TFG- Parque das ruínas de Nova Iguaçu, Rio de Janeiro.

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE TECNOLOGIA ARQUITETURA E URBANISMO

AMANDA PEREIRA LIDUINO

PROJETO DE REABILITAÇÃO E CONSERVAÇÃO DAS RUÍNAS DA FAZENDA SÃO BERNARDINO E UMA PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DO PARQUE DAS RUÍNAS DE NOVA IGUAÇU - ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

Seropédica- RJ Dezembro, 2023

AMANDA PEREIRA LIDUINO

PROJETO DE REABILITAÇÃO E CONSERVAÇÃO DAS RUÍNAS DA FAZENDA SÃO BERNARDINO E UMA PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DO PARQUE DAS RUÍNAS DE NOVA IGUAÇU - ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

Trabalho realizado em cumprimento às exigências da atividade acadêmica AA251 – Trabalho Final de Graduação

Orientador: Cláudio Antônio Santos Lima Carlos Co-orientador: Humberto Kzure-Cerquera

Seropédica- RJ Dezembro, 2023

INSTITUTO DE TECNOLOGIA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO ATA DE DEFESA DE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO Ata de defesa de Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, realizada em formato remoto por intermédio do link https://meet.google.com/cnb-vhae-spc na data de 15/12/2023, às 7h30, como requisito necessário à concessão do grau de ARQUITETO E URBANISTA a: Discente: Amanda Pereira Liduino Matrícula: 2018-250191 Título do Trabalho: O caso da fazenda São Bernardino e uma proposta de implantação do parque das ruínas de Nova Iguaçu BANCA EXAMINADORA: Orientador: Claudio Antônio S. Lima Carlos Coorientador/Membro interno: Humberto Kzure-Cerquera Membro interno: Júlio Cesar R. Sampaio Membro externo: Emília Martins Ribeiro Membro externo: Ubirajara Avelino de Mello Presidente da Comissão de TFG 2023.2: Gabriel Girnos Elias de Souza Em sessão pública, após exposição de cerca de 30 minutos, o(a) candidato(a) foi arguido oralmente, tendo demonstrando (X) SUFICIÊNCIA ou (_) INSUFICIÊNCIA de conhecimento e capacidade de resolver o tema do seu Trabalho de Curso, sendo pela Banca: (X) APROVADO ( X ) com recomendação para participar em Concurso (_ ) REPROVADO Na forma regulamentar foi lavrada a presente ata que é assinada pelos membros da banca, pelo candidato e pela presidente da Comissão de TCC. FORAM FEITOS OS SEGUINTES REGISTROS PELA BANCA EXAMINADORA: A banca reconheceu o mérito, pertinência e a qualidade do projeto apresentado, destacando a integração das propostas para o sítio da Fazenda São Bernardino.

(Assinado digitalmente em 15/12/2023 10:32 ) (Assinado digitalmente em 15/12/2023 15:47 ) CLAUDIO ANTONIO SANTOS LIMA GABRIEL GIRNOS ELIAS DE SOUZA CARLOS PROFESSOR DO MAGISTERIO SUPERIOR PROFESSOR DO MAGISTERIO SUPERIOR DeptAU (12.28.01.00.00.00.00.43) Matrícula: 1520543

DeptAU (12.28.01.00.00.00.00.43) Matrícula: 1708151

(Assinado digitalmente em 15/12/2023 20:14 ) (Assinado digitalmente em 15/12/2023 12:58 ) HUMBERTO KZURE CERQUERA JULIO CESAR RIBEIRO SAMPAIO

CERQUEIRA DA SILVA PROFESSOR DO MAGISTERIO SUPERIOR DeptAU (12.28.01.00.00.00.00.43) Matrícula: 2168095

PROFESSOR DO MAGISTERIO SUPERIOR DeptAU (12.28.01.00.00.00.00.43) Matrícula: 1461577

(Assinado digitalmente em 15/12/2023 12:17 ) (Assinado digitalmente em 15/12/2023 10:53 ) EMÍLIA MARTINS RIBEIRO UBIRAJARA AVELINO DE MELLO ASSINANTE EXTERNO CPF: 361.559.427-49

(Assinado digitalmente em 15/12/2023 17:16 ) AMANDA PEREIRA LIDUINO DISCENTE Matrícula: 2018250191

ASSINANTE EXTERNO CPF: 877.576.217-04

RESUMO O presente trabalho tem como tema a preservação de ruínas históricas, destacando o caso do conjunto da Fazenda São Bernardino, Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, Brasil, tombado em nível federal como conjunto arquitetônico e cultural em 1951. De valor ainda desconhecido por parte da comunidade iguaçuana e abandonada pelo poder público há décadas, esses remanescentes são heranças do séc. XIX e compõem parte da história de desenvolvimento do estado e do país.

Aborda-se a trajetória do bem cultural protegido que culminou no seu arruinamento, apresentando conceitos relacionados à preservação de ruínas em geral, presentes na literatura

especializada

em

patrimônio

cultural.

Analisam-se

características

arquitetônicas do bem cultural, seu estado atual de conservação, além dos aspectos gerais e físicos-espaciais do sítio onde está inserido, propondo-se uma intervenção pautada na inserção desse objeto de estudo em um contexto de Parque, com fins de consolidação dos remanescentes, valorização através do uso e integração com o entorno, com a paisagem e o indivíduo, entendendo a intervenção como meio de conservação e visibilidade das ruínas, bem como resgate da memória local, garantia do direito ao espaço público, acesso à cultura, educação e ao lazer.

PALAVRAS-CHAVE: Patrimônio edificado; Ruínas; Fazenda São Bernardino; Conservação; Consolidação;

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LISTA DE FIGURAS Figura 1: Vila do iguassu ........................................................................................................................27 Figura 2: Antiga Vila do Iguaçu e equipamentos existentes. .................................................................28 Figura 3: Localização da região que correspondia à antiga Vila do Iguaçu. .........................................28 Figura 4: Casa Grande (A), Engenho e Senzala (C) em 1950 Aleia de Palmeiras Imperiais. ..............29 Figura 5: Provável Estação São Bernardino em 1886, ilustrada por Mauro Lemos Azeredo. ..............30 Figura 6: Capela (interior da Casa Grande) e Atividades agrícolas no Engenho. .................................30 Figura 7: Maxambomba e Vila de Iguaçu ..............................................................................................31 Figura 8: Estação de Vila de Cava, (Autor e data desconhecidos). ......................................................32 Figura 9: Recortes de Jornais sobre os despejos da Fazenda. .............................................................34 Figura 10: Incêndio em 1983. .................................................................................................................35 Figura 11: O conjunto arquitetônico à noite, 2017. ................................................................................36 Figura 12: Recorte de Notícia sobre o projeto da SEMCULT. ...............................................................38 Figura 13: Restauração da Torre Sineira de Nossa Senhora da Piedade, 2020. .................................38 Figura 14: Corpo técnico na visita à Fazenda. .......................................................................................39 Figura 15: Estudo arqueológico das ruínas da senzala. ........................................................................40 Figura 16: Casa Grande, 1950. ..............................................................................................................41 Figura 17: Pátio Interno 1985 (A) e Pátio interno, 1977 (B). ..................................................................42 Figura 18: Estrutura de cantaria e em seguida estrutura de cantaria exposta respectivamente...........43 Figura 19: Alvenaria de tijolos e tipo de aparelho. .................................................................................43 Figura 20: Detalhe da cobertura, com telha de capa, bica e espigão 1962...........................................44 Figura 21: Detalhe do trecho de cobertura (A, C, D) e pavimento superior inexistente,1985 (B). ........45 Figura 22: Parede interna da Casa Grande caiada de branco, 1993 (A) e Pintura da edificação (B). ..46 Figura 23: Escada em pedra, cantaria nas ombreiras do requadro e ferro fundido no guarda-corpo, 1956 (A). Fragmentos do beiral esmaltado da Casa Grande em exposição organizada pelo pesquisador Victor Antu (C). Beiral mostrando elemento decorativo (B, E e F). Porta com bandeira feita de vidraçaria colorida, 1965 (D). ..................................................................................................................................46 Figura 24: Fachada principal da Casa Grande, década de 40 do séc. XX. ...........................................47 Figura 25: Parte superior da fachada principal, 1977 (E) e Lateral da Casa Grande, 1977 (F). ...........48 Figura 26:Fachada principal da Casa Grande, 1977 (H) e Detalhes da esquadria, 1977 (H). ..............48 Figura 27: Forros Capela e Sala de Jantar da década de 40 do séc. XX (A e B) e década de 50 (B). 49 Figura 28: Detalhe do Forro (A) e detalhe do forro deteriorado da Sala de estar (B), Detalhe do lustre (C), Salão Nobre e Sala de Música da Casa Grande (D). .....................................................................49 Figura 29: Clarabóia. ..............................................................................................................................50 Figura 30: Forro em madeira na parte inferior na escada interna (A), Detalhe da Balaustrada do corrimão da escada interna (B), forno a lenha (C), Bomba hidráulica no engenho (D). .......................................51 Figura 31: Detalhe do altar da Capela com a imagem de São Bernardino (à esquerda) e detalhe do altar (à direita) com representação do “Olho que tudo vê”, encontrado em escavação realizada e em exposição na Estação da Cultura Tinguá. .............................................................................................52

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Figura 32: Comparativo da planta original do IPHAN x Planta atual das ruínas, 2023. ........................55 Figura 33: Casa grande ..........................................................................................................................56 Figura 34: Engenho e Senzala ...............................................................................................................56 Figura 35: Fachada frontal e posterior, respectivamente, da Casa Grande, anterior ao incêndio ........57 Figura 36: Fachada posterior da Casa Grande em 1984 anterior ao incêndio. .....................................57 Figura 37: Fachada frontal Casa Grande atualmente (A) e (B) 1977. ...................................................58 Figura 38: Parede mostrando a disposição dos tijolos (A) e Embasamento em cantaria (B). ..............59 Figura 39- Fachada evidenciando descolamento de revestimentos e desplacamento de tijolos. .........60 Figura 40: Ação da umidade ascendente e descendente. .....................................................................60 Figura 41: Parte interna fachada frontal da Casa Grande e remanescentes do Engenho e Senzala. ..61 Figura 42: Ornatos em estado precário na fachada frontal com cacos de telha e vegetação (A) e ......62 Figura 43: Fachada principal com bastante grafismo e desgaste do revestimento. ..............................62 Figura 44: Fachada onde as telhas se encontram em estado mais conservado. .................................63 Figura 45: Escadaria da Casa Grande (A, B,C) e do Engenho (D). ......................................................64 Figura 46: Escada do muro de contenção. ............................................................................................64 Figura 47: Fachada Frontal (Vista externa e interna respectivamente). ................................................65 Figura 48: Desgaste do madeiramento (A, B, C e F), presença de casa de insetos (D e E). ...............65 Figura 49: Partes faltantes ou ausência de madeiramento. ..................................................................66 Figura 50: Engenho, Fachada frontal externa (A), Interior (B e C). .......................................................66 Figura 51: Senzala .................................................................................................................................67 Figura 52: Interior da Casa Grande. .......................................................................................................67 Figura 53: Piso Senzala e Engenho. ......................................................................................................68 Figura 54: Estrutura autoportante da Casa Grande com alvenaria em diferentes padrões e vãos fechados para evitar desabamentos. .....................................................................................................70 Figura 55- Acréscimentos com tijolos de adobe preenchendo vãos .....................................................70 Figura 56: Presença de vigas. ................................................................................................................71 Figura 57: Mapa de Nova Iguaçu e equipamentos públicos e bairro de Barão de Gandu. ...................76 Figura 58- Mapa de terreno ....................................................................................................................77 Figura 59: Reservatório Rio D’ouro. .......................................................................................................78 Figura 60: Mapa de uso de solo. ............................................................................................................80 Figura 61: Mapa de Gabarito .................................................................................................................81 Figura 62: Mapa de adensamento. ........................................................................................................82 Figura 63- Mapa manchas de desenvolvimento. ...................................................................................83 Figura 64: Mapa de equipamentos.........................................................................................................83 Figura 65: Dados referentes ao número de homens e mulheres. .........................................................84 Figura 66: Atividades Econômicas de Nova Iguaçu. ..............................................................................84 Figura 67: Atividades de agricultura e comércio local na região. ..........................................................85 Figura 68: Casa da Cultura de Nova Iguaçu (A), Onda verde (B), Inauguração da Casa da Cultura Tinguá (C e D). .......................................................................................................................................86 Figura 69: Festa do aipim em Tinguá (A). Festival Gastronômico dos produtores de Tinguá (B).........86

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Figura 70: Mapa de análise ambiental. ..................................................................................................87 Figura 71: Mapa de condicionantes climáticos. .....................................................................................88 Figura 72: Rodovias que cortam a cidade de Nova Iguaçu. ..................................................................89 Figura 73- Sistema Viário .......................................................................................................................90 Figura 74: Topografia do terreno (A e B). ..............................................................................................91 Figura 75: Zonas rurais do município de Nova Iguaçu. .........................................................................92 Figura 76: Mapa de uso do solo e Unidades de Conservação do Município de Nova Iguaçu. .............92 Figura 77: Informações sobre os índices urbanísticos do Município de Nova Iguaçu. 2015. ................93 Figura 78: Edição da autora sobre tabela de especificação de uso e ocupação do solo do Município de Nova Iguaçu. Novo decreto de 2015. .....................................................................................................93 Figura 79: Setorização esquemática da Torre. ......................................................................................94 Figura 80: Setorização do Parque..........................................................................................................95 Figura 81: Museu cultural e arqueológico ..............................................................................................96 Figura 82: Maquete volumétrica da Torre Garcia D’ávilla ......................................................................97 Figura 83: Projeção do Castelo Garcia D’ Avila. ..................................................................................98 Figura 84: Loja para venda de produtos locais ......................................................................................99 Figura 85: Fachada Frontal do Parque das ruinas. ..............................................................................100 Figura 86: Parte interna da casa, 2023. ...............................................................................................101 Figura 87: Vista da viga composta no vão central; Caminho das forças em vermelho. ......................102 Figura 88: Escada que dá acesso ao mirante. .....................................................................................102 Figura 89: Plano de massas. ................................................................................................................104 Figura 90: Volumetria proposta ............................................................................................................105 Figura 91: Isométrica explodia da volumetria proposta. ......................................................................106 Figura 92: Demolir e construir da volumetria proposta. .......................................................................107 Figura 93: Setorização Casa Grande do térreo e 1 pavimento, respectivamente. ..............................111 Figura 94: Fluxo Casa Grande do térreo e 1 pavimento, respectivamente. ........................................112 Figura 95- Setorização do anexo cultural térreo. .................................................................................113 Figura 96- Setorização do anexo cultural – Subsolo. ..........................................................................114 Figura 97: Captação de água de chuva e armazenamento .................................................................115 Figura 98- Vista do telhado verde e área recreativa ............................................................................116 Figura 99: Esquema dos ventos ...........................................................................................................117 Figura 100: Esquema vidro duplo ........................................................................................................118 Figura 101- Materiais de revestimento para o anexo...........................................................................119 Figura 102: Corte mostrando detalhes .................................................................................................120 Figura 103: Interface entre viga de aço e parede de alvenaria ...........................................................121 Figura 104: Tipos de pavimentação. ....................................................................................................123 Figura 105- Proposta paisagística ........................................................................................................125 Figura 106: Plantas para proposta paisagística ...................................................................................125 Figura 107: Proposta Urbanística .........................................................................................................127 Figura 108- Proposta para o traçado viário ..........................................................................................128

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Figura 109- Proposta para o traçado viário ..........................................................................................128 Figura 110- Implantação humanizada. .................................................................................................129 Figura 111- Corte AA do anexo cultural. ..............................................................................................131 Figura 112- Corte AA do anexo cultural. ..............................................................................................131 Figura 113: Vista geral .........................................................................................................................132 Figura 114: Vista frontal Casa Grande ...............................................................................................132 Figura 115: Vista rampa .......................................................................................................................132 Figura 116: Vista terraço do anexo ......................................................................................................133 Figura 117: Vista terraço do anexo ......................................................................................................133 Figura 118: Vista da Entrada principal .................................................................................................134 Figura 119: Dentro da ruína .................................................................................................................134 Figura 120: Dentro da ruína- Entrada principal. ...................................................................................135 Figura 121: Dentro da ruína- Vista da antiga sala de jantar. ...............................................................135 Figura 122: Dentro da ruína- Vista do elevador. ..................................................................................136 Figura 123: Dentro da ruína- Vista do elevador. ..................................................................................136 Figura 124: Dentro da ruína- Vista do 1 Pavimento. ............................................................................137 Figura 125: Dentro da ruína- Vista do 1 Pavimento. ............................................................................137 Figura 126: Vista interna do Anexo ......................................................................................................138 Figura 127: Setor externo do Anexo ....................................................................................................138 Figura 128: Vista escada frontal Casa Grande ....................................................................................139

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LISTA DE TABELAS Tabela 1: Tendências atuais da prática da restauração na América Latina ..........................................21 Tabela 2- As causas e agentes de deterioração da alvenaria, bem com a natureza da patologia. ......68 Tabela 3: Programa para áreas de visitação interior da Casa Grande................................................108 Tabela 4: Programa para áreas do interior do Anexo Cultural ............................................................109 Tabela 5: Programa de necessidades para a área foco. .....................................................................110 Tabela 6: Programa para serviços de auxilio para área externa .........................................................110

LISTA DE QUADROS Quadro 1: Estado de conservação dos elementos arquitetônicos........................................................72 Quadro 2: Grau de caracterização dos elementos arquitetônicos........................................................73

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS SEMCULT/NI- Secretaria Municipal de Cultura de Nova Iguaçu SIP/NI- Superintendência de Patrimônio Cultural de Nova Iguaçu IPHAN- Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

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SUMÁRIO RESUMO...................................................................................................................... i LISTA DE FIGURAS ................................................................................................... ii LISTA DE TABELAS .................................................................................................. vi LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS...................................................................... vi 1. INTRODUÇÂO ........................................................................................................ 9 1.1 O tema ............................................................................................................... 9 1.2 Justificativa do tema ......................................................................................... 10 1.3 Objetivos .......................................................................................................... 10 1.4 Metodologia...................................................................................................... 11 1.5 Estrutura de capítulos ...................................................................................... 12 2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 13 2.1 Uma possível definição de Ruínas e seus aspectos simbólicos ...................... 13 2.2 Das teorias da preservação do séc. XIX à atualidade ...................................... 15 2.3 A ruína e o lugar de memória ........................................................................... 24 3 PESQUISA HISTÓRICA......................................................................................... 26 3.1 Contexto histórico de Nova Iguaçu .................................................................. 26 3.2 Contexto histórico das ruínas da Fazenda São Bernardino ............................. 27 3.2.1 Do surgimento ao declínio: A Vila Iguaçu e a Fazenda São Bernardino .... 27 3.2.2 O tombamento, Conflitos de posse e o Incêndio ....................................... 33 3.2.3 A atual situação do Conjunto arquitetônico e as propostas de intervenção. ............................................................................................................................ 36 4 ANÁLISE DAS CONDIÇÕES ATUAIS ................................................................... 41 4.1 Características arquitetônicas .......................................................................... 41 4.1.1 Aspectos construtivos ................................................................................ 43 4.1.2 Elementos e detalhes significativos ........................................................... 46 4.2 Procedimentos metodológicos ......................................................................... 52 4.3 Mapeamento de danos .................................................................................... 53 4.3.1 Deteriorações............................................................................................. 54 4.3.2. Descaracterizações .................................................................................. 69 4.3.3 Diagnóstico do estado de conservação e grau de caracterização ............. 71 4.4 Legislação ........................................................................................................ 74 4.5 Área de intervenção ......................................................................................... 75 vii

4.5.1 Localização ................................................................................................ 75 4.5.2 O entorno ................................................................................................... 77 4.5.3 Aspectos gerais ......................................................................................... 82 4.5.4 Aspectos ambientais e bioclimáticos ......................................................... 86 4.5.5 Sistema Viário ............................................................................................ 88 4.5.6 Levantamento topográfico ......................................................................... 90 4.6 Aspectos legais/ normativas ......................................................................... 91 5 REFERÊNCIAS PROJETUAIS .............................................................................. 94 5.1 O Castelo da Torre de Garcia D’Avila .............................................................. 94 5.2 Parque Municipal Parque das Ruínas do Rio de Janeiro ............................... 100 6 PROJETO ............................................................................................................ 103 6.1 Diretrizes projetuais e partido......................................................................... 103 6.2 Volumetria Casa Grande ................................................................................ 104 6.3 Programa de Necessidades ........................................................................... 107 6.4 Fluxograma e Setorização ............................................................................. 111 6.4.1 Casa Grande............................................................................................ 111 6.4.2 Anexo Cultural ......................................................................................... 113 6.5 Estratégias bioclimáticas ................................................................................ 114 6.5.1 Captação de águas pluviais e cisterna .................................................... 114 6.5.2 Telhado verde .......................................................................................... 116 6.6 Materiais e revestimentos .............................................................................. 117 6.6.1 Na Casa Grande ...................................................................................... 117 6.8.2 Anexo Cultural ......................................................................................... 119 6.7 Estrutural ........................................................................................................ 119 6.7.1 Na Casa Grande ...................................................................................... 119 6.7.2 Anexo Cultural ......................................................................................... 121 6.9 Acessibilidade ................................................................................................ 121 6.10 Incêndio ....................................................................................................... 122 6.11 Pavimentação e paisagismo ........................................................................ 123 6.14 Proposta urbanística .................................................................................... 126 6.15 Implantação.................................................................................................. 129 6.16 Fachadas ..................................................................................................... 130 6.17 Cortes .......................................................................................................... 130 6.15 Render ......................................................................................................... 132 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 140 viii

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO .......................................................................... 143 ANEXO 1 ................................................................................................................. 153 ANEXO 2 ................................................................................................................. 167

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1. INTRODUÇÂO 1.1 O tema

O debate sobre a importância das ruínas e os métodos para sua preservação foram de suma importância ao longo dos séculos para a maturação do conceito de monumento e definições das teorias de preservação patrimonial. O culto às ruínas, os aspectos pitorescos e sublimes a elas relacionados, exaltados durante o Romantismo, marcaram uma geração de autores que destacaram a importância de preservar os monumentos (RODRIGUES, 2017, p. 12). Sendo assim, desde o séc. XIX até a contemporaneidade, as ruínas, bem como monumentos históricos, reúnem predicativos e características específicas que lhes atribuem o direito à conservação.

São entendidas portanto por satisfazerem demandas de caráter memorial, de arte e de significado para os sujeitos ou grupos sociais (RIEGL, 1999 apud BARRETO et. al, 2020, p. 624).

Nesse contexto, se há hoje um aparente consenso entre as ciências sociais, a arte e cultura com relação à necessidade de preservação das ruínas, o mesmo não ocorre quanto à forma de intervenção, em razão do difícil diálogo com a dinâmica urbana e sociocultural. Segundo Andreas Huyssen (2014, p.96), as ruínas não são mais consideradas por ele autênticas1, como as do século XVIII e XIX, pois não encontram espaço dentro da atual lógica capitalista- cultura de mercadoria e memóriaonde o envelhecimento em geral não parece aceito. Na condição de “commodities”, termo citado pelo autor, tornam-se ultrapassadas, sendo demolidas ou restauradas.

Nesse sentido, intervenções que visão reconstruir ou criar além do necessário acabam por deturpar a originalidade e colocar as ruínas em um estado nunca antes existente. Ações essas motivadas em muitos casos pela “espetacularização” do bem com fins unicamente turísticos ou estéticos. Como é o caso da Fazenda São Bernardino, objeto de estudo deste trabalho, que vem sendo alvo de propostas de intervenção cuja intenção foge à conservação e readequação do seu uso.

1 A ruína autentica não deve ser entendida como “essência ontológica de ruínas”, mas sim

como uma “constelação conceitual” (p. 95) que aponta para momentos de decadência e arruinamento presentes no início do séc. XVIII.

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1.2 Justificativa do tema

Justifica-se primeiramente em razão das propostas de intervenção da Secretaria da Cultura de Nova Iguaçu e Prefeitura de Nova Iguaçu para o sítio em questão, que visa reconstruir a Casa Grande e Senzala, cuja proposta aparentemente já está em andamento. Entende-se que uma reconstrução total do bem não se justifica nesse caso, uma vez que a população não se identifica com o bem em sua originalidade.

Esse trabalho visa apresentar uma alternativa para conservação do bem arquitetônico, preservando fatores de história e memória, valorizando as ruinas ao propor um novo uso que não comprometa sua sobrevivência, ao passo que ela se torne um atrativo.

A Fazenda São Bernardino possui uma grande importância no cenário cultural da cidade de Nova Iguaçu, sendo um exemplar de edificação do séc. XIX, tombada a nível federal pelo IPHAN, pertencente à Vila Iguassú que deu origem ao atual município e fez parte da história de desenvolvimento do país. Símbolo da memória local, esse patrimônio registra em seus remanescentes não somente os visíveis efeitos físicos da estratificação do tempo, como também as marcas invisíveis da história local, as quais refletem a relação de domínio e de poder da velha estrutura política e social brasileira.

As ruínas da Fazenda São Bernardino hoje destacam-se dentre um número considerável de exemplares que apresentam valores tanto quantitativos, devido ao número de exemplares, quanto artísticos e históricos diversificados e únicos (SAMPAIO, 2022). Valores esses poucos divulgados na comunidade local e negligenciados pelo poder público. Sendo hoje necessário o resgate da sua importância cultural e de seus valores tanto materiais quanto imateriais para a comunidade, contribuindo assim para sua permanência e transmissão às gerações futuras.

1.3 Objetivos

O objetivo geral deste trabalho, a partir de uma base teórica e conceitual previamente selecionada, consiste na elaboração de um projeto de reabilitação e 10

consolidação do patrimônio cultural tombado e em ruínas denominado Fazenda São Bernardino e seu entorno, visando a criação do Parque das Ruínas de Nova Iguaçu, Estado do Rio de Janeiro.

Como objetivos específicos, pretende-se: • Apresentar os principais conceitos que embasam a importância de ruínas e os meios possíveis para sua preservação; • Propor diretrizes para conservação e consolidação das estruturas da ruína que possibilitem sua visitação de acordo com os critérios de conservação.

• Indicar prováveis áreas para o estabelecimento de sítios arqueológicos; • Garantir o acesso da população à cultura através da criação de um anexo cultural para exposições de material arqueológico e exposições sobre a história local, além de espaços para eventos culturais: exposições, arte, agricultura e meio ambiente; • Propor um diagrama de massas na escala micro e macro que gere conexões do objeto de estudo com o seu entorno e com os indivíduos; • Propor critérios de uso e ocupação para o sítio onde se situa a ruína e seu entorno imediato; • Garantir o direito ao espaço público de convivência, tornando-os acessíveis (principalmente para idosos e deficientes), ativos (atividades e formas de uso), confortabilidade (espaço convidativo para conforto do público) e sociáveis (espaço de encontro).

1.4 Metodologia

Para atingir os objetivos deste trabalho, a pesquisa foi estruturada em 3 (três) partes: • Construção do referencial teórico-metodológico sobre o tema (ruínas); • Elaboração do diagnóstico das condições atuais do bem cultural e sua contextualização na região; 11

• Desenvolvimento da proposta de intervenção;

1.5 Estrutura de capítulos

No capítulo 2, julgou-se necessário iniciar este trabalho a partir da definição de alguns conceitos relevantes para o entendimento do tema desta pesquisa. Será realizado um breve histórico sobre ruínas, uma possível definição do seu conceito, bem como seus aspectos simbólicos, além da evolução das teorias de preservação patrimonial com foco na conservação de ruínas, dos autores mais relevantes desde o séc. XIX até a contemporaneidade. E por último, noções atuais balizadoras da conservação de ruínas, pautadas nos conceitos de autenticidade e integridade.

No capítulo 3, será apresentado de forma sucinta o estudo de caso, sua localização e seu entorno imediato. Será também apresentado o histórico da Fazenda São Bernardino relacionado ao contexto da região, uma breve análise da relação do objeto de estudo com as teorias patrimoniais, sua descrição arquitetônica, análise do seu estado de conservação, bem como um mapeamento de danos a fim de avaliar estatisticamente quais danos são mais frequentes.

No capítulo 4, será realizada uma análise da área de intervenção e do sítio, além de uma análise da área de intervenção inserida no contexto da cidade de Nova Iguaçu a partir do levantamento dos aspectos gerais. A legislação e a análise das transformações do sítio histórico e seu entorno, terá como base o levantamento de dados referentes aos aspectos físico-espaciais.

No capítulo 5, será feita uma análise das Referências Projetuais, bem como técnicas, materiais e diretrizes pertinentes para o embasamento do tema. Pode ser citado, o Parque Municipal das Ruínas do Rio de Janeiro, Castelo da Torre Garcia D’ávila, Pinacoteca de São Paulo.

No capítulo 6, será proposto uma intervenção na Ruína, com diretrizes de consolidação de sua estrutura e materiais, um programa de necessidades para a área foco, um plano de massas para implantação do parque no entorno e as propostas urbanísticas para requalificar a área.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 Uma possível definição de Ruínas e seus aspectos simbólicos

As ruínas constituem um rico e complexo campo de discussões teóricas relacionadas à preservação patrimonial. Em geral são produtos da passagem e ação incondicional do tempo sobre a materialidade do bem cultural. Ângela Rodrigues 2 (2017, p.17), observa ser possível evidenciar como o entendimento e a definição de ruína é complexa e as causas desse arruinamento variadas. Podem ser geradas por distanciamentos cronológicos ou não, pela perda da função original, pela falta de uso, pela incúria ou ainda advindas de catástrofes de ordem natural ou antrópica. Assim, considerando-a como uma condição de descaracterização de um bem de qualquer idade, o debate nesse tópico não leva em conta somente sua caracterização física e semântica da palavra “ruína”, mas sim a sua representação simbólica.

Esses remanescentes arquitetônicos são vestígios de algo que, em muitos casos, não se conhece exatamente o anterior dotado de sentido e funcionalidade.

Sendo por isso, com o passar dos anos, de complexa reconstituição. Nesse sentido, o teórico Cesari Brandi as definiu como qualquer obra que seja testemunho da história humana, cujo conformação é “bastante diversa e quase irreconhecível em relação ao seu anterior” (2004, p. 65). Podem ser objetos modestos ou monumentais, cujas partes inconexas não representam um conjunto organizado e racional. Por essa razão as ruínas são espaços para a “fantasia” e “especulação imaginativa”, como sugere o autor, um atrativo exercício mental de construir e reconstruir suas peças (SOUSA JUNIOR, 2017, p 137).

Contudo, as ruínas não são somente um testemunho histórico, como afirma brandi, mas constituem uma rica fonte de estudos e experimentações. Assumem um papel importante como fonte de informações sobre as técnicas construtivas, os materiais, revestimentos ou partidos arquitetônicos de uma determinada época. No fim do século XVIII, o debate sobre ruínas se aproximou mais do valor documental, tendo em vista a relevância da arqueologia que vinha sendo desenvolvida desde então 2

Arquiteta e urbanista (Mackenzie, 1998), mestre (2011) e doutora (2017) pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Autora da tese de doutorado “A problemática da ruína: das teorias da preservação patrimonial do século XIX ao restauro crítico”.

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(SOUZA JUNIOR, 2017). São desse modo registros vivos da arquitetura local, pois através dos seus elementos tanto tipológicos quanto estruturais é possível descobrir também a data de construção do edifício. Com isso, por seu valor documental, pode servir para fundamentar estudos e direcionar os tipos de intervenções.

A imagem das ruínas pode ser entendida como fragmentos de arquitetura existentes em épocas anteriores dotadas de uma beleza característica e com potencial capaz de despertar sensações no observador tal como uma obra de arte. Segundo Georg Simmel (1958), são configuradas pela combinação da ação da natureza e da cultura, cujos elementos agregados entram em um harmonioso conflito evidenciando a inevitável ação da natureza sobre a obra do homem (Simmel, 1958 apud LIMA et. al, 2019, p. 65). Nesse sentido, embora, sua aparência represente um estágio de deterioração em que o edifício não apresenta elementos de defesa como cobertura, esquadrias e reforços estruturais, a sua nova aparência pode despertar no indivíduo relações afetivas com o objeto arruinado.

O edifício em ruínas, por si só é contraditório, já que reúne em torno de si a necessidade de preservação conjugada a um processo progressivo de deterioração.

A visão negativa a respeito do que foi perdido, pode ser contida por meio de uma nova forma de olhar para o fragmento, na medida em que se percebe o encanto das partes remanescentes que, mesmo degradados, possuem uma mensagem e uma representação. No limiar entre manutenção e esquecimento, as ruínas evocam à memória e se fazem necessárias em si e em todos os monumentos histórico-culturais, como afirmado por Henry-Pierre Jeudy (1990). Também refletem aquilo que perdura, que se recusa a ser esquecido, mesmo que de forma fragmentada. Afinal, as sociedades precisam do passado para referenciarem enquanto grupos sociais e, neste raciocínio, precisam das ruínas (PONTES, 2010).

Diante disso, são espaços de memória capazes de gerar no indivíduo o sentimento de nostalgia. Andreas Huyssen (1990, p.91) afirma que a ruína arquitetônica é um exemplo da combinação inseparável de desejos espaciais e temporais que em conjunto desencadeiam o sentimento de nostalgia. Segundo ele, “no corpo da ruína, o passado está presente nos resíduos, mas ao mesmo tempo não está mais acessível fazendo da ruína um desencadeante especialmente poderoso da nostalgia” (HUYSSEN, 2014, p.91). A nostalgia aqui, segundo o autor, tem a ver com 14

a ação incondicional do tempo, como se algo do passado deixasse de existir, sendo, como afirma o autor, o anseio o do passado e a saudade de outro lugar.

Nesse sentido, esses remanescentes são vestígios de materialidades do passado representantes da história e da cultura humana, percebidas no tempo presente e que ajudam a reforçar o pensamento de futuro. Importantes como espaços de memória, identidade de determinada população e um meio de aprendizagem. Dito isto, é necessário observar que o reconhecimento desses valores “é determinante para as ações de intervenção e preservação desse patrimônio.” (RIBEIRO, 2016, p.24).

2.2 Das teorias da preservação do séc. XIX à atualidade 2.2.1 As teorias do séc. XIX ao séc. XX

Ao longo dos séculos, em regiões como Itália, Inglaterra e França, arquitetos e pensadores de diferentes campos disciplinares lançaram opiniões e teorias a respeito da preservação de patrimônios. Até a atualidade, vê-se que a prática da restauração segue posicionamentos diferentes, em alguns casos polêmicos, e divergentes entre si. De Viollet-le-Duc (1814-1879) a Cesari Brandi (1906-1988), uma linha cronológica de autores se apresenta e representa a evolução da teoria da restauração até a atualidade. Embora sejam poucas as contribuições a respeito do tratamento de ruínas, cabe neste tópico a tentativa de apresentar a preservação em relação à ação prática voltada mais especificamente para o tema das ruínas, a fim de entender até que ponto podemos vivenciá-las na sociedade.

Desde o Renascimento até o século XIX, a utilização da arquitetura clássica na arquitetura contemporânea resultou na atribuição de valores às ruínas e na consequente ampliação do entendimento de “monumento”. Segundo Beatriz Kuhl (2019, p.10), a partir do século XV, as noções ligadas à preservação começam a florescer, sendo amadurecidas entre o período do séc. XV ao XVIII com o movimento romântico e o culto às ruínas. Com a contribuição do cenário de transformações sociais e econômicas resultantes das Revoluções e do Iluminismo, o interesse pela preservação dos monumentos, bem como. Nesse contexto, afirmou Riegl (2008, p.

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46-47), a antiguidade clássica se aproximou de um ideal artístico quase inatingível e ideal (ANDRADE JUNIOR, 2008, p. 4).

A partir do século XIX, ocorre uma segunda ruptura através do reconhecimento de todos os estilos, culminando em um novo momento a respeito da preservação. As intervenções no Coliseu e no Arco de Tito no séc. XIX, por exemplo, corroboraram para o desenvolvimento das ideias a respeito das atuações em monumentos antigos (RODRIGUES, 2017, p. 17). A restauração neste período é consolidada como ciência e a preservação do patrimônio aproxima-se de como se entende hoje. As experiências francesas pós-revolucionárias resultaram na criação da Inspetoria dos Monumentos Históricos em 1830 (KUHL, 2019, p.14). É nesse contexto que se formou Viollet-LeDuc 3 e sobre o qual seria influente ao ser um dos principais teóricos da preservação, cuja linha de pensamento foi polarizada e antagônica a de Ruskin 4.

A primeira visão, de Viollet-Le-Duc, pautava as intervenções em refazimentos e completamentos de acordo com as intenções originais ou com o período mais significativo (LE-DUC, 2019). Por outro lado John Ruskin, cujo posicionamento era mais conservacionista, condenava os refazimentos considerados por ele como “a mais absoluta destruição do edifício” e afirmava que a preservação dos aspectos da passagem do tempo fazia alusão à sua antiguidade e à verdade de seus materiais (RUSKIN, 2008). Assim, enquanto o primeiro defendia uma intervenção estilística ao buscar a unidade de estilo e restaurações imaginativas, o segundo defendia a antiintervenção ao propor que mesmo a “restauração fiel” era uma mentira e uma falsificação.

Em relação às ruínas, Viollet-Le-Duc encarava a intervenção como forma de evitá-las - como o ato de “salvar-se” das ruínas. E quando o edifício já se encontra nesse estado ou sob ameaça de assim o ficar, sugere a reconstrução. Entretanto,

3 Viollet-Le-Duc (1814-1879) Restaurador de monumentos francês nascido em Paris. Um dos

responsáveis pelo reconhecimento do gótico como uma das mais importantes etapas da história da arte ocidental. Ganhou fama com a restauração de monumentos como a Sainte-Chapelle e a catedral de Notre-Dame, em Paris. Supervisionou ainda a recuperação de inúmeros prédios medievais, como a catedral de Amiens, as muralhas de Carcassonne e a igreja de Saint-Sernin, em Toulouse.

4 John Ruskin (1819-1900)– Escritor, poeta e crítico–representante da teoria romântica, ou da restauração romântica, que defende a intocabilidade do monumento degradado. Viveu em uma época de dicotomia entre os antigos costumes sociais e os emergentes decorrentes da Revolução Industrial, que devido ao seu acelerado desenvolvimento substitui de forma gradativa o sistema de produção das manufaturas.

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ações desse tipo correm o risco de gerar um falso histórico e, para que isso não ocorra, é necessário, segundo o autor, realizar um relatório minuscioso do bem e: [...] antes de começar, tudo buscar, tudo examinar, reunir os menores fragmentos tendo o cuidado de constatar o ponto onde foram descobertos, e somente iniciar a obra quando todos estes remanescentes tiverem encontrado logicamente sua destinação e seu lugar, como os pedaços de um jogo de paciência (VIOLLET-LE-DUC, 2000, p. 69-70).

Ruskin, por outro lado, destacou-se por possuir uma posição reacionária à LeDuc. Afirmava que todo bem possui um ciclo próprio, com início e fim. As intervenções não seriam necessárias e até mesmo malvistas, já que a própria ruína representa o fim do edifício, sendo preferível aceitar a sua morte. Para ele o bem denota uma temporalidade determinada que irá morrer em seu trajeto existencial. Entretanto, o autor admite a manutenção como forma aumentar o ciclo de vida do bem e valorizar seu aspecto pitoresco e sublime.

Essas vertentes geraram debates e revisões que convergiram em uma postura intermediária entre os dois autores anteriormente citados, materializadas na visão do italiano Camillo Boito5 (1836-1914). Embora não possuísse em seus escritos o tratamento sobre ruínas, declarava a conservação como a única atitude a se tomar em prol da sobrevivência do bem (KUHL, 2008). Assim, propõe que: “É necessário fazer o impossível, é necessário fazer milagres para conservar no monumento o seu velho aspecto artístico e pitoresco” (KUHL, 2008, p. 60). Assim, configura um eixo de tratamento aos bens em que se baseia em sua materialidade intrínseca, sua historicidade e marcas temporais.

Nos fins do século XIX e início do século XX, na Áustria, se destacaram Alois Riegl6 (1858-1905) e Max Dvorák7 (1841- 1904), cujas linhas de pensamento eram conservacionistas como a de Ruskin. A respeito das ruínas, Riegl (2016), propõe que o valor de antiguidade se revela a partir de toda obra entendida como um organismo 5 É uma figura de grande destaque no contexto cultural da época. Na exposição de Turim

(1884), Boito apresentou a conferência “Os restauradores”, onde sintetizou algumas formulações importantes sobre a restauração e consolidou uma linha conhecida como restauro filológico (ênfase no valor documental da obra).

6 Em seu livro “O culto dos monumentos”, o autor apresenta valores pertencentes aos monumentos, os quais se cultuam na modernidade e se dividem em dois grandes grupos: Os valores rememorativos (ligados ao passado) e os valores de contemporaneidade (ligados ao presente).

7 Valorizava as características pitorescas nas obras do passado e apresentou advertências a respeito da conservação em ambientes e funções originais e sem alterações de formas.

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natural, cuja evolução ninguém deve contrariar8. Conhece-se pelas marcas dessa atividade o tempo de vida do edifício e é sobre a “perceptibilidade distinta dessas marcas” onde se coloca o valor de antiguidade. Para ele, as ruínas representam o exemplo desse valor.

Dvorák, por sua vez, orientou que é preciso preservar aquilo que consiste em seu atrativo singular: o caráter de uma construção resultante da ação do tempo e também seu aspecto na paisagem. Ele afirmava: “Uma ruína reconstruída não é mais uma ruína, mas uma nova, geralmente medíocre, obra arquitetônica.” (DVORÁK, 2015, p. 110, apud LIMA et al., 2019). Assim, se coloca em posição contrária ao restauro estilístico proposto por Viollet-Le-Duc, o qual buscava a unidade de estilo e ignorava as marcas do tempo na obra.

No século XX, dado o contexto político, social e cultural da Itália nesse momento, as ruínas da antiguidade clássica romana ganharam notoriedade e valorização. Nesse contexto, o italiano Gustavo Giovannoni9 publica o verbete “Restauro dei Monumenti”, no qual ele apresenta a distinção dos tipos de restauro, os quais serviram posteriormente de embasamento para a formulação da Carta de Atenas de 1931. A respeito das ruínas, publica um verbete que dispunha diretrizes pertinentes ao seu tratamento, como a consolidação através de técnicas para auxiliar na estruturação, além da prática de “liberação”, “completamento” e “renovação” (RODRIGUES, 2017).

Um outro teórico bastante reconhecido no campo da preservação é Cesare Brandi10. Responsável por lançar as bases para o “restauro crítico”, considerava o bem na totalidade da sua consistência material e propunha que a restauração deveria designar a unidade potencial da obra de arte, na medida em que um falso artístico ou histórico não ocorresse, e sem eliminar registros temporais da obra de tarde, considerando sua instância histórica e estética. A respeito das ruínas, a instância que prevalece é a histórica, já que ainda que incompleta em seu aspecto físico “bastante

8 Entretanto, o próprio Ruskin reconheceu a necessidade de se frear o processo de autodestruição deixado à ação do tempo e intempéries através de práticas consolidativas.

9 (1873-1947) Ampliou a linha de pensamento de Boito sobre o restauro filológico ou científico, o qual propunha o valor documental ao monumento.

10 Brandi (1906-1986) é um dos principais nomes da restauração de objetos de arte. Em 1938 Brandi

organizou o Instituto Central de Restauro (ICR) em Roma, instituição da qual se tornou diretor em 1939.

O instituto se tornou a referência para técnicas de restauração, proteção, salvaguarda e restauro de obras de arte e arquitetônica, em toda a Itália

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diverso e quase irreconhecível” (BRANDI,2004, p.65) é testemunho da história humana.

Nesse sentido, para Brandi, a ruína requer ações de conservação. A sua preservação é restrita apenas às ações de consolidação e conservação do seu contexto, uma vez que a sua preservação também implica na priorização de sua instância histórica (BRANDI, 2004). Quanto ao seu tratamento, Brandi era contrário aos “refazimentos” e indicava a consolidação e conservação do seu status quo com procedimentos técnicos existentes, a partir da compreensão do seu estado desintegrado (RODRIGUES, 2017).

No segundo pós-guerra, as reconstruções realizadas em Pompéia, Herculano e Ostia são duramente criticadas por Brandi, então diretor do ICR (Instituto Central do Restauro) como um “grave erro”. Brandi formulou abordagens conceituais e teóricas pertinentes para o tratamento arqueológico, rejeitando a retirada de fragmentos de elementos arquitetônicos e artísticos do seu contexto de sítio original e propôs a musealização como forma de conservação e uso in situ através de um adequado projeto.

Ainda no séc. XX, nas discussões de geógrafos como Carl Sauer, ressalta-se o conceito de paisagem cultural, abordada no campo do patrimônio, permitindo maior abrangência das teorias e dos instrumentos de tutela aplicados aos órgãos responsáveis. Nesse sentido, essa abrangência na noção de patrimônio, aborda a profunda relação do bem com o entorno, e nesse caso as ruínas são indissociáveis.

2.1.2 O tratamento de ruínas nos textos das cartas patrimoniais

No séc. XX, a Carta de Atenas11 de 1931 deu início à difusão da necessidade de “salvaguardar” monumentos (proteção e defesa do bem por parte de autoridades e instituições). Esse documento foi, portanto, inaugural e abriu caminho para as regulamentações e criação das cartas patrimoniais no campo da preservação do patrimônio cultural. A carta aborda em um tópico específico à conservação da ruína,

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Esse documento foi elaborado durante a conferência Internacional de Atenas sobre o Restauro de Monumentos, sendo responsável pelo apelo às nações a respeito da preservação dos bens.

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incorporada no grupo dos monumentos arqueológicos, a qual precisa ser necessariamente cuidadosa, recomendando a prática da anastilose 12 quando o caso assim permitir e utilização de materiais novos necessariamente reconhecíveis a esse trabalho (CARTA DE ATENAS, 1931).

No ano de 1964, a Carta de Veneza13 foi publicada a partir da influência dos pensamentos de Brandi e com o intuito de aprofundar as premissas da Carta de Atenas (1931). As ruínas, por sua vez, ainda são incorporadas no grupo dos monumentos arqueológicos. As reconstruções deveriam ser excluídas no primeiro momento, sendo permitido apenas a anastilose. Os materiais integrados deveriam ser reconhecíveis (distinguilidade) e intervir o mínimo possível na ruína para, assim, não alterar a “continuidade de suas formas” (CARTA DE VENEZA,1964, p. 4).

Na transição da década de 1970 para 1980, a conservação e a restauração assumiram uma nova delimitação conceitual. Novas propostas teóricas resultaram da transferência do debate do eixo estético-histórico para o antropológico-cultural, das quais destaca-se a ampliação do conceito de Patrimônio passando a denominar-se “Patrimônio Cultural”. Os conceitos de conservação foram “culturalizados” e o foco transferiu-se dos aspectos materiais para os aspectos imateriais. No campo das ciências humanas, os procedimentos e modelos científicos foram paulatinamente substituídos pelos da Antropologia de modo que a conservação incorporou conceitos como significância, linguagens, diversidade, memória coletiva e identidades (PEREIRA, 2020).

Na década de 1980, a publicação da Carta de Burra (1980) propõe diretrizes para a conservação cujo objetivo é preservar a significância cultural de um bem, devendo implicar medidas de segurança e manutenção. Não admite a reconstrução em grande parte do monumento, permitida apenas no preenchimento de lacunas e de maneira distinguível. A reconstrução deveria se limitar apenas à colocação de elementos com a finalidade de contribuir para o seu significado cultural. Em 1994 no Japão, a Carta de Nara, por sua vez, passa a tratar da importância da conservação 12 A anastilose é uma técnica de restauro que consiste em identificar elementos que originalmente faziam parte de um monumento ou construção e buscar remontar, parcial ou integralmente, este monumento, através da recolocação destas peças em seus locais originais e da adição de elementos alheios à construção original, mas que ajudem na fixação ou composição da parte restaurada (COSTA, H. F.,2014) 13 Este documento foi definido com propósito de traçar uma metodologia unificada para as intervenções inserindo o restauro no contexto social, econômico e cultural.

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da “autenticidade” cultural através de intervenções que respeitam os significados e valores de cada cultura para além da materialidade dos edifícios.

2.1.3 Abordagem das ruínas na atualidade: teorias e práticas

Na América Latina, atualmente, destacam-se três frentes na intervenção sobre edifícios antigos: A museificação, a auto-sustentabilidade e a modernização dos monumentos (Tabela 1).

Tabela 1: Tendências atuais da prática da restauração na América Latina

Museificação

Modernizante

Auto-Sustentável

Por meio de novas técnicas, busca congelar o edifício como objeto de arte do passado, integrado à função primitiva.

O aproveitamento do antigo busca valorizar o novo, característico das cidades contemporâneas, também conhecido como “fachadismo”.

Busca integrar o monumento a vida contemporânea de modo flexível, que o torne viável, atribuindo nova função e/ou uso.

O passado que “permanece” no passado.

Preexistente como suporte para o novo.

O passado que participa efetivamente do presente.

Mantém sua composição

Propõe novas composições, porém respeitando o valor documental do preexistente

Cria-se uma nova composição, onde o antigo assume apenas função de fundo estético.

Fonte: AZEVEDO, 2003, p. 22. Elaborado pela a Autora.

Nos últimos anos algumas ações contemporâneas descontextualizam a ruína do local onde está inserida, comprometendo a percepção original da paisagem (BAETA e NERY, 2014). Dentre essas ações, podemos citar: reconstrução sem motivação social; restaurações; falso histórico; deturpações do significado e etc. Dentre essas ações, algumas intervenções são pautadas em interesses e gostos pessoais, emulando em muitos casos uma prática construtiva artesanal há tempos não utilizadas, ou restaurações que nada se diferem de intervenções em edifícios novos.

(ANDRADE JUNIOR, 2008).

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Pode-se citar como exemplo o Centro Histórico de Salvador, caracterizado por sobrados em péssimo estado de conservação e em alguns trechos, reduzidos a ruínas, ganham um Programa de Recuperação, implementados a partir de 1992 pelo Governo do Estado da Bahia. As primeiras intervenções foram realizadas em um conjunto de sobrados íntegros, com resgaste da sua unidade estilística, que priorizou a construção de cenários urbanos, caracterizando uma prática “fachadista” que incluiu falsificações.

Entende-se assim que a intervenção sobre preexistências não é de total liberdade do projetista, tendo-se clara a importância da conservação seja do edifício, seja do seu conjunto. Dourado (1997, p. 145) observa que: Visto que o passado não passou, que ele ainda se constitui para o ser humano numa força tão poderosa quanto o futuro, que o arquiteto restaurador abandone a falsa segurança do recolhimento num passado anacronicamente estático e que o arquiteto dito criador saiba dialogar com a preexistência, [...].

(DOURADO, 1997, p. 145)

De acordo com os preceitos atuais, a conservação deve buscar a autenticidade documental, a diferenciação dos acréscimos produzidos em diferentes tempos, a legibilidade dos materiais e de técnicas empregadas. O novo deve se relacionar com o preexistente sem o suprimir, devendo assim remeter como demanda da própria obra e estar ancorada a uma teoria (L.H.A. Lima et al., 2019).

Na obra de Ashuts (2007), ilustra-se algumas abordagens distintas possíveis ao tratamento de ruínas. A abordagem da restauração que se aproxima da ideia de reconstrução é considerada polêmica por buscar reconstruir uma imagem específica do monumento. Sendo comumente confundida com a restauração que visa conservar os valores históricos e estéticos (BRANDI, 2014), os quais respeitam os principais conceitos do campo da preservação, como autenticidade e o falso histórico (BOITO, 2003) (BAETA e NERY, 2014). Nestes casos, somente a prática da anastilose é justificada como citado anteriormente nas cartas de Atenas (1931) e de Veneza (1964).

Dentre algumas abordagens, Ashuts (2007) descreve a “pitoresca”, embasadas no movimento romântico, seguindo as linhas teóricas de Ruskin, Boito e Dvorák, os quais exaltavam os aspectos pitorescos na preservação do monumento. Contudo 22

atenta para o fato de que esse tipo de intervenção pode, erroneamente, ter o interesse maior em uma construção de “mise-em-scène” (CHOAY, 2006).

Há ainda a abordagem documental, que trabalha a ruína como evidência, dando mais foco ao valor cultural e científico, seguindo a linha de BOITO (2003) como um documento do passado. Existe uma preocupação maior de preservar os remanescentes e desacelerar seu processo natural. Logo, a pátina e estratificação do tempo são removidas e trabalhos de reforços estruturais são realizados com o intuito de evidênciar a ruína. Nesse sentido, as ruínas são tratadas como vestígios e objetos de estudos do passado.

Partindo desse ponto, Nivaldo Andrade Júnior (2008), atenta para a possibilidade de, em determinadas situações, preservar as ruínas enquanto tal e ao mesmo tempo incorporá-las em novas construções que possa lhes agregar um valor e dignificá-las, realizando uma arquitetura contemporânea baseada nas tecnologias e materiais construtivos mais atuais a fim de resgatar sua função social. Neste caso a ruína é preservada enquanto tal e a viabilização da estrutura permite a sua visitação e organização dos percursos e fluxos.

Com isso, diante de todo aporte teórico apresentado, entende-se que as ruínas devem

primordialmente

ser

preservadas

em

sua

condição

atual:

ruínas.

Recapitulando os principais autores citados e as cartas patrimoniais internacionais, presume-se que embora existam possibilidades de tratamento, as ruínas possuem valores pelos quais são e devem ser cultuadas no presente. Logo, intervenções limitadas à consolidação e manutenção do seu aspecto associadas às práticas da legibilidade, mínima intervenção e reversibilidade parecem ser as mais apropriadas no caso das ruínas da Fazenda São Bernardino, uma vez que valorizam os registros do passado ao passo que lhes atribui valor instrumental.

Pontes (2010, p.104) faz o alerta: [...] más ações em ruinas também são danosas à alegoria que delas emana.

Afinal, seus fragmentos provocam uma série de interpretações e, apesar de não haver como prevê‑los, devemos mantê‑los em seu contexto e sem incorrer num falso histórico, havendo necessidade de respeitar a atmosfera formada por meio das características que permitem a identificação da ruina como tal.

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2.3 A ruína e o lugar de memória

Ao contrário do senso comum, a memória e a história não são sinônimos e sim apostos. A história é a representação do passado e apresenta de forma problemática e incompleta a reconstrução do que não existe mais, enquanto a memória se mostra como fenômeno atual, fortalecendo o elo no presente. A memória é vida, levada por grupos vivos e está sempre em evolução, aberta as lembranças e esquecimento, vulneráveis as manipulações (NORA, 1993). A memória fixa as lembranças no sagrado e a torna prosaica, além de estarem enraizadas no que é concreto, na imagem e no objeto. A história por sua vez se apega as evoluções, continuidade e as relações das coisas.

Existe um fenômeno presente nesse contexto chamado aceleração da Memória e aceleração da História. Dito aceleração da memória, entende-se como uma distância entre memória verdadeira, social, intocada, que estão relacionadas as sociedades primitivas que por sua vez as preservaram. Já a aceleração da história, julga ser o que nossas sociedades condenadas ao esquecimento fazem do passado, sendo levadas pelas mudanças. Hoje, entende-se que a necessidade de memória é uma necessidade de história, uma vez que tudo que é dito memória é de fato história.

Contudo, é importante perceber que em meio a essas definições existem sim diferenças entre memória e história, além dos diversos tipos de memória, seja memória de impregnação, memória psicológica, individual e subjetiva, porém não mais social, coletiva, globalizante. É notável que a materialização da memória se dilatou em poucos anos, democratizando-se, diferente dos tempos clássicos onde os três grandes produtores de arquivos reduziam-se às principais famílias, igreja e estado. Os lugares de memória são lugares com efeitos simbólicos e funcionais, além de pertencerem a dois domínios que os fazem interessantes, porém complexos. A memória, com efeito, tem duas formas de legitimidade: histórica ou literária. Foram exercidas juntamente, mas hoje, estão ainda separadas. A história é o imaginário de substituição de cada pessoa (TEIXEIRA, 2019).

A Carta de Quebec (2008, p.3) introduz o conceito de espírito do lugar, definindo-o como um conjunto de elementos materiais e imateriais que são crucias 24

para compor um lugar. Todo lugar possui um espírito e a memória, as narrativas, as atividades culturais, práticas tradicionais etc. são exemplos de fenômenos culturais e sociais intangíveis que conferem ao sítio, edifício e entre outros um “espírito” complexo e multiforme digno de ser preservado e transmitido a gerações futuras.

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3 PESQUISA HISTÓRICA

3.1 Contexto histórico de Nova Iguaçu

Em 1879, aproximadamente uma população de 22 mil pessoas habitavam a Vila de Iguassu, dos quais cerca de 8 mil eram escravizados. Em 1858, com a inauguração da Estrada de Ferro Dom Pedro II e outros acontecimentos, foi realizada a transferência da sede do município da Vila para o Arraial de Maxambomba. Em 1916, Maxambomba passa a se chamar Nova Iguassú e a principal atividade econômica do Município passa a ser o plantio de laranjas14 - na época, ficou conhecida como “Cidade Perfume” por causa do cheiro das frutas. Porém, diante da forte influência da Segunda Guerra Mundial, ocorreu uma explosão demográfica na Baixada Fluminense e no Rio de Janeiro, levando o cultivo e exportação da laranja à decadência, o que culminou na divisão do território.

De acordo com o site da Prefeitura de Nova Iguaçu15, foi a partir da década de 40 que surgiu o processo de emancipação do Município16. Vale destacar que em 1952, com a inauguração da Rodovia Presidente Dutra e a recuperação da malha ferroviária, a cidade passou por um aumento populacional e assumiu outras funções, entre elas, a de cidade dormitório e de corredor de acesso à capital. Hoje, Nova Iguaçu é o maior município da Baixada Fluminense em extensão territorial e segundo em população.

Possui um dos centros comerciais mais importantes do Estado do Rio de Janeiro, um polo que atrai consumidores das cidades de seu entorno.

Em 1997, o município de Nova Iguaçu passou a ser denominado de “cidade de Nova Iguaçu” pela Lei Complementar N° 006 e foi dividido administrativamente em nove Unidades Regionais de Governo, onde cada uma é dividida em bairros17. Os bairros, por sua vez, oficialmente são as menores unidades administrativas da cidade,

14 Os pomares de Nova Iguaçu se estendiam por toda a Estrada de Madureira, Cabuçu,

Marapicu, alcançando também Itaguaí.

15 https://www.novaiguacu.rj.gov.br/ 16 Nova Iguaçu perdeu Duque de Caxias (1943), Nilópolis e São João de Meriti (1947). Nos anos 90, foi a vez de Belford Roxo e Queimados (1990), Japeri (1991) e Mesquita (1999).

17 Segundo o Plano Diretor Participativo do Município de Nova Iguaçu, essas unidades foram criadas para oferecer os serviços ordinários à população, descentralizando, assim, alguns serviços rotineiros que são realizados apenas no centro da cidade.

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porém cada bairro conta com diversos sub-bairros, vilas, lugarejos e povoados.

Atualmente, a relação de bairros de Nova Iguaçu é definida pela Leis 2.952, de 17 de 1989.

3.2 Contexto histórico das ruínas da Fazenda São Bernardino

3.2.1 Do surgimento ao declínio: A Vila Iguaçu e a Fazenda São Bernardino A região onde atualmente localiza-se o município de Nova Iguaçu fez parte da antiga Capitania de Martim Affonso de Souza (FORTE, 1933) e começou a sofrer gradativa colonização a partir de 1566. Em torno do Rio Iguaçu, na época navegável, essa sesmaria transformou-se em freguesia e se desenvolveu devido à proximidade com os cursos fluviais (TORRES, 2008). A então Estrada do Comércio abrangia um trecho da atual Estrada Federal de Tinguá e era a artéria principal da região. Segundo Fleury (1980), em suas margens se concentravam importantes equipamentos públicos, dentre eles a Igreja de Nossa Senhora da Piedade do Iguaçu. Na figura 2, é possível ver o mapa que correspondia à região no séc. XIX. Figura 1: Vila do iguassu

Fonte: Projeto “Ser” Ambiental Tinguá, 2017. Foto: Yuri Borba

27

Figura 2: Antiga Vila do Iguaçu e equipamentos existentes.

Fonte: Imagem produzida pela autora a partir do mapa disponibilizado por TORRES, gênesis (Org), 2023.

Figura 3: Localização da região que correspondia à antiga Vila do Iguaçu.

Fonte: Diagrama produzido pela autora a partir de imagens do Google Maps, 2022.

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As terras onde viria a ser construída a Fazenda São Bernardino foram adquiridas em outubro de 1860 por Bernardino José de Souza e Melo - cujo registro se encontra no cartório (processo n° 2.252, existente no Cartório do 1° Ofício de Nova Iguaçu).

Sua construção foi planejada até sua conclusão e inauguração em 1875. A fazenda era servida pela Estrada de Ferro Rio D’Ouro, atualmente extinta, que tinha uma estação com o nome de São Bernardino e possuía um acesso que se conecta à Fazenda através da Aleia de Palmeiras Imperiais (Fig. 4- B), das quais parte ainda subsiste (ARANHA [200-]).

Quanto ao conjunto arquitetônico, a fazenda possuía Casa Grande com uma capela em seu interior (Fig. 6- D), Engenho (Fig. 6- E e F) e uma senzala (Fig. 4- C).

Também contava com cavalariças, garagem para carruagens. Segundo informações disponíveis para consulta no site da prefeitura do município de Nova Iguaçu 18 a Fazenda produzia café, açúcar, aguardente, farinha de mandioca, além de extrair madeira e exportar carvão.

Figura 4: Casa Grande (A), Engenho e Senzala (C) em 1950 Aleia de Palmeiras Imperiais.

Fonte: Arquivo Central do IPHAN – RJ (A) e Secretaria da Cultura de Nova Iguaçu (B e C), 2023.

18

Disponível em: https://www.novaiguacu.rj.gov.br/2017/12/22/fazenda-sao-bernardinopertence-a-nova-iguacu/. Acesso em: Jan, 2023.

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Figura 5: Provável Estação São Bernardino em 1886, ilustrada por Mauro Lemos Azeredo.

Fonte: Ver link em referência de imagens.

Figura 6: Capela (interior da Casa Grande) e Atividades agrícolas no Engenho.

Fonte: Arquivo Central do IPHAN.

A Vila Iguaçu teve um breve período de prósperas atividades econômicas, tendo seu fim decretado na segunda metade do séc. XIX - momento em que ocorreram 30

drásticas mudanças políticas, sociais e econômicas: como o surto de cólera, abolição da escravatura, a criação da linha férrea, o deslocamento do eixo econômico, a transferência da Igreja Matriz Paroquial e da Câmara Municipal para o atual município de Nova Iguaçu (SANTOS, 2009)19. Deste modo, esses acontecimentos afetaram diretamente as produções da Fazenda São Bernardino, passando a ser apenas uma casa de campo e caça. Sua produção não objetivava mais fins comerciais, mas sim o próprio sustento do proprietário Bernardino José de Sousa e Melo até o ano de 1917.

Sobre a decadência da Vila, Santos (2009) afirmou:

Figura 7: Maxambomba e Vila de Iguaçu

Fonte: TEIXEIRA, 2019.

19

Disponível em: http://www.estacoesferroviarias.com.br/efcb_rj_riodeouro/sbernardino.htm.

Acesso em: Dez, 2022.

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A criação da ferrovia na região do Iguaçu tinha como principal objetivo tornar possível e acelerado o deslocamento das mercadorias produzidas no bairro. O ramal saía da estação José Bulhões, próximo a vila de cava, chegando até Tinguá. Porém, com todos os problemas já citados anteriormente, somando a extensão da Estrada de Ferro, tornou-se breve o período que a Vila do Iguaçu esteve próspera em suas atividades (TEIXEIRA, 2019).

Figura 8: Estação de Vila de Cava, (Autor e data desconhecidos).

Fonte: Estações ferroviárias do Brasil. Ver referência de figuras.

Em 1917, o conjunto ainda em bom estado de conservação foi vendido pelos herdeiros de Bernardino para João Julião e Giácomo Gavazzi. Durante esse período, o casarão voltou a ser usado para produções econômicas, cuja atividade se restringia apenas à citricultura. Nelson Aranha ([200-]) declara que essas atividades prejudicaram as bases de pedra e cal das cocheiras, além de provocar o abatimento de algumas das palmeiras com a abertura de uma estrada para o transporte de

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mercadorias. Por fim, Gavazzi vendeu quase tudo que havia em seu conjunto e em seguida a abandonou.

3.2.2 O tombamento, Conflitos de posse e o Incêndio O conjunto arquitetônico do casarão era dotado de detalhes importantes que trouxeram reconhecimento nacional. O prefeito de Nova Iguaçu, Ricardo Silveira, solicitou o seu tombamento e, em 1951, foi oficializada como patrimônio histórico e artístico pelo SPHAN (atual IPHAN). Após o tombamento da fazenda, a prefeitura de Nova Iguaçu executou o desapropriamento através do decreto nº 1459, publicado em 8 de dezembro de 1975 (Ver Anexo A). Este decreto inicialmente tinha como objetivo, criar um Parque com diversas funcionalidades para a população, o que não aconteceu. A fazenda então, entrou em processo de deterioração das ruínas por conta do abandono (TEIXEIRA, 2019).

A desapropriação autorizada pela Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu em seu decreto nº 1.459 em 1975, foi revogado em 1984, tornando novamente de posse do autor a Fazenda São Bernardino. Após esses acontecimentos, o autor entrou com ação ordinária contra a Prefeitura, solicitando a devolução dos imóveis expropriados e responsabilidade financeira pelos danos causados à Fazenda. A ação foi julgada por sentença do então Juiz Federal da 3a. Vara, Dr. ALBERTO NOGUEIRA, processo nº 5199530.

Isto posto, julgo a ação procedente em parte para condenar: a) a Prefeitura de Nova Iguaçu a entregar, de imediato, os bens descritos na inicial ao Autor, em face da revogação dos atos expropriatórios e consequente perda de objeto da retrocessão, responder por perdas e danos, a partir da data da imissão na posse ·c19 de outubro de 1976) até a efetiva entrega, além de restaurar, em conjunto com a União Federal (está em solidariedade com a litisconsorte Pró-Memória) o acervo arquitetônico tombado, na proporção dos das pela mesma causados (ou seja, pela deterioração do patrimônio do estado precário em que já se encontrava e pelo tempo em que o detiver); b) a União Federal e sua litisconsorte, corno assinalado no item anterior e no restante da obrigação de restaurar o mencionado conjunto; c) a todos os vencidos em juros moratórios correção monetária, a teor da Lei nº 6.899, de 8 de abril de 1981, a partir do laudo a ser produzido na fase de liquidação mais custas e honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, em rateio pelos sucumbentes.

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Segundo relatos citados no processo da Fazenda São Bernardino, ao passo desses acontecimentos, o terreno do conjunto começou a ser ocupado por moradores que, motivados pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nova Iguaçu, invadiram as terras para construção de moradias precárias. Mais um fato triste ocorreu ao fim da liminar que favorecia os ocupantes que cultivavam 181 hectares da Fazenda. Segundo jornais da época, herdeiros da família Gavazzi, acompanhados da polícia, estiveram nas terras, onde cometeram atos de violência contra diversas pessoas, além de destruírem vários barracos. A tensão só aumentava por parte dos moradores que temiam novos ataques e por isso faziam vigílias para não serem surpreendidos. Nesse tempo de apreensão, os ocupantes viviam em situação precária, mas receberam ajuda de grupos de apoio da Cáritas Diocesana (ANEXO 1).

Figura 9: Recortes de Jornais sobre os despejos da Fazenda.

Fonte: Diocese Nova Iguaçu.

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Em processo de deterioração por consequências naturais, em 1983, a fazenda São Bernardino sofreu um incêndio fatídico e criminoso que destruiu parte do que ainda era possível visualizar do espectro original. Uma declaração do Corpo de bombeiros a respeito do incêndio constata o ocorrido (Ver ANEXO 1). Após o incêndio, nota-se o total abandono da fazenda, agora à mercê de intempéries e toda sorte de vandalismo. Os jornais da época noticiaram os acontecimentos sobre o incêndio, que para muitos foi de caráter criminoso. Os posseiros sofreram a violência em uma terra que julgavam ser “Terra de todos”, mas que diante dos terríveis acontecimentos, naquele momento mesmo com as promessas de proteção feitas pela Polícia Civil, se viam desprotegidos. O secretário da Polícia Civil, Nilo Batista, considerou genocídio os atos de violências contra os posseiros, além de ouvir das vítimas que os principais suspeitos eram o Prefeito Paulo Leone, o despachante Jordão Pinheiro, os grileiros Laerte Minuano e major Américo e claro, a família Gavazzi (Jornal do Brasil – 14.08.86 – Pág.1).

Figura 10: Incêndio em 1983.

Fonte: Arquivo Central do IPHAN.

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3.2.3 A atual situação do Conjunto arquitetônico e as propostas de intervenção.

Com o passar dos anos, o conjunto sob os “cuidados” da Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu, apresentando-se em estado de total abandono, vem sendo alvo das intempéries e vandalismo por parte de criminosos. Diversas foram as propostas e promessas de revitalização da área por parte do poder público, no entanto a maioria não se concretizou. Uma das primeiras a ser citada, é a proposta do então Prefeito de Nova Iguaçu, Lindbergh Farias que foi favorável ao projeto de restauração do bem, obtendo recursos capitalizados pelo IPHAN. Entretanto, logo chegaram denúncias de moradores e visitantes, relatando que o projeto não passava de alguns escoramentos nas ruínas (TEIXEIRA, 2019).

Em abril de 2013, o secretário de Desenvolvimento Econômico, Agricultura e Turismo, Mario Marques, demonstrou interesse em restaurar o bem e instalar iluminação especial, visando destacar o conjunto arquitetônico. No entanto, verificouse que a intervenção não passou da colocação de luzes (Fig. 11), que segundo Alcy Maihoni, em seu blog “O coletivo Popular é o Alvo”, cujo texto se intitula “Fazenda São Bernardino: estou verde de indignação”, a luz verde durante a noite só realçou ainda mais a precariedade das ruínas. Ele ainda ressalta: “Veja lá no alto, sequer houve uma preocupação de retirada do capim. [...] Ainda aguardo o projeto de visitas guiadas que contará a história deste patrimônio, mas priorizem primeiramente os estudantes da rede estadual e municipal.”

Figura 11: O conjunto arquitetônico à noite, 2017.

Fonte: Blog post “O coletivo Popular é o Alvo”. Ver referência de figuras

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Os atos de vandalismo na Fazenda São Bernardino foram de diversas naturezas, desde incêndio até roubos. Em 2016, a fazenda foi alvo de roubo, dessa vez dos tijolos oriundos das paredes demolidas na mesma semana do então roubo. Os homens que cometeram o ato usaram um caminhão com identificação da CEDAE para fazer o transporte dos tijolos. Na ocasião, os responsáveis não foram identificados, e o secretário de Cultura na ocasião, Wagner D’Almeida, solicitou que a Cedae fizesse o reparo dos danos Alguns moradores que vivem no entorno, registraram o momento em que os homens deixaram a Fazenda São Bernardino. Segue abaixo o depoimento de Geraldo Baptista, de 49 anos, que viu toda ação dos vândalos.

‘Desconfiei do barulho e fui ver o que estava acontecendo. Quando me deparei com aquela situação, não pensei duas vezes e chamei atenção dizendo-lhes que estavam cometendo um crime e que poderiam ser presos por aquilo. Eles perceberam que poderiam ter problemas e começaram a se retirar do terreno. Foi quando aproveitei para fotografá-los.”

Desde 2017, a SEMCULT vem mostrando um notável interesse na região, através de uma proposta de revitalização não somente da Fazenda São Bernardino como também do sítio histórico da Vila Iguaçu. O objetivo do projeto é transformar a região em um ponto de visitação, a nova “Paraty de Nova Iguaçu”, através da restauração de bens históricos como a escadaria do cemitério da Vila, o Cemitério da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, a antiga Estrada do Comércio, o Porto de Iguaçu e a Torre Sineira da Igreja da Nossa Senhora da Piedade do Iguaçu.

Até o momento apenas a Torre Sineira da Igreja Nossa Senhora da Piedade e a escadaria do antigo Cemitério dos Escravos foram restauradas.

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Figura 12: Recorte de Notícia sobre o projeto da SEMCULT.

Fonte: Rede da Notícia. Ver referência de Figuras

Figura 13: Restauração da Torre Sineira de Nossa Senhora da Piedade, 2020.

Fonte: Ver link disponível em Referência de figura.

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Figura 14: Corpo técnico na visita à Fazenda.

Fonte: Ver referência de figuras

Mais recentemente, a proposta continuou em andamento ao iniciarem uma prospecção e monitoramento arqueológico no local com o intuito de reconstruir as ruínas pertencentes à antiga Senzala dos escravizados. Segundo o Jornal da Baixada, o trabalho foi iniciado após a publicação da Portaria Autorizativa do IPHAN e os estudos arqueológicos também foram realizados nos remanescentes do antigo Porto do Iguaçu. Recentemente alguns artefatos, bem como a história da região, foram expostos na Casa de Cultura de Tinguá, restaurada e inaugurada, durante um tradicional festival gastronômico, a Festa do Aipim.

39

Figura 15: Estudo arqueológico das ruínas da senzala.

Fonte: Site da baixada. Link disponível em referência de Figuras.

Embora

essas

intervenções

demonstrem

uma

preocupação

com

o

reconhecimento cultural e histórico da região, torna-se questionável a real motivação para tais intervenções. Ainda que se valendo de estudos técnicos, arqueológicos e levantamentos originais do conjunto arquitetônico pelo IPHAN cabe indagar se nesse caso uma reconstrução seria justificável, já que a população local nunca conheceu o bem em seu estado inicial. Dito isto, por que não pensar em um projeto que vise sobretudo a consolidação e preservação das ruínas ainda existentes, inserindo-as em um contexto que as valorizem pelos seus aspectos simbólicos e como é reconhecida pelos moradores e visitantes? (RUSKIN, 2008; BRANDI, 2014; BOITO,2008; CARTA DE ATENAS, 1931).

Em suma, mediante ao histórico apresentado, não resta dúvidas sobre a relevância não somente da Fazenda São Bernardino, como de toda região da Vila de Iguaçu para a história do Município de Nova Iguaçu. As ruínas do conjunto, por sua vez, são remanescentes que resistem às ações do tempo, sendo testemunho não somente da história da cidade, mas também de uma história silenciada de povos dominados e oprimidos do séc. XVIII e XIX. O estado em que a Fazenda São Bernardino se encontra durante anos reflete também o descaso com a população que vive na região, onde ações públicas de segurança, saúde, educação e fiscalização são precárias.

40

4 ANÁLISE DAS CONDIÇÕES ATUAIS

4.1 Características arquitetônicas

Segundo Joaquim Cardoso (1943), em seu trabalho “Um tipo de Casa Rural do Distrito Federal e estado do Rio de Janeiro”, o conjunto arquitetônico de São Bernardino se enquadra dentro de um seleto grupo de exemplares de fazendas coloniais que surgiram no Brasil em diferentes regiões do seu território. Esse grupo corresponde aos fatos econômicos designados por alguns historiadores como “ciclo do açúcar”. Nele a atividade arquitetônica se distribuía de maneira invariável em três edifícios: Casa Grande, Engenho e Senzala, a que frequentemente se juntava também a Capela. O Engenho era construído de maneira bem primitiva, com grandes esteios de madeira e pesado vigamento na cobertura. A Casa e a capela recebiam um tratamento mais requintado, chegando a um grau de apuro estético em que pese à simplicidade dos meios construtivos.

Figura 16: Casa Grande, 1950.

Fonte: Arquivo Central do IPHAN

41

Embora se tratasse de uma classificação inicial, cuja intenção era servir de ponto de partida para pesquisas mais cuidadas, o conjunto foi caracterizado por Joaquim Cardoso (1943) por uma tipologia de habitações rurais que essencialmente procurava aprimorar o esmero pela fachada principal. Apresentava aspecto de nobreza e fidalguia, e sua construção, que apresentava formato em U, possui elevação no sobrado na parte central. Os eixos laterais são simétricos, com maior aperfeiçoamento no uso das esquadrias, excelência no exercício da alvenaria e revestimentos. Dos quase 40 cômodos dispostos pela Casa Grande, alguns salões possuíam paredes trabalhadas, e na capela havia uma imagem de São Bernardino, enriquecido por forro estocado de finalidade litúrgica. Muitos itens na casa se destacam por seu requinte, como o Chafariz no pátio interno (Fig. 17), além das telhas de louça localizadas nos beirais dos telhados (TEIXEIRA, 2019). [...] uma casa grande de 40 quartos que tinha até uma capela em seu interior.

As telhas, ferragens e a louça do único banheiro ele [Bernardino] mandou vir de Portugal; as madeiras eram todas de lei; o mobiliário, de jacarandá; e os vitrais, em três cores. (FLEURY, 1980, p.4).

É de suma importância mencionar que as descrições da Fazenda São Bernardino têm maior foco no cômodo principal (Casa Grande), descrevendo de forma breve as áreas do Engenho e Senzala. A casa principal construída em um terreno elevado, evidencia uma característica de implantação nos tipos de Casas de senhor de engenho. Ponto estratégico para a visão dos grandes proprietários rurais, refletindo desse modo o domínio e a opressão.

Figura 17: Pátio Interno 1985 (A) e Pátio interno, 1977 (B).

Fonte: Imagens do arquivo Central do IPHAN (A) e Lilian Jansen (B).

42

4.1.1 Aspectos construtivos Considerando o tempo de construção da edificação e os materiais utilizados na época, a fundação provavelmente é em baldrame de pedra (Fig. 18). Há o uso de cantaria no embasamento da Casa Grande (Fig. 19-2) na escadaria, soleiras e no muro de contenção que permite o acesso entre o nível superior e inferior do terreno.

No Brasil, devido à dificuldade de mão de obra qualificada e ao custo, a cantaria não era utilizada na totalidade do edifício, mas apenas em suas partes mais importantes, assim como no caso da Fazenda São Bernardino. O aparelho das pedras não era muito elaborado, exceto no Rio de Janeiro, a partir da segunda metade do século XVIII (COLIN, 2010).

Figura 18: Estrutura de cantaria e em seguida estrutura de cantaria exposta respectivamente.

Fonte: Silvio Colin, 2010 e Autora, 2023, respectivamente.

As alvenarias encontradas nas edificações são em tijolos cerâmicos maciços cozidos, assentados em argamassa de areia e cal, com disposição de alvenaria 1 mês provavelmente de aparelhamento inglês (Fig. 19, exemplo 2).

Figura 19: Alvenaria de tijolos e tipo de aparelho.

Fonte: Silvio Colin, 2010.

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Algumas características arquitetônicas estão presentes nas três edificações, como as coberturas (TEIXEIRA, 2019). As coberturas eram constituídas de madeira com telhado cerâmico, as platibandas apresentavam beirais com telhas cerâmicas “capa e bica” (Fig. 20 e 21).

Figura 20: Detalhe da cobertura, com telha de capa, bica e espigão 1962.

Fonte: Ver referência de imagem.

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Figura 21: Detalhe do trecho de cobertura 1985 (A, C, D). Pavimento superior inexistente, 1985 (B).

Fonte: Imagens do arquivo Central do IPHAN

Quanto à pintura, no interior da Casa Grande as paredes eram caiadas de branco (Fig. 21-A), enquanto na parte externa a cor original da edificação era amarelo-creme (uso provavelmente de corante amarelo-creme), como retratam pinturas antigas da edificação (Fig. 21- B). Os portões, janelas, portas e guarnições tinham a cor verdeescuro. Quanto à senzala e engenho não foram mencionadas as cores. De acordo com o texto do pesquisador Nelson Aranha (20- -?), baseado em material de entrevistas com proprietários do patrimônio (herdeiros de Bernardino de Mello e Gavazzi) ocorridas em 1986 ou 1987: a Casa Grande, Construída sobre um promontório que dominava a região, tinha as paredes externas originalmente pintadas na cor amarelo-creme. Portões, janelas, portas e guarnições pintadas de verde-escuro. As paredes internas “caiadas de branco” (conforme inscrição datada de 1887, encontrada em uma das dependências do engenho em 1977). (ARANHA, [20--?], p.4)

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Figura 22: Parede interna da Casa Grande caiada de branco, 1993 (A) e Pintura da edificação (B).

Fonte: Imagens do arquivo Central do IPHAN (A) e (B) Ver link disponível em Referência de figuras.

4.1.2 Elementos e detalhes significativos Na fachada principal, destacam-se elementos como o guarda-corpo da escada do acesso principal constituído por ferro fundido, escada em pedra e cantarias nas ombreiras (Fig. 23-A). Nota-se adornos em estuque, adornos em cantaria, nas platibandas com ornatos estucados (Fig. 23- B e F) e beirais com telhas portuguesas esmaltadas em tons de branco cimalha e azul (Fig. 23-C). As portas eram simples e sem muita ornamentação, apresentavam bandeira feita com vidraçaria colorida em sua maioria (Fig. 23-D).

Figura 23: Escada em pedra, cantaria nas ombreiras do requadro e ferro fundido no guarda-corpo, 1956 (A). Fragmentos do beiral esmaltado da Casa Grande em exposição organizada pelo

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pesquisador Victor Antu (C). Beiral mostrando elemento decorativo (B, E e F). Porta com bandeira feita de vidraçaria colorida, 1965 (D).

Fonte: Imagens do arquivo Central do IPHAN (A, B, D e F) e TEIXEIRA, 2017 (C e E).

No trecho central da fachada principal, vergas se apresentam em arco pleno, juntamente com as ombreiras e soleira (na porta principal) e peitoril (das janelas) (Fig. 24 - A, B). As demais esquadrias da fachada e restante da edificação continham vergas retas constituídas por folhas duplas de Pinázios com vidros e bandeira fixa (Fig. 25 - E e F).

Figura 24: Fachada principal da Casa Grande, década de 40 do séc. XX.

Foto: Secretaria de Cultura e Superintendência do Patrimônio de Nova Iguaçu.

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Figura 25: Parte superior da fachada principal, 1977 (E) e Lateral da Casa Grande, 1977 (F).

Fonte: Imagens do arquivo Central do IPHAN. Figura 26:Fachada principal da Casa Grande, 1977 (H) e Detalhes da esquadria, 1977 (H).

Fonte: Imagens do arquivo Central do IPHAN.

No interior, nota-se adornos de pedra-sabão, forros estucados com a finalidade de atender plasticamente o uso de cada ambiente. Havia ambientes em que o forro era de madeira e simples, no entanto percebe-se o requinte no interior da capela (Fig. 27- A e B), salão nobre (Fig. 27-C e Fig. 28-A, B e C) e na sala de música (Fig. 30-D).

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Fotografias mostram também a presença de uma claraboia presente no último andar (Fig. 28- A e C).

Figura 27: Forros Capela e Sala de Jantar da década de 40 do séc. XX (A e B) e década de 50 (B).

Fonte: Secretaria de Cultura e Superintendência do Patrimônio de Nova Iguaçu.

Figura 28: Detalhe do Forro da sala de estar (A), Detalhe do forro deteriorado da Sala de estar (B), Detalhe do lustre da Sala Grande (C), Salão Nobre da Casa Grande e Sala de Música (D).

Fonte: Fotos de Lilian Jansen, 1977, imagens cedidas pela Secretaria e Superintendência de Cultura de Nova Iguaçu.

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Figura 29: Claraboia.

Fonte: Fotos de Lilian Jansen, 1965, imagens cedidas pela Secretaria e Superintendência de Cultura de Nova Iguaçu.

Nota-se elementos como a escada interna que dava acesso aos pavimentos superiores (30- A e B), o fogão à lenha (C) e a bomba hidráulica, restando hoje alguns indícios no local (D).

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Figura 30: Forro em madeira na parte inferior na escada interna (A), Detalhe da Balaustrada do corrimão da escada interna (B), forno a lenha (C), Bomba hidráulica no engenho (D).

Fonte: Fotos de Lilian Jansen, 1977, imagens cedidas pela Secretaria e Superintendência de Cultura de Nova Iguaçu.

Segundo informações encontradas em exposição na Casa da Cultura Tinguá, em vistoria realizada no conjunto arquitetônico por Marcus Monteiro, atual secretário de Cultura da Cidade de Nova Iguaçu, acompanhado do historiador Ney Alberto Gonçalves de Barros e do educador Paulo de Tarso Gonçalves de Barros, ao adentrar no recinto onde se encontrava o oratório da antiga capela, encontraram uma representação do “olho que tudo vê” (Fig. 31), símbolo da divindade máxima em diversas religiões e também na maçonaria. Na tradição maçônica o olho simboliza no plano físico o Sol visível, de onde emanam luz e vida, no plano intermediário ou astral, o verbo, logos, o princípio Criador; e no plano espiritual, o Grande Arquiteto do Universo.

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Figura 31: Detalhe do altar da Capela com a imagem de São Bernardino (à esquerda) e detalhe do altar (à direita) com representação do “Olho que tudo vê”, encontrado em escavação realizada e em exposição na Estação da Cultura Tinguá.

Fonte: Autora, 2023.

4.2 Procedimentos metodológicos

Como parte da pesquisa histórica, buscou-se documentação referente à autoria do projeto, bem como levantamentos que pudessem existir nos arquivos e acervos disponíveis para consultas. Foi realizada uma consulta à Secretaria da Cultura de Nova Iguaçu, com o objetivo de obter informações suficientes para compor a referente pesquisa. Obteve-se tanto materiais fotográficos e textuais referentes a história da Fazenda São Bernardino, quanto levantamentos realizados pela FUNDREM no ano de 1984.

A pesquisa deu-se em duas etapas: levantamento planialtimétrico e fotográfico.

Com relação à planialtimetria, foram concedidos arquivos em DWG realizados por Natália Maldonado em sua tese de mestrado no ano de 2017. A partir desses 52

documentos foi realizada uma revisão in loco com auxílio de trena para averiguar as medidas e as possíveis deteriorizações sofridas desde então.

Quanto ao levantamento fotográfico, os registros se concentraram tanto em elementos gerais (volumetria, fachadas, interior e ambiência) quanto em elementos específicos (ornamentos, detalhes estilísticos e características construtivas). O primeiro registro se deu na fachada principal, tirada em posição central. As fachadas lateriais e posterior não puderam ser registradas em sua totalidade e nem de maneira centralizada devido a inclinação do terreno.

As fotografias foram transferidas para o software Adobe Photoshop, onde utilizou-se o comando Crop com a opção Straigthen e Edit Transform para o alinhamento horizontal e vertical a fim de retirar as distorções. Esse procedimento foi realizado apenas na fachada principal.

Por fim, com base nos materiais gerados nas etapas anteriores, foi possível elaborar a análise das condições atuais da Fazenda São Bernardino, utilizando-se da metodologia empregada na disciplina IT819 – Projeto de Conservação e Restauração do Patrimônio Edificado, da UFRRJ, onde foram abordados os tópicos: •

Características arquitetônicas remanescentes (aspectos estilísticos; aspectos

construtivos e ambiência) •

Mapeamento de danos (deteriorações; perdas; descaracterizações)

•

Diagnóstico (estado de conservação; grau de caracterização)

•

Recomendações para conservação e restauro e proposta de proteção da Casa

Grande, Engenho e Senzala.

4.3 Mapeamento de danos

O mapeamento de danos (Anexo 3) foi elaborado a partir de um levantamento físico cedido por Natália Maldonado, realizado em 2017 para sua defesa de mestrado sobre a Fazenda São Bernardino. A partir desse documento foi realizada uma atualização utilizando, no entanto, uma metodologia diferente. Fazendo uso de registros fotográficos in loco e por visitas de inspeções, pôde identificar alguns danos.

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A identificação e sistematização do mapeamento de danos foi essencial para elaborarse o diagnóstico do estado de conservação e o grau de caracterização do estudo de caso. Esse diagnóstico fundamenta a elaboração do projeto de conservação (Anexo 2) e o projeto de intervenção (Anexo 4).

4.3.1 Deteriorações A análise do estado atual da edificação permitiu identificar deteriorações cuja causa principal advém da umidade. As causas dos danos têm sua origem principalmente na umidade que, com a exposição do topo das paredes à chuva, ocasiona o surgimento de manchas negras nos tijolos, contribui para o desgaste do revestimento e crescimento de vegetação. A umidade ascendente e descendentes causam danos ao revestimento, à alvenaria e etc. Como principais danos foi identificado

descolamento

de

revestimento/tijolo

aparente,

degradação

do

revestimento, argamassa diferenciada, biodegradação por vegetação, fissuras, rachaduras, madeira degastada, acréscimos, cantaria deteriorada, manchas negras/sujidade, biodegradação por insetos/xilófagos, remanescentes de telhas deterioradas e pichação.

Após anos de abandono e ausência de ações de preservação no conjunto, somado ao agravante incêndio ocorrido na Casa Grande em 1980, muito se perdeu.

A partir de plantas das edificações originais referentes à Fazenda acessadas nos arquivos da Superintendência do IPHAN, foi elaborada uma planta baixa (Fig. 32) indicando o existente (em Preto), hoje em ruínas, e as partes inexistentes (em amarelo), que compunham a edificação original, a fim de propor um comparativo relativo à descaracterização que ocorreu no bem desde então. Pôde-se também, através das plantas originais da fachada e cortes das edificações, comparar as fachadas das edificações Casa Grande, Engenho e Senzala (Fig. 33), no ano de 1984, levantamento concedido pela SEMCULT/NI, e na atual situação de ruínas, após levantamento físico realizado in loco.

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Figura 32: Comparativo da planta original do IPHAN x Planta atual das ruínas, 2023.

Fonte: Editado pela autora a partir de mapa produzido por Nathalia Maldonado em 2017.

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Figura 33: Casa grande

Fonte: Arquivo Central do IPHAN.

Figura 34: Engenho e Senzala

Fonte: Arquivo Central do IPHAN.

56

Figura 35: Fachada frontal e posterior, respectivamente, da Casa Grande em1984, anterior ao incêndio

Fonte: Levantamento cedido pela Secretaria da Cultura e Superintendência do Patrimônio, 2023.

Figura 36: Fachada posterior da Casa Grande em 1984 anterior ao incêndio.

Fonte: Levantamento cedido pela Secretaria da Cultura e Superintendência do Patrimônio, 2023.

57

Figura 37: Fachada frontal Casa Grande atualmente (A) e (B) 1977.

A

B

Fonte: Autora, 2023 e Iphan, 2017.

58

3.6.1.1 Fundação e sistema construtivo A fundação em baldrame de pedra é exposta em alguns trechos de fachadas (Fig. 39-B).

Figura 38: Parede mostrando a disposição dos tijolos (A) e Embasamento em cantaria (B).

Fonte: Autora, 2023.

3.6.1.2 Alvenaria Devido à ausência de cobertura, as alvenarias da Casa Grande, Senzala e Engenho

apresentam

sujidades,

infiltrações,

vegetação,

descolamento

ou

degradação do revestimento e desplacamento de tijolos.

Os sais cristalizados como sulfatos, carbonatos de sódio, de potássio etc., solúveis em água, provenientes da própria argila usada na confecção dos tijolos ou da composição da argamassa no assentamento e rejuntamento, como a cal e do próprio solo - desenvolvem manchas e contribuem para a desagregação dos tijolos. A argila expande e torna-se plástica, sofrendo assim erosão (OLIVEIRA, 2011).

59

Figura 39- Fachada evidenciando descolamento de revestimentos e desplacamento de tijolos.

Fonte: Autora, 2023.

Fonte: A autora, 2023.

Figura 40: Ação da umidade ascendente e descendente.

Fonte: A autora, 2023.

As alvenarias dos pavimentos superiores, presentes originalmente na Casa Grande, hoje são inexistentes. Através da fachada frontal e trechos de alvenaria 60

interna exibem os vãos de portas e janelas do segundo pavimento da edificação, atualmente inexistentes (Fig. 41- F e G).

Parte das alvenarias do Engenho ainda resistem (Fig. 41-H), enquanto as da Senzala, em sua maior parte, já não existem mais, restando apenas trechos da fachada posterior e duas estruturas em alvenaria podem ser observadas no sítio (Fig. 41-I).

Figura 41: Parte interna da fachada principal da Casa Grande e remanescentes do Engenho e Senzala.

Fonte: A autora, 2023.

3.6.1.4 Revestimentos e ornatos As paredes apresentam grande parte de seu revestimento ausente com exposição dos tijolos e muita pixação, principalmente na fachada principal (Fig. 43).

Os ornatos em argamassa que decoram as fachadas frontal e lateral apresentam desplacamento (Fig. 42 A e B), manchas e presença de agentes biológicos (Fig. 42).

61

Figura 42: Ornatos em estado precário na fachada frontal com cacos de telha e vegetação (A) e Casa de Vespas no ornato da fachada lateral (B).

Fonte: Autora, 2023.

Figura 43: Fachada principal com bastante grafismo e desgaste do revestimento.

Fonte: Autora, 2023.

Alguns trechos de topos de alvenarias ainda possuem remanescentes das telhas dos beirais da edificação da Casa Grande, onde se encontram apenas alguns cacos das telhas portuguesas esmaltadas em tons de branco e azul. Em um trecho de alvenaria interna, as telhas do beiral aparentam condição menos precária que nas demais do conjunto (Fig. 44).

62

Figura 44: Fachada onde as telhas se encontram em estado mais conservado.

Fonte: Autora, 2023.

3.6.1.5 Escadarias A casa Grande apresentava na entrada escadaria dupla na fachada frontal que originalmente marcava o acesso principal da edificação e que hoje está em condições precárias, já sem os degraus e com trechos de cantaria solta exposta com vegetação (Fig. 49-A). A Casa Grande apresenta também duas escadas nas saídas laterais de menor dimensão que apresentam desgastes e vegetação (Fig. 45-B e C).

Quanto ao Engenho, apresenta pavimento térreo um pouco elevado com relação ao nível do terreno, sendo identificadas três escadarias externas para o acesso à edificação e outras para vencer desníveis em seu interior, todas apresentando desgastes e vegetação (Fig. 45-D). A escada de maior dimensão encontra-se junto ao muro de contenção em cantaria e dá acesso ao nível superior do sítio (onde se localiza-se a Casa Grande), está em situação precária, com degraus apresentando desgaste, musgo e vegetação (Fig. 46- E e F).

63

Figura 45: Escadaria da Casa Grande (A, B,C) e do Engenho (D).

Fonte: Autora, 2023 Figura 46: Escada do muro de contenção.

Fonte: Autora, 2023

3.6.1.6 Esquadrias As esquadrias são totalmente inexistentes. Na fachada frontal, há a presença de guarnições em pedra pertencentes às esquadrias da faixa central com desgaste e 64

pichações (Fig. 47). No restante da edificação, notam-se apenas as guarnições em madeira de portas e janelas em estado degradado. O madeiramento se apresenta ressecado, desgastado, com deformações, lacunas e marcas por ataques biológicos (insetos xilófagos, bactérias, fungos etc.) e em alguns vãos são inexistentes.

Figura 47: Fachada Frontal (Vista externa e interna respectivamente).

Fonte: Autora, 2023.

Figura 48: Desgaste do madeiramento (A, B, C e F), presença de casa de insetos (D e E).

Fonte: Autora, 2023

65

Figura 49: Partes faltantes ou ausência de madeiramento.

Fonte: Autora, 2023

No engenho, nota-se apenas a presença de alguns trechos de madeiramento na parte inferior dos vãos. Já na senzala, os vãos e as esquadrias são inexistentes por praticamente não apresentarem mais paredes.

Figura 50: Engenho, Fachada frontal externa (A), Interior (B e C).

Fonte: Autora, 2023

66

Figura 51: Senzala

Fonte: Autora, 2023.

3.6.1.7 Pisos Os pisos originais são inexistentes em toda edificação, tanto internamente quanto externamente. Atualmente o piso de todo conjunto é de terra batida com vegetação.

Figura 52: Interior da Casa Grande.

Fonte: Autora, 2023.

67

Figura 53: Piso Senzala e Engenho.

Fonte: Autora, 2023.

A partir de toda análise apresentada sobre as deteorizações, foi realizada uma tabela de diagnóstico (Tabela 2) com as causas e agentes de deterioração, a natureza da patologia (Física/mecânica, Química ou Biológica).

Tabela 2- As causas e agentes de deterioração das fachadas, bem com a natureza da patologia.

Danos

Causas

Agentes

Natureza

ARGAMASSA DREGRADADA

Umidade natural ou umidade ascendente/Sais solúveis

Água

Patologia Química

CANTARIA DETERIORADA

Umidade descendente e do solo/Sais solúveis (Argila expande, tona-se plástica e sofre erosão)

Umidade, Vibrações

Patologia Química e Física/ Mecânica

68

DESCOLAMENTO/ REVESTIMENTO

Exposição excessiva ao sol, à umidade e ventos fortes

Clima, ação do sol e retração noturna, Vibrações

Patologia Física/ Mecânica

RESSECAMENTO MADEIRA

Umidade e biodegradação

Água ou insetos

Patologia Física/ Mecânica

RACHADURAS/TRINCAS

Expansão, dilatação térmica

Umidade ou Vibrações

Patologia Física/ Mecânica

PICHAÇÃO

Vandalismo

Ser humano

Patologia Física/ Mecânica

REMANESCENTES: TELHAS

Umidade, Ação eólica

Intempéries, Água

Patologia Física/ Mecânica

LACUNAS: TIJOLOS

Umidade natural ou umidade ascendente/Sais solúveis

Água

Patologia Física/ Mecânica

MANCHAS NEGRAS/ SUJIDADE

Umidade natural ou umidade ascendente/Sais solúveis

Umidade, Sais solúveis, Poluição atmosférica, Fungos

Patologia Química

BIODEGRADAÇÃO/VEGETAÇÃO

Umidade

Raízes

Patologia Física/ Mecânica

PULVERULÊNCIA PINTURA

Falta de luz e ventilação, sais solúveis

Água

Patologia Química

Fonte: Autora, 2023.

4.3.2. Descaracterizações Observa-se no conjunto algumas intervenções realizadas posteriormente ao incêndio. Nas paredes laterais internas direita e esquerda, nota-se a presença de fechamentos de vãos com preenchimentos de tijolos de adobe (figura 54). Na fachada sudeste também é possível observar o preenchimento de tijolos (figura 55).

69

Figura 54: Estrutura autoportante da Casa Grande com alvenaria em diferentes padrões e vãos fechados para evitar desabamentos.

Fonte: A autora, 2023.

Figura 55- Acréscimentos com tijolos de adobe preenchendo vãos

Fonte: A autora, 2023.

Observa-se também a presença de vigas de concreto que servem para sustentar a parede posterior que está atualmente desconectada do conjunto estando sujeita a desabamento.

70

Figura 56: Presença de vigas.

Fonte: Autora, 2023.

4.3.3 Diagnóstico do estado de conservação e grau de caracterização

Tomando como base o material de apoio para elaboração de projeto de conservação, da disciplina IT819, além dos levantamentos obtidos no mapeamento de danos, foi possível elaborar o diagnóstico do estado de conservação e grau de caracterização do estudo de caso.

3.5.1.1 Estado de conservação O diagnóstico do estado de conservação foi elaborado tendo como parâmetros os seguintes índices: • Muito Bom (MB) – Edificação recém preservada e/ ou restaurada; • Bom (B) – Edificação sem interferências de fatores de deterioração; • Regular (RE) – Presença moderada de fatores de deterioração; • Ruim (RU)- Presença significativa de fatores de deterioração sem comprometimento da estabilidade do esquema estrutural da edificação; 71

• Muito ruim (MR)- Edificação com risco de desabamento; • Péssimo (P) – Edificação com risco eminente de desabamento; Com base nos levantamentos e análises anteriores, levando em consideração que não feita nenhuma avaliação estrutural, mas apenas uma análise in loco da condição das ruínas, conclui-se que o estado de conservação da edificação, como um todo, pode ser considerado como ruim em razão da presença significativa de ações e fatores de deterioração com desintegrações totais de elementos arquitetônicos, em função dos danos identificados, sobretudo, nas fachadas e áreas internas.

Quadro 1- Estado de conservação dos elementos arquitetônicos Item

Material

Estado de conservação

Observações

Piso Teto

Forro de madeira

Inexistente

-

Paredes

Tijolos cerâmicos com disposição 1 vez e meia

Ruim

Técnica Argamassa areia e cal e pintura mineral Madeira Madeira Não há -

Inexistente Inexistente Inexistente Inexistente

Madeira e telhas portuguesas

Inexistente

Elementos decorativos

Estuques em pedra e cal

Precário

Sistema construtivo

Alvenaria e pedra

Fundações

Embasamento em pedra

Esquadrias Instalações

Acabamento Portas Janelas Elétrica Hidráulica

Cobertura

Acréscimos de tijolos de adobe para fechamentos de vãos de janelas e portas -

Muito Ruim

-

Ruim

-

Fonte: Autora, 2023.

3.5.1.2 Grau de caracterização Ainda de acordo com a metodologia da disciplina IT819, para elaboração do grau de caracterização do estudo de caso, foram utilizados os seguintes parâmetros quanto ao estado atual: •

Caracterizada (CR) – Quando as características estiverem mantidas; 72

•

Descaracterizada recuperável (DR) – Quando a recuperação dos elementos arquitetônicos alterados e/ou deteriorados for possível a partir de informações obtidas na própria edificação;

•

Descaracterizada irrecuperável (DI) - Quando a recuperação dos elementos arquitetônicos alterados e/ou deteriorados não for possível a partir de dados obtidos na própria edificação;

•

Ruínas (RN) - em ruínas; Com base no exame das condições atuais, conclui-se que o grau de

caracterização da edificação é em ruínas. Devido ao tempo e negligência não se pode mais identificar elementos arquitetônicos como cobertura, esquadrias e pisos.

Verificou-se que todas as fachadas foram descaracterizadas, sendo as mais afetadas as externas, principalmente a frontal (Noroeste).

Quadro 2- Grau de caracterização dos elementos arquitetônicos Elemento arquitetônico

CR

DR

DI

Fachadas

x

Teto

Cobertura

-

-

-

-

-

-

-

-

Elementos decorativos

x

Sistema construtivo

x

Fundações

x

Pisos

RN

-

-

-

-

Fonte: Autora, 2023.

73

4.4 Legislação Através do pedido formulado em 15 de Janeiro de 1940 pelo então prefeito de Nova Iguaçu, Ricardo Xavier da Silveira, ao SPHAN (Atual IPHAN), a Fazenda São Bernardino foi tombada. O pedido foi aceito somente em 1951, sendo então deliberado pelo Conselho Consultivo do IPHAN o tombamento por considerar o conjunto “bem particular de elevado valor artístico” (Ver Anexo A). Posto isto, torna-se legítimo o Decreto-lei nº 25 de 30 de novembro de 1937, inscrito no Livro das Belas Artes no dia 26 de fevereiro de 1951, sob o número 390, folha 76, processo 432- T- 50.

No que tange o Capítulo III do Decreto n° 25, artigo 17, diz: As coisas tombadas não poderão, em caso nenhum, ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ser reparadas, pintadas ou restauradas, sob pena de multa de cinquenta por cento do dano causado”.

(Dos efeitos do tombamento Decreto-lei n° 25 de 30 de novembro de 1937, que no Capítulo III, Artigo 17).

Consta no mesmo Decreto-lei nº 25 de 30 de novembro de 1937, registrado no Capítulo III, Artigo 18, dito: Sem a prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que lhe impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto, impondo-se neste caso multa de cinquenta por cento do valor do mesmo objeto. (Dos efeitos do tombamento- Decreto-lei n° 25 de 30 de novembro de 1937, que no Capítulo III)

No ano de 1975, o Decreto n° 1459 dava provisoriamente a desapropriação da Fazenda São Bernardino com finalidade de preservação e criação de um Parque de Múltiplo uso, contudo não houve execução do projeto. Atualmente, depois de anos de silêncio por parte do poder público, foi criado pelo Decreto Municipal n° 12.789, de 22 de Junho de 2022, o Parque Histórico e Arqueológico de Iguassú Velha abrange toda área tombada pelo Governo do Estado/ INEPAC (Proc. E-03/ 02.453/78, de 8 de Abril de 1983), além de estar incluída na área de Proteção Ambiental do Alto Iguassú (Decreto Estadual n° 44.032, de 15 de Janeiro de 2013).

74

Contudo, percebe-se na prática a ineficiência do tombamento no que envolve a proteção e salvaguarda do patrimônio no Brasil. A Fazenda São Bernardino é um exemplo claro desse crime quanto ao patrimônio brasileiro. Segundo o decreto Lei n° 25, o Patrimônio Histórico e Artístico Nacional é definido por “bens móveis e imóveis existentes no país em que a preservação seja de interesse público, devido a fatos memoráveis da história do Brasil, excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico”. A construção desse conjunto de bens é uma prática dos Estados modernos, visando sua proteção e transmissão através das gerações.

Contudo, o que percebe-se na prática se resume nas seguintes palavras: [...] instrumentos legais, como o tombamento, não são suficientes para assegurar que um bem venha a cumprir efetivamente sua função de patrimônio cultural em uma sociedade. É necessária uma constante atualização das políticas específicas, tanto mais se tais políticas desenvolvem-se num contexto democrático. (FONSECA, 2003, p.69, apud PAIVA, 2018)..

4.5 Área de intervenção

4.5.1 Localização O terreno se encontra em uma elevação de 5,60 metros às margens da R111Estr. Federal de Tinguá, 2023, no bairro Barão de Guandu, na cidade de Nova Iguaçu – RJ. Distante do Centro de Nova Iguaçu, o conjunto se localiza em uma periferia de difícil acesso e ausência de equipamentos públicos.

75

Figura 57: Mapa de Nova Iguaçu indicando alguns equipamentos públicos e bairro de Barão de Gandu.

Fonte: Autora,2023.

76

Figura 58- Mapa de terreno

Fonte: Fonte: Diagrama produzido pela autora a partir de imagem do Google Maps, 2022.

4.5.2 O entorno Nas periferias intermediárias e distantes do centro de Nova Iguaçu, pertencente a um grupo específico e muito relevante para o cenário cultural da cidade, composto por edificações do séc. XIX, destaca-se a Fazenda São Bernardino. A prefeitura de Nova Iguaçu vem desenvolvendo intervenções nas edificações que, por muito tempo 77

se encontravam abandonadas, arruinadas e à mercê de intemperes, segundo avaliações de alunos da UFRRJ. A antiga Vila de Iguaçu era um conjunto urbano situado nas proximidades da fazenda, onde pode-se constatar atualmente parte da Matriz de Nossa Senhora da Piedade e vestígios de alicerces de antigas edificações. É notável que o principal monumento arquitetônico da região é a Fazenda São Bernardino, com inspirações neoclássicas, situada em um importante complexo agrícola da segunda metade do século XIX. Outra construção de destaque na região, o Reservatório de Rio d’Ouro, de 1879, situado em um sítio natural, apresentava importantes valores paisagísticos, como lagos, palmeiras, calçamento de pedras, gradis em ferro forjado, apresentando inclinação estilística neoclássica (SAMPAIO, 2022).

Figura 59: Reservatório Rio D’ouro.

Fonte: Mapa da cultura

Em cada fase histórica observada é possível avaliar edificações arquitetônicas, de maneira que cada edificação expressa padrões arquitetônicos prevalescentes na fase histórica em que se encontra. Percebe-se que o acervo arquitetônico da baixada 78

fluminense em toda fase imperial (ao longo do século XIX), apresentou o padrão imperial, absolvendo o padrão imposto pela Cidade do Rio de Janeiro, sendo ela Capital a partir de 1973. Assim, quando se observa os padrões arquitetônicos e construtivos em Nova Iguaçu, percebe-se que existe uma transição da dimensão rural para a urbana, uma vez que esses padrões revelam a austeridade do imaginário da periferia. É importante perceber que, a partir do século XIX, foram tomadas decisões na intenção de desgarrar-se do passado escravocrata, alinhando a novos padrões de vida que já estavam sendo seguidos, como na Capital Rio de Janeiro. Com as mudanças ao longo do tempo, se enquadra dentro de um conjunto arquitetônico rico em idiossincrasias, principalmente por investir em conceitos e ações de simplificações, estilizações e detalhes construtivos já executados em outros centros urbanos do país, dito por Carlos Lemos (1985), no caso de São Paulo (SAMPAIO, 2022). É notável que ao longo dos anos os monumentos arquitetônicos na região, foram afetadas por diferentes fatores que causaram deteriorações que tornaram de risco sua estabilidade. As igrejas (Capela Nossa Senhora de Guadalupe) e estações ferroviárias (Estação Ferroviária Rio D’Ouro), situadas nas proximidades da cidade, sofreram deterioração, muito por conta de abandono. Segundo levantamento da UFRRJ, das 64 edificações que foram visitadas, 63 já se encontram sob cuidados e protegidas. Um número alto de edificações ainda precisa de proteção, no entanto, essas possuem maior dificuldade devido ao grau de deterioração desse momento.

Existem muitas ferramentas de proteção que precisam ser aplicadas no município, fato que traria crescimento nas cidades da baixada fluminense e que já possuem a prorrogativa de legislação de proteção do patrimônio cultural (SAMPAIO, 2022).

A região apresenta uma ocupação de baixa densidade, com baixo crescimento populacional. Na sua maior parte o entorno é composto por residências do tipo unifamiliar, prosseguindo, como segunda maior ocupação, o uso recreacional, devido a presença de muitos sítios destinados ao lazer. Segundo análise de própria autoria, somam-se mais de 50 sítios diferentes na região. Em temporadas de verão, muitos turistas são atraídos, o que causa grandes congestionamentos na Estrada Federal de Tinguá.

79

Não apresenta um comércio expressivo que atenda às necessidades dos moradores comparado aos serviços gerais presentes na região central de Nova Iguaçu. Com efeito, o deslocamento ao centro do Município é obrigatório. Como as atividades presentes não são suficientes para empregar e fixar a população ativa, a maioria necessita realizar grandes deslocamentos para trabalhar em áreas centrais como no centro do Município e do Rio de Janeiro, voltando para sua residência somente para descansar.

Figura 60: Mapa de uso de solo.

Fonte: Mapa produzido por autora, 2023.

No que diz respeito ao gabarito, tem-se que as construções possuem, em sua grande maioria, 1 ou 2 pavimentos. Não há nenhuma construção que interfira na visibilidade das ruínas.

80

Figura 61: Mapa de Gabarito

Fonte: Mapa produzido por autora, 2023.

Ao analisar o mapa de cheios e vazios, nota-se que a região não é densa, possuindo áreas vazias no lote e grandes áreas verdes, devido à proximidade com parques naturais e reservas biológicas protegidas por órgãos responsáveis.

81

Figura 62: Mapa de adensamento.

Fonte: Mapa produzido por autora, 2023.

4.5.3 Aspectos gerais Ao analisar o entorno da Fazenda São Bernardino, percebe-se a carência de equipamentos que dinamizam a região, desde serviços gerais, segurança, infraestrutura a áreas culturais. A distribuição espacial do Município reflete uma segregação espacial expressiva, de modo que a centralidade seja concentrada em torno de equipamentos viários. A linha férrea, por exemplo, segrega a população: de um lado as que carecem de serviços públicos e infraestrutura e de outro uma população com maior poder aquisitivo e maior acesso aos serviços gerais.

82

Figura 63- Mapa manchas de desenvolvimento.

Fonte: Mapa produzido pela autora a partir de mapa do Google Earth, 2023.

Figura 64: Mapa de equipamentos.

Fonte: Mapa produzido pela autora a partir de mapa do Google Earth, 2023.

83

De acordo com o último Censo do IBGE, para o ano de 2022, a população de Nova Iguaçu estimava-se em 785.867 habitantes dos quais o maior número é de mulheres. A população em maioria é caracterizada como classe média baixa, principalmente em regiões distantes do centro.

Figura 65: Dados referentes ao número de homens e mulheres.

Fonte: IBGE, 2022.

Conforme informações disponibilizadas pelo IBGE para o ano 2016, dentre as atividades econômicas que compreendem o PIB da Cidade de Nova Iguaçu, destacam-se: agropecuária, indústria, serviços, administração, defesa, educação, saúde e seguridade social. Na (Fig. 66) está apresentada a porcentagem de contribuição de cada atividade econômica. Percebe-se que as atividades rurais são inexpressivas em relação aos outros tipos de serviços.

Figura 66: Atividades Econômicas de Nova Iguaçu.

Fonte: IBGE (2019)

84

No bairro de Iguaçu Velho, ainda que inexpressivo há a presença de um tímido comércio local e atividades agrícolas são realizadas pelos próprios moradores que fornecem os produtos para vendedores locais. Dentre as atividades rurais, destacase o cultivo de aipim, goiaba, banana e entre outros.

Figura 67: Atividades de agricultura e comércio local na região.

Fonte: Expedição Rio, 2023.

Quanto ao acesso à cultura, boa parte dos espaços encontram-se no centro de Nova Iguaçu, dentre os quais é possível citar a Casa da Cultura de Nova Iguaçu (Fig. 68- A), o SESC, o Centro de Artes Ville Arte e Produções. Na região a aproxidamente distante de 9km do objeto de intervenção, destaca-se no centro de Tinguá, a Onda Verde (Fig. 68-B) - uma ONG sem fins lucrativos que contribui e dissemina informações sobre o meio ambiente e sustentabilidade- a Casa de Cultura em Tinguá (Fig. 68- C e D) recentemente inaugurada pela Prefeitura de Nova Iguaçu e o patrimônio imaterial, Festival Gastronômico de Tinguá, denominado “Festa do Aipim”, evento anual no qual estimula a cultura, o micro empreendimento alimentício e a agricultura local.

85

Figura 68: Casa da Cultura de Nova Iguaçu (A), Onda verde (B), Inauguração da Casa da Cultura Tinguá (C e D).

Fonte: Ver referência de figuras Figura 69: Festa do aipim em Tinguá (A). Festival Gastronômico dos produtores de Tinguá (B).

Fonte: Ver referências de Figuras

4.5.4 Aspectos ambientais e bioclimáticos O entorno é composto por elevações de altura máxima de 50 m. Possui em grande parte cobertura de vegetação densa e alguns pontos das elevações possuem ausência de vegetação. Os dois maciços rochosos mais próximos estão situados nas porções norte, assim como também no sul do município de Nova Iguaçu: o maciço de Tinguá e o maciço do Gericinó-Mendanha, respectivamente. Considerando que o 86

município de Nova Iguaçu corresponde a 30 % de área urbana e 40 % destinados às áreas vegetais, tal como a Reserva Biológica do Tinguá que abriga espécies de fauna e flora de Mata Atlântica extintas no Brasil Quanto à hidrografia, há um afluente do Rio Botas que passa pela região que se encontra atualmente assoreado. O rio nasce na encosta do Maciço de Gericinó, onde a Serra de Madureira fica localizada, na cidade de Nova Iguaçu, passando pelo bairro de Comendador Soares, mais conhecido como Morro Agudo, até desaguar no Rio Iguaçu localizado no bairro de São Vicente em Belford Roxo.

Figura 70: Mapa de análise ambiental.

Fonte: Mapa produzido por autora, 2023.

87

Figura 71: Mapa de condicionantes climáticos.

Fonte: Mapa produzido por autora, 2023.

Quanto às condições climáticas, o clima é caracterizado como tropical, em que o inverno exige muito menos pluviosidade que no verão. Os ventos predominantes têm origem no Sudeste. Quanto à temperatura média, mede-se 23.4 °C e a pluviosidade é de 1.408 mm. Apesar da presença de vegetação densa, a área de estudo recebe incidência solar em todo o dia.

4.5.5 Sistema Viário Nova Iguaçu possui uma grande malha viária e é cortada por importantes estradas e rodovias. Os principais acessos rodoviários do município se dão pela Rodovia Presidente Dutra, Antiga Estrada Rio-São Paulo, Estrada de Madureira, Estrada Zumbi dos Palmares, Estrada de Adrianópolis, Via Light e Arco Metropolitano.

Há também a linha férrea ramal Japeri, que liga Japeri até a Central do Brasil, e é um importante meio de transporte no município. A principal rodovia que dá acesso ao objeto de estudo é a Estrada Federal de Tinguá. As vias que passam próximo à área de intervenção é a BR493 (arco metropolitano) e RJ113 (R. Muniz Barreto).

88

Figura 72: Rodovias que cortam a cidade de Nova Iguaçu.

Fonte: Fonte: Mapa produzido pela autora, 2023.

A região no geral não apresenta um alto tráfego de veículos, exceto em períodos específicos ao longo do ano. A Estrada Federal de Tinguá (R-111), identificada como via expressa e caracterizada pelo Plano Diretor como eixo estrutural, recebe um grande fluxo de veículos especialmente em época de verão, devido à presença expressiva de sítios na região, e do Festival Gastronômico do Aipim. As vias locais são as que dão acesso aos bairros pertencentes à região. É possível observar a falta de pavimentação em todas as vias locais, excluindo a somente a R-111 que possui pavimentação asfáltica. Contudo, em alguns trechos, a Estrada Federal de Tinguá apresenta mau estado de conservação do seu leito carroçável, que costumava receber manutenção somente em períodos próximos ao Festival Gastronômico do Aipim. Há também a inexistência de passeios e ciclovias, resultando na falta de segurança e acessibilidade para os pedestres.

As vias em sua maioria apresentam um fluxo nos dois sentidos, no entanto, a maioria não possui a largura adequada do leito carroçável para a passagem dos carros. No que diz respeito aos conflitos viários, a rodovia R111 no geral apresenta um alto nível de risco devido à falta de sinalização principalmente. Nos trechos sinalizados nota-se um agravante por ser áreas de curva e sinalização precária.

89

Figura 73- Sistema Viário

Fonte: Fonte: Mapa produzido pela autora, 2023.

4.5.6 Levantamento topográfico O terreno apresenta um talude de 5,60 m onde a Casa Grande se encontra no nível mais elevado, enquanto a senzala e engenho ficam no nível mais baixo. Esse tipo de implantação reflete uma característica das Casas de senhor de engelho. A casa grande na elevação do terreno permitia que o proprietário pudesse manter o controle das atividades ao redor. O terreno possui uma inclinação, onde a parte frontal é menos elevada enquanto a parte posterior é mais elevada.

90

Figura 74: Topografia do terreno (A e B).

A

B

Fonte: Fonte: Mapa produzido pela autora, 2023.

4.6 Aspectos legais/ normativas De acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo do município de Nova Iguaçu, instituída pela Lei Municipal nº 4.567, de 23 de dezembro de 2015, a área urbana do município é subdividida em áreas de comércio, áreas residenciais, áreas especiais e áreas estratégicas. De acordo com o mapa disponibilizado pela Prefeitura de Nova Iguaçu (2009), a área de intervenção está situada na Área de Interesse Especial 2 (AE - 2) e situada entre as URGS de Vila de Cava e Tinguá, e na Zona Rural São 91

Bernardino, conforme podemos ver nos mapas abaixo. Na macrozona de Uso Sustentável: estão nela incluídas as áreas definidas como zona rural do município e as Áreas de Proteção Ambiental – APAs. Figura 75: Zonas rurais do município de Nova Iguaçu.

Fonte: Prefeitura de Nova Iguaçu (2009)

Figura 76: Mapa de uso do solo e Unidades de Conservação do Município de Nova Iguaçu.

Fonte: Prefeitura de Nova Iguaçu (2009). Mapa editada pela autora.

92

Em relação às diretrizes de recuo, afastamentos, gabarito, taxa de ocupação, por se tratar de uma Área Especial de Interesse Paisagístico ou Histórico-cultural (AE2), não existe dentro da legislação vigente, índices compatíveis com a área onde situase a Fazenda São Bernardino. O Plano Diretor rege no Capítulo V, Artigo 30, que levando em consideração as peculiaridades, o Controle Urbanístico deve ser definido pelo Chefe do Poder Executivo Municipal, através de decreto.

Figura 77: Informações sobre os índices urbanísticos do Município de Nova Iguaçu. 2015.

Fonte: Paiva, 2018.

Em relação ao programa, sob cumprimento do Plano Diretor voltado para edificação com fins de atividades culturais e educativas, na AE-2, tem sua construção aceitável. Ainda de acordo com o plano diretor e leis de uso e ocupação do solo, o número de vagas de estacionamento necessárias será conforme tabela (Fig. 78).

Entretanto, existe ausência de informação por conta da atualização da Lei em 2015.

Figura 78: Edição da autora sobre tabela de especificação de uso e ocupação do solo do Município de Nova Iguaçu. Novo decreto de 2015.

Fonte: Paiva, 2018.

93

5 REFERÊNCIAS PROJETUAIS 5.1 O Castelo da Torre de Garcia D’Avila

O Castelo da Torre de Garcia D' Avila, localizado no Brasil, em Praia do Forte, litoral norte da Bahia, é o único castelo em estilo feudal existente nas Américas.

Juntamente com o Forte Garcia D' Ávila são importantes marcos testemunhos da tradição e história brasileiras. Construído em 1551, é considerado a primeira grande edificação portuguesa no Brasil, sendo um dos mais importantes monumentos do patrimônio cultural brasileiro e sede do maior latifúndio do mundo, constituído de 129 fazendas, com uma área de 800 mil km², representando desse modo 1/10 do território brasileiro.

Segundo o site Bahia Notícias20, a área onde existe o castelo foi vendida em 1970 para o empresário paulista Wilhelm Peters, que decidiu dar um sentido mais amplo para as ruínas da Casa da Torre, conhecida como Castelo Garcia D’ávila. Em 1938, a casa já havia sido tombada pelo IPHAN, mas foi Wilhelm que decidiu dar acesso para que o público conhecesse parte da história do país, já que esse patrimônio participou nas lutas de defesa da terra contra piratas e invasores estrangeiros, da história da ocupação e da colonização do Nordeste, por mais de três séculos, como também foram importantes pontos de apoio nas lutas pela Independência do Brasil.

Figura 79: Setorização esquemática da Torre.

Fonte: Editada pela Autora, 2023.

20

Disponível em: https://www.bahianoticias.com.br/bnhall/travelling/113-o-bahia-historiacultura-tecnologia-e-o-renascimento-do-castelo-garcia-davila.

94

Em 1996, sob direção do arquiteto Ubirajara Avelino de Mello, foi desenvolvido um projeto de revitalização apresentado no IX Curso de Especialização em Conservação e Restauração de Monumentos e Sítios Históricos (CECRE) Universidade Federal da Bahia, em parceria com a arquiteta Mariely Santana (BAETA e NERY, 2017). Foram feitos trabalhos de escavação para a identificação de achados arqueológicos importantes e instalação das primeiras passarelas metálicas para acesso ao andar superior da casa, destruída por um incêndio provocado por escravos.

Dentre os aspectos interessantes nesse projeto, é importante ressaltar que o arquiteto e toda equipe envolvida no processo de intervenção, se preocuparam em respeitar o caráter pitoresco da ruína, a partir da estabilização e consolidação das ruínas, da liberação ao acesso de visitantes por meio de passarelas na parte interna do monumento e a utilização da arqueologia para o estudo do local.

Figura 80: Setorização do Parque.

Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=Djm0A49fi10

Ao longo dos últimos 40 anos, o espaço gerido pela Fundação Garcia D'Ávila não conseguia recursos para investir em uma estrutura capaz de atrair mais turistas.

Quando então, em 2019, por meio de uma emenda parlamentar, uma verba foi disponibilizada para a reforma. Segundo a Presidente do Conselho Curador, Geisy Fiedra: 95

"Durante todos esses anos, o custo sempre foi muito alto e as empresas parceiras, como Hiper Ideal e Enseada do Castelo, bancavam essa estrutura. A gente não tinha muito o que oferecer além da vista maravilhosa e das próprias ruínas".

Outro interessante aspecto é a criação de um museu para armazenar materiais arqueológicos achados durante as escavações. Através da contratação da curadora Rose Lima e participação ativa de arqueólogos, foi construído o primeiro museu da fundação. Entre as descobertas arqueológicas, estão peças portuguesas, achados indígenas, e até do Japão - que provavelmente foram presentes recebidos pelas gerações que lá viveram. Além dos artefatos, o museu conta com uma reconstituição volumétrica física da Casa da Torre, permitindo desse modo que os visitantes conheçam o que poderia ter sido de fato a Casa da Torre.

Figura 81: Museu cultural e arqueológico

Fonte: Bahia Notícias21

21

https://www.bahianoticias.com.br/bnhall/travelling/113-o-bahia-historia-cultura-tecnologiae-o-renascimento-do-castelo-garcia-davila

96

Figura 82: Maquete volumétrica da Torre Garcia D’ávilla

Fonte: Vaneza com Z. 22

Dentre os destaques do projeto, se encontra também o Vídeo Mapping, uma projeção de luzes e sons que contam a história da edificação. O espetáculo foi criado pelos renomados VJs Gabiru, Grazi e Speto e é apresentado durante a noite. São 3 vídeos mappings. Na fachada da frente faz-se o revezamento de dois vídeos, e ao fundo, na arquibancada, é o mapping de duração maior, com duração de 20 minutos de uma história de 470 anos.

22 : Disponível em: https://www.vanezacomz.com.br/praia-do-forte-castelo-garcia-davila/

97

Figura 83: Projeção do Castelo Garcia D’ Avila.

Fonte: Bahia Notícias 23

É interessante ainda ressaltar, a inauguração de um Coffee shop e uma loja para venda de produtos locais, os quais serão futuramente ampliados com fins de contribuir para a sustentabilidade da fundação. Há também atividades como o Festival de Jazz, apoiado pelo programa do governo da Bahia Faz Cultura, cuja ideia é fazer “algo integrado”, garantindo o cuidado às ruínas, mas também levando programações culturais para a comunidade.

23

Disponível em: https://www.bahianoticias.com.br/bnhall/travelling/113-o-bahia-historia-cultura

tecnologia-e-o-renascimento-do-castelo-garcia-davila

98

Figura 84: Loja para venda de produtos locais

Disponível em: Vaneza com Z24

As diferenças entre as Ruínas da Fazenda São Bernardino e a Torre Garcia D’ávilla possuem como ponto de partida a função para a qual foram criadas e.

Enquanto a primeira corresponde à uma casa de campo do séc. XIX, a segunda se trata de ruínas de uma das mais antigas edificações brasileiras. Contudo, vale destacar pontos em comum entre as duas, como a inserção em um sítio não-urbano, o processo de arruinamento e a ausência de cobertura, fatores esses pertinentes para nortear um projeto de intervenção.

Quanto às estratégias projetuais, como realizado no Castelo Torre Garcia D’ávilla, pretende-se consolidar as ruínas da Fazenda São Bernardino, oferecer o acesso à visitação através de percursos internos e acessibilidade, propor prováveis áreas para estudos arqueológicos, a criação do vídeo mapping e implantação de um anexo cultural com o intuito de disseminar o conhecimento a respeito da história local e incentivar empreendimentos no entorno com fins de gerar sustentabilidade local.

Entende-se desse modo que essas estratégias são essenciais para a valorização das ruínas, recuperação da memória local e incentivo ao uso do espaço.

24 Disponível em: https://www.vanezacomz.com.br/praia-do-forte-castelo-garcia-davila/

99

5.2 Parque Municipal Parque das Ruínas do Rio de Janeiro

O Parque das Ruínas é um belo mirante do Rio de Janeiro e está localizado na Rua Murtinho Nobre, no bairro de Santa Teresa, Rio de Janeiro. A casa, atual centro cultural, pertenceu ao ministro do governo Campos Sales, e em 1911 passou a herdeiros como Laurinda Santos Lobo e sofreu, ao longo dos anos, várias reformas, sendo, inclusive, algumas de autoria da proprietária. Em 1946, com a morte de Laurinda, a casa e toda a coleção de artes foram legadas à Sociedade Hanemaniana, que não conseguiu mantê-la. Com isso, a residência foi abandonada, saqueada e ocupada por mendigos e traficantes, fazendo com que a casa chegasse ao estágio de ruína.

Figura 85: Fachada Frontal do Parque das ruinas.

Fonte: Autora, 2023

Uma característica do bairro de Santa Tereza, comum à cidade de Nova Iguaçu, foi o abandono, uma vez que os projetos urbanísticos para o Rio de Janeiro por anos não o incluíram. Em contrapartida, hoje o cenário cultural é diferente com seus casarões, bonde e suas ruas, apresentando museus, centros culturais e um parque.

100

Sobre o projeto, os arquitetos Ernani Freire e Sônia Lopes, responsáveis pela obra, dividiram o projeto em duas escalas, sendo uma delas a escala da arquitetura, inserindo um programa que busca ampliar e complementar as atividades existentes no museu, e a outra escala foi a Urbana, visando o entorno das edificações e incorporando um terceiro terreno para atividades ao ar livre. O projeto tem uma abordagem de micro urbanismo envolvendo duas edificações e o parque que foi reciclado, cujas ações se estabeleceram em torno da exploração da estrutura como ruínas e o estabelecimento entre o Parque e o Museu da Chácara do Céu.

Quanto aos materiais e revestimentos, essa referência projetual possui pontos pertinente à intervenção na Fazenda São Bernardino. Assim como pretende-se realizar no projeto, a construção chama atenção por sua arquitetura de tijolos aparentes combinados com estrutura metálica e vidro. O material escolhido para as escadas e passarelas foi o aço que, além de contribuir esteticamente, serviu para estabilizar a frágil alvenaria estrutural. Os fechamentos em vidro sobretudo da cobertura tornou possível a preservação da iluminação natural existente.

Figura 86: Parte interna da casa, 2023.

Fonte: Autora, 2023.

Quanto à estruturação, uma solução interessante a ser também usada no projeto, é a possibilidade de serem realizadas algumas ligações parafusadas, o que permite a reversibilidade recomendada nas atuais cartas de restauro. Além da estrutura metálica, o concreto também foi utilizado na estabilização da estrutura existente, como é o caso de uma das interfaces - a viga central composta de berço de concreto armado entre dois perfis metálicos dobrados em forma de U. Essa viga 101

recebe grande parte das cargas do mirante e sua circulação vertical, direcionando-as para as paredes laterais do vão central. Dessa forma a parede de alvenaria, que se encontra logo abaixo, foi protegida (Fig.87).

Figura 87: Vista da viga composta no vão central; Caminho das forças em vermelho.

Fonte: Construções metálicas, 2014.

Quanto ao programa e a setorização, destaca-se a cafeteria em um espaço aberto e de contemplação, como no primeiro pavimento do projeto. No segundo, concentrado no ponto mais alto do edifício, está o mirante, com vista para a cidade do Rio de Janeiro. Um outro aspecto interessante é a parte funcional do projeto com auditório de 100 lugares, sala de exposições temporárias, copa, administração, depósito e banheiro público se encontrar em um pavimento semienterrado.

Figura 88: Escada que dá acesso ao mirante.

Fonte: Autora, 2023.

102

6 PROJETO

6.1 Diretrizes projetuais e partido

“Entender a importância das ruínas como referências materiais e simbólicas do passado é determinante para as ações de intervenção e preservação desse patrimônio cultural” (RIBEIRO, 2016, p.24).

Analisando todo aporte teórico até o momento, é notável que as ruínas devem primordialmente ser preservadas em sua condição atual: como ruínas. Relembrando os principais autores citados e as cartas patrimoniais internacionais, presume-se que embora existam possibilidades de tratamento, as ruínas possuem valores pelos quais devem ser preservados. Logo, intervenções pautadas na consolidação e manutenção do seu aspecto associadas às práticas da consolidação, legibilidade, reversibilidade e respeito à memória parecem ser as mais apropriadas no caso das ruínas da Fazenda São Bernardino, uma vez que priorizam os registros do passado ao passo que lhes atribui valor de uso.

A proposta não se limitará à consolidação pura e simples da ruína para o uso contemplativo, e sim corresponderá a preservação da ruína enquanto tal e a inserção de uma estrutura arquitetônica que viabilize a sua visitação e que organize os percursos e fluxos com a finalidade de recompor as visadas dos antigos moradores da Casa Grande. O projeto tem como objetivo servir-se das pedras disponíveis para criar um museu de exposições transitórias sobre a história da fazenda sem que externamente o conjunto perca a aparência de ruína – não obstante a inserção de delicados elementos construtivos, como o aço e o vidro, que sinalizam a ocorrência de uma intervenção contemporânea.

As ações nas ruínas objetivarão tanto a consolidação como a criação de uma nova arquitetura. As medidas para a preservação da materialidade se dará através de um projeto com aplicações técnicas de conservação (Anexo 2). E no seu interior serão inseridas passarelas de estrutura metálica que viabilizarão a visitação e a estabilização estrutural. Será proposto também fechamentos com painéis de vidro e a recomposição da cobertura de maneira simplificada com uso de materiais distintos 103

(aço e vidro). Para as exposições permanentes será construído um anexo cultural semienterrado ao lado da Casa Grande. E por fim, com auxílio de circulações verticais (indicado em roxo) - como rampas, elevadores hidráulicos e plataformas elevatóriaso acesso será facilitado a todos.

Figura 89: Plano de massas.

Fonte: Produzido pela autora, 2023.

6.2 Volumetria Casa Grande A proposta volumétrica se baseará na recomposição simplificada da volumetria original da Casa Grande e no fechamentos das lateriais do primeiro pavimento com painéis de vidro, tendo como objetivo, sugerir a volumetria original com a utilização de materiais totalmente diferenciados. A cobertura justifica-se principalmente pela sua função de proteção contra chuva das alvenarias remanescentes, mesmo já se sabendo que existem materiais capazes de promover essa proteção. Também será possivel atividades no interior da Casa Grande mesmo em dias chuvosos. Entendese que qualquer intervenção e criação de nova arquitetura sobre a pré-existência deve ser avaliado o seu impacto e deve-se ter todo o cuidado para que não haja deturpação da sua originalidade

104

A utilização de vidro na cobertura promove a desmaterialização das superficieis que delimitam o volume arquitetônico, resultando em edificações translúcidas e leves.

Deve-se ressaltar também que a utilização do vidro tido como material predominante nas intervenções em pré-existência é, em muitos casos, polêmica. Isto ocorre devio a desmaterialização das superficies, delimitando o volume arquitetônico e resultando, como já citado acima, em edificações translúcidas e leves. Tem-se o exemplo do Parque das Ruinas, em Santa Teresa/RJ, onde o vidro teve o papel de recompor a volumetria original das edificações preservando suas caracteristicas de ruínas, de fragmento e resíduo arquitetônico. As coberturas de vidro tem vantagens não só estilisticas e práticas, mas também pela sua versátilidade, integrando-se em diversos ambientes e aproveitando a iluminação natural (ANDRADE JUNIOR, 2014). .

Figura 90: Volumetria proposta

Fonte: Autora, 2023.

105

Figura 91: Isométrica explodia da volumetria proposta.

Fonte: Autora, 2023.

Será também proposto, após a inserção da estrutura metálica, abertura de vãos que foram fechados com tijolos de adobe da Casa Grande com o devido cuidado.

Assim novos vazios serão gerados na volumetria com o intuito de retirar as descaracterizações da edificação.

106

Figura 92: Demolir e construir da volumetria proposta.

Fonte: Autora, 2023.

6.3 Programa de Necessidades O programa de necessidades será proposto com o intuito de atender a demanda de visitantes turistas e moradores locais. O programa se divide em áreas de visitação às ruínas, um anexo cultural, áreas de convivência e serviços. O Projeto abrigará área de visitação ao interior da Casa Grande e visita externa ao Engenho e Senzala, tendo como suporte um anexo cultural para abrigar materiais arqueológicos, acervos e salas de curso/oficinas, além de um café e serviços gerais.

6.3.1 Áreas de visitação- Casa Grande, Engenho e Senzala

Diante do seu atual estado de ruína, é evidente não ser mais possível recuperar o uso original da Casa Grande. Por isso o objetivo da intervenção é recompor algumas visadas do antigo morador da Casa Grande ao promover percursos por meio de 107

passarelas e auxílios de totens informativos que contem a história da Fazenda São Bernardino. O solo não receberá intervenção e serão áreas destinadas ao estudo arqueológico. Quanto ao Engenho e Senzala, também será permitido a visitação externa por meio de pisos que delimitem o espaço e o solo destinados ao estudo arqueológico.

Tabela 3: Áreas de visitação interior Casa Grande Setor

Ambientes

Função

Área Uni. Quant. Area total (m²)

Área de visitação à Casa Casa Grande

(m²)

-

1

1.133,20

-

1

774,50

-

1

721,40

Grande/ Exposição e estudo arqueológico

Área/ Visitação

Engenho

Exposição e estudo arqueológico

ou exposição Senzala

Exposição e estudo arqueológico

Fonte: Tabela produzida pela autora, 2023.

6.3.2 Anexo Cultural

No terreno em declive, por sua vez, será construído um discreto volume semienterrado para abrigar o anexo cultural e espaços de serviço. O volume consiste em uma estrutura em forma de caixa de concreto na cor vermelho, de modo a distinguirse das ruínas e sem competir com a visibilidade. O anexo abrigará em seu interior uma área para exposições, salas de oficinas e de vídeo, café e áreas de serviço, como banheiros, sala de administração, depósito e DML.

108

Tabela 4: Áreas do interior do Anexo Cultural Setor

Ambientes

Função

Área Uni. Quant. Area total (m²)

Destinado a exposições Área de exposições

(m²) 1

142,82

2

122,7

60,6

1

60

12

1

12

74,43

1

74,43

9,38

1

9,38

16,71

2

33,42

142,82

de matérias arqueológicos, exposições culturais

Salas de oficina

Destinada a cursos e aulas sobre cultura e meio

61,35

ambiente.

Sala de mídia/

Destinada

ao

uso

de

computadores

informática,computadores e mídia.

Destinada a venda de

Anexo

Café

café e alimentos de rápido preparo.

Cultural

Área destinada à Espaço mesas

alimentação e convivência Área destinada ao

Depósito geral

armazenamento de Peças, materiais e suprimentos de modo geral

Banheiro social

Banheiro destinado ao

Fem./Masc.

uso de visitantes.

Sala administrativa

Administração do Parque

13,54

1

13,54

DML

Depósito de materiais de

6,77

1

15

limpeza

109

Destinados a visitantes Banheiro PCD

portadores de

3,78

1

3,78

necessidades físicas Fonte: Tabela produzida pela autora, 2023.

6.3.3 Áreas de permanência Tabela 5: Programa de necessidades para a área foco.

Prática Academia ao ar livre

de

exercícios

-

1

Eventos culturais, danças

-

1

físicos

Lazer Anfiteatro

2709 Espelho d’água

Função de tornar o

-

ambiente mais úmido e captar água da chuva

Lazer

Espaços de descanso e

Local de encontros,

lazer

convivência, recreação

Deck

Local de encontros,

-

1

Ver área

1

Ver área

1000

1

1000

25

1

25

convivência, recreação Fonte: Tabela produzida pela autora, 2023.

Tabela 6: Serviços de auxílio para área externa Local para estacionar Serviço

Estacionamento

veículos de visitantes e de serviço.

Serviço

Vigilância

Vigilância da entrada

Fonte: Tabela produzida pela autora, 2023.

110

6.4 Fluxograma e Setorização

6.4.1 Casa Grande Como não se conhece o programa original da Casa Grande por inteiro, sendo apenas sinalizado nas plantas originais apenas o Salão de jantar, o altar São Bernardino, e a cozinha, será proposto a implantação de totens informativos com fotografias do acervo do Iphan para situar o visitante a respeito desses ambientes.

Quanto ao 1° pavimento, supõe que possivelmente esse espaço era destinado ao quarto do Senhor de Engenho, logo esse ambiente receberá essa destinação.

Figura 93: Setorização Casa Grande do térreo e 1 pavimento, respectivamente.

Fonte: Produzido pela autora,2023.

111

Quanto ao fluxo, o percurso se dará pela entrada principal, com acesso ao 1 primeiro pavimento através de elevador hidráulico e escada. A saída se dará pela parte posterior à Casa Grande.

Figura 94: Fluxo Casa Grande do térreo e 1 pavimento, respectivamente.

Fonte: Produzido pela autora,2023.

112

6.4.2 Anexo Cultural No nível 5m, será proposto espaço para mesas e recreação. Para objetivos de conforto, conterá um telhado verde. Já para iluminação do interior do anexo, uma clarabóia de policarbonato e abeturas zenitais.

Figura 95- Setorização do anexo cultural térreo.

Fonte: autora, 2023.

113

Figura 96- Setorização do anexo cultural – Subsolo.

Fonte: autora, 2023.

6.5 Estratégias bioclimáticas

6.5.1 Captação de águas pluviais e cisterna A cisterna subterrânea foi posicionada de modo a captar águas pluviais da cobertura da Casa Grande, do anexo e do telhado verde. Sendo conectadas aos banheiros do anexo cultural para alimentar descargas e a pontos de água externos, para regar jardins e lavar pisos. Será utilizado uma caixa d’água de 10.000 litros que 114

atenderá uma demanda de 100 pessoas levando em consideração 5 dias da semana e as áreas laváveis e jardim. O Cálculo a seguir: Figura 97: Captação de água de chuva e armazenamento

Fonte: Autora,2023.

115

6.5.2 Telhado verde O anexo cultural contará com um telhado verde como uma estratégia sustentável com o objetivo de obter um melhor aproveitamento energético devido aos benefícios do uso de telhados verdes. Já que o terreno possui forração vegetativa em grande parte, o anexo irá sugerir uma continuidade dessa característiva. Dentre os benefícios, podem ser citados: regulação térmica, captação da água da chuva para limpeza dos ambientes como jardins e descarga de banheiros, diminuição dos alagamentos e facilidade do escoamento das chuvas.

Figura 98- Vista do telhado verde e área recreativa

Fonte: Autora,2023.

6.7.3 Conforto térmico

Aproveitando as direções do vendo dominante da região, a circulação de ar ocorrerá de maneira cruzada pela edificação através dos grandes vão que será mantidos abertos.

116

Figura 99: Esquema dos ventos

Fonte: Autora,2023.

6.6 Materiais e revestimentos

6.6.1 Na Casa Grande Os materiais escolhidos foram o aço e o vidro. O aço tem considerável aplicabilidade em edificações históricas, das quais, pode-se citar eficiência, agilidade, maiores vãos, construção limpa e entre outros. Duas características pertinentes no uso desse elemento é a diferenciação de materiais ao promover um diálogo entre o antigo e o novo, e a reversibilidade que é a possibilidade de desfazer a intervenção ou substituir peças. Essas vantagens, por sua vez, são diretrizes propostas pelos teóricos da restauração e pelas cartas patrimoniais, especificamente no tratamento de ruínas (CARTA DE VENEZA, 1964). Contudo deve-se atentar para a avaliação e estudo particular de cada caso, devido às suas peculiaridades e demandas de resoluções diferentes.

6.8.1.1 Cobertura Nesse projeto, optamos pelo vidro duplo na cobertura e nos paineis que estão presentes no primeiro pavimento, também conhecido como vidro insulado, levando em consideração o sistema de duplo envidraçamento, obtendo uma camada interna.

A combinação de vidros semelhantes ou não, é a principal caracteristica desse sistema, podendo unir o vidro temperado ao vidro laminado que apresenta alta 117

resistência, sendo este ultimo resistente à proteção térmica e acustica. O vidro duplo é primordial para projetos que se preocupam com a eficiencia energética com sustentabilidade. O vidro duplo trás maior conforto térmico ao ambiente interno, evitando troca nos niveis de temperatura entre o ambiente interno e externo. Seu sistema permite combinar qualidade de vidros, como por exemplo, vidro laminado com fator solar baixo e vidro aramado. O vidro insulado duplo também gera maior controle acustico, evitando a presença de ruidos no ambiente interno, além de possibilitar a combinação com outros tipos de vidros. Dentre as varias espessuras, optamos por 10mm, considerando ser o suficiente para proteção do meio interno DIVINAL VIDROS, 2023).

Figura 100: Esquema vidro duplo

Fonte: Glassec Viracon

6.8.1.2 Passarelas Para as passarelas serão utilizadas chapas expandidas de dimensões 2m por 1,20m de largura e espessura de 6 mm que consistem em uma chapa laminada e galvanizada, em aço inoxidável ou alumínio. Esse material possui um custo-benefício devido a durabilidade e resistência por possuírem alta resistência à corrosão em decorrência do tempo ou adversidades climáticas, como sol e chuva.

118

6.8.2 Anexo Cultural O anexo será de concreto e receberá pintura na cor vermelha das paredes. Os pisos e o teto serão de concreto aparente. A claraboia e a cobertura da rampa serão de policarbonato.

Figura 101- Materiais de revestimento para o anexo.

Fonte: Autora a partir de imagens da internet,2023.

6.7 Estrutural

6.7.1 Na Casa Grande

Entende-se que quando se trata de alvenarias autoportantes pré-existentes, o mais aconselhável é a desvinculação entre a nova e a antiga estrutura (MORAIS, 2009, p. 33). Contudo, na prática, casos existentes, demonstram que é possível apoiar estruturas novas em antigas, como na Pinacoteca do Estado de São Paulo, e ainda oferecer um reforço estrutural, como nos casos do Parque das Ruínas e a Casa dos Bandeirantes.

Lembrando que, assim como nesses casos citados, deve-se considerar uma avaliação prévia das condições estruturais das ruínas. É importante constatar se a alvenaria é ou não estrutural, avaliar as propriedades dos materiais e distinguir onde a alvenaria é sólida e se há densidade suficiente para suportar o carregamento (SCI, 1996 apud MORAIS, 2009).

119

Como não se conhece as condições estruturais das ruínas e do solo, optou-se por propor uma estrutura nova independente da preexistente. A estrutura metálica não se apoia em sua totalidade nas ruínas, exceto em um único trecho, onde algumas vigas se engastarão na estrutura auto-portante somente em alguns pontos. Assim o descarregamento principal ocorrerá pelos pilares da nova estrutura até o solo e em alguns pontos pelas paredes das ruínas como mostra a figura a seguir.

Para esse procedimento, uma abertura será feita na parede de alvenaria para acomodar um bloco de concreto, pré- moldado ou moldado in loco, que permitirá a instalação da vida de aço. Esse bloco recebe parafusos que podem prover ajustes juntamente a placas lavadas. Contudo, deve-se atentar para que esse exemplo de interface entre viga metálica e alvenaria mostrado abaixo têm uma mesma particularidade quanto ao carregamento: não são recomendados para situações em que haja transferência de momento.

Figura 102: Corte mostrando detalhes

Fonte: Produzido pela Autora

120

Figura 103: Interface entre viga de aço e parede de alvenaria

Fonte: MORAIS, 2009.

Para as passarelas do térreo, serão utilizadas vigas de aço perfil I de 15 cm, de 50 cm e pilares de aço de 20x20 cm. Os pilares que darão suporte para a passarela do segundo pavimento e para sustentar a cobertura terão 20x20 cm.

Quanto a estruturação da passarela do 1°, será proposto uma aplicação em conexões de vigas de aço de 50 cm simplesmente apoiadas nas paredes de alvenaria que suportam totalmente o carregamento, desde que não haja transferência de momento da nova estrutura. Adotou-se essa solução com a finalidade de obter maior liberdade de layout, ou seja, sem interferências de pilares nas passarelas e evitar possível montante de cargas pontuais no solo.

6.7.2 Anexo Cultural

O anexo será sustentado por vigas de 25cm e pilares de sessão 20x20cm, com pé direito de 3 metros dispostos por uma malha de 5x5 metros.

6.9 Acessibilidade

121

O sítio possui talude de 5,6 m, então o acesso ao nível da Casa Grande e anexo se derá por uma escada e uma rampa de inclinação máxima de 8,33%, de acordo com a norma ABNT-NBR 9050/202034. A rampa se configura de acordo com as características do terreno, de modo que permita ao visitante realizar um percurso arborizado e agradável ao passo que permite observar a Casa Grande acima. O nível 5,60m também poderá ser acessado por um elevador hidráulico de vidro em contraste com a antiga escada existente do muro de arrimo.

A Casa Grande possui duas escadarias secundárias nas laterais e uma escadaria principal, em grande parte inexistente, que não atendem às atuais normas de acessibilidade. Como o interior possui um desnível de 2m, para permitir o acesso de qualquer usuário, optou-se por posicionar uma rampa de aço na lateral do edifício para o acesso principal, de acordo com as recomendações da ABNT-NBR 9050/202034 com a inclinação máxima permitida pela norma de 8,33%. Para o acesso ao 1° pavimento, será implantada uma escada metálica de seção quadrada disposta no mesmo espaço que a escada original, atualmente inexistente, e um elevador hidráulico que vencem 4 m de altura. Para a saída foi proposto dois acessos pelo exterior posterior, um que se conecta à rampa lateral de aço e outro que leva ao anexo cultural através da escada lateral direita existente e de uma plataforma elevatória.

Como o anexo cultural será semienterrado, o acesso principal também se dará por uma rampa de inclinação máxima de 8,33%, segundo ABNT-NBR 9050/202034, para vencer um desnível de 3m. A saída de serviço, bem como a carga e descarga, também terá o suporte de uma rampa, também segundo às normas de acessibilidade, para vencer um desnível de 2m que seja permitido o acesso à rua.

6.10 Incêndio

Este item está baseado no Código de Segurança Contra Incêndio e Pânico – COSCIP do estado do Rio de Janeiro, regulamentado pelo decreto 42º de 17 de dezembro de 2018. Segundo a Nota Técnica 2-01:2020, é necessario incluir extintor para no minimo 150 m. Na casa grande, tanto no terreo quanto no pavimento superior, será incluso uma unidade de extintor de incêndio do tipo sobre rodas como

122

recomendado na nota citada acima. Da mesma forma será incluso uma unidade de extintor para área de anexo.

6.11 Pavimentação e paisagismo A escolha dos pisos é muito importante e primordial para o sistema de drenagem do solo, de maneira que se faz necessário pisos permeáveis para evitar problemas com inundações. No projeto, como o intuito é interferir o mínimo possível na drenagem do solo, será proposto a utilização de concregrama na maior parte do terreno. Na área do Deck o piso será de madeira, material ecológico e sustentável. No nível 0m (Praça), será utilizado concregrama para os percursos, pisos drenantes no anfiteatro e na academia ao ar livre.

Na pavimentação externa ao sítio, para a ciclovia será utilizado tinta específica para traçar os limites da pista. A calçada será constituída de pisos intertravados e piso tátil direcional, a fim de garantir acesso e segurança ao percurso do pedrestre (Ver anexo 4, prancha A13).

Figura 104: Tipos de pavimentação.

Fonte: Autora, 2023.

123

Quanto ao paisagismo, atualmente, o terreno externo à Casa Grande é coberto por forração rasteira e possui algumas árvores existentes, dentre elas a aleia de Palmeiras imperiais próximo ao sítio do outro lado da R111 e uma palmeira imperial, fato que reflete uma prática característica dos senhores de engenho: implantar palmeiras imperiais como símbolo de nobreza.

Nota-se no terreno ausência de trabalho paisagístico ou áreas de permanência.

Mediante a isso, para o projeto, será proposta a implantação de árvores considerando benefícios ambientais como regulação do escoamento de águas pluviais, melhoria da qualidade do ar e do sombreamento. As árvores definidas têm distribuição geográfica que abrange a mata atlântica e apresentam características que as tornam recomendáveis para o paisagismo local.

Dentre as árvores definidas estão: Casca-de-Anta (Drims brasiliensis) da familia Winterecoe que suportam exposição ao sol e sua altura varia de 2 a 5 metros. Ipê Amarelo (Tabeuia alba) da familia Bignoniaceae que suportam exposição ao sol e sua altura varia de 3 a 30 metros. Cereja-do-mato (Eugenia involucrata) da familia Myrtaceae que soportam exposição ao sol e sua altura chega a 2 metros. Pingo-deouro (Duranta erecta) pertencente a familia Verbenaceae, se apresenta como arbusto ereto, atinge cerca de 2,0 metros de altura, são encontrados facilmente em jardins e se tornam amarelas e vistosas quando expostas ao sol pleno. Camarão-amarelo (Pachystachys lutea) da familia Aconthaceae, suporta sol pleno, atinge até 1,2 de altura e é indicada para paisagismo (HERBARIO UNIRIO, 2019).

Optou-se por manter a disposição da vegetação existente, sendo proposta a complementação de massa arbórea em áreas em que será proposto espaços de permanência e convivência. Será proposto também a recomposição das palmeiras que fazem parte da antiga aléia de Palmeiras existentes com palmeiras Jerivá (Ver anexo 4, prancha A14).

124

Figura 105- Proposta paisagística

Fonte: Autora, 2023.

Figura 106: Plantas para proposta paisagística

Fonte: Autora, 2023.

125

6.14 Proposta urbanística

A proposta é tornar a Fazenda o atrativo principal, de maneira que ela sirva como uma ancora para dinamizar a economia local de forma pulverizada. O entorno funcionará como grande parque, com articulações de fragmentos florestais protegidos (setores específicos) para atender a população local e turística. Englobando desse modo uma rede de apoio que conta com: estacionamentos, oficinas, comércios voltados para o ecoturismos e agricultura local como pousadas, restaurantes e entre outros. Para o uso coletivo, pretende-se integrar escolas, espaço de saúde, corpo de bombeiros, espaços de cultura e etc.

Quanto às ações para a comunidade, pretende-se criar espaços que incentivem cursos de Educação Ambiental para a capacitação de educadores e estudantes da rede pública de ensino, possibilitando maior disseminação de informações relevantes sobre a conservação e preservação do meio ambiente. E um projeto Agroecológico com objetivo de capacitação participativa de agricultores locais para difusão de experiências com práticas agroecológicas no bioma da Mata Atlântica. Comércio voltado para vendas de produtos locais (agricultura, plantas).

Quanto ao zoneameto territorial, propõe-se também a criação de uma Zona Especial de Interesse Histórico-Cultural e Ambiental a fim de garantir a proteção do bem e do parque em que está inserido. Será, portanto, proibido construções próximas ao entorno imediato e nas áreas mais distantes. Com relação ao gabarito, será proibido construções maiores que o do bem que possam prejudicar sua visualização.

O objetivo também é preservar os espaços verdes e a paisagem natural, através de leis que proíbem o desmatamento e incentivar a criação de mais espaços de parada coletiva (áreas livres e verdes), em pontos estratégicos do parque.

126

Figura 107: Proposta Urbanística

Fonte: Produzido pela Autora,2023.

Quanto ao sistema viário, a proposta tem o objetivo de melhorar a mobilidade urbana e a qualidade do sistema viário. Para isso, a fim de criar espaços mais seguros com passeios devidamente regulados e ilumidados, será proposto a regulação do traçado viário e leito carroçável da Estrada Federal de Tinguá, criação de uma ciclovia de 2,4m e calçadas de 2,30 de largura com espaço para fluxo de pedestre e serviço.

Para a acessibilidade será proposto o piso tátil de 25 cm de largura, e rampas acessíveis com inclinação permitida para as faixas de pedestre. Os postes serão diposto a cada 24 m com tamanhos de 12 m para iluminar a via e 9 m para iluminar a calçada.

127

Figura 108- Proposta para o traçado viário

Fonte: Produzido pela Autora,2023.

Figura 109- Proposta para o traçado viário

128

Fonte: Produzido pela Autora,2023.

Quanto ao paisagismo, será proposto a recomposição de cobertura vegetal nos lugares onde há carência de vegetação, desassoreamento do Rio Iguaçu e limpeza de pontos que se econtram deteriorados e com presença de resíduos sólidos. Será proposto também implantação de mobiliário como assentos, lixeiras ecológicas e bicicletário.

6.15 Implantação

Figura 110- Implantação humanizada.

Fonte: Produzido pela Autora,2023.

129

6.16 Fachadas Figura: Cortes longitudinais do terreno AA e CC, respectivamente.

6.17 Cortes Figura: Corte BB da Casa Grande.

Fonte: Autora, 2023.

130

Corte AA da Casa Grande.

Fonte: Autora, 2023.

Figura 111- Corte AA do anexo cultural.

Fonte: Autora,2023.

Figura 112- Corte AA do anexo cultural.

131

Fonte: Autora,2023.

6.15 Render Figura 113: Vista geral

Fonte: Produzido pela Autora

Figura 114: Vista frontal Casa Grande

Fonte: Produzido pela Autora.

Figura 115: Vista rampa

132

Fonte: Produzido pela Autora Figura 116: Vista terraço do anexo

Fonte: Produzido pela Autora

Figura 117: Vista terraço do anexo

133

Fonte: Produzido pela Autora Figura 118: Vista da Entrada principal

Fonte: Produzido pela Autora

Figura 119: Dentro da ruína

134

Fonte: Produzido pela Autora Figura 120: Dentro da ruína- Entrada principal.

Fonte: Produzido pela Autora

Figura 121: Dentro da ruína- Vista da antiga sala de jantar.

135

Fonte: Produzido pela Autora

Figura 122: Dentro da ruína- Vista do elevador.

Fonte: Produzido pela Autora

Figura 123: Dentro da ruína- Vista do elevador.

136

Fonte: Produzido pela Autora.

Figura 124: Dentro da ruína- Vista do 1 Pavimento.

Fonte: Produzido pela Autora.

Figura 125: Dentro da ruína- Vista do 1 Pavimento.

137

Fonte: Produzido pela Autora.

Figura 126: Vista interna do Anexo

Fonte: Produzido pela Autora

Figura 127: Setor externo do Anexo

138

Fonte: Produção da Autora

Figura 128: Vista escada frontal Casa Grande

Fonte: Produzido pela Autora

139

CONSIDERAÇÕES FINAIS O conjunto arquitetônico da Fazenda São Bernardino é caracterizado como uma obra arquitetônica, cujo estado de arruinamento é tão elevado que já não é mais possível compreender, de maneira visual, a distribuição da sua estrutura preexistente, bem como compreender minimamente a sua condição artística anterior (BAETA e NERY, 2020). Mediante a todo conteúdo apresentado, conclui-se que esses remanescentes são atualmente ruínas geradas pela incúria e por um desastre de cunho antrópico, de causa criminosa. Mediante à falta de fiscalização e de ações práticas referentes ao decreto-lei n° 25, o conjunto sofreu e continua a sofrer com ações do tempo e do homem.

De acordo com Joaquim Cardoso (1943), em seu trabalho intitulado “Um Tipo de Casa Rural do Distrito Federal”, a atenção que nós brasileiros dispensamos à nossa história da arquitetura é pouca, principalmente àquelas que não dizem respeito à arte religiosa ou barroca. Segundo ele, pode-se afirmar que a arquitetura civil referente à simples casa da habitação - nunca mereceu o privilégio de uma análise à parte que fosse mais compreensiva, original e sistemática tanto quanto às influenciadas pelas artes religiosas da mesma época. Isso se deve em partes ao conhecimento insuficiente do que representa a arquitetura como atividade de espírito inserida nos complexos fenômenos que explicam a existência das comunhões sociais.

Compreende-se que a ruina pode ser considerada fragmento arquitetônico existente em época anterior dotada de uma beleza peculiar e com potencial para despertar sensações no observador. Mas sua importância vai além desses aspectos, uma vez que as memórias, identidade e o conhecimento cultural de uma população, estão totalmente ligados ao bem arquitetônico. Símbolo da memória local, a Fazenda São Bernardino registra em seus remanescentes não somente os visíveis efeitos físicos da estratificação do tempo, como também as marcas invisíveis da história local, as quais refletem a relação de domínio e de poder da velha estrutura política e social brasileira. É evidente que o conjunto da Fazenda São Bernardino como habitação no século XIX foi um local de inúmeras experiências vividas. Desde simples relações cotidianas, 140

tanto de senhores como de escravos, até relações conflitantes entre posseiros. Suas paredes, hoje em estado arruinado, foram abrigo de sentimentos, sonhos, desejos, medos, solidão e tristeza indivíduos com posições sociais e histórias diferentes.

Construção essa “impregnada” por resquícios tanto físicos quanto simbólicos do passado. O estado em que a Fazenda São Bernardino se encontra durante anos, reflete também o descaso com a população que reside na região, onde ações públicas de segurança, saúde, educação e fiscalização são precárias.

Se faz necessário um olhar mais cuidadoso por parte dos órgãos competentes para a conservação das ruínas da Fazenda São Bernardino, que já foi alvo de propostas que tinham outros interesses que não priorizavam a conservação das ruínas e seu valor histórico. Desde 2017, a Secretaria de Cultura de Nova Iguaçu vem demostrando interesse não só nos remanescentes, mas também no sítio em questão, oferecendo uma proposta de reconstrução total da Casa Grande e senzala. Porém, a pergunta fundamental é: Qual a real intensão? Embora essas intervenções demostrem alguma preocupação com o reconhecimento cultural e histórico da região, é discutível se uma reconstrução total seria aconselhavel, já que a população local nunca conheceu o bem em seu estado original. Em contrapartida, propor a consolidação e manutenção das ruínas valoriza os seus aspectos simbólicos e fortalece o conhecimento da população sobre o bem.

Quando se trata de edificações tombadas que apresentam valor histótico ações de natureza antrópica (provocadas pelo homem) ou trópica (provocadas pela natureza) quando não combatida pelas autoridades competentes, podem acarretar problemas não solucionáveis nas construções arquitetônicas. Nesse projeto, apoia-se a ideia do homem manter vivo o vínculo com o passado afim de preservar o Patrimônio que pertence a todos.

Segundo Ubirajara Mello (2006), a falta de afetividade pelos lugares e pelo que representam é a certeza para a escassez cultural. A frase é pertinente no que tange a falta de interesse público e quanto a falta de identificação da própria população com o patrimônio. Assim, somente com o comprometimento da comunidade local, em todas as fases do projeto, atuando fisicamente nos trabalhos e intelectualmente no resgate da história, repassada para gerações futuras através da “história contada” pelos habitantes do local, estabelecendo também possíveis ligações com inscrições e 141

desenhos encontrados em prospecções pictóricas no interior do conjunto é possível caminhar para a recuperação da identificação e do afeto.

A proposta de conservação das ruínas é uma tentativa de resgatar no bem arquitetônico sua materialidade e valores que são expressos por ele a seus usuários. É primordial trabalhar não só através da ótica material, mas também se atentar para as emoções que foram geradas de alguma forma em quem esteve envolvido com o bem. A memória fixa as lembranças no sagrado e as torna prosaica, ou seja, corriqueiras, além de estarem enraizadas no que é concreto, na imagem e no objeto.

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USTÁRROZ, Alberto. La lección de las ruinas: presencia del pensamiento griego y del pensamiento romano en la arquitectura. Fundacion Caja de Arquitectos, f. 144, 1997. 287 p.

VIOLLET-LE-DUC, Eugène Emmanuel. Restauração. Ateliê Editorial, 2019.

REFERÊNCIA DE FIGURAS Figura 8 - Estação de Vila de Cava, (Autor e data desconhecidos).

Disponível em: http://www.estacoesferroviarias.com.br/efcb_rj_riodeouro/cava.htm

Figura

11:

O

conjunto

arquitetônico

à

noite,

2017.

Disponível

em:

http://uniaodanon.blogspot.com/2014/08/fazenda-sao-bernardino-estou-verdede.htm.

150

Figura 12: Recorte de Notícia sobre o projeto da SEMCULT: Disponível em: https://rededanoticia.com.br/inspirado-em-paraty-projeto-promete-revitalizarconstrucoes-historicas-da-baixada-fluminense/

Figura 13: Restauração da Torre Sineria Nossa Senhora da Piedade, 2020.

Disponível em: https://www.facebook.com/tinguá/

Figura

14:

Corpo

técnico

na

visita

à

Fazenda.

Disponivel

em:https://www.novaiguacu.rj.gov.br/2020/07/01/prefeitura-de-nova-iguacu-instauraprojeto-de-revitalizacao-da-fazenda-sao-bernardino-e-do-sitio-historico-de-iguassuvelha/, acesso em: julho de 2020.

Figura

69

-

Festival

Gastronômico

de

Tinguá

(D)

Disponivel

em:

https://extra.globo.com/noticias/rio/baixada-fluminense/concurso-gastronomico-detingua-em-nova-iguacu-elege-os-melhores-pratos-com-aipim-17302003.html

Figura

68:

Casa

da

Cultura

de

Nova

Iguaçu

(A)

-

Disponivel

em:

https://centrodemoriagitaldenovaiguacu.wordpress.com/casa-de-cultura/

Figura 68:

Onda verde (B), Disponívelem: https://arqueologia-iab.com.br/iab-

participa-da-iii-aldeia-ambiental-da-reserva-biola%C2%B3gica-do-tingua/ Figura

69

-

Festa

do

aipim

(A).

Disponível

em:

https://s3.glbimg.com/v1/AUTH_35862ca5c6ab48b992baf1f1b4f7062e/extra-globocom/incoming/5472479-762-755/w640h360-PROP/festa.jpg Figura 97 – Esquema de Vidro Duplo. https://glassecviracon.com.br/service/vidroinsulado/

LISTA DE LINKS HERBÀRIO - https://www.unirio.br/ccbs/ibio/herbariohuni/herbario-prof-jorgepedro-pereira-carauta-huni.

151

152

ANEXO 1

153

154

155

156

157

158

159

Imagem- Barracos queimados em despejo.

160

161

162

163

164

165

166

ANEXO 2 PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DE CONSERVAÇÃO

DETALHAMENTO DAS INTERVENÇÕES DE CONSERVAÇÃO

ESPECIFICAÇÕES DAS INTERVENÇÕES DO PROJETO DE CONSERVAÇÃO

Intervenção de Conservação 1.1 Casa Grande D01- Revestimento degradado D02- Cantaria deteriorada D03- Descolamento de revestimento/Tijolos aparentes degradados D04- Sugidade/mancha negra D05- Pichação D06- Remanescente/Telha D07- Biodegradação/Vegetação D08- Tijolos aparentes D09- Madeira desgastada D10- Acréscimo D11- Biodegradação/ Insetos D12- Fissuras Tipos de danos identificados Deterioração

10

Descaracterização

2

Total:

12

Dano: D.01- Revestimento degradado Localização: Todas as fachadas Tipo: Deterioração Fator: Umidade Procedimento de Conservação: Deve-se inicialmente ser feita limpeza superficial de todas as paredes, antes de iniciar qualquer trabalho, utilizando escova de cerdas de nylon, de dureza média. Este serviço deve ser realizado da parte superior para a parte 167

inferior da parede. A seguir, é necessário realizar uma minuciosa inspeção visual, tátil e sonora a fim de identificar eventuais vazios, desagregações, fragilidades, deterioração do material e outras patologias. Em seguida, deve ser realizado um teste de percussão em toda a área de alvenaria, utilizando o martelo de borracha, fazendose a identificação com giz de cera para validação do mapa de danos existentes. O teste é necessário para saber se o revestimento está em estágio de descolamento.

Caso seja reprovado, os revestimentos serão removidos ou passarão por processo de consolidação. Caso não seja reprovado no teste, o revestimento passará por uma limpeza com sabão neutro e água.

Deve-se atentar para disponibilização de caçamba ou coletores para segregação do resíduo gerado nas frentes de serviço- Promover treinamento aos envolvidos quanto a segregação e coleta seletiva.

Para esse tipo de patologia, é importante controlar a umidade. Deve-se utilizar produtos que protejam o revestimento e impeçam a penetração de água, assim impedindo a condensação de vapor de água por detrás do revestimento. Uma opção é hidrofugante, produto que tem como objetivo a absorção de água pela alvenaria e diminui os processos de degradação que ocorrem pelo acúmulo de água, bem como a poluição atmosférica.

Ainda que a cobertura proposta tenha a função principal de proteger as alvenarias remanescentes principais, será proporto também como alternativa a utilização de placas cimentícia no topo de todas as alvenarias com o objetivo de reforçar a proteção contra chuvas fortes e ventos.

Dano: D.02- Cantaria deteriorada Localização: Embasamento da Casa Grande e Escadas Tipo: Deterioração Fator: Umidade Procedimento de Conservação: Avaliação do estado. A limpeza de cantaria deve ser feita com água vaporizada em temperatura ambiente. O jato de água não deve ser direcionado especificamente para a superficie, devendo atender uma distância entre o vaporizador e a súperficie, evitando efeitos mecanicos. Pode-se optar também por 168

utilizar equipamento de vapor dágua a temperatura controlada. Quando aplicado sobre a pedra, pode remover toda a sujidade superficial.

Dano: D.03- Descolamento de revestimento/ Tijolos aparentes degradados Localização: Todas as fachadas Tipo: Deterioração Fator: Umidade Procedimento de Conservação: Deve-se inicialmente ser feita limpeza superficial de todas as paredes, antes de iniciar qualquer trabalho, utilizando escova de cerdas de nylon, de dureza média.

Este serviço deve ser realizado da parte superior para a parte inferior da parede. A seguir, é necessário realizar uma minuciosa inspeção visual, tátil e sonora a fim de identificar eventuais vazios, desagregações, fragilidades, deterioração do material e outras patologias. Em seguida, deve ser realizado um teste de percussão em toda a área de alvenaria, utilizando o martelo de borracha, fazendo-se a identificação com giz de cera para validação do mapa de danos existentes.

Para esse tipo de patologia, é importante controlar a umidade. Deve-se utilizar produtos que protejam o revestimento e impeçam a penetração de água, assim impedindo a condensação de vapor de água por detrás do revestimento. Uma opção é hidrofugante, produto que tem como objetivo a absorção de água pela alvenaria e diminui os processos de degradação que ocorrem pelo acúmulo de água, bem como a poluição atmosférica.

Dano: D.04- Sugidade/mancha negra Localização: Topo das paredes Tipo: Deterioração Fator: Umidade 169

Procedimento de Conservação: Nas paredes: Deve ser feita limpezade todas as paredes, utilizando escova de cerdas de nylon, de dureza média. Esse serviço deve ser executado da parte superior para a inferior da parede.

Nos elementos pétreos: Após a limpeza utilizando jato de água com hidrojato, o gnaisse dever escovado com escova de nylon de cerdas macias e detergente P.A. neutro Ph 7,0 diluído a 10% em água, com posterior enxague com água. Após esses procedimentos, deve-se aplicar uma limpeza pontual nas áreas que apresentam crostas negras e outros tipo de mancha.

Dano: D.05- Pichação Localização: Todas as fachadas, com maior frequência na fachada frontal.

Tipo: Descaracterização Fator: Homem Procedimento de Conservação: A limpeza deve ser feita com água quente, detergente e raspagem com escovas macias. O produto indicado deve ser à base de solvente orgânico. Uma indicação é o solvente Orgânico MORLUB-SOLI-503.

Dentre as metodologias desenvolvidas para remover a pichação, Hass (2008) propôs o enxágue prévio de todo bloco em cantaria com água limpa corrente, utilizando sabão neutro. Essa limpeza é o ponto de partida para tornar vulnerável a película da tinta. O autor sugere lavar os blocos em cantaria circunvizinhos. Ao seguir esse método, devese avaliar inicialmente as condições das pedras, pois com a pressão da água na limpeza, podem deslocar-se.

Como medida de proteção da área pichada, deve-se isolar a mesma com fita crepe para evitar escorrimento ou aplicação de solventes ou qualquer material químico nos pontos pichados. Diversos testes químicos devem ser realizados, como Hass (2008) sugeriu, os testes devem ser iniciados com carbono de amônio a 10 e 20% (sal inorgânico), acetona (solvente/cetonas), xileno (Solvente / hiodrocarboneto aromático /série benzênica), EDITA puro (ácido etilenodiaminotetracético / composto químico orgânico e EDITA com carbontato de amônio.

170

É importante o cuidado na retirada dos produtos químicos, sempre levando em consideração a utilização de água corrente sem pressão, panos ou estoupa, evitando escorrimento. Não obstante, os cuidados para o manuseio e uso de equipamentos de Proteção individual devem ser seguidos.

Recomendações gerais para procedimentos de limpeza química em geral (GERMANI, 2007, pp. 154-155): •

Recomenda-se que o procedimento preveja enxágue prévio de todo o bloco em cantaria com água limpa corrente sem pressão e com sabão neutro;

• • • •

Isolar as áreas que devem ser limpas, pois a limpeza química é feita pontualmente; Fazer testes em amostras de diversos tipos de pedra; Remover bem o produto após a reação desejada e lavar a superfície em seguida; Cuidados especiais com escorrimentos devem ser tomados, bem como com resíduos de produtos químicos sobre as superfícies, os quais não devem em hipótese nenhuma secar sobre o suporte; Todos os testes e procedimentos devem ser documentados, fichados, observados in loco e aprovados por profissionais dos órgãos de preservação;

•

Dano: D.06- Remanescente/Telha Localização: Todas as fachadas, com maior frequência na fachada frontal.

Tipo: Deterioração Fator: Umidade, vento, vegetação Procedimento de Conservação: Após remoção cuidadosa das telhas que estão em situação de risco de queda, as mesmas devem ser armazenadas em caixa de papelão onde posteriormente serão expostas no anexo cultural.

Dano: D.07- D07- Biodegradação/Vegetação Localização: Todas as fachadas, com maior frequência na fachada frontal.

Tipo: Deterioração Fator: Umidade, vento, vegetação Procedimento de Conservação: Remoção cuidadosa, principalmente em casos de raízes profundas.

171

Dano: D08- Tijolos aparentes Localização: Fachada interna Tipo: Deterioração Fator: Umidade, vento, vegetação Procedimento de Conservação: Limpeza com água e escova de nylon macia. Em caso de tijolos soltos com risco de queda, fazer reparo ou substituíção.

Dano: D09- Madeira desgastada Identificação: Localização: Moldura das janelas, atualmente inexistentes.

Tipo: Deterioração Fator: Umidade, vento, vegetação Procedimento de Conservação: Todas as madeiras serão retiradas.

Dano: D10- Acréscimo Identificação: Localização: Paredes laterais internas e Fachada Sudeste Tipo: Descaracterização Fator: Homem Procedimento de Conservação: Deve ser realizada a remoção do acréscimo cuidadosamente após a inserção da nova estrutura metálica, a fim de não danificar toda a estrutura. Em caso de remoção de estrutura de tijolos, se for necessario, podese utilizar marretas leves, ponteiras e talhadeiras. Os tijolos removidos devem ser armazenados em caixas para serem aproveitados se necessário.

Dano: D11- Biodegradação/ Insetos Localização: Paredes laterais internas e Fachada Sudeste 172

Tipo: Descaracterização Fator: Homem Procedimento de Conservação: Remoção cuidadosa dos agentes biológicos realizada por um profissional, utilizando os EPI necessarios para proteção pessoal.

Deve-se adotar uso de inseticidas.

Dano: D12- Fissuras Localização: Paredes laterais internas e Fachada Sudeste Tipo: Descaracterização Fator: Umidade, raízes e vibrações.

Procedimento de Conservação: Substituir os tijolos afetados pela fissura por tijolos novos, sendo o assentamento dos tijolos executados com argamassa de cal no traço 1:3 ou argamassa compatível.

173