taipa como matéria-prima, porém, nos primeiros anos do século XVII, houveram ampliações e substituições das paredes originais por alvenaria feita de pedra calcária, material extraído das próprias instalações. O convento apresenta afloramentos de calcário, sendo encontrado registros que descrevem a abundância da água, pedra calcária e madeira em suas fontes naturais, podendo citar o relato de Jaboatão (1861, p. 367 apud Pereira; Amaral. p. 13)9, que escreveu sobre o processo de povoamento e conquista do Brasil e o papel dos monges franciscanos: [...] nesta da cerca do Convento se tirou, e se tira, ainda que já hoje com algum trabalho desmontar a terra pelos seos altos, toda a pedra, assim decantaria, como a mais, que He necessária a qualquer obra, ou edifício.Consta de vários bancos, como explicão os mestres de arte. Do primeyro,que se cobria ao princípio, e pelas bayxas de poucas terras, e em muitas partes descuberto, se tira a perda e tosca, e dura de alvenaria, do segundo, outra menos áspera, mas forte, de que se faz perfeita e forte cal,do terceyro cabeços para fortalecer as paredes, e do quarto a que serve para se lavrarem portaes, e outras semelhantes peças, não tão dura, e áspera, como as primeiras, mas muito mais alva, solida e Liza [...] (JABOATÃO, 1861, p. 367 apud PEREIRA; AMARAL, 2014, p. 13)

O Convento de Santo Antônio apresenta uma planta baixa (Figura 4) com uma diversidade de ambientes com complexo acervo artístico, pode-se observar na página posterior um esquema com marcação e descrição dos ambientes selecionados de acordo com o planejamento do estudo em questão.

Além dos ambientes descritos, é de suma importância ressaltar particular atenção as influências recebidas de outras culturas, pode-se citar as duas máscaras (Figura 03) nas laterais da fachada, com feição que se assemelha a de povos indígenas, que eram os nativos e cabelo frisados presente na cimeira do adro, que, segundo Burity (2008) contrastam com o

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9 Frei Antônio de Sta. Maria Jaboatão, natural de Pernambuco, foi pregador, poeta, cronista da província franciscana de Sto. Antônio, atuou como mestre dos noviços em Igaraçu e como guardião na Paraíba e Recife.

Figura 3: Carotanha com indígenas e cabelo em friso.

Fonte: Acervo da autora, 2020.

feições

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Figura 4: Planta baixa com registros fotográficos e explicações dos principais ambientes do conjunto franciscano.

Fonte: Elaborado pela autora, 2020.

estilo europeu presente no Brasil inseridos pelos colonos portugueses; e os dois leões de guarda nas laterais, apresentam traços de arte oriental como os colocados nos templos xintoístas do Japão ou “leões de Fô” na China, influência recebida devido aos missionários franciscanos, segundo Germain Bazin (1983), possivelmente colocados na fase final das obras do frontispício (1779).

Figura 5: Imagem do frontispício do Convento de Santo Antônio.

Fonte: Acervo da autora, 2020.

O adro permite o acesso à fachada monumental, com inspiração Rococó, há uma perfeição nessas construções sendo considerada a mais perfeita dentro das construções franciscanas do Nordeste brasileiro por Germain Bazin, que descreve O conjunto de João Pessoa é uma das mais belas misesen-scènes da arte barroca. A divergência e os ressaltos dos muros do adro acentuam o efeito de perspectiva ascendente, que atrai o olhar para o magnífico tema frontal da igreja, majestosamente bem dividido em sua estrutura e suntuosamente ornamentado de esculturas de pedra, cuja execução rústica muito contribui para o efeito monumental. (BAZIN, 1983, p. 152 apud TIRAPELI, 2008, p.21)

O frontispício apresenta linhas simétricas, forma de retábulo e com três divisões: a primeira, é a parte térreo com cinco arcos plenos de estilo românico com detalhes de grade em madeira torneada e dão acesso ao galilé, com os três arcos centrais representando o corpo da igreja, assentado acima dos mesmos está o coro, pelo arco do lado esquerdo vai ter acesso a casa da Portaria e, pelo lado direito, para a capela e obras da Ordem Terceira; a segunda parte apresenta uma sequência simétrica de três janelas do coro com balaustradas em pedra calcária; e a terceira parte com frontão apoiado sobre a cornija, a última parte apresenta uma diversidade de elementos decorativos, podendo citar as volutas com folhagem, cunhais de pedra coroados por pináculos, concha, o símbolo da Ordem dos Frades Menores que são dois braços e o cordão, cruz, janela sineira e cúpula.

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O frontispício possui uma diversidade de elementos decorativos e, consequentemente, de estilos arquitetônicos e estilísticos derivados do longo período de construção e de

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dominações (Figura 5). O especialista e professor Menezes na Revista Universitas afirma, A fachada da igreja conventual é das últimas, embora não a derradeira, a se incluir no contexto franciscano do Nordeste. Executada talvez lentamente, distinguem-se, no todo do frontispício, estilos de execução característicos de épocas diversas (MENEZES, 1977, p.64).

A torre ou campanário é recuada, recoberta de azulejos na padronagem azul e branca, com janela sineira com arco pleno e acima a cúpula com superposição de abóbodas com azulejos compondo geometricamente com a técnica enxadrezada.

No coroamento da torre e na cúpula está presente a data de 1783, teria sido dada por concluída nesse ano.

Na nave da igreja da Ordem Primeira, é possível destacar o painel do forro com pintura à óleo sobre madeira da segunda metade do século XVIII, segundo Carlos Ott (1982), a pintura é de autoria de José Joaquim da Rocha, o mesmo pintor do forro da portaria do Convento de S. Francisco da Bahia, que Burity (2008) aponta semelhanças com o forro da nave estudado. O painel (Figura 6) apresenta uma técnica denominada de trompe l’oeil ou ilusionista, na qual as figuras aparecem suspensas no espaço e em movimento criando ideia de perspectiva, com elementos característicos do barroco tardio executados em vários forros de igrejas brasileiras, como em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco.

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O medalhão central tem sua composição dividida em três partes: a primeira a simbologia de uma pomba branca representando o Divino Espirito Santo, na lateral esquerda Jesus com a cruz, vestes vermelhas e halo circular em volta da cabeça e na lateral direita Deus com vestes azul e branca e halo triangular; a segunda cena é a Virgem Maria cercada por anjos e carregando uma bandeira com o símbolo da Ordem Franciscana; na terceira cena locada no inferior da pintura, representa São Francisco irradiando luz para personagens alegóricos representando a Europa, Ásia, África e América, continentes em que os franciscanos atuaram. Em torno do medalhão central, aparecem personagens como, por

Figura 6: Painel com pintura em óleo sobre forro de madeira.

Fonte: Acervo da autora, 2020.

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exemplo, bispos, cardiais e papas, e medalhões menores completando a decoração do forro e narrando os principais momentos de São Francisco de Assis (OLIVEIRA, 2009).

Até o início do século XX, existia um altar-mor no estilo barroco italiano revestido com talha dourada, porém demolido por estar deteriorado, assim como o arco-mor da igreja, atualmente, resta apenas a pintura no teto com as cenas dos milagres de Santo Antônio.

Figura 7: Representações gráficas bidimensionais da cripta funerária subterrânea.

Fonte: Arte Colonial da Paraíba de Humberto Nóbrega, 1974.

No perímetro conventual, estão elementos de grande valor artístico como a Fonte de Santo Antônio, situada entre duas pilastras que atuam como apoio, dividida em duas partes, com a primeira localizada o nicho e a segunda o golfinho esculpido em pedra, além das suas inscrições presente no corpo inferior; o Relógio do Sol presente no pátio externo, feito também em pedra calcária e com inscrição datada de 1781, Burity (2008) aponta a descoberta de outro relógio do sol nas escavações arqueológicas da capela-mor, que deveria pertencer ao convento primitivo.

No livro de Humberto Nóbrega (1974) é citada uma passagem do Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta de Ariano Suassuna: [...] Diziam que, depois do raptado, Sinésio fora levado para cidade da Paraíba, capital do nosso Estado, e encarcerado debaixo da terra, num subterrâneo cavado durante a “Guerra Holandesa” “e que liga a Igreja de São Francisco à Fortaleza de Santa Catarina, situada em Cabedelo, a umas três ou quatro léguas de distância da Igreja! Êsse subterrâneo não existe, Sr. Quaderna! Isso é Patranha! Aqui no Nordeste, em todo lugar onde os Holandeses passaram, no século XVII, o Povo inventa que existe um subterrâneo cavado por eles! São imaginações descabidas da ralé ignorante da Paraíba. (SUASSUNA, 1971, p.297 apud NÓBREGA, 1974, p. 130).

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Além dos ambientes escritos e numerados na planta baixa, existe uma cripta funerária subterrânea (Figura 7) locada abaixo da Casa de oração da Ordem Terceira de São Francisco, comumente e erroneamente associada a lenda de uma saída de um túnel que

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ligava o convento à Fortaleza de Santa Catarina, em Cabedelo (PB), como visto no trecho de Suassuna descrito no livro de Humberto Nóbrega (1974).

Evidenciado o valor artístico e cultural da obra em questão, é de interesse e cuidado do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) a preservação contra a degradação derivada dos séculos, por meio de serviços que devem ser realizados de forma periódicas. O Tombamento da obra foi executado no ano de 1952, com a inscrição no terceiro Livro do Tombo das Belas Artes, relacionada aos objetos artísticos eruditos nacional ou estrangeiro, encontra-se no site do IPHAN as características da obra e dados, como a inscrição de nº 407, nº do processo 0063T-38 e Fls 78.

No entanto, as primeiras tentativas de proteção em João Pessoa englobando a área conventual ocorreu à nível de uma porção urbana de valor histórico, por meio do Plano Diretor de João Pessoa em 1975, em âmbito municipal, definindo uma poligonal de preservação rigorosa e, com a revisão em 1992, acrescentando a definição de “Centro Principal da Cidade”, “Zonas especiais de Preservação” e “Área de Preservação Rigorosa”.

Por meio do Decreto-Lei nº 5.255 de 1971 foi fundado o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico, conhecido pela sigla IPHAEP, em instância estadual que, em 1982, por meio do Decreto nº. 9.484 foi delimitou o “Centro Histórico Inicial de João Pessoa”, representada na Figura 8 com o tracejado vermelho, que foi uma área mais extensa do que a delimitada no âmbito municipal.

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Em 1987, foi estabelecido um convênio de cooperação internacional entre Brasil e Espanha devido aos esforços do Ministro da Cultura Celso Furtado, que integrou o Centro Histórico de João Pessoa no Programa de Preservação do Patrimônio Cultural da Ibero-América, regido pela Agência Espanhola de Cooperação Internacional – AECI-. Por meio do financiamento do Convênio, é criado no mesmo ano a Comissão Permanente de Desenvolvimento do Centro Histórico

Figura 8: Delimitação do Centro Histórico Inicial de João Pessoa pela instância estadual.

Fonte: Acervo do IPHAN/PB apud GONÇALVES, 2014.

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de João Pessoa através do Decreto Estadual de nº 12.239. A Comissão então definiu uma nova poligonal de tombamento, com o perímetro delimitado na cor azul da Figura 6. (GONÇALVES, 2014) Em 2004, houve revisão da área de proteção estadual com Decreto Estadual nº.

25.138 unificando as áreas da Comissão do Centro Histórico e do IPHAEP. Com isso, foi criado a Associação Centro Histórico Vivo (ACEHRVO) como resultado de um workshop intitulado “Construindo o Futuro” em 2000, por uma parceria entre IPHAN, Comissão e PRODETUR – Programas Regionais de Desenvolvimento do Turismo-.

Em 2002 em âmbito federal, ACEHRVO encaminhou ao IPHAN solicitação de processo de tombamento nacional do centro Histórico de João Pessoa argumentando a necessidade de tombamento para materialização dos avanços, percalços, erros e acertos de um polo antigo.

Processo de tombamento federal de número 1501-T-02 e em, 2007, recebeu orientação de adequação do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização (DEPAM), que resultou na poligonal de tombamento com Área de Preservação Rigorosa, Área de Entorno e Porto do Capim (Figura 9). O Convento de Santo Antônio está localizado na poligonal como Área de preservação rigorosa, devido a importância histórica presente na cidade alta.

Figura 9: Poligonal de tombamento na

instância federal.

Fonte: Acervo do GONÇALVES, 2014.

64

IPHAN/PB

apud

65

visão histórica e social: da capitania real da parahyba à fundação do convento de santo antônio contemplação artística: o percurso histórico do monumento narrado pela inserção dos azulejos

2.1 A origem do azulejo e sua introdução no Brasil

A

história do azulejo no Brasil data os séculos XVI, XVII e XVIII, com aculturação advinda da colonização portuguesa, foram inseridos em larga escala na decoração arquitetônica com “o mesmo gosto, a mesma técnica e os mesmos materiais de Portugal” (Wanderley, 2006, p.17), como ocorreu na reprodução artística dos azulejos florais com módulo de padrão de camélia do século XVII presente na Coleção do Museu de Évora em Lisboa (Figura 10 A) e da Igreja Nossa Senhora da Graça e Colégio Jesuítico em Olinda, Pernambuco (Figura 10 B).

O azulejo é um elemento de dupla utilidade, atuando como decorativo e como revestimento cerâmico, protegendo as superfícies das intempéries. O mesmo está presente na história por mais de cinco séculos, com origem da palavra apresentando variações etimológicas: ligada ao árabe com a palavra azzellij que significa “pedra polida” e relacionado com ao persa com a palavra azul (WANDERLEY, 2006).

O elemento em questão apresenta o barro cozido – chacota- como material e, geralmente, possui forma quadrada com duas faces, onde a externa é decorada e vitrificada e a interna constituída em barro (NÓBREGA, 2015).

Conforme Cavalcanti (1963), o surgimento da pedra lisa e escorregadia azulada veio dos mesopotâmicos devido as necessidades construtivas para impedir a impermeabilidade de água e a abundância de solo úmido, assim revestindo suas paredes de tijolos e torres de seus templos (zigurates) 10. Posteriormente, Alcântara (2001) diz que foi assimilada pela civilização islâmica e introduzida na Península Ibérica, com Málaga sendo uma grande produtora e exportadora de azulejos. Da Península ibérica, mais especificamente Espanha, foi para a Ilha de Majorca, Itália e o restante da Europa, incluindo Portugal, que foi um marco na valorização e desenvolvimento desse elemento.

Verissimo (2017) diz que a cronologia azulejar em Portugal inicia-se no século XV, no qual o mesmo recebia o artefato dos principais centros produtores 68

10 Espécie de templo construído por povos da Antiga Mesopotâmia, como, sumérios e assírios. São em formato de torre com superpostas formando uma pirâmide escalonada. (KAEFER, 1998)

Figura 10: A) Azulejo da Coleção do Museu de Évora em Lisboa, Portugal; B) Azulejo da Igreja de N. Senhora da Graça e Colégio Jesuítico em Olinda, Pernambuco.

Fonte: Tirapeli, 2008, p.24.

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na Península Ibérica, como Sevilha e Málaga, que possuíam influencia mourisca devido a dominação na região, com recorrência de motivo da estrela islâmica e entrelaçamento e repetição elementos geométricos radiais que formam um padrão com a técnica de produção corda seca ou “de corda”, que surgiu por volta de 1500 em Sevilha, devido a necessidade de diminuição dos custos da técnica do alicatado, que consiste em gravar um desenho na placa cerâmica úmida e criar ranhuras preenchidas com óxido de manganês e óleo de linhaça para separação de cores.

Trazendo o tempo histórico do objeto em estudo, no século XVI há um grande desenvolvimento da cerâmica na Itália devido a utilização da técnica de produção conhecida como majólica, que permitia pintar diretamente sobre o azulejo resultando em composições diversificadas e encomendadas cerâmicas italianas para o reinado de português. Registrou-se também o estilo renascentista com motivos baseados nas figuras da Roma clássica. (VERISSIMO, 2017) Entre os séculos XVII e XVIII, existem duas vertentes de produção, a primeira com azulejaria enxadrezada, foram utilizados em grandes composições com a técnica de tapete e com articulação sendo pela disposição alternada de azulejos de uma cor, em geral verde ou azul e limitados por frisos, cercaduras ou barras, podendo ser figurativo com temas religiosos ou temas civis (BARDI, 1980).

O século XVIII caracterizou-se pelo fim da Guerra de Restauração, que reatou relações exteriores de caráter político e econômico com a Espanha, Países Baixos, Holanda e França e adentrou no período de renovação, recuperação e reestruturação do poder da nobreza, que levou a renovação artísticas (VERISSIMO, 2017).

Logo, como houve a implantação do programa de industrialização manufatureira dos azulejos em Portugal, tornando os preços mais acessíveis; técnicas artesanais, ocorrendo destaque aos “artistas pintores” que usavam o azulejo como obra de arte com a pintura monumental; e foi um período de grande exportação de produtos portugueses para o Brasil, aumentando, consequentemente, seu patrimônio

artístico, sendo chamado por Simões (1980) apud Wanderley (2006) como período de fixação e nacionalização do azulejo no Brasil, com as ordens religiosas possuindo a maior parte da produção artística da época, assim, recorrente uso de iconografia ligada ao barroco da igreja Católica, porém com redução da dramaticidade, maior objetividade pictórica e pinceladas mais aguadas e menos densas. Com influência da porcelana azul importada da China, os azulejos portugueses começaram a produzir em dois tons de azul, apresentando uma simplificação na produção, maior facilidade e qualidade devido à utilização do cobalto que apresenta uma melhor desenvoltura durante as operações de queima do que as outras cores (WANDERLEY, 2006).

No século XIX, ocorre um enfraquecimento na relação de Portugal com Brasil, devido as guerras e a consequente diminuição de recursos e abertura dos portos brasileiros ao comércio internacional. Com isso, o Brasil começou a importar azulejos avindos de outros países, como Holanda, Inglaterra, França, Bélgica, Alemanha e Espanha (WANDERLEY, 2006), porém, Cavalcanti (2002) descreve que eles possuíam características da industrialização, como pasta fina e dimensões pequenas e padronizadas, por exemplo. Foi restabelecida a relação entre Portugal e Brasil devido a recuperação do primeiro, com as fábricas de azulejos portugueses voltando a se estabelecer em território brasileiro entre os anos de 1860 e 1918.

No século XX, ocorreu uma variação no uso do azulejo, o primeiro tipo sendo os decorativos como uma herança cultural portuguesa e com uma diversidade de azulejos importados de outros países, como Alemanha e Inglaterra; e o segundo tipo sendo os utilizados em instalações sanitárias, por exemplo, cozinhas (WANDERLEY, 2006).

Os azulejos apresentam uma diversidade de técnicas de produção que se relacionam com os locais onde foram fabricados e da evolução da execução dos mesmos ao decorrer dos séculos como pode ser visto na cronologia.

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Figura 11: Linha do tempo com a cronologia azulejar do século XV - XIX. Fonte: Elaborado pela autora, 2020.

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73

2.2 A história aos pedaços: Azulejos inseridos no Adro, Galilé e Claustro Os azulejos são elementos artísticos e estéticos empregados em larga escala no Conjunto Cultural de São Francisco, com suma importância superior a função de revestir ou decorar espaços. Possuem valor comunicativo, com objetivo de transmitir mensagens e intenções para o observador por meio de figuras, gestos, posições, formas geométricas e símbolos, ou seja, são “um fenômeno construtivo de ambiência imagética, vale dizer, é um revestimento arquitetônico e suporte comunicativo visual” (PINHEIRO, 1991, p.133).

No silhar presente na edificação traz informações que vão além do estudo iconográfico e hagiográfico, mas também do modo de inserção desses elementos de estudo na obra, com distintos recortes temporais e históricos, que narram o desenvolvimento do convento, com influências e técnicas distintas, ademais, serão analisados azulejos presentes no adro, galilé e claustro.

A tipologia e tonalidades variam de acordo com a manufatura da época, com Burity (2008) descrevendo: As faianças, que sofriam influência arábica, apresentavam-se em relevo, enquanto, no século XVII, são desprovidas de relevo. Quanto à nuance de cores, de uma policromia acentuada, evolui para uma monocromia com tendência ao azul sobre o fundo branco. Mas é na segunda metade do século XVII que têm início as molduras, em estilo barroco [...]. Na segunda metade do século XVIII, surgem as molduras policromas em quadros pintados de azul sobre fundo branco e aparecem também as figuras da história sagrada e profana, representando cenas históricas na Bíblia. (BURITY, 2008, p.124)

Mostram-se inicialmente policrômicos sobre fundo branco, onde prepondera o azul, mas onde também se exibe o amarelo, o verde, o marrom, o avinhado e o violeta. Tornaram-se progressivamente a duas cores, azul sobre fundo branco, no final do Seiscentos, e assim, permanecem ao longo do século XVIII, resgatando a paleta policrômica (embora mais pobre) no período pombalino. (PINHEIRO, 1991, p.133)

A segunda metade do século XVIII foi denominada de reconstrução pombalina após o terremoto de 1755, gerando como consequência os mestres ladrilhadores e, posteriormente, pintores organizaram novas sociedades, como a oficina de Bartolomeu Antunes e A Sociedade de Pintores de Azulejo de Valentim de Almeida e Cia, no entanto, com objetivos diferentes. Os azulejadores com intuito de enfrentar o desafio pós catástrofe natural e garantir o capital para as novas obras aumentando a utilização do azulejo, sendo considerado como um acabamento funcional, nobilatador e social (CÂMARA, 2005 apud MENDES, 2018). E os pintores com preocupação referente mais ao trabalho manual do que ao capital, procurando a distribuição dos lucros e perdas entre os sócios e garantir o rendimento para eles.

Apresentando como características da azulejaria Pombalina o seguindo do conceito de silhares historiados, padronagens e simplificação ornamentava e retomada a paleta de cores na sua totalidade (VERISSIMO, 2017), com os principais mestres que constituíram a primeira sociedade de azulejadores (1757-1767), a segunda sociedade (1768 - 1769) e a Sociedade de Pintores de Azulejo de Valentim de Almeida e Cia.

E Pinheiro (1991) descreve que: 74

75

2.2.1 Identificação da tipologia do Adro O adro apresenta uma forma trapezoidal com seis nichos locados simetricamente nas laterais, no fundo apresenta composição de cenas da Paixão de Cristo no estilo monumental e monocromático, como pode ser visto na planta baixa da Figura 12.

Ambiente espaçoso e aberto ladeado por duas muralhas revestidas com ladrilhos branco e colunas embutidas com azulejos portugueses enxadrezados em padronagem azul e branco (Figura 13).

13: Colunas embutidas com enxadrezados com cimeiras e volutas trabalhadas.

Figura

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Figura 12: Representação da planta baixa do Adro do Conjunto Cultural de São Francisco, com identificação dos locais e tipos dos azulejos presentes.

Fonte: NÓBREGA, 1974, p. 77 editada pela autora, 2020.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

77

O adro visa servir de ambiente de passagem entre o mundo profano e o sagrado, assim, a composição da passagem da Via Sacra de Jesus apresenta inúmeras simbologias e interpretações de diversas perspectivas religiosas, como descrito pela autora Burity (2008), como, por exemplo, de que as passagens teria como intuito servir como indicação que não adentra-se a Casa de Deus se não antes passar pelo sofrimento físico para alcançar o sagrado ou com objetivo de proporcionar a contemplação do sacrifício de Cristo para a salvação dos pecadores que irão adentrar no espaço sagrado.

Os painéis azulejares do nicho são do estilo monumental, figurativo e monocromático de tonalidade azul sobre fundo branco, com padronagem de peças de tamanho 14x10cm e data aproximadamente de 1720. Nota-se uma distinção referente à autoria dos nichos devido ao tom do azul, com o primeiro nicho apresentando nuances mais tênues do que os outros cinco, informação essa prestada por [...] Maria de Piedade Farias, especialista em restauração de bens móveis da Paraíba, que menciona o Dicionário da Arte Barroca em Portugal, segundo qual atribui a Policarpo de Oliveira Bernardes (1695-1778), pintor de azulejos e discípulo do seu pai -Antônio de Oliveira Bernardes-, ser o autor desses painéis (com exceção do primeiro nicho, que é de autoria desconhecida) (BURITY, 2008, p. 106)

Muitos das peças azulejares presentes possuem níveis de deterioração advindas do silhar secular, como por intempérie de ventos fortes, chuva e sol diariamente, e de ações de vandalismo, como exposto por Simões (1965, p.211) apud Burity (2008, p.106) “Representavam outros tantos passos da Paixão de Cristo, estando alguns infelizmente maltratados”. As ações degradadoras por parte dos indivíduos são diversas, com pichações, queima nas peças azulejares devido a colocação de velas em datas comemorativas (Figura 14 A) e deterioração das faces figurativas dos algozes de Cristo (Figura 14 B).

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Figura 14: A) Deterioração aparentemente causada por chamas de velas; B) Danos gerados aos azulejos com as faces dos algozes de Cristo.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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Acima dos nichos, existe uma cartela em forma de coração com as cinco Chagas de Cristo, símbolo franciscano, e uma cruz no topo simbolizando o sofrimento de Cristo, existindo distinção nas laterais, podendo ser ladeados por asas, como nos quatro primeiros nichos:

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Figura 15: Nichos simétricos locados nas laterais narrando os primeiros momentos da Paixão de Cristo.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2019.

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Ou ladeados por rosas, como nos últimos dois nichos:

Figura 16: Últimos nichos locados nas laterais narrando os momentos finais e a ressureição de Cristo.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2019.

Ademais sobre os azulejos locados no adro, Humberto Nóbrega (1974) fala sobre a semelhança dos mesmos com os retábulos presentes na sacristia do Convento dos Capuchinhos em Santarém, em Portugal.

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2.2.2 Identificação da tipologia do Galilé O galilé ou ádito é um ambiente situado posterior ao adro, com um total de dez portas, cinco que se abrem ao adro e cinco aos ambientes internos, como a nave da igreja, pátio e portaria que permite acesso ao claustro.

Para melhor compreensão, a Figura 16 é um esboço do ádito com a identificação dos painéis azulejares, com tipos diferentes de técnicas e tonalidades, presumível a inserção em recortes temporais distintos. Os painéis figurativos presentes nos nichos no topo das duas paredes laterais do galilé seguiram um padrão representando o azul com fundo branco, visto na Figura 17. É possível que a adição desses elementos tenha se dado durante o século XVIII, período de produção com monocromia dos tons de azul, que significava a simplificação dos processos produtivos e o cobalto, que produz as tonalidades de azul, possui um melhor comportamento nas operações de queima em relação as outras tonalidades. (WANDERLEY, 2006) Simões (1965) descreve que esses azulejos figurativos dos nichos “prova à saciedade que o convento recebeu azulejos de Portugal antes ou imediatamente depois da ocupação holandesa, podendo ligar-se às obras iniciadas em 1656.” (SIMÕES, 1965, p. 211 apud BURITY, 2008)

17: Representação da planta baixa do Galilé do Conjunto Cultural de São Francisco, com identificação dos locais e tipos dos azulejos presentes.

Figura

Fonte: Nóbrega, 1974, p. 77 editada pela autora, 2020.

Os painéis estreitos recortados são policromáticos, do estilo tapete com padronagem no esquema 2x2/1, que significa quatro azulejos, com os centrais com 12 azulejos de altura e os laterais com 7 peças. Silhar característico da produção de meados do século XVIII, descrito por Simões (1965) apud Burity (2008) como excepcionais e inquietantes, com um dos modelos de estranhíssimo desenho e policromia, descrevendo nunca ter encontrado outro semelhante.

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Os azulejos policromáticos são de estética diferente dos azulejos monocromáticos e figurativos portugueses, nota-se influência mourisca por meio da repetição de padrões geométricos e tonalidades distintas, como o uso do amarelo ou verde. O autor Verissimo (2017) diz que no século XV, Portugal recebia o artefato dos principais centros produtores na Península Ibérica, que estavam sob dominação mourisca, consequentemente ocorria a recorrência de motivos de estrela islâmica e repetição e entrelaçamento de elementos geométricos. Justificando a influência vinda para a Paraíba, Nóbrega (1974) descreve que A conquista da Paraíba ocorreu sob o reinado de Felipe II, governante de uma terra onde os oleiros muçulmanos introduziram no mundo ocidental as modificações do traçado artístico de tais ladrilhos, que passaram a exibir riscos geométricos, arabescos, laçarias e motivos florais estilizados. (NÓBREGA, 1974, p. 133)

Figura 18: Painel figurativo presente no nicho 01 no ambiente do Galilé.

Fonte: Acervo pessoal, 2020.

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A iconoclastia da arte islâmica é superior a uma mera proibição religiosa da utilização de imagens e do uso das formas geométricas como única solução possível artística, a autora Sylvia Leite (2007) relacionando a falta de um contato mais direto com os aspectos da linguagem da arte como motivo pelo qual historiadores reduzem a iconoclastia do Islãm a uma arte simplificada.

A repetição cíclica de padrões geométricos possui a simbologia de representar Deus e seus atributos divinos, não por meio das representações das figuras em si, mas de relações, criando alusões simbólicas e movimentos analógicos de expansão e contração da forma infinita, que servem de ponte (no caso do movimento horizontal) ou de escada (movimento vertical) para um estado meditativo.

O movimento de contração e expansão da forma está presente na Basmala, frase inicial do Corão, que é a fórmula de início de qualquer ação, palestra ou escritura, a síntese de toda existência, esse movimento representado na Figura 19 (LEITE, 2007).

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Os painéis estreitos recortados policromáticos do tipo 01 apresentam formas que se assemelham a representações encontradas na arte islâmica, por características como a repetição das formas geométricas simbólicas e suas relações, como visto na Figura 20.

Forma

Expansão

Contração da forma 88

Figura 19: Esboço do movimento de expansão e contração da forma na arte islâmica com base nos desenhos no livro de Sylvia Leite (2007). Fonte: Acervo pessoal, 2020.

Figura 20: Painel Azulejar presente no Galilé do Convento de Santo Antônio.

Fonte: Acervo pessoal, 2020.

89

Para compreensão da semelhança das formas dos azulejos do tipo 01 com as representações islâmicas foram criados esboços com o desenvolvimento das duas formas geométricas principais presentes nas peças: a primeira, o octógono, que é resultado do desdobramento do quadrado em ângulos retos que, segundo Sylvia Leite (2007), no padrão todas as formam surgem dessa cifra, incluindo a segunda forma geométrica circular presente na peça azulejar.

A partir do esboço das duas formas principais (Figura 21), é possível sugerir um esquema de recriação do vínculo dos elementos geométricos das peças de estudo (Figura 22), que fica evidente na relação o movimento de retração da forma com a cifra do polígono estrelado e a expansão com a forma circular derivada do octógono.

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Figura 21: Esboço da criação do octógono com pontas e da forma circular derivado dele.

Fonte: Acervo pessoal, 2020.

Figura 22: Esquema da relação das formas do azulejo presente no Galilé, primeiro com a base estrutural e, segundo, apenas os elementos. Fonte: Acervo pessoal, 2020.

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A autora Sylvia Leite (2007) aponta o uso do padrão de malha que alterna entre as estrelas e cruzes, comumente encontrado com forma simples ou complexo nos diversos tipos de construção islâmica, como na Figura 23, que apresenta semelhança com a forma poligonal encontrada no azulejo do ádito.

Ao retirar o elemento circular do esquema dos azulejos do galilé, é possível observar que segue a ideia de alternância na malha com cruz e estrela (Figura 24).

Os painéis policromáticos do tipo 02 apresentam formas mais suaves e circulares, com predominância do amarelo e azul sobre fundo branco, com cercadura superior com detalhes brancos sobre fundo azul, como visto na Figura 25.

Os exemplares analisados em questão apresentam elevado grau de semelhança com azulejos presentes no Museu Nacional do Azulejo, no Convento da Madre de Deus do Século XVI, Burity (2008) relata a possibilidade de ambos serem da mesma autoria devido a verossímil afinidade, porém ambos não apresentam autores conhecidos, a comparação entre os mesmos pode ser vista na figura abaixo.

Figura 23: Representação da malha com alternância de estrela e cruz.

Fonte: Acervo pessoal, 2020.

Figura 24: Friso azulejar presente em tumba do complexo Shaki Zinda em Samarcanda, Uzbequistão, do século XIV. Fonte: Sylvia Leite, 2007, p. 169.

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93 Figura 25: A)Lado direito azulejo presente no galilé e claustro do Convento de Santo Antônio; B) Azulejo presente em Lisboa, Portugal. Fonte: A) acervo pessoal, 2020; B) Burity, 2008, p. 132.

2.2.3 Identificação da tipologia do Claustro A autora Carvalho (2005) afirma que o claustro provém da palavra “claustrum” do latim, que têm dois significados, o primeiro refere-se a um mosteiro, a ideia de clausura e vida de retiro; o segundo seria um termo arquitetônico que simboliza um pátio interno com paredes da igreja ao redor, com colunata coberta e um quadrângulo central. Elemento arquitetônico encontrado comumente em edificações religiosas e hospitais, desenvolveu-se na arquitetura medieval na Europa Ocidental datada nos séculos VIII a XV, adotada inicialmente pelos monges nos mosteiros e, posteriormente, imitada pelos padres que vivam em sua igreja, por meio da regra canónica, Carvalho descreve que o

Figura 26: Representação da planta baixa do Claustro Conventual do Conjunto Cultural Franciscano, com a marcação da localização dos azulejos.

Fonte: Nóbrega, 1974, p. 77 editada pela autora, 2020.

Monástico ou canónico, num claustro perpetuou sempre um pátio, um quadrângulo aberto no qual foram frequentemente plantados arbustos ou flores, organizados ao redor de uma fonte ou poço.

Por isso, o Latim medieval chamou-o de hortus conclusus, jardim fechado. (CARVALHO, 2005, p. 4)

Segundo a autora Burity (2008), as plantas conventuais franciscanas eram similares, com mudança referente ao maior ou menor desenvolvimento e variantes, com a construção concentrando-se em torno do claustro, locado ao lado da igreja. O claustro presente no Convento de Santo Antônio apresenta a tipologia descrita por Carvalho (2005), tratando-se de um pátio central cercado por duas séries de arcadas romanas e colunas gregas de pedra calcária em estilo toscano, situado à direita da igreja (Figura 26).

Oliveira (1975) traz uma referência histórica ao período de dominação holandesa referente ao uso e dano do ambiente, que “transformaram o claustro franciscano em cavalariças; numa, de suas salas, instalaram um presídio, As grades de ferro que puseram às janelas são vistas até hoje” (OLIVEIRA, 1975, p. 58).

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O ambiente analisado apresenta azulejos de padrão policromáticos característicos do século XVIII (Figura 27), com motivo tapete e de grande repetição 6x6/8 com cercaduras também multicoloridas nas tonalidades azul e amarelo no fundo branco, [...] oferecendo ao conjunto um aspecto simultâneo de elegância e sobriedade. Esse relevante trabalho em azulejaria portuguesa, de autor desconhecido, possui revestimento de ‘motivo tapete’. Constitui incontestável riqueza artística. [...] as mesmas se encontram em algumas igrejas de Portugal e são o único exemplar existente no Brasil. (BURITY, 2008, p. 154) Os azulejos estão inseridos nas sapatas, especificamente na parede esquerda à entrada da portaria e na parede dos fundos, e no andar parapeito do andar superior, como visto na Figura 28. Relacionado a data de inserção do mesmo, Nóbrega (1974) descreve que foram assentados nos anos de 1796 e tendo como Guardião responsável o Frei Joaquim da Purificação.

Burity (2008) afirma que existiu vários painéis em madeira nas paredes do claustro até os fins do século XIX, porém não se sabe onde foram armazenados, pois “o abandono e o desprezo pelas obras artísticas eram uma constante nos responsáveis daquela casa que substituíram os franciscanos.” (BURITY, 2008, p.

154)

Figura 28: Claustro com pátio central cercado por arcadas e colunas com duas séries.

Fonte: Acervo Pessoal, 2020.

Figura 27: Azulejo policromático presente no claustro.

Fonte: Acervo pessoal, 2020.

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visão histórica e social: da capitania real da parahyba à fundação do convento de santo antônio contemplação artística: o percurso histórico do monumento narrado pela inserção dos azulejos

3.1 Azulejo e expressão religiosa: a expansão da imagem como fonte de conhecimento, contemplação e memória

O

termo imagem apresenta uma diversidade de significados, designando algo que pode visível ou imaginário e com inúmeras naturezas, por exemplo, mediática, memória, psiquismo, científica e outras (JOLY, 2007). Por meio da abordagem semiótica da imagem é possível compreender suas especificidades, interpretando os tipos de signos e suas tipologias, com grandes precursores como o linguista Ferdinand de Saussure (1857-1913) e o cientista Charles Sanders Peirce (1839-1914) (JOLY, 2007).

A imagem também pode possuir um caráter didático e pedagógico, com informações mudas e autoexplicativas que transmitem para o indivíduo informações presentes na memória ou novos conhecimentos, como ressaltado por Alberto Manguel ao afirmar que a imagem “assim como as histórias, nos informam” (MANGUEL, 2001, p.21 apud SANTOS NÓBREGA, 20015, p. 39).

Para o semiólogo e crítico de arte Omar Calabrese (1987), as relações entre arte e comunicação podem estar voltadas em dois sentidos, para aquilo que na arte interessa à comunicação e o contrário, considerando a arte como Uma qualidade intrínseca a certas obras produzidas pela inteligência humana, em geral constituídas apenas de materiais visuais, que manifeste um efeito estético, leve a um juízo de valos sobre cada obra, sobre seu agrupamento ou sobre seus autores e que dependa de técnicas específicas ou modalidades de produção da própria obra (CALABRESE, 1987, p. 15)

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E a comunicação, No sentido moderno, isto é, ‘toda transmissão de informação obtida mediante a emissão, condução e recepção de uma mensagem’.

Trata-se, em suma, de um processo socializado, no qual a informação passa entre dois interlocutores (não necessariamente seres humanos), através de um suporte físico (um canal) e por meio de um código (um conjunto de regras para segmentar sistematicamente segmentado; e ainda um conjunto de regras para combinar o primeiro com o segundo). Como se pode ver, a ‘comunicação’ é um fenômeno complexo que comporta numerosos elementos em jogo: a natureza dos participantes (emissor e receptor), a natureza do canal utilizado (que pode ser desde as ondas sonoras até as da luz), a natureza do código (que pode ser desde as regras da língua falada até a linguagem do computador), a natureza das mensagens transmitidas mediante códigos, o processo de emissão e de recepção.” (CALABRESE, 1986, p. 15-16)

Desde os primórdios dos tratados sobre arte analisa-se os fenômenos artísticos sob o ponto de vista de sua organização comunicativa, com Calabrese (1987) citando a teoria da visibilidade pura originada no século XIX, com o fundador Konrad Fiedler e representantes o escultor Adolf Hildebrand e o pintor Hans von Marées. A teoria de Fiedler pretende formular uma teoria do olhar artístico, pois segundo os visibilistas puros, o mundo sensível se exprime por símbolos da linguagem, mas pela representação visual na qual o artista se esforça por apropria-se da natureza e traduzindo-a em uma expressão, O artista (...) distingue-se, antes, pelo fato de a faculdade peculiar de sua natureza colocá-lo em posição de passar imediatamente da percepção visual para a expressão visual; sua relação com a natureza não é uma relação visual, mas uma relação de expressão (FIEDLER, 1887, p. 43 apud CALABRESE, 1987, p. 22)

101

A evolução da teoria da visibilidade pura desenvolve-se com Henri Focillon com La vie des formes (A vidas das formas, 1934) retomando o princípio essencial de que as formas artísticas podem ser examinadas autônomas e independentes de elementos históricos e culturais, o que Calabrese (1987) chama de “dotadas de vida própria”, Focillon foi amplamente retomado no século anterior por Jurgen Baltrusaitis, com a aventura das formas, e George Kubler, continuou a segunda tendência da pesquisa de Focillon e escreveu The shape of time (A forma do tempo) em 1972.

Pelo prisma dos modelos linguísticos, Calabrese (1987) relata que os modelos da linguística geral são rigorosos e não podem explicar a arte, pois esta mantém sempre algum resíduo resistente à análise. No âmbito estético, a semiótica de Emilio Garroni é do tipo categorial dirigida a soluções filosóficas kantianas e cassirerianas11, colocando em dúvida o valor das sistematizações teóricas que tentaram formalizar o saber estético e a comunidade visual, afirmando que o programa ambicioso e fascinante da semiótica revelou-se, numa consideração mais atenta, insuficiente para fundar um ponto de vista teórico e para ser aplicado a muitos setores de pesquisa. Por exemplo, uma verdadeira semiologia da arte, particularmente das “artes da visão”, não foi elaborada, nem, através dela, obtivemos até hoje um acréscimo significativo de conhecimento (GARRONI, 1979, p. 3 apud CALABRESE, 1987, p. 127).

Relacionado a associação de categorias linguísticas com à análise das obras de arte existem muitos críticos, como o linguista Georges Mounin e o estetólogo René Passeron, afirmam que a pintura não teria como objetivo primordial a comunicação e sim a expressão, assim “na medida em que a pintura, como arte e comunicação, não cessa de procurar a si

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11 As linhas filosóficas kantiana e cassireriana referem-se respectivamente ao principal filósofo da era moderna Immanuel Kant, que fundamentou uma síntese entre o racionalismo continental e a tração empírica inglesa; e um dos maiores filósofos europeus Ernst Cassirer, que foi referência para o desenvolvimento da iconologia de Panofsky como das estéticas simbólicas de Sussane Langer, contribuiu também para outras áreas das ciências humanas, como antropologia cultural.

mesma, ela escapa ao domínio dos sistemas semiológicos” (PASSERON, 1962, p. 26 apud CALABRESE, 1987, p. 122).

Contrário aos pensadores anteriores, Ruskin (1980, p. 17) apud CALABRESE (1987) afirma que “a pintura (...) nada mais é que uma nobre e expressiva linguagem, inestimável como veículo de pensamento”.

As imagens também tiveram caráter didático e estratégico na imposição de culturas dominantes sobre nações colonizadas, com intuito de “evangelização de povos de diferentes tradições linguísticas e religiosas” (SANT’ANNA, 2006, p.21 apud SANTOS NÓBREGA, 20015, p. 39). Considerando o pensamento do autor Nicolas Bourriaud, que contribuiu para análise da produção e recepção imagética, a azulejaria lusitana colonial foi uma forma de comunicação para determinado público e com determinada intenção, efetuando ligações entre contatos humanos.

Santos Nóbrega (2015) afirma que os concílios incitavam a utilização da imagem artística para função pedagógica, porém ditavam leis e normas para o uso, como exposto no II Concílio Ecumênico de Nicéia (325): As imagens não foram introduzidas na Igreja sem causa razoável. Elas derivam de três causas: a incultura dos simples, a frouxidão dos afetos e a impermanência da memória. Elas foram inventadas em razão da incultura dos simples, que não podendo ler o texto escrito utilizam as esculturas e pinturas como se fossem livros para se instruir nos mistérios de nossa fé.

Da mesma forma, elas foram introduzidas em função da frouxidão dos afetos para que aqueles cuja devoção não é estimuladas pelos gestos do Cristo recebidos por intermédio dos ouvidos sejam provocados pela contemplação dos olhos do corpo em sua presença nas esculturas e pinturas, já que na realidade o que se vê estimula mais os afetos do que o que se ouve... Finalmente por causa da impermanência da memória, já que o que se ouve é mais facilmente esquecido do que se vê... (OLIVEIRA, 2000, apud SANTOS NÓBREGA, 2015, p. 39).

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Por outro viés perceptivo, a iconoclastia foi uma preocupação constante no cristianismo,

artísticas, de forma que anteriormente era introduzido personagens e deuses pagãos a

em razão que a representação artística de Deus, Cristo ou santos pudesse incentivar à idolatria, de forma a descaracterizar a fé e incitar a heresia, por ser uma prática condenada no Velho Testamento. A reflexão metafisica e teológica sobre as imagens foi constantemente debatida com intuito de definir o estatuto, significado e funções da imagem em diversos documentos oficiais, como bulas papais, sínodos e concílios, por exemplo, o Concílio de Nicéia (325) convocado pelo Imperador Romano Constantino I, Concílio de Trulan (692) convocado pelo papa Sérgio I, Concílio de Mainz (813) convocado por Paulo III e o Concílio de Trento (1545-63) convocado pelo Papa Paulo III. Para João Damasceno (650-749) no Discurso apologético contra os que rejeitam as imagens sagradas (730), a imagem é uma semelhança, um exemplo ou figura que manifesta uma representação e um modelo que não é caracteristicamente fiel ao arquétipo. As representações de coisas que são invisíveis e indefinidas, como, por exemplo, as Sagradas Escrituras criam formas de Deus e anjos, o invisível divino se faz visível para representar por meio de uma iluminação celestial, que ensina e conduz para construção de uma imagem, por nosso necessidade de ícones e guias.

A percepção de Damasceno (730) é favorável a utilização das imagens como semelhança e não como adoração se assemelha à visão e objetivo expressos nas determinações exigidas durante o II Concílio Ecumênico de Nicéia (325) “Assim, por um dom divino, as imagens foram executadas nas Igrejas para que vendo-as nos lembremos das graças que recebemos e das obras virtuosas dos santos” (OLIVEIRA, 2000, p. 38 apud SANTOS NÓBREGA, 2015, p. 39).

O Concílio de Trento (1563) foi uma resposta à Reforma Protestante por meio da reformulação das resoluções do Concílio de Niceia (325), que foi contra a críticas iconoclastas, porém estabeleceu instruções aos fiéis sobre a relação dos mesmos a imagem e sua função, assim como aos artistas, exigindo uma maior inspiração, decência e decoro nas manifestações

cenas do Evangelho, suscitando ambiguidades e dissipando a mensagem religiosa, o que era prejudicial pois a imagem tem agregado a ela a função de persuasão doutrinária na ação catequética (CONCÍLIO, 2004, p. 65 apud SANTOS NÓBREGA, 2015, p.39).

Conforme Santos Nóbrega (2015) ressalta tratados teóricos e estéticos que sucederam o Concílio de Trento feitos por membros da Igreja que ocupavam altos cargos eclesiásticos e que possuíam interesse pela arte sacra, dando diretrizes de interpretação aos decretos e exemplificando por meio de situações práticas, como por exemplo, no viés perspectivo sobre o uso da imagem tratados por Gabrielle Paleotti (1552-1597) e Federico Borromeo (1564-1631) e, no prisma sobre construir e dispor elementos internos dos templos católicos, pode citar o tratado reformático de Carlos Borromeo (1538-1584).

Como exposto anteriormente, durante a Idade Média houveram diversas discussões referente a utilização da imagem, escasso de dogmas ou normatizações para a construção das imagens, possuindo várias representações iconográficas para uma mesma temática ou história. No entanto, nos séculos XII e XIII, surge o que a autora Silva (2011) chama de “civilização da imagem”, que de acordo com Schimitt (2007, p. 145) a evolução da produção iconográfica “obedeceu a certas normas, mas estas, na maior parte das vezes, permaneciam implícitas: o ensino dos mestres, as tradições dos ateliês não dão lugar à redação de manuais e menos ainda de ordenações”.

A gravura trouxe grande contribuição para a interpretação e leitura iconográfica, com a Idade Moderna, a circulação de imagens se expande por toda Europa, adentrando e influenciando múltiplas culturas por meio da expansão ultramarina. As gravuras tiveram papel importante nessa multiplicação cultural devido ao preço, facilidade manejo, reprodutibilidade e por permitir a compreensão de escrituras e dogmas cristãos em livros ilustrados, pois a liturgia era em latim, idioma indecifrável para a maioria da população, com isso “as estampas multiplicam ao infinito os quadros dos grandes mestres” (LESSING, 1998, p.

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26 apud SANTOS NÓBREGA, 2015, p. 42).

A produção em larga escala de gravuras e estampas de cenas bíblicas tinha como intuito catequizar nativos, direcionar a fé dos devotos e incentivar a glorificação de santos. Além dessas contribuições, as gravuras também permitiram que artistas tivessem contato com a obra de grandes mestres, facilitando a troca de técnicas, informações, estilos e referências iconográficas criando a padronização e homogeneização de imagens de santos e beatos, facilitando a identificação por meio de atributos e exemplos de vida (SANTOS NÓBREGA, 2015).

A reprodução de imagens que utilizam de outras obras como influencia ou imitação durante a criação é exemplificado na fala de Schimitt (2007, p. 145) sobre o artista Villard de Honnecourt12 que “Por terem sido preservados até nossa época, os cadernos de desenho de Villard de Honnecourt mostram que os modelos circulam, são imitados, contribuem para a recepção de novas normas iconográficas.”

A circulação de livros ilustrados contendo gravuras com temas bíblicos se estenderam por todo território cristão na Idade Moderna, conforme Santiago (2009) destaca as três casas impressoras cujas obras que influenciaram na arte da pintura, que foram a Tipografia Plantiniana13 em Antuérpia, a Impressão Régia em Lisboa e a Casa Literária do Arco do Cego, em Lisboa.

No Império Português, a principal influência adveio do francês Michel Dermane, autor da Bíblia de Dermane, coleção de gravuras de iconografia religiosa que influenciou estampas, gravuras e oficinas de azulejos, como artistas importantes da América portuguesa, Manuel da Costa Athayde em Minas Gerais e Teotónio dos Santos em João Pessoa (SANTOS NÓBREGA, 2015).

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12 Villard de Honnecourt foi um mestre de obras do século XIII, com sua coletânea de desenhos possuindo grande importância para o período medieval. (FONSECA; VIZIOLI, 2014, p. 479) 13 O nome da tipografia é em homenagem ao principal editor Christophe Plantin (1520-1589), que chegou a receber o título de Arquitipógrafo Real do rei da Espanha e comandou a maior tipografia da Europa Central do século XVI.

Outro exemplar de livros de emblemas foi Iconologia (1603) do escritor italiano Cesare Ripa (1560-1622), que traz modelos de representação para diversas personificações, alegorias e personagens, que influenciou obras como os painéis azulejares portugueses do claustro da Igreja e Convento de São Francisco da Bahia (DUGNANI, 2012) Segundo a autora Correia (2009), o conhecimento da gravura europeia e sua relação com os azulejos e sua produção teve como consequência um imaginário de iconografias, que “nos revela o conhecimento de obras gravadas de referência na Europa, e nos confronta com uma reflexão sobre o universo cultural e artístico dos nossos pintores ceramistas” (CORREIA, 2009, p. 25). Assim, para a autora Correia (2009), a gravura é parte fundamental para a interpretação e leitura iconográfica, permitindo encontras vestígios da origem do painel, período e outras características que podem ser encontradas quando compara as gravuras.

A produção azulejar teve influência da circulação de temas e inspiração, dando subsidio para o desenvolvimento artístico por meio de personagens, alegorias e histórias da sacras, assim, “Os painéis do período baseiam-se, na sua maioria, na cópia de gravuras europeias largamente difundidas na época, através de composições de temática religiosa, mitológica, e profana [...]” (GOMES, 2003, p.

22 apud SANTOS NÓBREGA, 2015, p. 50).

Segundo Santos Nóbrega (2015) em 1730, houve expansão em larga escala da produção azulejar devido à mudança na forma de feitura para ser seriada com intuído de atender a grande demanda por reprodução de imagens no período joanino.

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3.2 Azulejo e a abordagem metodológica: As fontes e métodos aplicados na análise azulejar De acordo com Santos Nóbrega (2015), por muitos anos a História renegou a importância da imagem como registro documental e histórico, contribuição da tradição marxista e positivista. Porém, com a Era Moderna no século XX e o despertar de novas questões e reflexões na sociedade surge a História Cultural ou virada cultural, apresentando características do método historiográfico passando por mudanças epistemológicas e a imagem tornando-se relevante para as pesquisas com função de informar o pesquisador, substituindo a abordagem quantitativa pela qualitativa.

Até o ano de 1940, as principais contribuições à virada cultural foram os autores germânicos Max Weber e Norbet Elias, mas com a modificação dos métodos historiográficos, na década de 1970 os pesquisadores da École des Hautes Études des Sciences Sociales tiveram papel fundamental para os estudos da virada cultural, assim como o intercâmbio cultural advento dos Estados Unidos terem enviado pesquisadores para a Europa com intuito de aprimorar a formação, que resultou na circulação de ideias que fundou o colégio invisível, local com objetivo de conectar os historiadores entre si, segundo Serna & Pons (2005).

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Com a importância da imagem adquirindo caráter documental, desenvolveu-se disciplinas que se ocupavam de estudar a natureza das mensagens transmitidas mediante a códigos e considerando como essencial o momento da mensagem. A semiótica é uma dessas disciplinas, a etimologia “denomina-la-emos etimologia (do Grego semeîn, ‘signo’).

Esta ciência ensinar-nos-ia em que consistem os signos e que leis os governam.” (SAUSSURE, 1916, p. 33 apud BEELY, 1982, p. 109), assim, tem como objetivo de estudar todos os signos, operações e relações sígnicas, na qual considera todos os fenômenos culturais como fenômenos de comunicação e processos de significação (CALABRESE, 1987). Para um dos grandes sistematizadores da semiótica Humberto Eco (1976) que escreveu o Trattato di semiótica generale (Tratado de semiótica geral), a semiótica é

Efetivamente, o projeto de uma disciplina que estuda o conjunto da cultura, descompondo em signos uma variedade de objetos e acontecimentos [...] ocupa-se de qualquer coisa que possa ser assumida como um sinal. É sinal qualquer coisa que possa ser assumida como um substituto significante qualquer outra coisa.

Esta qualquer outra coisa não deve existir necessariamente nem deve subsistir de fato no momento em que o sinal esteja ocupando seu lugar (ECO, 1976, p. 22).

Apesar de ser recorrente o uso das palavras como sinônimos, a semiótica e a semiologia apresentam origens teóricas, pressupostos e orientações distintas.

O principal representante da semiologia é o filósofo e linguista suíço Ferdinand de Saussure, que afirma que a língua é como um sistema de signos que exprime ideias e o signo linguístico é uma entidade psíquica formada por dois elementos, o significado (conceito) e significante (imagem acústica) que Une não uma coisa e um nome, mas um conceito e uma imagem acústica. Esta última não é o som material, puramente físico, mas a marca psíquica desse som, a sua representação fornecida pelo testemunho dos sentidos; é o sensorial e se, por vezes, lhe chamamos material é neste sentido e por oposição ao termo da associação, o conceito geralmente mais abstrato (SAUSSURE, 1990, p. 124)

No viés da semiótica, o filosofo, linguista e cientista Charles S. Peirce (1839 - 1914) gerou uma revolução na comunicação com a teoria geral dos signos e concebeu a lógica propriamente dita como um ramo da semiótica. A sua teoria nos permite adentrar no próprio movimento interno da mensagem, no modo como são realizadas e nos procedimentos e recursos utilizados, permitindo entender mais do que o contexto imediato, assim o signo é algo que está no lugar de alguma coisa para alguém em alguma relação ou alguma qualidade e mediação entre o objeto (aquilo que ele representa) e o interpretante (efeito produzido).

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Nöth (1988) afirma que os dois termos – semiótica e semiologia- foram adotados por autores diferentes com significados ambíguos, sobrepostos ou divergentes e semiose, objeto de estudo da semiótica, como “o processo no qual o signo tem um efeito cognitivo sobre o intérprete” (NÖTH, 1988, p. 129)

a leitura iconográfica e iconológica. Com isso, o semiólogo Omar Calabrese (1987) que com os estudos de Panofsky, a História da Arte passa a ser vista como história dos fatos estilísticos originados por símbolos que exprimem processos de abstração da mente humana.

O pesquisador Santos Nóbrega (2015) ressalta ainda as contribuições de estudiosos de outros campos sociais, como Ernst Hans Gombrich, Aby Warburg e Erwin Panofsky. O pesquisador Warburg (1866-1929) destaca-se como pai da iconologia moderna, historiador das artes e antropólogo, seguindo a tradição clássica, Aby acreditava que as imagens iam além de objetos locados no espaço-temporal, mas sim como atos, memória, questionamentos, visões e prefigurações e como “também os reflexos e os rastros de uma longa história de olhares que nos precederam, os fluxos e refluxos do presente, as pistas e as antevisões da longa aventura humana” (SAMAIN, 2011, p. 40). O autor Santos Nóbrega (2015, p. 31-32) resume como o interesse “pelos esquemas que se direcionavam para as formas em que as percepções e emoções eram representadas por poetas e pintores” e que “existe em casa artista uma exigência advinda de suas experiências próprias, que o faz definir suas próprias formas, tendo em vista que toda descrição é uma interpretação”.

Para o trabalho em questão, foi utilizado o método de análise da imagem desenvolvido por Panofsky (1976, p. 49-54), que agrega a iconologia e iconografia como estudos da análise das artes visuais em três níveis de significado. Com etimologias semelhantes, a iconografia é a junção da palavra em latim Eikon, que significa imagem, com Graphein, “escrever”, assim, com a tradução literal a escrita da imagem e classificação da imagem; no caso da iconologia, é a junção de Eikon com Logos, que seria a ciência, razão ou pensamento, com a tradução explicita seria o discurso ou interpretação da imagem, que segundo Panofsky (1976) advém da síntese mais que da análise.

Devido as contribuições e disseminação das ideias de Warburg, foi criado o Instituto Warburg, cujo local possuía livros, fontes, pesquisas e acervos, com a presença de estudiosos e pesquisadores de renome, como Ernst Cassirer e Erwin Panofsky.

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Com o estudo do alemão Panofsky, discípulo de Aby Warburg e que seguiu a vertente de Cassirer, influenciou com suas ideias inovadoras o campo da teoria de pesquisa com imagens e, devido à preocupação com a hermenêutica visual, o método iconográfico e iconológico, com um ensaio clássico de 1939 chamado Estudos de Iconologia: temas humanísticos na arte do renascimento, onde distingue

Com intuito de construir a identificação e distinção dos três níveis de significado, Panofsky traz como exemplo o ato de encontrar na rua um conhecido que retira o chapéu como forma de cumprimento, a ação é apenas uma mudança de detalhes dentro da configuração geral de cores, linhas e volumes presentes na visão. Considerando o primeiro nível de significado, chamado de primário ou natural, seria a leitura pré-iconográfica, que ocorre Identificação das formas puras, ou seja: certas configurações de linha e cor, [...] percepção de algumas qualidades expressionais, como o caráter pesaroso de uma pose ou gesto [...]. O mundo das formas puras assim reconhecidas como portadoras de significados primários ou naturais pode ser chamado de mundo dos motivos artísticos (PANOFSKY, 1976, p. 50).

No caso do exemplo, seria identificar as formas visíveis, que seriam o objeto/ cavalheiro que executa uma ação, retirar o chapéu. Porém, é possível

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identificar detalhes aprofundados além da simples identificação, como as nuances psicológicas ou características de uma dada civilização.

Com o segundo nível de análise da imagem, chamado de tema secundário ou convencional, denominado dessa forma pois é por meio de convenção que se reconhece o significado, descrita como: É apreendido pela percepção de que uma figura masculina com uma faca representa São Bartolomeu, que uma figura feminina com um pêssego na mão é a personificação da veracidade [...] Assim fazendo, ligamos os motivos artísticos e as combinações de motivos artísticos (composições) com assuntos e conceitos. Motivos reconhecidos como portadores de um significado secundário ou convencional podem chamar-se imagens, sendo que combinações de imagens são os antigos teóricos de arte chamavam de invenzioni; nós costumamos dar-lhes o nome de estórias e alegorias. A identificação de tais imagens, estórias e alegorias é o domínio daquilo que é normalmente conhecido como ‘iconografia’ (PANOFSKY, 1976, p. 50).

Ou seja, é apreendido a identificação de um tema, assunto e conceito dos motivos e combinações das formas puras, identificando costumes e tradições culturais peculiares de uma civilização, como gesto do conhecido de retirar o chapéu representando um cumprimento e forma de saudação peculiar ao mundo ocidental, que Panofsky afirma ser resquício do cavalheirismo medieval, devido “os homens armados costumavam retirar os elmos para deixarem claras suas intenções pacificas e sua confiança nas intenções pacíficas dos outros” (PANOFSKY, 1976, p.

48).

O terceiro e último é chamado de significado intrínseco ou conteúdo, que seria o reconhecimento dos valores simbólicos que revelam suas bases nacionais, sociais, educacionais, tradições, status e história pessoal, descrito por Panofsky como 112

Apreendido pela determinação daqueles princípios subjacentes que revelam a atitude básica de uma nação, de um período,

classe social, crença religiosa ou filosófica – qualificados por uma personalidade e condensados numa obra. Não é preciso dizer que estes princípios se manifestam, e portanto esclarecem, quer através dos ‘métodos de composição’, quer da ‘significação iconográfica’ [...]

Uma interpretação realmente exaustiva do significado intrínseco ou conteúdo poderia até nos mostrar técnicas características de um certo país, período ou artista, por exemplo, a preferência de Michelangelo pela escultura em pedra, em vez de bronze, ou o uso peculiar das sombras em seus desenhos, são sintomáticos de uma mesma atitude básica que é discernível em todas as outras qualidade específicas do seu estilo. (PANOFSKY, 1976, p. 50)

Ao conceber essas formas, motivos, imagens, estórias e alegorias como modo de manifestações de princípios subjacentes interpretamos-vos como formas simbólicas, que seria o que Ernst Cassirer chamou de valores simbólicos.

A interpretação e descoberta é o objeto de estudo da iconologia, que são “muitas vezes, são desconhecidos pelo próprio artista e podem até diferir enfaticamente do que ele conscientemente tentou expressar” (PANOFSKY, 1976, p. 53).

Relacionado a exemplificação do encontro com o conhecido, o terceiro nível seria a constituição do acontecimento natural no espaço-temporal, indicando disposições de animo, sentimento e personalidade, que é Condicionada por ser ele um homem do século XX, por suas bases nacionais, sociais e de educação, pela história de sua vida passada e pelas circunstancias atuais que o rodeiam, mas ela se distingue também pelo modo individual de encarar as coisas de reagir ao mundo que, se racionalizado, deveria se chamar de filosofia. Na ação isolada de uma saudação cortês, todos esses fatos não se manifestam claramente, porém sintomaticamente. Não podemos construir o retrato mental de um com base nesta ação isolada, e sim coordenado um grande número de observações similares e interpretando-as no contexto de nossas informações gerais quanto à sua época, nacionalidade, classe social, tradições intelectuais e assim por diante. (PANOFSKY, 1976, p. 49).

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Ademais, o entendimento dos níveis simbólicos e aplicação em obras figurativas é de grande auxilio para interpretar, estabelecer datas, origens, autenticidade e interação entre as formas simbólicas e ideias filosóficas, teológicas e políticas.

Para muitos autores, a última etapa da metodologia Panofskiana é insuficiente pela pretensão totalizante, com isso é de grande importância complementar com autores cujos trabalhos fornecem subsídios para aprofundamento do método de Panofsky complementando a etapa iconológica, Nóbrega Santos (2015) cita as metodologias de Carlo Ginzburg, autor de “Mitos, emblemas, sinais: Morfologia e história” que analisa a obra por inteiro e suas contribuições, com preocupação com as fontes e a sistematização; e Nicolas Bourriaud, autor de “Estética Relacional”, teorizou práticas artísticas, fundamentou a teoria da estética relacional que “consiste em julgar as obras de arte em função das relações interhumanas que elas figuram, produzem ou criam” (BOURRIAUD, 2009, p. 151 apud NÓBREGA SANTOS, 2015, p. 34).

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3.3 Análise dos painéis azulejares e influências da cultura histórica e artística Com o estudo da semiologia de Saussure, semiótica de Peirce e o método Panofskiano de análise da imagem, pretendeu compreender o processo dos símbolos nas representações azulejares da nave da Igreja de São Francisco, considerando as influências culturais, estrutura comum dos processos criativos e comparação com obras da mesma época, material, temática ou representação, assim, busca-se revelar a herança simbólica transmitida nos painéis azulejares.

Através da grande porta de jacarandá presente no ádito, localiza-se vestíbulo sob o coro com pias do século XVII de pedra calcária para colocar água benta e painel em madeira policromada do século XVIII no forro. Posterior, adentra-se a nave da Igreja de São Francisco (Figura 29) com um rico complexo artístico de incrível magnitude, com pinturas à óleo sobre madeira ornamentando o forro na técnica denominada de trompe l’oeil ou ilusionista, com a temática a alegoria da vida de São Francisco de Assis, e no forro do altar-mor encontra-se as vinte cenas de Santo Antônio de Pádua.

Circundando todas paredes internas da nave da igreja são dezoito painéis azulejares históricos “totalizando quatro mil e seiscentos ladrilhos, com artísticos desenhos numa feliz e suave combinação de duas cores – azul e branco” (NÓBREGA, 1912, p. 142) com 13 azulejos de altura e 14 x 14 cm de dimensão, representando cenas sucessivas da vida de José do Egito. O mesmo autor aponta o uso do branco sobre fundo azul forte nos azulejos como influência renascentista.

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O pintor azulejar responsável pela feitura dos painéis históricos da nave foi Teotónio dos Santos, um dos três pintores de azulejos que mais se destacaram na produção joanina e com atuação significante na decoração de espaços religiosos em Portugal e Brasil. Entre os anos de 1707 e 1710, o pintor iniciou como aprendiz

Figura 29: Representação da planta baixa da Nave da Igreja de São Francisco, com a marcação com a linha azul de onde estão locado os azulejos.

Fonte: Nóbrega, 1974, p. 77 editada pela

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na oficina do pintor António de Oliveira Bernardes, onde adquiriu conhecimentos que valeram uma eximia produção até a década de 1730 e trabalhou a par dos irmãos Policarpo e Inácio de Oliveira Bernardes, que foi atribuído ao primeiro à autoria pela pintura dos painéis azulejares dos nichos inseridos no adro, informação descrita no capítulo 2.2.1 (PORTELA, 2016). Posterior ao aprendizado, é encontrado inscrição na Irmandade de S. Lucas como morador na Rua dos Poiais de São Bento, freguesia de Santa Catarina, Lisboa. Santos Nóbrega (2015) associa o estilo gráfico de Teotónio dos Santos com o lirismo de Manuel dos Santos.

Teotónio dos Santos assinou diversos painéis azulejares, o primeiro datado foi 1713 na Igreja do Mosteiro de Santa Maria do Bouro em Amares e a Basílica Real de Nossa Senhora da Conceição em Castro Verde, porém o pintor também possui obras não datadas, como os dois conjuntos de painéis azulejares na capela-mor da Igreja do Convento de São Bento em Viana do Castelo e o Santuário de Nossa Senhora da Esperança em Abrunhosa do Ladário em Sátão (SANTOS NÓBREGA, 2015).

De acordo com Carvalho (2012) apud Santos Nóbrega (2015), José Meco chama atenção para a produção de um conjunto de revestimentos feito em associação de Teotónio dos Santos, Valentim de Almeida e o Mestre P.M.P., que realizaram no período de transição entre o Ciclo dos Mestres e a Grande Produção Joanina, como, por exemplo, os revestimentos do Palácio da Independência, em Lisboa. Os pintores azulejares Teotónio dos Santos e Valentim de Almeida foram responsáveis pela expansão do Barroco tipicamente romana na azulejaria portuguesa, utilizando serafins com túnicas teatrais e perspectiva, expansão dos planos e profundidade na decoração, conhecida como efeito trompe l’óeil utilizado por ambos, por exemplo, pintura de pilaras e anjos voando.

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Os painéis históricos da nave são oitocentistas característicos do século da azulejaria portuguesa, considerados azulejos de melhor qualidade fabricados e “além de fabricar azulejos com finalidade de decorar paredes, passaram também às miniaturas de quadros e até mesmo àqueles de grandes proporções” (BURITY, 2008, p. 123).

Com relação à história desses seculares azulejos, Burity (2008) descreve que Permanece obscura, não obstante pesquisas e trabalhos feitos por franciscanos e leigos que se interessam pela arte. A primeira indicação sobre a dita faiança nos veio através do cronista Frei Jabotão em sua excelente obra Novo Orbe Serafico Brasilíco. Mesmo que não sabemos por que o ilustre franciscano, ao descrever os conventos da Província, não se prolongou nos azulejos e pouco esclarece sobre o assunto. Apenas se refere, quanto à procedência dos mesmos, à ‘nova fábrica’ em Portugal.

(BURITY, 2008, p. 124)

No entanto, Pinheiro (1951, p. 21) relaciona as obras olarias do século XVIII de onde advém os azulejos para o Brasil como arte extraordinária e resultante da “fábrica do Beato Antônio; a do Rato, com a glória pombalina estampadas; as anônimas, de onde também saíram peças do mais alto valor”. E a datação dos painéis, é possível encontrar bibliografias relatando pela avaliação de Santos Simões A igreja [...] conserva o silhar de azulejos guarnecendo a nave até aos altares colaterais. São dois os tipos de composição, ambos de uma mesma época que estará empreendida no período das obras iniciadas em 1718 e terminadas em 1734, data esta última que muito convém aos azulejos em estudo. Ao longo de ambas as paredes, desde a fundeira, são painéis lisos e contínuos, de 13 azulejos de altura, incluindo os das barras que os circundam e onde, na parte central, se conta a história de José do Egipto em cenas sucessivas e sem outras soluções de continuidade que não sejam motivos arquitectónicos ou árvores incorporadas na própria história. [...] têm 142 azulejos na extensão – o que notabiliza esta decoração, mas, acima de tudo a correção do desenho e de uma boa qualidade de pintura.

(SANTOS SIMÕES, 1965 apud BURITY, 2008, p. 126)

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Os quatro mil e seiscentos ladrilhos nas cores azul e branco que compõe os painéis azulejares com desenhos artísticos narram a biografia de José do Egito e os principais acontecimentos. O pintor historiou episódios de forma sequenciada e cronológica, com, no primeiro plano, estando representado os personagens da passagem analisada, como no primeiro painel analisado com a pintura dos irmãos de José do Egito colocando-o na cova, e na segunda camada, paisagens montanhosas com vegetação, em outras cenas pictóricas é comumente encontrado, além das vegetações, construções com uma arquitetura imponente, com características arquitetônicas do barroco romano, como colunas, pilastras, arcos e cúpulas (Figura 30 A). Para intercalar os acontecimentos da vida de José, foi utilizado vegetação arbóreas, para separar uma passagem da próxima ou para decorar os extremos dos painéis azulejares (Figura 30 B). Os azulejos apresentam cercaduras de linhas simétricas e lineares com elementos decorativos, como folhas e anjos com as asas abertas ou nas pilastras (Figura 31).

Figura 30: A) Representação azulejar de uma arquitetura imponente com caráteres do Barroco Romano; B) Detalhe de representação de vegetação. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Para o entendimento dos azulejos que narram a história bíblica, recorremos ao Antigo Testamento, especificamente no Livro Gênesis, entre os capítulos 37 ao 47. Inicia a narração com o aniversário de dezessete anos de José, quando Jacó, seu pai e que depois Deus mudou seu nome para Israel, faz uma túnica de várias cores e o presenteia: “E Israel amava a José mais do que a todos os seus filhos, porque era filho da sua velhice; e fez-lhe uma túnica de várias cores” (GÊN. 37, 3). O presente causou inveja e ciúmes entre os irmãos mais velhos, que odiavam a José, pois viam ameaçados a primogenitura disputada, a revolta aumentou as explanações e hostilização quando José teve os seguintes sonhos:

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Eis que estávamos atando molhos no meio do campo, e eis que o meu molho se levantava, e também ficava em pé, e eis que os vossos molhos o rodeavam, e se inclinavam para mim. Então lhe disseram seus irmãos: Tu, pois, deveras reinarás sobre nós? Tu deveras terás domínio sobre nós? Por isso ainda mais o odiavam por seus sonhos e por suas palavras.

Eis que tive ainda outro sonho; e eis que o sol, e a lua, e onze estrelas se inclinavam a mim. (GÊN. 37, 7 – 9)

Figura 31: Detalhe da cercadura com anjo com folhas e anjo em pilastra. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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O patriarca repreende o caçula questionando se o próprio pai, mãe e irmãos prostrariam perante a ele e envia José a Siquém em busca de notícias dos irmãos que apascentavam as ovelhas. Ao chegar em Siquém, José descobre que os irmãos tinham ido para Dotã e foi a procura, porém, ao ser avistado por seus onze irmãos, eles, temendo que os sonhos de José pudessem materializar, conspiravam sua morte pela inveja e ciúme que nutriam pelo mais novo: “Vinde, pois, agora, e matêmo-lo, e lancêmo-lo numa dessas covas, e diremos: Uma fera o comeu; e veremos que será dos seus sonhos.” (GÊN. 37, 22). Contudo, não concretizou o plano graças a Rúben, primogênito filho de Jacó e Léa, que deu a ideia de lança-lo na cova no deserto. Assim, “Logo, pois, que José chegou junto de seus irmãos, despiram-no da túnica talar de várias cores, e lançaram-no na cisterna velha, que não tinha água” (GÊN. 37, 23-24), a passagem bíblica em questão foi a primeira cena representada nos azulejos.

Após de lançar à cova (Figura 32), passaram uma caravana vinda de Gileade que seguia ao Egito, com negociantes Madianitas 14, quando Judá teve a ideia de vender o irmão a esses mercadores e “Tiraram-no da cisterna e venderam-no por vinte moedas de prata aos Ismaelitas; e estes levaram-no para o Egito” (GÊN. 37, 28), representado na segunda cena dos painéis históricos (Figura 33).

Com a circulação de gravuras e manuais iconológicos na Europa, é comumente encontrado influência e inspiração de personagens. Seguindo o esquema comparativo entre as duas imagens, é possível observar semelhança nos gestos e vestimentas das gravuras nas pinturas azulejares, como as vestes de cavaleiro de Madianitas (Figura 34 A) que se assemelham à representação de Cesare Ripa no livro Iconologia representando o “amor domesticado” (Figura 34 B).

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14 Os Madianitas são citados no Antigo Testamento no livro de Gêneses e Crônicas como uma coligação de tribos nômades árabes descentes de Abraão e sua esposa concubina Quetura, que tiveram seis filhos: Zinrã, Jocsã, Medã, Midiã, Isbaque e Suá.

Figura 32: Painel azulejar com a cena dos irmãos de José colocando-o dentro da cova no deserto.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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125 Figura 33: Painel azulejar com a cena dos irmãos de José retiram-o do poço para vender aos Madianitas, com Judá no centro da representação negociando. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Figura 34: A) Ampliação do azulejo; B) “Amor Domato” representado por Cesare Ripa. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Continuando a narrativa exposta nos painéis, a terceira cena (Figura 35) representa o momento que os irmãos estavam com a túnica “tingindo no sangue de um cabrito que mataram” (Gên. 37, 31) para entregar a Jacó, com intuito de fazê-lo acreditar que José teria sido morto por uma fera.

Com a túnica de José manchada de sangue, os irmãos levam-na a Jacó representado na quarta cena e derivada da passagem (Figura 36): Mandaram-na levar ao pai, e dizer-lhe: Encontramos esta túnica; vê-se é a túnica do teu filho, ou não. E o pai, tendo-a reconhecido, disse: ‘A túnica é do meu filho, uma cruel fera o comeu, uma besta devorou José.’ E, rasgando os vestidos, cobriu-se de cilício, chorando o seu filho muito tempo. Todos os seus filhos e filhas tentaram consolá-lo, mas ele não quis ser consolado e disse: — Vou ficar de luto por meu filho até que vá me encontrar com ele no mundo dos mortos. (GÊN. 37, 32-3

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Figura 35: Irmãos de José tingindo a túnica de sangue de cabrito.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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Ao chegar ao Egito, os Madianitas venderam José a Putifar, eunuco de Faraó e chefe da guarda, e construíram uma forte relação, como entendido na passagem bíblica “[...] Vendo, pois, o seu senhor que o Senhor estava com ele, e tudo o que fazia o Senhor prosperava em sua mão, José achou graça em seus olhos e servia-o; e ele o pôs sobre a sua mesa, e entregou na sua mão tudo que tinha” (Gên. 37, 3-4). Porém, não impediu que a esposa do egípcio de tentar se relacionar com José, que rejeitava e evitava ficar a sós com a sua senhora, porém “aconteceu que, em um dia, entrou José em casa (de Putifar), e fazia uma certa obra, sem que ninguém o visse; e ela (a mulher de Putifar), segurando-o pela orla do seu manto, disse-lhe: Dorme comigo! Mas ele, deixando a capa na sua mão, fugiu.” (Gên. 39, 11-12).

Figura 36: Painel azulejar representando os irmãos de José entregando ao pai a túnica suja de sangue. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

O painel azulejar da cena apresenta uma composição formal característica de outras gravuras como uma tradição iconográfica, e ideia de movimento que age em sintonia com o conjunto pictórico como proposto por Wölfflin (2006). A pintura apresenta características arquitetônicas que adequam o espaço a uma arquitetura europeia seiscentista ou setecentista do barroco com influência romana, com pilastras robustas e enquadramentos.

(SANTOS NÓBREGA, 2015) A definição de tradição iconográfica formulada pelo antropólogo Carlo Severi, como veículo de uma memória social, construída por intermédio da narração ou pragmática, que “tende a criar um número relativamente estável de imagens cada vez mais complexas, cada vez mais ‘carregadas’ de significados e cada vez mais persistentes” (SEVERI, 2007, p. 148).

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Observa-se que a composição da cena em questão enquadra-se na descrição de uma tradição iconográfica, dado a existência de gravuras que eram utilizadas para decorar bíblias e obras artísticas da época que circularam na Europa moderna, como já exposto por Santos Nóbrega (2015), para compreender a construção simbólica das gravuras que percorreram séculos. Nesse prisma, buscou-se indícios quanto aos documentos com representações de José do Egito em acervos digitais encontrados, que serviriam como base para análise Figura 37: Painel histórico com José fugindo da mulher de Putifar. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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iconográfica e iconológica da cena, as variadas ilustrações encontradas apresentam características gestuais e composição formal similares. O trabalho em questão não descarta a existência de outras fontes de datações diferentes com ilustrações com as mesmas características dos painéis. Os documentos mais provectos inspecionados para pesquisa que apresentavam a mesma configuração compositiva estudada do painel azulejar de José foram a Bíblia Sacra de Jean de Tournes datada de 1558 (Figura 38 A), Biblia Sacra ... cum Hebraicorum nominum interpretatione (Figura 38 B) de Giullame Rouillé em 1563 e Icones Biblicae Veteris et Novi Testamenti de Melchior Küsel em 1679 (Figura 38 C). É perceptível semelhança das gravuras relacionada à disposição dos personagens com José locado à direita, braços erguidos para mesma direção e cabeça com inclinação para esquerda, enquanto a mulher de Putifar à esquerda encontra-se sentada na cama, levemente erguida pelo ação de puxar as vestes de José; a arquitetura difere de uma gravura para outra por elementos arquitetônicos que eram utilizados na época de cada ilustração, considerando o reconhecimento dos valores simbólicos que revelam as bases nacionais, tradição, educação, status social e história pessoal como descrito no terceiro passo do método panoksyiano; porém, no que diz a respeito dos detalhes decorativos, as gravuras apresentam semelhanças na representação das finas cortinas que caem na cama.

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Nessa perspectiva, foi analisado a representação de José do Egito na Bíblia de Demarne pelo frânces Michel Demarne, que Santos Nóbrega (2015) já relata da inspiração de Teotónio para produção da cena de José fugindo de Putifar da gravura de Demarne (Figura 39) presente na Histoire sacrée de la Providence et de la conduite de Dieu sur les homme. do artista francês. A representação de Demarne apresenta-se como um espelhamento análogo à composição das gravuras analisadas anteriormente, assim, com José aparecendo à esquerda e a mulher de Putifar à direita, e permanecendo os gestos iguais, de José erguer os braços com a cabeça inclinada para o lado oposto, enquanto a mulher de Putifar inclinase em sua direção com intuito de puxar suas vestes.

Figura 38: A) Gravura da Bíblia de Jean de Tournes; B) Gravura da Bíblia de Giullame Rouillé; C) Bíblia de Melchior Küsel.

Fonte: A) TOURNES, 1558; B) ROUILLÉ, 1563; C) KÜSEL, 1679.

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Além das bíblias ilustradas que circulavam comumente na Europa Moderna, encontramse ilustrações de artes da época, como a gravura Jozef a Putifárova žena dos artistas eslovacos Steinmüller sc., Raffael inv. e Kandler del. datada aproximadamente 1830, que apresentava a mesma composição formal e espelhamento das gravuras iniciais (Figura 40).

No campo das artes pictóricas, também é possível encontrar representações da passagem bíblica de José fugindo da mulher de Putifar, como na pintura de Bartolomé Esteban Perez Murillo data entre os anos de 1640-1645 e obra intitula-se Joseph and Potiphar’s Wife (Figura 41).

Figura 40: Gravura de artistas eslovacos. Fonte: STEINMÜLLER, JOSEF, RAFFAEL, KANDLER, WILHELM (1830). Disponível em: < https://www.slovakiana.sk/kulturne-objekty/cair-ko1i0ky?content=CAIR_DIV_IMAGES_1&contentDo=urn:nbn:sk:c air-do235o7> Figura 41: Pintura representando José e a mulher de Pufitar.

Fonte: BARTOLOMÉ, 1640-1645. Disponível em: < https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Bartolome_Esteban_Perez_ Murillo_012.jpg>

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Figura 39: Gravura de Michel Demarne com José fugindo da mulher de Putifar.

Fonte: DEMARNE, 1728-1729 apud NÓBREGA, 2015, p. 52.

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Encontra-se azulejos presentes na decoração de igrejas em Portugal e Brasil, a primeira analisada foi a Casa do Poço em Figueira da Foz, Lisboa, que possui quase 6.700 azulejos holandeses da primeira metade do século XVIII no piso nobre da localidade, entre os motivos bíblicos encontrados, é possível observar passagem bíblica de José fugindo da Mulher de Putifar com a mesma composição formal estudada, porém com detalhes artísticos simplificados (Figura 42).

Em igrejas brasileiras, observa-se a utilização de azulejos decorativos com a passagem estudada com a mesma disposição espacial dos personagens e características gestuais nos painéis azulejares na nave da Capela da Jaqueira (Figura 43 A), na cidade do Recife localizada em Pernambuco, e na igreja de Nossa Senhora da Saúde, em Rio de Janeiro (Figura 43 B).

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Figura 42: Azulejo holandês da Casa do Poço, Lisboa.

Fonte: PINTO, 2013, p.19.

Figura 43: A) Azulejo da Nave da Capela da Jaqueira; B) Azulejo da Igreja de Nossa Senhora da Saúde.

Fonte: SANTOS NÓBREGA, 2015, p. 53; ASTORGA, 2004, p.

209.

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Na continuação do enredo da biografia de José do Egito, após fugir da mulher de Putifar, [...] Aconteceu que, vendo ela que deixara a sua roupa em sua mão, e fugira para fora. Chamou aos homens de sua casa e falou-lhes, dizendo: Vede, meu marido trouxe-nos um homem hebreu para escarnecer de nós; veio a mim para deitar-se comigo, e eu gritei com grande voz; E aconteceu que ouvindo ele que eu levantava a minha voz e gritava, deixou a sua roupa comigo, e fugiu, e saiu para fora. (GÊN. 39, 15 - 18)

Com isso, Putifar encarcerou José nas masmorras do Palácio do Faraó pela traição e assédio à esposa. Na prisão, José passou doze anos entristecido, porém em um dia sua vida mudou quando ele interpretou os sonhos de dois prisioneiros que eram servos dos do faraó, um copeiro e um padeiro. Ambos tiveram sonhos inquietantes, contaram a José, que fez a sua interpretação dos dois enredos, o primeiro:

No sexto painel histórico (Figura 44), representa a estrutura da prisão com paredes espessas e janelas altas com grades. A disposição dos personagens conta com José está em pé à direita, apontando para os outros dois prisioneiros estão à esquerda, sentados com correntes presas em suas pernas direita.

O primeiro prisioneiro copeiro-mor está com a mão no rosto e expressão satisfeita de saber que a interpretação do sonho significando sua liberdade e volta ao cargo; enquanto o segundo prisioneiro padeiro-mor aponta-se para si mesmo e os recantos da boca para baixo mostrando insatisfação e surpresa, pois seu sonho simboliza a sua morta enforcado, com as aves devorando suas carnes.

Acima da cena, encontra-se a representação dos sonhos emoldurados, à esquerda está o sonho do copeiro-mor, retirando da cêpa os cachos de uvas maduras, significando a

E o copeiro-mor contou seu sonho a José: Em meu sonho, disse ele, vi uma cêpa que estava diante de mim, e nesta cêpa três varas, que pareciam brotar; saiu uma flor e seus cachos eram uvas maduras. [...] José respondeu: A interpretação do sonho é esta: As três varas são três dias ainda aqui (o copeiro), depois dos quais se lembrará ao antigo cargo, e tu apresentarás a taça conforme o teu ofício, como costumavas a fazer antes. (Gên. 40, 9–13)

Com a anunciação da libertação do mesmo dentro de três dias, acreditando que aquele homem pudesse servir de instrumento para sua própria libertação, José pediu-lhe para interceder em seu favor junto do Faraó. O padeiro-mor vendo a boa interpretação do sonho, narrou o seguinte sonho:

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Eu também, em meu sonho, levava sobre a minha cabeça três cestas de pão branco. Na de cima havia toda a sorte de manjares para o Faraó; mas as aves do céu comiam-nas na cesta que estava sobre minha cabeça. José respondeu: A interpretação do sonho é esta: Os três cestos são três dias ainda que te restam (o padeiro) depois dos quais o Faraó mandará tirar-te a cabeça, e te suspenderá a uma forca e as aves devorarão tuas carnes. (Gên. 40, 16-17)

Figura 44: Painel de azulejo com José na prisão decifrando os sonhos dos prisioneiros.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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liberdade e volta ao cargo (Figura 45 A); enquanto, à direita, o sonho do padeiro-mor, que ele carrega uma cesta acima da cabeça de pão branco, com aves comendo os pães, que simbolizava sua morte por enforcamento. (Figura 45 B).

Figura 45: A) Representação do sonho do Copeiro; B) Sonho do padeiro-mor. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Santos Nóbrega (2015) diz que a inspiração de Demarne (Figura 46) aparece de forma evidente na disposição dos personagens na cela e gestos, especialmente no caso de José, demonstrando influência da gravura sobre a pintura.

Na Igreja de Nossa Senhora da Saúde no Rio de Janeiro estão inseridos azulejos setentistas, que narram a saga de José do Egito (Figura 47), com enfoque na passagem de José decifrando os sonhos dos prisioneiros, que apresenta uma configuração na disposição dos personagens e gestos semelhante aos dois painéis azulejares analisados anteriormente.

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O sétimo painel azulejar retrata o banquete do Faraó de comemoração ao dia de nascimento, que comprova o dom divinatório de José, por ocorrer após três dias do episódio dele decifrar os sonhos dos prisioneiros.

Figura 46: Cena de José decifrando sonhos na Bíblia Demarne. Fonte: SANTOS NÓBREGA, 2015, p. 54.

Figura 47: Azulejo da Igreja de Nossa Senhora da Saúde. Fonte: ASTORGA, 2004.

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Ao dar um grande banquete aos seus criados, o Faraó lembrou à mesa do copeiro-mor e do padeiro-mor “E restituiu um ao seu lugar, para lhe ministrar a taça; e mandou suspender o outro num patíbulo, pelo que foi comprovada a verdade do intérprete.” (GÊN. 40, 21-22) No azulejo (Figura 48) é possível observar no primeiro plano o copeiro-mor abaixado executando a ação de manejar o liquido vindo das uvas para taça do Faraó; no segundo plano e centro da composição, encontra-se o banquete, com o Faraó disposto à direita, com vestes finas, coroa e trono, que o difere dos outros seis personagens, com vestes mais simples do que o Faraó; no último plano, à esquerda da cena e afastada da cena principal como detalhe da cena, encontra-se o padeiro-mor no patíbulo enforcado, como previsto na interpretação.

A cena é rodeada com arcos e pilastras enquadrados na cena, características do barroco romano. Ao redor da composição é decorado com vegetação arbóreas, montanhas, rio e construções.

Figura 48: Banquete do dia do nascimento do Faraó. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Dois anos após a interpretação dos sonhos dos dois prisioneiros que se realizaram, José continuava preso até o dia que o Faraó teve um sonho perturbador (Figura 49), que ninguém do reino conseguia interpretá-lo. No painel azulejar, identifica-se o Faraó com rosto barbado de feições maduras demonstrando princípios de velhice, adormecido na cama com os tecidos dobrados dos seus lençóis criando ideia de movimento e paramentos de um monarca na mesa ao lado da cama, como a coroa e cetro. Ambiente da cena pictórica é arquitetonicamente espaçoso, apesar da clara influência sofrida pelas gravuras em circulação, como da Bíblia de Demarne, a arquitetura é característica de um ambiente do século XVI ou XVII. Durante o sono, o Faraó teve sonhos de revelação:

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Figura 49: O sono do Faraó.

Fonte: Acervo pessoal da autora,

[...] Parecia-lhe que estava na margem do Nilo, do qual saiam sete vacas, muito formosas e gordas, as quais pastavam nos lugares palustres. Saiam também outras sete do mesmo rio desfiguradas e consumidas de magreza, as quais pastavam na mesma margem

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do rio, em lugares cheios de ervas; e estas devoravam aquelas que eram belas de aspecto e gordas de corpo. Tendo o Faraó despertado, adormeceu novamente, e teve outro sonho: Sete espigas saiam do mesmo caule, cheias de grãos e formosas; e nasciam também outras tantas espigas delgadas e queimadas do suão, as quais devoravam todas as primeiras que eram tão belas.

Despertando Faraó do sono, e tendo amanhecido, cheio de pavor [...] (GÊN. 41, 1 - 8)

Acima da cena pictórica, encontra-se os sonhos emoldurados, com o primeiro sonho à esquerda mostrando as sete vacas e o segundo mostrando as sete espigas, pode ser melhor observado na ampliação da Figura 50.

Santos Nóbrega (2015) associa a interpretação do sono do Faraó ao ambiente colonial da Capitania da Paraíba, caracterizando a ideia de criar uma identificação com outros governantes que, tocados pela passagem bíblica e cena pictórica,

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Figura 50: Ampliação dos sonhos do Faraó.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

poderiam estar mais atentos aos recados e presságios enviados por Deus.

O Faraó despertou do sono assombrado, chamou todos os adivinhos do Egito e todos os sábios para que reunidos, pudessem explicar seu sonho, porém não encontrou ninguém no reino para interpretá-lo. O copeiro, que antes José interpretou seu sonho simbolizando sua libertação, recordou-se do hebreu e indicou para o Faraó para ajudá-lo. Assim “Imediatamente José foi tirado do cárcere por mandado do Rei. Barbearam-no, mudaram-lhe os vestidos e apresentaramlhe.” (GÊN. 41, 14).

O nono painel histórico (Figura 51) envolve nove personagens, com à esquerda encontramos um personagem imponente que pode ser identificar como o Faraó, com vestes refinadas, sentado em um trono com detalhes de curvas e volutas características do barroco,

Figura 51: José se encontrando com o Faraó.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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os pés sobre uma banqueta, coroa acima da cabeça, cetro na mão direita e a mão esquerda aberta e estendida direcionada para o jovem, demostrando receptividade à interpretação do hebreu; este por sua vez, podemos identificar como o José, que encontra-se de pé com postura ereta e braço direito estendido para o Faraó, enquanto decifra os sonhos. Os outros sete personagens são conselheiros que aparecem trajando vestes simbolizando que são de uma condição mais abastada, configurando-os como próximos do círculo do Faraó.

Apesar de serem dois sonhos distintos, ambos traziam o mesmo presságio, que José interpretou como: O sonho do Rei reduz-se a um só: Deus mostrou ao Faraó o que está para fazer. As sete vacas formosas e as sete espigas cheias são sete anos de abundância; e no sonho têm a mesma significação. As sete vacas magras e macilentas, que subiam (do rio) após as primeiras, e as sete espigas delgadas e queimadas do suão, são sete anos de fome que estão para vir. [...] Agora, pois, escolha o rei um homem sábio e átrio a quem dê autoridade sobre a terra do Egito. (GÊN. 41, 25-27)

Com a interpretação, o Faraó anuncia que José será nomeado governador do Egito após sua interpretação Tu governarás a minha casa, e, ao mando de tua voz obedecerá o povo; eu não terei sobre ti outra precedência além do trono. O Faraó disse mais a José: Eis que te dou autoridade sobre toda a terra do Egito. E tirou o anel da sua mão, e meteu-o na mão dele; e vestiu-lhe um vestido de linho fino, e pôs-lhe ao pescoço um colar de ouro. E fé-lo subir para o seu segundo coche, clamando o pregoeiro que todos ajoelhassem diante dele, e soubessem que era o superintendente de toda a terra do Egito. (GÊN. 41, 40-43)

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No painel azulejar próximo ao altar-mor (Figura 52), contém apenas uma cena pictórica com moldura simétrica e linear com anjos, pilastras e folhas. Podemos observar a cena descreve a passagem bíblica analisada anteriormente, retratando o momento que José

Figura 52: José se encontrando com o Faraó.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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Figura 53: José do Egito montando em um belo cavalo.

146 Acervo pessoal da autora, 2020.

Fonte:

é conduzido por um dos conselheiros a reverenciar o Faraó, que está sentado em um trono rebuscamento decorado, ladeado por um guarda com vestes características e lança e por dois outros conselheiros. José então recebe a coroa como símbolo do cargo de administrador do Egito das mãos do Faraó, com a missão garantir os sete anos de fartura fossem suficientes para alimentar e atender à população nos próximos setes anos de seca que iriam acontecer, segundo sua interpretação dos sonhos do Faraó.

O segundo painel próximo (Figura 53) ao altar-mor retrata a cena de José do Egito em triunfo a cavalo com o braço levantado e apontando para atrás do outro personagem da cena, possivelmente trata-se de seu cavalariço. A cena pictórica simboliza o ápice de sua jornada pessoal, seu sucesso diante das adversidades, liberto da escravidão e da prisão injusta, enriqueceu e ocupando uma posição na corte egípcia.

Continuando a narração do silhar azulejar, a próxima cena pictórica (Figura 54) mostra José percorrendo as terras do faraó, com intuito de aumentar a produção do reino para estivessem preparados para as adversidades dos sete anos da previsão do sonho do faraó, assim “[...] quando começou a servir ao faraó, rei do Egito. Ele se ausentou da presença do faraó e foi percorrer todo o Egito” (GÊN.41, 46). e recebeu por mulher a Asenet, filha de Putifar, sacerdote de Heliópolis.

José encontra-se no lado direito da cena pictórica, com turbante com pedra preciosa, sentado na carruagem e com o braço erguido como forma de dar ordens e seus funcionários virados para ele, recebendo atentamente as instruções. Nos dois extremos do painel encontram-se famílias, do lado esquerdo com quatro pessoas apontando para José e do lado direito três pessoas observando José passando na carruagem.

Na pintura, encontramos uma arquitetura imponente ao fundo, que Santos Nóbrega (2015) aponta que se aproxima mais de uma paisagem da Europa Moderna do que o antigo Egito, devido as características arquitetônicas do Barroco romano,

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Figura 53: José do Egito montado em um belo cavalo.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Figura 54: José entregando sacos de trigo aos necessitados.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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assim como por meio do movimento das vestes com os drapeados e a paisagem bucólica e enérgica.

que eles recebessem os cereais armazenados nos silos reais, que tinham sido guardados para os sete anos de fome previstos nos sonhos do faraó.

O triunfo de José sobre as adversidades reafirma a vitória alcançada devido a sua fé em Deus, apesar das adversidades que procederam ao longo da sua história, se mostrando perseverante e bondosos para o povo. Mesmo nos sete anos de abundância se preocupou em armazenar alimentos que permitissem o sustento e saciar a fome daqueles que necessitariam nos sete anos de fome que estariam por vir, como interpretado dos sonhos do faraó.

Como estudado no método Panoskyiano, o artista pode retratar em sua obra características do seu status social, educação, local e entre outros fatores. O pintor Teotónio dos Santos traz inserido nas pinturas azulejares às suas bases nacionais e estilos da América portuguesa setecentista, pois no painel, podemos observar uma paisagem arquitetônica peculiar do estilo chão português, que a autora Loewen

Assim, quando o Egito sentiu fome, recorreram a José, como retratado na passagem seguinte E, quando também o Egito sentiu a fome, o povo clamou ao faraó pedindo sustento. E, ele respondeu-lhes: Ide a José e fazei tudo que ele vos disser. Ora a fome crescia todos os dias em toda a terra; e José abriu todos os celeiros, e vendia aos egípcios; porque também à eles oprimia a fome. E todas as províncias vinham ao Egito, para comprar de comer e procurar alívio ao mal a carestia. (GÊN. 41, 5557)

No próximo painel azulejar (Figura 55), encontra-se pintura da passagem bíblica citada anteriormente, mostrando dois momentos, que identificamos a presença à esquerda e à direita de um mesmo personagem com vestes destoantes dos demais devido a elegância, sapatos e turbante enfeitado com pedra, que identificando como José. Na primeira cena pictórica, encontramos José escutando os clamores do povo necessitado, que estão ajoelhados ao seu redor e, na segunda cena, observa-se ele estendendo a mão aos dois homens com expressões sofridas que vão de encontro a ele, para receber os sacos de trigo.

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A cena pictórica simboliza o momento em que o povo recorre a José por conta da fome que crescia a cada dia, José para ajudar, abriu os celeiros para

Figura 55: José entregando sacos de trigo aos necessitados. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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(2011) descreve que o termo começou a ser usado pelos historiadores de arte portuguesa para uma arquitetura religiosa a partir de 1570, que motivada por fatores econômicos e mudança do gosto das cortes reais, a arquitetura “chã” brasileira abandona a decoração manuelina na maioria das igrejas e conventos construídos em Portugal, caracterizado com fachadas compostas por figuras geométricas básicas, frontões triangulares, janelas quadradas e decoração escassa.

Na Figura 56, percebe-se dois personagens à esquerda, um deles já visto nos outros painéis com as mesmas vestes e turbante para identificar José do Egito, que exercia a função de administrador do Egito, ao seu lado um conselheiro. À direita, encontra-se os irmãos de José, pois: Os Dez irmãos de Jose foram, pois, ao Egito comprar trigo. Eles entraram na terra do Egito com outroa que iam comprar trigo.

Porque existia a fome na terra de Canaã. E José era governador na terra do Egito, e, conforme sua vontade, se vendia o trigo aos povos.

(Gên. 42, 3 -6)

A mandado do pai, Jacó, os irmãos foram para o Egito, quando José prostouse diante de seus irmãos, os reconheceu, porém, os mesmos não o reconheceram:

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José era Governador do Egito, e, conforme a sua vontade, se vendia o trigo aos povos. E, tendo-se prostado diante dele os seus irmãos, ele os reconheceu e falava-lhe com aspereza, como a estrangeiros, perguntando-lhes: Donde vindes? E eles responderam: Da terra de Canaã. A fim de comprar o necessário para o sustento. Embora ele reconhecesse os irmãos, todavia não foi reconhecido por eles: E, lembrando dos sonhos que em outro tempo tivera, disse-lhes: Vós sois espias; viestes para reconhecer os lugares mais fracos do país.

Eles responderam: Não é assim, Senhor, mas os teus servos vieram para comprar de comer. Somos todos os filhos de um mesmo homem; vimos com sentimentos pacíficos, nem os teus servos maquinam mal algum. 12. Ele respondeu-lhes: Isso não é assim; vós viestes observar os lugares não fortificados deste país. 13. Eles,

Figura 56: José, como administrador do Egito, recebendo os irmãos que vão comprar trigo. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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porém, disseram: Nós, teus servos, somos doze irmãos, filhos de um mesmo homem na terra de Canaã; o mais pequeno está com nosso pai, o outro já não existe. (GÊN. 42, 6 – 13)

José tornou a afirmar que os irmãos eram espiões, mandando-os prender e permitindo a saída apenas se o irmão caçula fosse para lá, como forma de comprovar suas palavras. Assim, após três dias de prisão, José deu ordem para acorrentar Simeão e encheu de trigo as bagagens dos outros para tivessem mantimentos para a viagem, chegando a Canaã, relataram o ocorrido ao pai, que implorou para que não levassem Benjamim, o filho caçula com eles, pois “Já fiquei sem José, agora sem Simeão e ainda querem levar Benjamim, Tudo está contra mim! [...] Se qualquer mal lhe acontecer na viagem que estão por fazer, vocês farão estes meus cabelos brancos descer à sepultura com tristeza” (GÊN. 42, 36 – 38).]

A fome então continuou rigorosa e Jacó pediu para que seus filhos comprassem mais comida, porém lembrando do que foi advertido por o Governador do Egito (José) que voltasse apenas com o irmão caçula. Convencendo Jacó de levar Benjamim com eles, desceram ao Egito, levando presente, prata e o irmão caçula com eles. Assim que José viu Benjamim com eles, José disse “Leve estes homens à minha casa, mate um animal e prepare-o; eles almoçarão comigo ao meio-dia” (GÊN. 43, 16), assim, levou-os à casa de José. Os irmãos ficaram com medo e desconfiados, pensando que queria atacar e torná-los escravos, dizendo na entrada da casa Ouça, senhor! A primeira vez que viemos aqui foi realmente para comprar comida, Mas,no lugar em que paramos para pernoitar, abrimos nossas bagagens e cada um de nós encontrou a prata que tinha trazido, na quantia exata. Por isso a trouxemos de volta conosco, além de mais prata, para comprar comida. Não sabemos quem pôs a prata em nossa bagagem. (GÊN. 43, 20-21)

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Porém, o administrador pediu que ficassem tranquilos e disse que Deus foi

quem lhes deu o tesouro presente em suas bagagens, os levou à casa de José, dando-lhes água para lavar os pés e forragem para seus jumentos. Sabendo da chegada de José ao meio-dia preparam-lhe o presente, que quando chegou perguntou sobre o seu pai, que os irmãos informaram que estava vivo.

O painel abaixo (Figura 57) retrata o momento em que os dez irmãos à direita, que dão o presente a José, entregue pelo soldado que se difere dos demais por suas vestes, com a mão direita nos sacos e mão esquerda com o presente entregando-o. Na arquitetura da cena, podemos encontrar colunas decoradas e janelas quadradas na construção no segundo plano da cena pictórica, ao redor encontra-se vegetações rasteiras e arbóreas e aves no topo da pintura.

Posteriormente, foi apresentado o irmão caçula à José, nascido após sua captura e obstáculos de ter sido vendido como escravo Olhando ao redor e vendo seu irmão Benjamim, filho de sua mãe, José perguntou: “É este o irmão caçula de quem me falaram?” E acrescentou: “Deus lhe conceda graça, meu filho”. Profundamente emocionado por causa de seu irmão, José apressou-se em sair à procura de um lugar para chorar, e, encontrando em seu quarto, chorou (GÊN. 43, 29-30)

O episódio de José conhecendo o irmão caçula Benjamim é retratado na cena da Figura 58, com José à direita junto de dois homens com vestes de soldados e à esquerda com Benjamim se ajoelhando como reverência.

Depois de acalmar-se após conhecer o irmão, José pediu que servissem a comida a ele em separado dos seus irmãos e egípcios, os irmãos foram colocados à mesa por ordem de idade, do mais velho ao mais novo.

A cena do banquete (Figura 59) é a última retratado nos painéis na ordem cronológica dos fatos acontecidos, com o painel próximo ao altar-mor representando José, à direita

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sentado em uma cadeira com adornos, com seus irmãos em uma mesa circular e com um serviçal próximo a mesa com uma bandeja. Posterior, José ordenou ao Administrador que enchesse as bagagens dos irmãos com todos os mantimentos que pudessem carregar, prata e, para o irmão mais novo, sua taça de prata.

No outro dia pela manhã, se despediram dos irmãos e José disse ao administrador de sua casa que fosse atrás deles antes de se afastar da cidade e dizer “Por que retribuíram o bem com o mal? Não é esta a taça que, o meu senhor, usa para beber e para fazer adivinhações? “(GÊN. 44, 4-5). Os irmãos então negaram e o administrador disse-lhes que quem for encontrado com ela será seu escravo e os demais livres, quando abriram as bagagensfoi encontrada a taça na bagagem de Benjamim, que rasgaram suas vestes e puseram a retornar à cidade. Ao chegar, José indagou o que fizeram e que Benjamim seria seu escravo, porém os irmãos imploraram para que não, pois era o filho caçula de um pai idoso que o ama muito

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Figura 57: José, como administrador do Egito, recebendo os irmãos que vão comprar trigo. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Figura 58: José conhecendo seu irmão caçula, Benjamim.

Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

Figura 59: José no banquete com seus irmãos Fonte: Acervo pessoal da autora, 2020.

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e, caso deixasse o jovem com ele, o seu pai morreria. Não contendo-se José pediu para que todos saíssem e deixasse-os a sós, revelando-se para seus irmãos, Então disse José a seus irmãos: ”Eu sou José! Meu pai ainda está vivo?” Mas os seus irmãos ficaram tão pasmados diante dele que não conseguiam responder-lhe.

“Cheguem mais perto”, disse José a seus irmãos. Quando eles se aproximaram, disse-lhes: “Eu sou José, seu irmão, aquele que vocês venderam ao Egito!

Agora, não se aflijam nem se recriminem por terem me vendido para cá, pois foi para salvar vidas que Deus me enviou adiante de vocês.

Já houve dois anos de fome na terra, e nos próximos cinco anos não haverá cultivo nem colheita.

Mas Deus me enviou à frente de vocês para lhes preservar um remanescente nesta terra e para salvar-lhes a vida com grande livramento.

Assim não foram vocês que me mandaram para cá, mas sim o próprio Deus. Ele me tornou ministro do faraó, e me fez administrador de todo o palácio e governador de todo o Egito.

Voltem depressa a meu pai e digam-lhe: Assim diz o seu filho José: ‘Deus me fez senhor de todo o Egito. Vem para cá, não te demores.

Tu viverás na região de Gósen e ficarás perto de mim – tu, os teus filhos, os teus netos, as tuas ovelhas, os teus bois e todos os teus bens.

Eu te sustentarei ali, porque ainda haverá cinco anos de fome. Do contrário, tu, a tua família e todos os teus rebanhos acabarão na miséria’.

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Vocês estão vendo com os seus próprios olhos, e Benjamim também, que realmente sou eu que estou vocês. Contem a meu pai quanta honra me prestam no o que vocês mesmos testemunharam. E tragam meu depressa.

meu irmão falando com Egito e tudo pai para cá

Então ele se lançou chorando sobre seu irmão Benjamim e o

abraçou, e Benjamim também o abraçou, chorando.

Em seguida, beijou todos os seus irmãos e chorou com eles. E só depois os seus irmãos conseguiram conversar com ele (GÊN. 45, 3-13)

A notícia que os irmãos de José estavam no Egito se espalhou e todos se alegraram, com o faraó pedindo para que os seus irmãos retomassem a Canaã e voltassem com o seu pai e família, que daria a melhor terra do Egito para desfrutarem da fartura. O pai Jacó quando soube que seu filho estava vivo seu espírito reviveu e disse que iria vê-lo antes de morrer, assim partiram para o Egito levando todos os seus descendentes.

Quando chegaram, José foi de carruagem encontra-se com seu pai, que quando o viu, correu para abraçá-lo e chorou, afirmando que já podia morrer pois viu o rosto de José e soube que ele ainda está vivo. José instalou seu pai e irmãos, deu as melhores partes das terras do Egito como ordenado pelo Faraó e deu sustento à família. Jacó viveu dezessete anos no Egito, na hora de seu falecimento, chamou José e pediu-lhe para não o enterra-se no Egito, sepultando junto aos seus pais e José jurou que faria isso. Jacó abençoa seus descentes e conhece os filhos de José Quando José viu seu pai colocar a mão direita sobre a cabeça de Efraim, não gostou; por isso pegou a mão do pai, a fim de mudá-la da cabeça de Efraim para a de Manassés, E lhe disse: Não, meu pai, este aqui é o mais velho, ponha a mão direita sobre a cabeça dele.

Mas seu pai recusou-se e respondeu: “Eu sei, meu filho, eu sei. Ele também se tornará um povo, também será grande. Apesar disso, seu irmão mais novo será maior do que ele, e seus descendentes se tornarão muitos povos”.

Assim, Jacó os abençoou naquele dia, dizendo: O povo de Israel usará os seus nomes para abençoar uns aos outros com esta expressão: Que Deus faça você como fez Efraim e a

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Manassés!

E colocou Efraim à frente de Manassés (GÊN. 48, 17 – 20).

O livro Gêneses que narra a vida e morte de José do Egito finaliza-se no versículo 50 com o falecimento dele aos cento e dez anos, que fez um juramento com os irmãos de que quando Deus intervier em favor deles, levassem seus ossos de lá. José foi embalsamado e colocado num sarcófago no Egito.

Vários patriarcas e profetas no Antigo Testamento foram prefiguras de Jesus Cristo: como Abraão, pai do crentes; Isaac, que carrega a lenha nas costas para sacrifício de si mesmo; Jeremias, por os sofrimentos e amor pelo povo; Jô, refletindo a imagem de Cristo doente; Jonas, pela pregação e sepultura. A autora Lopes (2001) ao explicar que a colocação no trono em marfim do arcebispo Maximiano de Ravena (546-554) decorado com as cenas da vida do patriarca e da vida de Cristo lado a lado que simboliza a consideração de José como prefiguração de Cristo, que caracteriza “interpretação tradicional na exegese cristã desde Tertuliano [...] deve-se, também, ao fato de o patriarca ser tomado como modelo de conduta pelos bispos” (LOPES, 2001, p. 85). O patriarca José do Egito enquadra-se como uma das figuras eloquentes como reflexo e fonte de metáforas para o messias, assim, consistindo como símbolo-chave para compreensão da história missionária de Jesus devido as notórias semelhanças das vivências de ambos e a etimologia do nome que significa acréscimo, que pode ser interpretado como “uma pista para um significado mais profundo” (FERREIRA, 2010, p. 80).

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A comparação entre a história de José do Egito e do messias inicia com a inocência e favoritismo do pai que suscita em inveja e na venda como escravo aos egípcios pelos próprios irmãos e, no caso de Jesus, entregue pelos judeus aos romanos. Com a venda de José, os irmãos enganam seu pai, Jacó, para acreditar

que o primogênito morreu, que [...] Jacó, ao ver a túnica ensanguentada e presumindo a morte do filho, ‘rasgou as suas vestes e se cingiu de pano de saco e lamentou o filho por muitos dias’. Análogo ao choro de Jacó teria sido, segundo o rabi, o lamento de ‘Israel profundo’ composto pelos judeus seguidores de Cristo que choraram a morte de seu messias como Jacó havia feito por seu filho. (FERREIRA, 2010, p. 83)

Com José entre os egípcios, é liberto da prisão injusta devido à sua habilidade de interpretação dos sonhos para interpretar os sonhos do faraó, que deixa evidente a inspiração divina revelando a existência de um Deus único. Com as interpretações, o faraó retira o seu anel de sinete e bota na mão de José, fazê-lo vestir roupas de linho fino e usar colar de ouro e, esse ato, assemelha-se a Jesus Cristo entre os gentios, quando tem que fazer a barba, mudar de roupa, utilizar colar de ouro e sinete simbolizando autoridade, assim o contato cultural promove mútuas transformações em ambos (FERREIRA, 2010). A própria interpretação dos sonhos dos prisioneiros, prevendo a morte de um e a liberdade do outro, traz semelhança ao momento de crucificação de Cristo, no livro Lucas 23:39-43, momento em que os malfeitores crucificados apresentam posturas distintas, um insultando o messias e o outro repreendendo o companheiro e suplicando para que Cristo lembre-se dele.

Por fim, com a interpretação do sonho do Faraó prevendo o período de fartura e a fome, José foi nomeado administrados dos celeiros egípcios, responsável assim pelo fornecimento de pão para o povo de Israel e todos os povos, saciando a fome física, enquanto Jesus Cristo veio para saciar a fome espiritual, afirmando que “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê em mim nunca mais terá sede” (João 6,35).

O azulejo, além de narrar a história bíblica de José do Egito como simbolização da

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prefiguração de Cristo, contribui para o entendimento da história da arquitetura colonial em João Pessoa, com a inserção de um elemento identitário característico do império português.

Entre meados do século XVIII e início do XIX, o cenário histórico relacionado à produção de trabalhos decorativos nas igrejas conventuais e irmandades era fervilhante, com mestre de obras, engenheiros militares, pedreiros, entalhadores, pintores edouradores disputavam as encomendas com base no estabelecimento do prestígio pessoal – através, inclusive, da participação nessas irmandades e do reconhecimento de suas qualidades artísticas e técnicas através dos serviços que executavam (OLIVEIRA, 2009, p. 16-17) .

A aplicação do azulejo monocromático monumental e figurativo feito com gosto e produção português trazido para a cidade de João Pessoa em meados do século XVIII traz reflexões, como exposto por Oliveira (2004) ao questionar se a colocação do exemplar heroico e inspirador da história de José de Egito não teria sido com intenção de cultivar a virtude da fé e respeito a Deus numa época de provações e crises das primeiras décadas da Capitania Real, como uma projeção de grau de realização que a comunidade cristã deveria atingir apesar das adversidades existentes.

A autora Carla Oliveira (2004) relembra que durante a segunda metade do século XVIII a Paraíba estava subordina de Pernambuco e ressalta a possibilidade de um prolífico tráfego de profissionais entre a Vila do Recife e a Cidade da Paraíba. O Barroco Colonial existente na Paraíba nos meados analisados é instigador e com o seu estudo é possível chegar à identificação no imaginário colonial, como uma representação mais profunda relacionada à fé e o universo cristão que pode ser percebido pelo capital simbólico por meio de registros escritos ou iconográfico e visual, como o azulejo estudado. A autora Oliveira (2004) narra ainda que esses símbolos ou sistemas simbólicos são “denunciadores” de relação de poder e que na sociedade paraibana colonial é identificável os elementos que traduzem a relação entre a esfera religiosa e o poder político, com a Igreja contribuindo para estratégias de legitimação do poder com inúmeras relações e instrumentos simbólicos.

Ainda ressaltado pela autora Oliveira (2004), essas relações se constroem por meio de um certo discurso com normas de produção, circulação e acumulação estudado na iconografia barroca remanescente na Paraíba. A igreja Católica possui obras de arte como forma de doutrinação dos fiéis desde períodos da arte cristã primitiva, bizantina e medieval.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A

presente pesquisa resultante do Trabalho de Conclusão de Curso teve como objetivo abordar o azulejo como peça cerâmica, primeiramente integrada ao conjunto arquitetônico Convento de Santo Antônio em João Pessoa, considerando os recortes temporais e inserções, e, posteriormente, a análise isoladamente dos mesmos, para explicar questões relacionadas à sua origem, história, iconografia e iconologia, podendo o leitor do presente texto, observar a história da arte presente na azulejaria sacra do convento.

Na busca por compreender a inserção, análise e estética dos painéis azulejares presentes na nave, a pesquisa foi dividida em três níveis: a visão histórica e social, contemplação artística e invocação da imagem. Assim, o estudo iniciouse no primeiro nível com a abordagem social e histórica do local, como forma de compreender o desenvolvimento da Capitania Real da Parahyba e inserção do Convento de Santo Antônio na cidade alta, inicialmente com caráter provisório com doze celas e um claustro, porém que criou novas linhas arquitetônicas ao longo do século XVII, com a inserção de obras artísticas, como pinturas, azulejos e trabalhos de cantaria, que foram locados em diferentes períodos históricos e arquitetônicos, de acordo com os acréscimos dos ambientes e acontecimentos históricos e sociais.

A contemplação artística refere-se ao estudo do azulejo, com a origem, tradição e inserção do mesmo no Brasil, vindo através dos portugueses, com os exemplares e modo de feitura sendo herança do período colonial. A contemplação é fruto do processo colonizador presente na cultura brasileira, que se adaptou as características das diversas localidades e expandiu sua utilização para fachadas de residências, devido a fácil manutenção e durabilidade.

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Posteriormente, foi identificado nos diversos ambientes as tipologias dos azulejos presentes, com suas influências e datação, que, através do detalhamento, podemos narrar uma parte da história do Convento. Ressaltando a importância das diversas peças cerâmicas, trago comparações entre os painéis presentes no Adro, Galilé e Claustro com outros exemplares presentes em diversas localidades, como Lisboa e templos islâmicos.

No capítulo terceiro capítulo, intitulado como a invocação da imagem, foi o estudo do uso da imagem, com os debates religiosos, em concílios, por exemplo, que discutiam sobre a iconoclastia, tratados e a utilização da imagem como forma de adoração, que foram importantes para criação de cenas pictóricas religiosas e o desenvolvimento de oficinas de gravuras e estampas. Posterior, o entendimento da imagem como documentos históricos que transmitem informações sobre o período histórico da obra, sobre o pintor e sociedade, assim foi apresentado as abordagens metodológicas para análise da imagem para poder aplicar nas análises dos painéis azulejares da nave da Igreja de São Francisco, citando grandes pesquisadores como Aby Warburg e Erwin Panofsky.

Por fim, chega-se na análise iconográfica e iconológica dos azulejos históricos da nave, abordando as cenas pictóricas com suas respectivas passagens bíblicas e influências figurativas. Os azulejos em questão tiveram como função catequisar e ensinar o evangelho através de imagens aos colonos, como forma de absorver a mensagem de José do Egito, que segundo relatos bíblicos expostos no livro de gêneses sofreu com obstáculos, vendido como escravo, preso injustamente e mesmo assim Deus o honrou, tornou-o triunfante administrador do Egito por suas interpretações dos sonhos do Faraó.

A análise da obra possui informações referente ao universo artístico e cultural da época, tendo sido encomendado para uma população já católica, que enfrentavam uma crise econômica desde a expulsão dos holandeses no século

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XVIII e que se tornou subordinada a Pernambuco. Nóbrega Santos (2015) relata que a crise foi refletida em diversos níveis sociais e que a encomenda desses painéis a Teotónio dos Santos em Lisboa foi voltada ao específico público, que frequentava o convento e igreja conventual, ou seja: uma população instruída, catequisada e de origem lusitana.

Finalmente, como últimas considerações, pode-se afirmar que há possibilidade estudos acadêmicos futuros aprofundando as pesquisas relacionadas ao Convento de Santo Antônio e suas obras artísticas no que se refere a história da arquitetura e urbanismo e áreas correlatas do saber, sem pretensão de exaurir o tema. É de suma importância ressaltar que, com a pesquisa, é possível compreender a magnificência e esplendor da história da arte do edifício em seu interior e exterior do Convento de Santo Antônio por sua importância na história de João Pessoa inserida na Cidade Alta em meados do século XVI, assim como, por sua exuberância nas linhas arquitetônicas desenvolvidas através dos séculos com a expertise do uso de matéria-prima da pedra calcária encontrada nas instalações conventuais, a riqueza dos ornamentos nos ambientes, a impecabilidade e delicadeza dos temas retratados nas pinturas e azulejos como forma de catequisar e ensinar os fiéis por meio do uso da imagem e pela grandiosidade do convento como um exemplar do barroco tropical e arte sacra paraibana e brasileira.

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Abóboda – Formada por um arco com deslocamento paralelo criando uma superfície curva sobre um espaço, inventada na Antiguidade e comumente usada em edificações romanas.

Com o surgimento do arco ogival gótico, permitiu a construção de abóbodas muito maiores e complexas, frequentemente usada em igrejas simbolizando a abóboda celeste e promovendo uma coberta à prova de fogo (CRAGOE, 2014).

Adro – Espaço aberto privilegiado à frente ou em torno da Igreja (ROMAN, 2016) e simbolizando a passagem entre o mundo profano e o sagrado (BURITY, 2008).

Arco pleno – Comumente conhecido como arco romano, foram explorados pelos romanos nas possibilidades decorativas e estruturais. Em geral, são arcos semicirculares associados a um pesado entablamento e colunas, como o arco de Constantino em Roma (CRAGOE, 2014).

Ádito – Termo utilizado para templos gregos, significando uma sala sagrada com acesso restrito aos sacerdotes do templo (DUARTE, 2020).

Arcada – Uma série de arcos sustentados por colunas ou pilastras, no caso de uma arcada sobreposta a uma parede é denominada de arcada cega (GLANCEY, 2001).

Altar – Etimologia da palavra vem do latim altare significando altar alto. No Cristianismo, o altar é símbolo de Jesus e o lugar designado à celebração dos sacrifícios. Inicialmente, o altar cristão não era um objeto litúrgico, com ausência de distinção entre a mesa de refeição e do sacrifício, porém com o uso eminentemente sagrado, tornou-se um objeto litúrgico consagrado, simbolicamente pelo sangue de Cristo e com a representação mais antiga encontra-se na Capela dos Sacramentos, na Catacumba de Calisto de meados do século III (DIAS, 2003).

Azulejo alicatado – Processo mais antigo de origem hispano-mourisco, com o desenho formado pelo azulejo de diferentes cores recortados e aplicados de forma geometrizada na face do ladrilho com arestas salientes que impedem a mistura de diferentes cores no processo de cozedura (MARCONDES apud WANDERLEY, 2006).

Altar-mor – Conhecido como altar principal ou o altar do Senhor, situado em frente à nave (DIAS, 2003).

Anjos Barrocos – Elementos ornamentais simbólicos comumente encontrados na arte barroca, com função de ministros mensageiros, guardiões, condutores de astros, executores de leis e protetores dos eleitos. Ora aparecem com feições europeus, outrora com traços grossos remetendo aos mestiços (BURITY, 2008).

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forma permitir o direcionamento das cargas verticais. Utilizado pelos romanos que exploraram as possibilidades de arco para criação de edificações mais amplas e complexas (CRAGOE, 2014).

Arco – Elemento curvo que vence um vão, podendo estar apoiado em colunas isoladas ou inserido numa parede, estruturalmente mais fortes que vigas por sua

Azulejo de aresta ou concha – Hispano-mourisco em que o desenho é englobado na face do ladrilho com arestas salientes para impedir a mistura das cores (MARCONDES apud WANDERLEY, 2006).

Azulejo de corda seca – Tipo de azulejo hispano-mourisco em que as cores são separadas por um filete de pigmento refratário à cozedura para impedir a mistura das tonalidades (MARCONDES apud WANDERLEY, 2006).

Azulejo de motivo tapete – Azulejo padrão do século XVII, comumente empregado na arquitetura portuguesa e com emprego de tecidos ornamentais (MARCONDES apud WANDERLEY, 2006).

Azulejo de padrão – Formados por multiplicação de figuras repetitivas ligadas

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(MARCONDES apud WANDERLEY, 2006).

de um mural de azulejos (MARCONDES, 1998 apud WANDERLEY, 2006).

Balaustrada – Parapeito ou peitoril sustentado por colunas de pequeno porte chamadas balaústres (BURITY, 2008).

Claustro – Pátio interno de um convento, geralmente descoberto rodeado por um passeio coberto (GLANDEY, 2001), com arcadas ou colunatas e planta retangular (BURITY, 2008).

Barroco – A cultura do barroco vai além de um agente ou promotor da história e sim como um pensar coletivo de uma história nascido do espirito do catolicismo romano, o Barroco espalha-se para Roma e torna-se definitivo no Século XVII, alcançando as Américas colonizadas no Ocidente e as Filipinas no Oriente. A teatralidade e expansividade são comumente associadas com o barroco, por exemplo, a Igreja de São Carlos nas Quatro Fontes projetada pelos italianos Gian Lorenzo Bernini e Francesco Borromini (ROGERS; GUMUCHDJIAN, 2014).

Barroco Tropical – Representação artística e arquitetônica da arte sacra do período colonial brasileiro dos séculos XVI e XVIII, introduzido pelos missionários católicos na decoração das igrejas utilizando combinações ornamentais tradicionais europeias com representações de figuras étnicas, fauna nativa e, em maior escala, frutas tropicais com o simbolismo e processo de afirmação da identidade nativa à qual o barroco foi adaptada (BATISTA, 2017).

Capela – Uma pequena igreja (BURITY, 2008).

Capela-mor – Capela principal de uma igreja, onde deverá estar locado o altar-mor (BURITY, 2008).

Capitel – O coroamento do fuste de uma coluna ou pilastra (GLANDEY, 2001).

Cartela – Superfície lisa destinada a receber uma inscrição, geralmente locada em friso ou pedestal (BURITY, 2008).

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Cercadura – Comumente chamado de moldura, é a barra que envolve a composição

Coluna – Elemento de sustentação vertical, normalmente circular e composto por base, fuste e capitel (GLANDEY, 2001).

Cornija – Seção superior onde se projeta um entablamento; molde horizontal que se projeta ao longo do ápice de uma parede ou edificação (GLANDEY, 2001); ornamento que assenta o friso sobre uma obra ou cimalha (BURITY, 2008).

Coro – Parte da igreja onde se canta o ofício divino (GLANDEY, 2001).

Cosmógrafos – responsáveis pela orientação e supervisão da preparação das cartas náuticas e geográficas e instrução no exercício da matemática e aplicações à geometria, astronomia, náutica, cosmografia e arquitetura (BUENO, 1998 apud MARTINS, 2011).

Cripta – Parte subterrânea destinada as relíquias ou funerária (BURITY, 2008).

Cruzeiro – Espaço na interseção de nave central, coro e transeptos em uma igreja cruciforme (GLANDEY, 2001); grande cruz locada em adros, cemitérios, largos e entre outros espaços (BURITY, 2008).

Cunhais – Ângulo saliente formado por duas paredes de um edifício.

Cúpula – Abóboda, teto abobadado ou arqueado (GLANDEY, 2001).

Fachada – Frente principal de um edifício (BURITY, 2008).

Friso – Divisão mediana de um entablamento clássico, faixa horizontal decorada

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(GLANDEY, 2001); faixa com ornamentação contínua (WANDERLEY, 2006).

painéis azulejares (WANDERLEY, 2006).

Frontão – Na arquitetura clássica, é chamada a seção triangular da parede, locado acima do entablamento e, atualmente, denomina-se um coroamento similar de uma janela ou porta (GLANDEY, 2001).

Nave – Pode dividir-se em nave principal, corpo principal de uma igreja que se estende da entrada à capela-mor subdividido por pilastras, colunas ou arcos, e as naves laterais, com as divisões laterais paralelas à nave central em uma igreja ou basílica (GLANDEY, 2001).

Frontispício – Elemento arquitetônico composto pela parte frontal de uma construção, a fachada principal (BURITY, 2008).

Galilé – Galeria entre a parede do frontispício e as portas da nave de igreja (BURITY, 2008).

Guardião – O termo guardião refere-se a um título concedido ao superior de conventos na Ordem Franciscana, existindo o Livro dos Guardiões do Convento de Santo Antônio da Paraíba / LGPB, no qual é uma importante referência bibliográfica que narra acontecimentos cotidianos do convento desde 1589 a 1885, com a citação dos guardiões, datas e realizações (BURITY, 2008).

Iconografia – Ramo da história da arte que trata sobre o tema ou mensagem das obras artísticas em contraposição da sua forma, definindo a distinção entre o significado e a forma. O sufixo “grafia” vem do verbo grego graphein que significa “escrever” e implica em um método de procedimento descritivo e classificação das imagens (PANOFSKY, 1991).

Iconologia – Método de interpretação que advém da síntese e exata análise de imagens, estórias e alegorias, assim sendo o estudo do significado do objeto. No sentido etimológico, o sufixo “logia” deriva do latim logos significando “pensamento” ou “razão” (PANOFSKY, 1991).

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Moldura – O mesmo que cercadura, um tipo de azulejo para dar acabamento nos

Nicho – Recesso em uma parede (GLANDEY, 2001); cavidade ou vão em uma parede ou muro para colocar estátua, imagem ou qualquer objeto ornamental (BURITY, 2008).

Ordem Primeira – Igualmente denominada de Ordem dos Frades Menores ou Primeira Ordem, surgiu como a Ordem de Irmãos quando, em 1205, Francisco de Assis recebe a mensagem de Cristo da missão de reparar as igrejas e assim começou a viver a sua vocação, reparando incialmente a Igreja de S. Damião, Igreja de S. Pedra e a pequena Capela de S. Maria. Vivendo sob as benções da Senhora dos Anjos, começou a receber jovens que quiseram viver como ele, que o levou ao Papa Inocêncio III na Roma para pedir aprovação para seu novo modo de viver e fundou a Ordem dos Frades Menores, formadas por frades com a missão de viver e pregar o Evangelho em pobreza, obediência e castidade (FRANCO, TEXEIRA, 2015).

Ordem Segunda – Em 1212, Clara de Assis se encontra com Francisco para começar a viver a missão de viver e pregar o Evangelho da mesma maneira, assim fundouse a Ordem das Clarissas ou a Segunda Ordem (FRANCO, TEXEIRA, 2015).

Ordem Terceira – Em 1215, devotos que viviam em família, não possuíam a vocação para a Primeira ou Segunda Ordem e queriam viver segundo o dom concedido a Francisco de Assis se unem para fundar a Ordem Terceira, inicialmente chamada de Ordem dos Penitentes e, atualmente, Ordem Franciscana Secular (FRANCO, TEXEIRA, 2015).

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Pináculos – Coroamento decorativo locado no ponto mais alto de um edifício ou torre (BURITY, 2008).

Púlpito – Tribuna nas igrejas, local onde o sacerdote ou padre realiza os sermões na igreja cristã (BURITY, 2008).

Policromia – Decoração arquitetônica que usa uma variedade de cores ou materiais de várias cores (GLANDEY, 2001).

Retábulo – Ao longo dos séculos, as várias formas do altar-mor foram decorrentes da sua evolução, como retábulo, palavra derivada do latim retabulum, junção das palavras retro (atrás) e tabula (quadro), que remete à uma construção situada posterior ou acima do altar, ornada por painéis e frisos em relevo e a matéria-prima varia de metal, madeira, pedra ou estuque (DIAS, 2003).

Revestimento – Material utilizado para cobrir a matéria-prima principal de um edifício que serve como proteção e decoração (GLANDEY, 2001).

Semiótica – Advindo da raiz grega semeion significa signo, assim semiótica podese denominar como a ciência dos signos, com intuito de investigação de todas as linguagens possíveis, ou seja, analisar os modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como produtor de significação e de sentido. Podendo citar a semiótica geral desenvolvida pelo filósofo e cientista Charles Sanders Pierce (1839-1914), que, por meio da investigação da relação entre objeto e pensamento,

à pintura (ALVES, 2003).

Tombamento – Instrumento administrativo regulamentado no Brasil pelo DecretoLei n.º25 datado de 30 de novembro de 1937, a aplicação do ato permite o reconhecimento do valor histórico, artístico e/ou cultural de um bem material, permitindo a proteção na instância federal pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN); ou instância municipal ou estadual, como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba (IPHAEP).

Torre sineira – Também conhecida como campanário, é uma construção redonda ou prismática, alta e estreita locada de forma isolada ou anexada a igreja, com objetivo de tocar os sinos com intuito de comunicar sinais à distância (BURITY, 2008).

Vão – Distância entre os suportes de arco, viga ou teto (GLANDEY, 2001).

Vestíbulo – Ante-sala de um aposento maior (GLANDEY, 2001).

Volutas – Elemento decorativo em espiral (BURITY, 2008); espiral ou rolo locado em capitéis jônicos, coríntios e compósitos (GLANDEY, 2001).

Sacristia – Ambiente perto do altar-mor para armazenamento de objetos sagrados (BURITY, 2008).

trouxe fundações fenomenológicas e formais para desenvolvimento da ciência em questão (SANTAELLA, 2017).

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Talha dourada – Trabalho de escultura em madeira (BURITY, 2008); expressão artística de maior impacto, com a talha finamente lavrada e dourada com o ouro de lei como manifestação estética de leitura simbólica da arte sacra, pode surgir associada ao azulejo ou

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