

Fernando Morgadinho


Realização
Editora Conectfarma® Publicações Científicas Ltda. Título: Sono Nosso de Cada Dia
Copyright © 2024 Libbs®
Autor
Fernando Morgadinho
Coordenação editorial
Vívian Seixas Maia
Capa e ilustrações
Gabrielli Masi
Projeto gráfico
Sandra Regina Santana
Revisão de textos
Viviane Zeppelini

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Cód.: 555997 | Janeiro/2024

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
MORGADINHO, FERNANDO (Autoria)
Sono Nosso de Cada Dia / Autoria: Fernando Morgadinho. 1ª ed. - São Paulo, SP: Editora Conectfarma, 2023. - (Projeto Livro do Sono - Laboratório Libbs)
200 p.; 14x21 cm. ISBN 978-85-63678-87-4
1. Saúde. 2. Sono.

Fernando Morgadinho



Neste livro, Dr. Fernando Morgadinho navega pelo universo do sono, desvendando desde o ritmo circadiano até os distúrbios do sono que afetam milhões. Aprofundando-se na insônia e suas causas, Dr. Morgadinho fornece não apenas uma análise clara, mas também estratégias eficazes para conviver com, e superar, esse desafio. Os capítulos seguintes discutem parassonias como sonambulismo, e revelam os mistérios da apneia obstrutiva do sono e distúrbios de movimento noturno.
No mundo do ritmo circadiano, o autor explora o jet lag e outros distúrbios que afetam nossa sincronia biológica, oferecendo insights para uma melhor adaptação. Ao chegar aos trabalhadores de turno, o livro fecha com uma reflexão sobre como otimizar o sono em ambientes desafiadores.
“Sono Nosso de Cada Dia” não é apenas uma exploração científica, mas sim um guia prático para transformar a relação de cada leitor com o sono. Uma leitura essencial para quem busca compreender, respeitar e aprimorar a qualidade do sono em suas vidas agitadas.


Sumário

Capítulo 1 • Sono e o ritmo circadiano 7
Capítulo 2 • Importância do sono 25
Capítulo 3 • Sonolência excessiva diurna 37
Capítulo 4 • Causas da sonolência 47
Capítulo 5 • Narcolepsia 59
Capítulo 6 • O tratamento da sonolência 71
Capítulo 7 • Insônia 83
Capítulo 8 • Causas da insônia 93
Capítulo 9 • Tratamento da insônia 103
Capítulo 10 • Sonambulismo e outras parassonias 115
Capítulo 11 • Síndrome da apneia obstrutiva do sono 125
Capítulo 12 • Distúrbios de movimento no sono: pernas inquietas e bruxismo 149
Capítulo 13 • Jetlag e outros distúrbios do ritmo circadiano 165
Capítulo 14 • Trabalhadores de turno 179
Referências 191
Listagem de siglas 197






Capítulo 1

Sono e o ritmo circadiano


História do sono
Caro leitor, primeiramente, gostaríamos de parabenizá-lo pela decisão de iniciar a leitura desta obra. Todos nós temos muita curiosidade sobre o sono e por muito tempo nos perguntamos: o que é o sono e para que serve?
O sono nos acompanha por toda a vida, e as pesquisas tentando entender melhor o sono remontam à Antiguidade.1
Os seres humanos dormem parte do dia desde que habitam a superfície do planeta Terra. Apesar de dormirmos um terço de nossas vidas, pouco se conhece em relação ao sono. A descrição de pessoas com insônia já era feita pelos egípcios, que usavam derivados do ópio para tratamento desses casos desde 1.300 a.C. A clássica obra Corpus hippocraticum, que cita o sono e suas características, foi escrita por Hipócrates em 400 a.C. Aristóteles estudou mais profundamente o sono na obra intitulada De somno et vigilia no ano de 350 a.C. Nela, ele propôs uma relação inédita para a época entre o corpo e a mente durante o sono. Foi nessa obra, também, que Aristóteles registrou o padrão universal do sono em todos os animais, pelo menos nos vertebrados.2
Luigi Rolando, em 1809, e Jean Pierre Flourens, em 1822, descreveram a sonolência excessiva após retirada de hemisférios cerebrais. Richard Cato descobriu a presença da corrente elétrica cerebral em 1875, e foi Hans Berger que, em 1924, amplificou e registrou essa atividade elétrica em um papel pela primeira vez, criando o eletroencefalograma (EEG). Berger identificou diferentes frequências de ondas cerebrais, que variavam conforme o estado de consciência nos diferentes pacientes.2
Mais tarde, em 1937, Alfred Loomis, E. Newton Harvey e Garret Hobart dividiram o sono em cinco estágios, de A até E,


segundo o EEG. Kleitman e Aserinsky, em 1953, descreveram períodos de movimentos rápidos dos olhos em algumas partes do sono, denominados rapid eye movement (REM). Em 1957, Kleitman e Dement caracterizaram o padrão cíclico do sono REM e do sono non-rapid eye movement (NREM) em humanos segundo o EEG. Um ano mais tarde, em 1958, Jasper desenvolveu um método padronizado de colocação de eletrodos na cabeça, com perspectiva de reprodutibilidade em outras ocasiões e em diferentes pacientes, denominado sistema 10-20. Com esse sistema, era possível fazer a correlação entre eletrodo e seu registro com uma região cerebral de origem.2
Finalmente, em 1968, Allan Rechtschaffen e Anthony Kales criaram o método que serve de parâmetro até a atualidade para estadiamento do sono, descrito no Manual of Standardized Terminology, Techniques and Scoring System for Sleep Stages of Human Subjects, que ainda é a base para estadiamento e estudo do sono no mundo todo.2
O que é o sono?
Podemos lhe assegurar que existem algumas interessantes definições de sono. Segundo o dicionário, sono é um estado fisiológico periódico, caracterizado por interrupção transitória e reversível do estado de vigilância; relaxamento natural dos músculos e diminuição da atividade sensorial e da atividade cerebral, durante o qual o organismo se recupera da fadiga.3
Entretanto, costumamos definir o sono como um estado em que mudamos nossa consciência, de maneira reversível, padrão cíclico e com ausência de movimentos voluntários, diminuição da interação com o meio ambiente e relaxamento muscular.1,2


Mudança de consciência: porque não temos o mesmo padrão da vigília (acordado), com memória limitada, e perdemos a capacidade de racionalizar pensamentos, como na vigília.
Reversibilidade do sono: uma certeza em relação ao sono é que é um estado transitório que sempre terminará ao acordar. É importante citar para o leitor que existem outras situações clínicas em que temos mudança de consciência, como o coma, estado vegetativo persistente e estado de consciência mínima. As principais diferenças encontradas nesses estados citados em relação ao sono são um tempo maior de duração; serem estados, muitas vezes, irreversíveis; não haver padrão cíclico e a origem do problema se dar por lesões do sistema nervoso central (SNC), em muitos casos.
Padrão cíclico: o sono obedece a um padrão cíclico de vigília/sono numa duração de aproximadamente 24 horas (circadiano).
Perda da capacidade de movimentos voluntários: por termos mais relaxamento muscular e perdermos a interação com o meio ambiente.
Perda da interação com o meio ambiente: durante o sono, ficamos mais vulneráveis, e muitos dos estímulos externos (visual, auditivo, de olfato e tátil) não são suficientes para nos tirar desse estado e trazer de volta à vigília.




O sono é definido como um estado de mudança de consciência, reversibilidade, padrão cíclico, relaxamento muscular e perda da interação com o meio.

Divisões do sono
O sono é dividido em duas partes principais: REM, que é mais profundo, e NREM. No sono REM, há os movimentos rápidos dos olhos e perda completa da atividade muscular. Já no sono NREM, que é dividido em sono dos tipos N1, N2 e N3, temos perda parcial da atividade muscular e não há movimentos rápidos dos olhos (Figura 1.1). Normalmente, temos de cinco a oito ciclos com todas as fases de sono durante a noite, como demonstrado na Figura 1.2. Os critérios para definir se estamos dormindo ou acordados e as diferentes fases do sono seguem as regras caracterizadas pelas nossas ondas cerebrais no EEG, o nível de contração muscular e a movimentação dos olhos, que são estudadas durante a polissonografia.1,4


Características do EEG na Polissonografia
Ondas agudas do vértex (N1)
Fusos de sono (N2)
Complexo K (N2)
Ondas em dente de serra (REM)
EEG: eletroencefalograma; REM: rapid eye movement

Figura 1.1. Padrões de ondas cerebrais no EEG.
Fonte: elaboração do autor.
REM Acordada N1 N2 N3 Hipnograma

REM: rapid eye movement
Figura 1.2. Ciclos das fases do sono demonstradas em um hipnograma (representação gráfica das fases do sono).
Fonte: elaboração do autor.


A polissonografia é um exame realizado à noite, em que são monitorados vários parâmetros simultaneamente, conforme demonstrado na Figura 1.3. Normalmente, esse exame é solicitado quando temos uma suspeita de algum distúrbio do sono, como síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS), por exemplo. A polissonografia pode ser realizada numa clínica ou na própria casa do paciente, dependendo da suspeita clínica.1,4
EEG
EOG
Microfone para ronco Capnografia (transcutâneo)
Cinta abdominal e cinta torácica
Oximetria de pulso
Sensor termostático e sensor pressórico de fluxo aéreo e capnografia (cânula)
EMG
Eletrocardiograma
Sensor de posição
EMG de braço
EMG de perna
EEG: eletroencefalograma; EOG: eletrooculograma; EMG: eletromiografia.
Figura 1.3. Montagem de polissonografia.
Fonte: elaboração do autor.
Sem o registro das ondas cerebrais, não conseguimos definir se estamos dormindo ou não. As atividades cerebrais são distintas quando se comparam a vigília, o sono REM e o sono NREM. A atividade cerebral é aumentada quando estamos acordados e durante o sono REM. Embora existam muitos aparelhos e aplicativos de celulares no mercado que se


propõem a monitorizar o sono, sem a monitorização das ondas cerebrais pelo EEG os resultados são apenas estimativas, com chance de erro por não contemplarem o estudo das ondas cerebrais, a atividade muscular e os movimentos de olhos de maneira simultânea.1,4
O sono é dividido em sono REM e NREM (N1, N2 e N3). Os critérios para se diferenciar sono da vigília,
bem como as fases do sono, dependem da análise das ondas cerebrais (EEG), dos movimentos dos olhos e da atividade muscular, por meio da polissonografia.

Ritmo circadiano
Os seres vivos possuem ciclos, ou ritmos, que fazem parte da sua biologia e que são fundamentais para a sobrevivência. Podemos dividir os ritmos biológicos em infradianos, ultradianos e circadianos.2


Ritmos infradianos: são ritmos que duram mais de 28 horas. O exemplo mais citado de ritmo infradiano é o ciclo menstrual, durando de 22 a 40 dias, cuja regulação se dá pela liberação de hormônios na primeira e segunda fases do ciclo menstrual. Outro exemplo de ritmo infradiano são alterações que ocorrem conforme a estação do ano ou sazonais. Como exemplo, podemos citar a maior prevalência de depressão durante o inverno.2
Ritmos ultradianos: são ritmos que duram menos que 24 horas. Podem ser ciclos muito mais rápidos, como frequência de batimentos cardíacos e respiração; ou mais ocasionais, como a movimentação do intestino ou o ciclo do aparelho urinário, que funciona algumas vezes por dia.
Ritmos circadianos: são ritmos que duram aproximadamente 24 horas, e seu maior exemplo é o ciclo vigília/sono. A soma dos momentos de vigília (momento acordado) e de sono durante o dia compõe o que chamamos de ritmo circadiano. Esse ritmo é controlado pelo nosso relógio biológico.2
O funcionamento do nosso relógio biológico é muito complexo e envolve aspectos individuais (genéticos) e do ambiente. A principal chave de ativação desse relógio biológico é a luminosidade natural. O ritmo circadiano é comandado pela luz e pelos eventos que ocorrem durante nossa rotina social, como os horários de trabalho, de estudo e das diversas atividades do dia a dia.5
Os seres humanos, os insetos, os fungos, as bactérias, as plantas e todos os mamíferos têm o mesmo sistema de regulação dia-noite (circadiana). A organização diária do relógio biológico funciona de modo independente e, em cada ser, todo o funcionamento do organismo está sincronizado.5


Como os indivíduos vivem em diferentes locais, com tempos variados de exposição à luminosidade no nosso planeta, nosso relógio biológico deve se ajustar às diferentes regiões do globo, uma vez que o dia é fixado em 24 horas. Vale a pena lembrar que, na linha do Equador, o sol nasce e se põe sempre na mesma hora em todos os dias. Porém, nas demais regiões do planeta, o ciclo natural claro-escuro varia conforme a estação do ano e a latitude. Além disso, cada um de nós ajusta seu relógio biológico para sincronizar as funções do organismo, para nos adaptarmos à variação de luminosidade e temperatura das diversas alterações das estações do ano. Durante cada estação, temos variações de quantidade de luz ao longo do dia, tanto em quantidade de horas claras, como também na intensidade da luminosidade. A adequação de cada um de nós a essas variações é fundamental para o bom funcionamento do nosso organismo.5
O principal local responsável pela regulação do ciclo circadiano no indivíduo é uma estrutura cerebral que se chama núcleo supraquiasmático, que recebe informação da presença de luz após estímulo na retina por uma via neuronal, chamada de via retino-hipotalâmica, a qual, por sua vez, estimula a produção de melatonina na glândula pineal. A glândula pineal é localizada na base do cérebro e produz e libera a melatonina.5
A melatonina, também chamada de N-acetil-5-metoxitriptamina, é o principal hormônio sintetizado pela glândula pineal, com a sequência bioquímica:
Conversão do triptofano em serotonina.
Conversão da serotonina em N-acetilserotonina (mediada pela aril-alquil-amina-N-acetiltransferase).
Conversão da N-acetilserotonina em melatonina (mediada pela hidroxi-indol-O-metiltransferase).5


A produção da melatonina depende do estímulo da luz que ocorre durante o dia. Sem exposição à luz, não produzimos melatonina de maneira adequada; e, como consequência, a quantidade de melatonina a ser liberada durante a noite é menor. A secreção (liberação para a circulação) da melatonina ocorre predominantemente à noite. Em geral, a liberação da melatonina inicia-se com a diminuição da exposição à luz, ao redor de 2 horas antes do horário habitual de ir dormir, e chega aos níveis máximos de liberação na circulação ao redor das 4h.5
É importante salientar que, para o bom funcionamento do nosso relógio biológico, e também boa produção e liberação de melatonina, é necessário que tenhamos exposição à luminosidade durante o dia e à escuridão durante a noite.
Quem não se expõe à luminosidade durante o dia diminui a produção de melatonina, e quem não se expõe à escuridão à noite libera pouca melatonina durante esse período, com impacto na qualidade e na quantidade de sono.5

O ritmo circadiano é definido como um ritmo que dura ao redor de 24 horas. A melatonina é fundamental na regulação do ritmo circadiano.
Precisamos de exposição solar durante o dia para produzir melatonina e de escuridão à noite para a liberação da melatonina.
A falta de luz de dia e a claridade à noite impactam no controle do ritmo circadiano e na qualidade do sono.


Quanto tempo precisamos dormir?
A necessidade de sono no ser humano é muito variável e depende da idade, sendo muito maior na infância. O recém-nascido dorme aproximadamente 18 horas por dia, com um padrão polifásico, ou seja, vários pequenos momentos de sono e de vigília durante as 24 horas do dia. Um bebê de 2 meses de idade passa, em média, 60% a 70% de seu tempo dormindo. Já uma criança de 2 anos dorme 50% de seu tempo, com períodos de sono e de vigília durante o dia.2
Conforme as crianças crescem, elas começam a concentrar o sono durante a noite, até que, com 6 a 7 anos de idade, deixam de fazer os cochilos à tarde para se tornarem monofásicas, ou seja, dormem somente à noite.
Na adolescência, o jovem inicia uma característica muito peculiar no ritmo circadiano, que é o que chamamos de padrão mais vespertino ou de atraso de fase. O atraso de fase se caracteriza por dormir mais tarde e acordar mais tarde. Desse modo, o adolescente arrasta todo o bloco de sono e tende a se deitar mais tarde do que o habitual. Isso é potencializado por maus hábitos de sono, como o uso de aparelhos eletrônicos e contatos sociais com amigos, por exemplo. Como as obrigações escolares, normalmente, concentram-se pela manhã, o adolescente dorme tarde e precisa acordar cedo para ir para a aula. Como consequência, dorme tempo insuficiente, evoluindo com complicações da privação do sono.2
No adulto jovem, ao redor de 20 anos de idade, o tempo de sono diminui para 33% do tempo total do dia. Já o adulto dorme ao redor de 25% (6 a 8 horas). É importante esclarecer que essas necessidades de horas de sono são estimadas para a maioria da população e podem não ser verdadeiras para todas as pessoas. Em relação ao tempo de sono necessário, encontramos, na população, um grupo de pessoas que necessita


dormir mais do que 9 horas por noite (dormidores longos), e, no outro extremo, grupos de pessoas que ficam muito bem com 5 ou menos horas de sono (dormidores curtos). Essas características são genéticas e resultam da interação entre a predisposição genética do indivíduo com as necessidades de rotina social e familiar de cada um.2
Durante o envelhecimento, diminuímos mais ainda nosso tempo de sono. Também perdemos em qualidade de sono. Há um aumento das fases mais superficiais do sono e diminuição de fases mais profundas. Ao contrário dos adolescentes, inicia-se um padrão mais matutino ou avanço de fase. O avanço de fase é a tendência do idoso de dormir mais cedo e acordar mais cedo. Assim, os idosos tendem a ter sono mais precocemente na noite e, como dormem menos, acordam muito mais cedo do que os adultos mais novos. Essas características de sono podem trazer dificuldades de adequação no convívio social entre as pessoas mais idosas e as mais jovens. Os horários simplesmente não batem! Um ajuste ambiental, com organização de horários de convivência mútua, é fundamental para a harmonia e o bom convívio de todos.2
Agora você já sabe: matutinas são as pessoas que acordam muito cedo e ficam bem dispostas; vespertinos são os indivíduos que dormem até tarde e só se sentem dispostos após o almoço e à noite;

os dormidores longos necessitam de mais de 9 horas de sono, e os dormidores curtos precisam de menos de 6 horas de sono.


Como o sono é regulado?
O equilíbrio do ciclo circadiano, ou a homeostase do sono, depende do balanço entre um mecanismo de homeostase (chamado de processo S) e um sistema de controle de 24 horas, que chamamos de processo circadiano (chamado de processo C). O processo S age aumentando a necessidade de sono progressivamente, conforme o dia passa, com pico na hora de se deitar. Já o processo C, que promove a vigília, é regulado pelo sistema circadiano e diminui na hora de se deitar. O processo C também aumenta a consolidação do sono no período em que o processo S se dissipa. O balanço entre os dois processos regula a intensidade e a duração do sono.2

O sono é regulado pelos processos S (relacionado ao sono) e C (relacionado à vigília).



E o sono no cenário brasileiro?
O conhecimento sobre o sono normal nos auxiliou muito na identificação e no melhor entendimento de doenças e distúrbios do sono. Existem muitas doenças e distúrbios do sono com prevalência variada, dependendo das mais diferentes características, como idade, sexo, peso, cultura, etnia, genética e muitas outras.
A Medicina do Sono é uma área de atuação criada no Brasil em 2012. Médicos especialistas em clínica médica, otorrinolaringologia, neurologia, pneumologia e psiquiatria podem se especializar em Medicina do Sono, segundo normatização da Associação Médica Brasileira (AMB).
Com o objetivo de facilitar o manejo e o conhecimento sobre as doenças e os distúrbios do sono, foi criada, em 1990, e revisada, em 1997, a primeira Classificação Internacional dos Distúrbios do Sono (ICSD, do inglês The International Classification of Sleep Disorders). Após 15 anos, com o incremento dos conhecimentos sobre o sono, as doenças e os distúrbios do sono, foi elaborada uma segunda ICSD. O expressivo aumento no conteúdo dessa classificação evidenciou o rápido crescimento da Medicina do Sono no cenário científico no período.6 E, em 2014, foi lançada a terceira ICSD, que foi revista e atualizada em 2023.1




É importante ressaltar que há importante participação de especialistas que trabalham no Brasil na elaboração dessas classificações e na produção científica na área de Medicina do Sono. O cenário científico e de assistência na Medicina do Sono no Brasil está entre os melhores do mundo. Entretanto, pacientes com doenças e distúrbios do sono do sistema público de saúde nacional ainda estão longe de ter atendimento adequado e sistematizado. Políticas públicas, parcerias público-privadas e ações governamentais devem ser realizadas e fortalecidas para modificar esse triste cenário.
O Brasil possui destaque mundial nas pesquisas sobre o sono,
mas o acesso ao diagnóstico e aos tratamentos dos distúrbios do sono, para todos os cidadãos, ainda é um desafio.




Retrospectiva
A história do sono é marcada por curiosidade e pesquisa ao longo dos tempos, desde os egípcios até os estudos de Hipócrates e Aristóteles.
O EEG foi desenvolvido em 1924 e possibilitou a análise das ondas cerebrais durante o sono.
O sono é definido como um estado de mudança de consciência, reversibilidade, padrão cíclico, relaxamento muscular e perda da interação com o meio ambiente.
O sono é dividido em sonos REM (com movimentos rápidos dos olhos) e NREM (N1, N2 e N3) e monitorado por polissonografia.
O ritmo circadiano, regulado pelo núcleo supraquiasmático, depende da exposição à luz, durante o dia, e à escuridão, à noite.
As necessidades de sono variam com a idade, sendo maiores na infância e diminuindo com o tempo, além de serem influenciadas por variações genéticas.
No cenário brasileiro, a Medicina do Sono foi criada em 2012, mas o acesso ao diagnóstico e ao tratamento de distúrbios do sono é um desafio no sistema público de saúde brasileiro, o Sistema Único de Saúde (SUS), necessitando de políticas públicas e ações governamentais para melhorar o cenário atual.









Importância do sono Capítulo 2


Como o sono é importante?
O sono é importante para o bom funcionamento do organismo; mas, infelizmente, a falta de sono e o sono interrompido vêm se tornando comuns na sociedade moderna. Há uma progressiva perda do tempo de sono na nossa rotina, devido à crescente necessidade de tempo para o trabalho, o lazer e o convívio pessoal e familiar, por meios pessoal ou digital.7
A perda da qualidade e da quantidade do sono pode levar a prejuízos irreversíveis, como:7
Tendência à obesidade.
Aumento da frequência de doenças cardiovasculares e do diabetes.
Piora da qualidade de vida.
Diminuição da longevidade.

Quais são as funções do sono?
O sono insuficiente e com qualidade ruim vem se tornando comum na sociedade moderna.

Por muito tempo, pensou-se que a principal função do sono fosse poupar energia. A ideia de mais quietude e pouca

atividade muscular nos trazia o pensamento de pouco gasto de energia. Entretanto, hoje sabemos que não é bem assim. Na verdade, muitas são as funções do sono.
Embora não totalmente esclarecidas, já sabemos que essas funções são diversas e contemplam a conservação e restauração de energia; a consolidação da memória; a capacidade de adaptação ao meio ambiente e de sobrevivência; além de adequar e melhorar as múltiplas funções do organismo.2
Cada fase do sono possui funções específicas fundamentais para o bom funcionamento do organismo (Tabela 2.1). O sono non-rapid eye movement (NREM), especialmente na fase de sono profundo (N3), possui as funções reparadoras de músculos e articulações. Além disso, a fase intermediária (N2) é responsável pela adequação do sistema de controle de pressão arterial (PA) e ritmo cardíaco, além da regulação de muitos hormônios. Já o sono rapid eye movement (REM) possui mais funções relacionadas à memória.2
Tabela 2.1. Comparação de achados fisiológicos nos sonos REM e NREM
Atividade cerebral
Frequência cardíaca
Pressão arterial
Irrigação cerebral
Respiração
Resistência de vias aéreas
Temperatura corporal
Menor do que vigília
Menor do que vigília
Menor do que vigília
Não há variação
Menor do que vigília
Menor do que vigília
Menor do que vigília
Despertares sexuais Raros
Maior em áreas motoras e sensitivas
Maior do que sono NREM
Maior do que sono NREM
Maior do que sono NREM
Maior do que sono NREM, breves apneias e bloqueia a tosse
Maior do que sono NREM
Perda do controle da temperatura
Mais prevalente do que sono NREM

REM: rapid eye movement NREM: non-rapid eye movement
Adaptada de: Kryger MH, 2016; Coelho F, et al., 2014; Zhang D, et al., 2022. 2,7,8

Funções do sono
Restauração: repara tecidos e produz proteínas.
Conservação de energia: gerencia recursos energéticos.
Maturação cerebral durante a infância: ajuda no desenvolvimento e no amadurecimento do cérebro nessa fase.
Consolidação de memória: reforça e organiza as memórias.
Homeostase sináptica: mantém o equilíbrio das conexões neuronais.
Plasticidade cerebral: possibilita novas conexões entre neurônios.
Sono glinfático: sistema de drenagem entre pequenos vasos cerebrais, que funciona mais durante o sono, sendo muito importante para a limpeza do cérebro de substâncias, como beta-amiloide, que predispõe à doença de Alzheimer (DA).8
Regulação do sistema imunológico: influencia a eficiência e a resposta do sistema imunológico.9
O sono possui funções diversas e fundamentais para a vida.
As funções do sono variam dependendo das fases do sono, da idade e da qualidade dele.



A privação de sono e a sociedade moderna
Durante quase toda a história, dependíamos somente da luz natural vinda do sol. Acordávamos ao amanhecer e pouco fazíamos à noite a não ser dormir. Com o advento da luz artificial, podemos trabalhar e conviver até mais tarde, e a escuridão já não é um empecilho para nossas atividades. Em 100 anos, perdemos, em média, 1 a 2 horas de sono por dia na nossa rotina.7
O trabalho em turnos, o prolongado tempo de trabalho e as atividades sociais, incluindo tempo dispensado no computador, nos jogos eletrônicos e na televisão, são causas frequentes de sono interrompido e insuficiente na atualidade. A privação do sono, muitas vezes decorrente de ajuste na carga de trabalho, pode trazer graves consequências à saúde, e seus sintomas variam de acordo com seu grau e tempo de duração.7
A perda de sono é cada vez mais comum na nossa sociedade, e o excesso de horas de trabalho com comprometimento das horas de sono (trabalho em turno) pode levar a sérios prejuízos à saúde.



Os tipos de perda de sono e suas consequências
Em geral, o indivíduo com perda de sono pode apresentar sintomas leves, que variam de pessoa para pessoa e conforme a quantidade de tempo sem dormir, como:
Dor muscular.
Dor de cabeça.
Irritação.
Tontura.
Tremores.
Náuseas.
Em casos mais graves, com falta importante de sono, podem ocorrer confusão mental, depressão, desmaios, perda da concentração e da atenção, hiperatividade, hipertensão arterial, diminuição da capacidade do tempo de reação e ganho de peso. É interessante frisar que os sintomas podem se assemelhar aos de uma intoxicação pelo uso de álcool, com visão turva e perda de equilíbrio. Muitos acidentes de trânsito e de trabalho, além de doenças cardiovasculares, estão relacionados à privação de sono.2
Privação de sono: é a perda total de sono durante a noite. Esse padrão é menos comum, mas com impacto tremendo nas funções físicas e cognitivas no dia seguinte. A ausência total de sono é incompatível com a vida, em médio e longo prazo.
Restrição de sono: é a causa mais prevalente de perda de sono da sociedade moderna. É caracterizada pela diminuição de horas dormidas. Rotinas extensas e intensas, com menos tempo para o sono, são uma realidade em parte expressiva da população.


Sono fragmentado: essa causa de perda de sono é vista em vários distúrbios do sono, como síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS), quando há vários despertares durante a noite, com impacto na qualidade e na quantidade de sono.
Recente trabalho, ainda em fase de submissão na Harvard Medical School, realizado pelo grupo de que faço parte, demonstrou em voluntários sadios que o pior cenário para sonolência e fadiga foi em pessoas submetidas à privação total de sono, seguido de ruptura de sono e, depois, de restrição de sono. Esse trabalho é importante na prática para programação de esquemas de sono em trabalhadores de turno, por exemplo. Nesses casos, dormir menos horas contínuas (restrição de sono) é menos prejudicial e causa menos impacto no dia seguinte do que dividir o sono em vários momentos durante a noite.9
As perdas de sono podem ser por privação total de sono, restrição de sono e fragmentação do sono.



A falta de sono leva a uma ampla gama de desfechos adversos à saúde, como:
Alteração de funções cognitivas (de raciocínio), como vigilância e atenção executiva, velocidades psicomotora e cognitiva e memória de trabalho. Consequentemente, esses decréscimos muitas vezes levam os indivíduos a um desempenho abaixo do padrão nas tarefas, o que pode apresentar riscos ocupacionais.10 Há diminuição na capacidade de responder a tarefas, com tempos de resposta mais lentos, aumento nas falhas de atenção e declínios no desempenho da memória.
Risco de acidentes: mais de 1,35 milhão de pessoas morrem em acidentes de trânsito no ano ao redor do mundo, além de 20 a 50 milhões de pessoas sofrerem lesões graves não fatais. A sonolência devida ao sono insuficiente é um dos principais fatores que contribuem para o risco de acidente automobilístico. Depois da privação total do sono, os motoristas apresentaram aumento de saídas involuntárias da faixa da estrada com risco de eventos de quase acidente 11 vezes maior, principalmente em jovens. É importante lembrar que pessoas que dormem mal, com distúrbios do sono como SAOS, por exemplo, também possuem o risco aumentado de acidentes.11
Obesidade e diabetes: a perda e a baixa qualidade do sono aumentam a ingestão de calorias, principalmente de alimentos ricos em gordura e carboidratos. As taxas mundiais de obesidade e diabetes mellitus (DM) tipo 2 aumentam concomitantemente à prevalência crescente de privação e distúrbios do sono. A restrição do sono está associada a mudanças na homeostase energética, na resistência à insulina (RI) e na função


das células produtoras de insulina no pâncreas. A curta duração do sono é um fator de risco para o desenvolvimento de obesidade e DM tipo 2, e o ajuste das horas de sono pode preveni-los, com impacto favorável em perda de peso ou composição corporal como parte da intervenção no estilo de vida.12

A perda de sono pode levar à obesidade e ao diabetes tipo 2.
Doenças do coração e dos vasos (risco cardiovascular): a falta de sono é altamente associada ao aumento das doenças cardiovasculares. Os mecanismos responsáveis pelos efeitos da falta de sono nessas doenças são complexos. É provável que resposta inflamatória, ação de radicais livres, disfunção das paredes dos vasos, alterações endocrinológicas e imunológicas estejam relacionadas aos efeitos da privação de sono na progressão da aterosclerose (acúmulo de gordura nas paredes dos vasos levando à obstrução).13


Estresse: pessoas com perda ou privação de sono têm maior irritabilidade, diminuição do controle de impulsos agressivos e estresse por aumento da atividade do eixo hormonal do estresse (hipotálamo-hipófise-adrenal) e consequente aumento dos níveis circulantes dos hormônios do estresse.14
A falta de sono traz prejuízos para a saúde, aumentando o risco de obesidade, diabetes e eventos adversos no coração e nos vasos.
Cuidar bem do sono é um ótimo caminho para se alcançar longevidade e qualidade de vida.






Retrospectiva
A falta de sono e a má qualidade do sono podem levar a problemas de saúde, como obesidade, doenças cardiovasculares e diabetes.
O sono possui funções específicas, variando de acordo com suas fases.
A privação do sono afeta o equilíbrio interno do corpo, levando a sintomas como dor muscular, irritação e até depressão.
Existem diferentes tipos de perda de sono, incluindo privação total de sono, restrição de sono e sono fragmentado.









Sonolência excessiva diurna Capítulo 3


O que é a sonolência?
Você se sente cansado ou com sono durante o dia? Tome cuidado! A sonolência ou sonolência excessiva diurna (SED) é a dificuldade de nos mantermos acordados em situações em que normalmente não dormimos ou sentimos sono. É uma queixa responsável por muitos dos atendimentos médicos, além de acidentes graves ao redor do mundo, e que tem aumentado nos últimos anos progressivamente.7
Diferença entre fadiga e sonolência
Muita confusão se faz entre sonolência e fadiga, usando frequentemente um termo para descrever o outro. Como fazemos a diferença?
A fadiga é a sensação de mal-estar muscular que melhora com repouso. É comum como resultado do uso abusivo da musculatura, como em atividades físicas extenuantes ou em doenças neurológicas e reumatológicas, por exemplo esclerose múltipla (EM), distrofias e vasculites. É importante frisar que a atividade física piora a fadiga!7
Já a sonolência melhora com a atividade física, diferenciando-se da fadiga já nesse ponto. Ou seja, caso a pessoa melhore com atividade física, ficando mais alerta, estamos falando de sonolência. Caso contrário, isso é mais provavelmente fadiga. É importante salientar para o leitor que a fadiga é muito comum em doenças inflamatórias e infecciosas, como a doença pelo coronavírus 2019 (Covid-19) longa, de maneira independente de sonolência.2,15



Agora você sabe a diferença!
Uma dica é que a atividade física melhora a sonolência, mas piora a fadiga.

E como se quantifica a sonolência?
A quantificação da sonolência é muito importante para o tratamento e a avaliação na prevenção de riscos de acidentes. Todas as pessoas que possuem algum grau de sonolência que ofereça risco para dirigir ou manejar equipamentos que ofereçam algum risco, não devem fazê-lo. Podemos dividir os métodos de quantificação da sonolência em subjetivos (por meio de questionários) e objetivos (por meio de exames).2
• Métodos subjetivos
A ferramenta mais utilizada para quantificar a sonolência é a Escala de Sonolência Epworth (ESE), que nos fornece informação de sonolência dos últimos 30 dias do paciente16 (Figura 3.1).



Situação
1. Sentado e lendo
2. Vendo TV
3. Sentado em um lugar público, sem atividade (sala de espera, cinema, reunião)
4. Como passageiro de trem, carro ou ônibus, andando 1 hora sem parar
5. Deitado para descansar à tarde, quando as circunstâncias permitem
6. Sentado e conversando com alguém
7. Sentado, calmamente, após o almoço (sem álcool)
8. Se estiver de carro, enquanto para por alguns minutos no trânsito intenso
Chance de cochilar
0: nenhuma chance de cochilar; 1: pequena chance de cochilar; 2: moderada chance de cochilar; 3: alta chance de cochilar
3.1. Escala de Sonolência Epworth (ESE).
Adaptado de: Boari L, et al., 2004.16
A ESE é um questionário que avalia oito situações do cotidiano, que requerem de pouco a elevado grau de atenção. O paciente pontua cada questão como 0, 1, 2 ou 3, que correspondem, respectivamente, a nenhuma, pequena, moderada e grande possibilidade de adormecer. Os valores maiores ou iguais a dez são considerados de sonolência excessiva.1
Outro questionário interessante é a Escala de Sonolência Stanford (SSS, do inglês Stanford Sleepiness Scale), que nos


Figura
fornece o grau de sonolência no momento da avaliação. A pessoa escolhe a opção na escala que melhor se adequa ao que está sentindo no momento da avaliação.7
• Métodos objetivos
O diagnóstico objetivo da sonolência é feito com um exame chamado teste das latências múltiplas do sono (TLMS). O raciocínio do exame é muito parecido com o da polissonografia, entretanto somente os eletrodos do eletroencefalograma (EEG), dos olhos e dos músculos do queixo serão mantidos, com o objetivo de definir as fases do sono e a vigília. Além disso, esse exame é realizado de dia, após polissonografia de noite inteira. Ao longo do dia, após acordar, o paciente é convidado a se deitar em cinco ocasiões (a cada 2 horas) e tentar dormir por 20 minutos. O paciente deve estar livre do uso de estimulantes ou de fármacos de ação central, como antidepressivos, por, pelo menos, quatro semanas.
A polissonografia prévia deve ter o mínimo de 6 horas de sono, sem a presença de distúrbios do sono que levem à sonolência. Pacientes com sonolência possuem a média do tempo para entrar no sono menor do que 10 minutos; e com sonolência excessiva em menos do que 5 minutos. Em uma doença rara, chamada narcolepsia, o diagnóstico é feito quando a latência do sono é menos do que 8 minutos, e encontramos dois ou mais registros de sono rapid eye movement (REM) nos cinco registros.2
Outro método que pode ser utilizado para monitorar e graduar a sonolência é um teste para atenção denominado Psychomotor Vigilance Task (PVT). O PVT é um aparelho, com um visor numérico digital, no qual o paciente precisa acionar um botão, assim que enxergar o aparecimento dos números, o mais rápido que puder. Dessa maneira, captamos o tempo de reação do paciente, bem como o nível de atenção e,


consequentemente, de sonolência, já que os números aparecem de maneira aleatória e sem padrão. A National Aeronautics and Space Administration (NASA) normalmente monitora a sonolência de seus astronautas com testes do tipo PVT, de maneira rotineira.7
A sonolência precisa ser medida e acompanhada! O tratamento da sonolência depende de sua causa.
A liberação para as atividades profissionais em pacientes com sonolência depende, primordialmente, da quantificação adequada subjetiva e objetiva.





Quais os riscos da sonolência?
Um dos grandes riscos desse estado é a associação da sonolência com maior probabilidade de envolvimento em acidentes automobilísticos. Acredita-se que adormecer enquanto dirige é responsável por um grande número de acidentes de trânsito, especialmente sob condições de condução monótonas. Em torno de 40% dos acidentes fatais estão relacionados à sonolência. Muitos deles ocorrem com motoristas profissionais na direção de ônibus, caminhões, veículos de mercadorias e carros da empresa.7
Outro cenário de risco importante para pessoas com sonolência é o ambiente de trabalho. Metade dos acidentes de trabalho pode estar relacionada à sonolência. Historicamente catástrofes mundiais, como os acidentes de Three Mile Island; Chernobyl e Exxon Valdez, ocorreram à noite e estavam relacionadas à sonolência.7
A sonolência também está associada ao risco de lesões ocupacionais, com várias evidências de que esteve associada a um aumento de mais de duas vezes o risco de acontecimento dessas lesões. Os resultados permaneceram significativos, ainda, após um maior controle das condições de trabalho e ambientais, como trabalho físico e níveis de ruído, provando que a sonolência continua a ser um fator importante associado à ocorrência de lesões desse tipo.1
Além disso, a sonolência pode estar relacionada à maior mortalidade e incapacidade, principalmente em pacientes acima dos 60 anos. Os resultados da análise de tabelas de vida sugerem que um indivíduo de 60 anos com sonolência teve redução de 4 anos, em anos de vida livre de incapacidade, e nenhuma mudança nos anos vividos com incapacidade.2


É importante, também, salientar que a sonolência foi associada ao aumento do acúmulo de beta-amiloide (Aβ) no cérebro, que é um marcador de demência de Alzheimer, em idosos sem demência. Esse achado sugere que pacientes com sonolência podem ser mais vulneráveis a alterações patológicas associadas à doença de Alzheimer (DA). Embora mais estudos sejam necessários para elucidar por que a instabilidade do sono leva à degeneração do sistema nervoso central (SNC), a identificação precoce de pacientes com sonolência e o tratamento de distúrbios do sono subjacentes podem reduzir o acúmulo de Aβ nesses pacientes.17
A sonolência é muito prejudicial para a saúde.
A maioria das causas de sonolência citadas neste capítulo pode ser identificada e corrigida. Nos próximos capítulos, vamos conversar sobre as causas da sonolência.



Retrospectiva
A sonolência é a dificuldade de se manter acordado em situações em que normalmente não dormimos. Já a fadiga é a sensação de mal-estar muscular que melhora com repouso, enquanto a sonolência é melhorada com atividade física.
A quantificação da sonolência é importante para prevenir acidentes e pode ser feita por métodos subjetivos (questionários, como a ESE) e objetivos (exames, como o TLMS).
A sonolência está associada a riscos, como acidentes automobilísticos, acidentes de trabalho e maior mortalidade e incapacidade, principalmente em idosos. A sonolência também pode estar relacionada ao acúmulo de Aβ no cérebro, um marcador de demência de Alzheimer.









Capítulo 4 Causas da sonolência


Quais as causas da sonolência?
As principais causas da sonolência são a privação ou falta de sono; doenças e distúrbios do próprio sono; doenças clínicas e psiquiátricas; uso de medicamento ou abuso de outras substâncias e alterações do ritmo circadiano7 (Tabela 4.1).
Tabela 4.1. Causas da sonolência Causas Suspeita clínica
Privação de sono Tempo de sono reduzido
Distúrbios ou doenças do sono
Doenças clínicas ou psiquiátricas
Ronco e pausas
respiratórias
Queixas em pernas Bruxismo
Depressão
Hipotireoidismo
Insuficiência
adrenal, renal ou hepática
Diário do sono Actigrafia
Anamnese clínica
Questionários Polissonografia
Anamnese clínica Exames complementares
Aumento do tempo de sono
Depende da patologia em questão
Depende da patologia em questão
Uso de medicamentos
Distúrbio de ritmo
Hipnóticos
Anticonvulsivantes
Antidepressivos
Neurolépticos
Medicamentos para parkinsonismo
Avanço ou atraso de fase
Privação de sono
Anamnese clínica
Anamnese clínica Diário do sono Actigrafia
Retirada ou substituição dos medicamentos
Melatonina e fototerapia
Fonte: elaboração do autor.

Você sabia que a privação de sono, ou o sono insuficiente, é a causa mais comum de sonolência? A privação de sono é responsável por um terço das causas das queixas da sonolência

excessiva diurna (SED) atendidas nos consultórios de especialistas, e vem crescendo nos últimos anos.
Atualmente, dormimos de 1 a 2 horas a menos por dia do que no século passado! Atribuições crescentes nas esferas pessoal, profissional e familiar nos levam a dormir cada vez mais tarde e a acordar cada vez mais cedo. No caso das mulheres, a maior quantidade de afazeres profissionais faz com que preciosas horas de sono sejam sacrificadas para terminar as tarefas do cuidado da família e da casa após o trabalho, caso estas não sejam divididas com seu parceiro.2
As crianças também dormem menos hoje em dia. Primeiramente porque cada vez mais atividades são impostas em horários do dia, sobrando a noite para deveres de casa e para o tempo individual para brincar. Além disso, com os pais chegando mais tarde, é natural que as crianças durmam mais tarde, para aproveitar a companhia familiar.2
Com a energia elétrica, mudamos nossos hábitos nessas últimas gerações. Podemos trabalhar a qualquer hora do dia e da noite, e temos aparelhos eletrônicos que nos conectam com tudo e com todos a qualquer hora. Essa realidade nos leva a uma tendência de querer aproveitar o tempo dito “perdido” no trabalho ou na escola durante o horário em que deveríamos estar dormindo.2
Os aparelhos eletrônicos utilizados rotineiramente emitem uma luz rica em luz azul. Esse espectro de luz é muito competente no bloqueio da liberação de melatonina. Como, para iniciar o sono, precisamos da liberação dessa substância, como visto no Capítulo 1 deste livro, o uso desses aparelhos nos faz dormir cada vez menos e cada vez pior.1 O resultado é que estamos criando uma sociedade moderna de pessoas com sono insuficiente e sonolência, com muitos riscos e danos para nossa saúde.


A privação de sono, ou o sono insuficiente, é a causa mais comum de sonolência.

Doenças clínicas e distúrbios psiquiátricos e do sono
Doenças clínicas, como hipotireoidismo, alterações do fígado, perda de função renal e muitas outras, podem levar à sonolência, que, nesses casos, normalmente vem acompanhada de outras queixas ou achados, que nos direcionam para o diagnóstico.7
Alterações psiquiátricas também estão muito relacionadas com alterações do sono. Nesse caso, tanto as queixas de insônia quanto as de sonolência podem estar relacionadas. Parte dos pacientes pode evoluir com uma ou outra queixa, dependendo das características individuais e do tipo de doença psiquiátrica em questão, e pacientes depressivos podem iniciar o quadro com queixa de sonolência sem outras queixas mais comuns na depressão.2


A suspeita clínica e uma investigação detalhada na conversa com o paciente podem trazer dicas importantes para o diagnóstico diferencial. Os distúrbios do sono são responsáveis por sonolência também, uma vez que pacientes com distúrbios como apneia obstrutiva do sono, síndrome das pernas inquietas, insônia e outros, apresentam sonolência durante o dia.7

Os distúrbios do sono levam frequentemente à sonolência durante o dia e devem sempre ser avaliados em pacientes com essa queixa.
Uso de medicamentos ou de outras substâncias
Não é incomum tomarmos medicamentos hoje em dia, certo? Com acesso à propaganda e às compras on-line pela internet, muitas vezes usamos medicamentos sem orientação médica e sem especificação detalhada das substâncias que os compõem. Para alguns pacientes, particularmente os mais idosos, a associação de três ou mais medicamentos é uma prática comum e necessária para correção de hábitos ruins de dieta e falta de exercícios, além da correção de problemas degenerativos, imunológicos, metabólicos ou genéticos.7
Dentre os efeitos adversos de alguns fármacos, a sonolência pode estar presente. Para alguns deles, como os sedativos1


ou remédios para controle de alergia, a sonolência é um efeito adverso evidente. Entretanto, outros medicamentos possuem esse efeito adverso de maneira menos conhecida e devem ser pesquisados na investigação da sonolência, para estabelecimento de diagnóstico diferencial.2
Existem substâncias legais e ilegais utilizadas pela população que podem levar à sonolência. O álcool, que é amplamente consumido e socialmente aceito, dependendo da quantidade ingerida, pode levar à desinibição, passando pela sonolência e chegando ao coma alcoólico. Outras substâncias de uso ilegal ou ilícito podem levar à sonolência por abstinência ou por privação de sono. O uso abusivo de substâncias alucinógenas e entorpecentes leva a um menor tempo de sono, com consequente privação de sono e sonolência.2
O uso de hipnóticos para tratar insônia pode levar a um efeito prolongado na manhã seguinte, com sonolência e risco de acidentes.
Por isso, tome seu remédio de acordo com a orientação médica!



Alterações do nosso ritmo circadiano
Nosso ritmo circadiano, ou ciclo vigília-sono, possui um controle rigoroso endógeno, que se adequa às variações sociais, adaptativas e ambientais que vivemos. Fatores genéticos são muito importantes nessa regulação. Existem algumas alterações do ritmo circadiano que são bem conhecidas e acometem parte de nós, como:2
Atraso de fase: as pessoas tendem a dormir mais tarde e a acordar mais tarde. Pode ser visto, por exemplo, nos adolescentes.
Avanço de fase: as pessoas dormem muito mais cedo e acordam muito mais cedo, como no caso dos idosos.1,7
Nessas duas situações, pode ocorrer um grave desbalanço entre o sono e os hábitos sociais, de trabalho e familiares. Não é incomum os adolescentes sentirem sono nas aulas pela manhã, o que, em parte, é explicado por essa característica de atraso de fase. Ao dormir depois da 1h da madrugada, o adolescente não pode acordar depois das 11h da manhã, pois precisa ir para a escola. O resultado é privação de sono e sonolência.2
O diagnóstico é feito por meio do estudo dos horários de dormir ou acordar, além do uso de diários do sono e/ou actígrafos (aparelhos no formato de relógios que captam os movimentos do pulso com identificação de ativo/inativo ou acordado/dormindo) (Figuras 4.1 e 4.2). Os diários do sono são ferramentas muito úteis, de baixo custo, que nos dão informação dos hábitos de sono de cada pessoa num tempo de dias até semanas seguidas. Nesse caso, inferimos que, quando há movimento, há vigília, e, quando há repouso, pode haver sono. O tratamento segue preceitos de controle de iniciar o sono e despertar em horários mais próximos do normal, numa migração de horários gradual e planejada.7



Fonte: elaboração do autor.


Fonte: elaboração do autor.

Figura 4.1. Exemplo de actigrafia.
Figura 4.2. Diário do sono.
Outra causa comum de sonolência é o jet lag, que acontece quando viajamos para países distantes e atravessamos mais de três meridianos. Nosso relógio interno não está adequado ao horário social e de luminosidade do local. Assim, experimentamos sono no nosso horário habitual, que não corresponde ao horário local. O organismo se adapta ao novo relógio aos poucos, com sofrimento variável, dependendo da quantidade de fusos atravessados, de características ambientais e do sentido a que viajamos (leste ou oeste).2
O jet lag, que é a falta de sincronia do nosso relógio biológico interno com o horário externo, quando viajamos para países distantes e atravessamos mais de três meridianos,
causa sonolência e mal-estar, prejudicando o funcionamento do nosso organismo.





Sonolência de origem central
Quando excluímos os diagnósticos diferenciais de sonolência citados, temos um conjunto de doenças com sonolência com origem no sistema nervoso central (SNC) e que são mais raras. Deve-se suspeitar de sonolência de origem central em pacientes sem a evidência de privação de sono, sem distúrbio de ritmo e na ausência do uso de medicamento com mecanismo de ação no SNC, além de terem sido excluídas doenças clínicas e psiquiátricas.2
As doenças com sonolência originadas no SNC são a narcolepsia, a síndrome de Kleine-Levin e a hipersonolência idiopática. Elas levam a uma redução significativa da qualidade de vida, bem como ao aumento do risco de acidentes pessoais e profissionais. Discutiremos a narcolepsia nos próximos capítulos.2
Como vimos, as causas de sonolência são variadas.

A identificação da origem da sonolência nos ajuda a resolver o problema na maioria das vezes!


Retrospectiva
As causas da sonolência incluem privação de sono, doenças e distúrbios do sono, doenças clínicas e psiquiátricas, uso de medicamentos ou abuso de substâncias e alterações do ritmo circadiano. A privação de sono é a causa mais comum.
Mudanças no estilo de vida, como horários de trabalho prolongados e uso de dispositivos eletrônicos que emitem luz azul, contribuem para a privação de sono.
Alterações no ritmo circadiano, como atraso ou avanço de fase, podem resultar em sonolência e desequilíbrio entre o sono e as demandas sociais. O jet lag, que acontece quando viajamos para fusos horários diferentes, é uma forma comum dessa alteração.
Em casos raros, a sonolência pode ter origem no SNC. Entre eles estão a narcolepsia, a síndrome de Kleine-Levin e a hipersonolência idiopática.









Capítulo 5 Narcolepsia


O que é narcolepsia?
No passado, caro leitor, havia uma lenda urbana segundo a qual pacientes com narcolepsia poderiam ser enterrados vivos por caírem no sono e serem confundidos com pessoas falecidas. Vamos ver, neste texto, que não é bem assim! Para isso, é importante definir as principais características da narcolepsia, que são:
Ataques incontroláveis de sono: pessoas afligidas com narcolepsia caem no sono em qualquer momento, mesmo em situações muito críticas, como conversando com alguém ou até namorando.1
Cataplexia: fraqueza muscular que pode ser de parte do corpo ou de todo o corpo sempre depois de um episódio de emoção positiva ou negativa. É importante esclarecer ao leitor que o paciente se mantém acordado durante o episódio de cataplexia.1
Alucinações hipnagógicas/hipnopômpicas: são imagens que os pacientes veem na transição entre o sono e a vigília, normalmente de pessoas ou de animais. São consideradas como componente onírico (sonhos) na vigília.1
Paralisia do sono: durante o despertar, ocorre a impossibilidade de movimentar os músculos do corpo. A paralisia do sono normalmente leva a uma grande angústia e pode ocorrer também na população em geral, especialmente com períodos de perda de sono.1
Fragmentação do sono: os pacientes com narcolepsia dormem com muitos despertares durante a noite, fenôme-



A narcolepsia é uma doença primária do sistema nervoso central (SNC), ou seja, na maioria das vezes não temos outras doenças associadas. É rara, aparecendo em apenas 0,02% da população e acometendo mulheres e homens na mesma proporção, com início dos sintomas normalmente na adolescência.1
A narcolepsia é uma doença rara, com sonolência excessiva durante o dia,
ataque de fraqueza muscular com emoção, alucinações, paralisia do sono e sono interrompido.

Como a narcolepsia se desenvolve?
O mecanismo que leva à narcolepsia não é totalmente conhecido e a combinação de várias teorias nos ajuda a entendê-la. A teoria degenerativa, por exemplo, fala de uma morte precoce das células produtoras de hipocretina. A teoria


genética, por sua vez, associa a narcolepsia a uma maior predisposição familiar de pacientes narcolépticos, além do início mais precoce dos sinais e sintomas da narcolepsia nas futuras gerações. E, por fim, a teoria ambiental descreve uma interação do meio ambiente com agentes físicos, químicos ou biológicos.2
Sendo assim, sabemos que a doença se desenvolve após uma predisposição genética, que é a presença, no material genético do indivíduo, de alelos (sequência de DNA) que facilitam o desenvolvimento da narcolepsia (HLA-DQB1*0602).
Essa tendência genética precisa estar associada à exposição de agentes do ambiente, como vírus (H1N1), algumas raras vacinas e bactérias (estreptococos) com ativação imunológica e desencadeamento da doença.2,18
Para entender melhor, é importante voltar ao fim de 1990, quando foi descoberto um neuropeptídeo (ou seja, uma proteína pequena), produzido numa região do cérebro chamada de hipotálamo, que tem importante função de regular o sono e a vigília.2 Esse neuropeptídeo foi batizado com dois nomes: hipocretina ou orexina. Vamos chamá-lo, neste livro, sempre de hipocretina, para facilitar o entendimento. A hipocretina também pode ser hipocretina-1 e hipocretina-2 com seus respectivos receptores distribuídos por todo o SNC. Não vamos entrar em detalhes nesta obra sobre os tipos de hipocretina, por isso optamos por manter somente hipocretina, com uma abordagem geral das ações.2
Alguns anos depois, foi evidenciado que, em pacientes com narcolepsia e cataplexia, havia uma diminuição dos níveis de hipocretina, pelo desaparecimento de células que a produzem



Desse modo, sabemos que a perda das células do hipotálamo que produzem a hipocretina, por um componente imunológico após uma predisposição genética, leva à narcolepsia de pacientes com cataplexia, mas ainda é obscuro o mecanismo que leva à narcolepsia em pacientes que não apresentam cataplexia.2,18
A narcolepsia com cataplexia se desenvolve pela perda das células do hipotálamo que produzem a hipocretina. Há um componente imunológico, após a predisposição genética e a exposição ao ambiente.
Ainda é obscuro o mecanismo que leva à narcolepsia em pacientes que não têm cataplexia.





Classificação
Os pacientes com narcolepsia são divididos em:
Narcolepsia tipo I: presença de cataplexia, ou níveis de hipocretina-1 no líquido cefalorraquidiano (aquele se colhe como na raquianestesia da cesariana ou para o diagnóstico de meningite) abaixo de 110 pg/mL ou queda de 1/3 do valor de uma dosagem anterior (crianças e adolescentes iniciando a doença) são característicos de narcolepsia tipo I.1
Narcolepsia tipo II: sem a presença de cataplexia e com a dosagem de hipocretina-1 no líquido cefalorraquidiano maior que ou igual a 200 pg/mL.1
A narcolepsia se divide em tipos I e II.

Como é feito o diagnóstico de narcolepsia?
Fazemos o diagnóstico da narcolepsia quando temos as queixas de sonolência com os outros fenômenos descritos do quadro clínico, abordados no início do capítulo, como


cataplexia, alucinações, paralisia do sono e sono fragmentado. Para medir a sonolência, usamos uma escala chamada de Escala de Sonolência Epworth (ESE), como visto no Capítulo 2 deste livro. Quanto maiores são os valores da escala, maior é a sonolência, com valores acima de 10 definindo sonolência excessiva. Além disso, precisamos comprovar a presença inesperada do estágio de sono rapid eye movement (REM) por meio de um estudo que analise as ondas cerebrais com eletroencefalograma (EEG), movimentos dos olhos e tônus muscular (que é o estado de ativação do músculo).1
Caro leitor, a narcolepsia é uma doença do sono REM. Durante ele, temos a perda do tônus muscular, sonhos e paralisia. Portanto, os achados clínicos sobre os quais temos conversado estão direcionados à entrada inadvertida de sono REM na vigília.1
Para saber mais!
Alucinações: componente onírico (sonhos) na vigília.
Paralisia do sono: manutenção da paralisia muscular do sono REM ao acordar.
Cataplexia: ataques de fraqueza com falha no comando muscular similar ao que ocorre no sono REM.1
Neste racional, fazemos estudos durante a noite (polissonografia) e durante o dia (teste das latências múltiplas do sono [TLMS]), para evidenciar o sono REM precoce. O TLMS é o estudo de cinco cochilos diurnos por 20 minutos, com intervalos de 2 horas entre cada um. Normalmente, durante a noite, faz-se a polissonografia, e, depois, realiza-se o TLMS, durante o dia. Como os medicamentos podem interferir no sono REM, o paciente precisa estar livre do uso de estimulantes ou de fármacos de ação central por, pelo menos, quatro semanas antes do exame.1


Para definirmos narcolepsia, precisamos ter uma média de adormecimento durante os cochilos menor que 8 minutos e a presença de dois ou mais episódios de sono REM (o sono REM precoce) nos cochilos no TLMS.
O leitor pode se perguntar por que chamamos de REM precoce. Não fazemos sono REM durante o sono? Fazemos sim, mas, normalmente, o sono REM demora 90 minutos para aparecer em uma pessoa normal. O seu aparecimento nos 20 minutos dos cochilos do TLMS não é esperado. Daí, caracterizamos a intrusão do sono REM com todos os sintomas descritos. 2
Ainda podemos avaliar a presença dos alelos que facilitam o desenvolvimento da narcolepsia no TLMS e também a dosagem de hipocretina.2
Para o diagnóstico de narcolepsia, precisamos dos achados clínicos comuns da doença, além de exames que comprovem o sono REM precoce.

A presença do alelo de predisposição genética e o nível de hipocretina também podem ajudar.


Impacto da narcolepsia na vida
O leitor deve imaginar que viver com narcolepsia não é fácil, especialmente sem o diagnóstico e sem o tratamento. Esses pacientes, durante a adolescência, isolam-se, para evitar ataques de cataplexia, e são zombados por muitos por sua sonolência.19
A demora para o diagnóstico, de forma universal, é muito grande. Embora vocês possam não acreditar, ele leva, na maioria das vezes, mais de 10 anos! Isso mesmo: 10 anos! Por quê?
Muitas vezes, esses pacientes têm o diagnóstico de depressão ou outras alterações psiquiátricas e são taxados frequentemente de preguiçosos por amigos e familiares. O desconhecimento sobre a doença pela população e pelos profissionais de saúde contribui para esse triste cenário.19

Tratamento
Viver com narcolepsia não é fácil! Pacientes com narcolepsia se isolam para evitar ataques de cataplexia e são zombados por muitos, pela sonolência.

O tratamento da narcolepsia deve ser feito individualmente, ou seja, personalizado para cada paciente. Porém, o seguimento regular desses pacientes em centros especializados garante melhor resultado, com interação da equipe multiprofissional especializada.20

Cuidado com um maior risco de acidentes deve ser sempre tomado, e situações potenciais devem ser evitadas.20 Além disso, deve haver integrações social e familiar de pacientes com narcolepsia com suporte educacional contínuo.20
No tratamento, os pacientes devem ter horários regulares para dormir, assim como cochilos programados por 20 minutos; além disso, exercícios regulares melhoram as queixas de sonolência diurna. Devem também evitar o consumo de bebidas alcoólicas ou outras substâncias estimulantes sem orientações médicas.20
O tratamento com medicamentos tem por objetivo controlar a sonolência excessiva e os ataques de cataplexia.
A sonolência excessiva tem sido tratada com estimulantes desde a década de 1960, e novos medicamentos têm sido lançados para controle das queixas de sono nesses pacientes.20 Um exemplo é a modafinila, que estimula a vigília, sendo o fármaco mais recomendado para tratamento de narcolepsia. É uma substância mais segura do que os estimulantes tradicionais, com menos efeitos colaterais e menos riscos de complicações.
Tratar a cataplexia também é importante para a melhora da qualidade de vida desses pacientes. Infelizmente, alguns medicamentos importantes para o controle da sonolência e da cataplexia não estão ainda disponíveis no Brasil.

O tratamento da narcolepsia deve ser individualizado e multiprofissional. O controle da sonolência excessiva e da cataplexia é fundamental para o bem-estar desses pacientes.


Retrospectiva
A narcolepsia é caracterizada por ataques incontroláveis de sono (que podem ocorrer em situações como no meio de uma conversa ou de atividades que demandam esforço físico); cataplexia e alucinações hipnagógicas/hipnopômpicas; paralisia do sono e fragmentação do sono.
O desenvolvimento da narcolepsia envolve predisposição genética, exposição a fatores ambientais (como vírus) e diminuição das células produtoras de hipocretina (ou orexina) no hipotálamo.
A demora no diagnóstico é comum, pois os pacientes frequentemente são diagnosticados com depressão ou outras condições, sendo, muitas vezes, mal compreendidos.
O tratamento é individualizado e pode envolver medicamentos para controlar a sonolência excessiva e a cataplexia, além de terapias comportamentais. O acompanhamento em centros especializados também é essencial.
Estabelecer rotinas regulares de sono, evitar substâncias estimulantes, programar cochilos curtos e praticar exercícios regulares pode melhorar a qualidade de vida dos pacientes com narcolepsia.








Capítulo 6

O tratamento da sonolência


Como tratamos a sonolência?
O leitor pode ter se identificado, nos capítulos anteriores, como uma pessoa sonolenta. Nesse caso, como tratamos a sonolência? Já adianto para você, leitor, que o melhor tratamento somente será realizado após um diagnóstico bem feito. A identificação das causas da sonolência será fundamental para o correto tratamento.7
Para tal, vamos utilizar muitas das informações que o leitor obteve nos capítulos anteriores. Uma conversa franca na consulta médica é fundamental para que conheçamos os detalhes de vida e hábitos do paciente.
Detalhes das queixas, bem como antecedentes, medicamentos em uso, doenças em tratamento e história familiar são muito importantes e podem ajudar no diagnóstico e no tratamento da sonolência.
É fundamental entendermos sobre horários e hábitos.
Por isso, podemos nos fazer as seguintes perguntas:
Que horas vai para a cama?
Quanto tempo leva para adormecer?
Acorda durante a noite?
Vai ao banheiro durante os despertares?
Qual a duração dos despertares?
Que horas acorda pela manhã?
Com despertador?
Levanta bem e rápido ou demora na cama?
Como se sente pela manhã?
Faz cochilos durante o dia?


Qual duração?
No fim de semana tem horários diferentes? Quais?
Essas perguntas são muito importantes para definirmos alguns padrões individuais de sono. Sugiro que o leitor responda a todas e venha comigo neste capítulo para identificarmos as possíveis causas de sonolência (Figura 6.1) para adequado tratamento.
Ritmo
Uso de substâncias
Doenças clínicas e psiquiátricas
Doenças do sono
Privação de sono


Figura 6.1. Causas reversíveis de sonolência.
Fonte: elaboração do autor.
Privação de sono
Já abordada em capítulos anteriores, a privação de sono é a principal causa de sonolência e uma mazela da sociedade moderna. O diagnóstico não é difícil de ser feito e, na maioria das vezes, pode ser realizado com as perguntas que foram respondidas no início do capítulo. Normalmente, um adulto necessita de um tempo total de sono de 8 horas no ciclo de 24 horas. Abaixo disso, estamos falando de perda de sono. Evidentemente, temos exceções para mais e para menos, visto que algumas pessoas precisam de menos horas (dormidores curtos) e outras, de mais horas de sono (dormidores longos). A melhor maneira de descobrir seu tempo ideal de sono é lembrar o quanto dormia sem compromisso, durante as férias. Esta é uma boa dica na prática!
O tratamento é dormir mais! Mas, nem sempre é fácil aumentarmos nosso tempo total de sono. Abrir mão de algumas atividades essenciais nem sempre é possível, por isso um planejamento da agenda e uma priorização de mais tempo de sono lhe ajudarão com muitos benefícios para a saúde. É muito importante também evitar deitar e fazer uso concomitante de celulares e outros aparelhos. Esse hábito, muitas vezes, diminui em demasia o tempo total de sono.1,2




O tratamento da privação de sono ou insuficiência de sono é dormirmos mais!

Doenças clínicas, psiquiátricas e distúrbios do sono
Muitas doenças clínicas podem levar à má qualidade, à baixa quantidade de sono ou à sonolência pela própria doença. O tratamento da sonolência, nesse caso, consiste em tratarmos a doença de base, que pode ser:



Doenças do sangue (anemias e baixa de ferro e vitamina B12).
Doenças endocrinológicas (tireoide, diabete, doenças da suprarrenal).
Doenças hepáticas (hepatites e cirroses).
Doenças renais (perda da função renal).
Doenças neurológicas (epilepsia, acidente vascular cerebral [AVC] e esclerose múltipla [EM]).7
As alterações psiquiátricas também precisam ser identificadas e tratadas de maneira farmacológica e/ou não farmacológica:
Transtorno de ansiedade generalizada (TAG).
Síndrome de estresse pós-traumático (TEPT).
Depressão.
Distimia.
Psicose.
Esquizofrenia.
Transtorno bipolar (TB).2,7
É importante salientar que o tratamento dos distúrbios psiquiátricos ajuda não somente na sonolência, mas também em outras alterações do sono, como nos pesadelos.



O tratamento dos distúrbios clínicos e psiquiátricos auxilia na melhora da sonolência e em outras alterações do sono, como os pesadelos.

• Uso de medicamentos ou de outras substâncias
Muitos medicamentos levam à sonolência, seja pela ação sedativa ou pela interferência na qualidade do sono, ocasionando um sono de má qualidade. A recomendação aqui é a retirada ou a troca dos medicamentos que causaram o efeito. Entretanto, caros leitores, nem sempre isso é fácil. Por exemplo, o uso de medicamentos para tratamento de distúrbios psiquiátricos pode levar à sonolência e não pode ser retirado facilmente. Nesse caso, a conversa entre os profissionais de saúde que acompanham o paciente é muito importante para discussão de possíveis opções, para a diminuição do impacto medicamentoso.2,7
Medicamentos/substâncias que levam à sonolência: Hipnóticos (fármacos Z e benzodiazepínicos [BZD]).
Alguns antidepressivos.
Alguns antipsicóticos.


Medicamentos para alergia.
Medicamentos para doenças neurológicas (epilepsia, Parkinson e cefaleia).
Álcool.
Medicamentos/substâncias que diminuem a qualidade do sono, com sonolência consequente:
Estimulantes.
Cafeína.
Medicamentos para pressão.
Hormônios (tireoide, testosterona, etc.).
Álcool.
O álcool tanto induz o sono, no início da noite, como piora sua qualidade no fim da noite.
No balanço geral, não é bom negócio tomar álcool em excesso para dormir, por prejudicar mais o sono do que ajudar!



Alterações do nosso ritmo circadiano
O tratamento dos distúrbios do ritmo circadiano depende do diagnóstico. O uso do diário de sono e da actigrafia pode ser muito importante na definição diagnóstica e no plano terapêutico.1,2,7
Abordaremos o tratamento detalhado de cada distúrbio de ritmo no Capítulo 13.
O tratamento dos distúrbios de ritmo circadiano que leva à sonolência é individualizado de tipo para tipo e de paciente para paciente.
Um conjunto de medidas farmacológicas e comportamentais é utilizado.




Sonolência de origem central
Após a exclusão das causas diferenciais de sonolência citadas, precisamos abordar possíveis doenças que levam à sonolência, como narcolepsia, síndrome de Kleine-Levin e hipersonolência idiopática.2 Caro leitor, para ter maior entendimento sobre a narcolepsia, leia atentamente o Capítulo 5.


As sonolências de origem centrais são raras e precisam de acompanhamento especializado!







Retrospectiva
A identificação das causas da sonolência é crucial para um tratamento eficaz, e a consulta médica franca é fundamental para entender os detalhes da vida e dos hábitos do paciente.
Doenças clínicas, distúrbios do sono e condições psiquiátricas podem causar sonolência e devem ser tratados para resolver esse problema.
Alterações nos ritmos circadianos exigem diagnóstico específico e planos terapêuticos individualizados.
Sonolência de origem central, como a narcolepsia, é rara e requer acompanhamento especializado.








Capítulo 7

Insônia


O que é insônia?
Este capítulo é dedicado a todos aqueles e, principalmente, aquelas que têm dificuldade de dormir, já que a insônia é mais comum nas mulheres. A palavra “insônia” significa falta de sono, e esse estado é considerado uma queixa comum no ambulatório de generalistas e especialistas. A insônia é caracterizada pelos seguintes atributos*, que sempre têm repercussões no dia seguinte:1
Dificuldade de iniciar o sono: a insônia pode ocorrer no início do sono, quando o paciente apresenta dificuldade para iniciá-lo. Uma demora para iniciar o sono (também chamada de latência do sono) maior que 30 minutos pode ser considerada como insônia inicial.1
Dificuldade de manter o sono: despertares mais longos e frequentes no meio da noite definem uma insônia de manutenção.1
Despertar precoce: um despertar precoce no meio da madrugada caracteriza uma insônia chamada de insônia terminal.1
*Não é incomum que mais de uma dessas formas de insônia esteja presente no mesmo paciente.
É muito importante lembrar que, no caso da insônia, a má qualidade e a baixa quantidade do sono resultam obrigatoriamente em queixas durante o dia, com danos físicos e emocionais, levando a prejuízos no desempenho das funções sociais e de memória.2
A insônia pode ser uma doença em si, denominada de transtorno da insônia, quando é o distúrbio principal, ou pode ser um sintoma, quando associada a outra causa, como a depressão. No passado, a insônia era vista somente como secundária a um


outro diagnóstico médico, necessitando de uma doença precipitante, que, quando corrigida, resolveria completamente todas as queixas do paciente. Atualmente, porém, a insônia comórbida é vista como um problema de saúde independente e que necessita de tratamento direcionado.1
A insônia é a dificuldade de iniciar ou manter o sono, além de um despertar muito precoce com repercussão negativa no dia seguinte.

A classificação das insônias
As pessoas com insônia não são todas iguais e nem apresentam as dificuldades de sono da mesma maneira; por isso, a classificação das insônias facilita entender as características e as dificuldades de sono de grupos de pessoas que têm um comportamento semelhante. A categorização de pessoas dentro dessas classificações facilita entender e estudar melhor cada um desses tipos de insônia, bem como o diagnóstico e o tratamento de cada um.2


A insônia pode ser classificada, conforme sua duração, em:2 Insônia do tipo aguda (curto período): é aquela que dura menos de quatro semanas e surge em resposta a fatores de estresse do tipo físico ou psicológico. Normalmente, ela se resolve sem necessidade de tratamentos específicos, e pode ser chamada de insônia transitória ou de ajustamento. Ela é decorrente de um fator precipitante causal, claramente identificável em um indivíduo com sono previamente normal, sem queixas anteriores, devendo durar alguns dias, até, no máximo, um mês. Fatores comumente encontrados são: demissão, viagem, prova, hospitalização ou ambiente de sono desconfortável. A insônia aguda se resolve após a retirada do fator estressor precipitante.1
A insônia do tipo crônica (longo período): caracterizada por dificuldade de cair no sono por mais de três vezes por semana e por mais de 3 meses consecutivos.2
As insônias crônicas caracterizam-se pela dificuldade de sono por 3 ou mais dias na semana e por mais de 3 meses consecutivos.

Sabia que a insônia é comum na população e sua frequência vem crescendo?


As insônias podem ainda ser classificadas, conforme sua origem, em:
Insônia primária
Tipo de insônia que tem duração maior do que 4 semanas e não tem causas determinadas. A insônia primária não está relacionada com doença mental, neurológica, clínica, uso de medicações ou abuso de substâncias e nem com outro transtorno do sono. Tem como principais características os sintomas de dificuldade de iniciar ou manter o sono, com despertares noturnos de longa duração, sono de má qualidade e sintomas diurnos, como fadiga e irritabilidade.2
Esse tipo de insônia ainda pode ser dividido em:
• Insônia primária psicofisiológica
É também chamada de aprendida, sendo um estado no qual o paciente manifesta aumento do alerta e ansiedade relacionada ao ato de dormir. Qualquer fator ou situação pode ser motivo para a dificuldade para dormir, como a luz fraca da televisão acessa, o relógio, qualquer som diferente, ronco, movimentos do esposo ou esposa na cama, além de qualquer estímulo, mesmo que de pequena intensidade.2 Assim, desencadeia no paciente pensamentos muito negativos e repetitivos na hora de dormir, como:




Não vou conseguir dormir.
Amanhã me sentirei muito mal.
Se não dormir agora, vou ficar mal no trabalho amanhã.
Não durmo bem há 1 semana e não vou dormir hoje também...

• Insônia primária idiopática ou transtorno de insônia
É um transtorno com causas ainda a serem descobertas. Normalmente, a insônia idiopática se inicia na infância, persistindo durante a vida adulta. Há, geralmente, história familiar, o que sugere um forte fator constitucional e, bem possivelmente, genético.2
• Insônia primária paradoxal
Está relacionada com a percepção inadequada do sono. O paciente tem a percepção de que não dorme nada ou de que dorme muito pouco durante noites ou até semanas seguidas. Entretanto, sabemos que é impossível ficarmos sem dormir por um tempo tão longo e nos mantermos vivos e funcionais. Nesse caso, os pacientes com insônia paradoxal dormem, o que é comprovado por exame de polissonografia, mas têm a percepção de que ficaram acordados.2


O mecanismo que leva esses pacientes a esse estado de impercepção de sono não é conhecido. Aparentemente, estão envolvidos, componentes constitucionais, substrato neurobiológico (como alerta aumentado), componentes ansiosos, além de fatores comportamentais e cognitivos (percepção inadequada do tempo total de sono).
Insônia secundária
Apresenta um agente causal como principal fator responsável pela insônia. A característica principal desse tipo é a relação causal direta e temporal, que, uma vez eliminada, ocorre, consequentemente, o desaparecimento da insônia.2
Insônia associada ou comórbida
Definida quando o sintoma insônia ocorre concomitantemente com outros fatores associados e pode estar associada a depressão, ansiedade, doenças clínicas, uso de substâncias ou de medicamentos. Os transtornos do sono e do ritmo vigília-sono também podem estar associados às insônias comórbidas, como síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS).2
A avaliação do paciente com insônia
Preste muita atenção nesta parte, caro leitor, especialmente se sua dificuldade de dormir tem uma duração em tempo maior que 4 semanas. Todo paciente com dificuldade de dormir por mais de 4 semanas deve ser avaliado por um médico com experiência em Medicina do Sono. Problemas de saúde importantes podem levar à insônia crônica.1


A abordagem do médico deve se iniciar com uma avaliação detalhada de cada caso. Nenhum paciente é igual a outro! É preciso que haja uma avaliação das queixas das dificuldades de dormir e de outras doenças que podem estar associadas, como distúrbios psiquiátricos, outras doenças e uso de substâncias.21
Além disso, é fundamental o conhecimento detalhado dos sintomas, como início e perpetuação da insônia, tratamentos já realizados e definição das repercussões durante o dia, como cansaço, fadiga, sonolência excessiva, redução de atenção, concentração e memória.1
É muito importante o relato de um familiar ou do companheiro(a) do paciente, para obtermos informações sobre ronco, irregularidades respiratórias ou qualquer movimento relacionado ao sono.21
O uso de questionários ou diário do sono pode trazer informações adicionais relevantes. Rotineiramente, os exames de estudo do sono, como a polissonografia, não são realizados. Entretanto, em casos em que a insônia de manutenção pode estar associada a outras doenças do sono, como a SAOS, ela deve ser solicitada.1,21
Todo indivíduo com insônia há mais de 4 semanas deve procurar ajuda. Nos próximos capítulos, discutiremos as causas da insônia e os tratamentos existentes.



Retrospectiva
A insônia é mais comum em mulheres e é caracterizada pela dificuldade de iniciar, manter o sono ou despertar cedo demais durante a madrugada, causando impacto no dia seguinte. Pode ser uma doença independente, denominada transtorno da insônia, ou um sintoma de outra condição, como a depressão.
As insônias primárias não têm causas determinadas, não estão relacionadas a doenças mentais ou físicas e podem ser divididas em três tipos: psicofisiológica, idiopática e paradoxal.
A avaliação de pacientes com insônia deve ser realizada por um médico especializado em Medicina do Sono e inclui análise detalhada das queixas, do histórico médico, de tratamentos anteriores e do impacto dela durante o dia.
O uso de questionários e diários do sono pode fornecer informações adicionais.








Capítulo 8

Causas da insônia


Quais são os fatores de risco para a insônia?
Costumo dizer que tem insônia quem pode, não quem quer. Existem alguns fatores que predispõem ao desenvolvimento de insônia, como:2
• Gênero
As mulheres têm mais probabilidade de desenvolver insônia, principalmente depois da maternidade. Uma das teorias para a grande incidência de insônia em mães é a de que elas desenvolveram, durante a evolução da humanidade, a capacidade de ficar mais atentas ao choro e às necessidades dos bebês e crianças durante a noite. Essa capacidade garantiu a perpetuação da espécie, mas também fez com que as mulheres, em específico as mães, desenvolvessem maior probabilidade de ter insônia.
• Idade
Com o avançar da idade, dormimos menos e temos sono mais superficial, sendo que com mais de 60 anos, a prevalência de insônia é muito maior. Nessa idade, temos maior chance de doenças e comorbidades associadas, que aumentam a prevalência de insônia.
• Saúde mental
Transtornos clínicos e psiquiátricos predispõem à perpetuação da insônia. A combinação dos próprios transtornos, das medicações em uso e das complicações aumenta o risco de insônia.



• Níveis de estresse
O estresse prolongado e excessivo pode levar à insônia crônica.
• Rotina
A falta de rotina, o trabalho em turno e as viagens prolongadas podem potencializar o risco de insônia.
• Uso de certos fármacos e substâncias
Algumas substâncias podem dificultar o sono. Exemplos comuns são os estimulantes, que naturalmente inibem o sono quando tomados próximos ao horário de dormir, como bebidas com cafeína (refrigerantes e chás); narcóticos; diuréticos que fazem o indivíduo levantar várias vezes à noite para ir ao banheiro; medicamentos para emagrecer; pó de guaraná, entre outros. É importante que o paciente leve para o consultório o nome da substância consumida e relate toda a rotina de seu uso para uma avaliação detalhada em consulta.
• Dor
A dor é um fator que predispõe à perda do sono. Pacientes com queixas de dores durante a noite, seja por alterações ortopédicas, reumatológicas, oncológicas, neurológicas ou outras, possuem muito frequentemente dificuldade de iniciar e manter o sono. A não melhora do quadro da dor impossibilita um completo tratamento para melhora da insônia.




Os principais fatores relacionados com a insônia são:
gênero, idade, saúde mental, dificuldade no controle do estresse, falta de rotina, uso de certos fármacos ou substâncias e dor noturna.

Quais são as consequências da insônia?
As consequências da falta de sono podem ser facilmente vistas após uma noite em claro, mas podem ser mais difíceis de se identificar no caso de pacientes com insônia de longa data. Isso ocorre porque nos adequamos à falta de sono, mas com grande prejuízo para o organismo.22
Pagamos um preço alto por não dormirmos bem! A insônia está associada a muitos efeitos indesejáveis, como distúrbios na parte física, descontrole emocional, alterações do humor, aumento da ansiedade e irritabilidade, além da dificuldade de concentração e de memorização.23
Os indivíduos com insônia apresentam risco aumentado em duas vezes para transtorno de ansiedade, quatro vezes para depressão e em sete vezes para o abuso de substâncias (álcool, substâncias alucinógenas, entorpecentes e sedativos).
O uso crônico dos hipnóticos, conhecidos como benzodiazepínicos (BZD) e fármacos Z, tem sido apontado por alguns estudos como responsável pelo aumento do risco de desenvolvimento de demência, de quedas e de fraturas.24


As pessoas com insônia apresentam, também, maior risco de desenvolver complicações cardiovasculares, como hipertensão arterial (HTA), infarto agudo do miocárdio (IAM) e acidente vascular cerebral (AVC).22

A insônia leva a prejuízos físicos e mentais, como alteração emocional, mau humor, ansiedade, irritabilidade, impulsividade, perda de concentração e problemas de memória.
Mecanismos que levam à insônia
Os mecanismos que levam à insônia crônica são complexos e multifatoriais. Ela depende da soma de condições que potencializam e perpetuam a dificuldade de sono e que são divididas em fatores predisponentes, desencadeantes e perpetuantes 25 (Tabela 8.1).
Tabela 8.1. Exemplos de fatores relacionados à insônia crônica
Predisponentes
Idosos
Gênero feminino
História familiar
Distúrbios do humor
Desencadeantes
Divórcios e brigas
Atritos familiares
Dor crônica
Trabalho de turno
Perpetuantes
Uso abusivo de álcool
Uso de medicações
Doença crônica
Uso de estimulantes
Fonte: elaboração do autor.


O desenvolvimento da insônia crônica é um processo que deve ter algumas etapas bem conhecidas. Normalmente, a pessoa que desenvolve a insônia crônica possui uma predisposição familiar ou genética, embora esse fato não seja obrigatório.
Em pessoas com predisposição de desenvolver a insônia, ocorre um fator agressor (físico e psicológico), que inicia a dificuldade de dormir. Na maioria dos casos, essa insônia melhora após algum tempo. Entretanto, no caso da insônia crônica, fatores chamados de perpetuantes mantêm a dificuldade de dormir em um ciclo vicioso.25
Exemplos de insônia crônica
• Caso 1
Dona Maria (nome fictício), de 67 anos, ficou viúva há 8 meses. Logo após a morte do esposo, começou a ter dificuldade de pegar no sono, acordava de madrugada e não conseguia dormir mais. Teve histórico de insônia quando tinha 45 anos, que melhorou com o uso de medicação para depressão. Dois meses após a morte do esposo, escorregou, quebrou o fêmur e relatou piora do sono devido à dor, tendo desenvolvido insônia crônica.
Fatores predisponentes: passado de insônia, idosa e mulher.
Fator desencadeante: perda do esposo.
Fatores perpetuantes: fratura de fêmur com dor e ficar acamada.



Repare que, na fratura de fêmur, podemos ter a dor e a perda da regulação do ciclo claro e escuro pela luz natural, que é fundamental para o sono de qualidade, conforme visto no Capítulo 1.

• Caso 2
Senhora Raquel (nome fictício), de 42 anos, sem antecedente de insônia, procurou serviço médico por dificuldade no sono e muitos despertares nos últimos 6 meses. Sem outras doenças; a mãe tinha insônia de longa data. Há 1 ano, com divórcio não amigável, evoluiu com consumo progressivo de álcool (quatro doses de destilada por dia) e piora do sono, com despertares frequentes.
Fatores predisponentes: história familiar e mulher.
Fator desencadeante: divórcio.
Fator perpetuante: uso de álcool.





• Caso 3
Não podemos desconsiderar a possibilidade de um quadro de depressão associado, que poderia entrar como um fator predisponente também neste caso.
Senhora Eunice (nome fictício), de 72 anos, com queixa de dificuldade de iniciar e manter o sono há 12 meses. Antecedente de inchaço e dor nas pernas, iniciando medicamentos do tipo diurético e analgésicos no início dos sintomas, com aumento da necessidade de ir ao banheiro à noite e sono agitado.
Fatores predisponentes: mulher e idosa.
Fator desencadeante: dor crônica.
Fator perpetuante: uso de medicamentos.
Além do diurético, que predispõe a levantar para ir ao banheiro, precisamos checar qual tipo de analgésico foi prescrito.

Muitas apresentações de analgésicos têm cafeína para potencializar o efeito, com piora da qualidade do sono.


Retrospectiva
Fatores de risco para a insônia incluem ser do gênero feminino, ter idade acima de 60 anos, presença de doenças clínicas ou psiquiátricas, excesso de estresse, falta de rotina, uso de medicamentos ou substâncias e dor.
As consequências da insônia envolvem distúrbios físicos, emocionais e mentais, como alterações no humor, aumento da ansiedade, depressão, dificuldade de concentração e de memorização.
A insônia está associada a um risco aumentado de transtorno de ansiedade, depressão, abuso de substâncias, complicações cardiovasculares e risco de demência.
Os mecanismos que levam à insônia são complexos e incluem fatores predisponentes, desencadeantes e perpetuantes.








Capítulo 9

Tratamento da insônia


O tratamento da insônia nem sempre é fácil, caro leitor. Você já percebeu que ela possui muitas causas diversas, precisando de cuidado individualizado e multidisciplinar.2
Neste capítulo, discutiremos os tratamentos não farmacológicos para a insônia e teremos uma conversa sobre o tratamento com medicamentos.
Tratamento não farmacológico
O tratamento mais efetivo da insônia é a terapia cognitivo-comportamental (TCC), que é um conjunto de orientações comportamentais que visa promover mudanças no pensamento e nos credos do paciente, focando em mudanças emocionais e comportamentais duradouras.26
O diário do sono é uma ferramenta importante para monitoramento dos efeitos da TCC. Todos os horários em que o paciente dorme devem ser marcados na manhã seguinte:
O horário em que vai para a cama.
A hora em que adormece.
Quantas vezes e por quanto tempo fica acordado no quarto.
Se sai do quarto e o que vai fazer (ir ao banheiro, comer, ver televisão, mexer no celular, etc.).
Quando acorda.
Que horas se levanta.
Se fez cochilos durante o dia.
O paciente deve anotar também os pensamentos que passam pela cabeça enquanto fica acordado; e todas as atividades realizadas antes de se deitar. O diário de sono facilita


a percepção do paciente do que está acontecendo em sua noite para modificar os comportamentos inadequados.26
Por meio do diário do sono, o terapeuta consegue informações sobre quanto tempo o paciente dorme ou fica acordado durante a noite, caracterizando a eficiência do sono (tempo total de sono/tempo em que ficou na cama x 100, em %), o período de latência do sono (tempo que demora para adormecer depois de se deitar, em minutos), a regularidade nos horários de dormir e acordar na semana e nos fins de semana, além de quantificar os cochilos durante o dia.26
O diário do sono é muito importante na TCC com papel-chave na monitorização e na percepção do sono pelo paciente e pela equipe que é responsável pelo tratamento da insônia.

A TCC para o tratamento de indivíduos com insônia busca diminuir e abolir hábitos e crenças incorretas que prejudicavam o sono e levavam o indivíduo a permanecer acordado, num ciclo vicioso. O paciente com insônia apresenta sensação de que os pensamentos não param, como se sofresse uma ameaça constante, necessitando permanecer em vigília para se proteger.26


São várias as formas de aplicação da TCC (individual e em grupo), de apresentação (internet, livro e presencial), de duração do tratamento (número de sessões) e de profissional a conduzir as sessões (psicólogo, enfermeiro, médico ou assistente social). O objetivo da TCC é aumentar o tempo e melhorar a qualidade de sono do paciente.26
Essa terapia é um conjunto de medidas, que serão descritas a seguir, como: .
Higiene do sono.
Controle de estímulos.
Relaxamento.
Estratégia de restrição do sono.
Terapia cognitiva.
• Higiene do sono
As recomendações de higiene do sono são explicadas detalhadamente para o paciente e monitorizadas durante todo o tratamento:26
Verificar se o quarto é escuro e silencioso. O som do relógio e a luz do despertador podem causar a interrupção do sono, com sensação de insônia. Pode-se usar máscara de dormir, tampões de ouvido ou cortinas escuras para ajudar no sono.
Checar se a temperatura do quarto está adequada. Muito frio ou calor atrapalha o sono.
Dormir o tempo necessário para se sentir bem e sem sonolência (ao redor de 7 a 8 horas por dia, em adultos).




Fazer refeições leves antes de dormir, que incluam queijo, leite e bolo. Esses alimentos têm substâncias que auxiliam no sono.
Evitar trabalhar na cama. Isso confunde o organismo e pode potencializar ou piorar um quadro de insônia.
Sair da cama assim que acordar.
Ter um horário regular de sono, como despertar e ir dormir.
Não forçar o sono.
Não consumir bebidas com cafeína após as 15h.
Não consumir substâncias ilícitas nem estimulantes no período noturno.
Diminuir os estímulos do quarto (menos luminosidade, evitar televisão ou rádio).
Evitar uso de aparelhos com emissão de luz ao se deitar (telas).
Solucionar assuntos estressantes antes de se deitar.
Manter exercícios regulares, sendo que o período entre os exercícios e o sono deve ser de, pelo menos, 4 a 5 horas.
Não cochilar durante o dia, especialmente sonecas de mais de 20 minutos ou no fim do dia e início da noite.




As medidas de higiene do sono são muito importantes para um sono de qualidade e devem ser seguidas por todos. Importante lembrar de não levar os problemas para a cama!

• Terapia de controle de estímulos e de restrição de sono Essas terapias têm abordagens semelhantes, pois ambas propõem que o paciente deve ir para a cama somente quando estiver com sono. Caso se deite e o sono não venha, em 15 a 20 minutos sem conseguir dormir na cama, o paciente deve se levantar, ir para fora do quarto e iniciar atividades calmas, até que a sonolência retorne.27




Fique na cama somente durante o sono. Evite ficar “fritando” na cama!
Caso não consiga dormir, saia da cama, espere o sono voltar e, então, retorne para a cama.




• Terapia de relaxamento e de biofeedback
As técnicas de relaxamento visam reduzir os estímulos e a ansiedade, que prejudicam o início do sono. Algumas delas são:
Auto-hipnose.
Relaxamento.
Exercícios de respiração profunda.
Biofeedback.
Meditação.
Essas técnicas devem sempre estar relacionadas com as medidas de TCC.27
Técnicas de relaxamentos ajudam e devem sempre fazer parte das medidas da TCC.

Tratamento farmacológico
Deve haver sempre uso criterioso dos medicamentos para induzir o sono (hipnóticos) e que melhoram a ansiedade (ansiolíticos). Esses medicamentos devem ser utilizados na menor dose e tempo possíveis.26


Sempre devemos pesar os custos/benefícios do tratamento escolhido, buscando equilíbrio entre a qualidade do sono, as funções durante o dia seguinte e os efeitos adversos (dependências física e psicológica com o uso a longo prazo) desses medicamentos.26
O uso de medicamentos para o tratamento de insônia deve ser uma opção médica após avaliação detalhada e conversa com cada paciente. Os detalhes sobre os medicamentos, seus efeitos colaterais e ações, devem ser esclarecidos e monitorizados em consultas médicas. Cada paciente terá benefício no tratamento de acordo com seu tipo de insônia e suas características individuais, por esse motivo, o tratamento farmacológico deve ser uma escolha médica feita após deliberação minuciosa de todos os detalhes compartilhados pelo paciente em suas consultas.
Em pacientes com comorbidades, como depressão e ansiedade, a primeira escolha pode estar num fármaco antidepressivo. Caso o quadro seja de psicose, o tratamento com antipsicóticos com características sedativas é recomendado. O uso dos agonistas da melatonina está indicado em pacientes com insônia inicial mais leve e àqueles com distúrbios do ritmo circadiano, que serão abordados adiante neste livro.
É importante salientar para o leitor que a melatonina não é um tratamento de insônia, mesmo nos dando boas respostas clínicas com o uso no tratamento dos transtornos de ritmos circadianos, por ter uma ação sedativa pequena, principalmente nas doses baixas, como deve ser prescrita nas alterações de ritmo.26
O uso de fitoterápicos não está recomendado rotineiramente, pelo risco de efeitos adversos e por existirem poucos estudos avaliando esses medicamentos. Os antagonistas de orexina ainda não estão disponíveis no Brasil.


A seleção de esquemas apropriados de medicação adaptados às necessidades de cada paciente é fundamental para o correto controle da insônia. O tratamento das causas subjacentes e a abordagem não farmacológica são fortemente recomendados. Em termos gerais, devem-se iniciar as medidas não farmacológicas para todos os pacientes que apresentam diagnóstico de insônia.26
O uso de medicamentos para induzir o sono deve ser muito cuidadoso e sempre acompanhado por um médico.

O risco de efeitos adversos e complicações para a saúde é uma realidade nesse tipo de tratamento. Não se medique sozinho, sempre procure ajuda!




Retrospectiva
O tratamento da insônia é complexo e individualizado, envolvendo abordagens não farmacológicas e farmacológicas. O tratamento sem uso de fármacos pode ser por TCC, de controle de estímulos ou de restrição de sono.
O tratamento farmacológico da insônia deve ser usado com cautela, com doses mínimas e por um curto período.
A escolha do tratamento farmacológico depende da comorbidade e das necessidades do paciente, e as causas subjacentes devem ser tratadas simultaneamente.









Sonambulismo e outras parassonias Capítulo 10


Meu filho anda à noite. O que é isso?
Caro leitor, não é de espantar que muitos de vocês me façam essa pergunta. A razão para isso é que a prevalência de parassonias, que são comportamentos ou reações involuntárias que ocorrem durante o estado de sono, 1 como o sonambulismo, pode chegar até 25% da população durante a infância e até 4% dos adultos. Então, vamos defini-las para entendê-las melhor!2

O sonambulismo é uma parassonia (comportamentos anormais durante o sono).
As parassonias são classificadas dependendo do estágio do sono em que ocorrem:
Parassonias relacionadas com o sono non-rapid eye movement (NREM):
Transtornos do despertar:
Despertar confusional.
Transtorno de comportamento sexual durante o sono.
Transtorno de comportamento alimentar durante o sono.


Sonambulismo.
Terror noturno.
Parassonias relacionadas com o sono rapid eye movement (REM):1,2
Transtorno comportamental do sono REM.
Paralisia do sono.
Pesadelos recorrentes.
Sonilóquio.

As parassonias são classificadas conforme a fase do sono em que ocorrem: do sono NREM e do sono
Parassonias do sono NREM
As parassonias do sono NREM (que ocorrem, na sua maioria, na fase de sono profundo [N3]) são mais comuns em crianças, tendem a desaparecer com a idade e são benignas (não afetam a qualidade do sono nem têm relação com doenças neurológicas). O diagnóstico é clínico e, normalmente, não se pedem exames complementares, exceto em casos especiais.2


• Despertar confusional
É caracterizado pela confusão mental ou comportamental no momento de um despertar a partir de um sono NREM, normalmente na primeira parte da noite ou pela manhã. Podem ocorrer desorientação no tempo e no espaço, fala arrastada e dificuldade de reagir aos estímulos externos.
Ocorre, ainda, a perda de memória do evento. Os episódios duram, em média, 5 a 15 minutos e podem ser mais prolongados se os parentes tentarem consolar a criança. A maioria dos pacientes inicia os sintomas antes dos 5 anos de idade. O quadro é benigno e autolimitado, e alguns pacientes desenvolvem sonambulismo na adolescência. A variante do adulto pode persistir durante longo tempo e apresentar comportamentos automáticos e inapropriados. É importante ressaltar a associação dos transtornos do despertar com distúrbios de sono no adulto, como a apneia obstrutiva do sono.1
• Sonambulismo
O sonambulismo é a parassonia do sono NREM mais conhecida. Também ocorre durante o sono N3, chamado muitas vezes de sono de ondas lentas. Os episódios são caracterizados por comportamentos motores que se iniciam abruptamente a partir do sono N3 com confusão mental e amnésia. Ocorrem comportamentos automáticos, como sentar-se na cama, levantar-se e até andar com olhos abertos, vidrados e com expressão facial vaga e distante, sem medo ou terror. É mais comum em crianças entre 5 e 15 anos de idade. A duração dos episódios pode variar de minutos a horas, e há amnésia total ou parcial do evento. O histórico familiar é muito forte, com 25% de chance se o pai ou a mãe forem sonâmbulos e de 50% se ambos tiverem a parassonia.1


• Terror noturno
O terror noturno é uma parassonia mais complicada, do ponto de vista do estresse da família. É caracterizado por um despertar confusional súbito nas primeiras horas da noite, quando o paciente se senta na cama e dá grito estridente com intensa ativação do sistema de estresse (aumento da frequência cardíaca e da respiração, além de vermelhidão da pele e aumento do suor), além de expressão de extremo terror. Os episódios duram de 5 a 20 minutos e, em geral, o episódio piora quando o paciente é estimulado no decorrer do evento. Geralmente, ocorre perda de memória do evento. É mais comum na infância, com pico entre 4 e 12 anos de idade, mas também pode persistir ou iniciar na idade adulta.1
O tratamento medicamentoso para as parassonias do sono NREM geralmente não é necessário, porém podem ser usados benzodiazepínicos (BZD), antidepressivos tricíclicos e inibidores da recaptação da serotonina, em casos selecionados.
Muito importante é o controle do ambiente na noite das pessoas com essas parassonias. Fechamento de portas e janelas e retirada de tapetes e mesas no caminho, além de orientação da família, são medidas importantes para evitar acidentes.2

As parassonias do sono NREM são mais comuns na infância, evoluem com melhora espontânea com a idade e o tratamento consiste em cuidados do ambiente ao redor da criança durante o sono, para evitar acidentes.


Parassonias do sono REM
As parassonias do sono REM são mais comuns em idosos, tendem a ser contínuas e podem não ser benignas (podem estar relacionadas com doenças degenerativas do sistema nervoso central [SNC], como Parkinson). O diagnóstico é clínico e, normalmente, precisamos de exames complementares para confirmá-lo.2
• Transtorno comportamental do sono REM
O transtorno comportamental do sono REM geralmente ocorre em homens acima de 50 anos, podendo manifestar-se também em mulheres e indivíduos mais jovens. Observa-se que, durante o sono REM, a paralisia muscular que nos protege durante os sonhos é perdida. Assim, os pacientes começam a ter movimentos durante os sonhos (viver os sonhos com ações), causando lesões no próprio paciente ou no companheiro. Em alguns casos, podem ser causadas por substâncias como hipnóticos, antidepressivos tricíclicos, anticolinérgicos, inibidores de recaptação de serotonina e uso de álcool.1
Há associação do distúrbio comportamental do sono REM com doenças degenerativas como:
Doença de Parkinson (DP).
Atrofia de múltiplos sistemas (AMS).
Demência por corpos de Lewy (DCL).
Porém, nem todos os casos evoluirão com doenças degenerativas. O distúrbio comportamental do sono REM pode estar relacionado com o uso de antidepressivos sem maiores riscos com outras doenças. O tratamento medicamentoso


tem como fármaco mais utilizado o clonazepam, com taxas de sucesso de até 90%, podendo também ser utilizada a melatonina no controle dos comportamentos.1
• Paralisia do sono
A paralisia do sono pode estar presente na população geral em até 17%, de maneira esporádica. Por isso, não se assuste se já tiver vivenciado algum episódio. Trata-se de uma incapacidade de realizar movimentos voluntários no início do sono ou ao despertar. Durante o evento, há incapacidade de falar ou se mover, com a preservação da consciência, assustando muito a pessoa durante o momento.
A duração é de segundos a minutos e, com frequência, é variável. Os ataques costumam parar espontaneamente, mas podem ser interrompidos por um estímulo, como ser tocado. Fatores predisponentes observados são falta de sono, estresse, medicações hipnóticas e transtorno bipolar.1
• Pesadelos
Os pesadelos são mais prevalentes em crianças, principalmente naquelas que têm entre 6 e 10 anos, mas diminuem com a idade. Entretanto, os pesadelos podem estar relacionados ao estresse pós-traumático, após eventos físicos e psíquicos, em qualquer idade. Os eventos causam sensação de medo, terror e/ou ansiedade. São comuns em pacientes que usam certas classes de medicamentos:
Anticolinérgicos.
Betabloqueadores.
Fármacos para tratamento do Parkinson.
Antidepressivos tricíclicos.


Anfetaminas.
Lítio.
Os pesadelos levam ao despertar completo, e a sua lembrança é geralmente conservada. Os tratamentos utilizados são psicoterapia e técnicas de relaxamento. Alguns medicamentos também podem ajudar.1
• Sonilóquio
O leitor deve estar se perguntando sobre falar à noite. Certo?
Pois está aqui a resposta: sonilóquio é o que chamamos de falar dormindo. É muito prevalente na população em geral e pode ser desencadeado em períodos de maior perda de sono. Normalmente, o sonilóquio é benigno (sem risco de desenvolver outras doenças) e limitado no início da noite. Essa parassonia é geralmente de fases de sono mais superficiais, como o sono superficial (N1) e o intermediário (N2).2
O distúrbio comportamental do sono REM é uma parassonia do sono REM,
mais comum em homens com mais de 50 anos e está associado a uma maior chance de evolução de doenças degenerativas do sistema nervoso central.



Retrospectiva
As parassonias são classificadas em: relacionadas ao sono NREM ou ao REM.
As parassonias relacionadas ao sono NREM são mais comuns em crianças, são benignas e tendem a desaparecer com a idade. Incluem despertar confusional, transtorno de comportamento sexual durante o sono, transtorno de comportamento alimentar durante o sono, sonambulismo e terror noturno.
O tratamento para NREM raramente é farmacológico.
As parassonias relacionadas ao sono REM são mais comuns em idosos e podem persistir. Elas incluem despertar confusional, transtorno de comportamento sexual e de comportamento alimentar durante o sono, sonambulismo e terror noturno.
O tratamento para REM frequentemente envolve uso de fármacos.
O sonilóquio, que é o ato de falar dormindo, é geralmente benigno.









Síndrome da apneia obstrutiva do sono Capítulo 11


O que é a síndrome da apneia obstrutiva do sono?
Caro leitor, este capítulo ganha muita importância pela alta frequência com que encontramos a síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS) no mundo. Essa síndrome acontece quando temos episódios repetidos de obstrução total ou parcial das nossas vias aéreas altas durante o sono. A prevalência da SAOS aumenta com a idade, sendo mais comum em homens obesos, com algumas alterações na estrutura do rosto, em algumas doenças clínicas e no uso de medicamentos, como naqueles que relaxam os músculos da respiração durante a noite.2
Estudos têm demonstrado que mais de 30% dos adultos na população geral podem ter SAOS. Isso mesmo! Um terço dos adultos com esse distúrbio do sono!28
Vamos entender um pouco mais sobre essa doença?
A SAOS é muito comum na população, sendo caracterizada por repetidos episódios de fechamento total ou parcial das nossas vias aéreas altas,

com diminuição da oxigenação do sangue durante o sono.


Quais as causas da SAOS?
O mecanismo da SAOS é complexo e multifatorial. A predisposição genética é conhecida, e as características craniofaciais contribuem muito para o desenvolvimento da doença. A humanidade iniciou uma mudança anatômica há milhares de anos, com impacto direto em nossa via aérea superior (VAS). Houve uma mudança do ângulo entre as partes horizontal e vertical da VAS, por um encurtamento da face e pela descida da laringe.2
Com essas modificações evolutivas da anatomia da face e das vias aéreas, houve melhor adaptação para desenvolvimento da fala e da linguagem, entretanto, com maior risco de desenvolvimento de SAOS. É importante salientar que a síndrome é uma exclusividade da espécie humana.2
O gênero masculino possui mais prevalência de SAOS. Isso se deve ao fato de a testosterona predispor à SAOS, enquanto a progesterona e o estrogênio protegem dela. Assim, a SAOS é pouco frequente em mulheres na idade fértil. Entretanto, após a menopausa e com a perda do fator hormonal, sua prevalência na população feminina cresce até que, aos 60 anos, é igual no homem e na mulher.2
Outro fator de risco importante para o desenvolvimento da SAOS é a obesidade. Com o aumento do peso, há aumento da gordura no pescoço, ao redor das VAS, com maior risco de fechamento das vias durante o sono. Além disso, com a obesidade, há uma menor capacidade de respiração, já que o abdômen globoso impede que tenhamos toda a incursão torácica e menor capacidade respiratória.2
Pacientes com problemas cardíacos e renais também têm maior chance de terem SAOS. Normalmente, esses pacientes acumulam muito líquido no organismo, e, ao se deitarem para


dormir, esse excesso de volume se desloca para os vasos do pescoço e para a própria via aérea, ocorrendo maior fechamento dessas vias.2
Com o envelhecimento e lesões neurológicas encontradas em pacientes após o acidente vascular cerebral (AVC), por exemplo, temos dificuldade no controle dos músculos da garganta e de todas as vias aéreas, com maior chance de fechamento e SAOS durante a noite. As avaliações de pacientes após AVC na fase aguda indicam que cerca de 70% apresentam a doença.7
As causas da SAOS são muitas.
Obesidade, gênero masculino, envelhecimento e alteração na morfologia da face são fatores marcantes da doença.

Como sei se tenho SAOS?
Boa pergunta! Vamos ver com detalhes para confirmar se você se enquadra. Pacientes com SAOS normalmente apresentam ronco e, muitas vezes, barulho demais e agitação ao


dormir. O esforço para vencer a resistência das vias aéreas leva a um evento chamado de respiração de ressuscitação, que é como se estivesse saindo de um afogamento. É comum também:1
Aumento do suor noturno.
Maior insalivação durante o sono.
Despertar engasgado.
Maior frequência de visitas ao banheiro, no meio da noite, para urinar.
Além disso, muitas consequências de um sono fragmentado e de má qualidade por conta da SAOS trazem repercussões durante o dia, como sonolência, perda de memória, irritabilidade e dificuldade de concentração, assim como alteração do apetite e do desempenho sexual.7



Roncos, despertares com engasgo, pesadelos com afogamento, agitação, necessidade de urinar durante a noite e excesso de suor noturno são comuns em pacientes com SAOS.
As consequências da SAOS
O fechamento frequente das vias aéreas nessa doença leva a uma diminuição da oxigenação em todo o corpo, incluindo o cérebro, além do estresse durante a noite, no esforço para respirar. Além disso, durante a SAOS, ocorrem muitos despertares de curta duração, que, em geral, não são percebidos pelo paciente e levam a um sono muito fragmentado e mais superficial (Figura 11.1).
F4 – A1
C4 – A1
O2 – A1
Referência ocular esquerda
Referência ocular direita
EMG de mento
Eletrocardiograma
EMG de perna esquerda
EMG de perna direita Microfone para ronco
Sensor termostático de fluxo aéreo
Sensor pressórico de fluxo aéreo
Cinta torácica
Cinta abdominal
Saturação de oxigênio

*Setas em vermelho com falta de fluxo aéreo e setas em azul com aumento do esforço torácico.
SAOS: síndrome da apneia obstrutiva do sono; EMG: eletromiografia.
Figura 11.1. Polissonografia com eventos de SAOS
Fonte: elaboração do autor.




Os pacientes com SAOS possuem:29
Risco aumentado de doenças do coração.
Aumento da pressão arterial (PA).
Sonolência durante o dia.
Aumento do risco de acidentes de trabalho e de trânsito.
Alterações de humor e memória.
Mais risco de diabetes.
Essa síndrome é reconhecida como importante fator reversível de risco de infarto e AVC, junto da hipertensão arterial sistêmica (HAS), da obesidade, do diabetes, dos problemas cardiovasculares, da dislipidemia e do sedentarismo.7
O estresse oxidativo resultante dos eventos das pausas respiratórias e da queda da oxigenação sanguínea está relacionado ao aumento da resistência periférica, conforme a ação da insulina e o aumento da chance de desenvolver diabetes. Além disso, hormônios de estresse, liberados com frequência durante os episódios de pausas respiratórias durante a noite, e a desorganização na liberação de hormônios, como o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), também predispõem a um aumento dos níveis de glicose no sangue, além de aumento de peso, que, por sua vez, contribui para o aumento do risco de desenvolver diabetes.29
As pausas respiratórias durante o sono ocorrem de forma repetitiva: há queda da oxigenação sanguínea, aumento do gás carbônico, aumento do esforço respiratório e diminuição da pressão torácica negativa com aumento do retorno venoso e deslocamento das câmaras do coração.7




Durante as pausas respiratórias, há redução da pressão arterial sistólica (PAS) e dos batimentos cardíacos, e o oposto é visto nos despertares após as pausas. As muitas alterações na frequência cardíaca aumentam a chance de arritmias cardíacas. Em particular, a fibrilação atrial é a arritmia cardíaca mais frequente nos pacientes com SAOS. Esse tipo de arritmia aumenta muito o risco de desenvolvimento de AVC.7
Os pacientes com SAOS apresentam:7
Mais liberação de substâncias de estresse.
Aumento de marcadores da inflamação.
Aumento da coagulação.
Alterações no controle cardíaco e na pressão arterial.
A soma das alterações no organismo causadas pela síndrome leva a um risco de duas a cinco vezes maior de desenvolver AVC e infarto agudo do miocárdio.7
Além disso, cerca de um a cada quatro pacientes com SAOS tem redução da libido e/ou impotência sexual, que podem ser explicadas por alterações hormonais e vasculares, com disfunção do endotélio, que é o revestimento interno dos vasos que produzem substâncias essenciais para o bom funcionamento sexual.2
Os pacientes com essa doença apresentam dificuldades de memorização e de realização de funções mentais de maneira geral. Estudos têm demonstrado que pacientes que se encaixam no quadro clínico da doença apresentam maior risco de desenvolver perda de neurônios na região do cérebro responsável pela memória (hipocampo). Outros autores demonstram que pacientes com SAOS possuem maior risco de desenvolverem demências, como a doença de Alzheimer (DA).2


A SAOS é importante fator reversível de risco de infarto e AVC, junto da HAS, da obesidade, do diabetes, dos problemas cardiovasculares, da dislipidemia e da obesidade.

O diagnóstico da SAOS
Esse diagnóstico depende de um exame de polissonografia, que monitora muitos parâmetros do organismo de maneira simultânea durante a noite1 (Capítulo 1).
As polissonografias são classificadas dependendo do nível de complexidade de investigação, que pode ser feita através de:
Avaliações diagnósticas dos níveis I, II, III e IV.
Titulação de pressão positiva contínua de vias aéreas (CPAP).
Outros aparelhos de ventilação não invasiva.
Polissonografias com montagem neurológica e vídeo.1


A polissonografia nível I é o exame-padrão realizado para diagnóstico dos distúrbios do sono. É diferenciado, realizado no laboratório do sono de forma completa e abrangente. Podemos avaliar os vários estágios do sono, assim como movimentos corporais, ritmo cardíaco e distúrbios respiratórios, cujo ronco é o primeiro sintoma.1 Essa polissonografia também pode ser chamada de diagnóstica, e é realizada com canais múltiplos de eletroencefalograma, oculograma, eletrocardiograma e eletromiograma, além de sensores para detecção de ronco, posição corporal, detecção de eventos respiratórios, movimentos torácico e abdominal e eletrodos para avaliar movimentos anômalos das pernas e braços, quando necessário.1
Recentemente, pela dificuldade de locais com condições ideais e pelo alto custo de manutenção para a realização do exame, novos aparelhos de polissonografia foram desenvolvidos para exames domiciliares. As polissonografias domiciliares têm ganhado mercado nos últimos anos e têm sido realizadas com cada vez maior precisão e definição diagnóstica. Atualmente, temos vários níveis de aparelhos domiciliares para diagnóstico, sendo os mais utilizados os níveis II, III e IV.1
As polissonografias de nível II são as mais semelhantes aos exames realizados no laboratório, usando quase todos os parâmetros previamente relatados para diagnóstico. A maior diferença é o número de canais para eletroencefalografia, que é menor nos aparelhos nível II domiciliares. As polissonografias dos níveis III e IV são usadas principalmente para diagnosticar distúrbios respiratórios do sono, como a SAOS e a hipopneia (respiração mais profunda e lenta que o normal), não sendo utilizadas de forma abrangente. Esses exames possuem muito menos canais de análise e grande risco de resultados não esclarecedores.1


Apesar de as indicações das polissonografias domiciliares terem crescido no mercado, é importante lembrar que são exames realizados sem o acompanhamento técnico do laboratório do sono, podendo ter falhas mais frequentes por perda de sensores durante o sono, aumentando o risco de repetição do exame.1
A polissonografia de tratamento ou de titulação é realizada para ajuste do CPAP ou de outros métodos ventilatórios noturnos para pacientes específicos. Deve ser realizada antes do início do tratamento com o CPAP para aqueles com diagnóstico de SAOS com indicação de ventilação noturna. Para os pacientes com alta probabilidade de apresentar a síndrome, referindo sintomas graves de sonolência excessiva e risco aumentado para acidentes e eventos cardiovasculares, pode-se solicitar o split-night. Nesse exame, o paciente faz uma polissonografia diagnóstica na primeira metade da noite e, na segunda metade, titula-se o CPAP.1
A polissonografia com montagem neurológica e vídeo está reservada para investigação dos comportamentos durante o sono. O exame consiste em uma polissonografia completa do tipo I com mais eletrodos para o eletroencefalograma, além de uma filmagem do paciente durante o sono. O objetivo é correlacionar os achados do vídeo, como comportamentos anormais, com o traçado do eletroencefalograma. Assim, podemos diferenciar sonambulismo de uma epilepsia, por exemplo.1





O diagnóstico da SAOS e de sua severidade depende da polissonografia.
O índice de apneia e da hipopneia e a dessaturação de oxigênio no sangue são importantes para a definição da severidade e a programação do tratamento.

Classificação da SAOS
O índice de apneia-hipopneia é a quantidade de pausas respiratórias por hora. O diagnóstico e a classificação da SAOS dependem do índice de apneia-hipopneia e do tempo, se oxigenação baixa durante o exame.1
Quando temos ronco sem a presença de SAOS, chamamos de ronco primário. O tratamento do ronco primário será abordado no decorrer do capítulo.
Normal: índice de apneia-hipopneia de zero a 5 no adulto.
Apneia leve: índice de apneia-hipopneia de 6 a 15 no adulto.
Apneia moderada: índice de apneia-hipopneia de 16 a 30 no adulto.
Apneia severa: índice de apneia-hipopneia acima de 30 no adulto.50


Você ronca? Procure ajuda e veja em qual dos diagnósticos você se encaixa:
• Ronco primário.
• Apneia obstrutiva leve.
• Apneia obstrutiva moderada.
• Apneia obstrutiva severa.

Mas essa síndrome pode afetar crianças?
A resposta é sim! As crianças também podem ter SAOS, mas a prevalência é menor do que nos adultos. A razão para esse fato é que o mecanismo que leva à SAOS na criança é diferente daquela com predomínio de obstrução das vias aéreas altas, como amígdalas e adenoides aumentadas.30
Os sintomas nas crianças são diferentes também, visto que elas não apresentam normalmente sonolência durante o dia. O achado mais comum em crianças com SAOS é a agitação. Muitas vezes, essas crianças apresentam comportamento durante o dia, que lembra a hiperatividade e déficit de atenção. Sempre temos que lembrar da possibilidade da SAOS se manifestar em crianças com grande nível de agitação e perda de rendimento escolar.30


Outra diferença importante é que a criança pequena não possui força para roncos intensos e pausas respiratórias prolongadas. O índice de apneia-hipopneia, que é normal no adulto, com até cinco pausas por hora, na criança já é considerado alterado quando for acima de uma pausa por hora. A explicação para esse fato é que o impacto da SAOS em crianças pode ser devastador.30
As crianças com essa síndrome têm a redução da quantidade de sono profundo (delta) relacionada à diminuição da secreção do hormônio de crescimento (GH), levando a um baixo crescimento e a alterações no desenvolvimento do esqueleto facial e das funções de mastigação.30 Além disso, há casos, embora raros, em que as complicações da pressão de artérias do pulmão e a sobrecarga do coração podem estar associadas.30
A SAOS na criança é mais rara do que no adulto e se apresenta, muitas vezes, com agitação e dificuldade escolar.

A causa mais comum são alterações de vias aéreas superiores, como hipertrofia de adenoide e amígdalas, com boa resposta ao tratamento cirúrgico.


Como podemos tratar a SAOS?
Caso o leitor tenha essa síndrome, leia com muita atenção esta parte do capítulo. O tratamento da SAOS inicia com a orientação do paciente sobre a doença e o risco que ela oferece para a saúde. Por ser uma doença que, muitas vezes, não é presenciada pelo paciente, que não vê roncos nem pausas respiratórias, não é valorizada. Muitas vezes, os pacientes nos procuram no consultório por pressão de familiares, e por não terem a consciência de que estão doentes, por isso dificilmente terão uma boa adesão ao tratamento.2
O primeiro passo para tratar a síndrome é otimizar as medidas de higiene do sono e as comportamentais, visando à:2 Perda de peso.
Retirada de substâncias sedativas que pioram o colapso das vias aéreas (benzodiazepínicos [BZD], barbitúricos e narcóticos).
Diminuição do consumo de álcool.
Mudança da posição do corpo durante o sono (evitando decúbito dorsal).
A opção específica do seu tratamento depende da severidade da doença, que é dada pelo índice apneia-hipopneia (IAH), que é a quantidade de pausas respiratórias por hora, além do tempo e da profundidade de queda dos níveis de oxigênio durante os eventos respiratórios.2
Nas crianças, a SAOS normalmente é muito bem controlada com abordagem cirúrgica das vias aéreas superiores. Entretanto, nos adultos, o tratamento cirúrgico resolve menos que 20% dos casos com grande risco de reincidência da doença. Casos dessa doença se apresentando de forma leve, com hipertrofia de amígdalas, podem se beneficiar da abordagem


cirúrgica, mas todos eles devem ser detalhadamente pensados e discutidos.30
Tratamentos cirúrgicos têm sido propostos e podem tanto envolver a correção de alterações anatômicas encontradas nas vias aéreas superiores quanto a correção de alterações do esqueleto craniofacial. No entanto, os resultados são controversos quanto ao sucesso, e, normalmente, a indicação dos procedimentos cirúrgicos não é rotineira.2
Alguns tratamentos farmacológicos, como reposição hormonal em pacientes que apresentam doenças endocrinológicas (como gigantismo, hipotireoidismo e climatério), podem ajudar. Entretanto, nenhum outro tratamento farmacológico possui benefícios para tratamento da SAOS.2
O primeiro passo para tratar a SAOS é otimizar a perda de peso, a retirada de fármacos sedativos, a diminuição do consumo de álcool e a mudança da posição do corpo durante o sono (evitando dormir de barriga para cima).



• Fonoterapia
Outra possibilidade terapêutica, nos casos de SAOS, é o tratamento fonoaudiológico isolado, nos casos leves ou associado a outros tipos de tratamento.31
O tratamento fonoaudiológico tem como objetivo dar força e mobilidade aos grupos musculares na região da orofaringe (garganta) e adequar a postura dos tecidos moles, melhorando as funções da mastigação, da sucção, da deglutição e da respiração. Os exercícios trabalham a força muscular e a mobilidade de toda a musculatura da orofaringe, com redução do ronco e diminuição da gravidade da SAOS.31 Esse tratamento é um procedimento terapêutico simples, não invasivo, seguro e sem risco.31
O tratamento fonoaudiológico é indicado para pacientes adultos com:31
Diagnóstico de ronco primário (sem apneias do sono).
Diagnóstico recente de SAOS de grau leve (5 a 15 eventos por hora) ou moderado (de 15 a 30 eventos por hora).
Pacientes que tenham oxigenação acima de 90% e com índice de massa corporal (IMC) menor do que 35 kg/m2.
Esse tratamento também é indicado para pacientes que não tiveram boa adaptação ao tratamento com o CPAP (que é o tratamento de escolha para a SAOS moderada e grave), que não têm os pré-requisitos ou não se adaptaram ao tratamento com aparelho intraoral e como terapia associada aos outros tratamentos. O tratamento fonoaudiológico não é indicado isoladamente para pacientes com presença de acentuadas alterações anatômicas craniofaciais ou das vias aéreas.31




A avaliação é feita em uma consulta individual, e as sessões terapêuticas são semanais, com duração de aproximadamente 1 hora, por 8 semanas consecutivas. Após esse período, iniciam-se quatro sessões a cada 15 dias, para adequação de funções (manutenção da terapia em funções do paciente). Caso haja necessidade, esse período poderá ser reavaliado.31
Durante as sessões, o paciente recebe modelo e orientações dos exercícios que deverão ser realizados em casa no decorrer da semana. Eles têm duração de, em média, 15 minutos, devendo ser realizados três vezes ao dia (manhã, tarde e noite). O paciente receberá um diário para anotação da execução dos exercícios e possíveis dificuldades. Após 12 sessões, o paciente será reavaliado, com avaliação fonoaudiológica e com a polissonografia.31
Os exercícios reduzem o ronco e a diminuição da gravidade da SAOS.

O tratamento fonoaudiológico na SAOS é não invasivo, seguro e tem como objetivo fortalecer a mobilidade aos grupos musculares na região da garganta e adequar a postura.


• Aparelho intraoral
Em casos de ronco primário (sem SAOS), síndromes leve e moderada, há a possibilidade do tratamento com aparelhos intraorais. Esses aparelhos são dispositivos utilizados na cavidade oral durante o sono, modificando a posição da mandíbula, da língua e outras estruturas de suporte, promovendo o aumento do calibre da via aérea com melhora importante de pacientes com ronco primário e SAOS, além de casos de síndrome de resistência de vias aéreas superiores.2
Os aparelhos intraorais também podem ser utilizados em casos de pacientes com intolerância ao uso de CPAP, após falência do tratamento com CPAP ou como terapia substitutiva de curta duração (em caso de viagens, por exemplo).2 Além disso, são contraindicados em casos de apneia predominantemente central, disfunção temporomandibular grave e condições dentais inapropriadas, como número reduzido de dentes e doença periodontal grave. Os tipos de aparelhos intraorais são:
Aparelhos retentores linguais: pré-fabricados em material maleável, possuem um bulbo plástico no qual a parte anterior da língua é posicionada, sendo, em geral, utilizados em pacientes portadores de prótese total frequentemente na arcada inferior, com perdas dentais extensas e com doença periodontal.
Aparelhos reposicionadores mandibulares: aparelhos de avanço mandibular, monobloco ou dois blocos, ajustáveis ou não ajustáveis, com ou sem liberdade de movimento lateral. Em geral, fazemos uso dos ajustáveis e individualizados, confeccionados em laboratório.2




Os aparelhos intraorais são utilizados na cavidade oral durante o sono, com a função de mudar a posição da mandíbula e da língua.

Como consequência, há um aumento do calibre da VAS, com melhora do ronco e dos eventos de obstrução de vias aéreas.
• CPAP
O melhor tratamento dos aparelhos intraorais é o CPAP, em especial dos quadros moderados a graves. Os benefícios consistem na abolição das pausas respiratórias e dos roncos, com melhora da oxigenação do sangue.2
Se indicado, o paciente deve ser submetido a uma polissonografia para titulação de CPAP ou uma titulação com aparelho automático por 7 a 15 dias para definição da pressão. Na noite do exame, o paciente repete a polissonografia com o uso do CPAP. A pressão inicial do aparelho é baixa, e o


técnico a aumenta conforme o paciente se aprofunda no sono e tem as pausas respiratórias, os episódios de ronco, as quedas do nível de oxigênio no sangue e os despertares. No fim dessa noite de titulação, espera-se que o paciente esteja usando uma pressão no CPAP que controle todos os elementos que caracterizam os aparelhos intraorais.2
O paciente deve conhecer com antecedência como é um CPAP e uma máscara, antes do exame de titulação. Uma melhor adequação da máscara é fundamental para o sucesso do tratamento. Essa visita prévia ao exame de titulação é denominada “dessensibilização”. É um trabalho do fisioterapeuta que nos auxilia no sucesso do tratamento.2 As máscaras utilizadas podem ser as nasais, oronasais ou de toda a face. Para o tratamento dos aparelhos intraorais, as máscaras nasais são mais utilizadas, por terem maior aceitação e conforto.2
A monitorização do tratamento com o CPAP é muito importante. A análise dos dados, como tempo e porcentagem de uso de CPAP, além de quantidade de pausas respiratórias por hora e vazamento da máscara, garante-nos o sucesso do tratamento proposto. Essa avaliação pode ser realizada periodicamente, com análise de informações nos chips das máquinas de CPAP ou, em tempo real, com dados obtidos a distância.2





Em casos mais raros, há a indicação do uso de uma modalidade de aparelho que se chama pressão positiva nas vias aéreas a dois níveis (BiPAP). Essa modalidade de ventilação está indicada quando necessitamos de pressões muito elevadas para controle dos eventos respiratórios ou temos um problema de controle da ventilação (respiração) associado à SAOS. Pacientes com doenças no nervo e do músculo precisam muitas vezes de BiPAP para melhora da respiração durante a noite.2

O tratamento de escolha para apneia obstrutiva do sono é o CPAP que está indicado em pacientes mais moderados a graves. O uso do CPAP melhora a qualidade de vida dos pacientes, bem como diminui os efeitos deletérios da SAOS.









Retrospectiva
A SAOS envolve episódios de obstrução total ou parcial das vias aéreas superiores durante o sono e pode estar presente em 30% da população adulta mundial.
Fatores de risco incluem obesidade, gênero masculino, alterações anatômicas na face, problemas cardíacos e uso de medicamentos relaxantes dos músculos respiratórios.
Sintomas incluem ronco, agitação ao dormir, sudorese noturna, aumento da salivação, despertar engasgado e visitas frequentes ao banheiro durante a noite.
A SAOS está associada a uma série de complicações, incluindo doenças cardiovasculares, diabetes, distúrbios de humor e cognitivos, além de impotência sexual e distúrbios do sono.









Capítulo 12

Distúrbios de movimento no sono: pernas inquietas e bruxismo


Introdução
Caro leitor, existem alguns distúrbios do sono que se caracterizam por movimentos repetidos e involuntários durante o sono. Neste capítulo, vamos discutir a síndrome das pernas inquietas, movimentos periódicos dos membros durante o sono, e o bruxismo.
O que é a síndrome das pernas inquietas?
A síndrome das pernas inquietas, ou síndrome de Willis-Ekbom, caracteriza-se por uma sensação de desconforto, muitas vezes mal definida, que obriga o paciente a movimentar as pernas, para aliviar tal sensação. Há uma piora das sensações desagradáveis com o repouso no fim do dia ou quando o paciente se deita para dormir, e melhora com a movimentação.1
Muito mais raramente, essa síndrome pode acometer outras partes do corpo, como braços e cabeça, dentre outras partes. É importante alertar ao leitor que pessoas com síndrome das pernas inquietas mais grave terão dificuldade de se manter sentadas e imóveis por muito tempo. Situações como viagens longas de avião, por exemplo, levam a muito sofrimento.2
A síndrome das pernas inquietas pode afetar de 5 a 30% das pessoas, dependendo dos estudos. Na população geral, chega a 15% e é mais prevalente em mulheres e em pessoas mais idosas, além de ser mais vista em pacientes com perda da função renal e diabetes mellitus (DM). Pode também acometer crianças, especialmente quando há associação com outras doenças, como a narcolepsia.2




A síndrome pode ter associação familiar em até 30% dos casos, não sendo incomum algum histórico familiar ser descoberto durante uma primeira consulta médica após o diagnóstico. A queixa de dificuldade de iniciar e manter o sono é frequente nesses pacientes. Verdadeiros rituais de massagens, caminhadas, uso de gelo e de pomadas nas pernas antes de dormir são descobertos em uma investigação direcionada, e não espontânea, em relatos.1

A síndrome das pernas inquietas é uma sensação de desconforto que obriga o paciente a movimentar as pernas para aliviar; piora no repouso; melhora no movimento e é pior à noite.





O que causa a síndrome das pernas inquietas?
O mecanismo exato que causa a síndrome das pernas inquietas ainda não foi totalmente esclarecido. O que se sabe é que há uma disfunção em um sistema de controle cerebral de uma substância chamada dopamina. A diminuição dessa substância levaria aos sintomas conhecidos da síndrome das pernas inquietas.2
Outras condições clínicas podem predispor à síndrome das pernas inquietas, como lesões na medula, neuropatias, lesões das raízes nervosas, fibromialgia, insuficiência renal e diabetes.32
A carência de ferro também é um importante fator desencadeante da síndrome das pernas inquietas. O ferro possui função importante na produção de dopamina no sistema nervoso central (SNC). Ele age como cofator em duas enzimas que participam na produção da dopamina. Situações em que há baixa de ferro, como a gravidez, as dietas vegetarianas sem supervisão nutricional e as perdas sanguíneas, são exemplos práticos de situações em que há maior prevalência de síndrome das pernas inquietas.2
Outro fator desencadeante da síndrome das pernas inquietas é o uso de alguns medicamentos, como os antidepressivos e alguns antipsicóticos. O uso de cafeína e o hábito de fumar também pioram a síndrome das pernas inquietas.2





História familiar, carência de ferro e uso de medicamentos estão implicados nos mecanismos causadores da síndrome das pernas inquietas.

Como se diagnostica a síndrome das pernas inquietas?
O diagnóstico de síndrome das pernas inquietas é essencialmente clínico. Os detalhes são obtidos na consulta médica, com o paciente que deve responder sim para as quatro perguntas:1
Há sensação de mal-estar, incômodo ou gastura nas pernas que lhe obrigue a mexê-las?
Essa sensação piora com o repouso?
Ela melhora com o movimento?
Há piora do quadro no fim do dia ou no início da noite?
Caso o paciente responda sim para todas as perguntas e não haja outra doença que simule o achado, o diagnóstico de síndrome das pernas inquietas é confirmado. Não há marcadores em exames para essa síndrome.1


Normalmente se investiga todo o metabolismo do ferro, além de uma avaliação global com exames gerais e níveis de vitamina B12 e folato. Em casos de pacientes com suspeita de outras doenças associadas, como doenças dos nervos, outros exames específicos são também solicitados e avaliados.1

Responder às perguntas mencionadas anteriormente é um bom começo para quem quer descobrir se tem a síndrome das pernas inquietas.
Como se trata a síndrome das pernas inquietas?
Caro leitor, o tratamento dessa síndrome é necessário somente para pacientes com sintomas moderados e graves que impactem na qualidade do sono e de vida. O tratamento é dividido em não farmacológico e farmacológico.2
• Tratamento não farmacológico
Inicia-se com as recomendações gerais e o controle dos fatores ambientais. A diminuição do hábito de fumar e de tomar café é radicalmente encorajada. A substituição,


quando possível, de medicamentos que podem levar à síndrome das pernas inquietas é realizada. A atividade física melhora muito os sintomas dos pacientes com síndrome das pernas inquietas, sendo um dos fatores importantes no sucesso do tratamento.2
A reposição de ferro é muito importante nos pacientes com carência comprovada. Há melhora clínica importante após a reposição, sendo o tempo da reposição dependente do nível da reserva de ferro no organismo e da doença de base.2
• Tratamento farmacológico
Pode ser realizado por duas classes de medicamentos: o grupo dos que aumentam o nível de dopamina no SNC e os chamados de gabapentinoides, também conhecidos como alfa-delta ligantes, que são mais utilizados em dores neuropáticas e controle de epilepsia. Qualquer das opções a ser escolhida deve ter um seguimento regular e cuidadoso.2
O tratamento da síndrome das pernas inquietas passa por medidas comportamentais, como parar de fumar, aumentar a atividade física e repor ferro e vitaminas quando necessário, além da retirada de alguns medicamentos que pioram os sintomas.



Movimentos periódicos dos membros durante o sono
Os movimentos periódicos dos membros durante o sono são aqueles que ocorrem sem a percepção do paciente, e são caracterizados pela dorsiflexão dos dedos e dos tornozelos, com consequente dificuldade em consolidar o sono, pela fragmentação e por múltiplos despertares.1
Há uma associação muito frequente com a síndrome das pernas inquietas, podendo chegar a 80%. O mecanismo e o tratamento também são comuns.32
O diagnóstico de movimentos periódicos dos membros durante o sono costuma ser secundário em pacientes com síndrome de pernas inquietas, que, porventura, necessitam realizar uma polissonografia1 (Figura 12.1).
Movimentos periódicos dos membros durante o sono
F4 – A1
F3 – A2
C4 – A1
C3– A2
O2 – A1
O1 – A2
Referência ocular esquerda
Referência ocular direita
EMG de mento
Eletrocardiograma
EMG de perna esquerda
EMG de perna direita
Microfone para ronco
Sensor pressórico de fluxo aéreo
Cinta torácica
Cinta abdominal
Saturação de oxigênio

EMG: eletromiografia
Figura 12.1. Movimentos periódicos dos membros durante o sono na polissonografia 15 a 50 – leve/moderado.
Fonte: elaboração do autor.


O índice dos movimentos periódicos dos membros durante o sono por hora é usado para determinar a gravidade, sendo:
Zero a 15 movimentos por hora – normal.
Acima de 50 movimentos por hora – grave.
Os critérios para o diagnóstico de movimentos periódicos dos membros durante o sono são:
Frequência: mínimo de quatro movimentos, com duração entre 0,5 e 10 segundos por movimento.
Intervalo: do início do primeiro movimento ao início do segundo de, no mínimo, 4 segundos e, máximo, de 90 segundos (Figura 12.1).
É importante ressaltar que os movimentos periódicos dos membros no sono não podem estar relacionados aos movimentos de despertar, devendo respeitar uma janela de tempo de 0,5 segundo antes do início de um evento respiratório (apneia ou hipopneia) até 0,5 segundo após seu término.4
O tratamento medicamentoso dos movimentos periódicos dos membros durante o sono ainda é controverso. Quando há associação com síndrome das pernas inquietas, o tratamento será o mesmo e resolverá os dois problemas.2








Os movimentos periódicos dos membros durante o sono acontecem durante a noite e são percebidos pelas pessoas que dormem com o paciente.

O que é o bruxismo?
Estão muito associados à síndrome de pernas inquietas, e o tratamento resolve os dois problemas.

É o apertar e/ou ranger dos dentes, principalmente durante o sono, podendo ocorrer também acordado. Essa condição é frequente e pode chegar a 45% nas crianças, 20% nos adultos e 8% nos idosos, sendo igual em homens e mulheres.2


O bruxismo é o ranger dos dentes durante o sono, mas também pode acontecer quando você está acordado.
O bruxismo causa desgaste dos dentes com dor, fratura de dentes, dor nos músculos faciais, dores de cabeça e na articulação temporomandibular (ATM). Alguns dos fatores que predispõem ao bruxismo são história familiar, personalidades mais competitivas, alterações ósseas cranioesqueléticas, disfunções de ATM e cefaleia em crianças, além de ansiedade e depressão. Ainda podem piorar o bruxismo o uso de alguns medicamentos, o consumo de cafeína e o hábito de fumar.2,33

O bruxismo causa dor, fratura de dentes e lesão na ATM.


O diagnóstico do bruxismo é realizado por avaliação clínica detalhada, história completa do paciente e exame cuidadoso, além do relato de terceiros de barulhos característicos durante o sono, uso de questionários e alguns exames complementares, como a polissonografia, em casos selecionados1,2 (Figura 12.2).
Bruxismo
F4 – A1
C4 – A1
O2 – A1
Referência ocular esquerda
Referência ocular direita EMG de mento
Eletrocardiograma
EMG de perna esquerda EMG de perna direita Microfone para ronco
Sensor pressórico de fluxo aéreo Cinta torácica
Cinta abdominal
Saturação de oxigênio

EMG: eletromiografia
Figura 12.2. Bruxismo na polissonografia.
Fonte: elaboração do autor.

O diagnóstico do bruxismo é realizado por história, exame e relato de terceiros de barulhos característicos durante o sono.


O tratamento se inicia com o controle dos fatores precipitantes. A diminuição de café e do hábito de fumar, além do controle das disfunções orgânicas e psicológicas, ajuda no controle do bruxismo. A opção de tratamento mais utilizada é a placa de mordida, a qual tem como objetivo proteger os dentes durante a noite, para evitar fraturas e dor intensa2,34 (Figura 12.3).

A placa de mordida deve ser elaborada para cada paciente. O material mais indicado é o acrílico, com contatos oclusais balanceados e uniformes. A placa de silicone ou soft também pode ser utilizada, porém por períodos mais curtos, pois pode aumentar o hábito do bruxismo em alguns pacientes e ter uma durabilidade menor.2
Podemos ter como terapias adjuvantes no tratamento do bruxismo a fisioterapia, a farmacoterapia e a terapia cognitivo-comportamental (TCC).2,35


Figura 12.3. Placa de mordida.
Fonte: acervo do autor.
O bruxismo pode estar relacionado a doenças que fragmentam o sono, como a síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS). Em casos de distúrbios respiratórios associados ao bruxismo, devemos priorizar o tratamento do problema respiratório.2


Retrospectiva
A síndrome das pernas inquietas é um distúrbio caracterizado por movimentos repetidos e involuntários das pernas, que pioram com o repouso e melhoram com o movimento. Pode afetar outras partes do corpo e é mais prevalente em mulheres e idosos.
As causas envolvem disfunção na dopamina, carência de ferro, uso de certos medicamentos, histórico familiar e outras condições médicas.
Movimentos periódicos dos membros durante o sono são involuntários dos membros, e ocorrem durante o sono, sendo frequentemente associados à síndrome das pernas inquietas. O diagnóstico é feito com base em critérios específicos.
Fatores de predisposição incluem história familiar, traços de personalidade competitiva, alterações ósseas, disfunções na articulação temporomandibular, ansiedade, depressão, uso de certos medicamentos, consumo de cafeína e tabagismo.
O bruxismo pode estar relacionado a distúrbios do sono, como a síndrome da apneia obstrutiva do sono, e, nesses casos, o tratamento do problema respiratório deve ser priorizado.








Capítulo 13

Jetlag e outros distúrbios do ritmo circadiano


O ritmo circadiano
O leitor já sabe o que é o ritmo circadiano, pois já discutimos sobre isso no início deste livro. Mas vamos recordar!
O ritmo circadiano é um ritmo biológico que dura cerca de 24 horas. O ciclo sono-vigília é a alternância entre a vigília e o sono que contempla vários padrões, como fome, temperatura corporal, liberação de hormônios, frequência cardíaca, pressão arterial, desempenho de cognição (memória), tempos de reação, humor, dentre outros.2
A regularidade e a periodicidade dos ritmos biológicos são fundamentais para a saúde humana; e quando temos a perda da regulação desse ritmo, chamamos de dessincronização ou ruptura do ritmo circadiano. O desequilíbrio entre o sistema de regulação circadiana do organismo e os horários de sono-vigília externos pode resultar em um dos distúrbios do ritmo circadiano sono-vigília com risco para a saúde.2
O desequilíbrio entre a regulação interna do organismo e os horários externos resulta em distúrbios do ritmo, com risco para a saúde.



Jetlag e outros distúrbios do ritmo circadiano
Controle do ritmo circadiano
O sistema de controle circadiano interno regula a temperatura corporal, os hormônios (cortisol e melatonina), a digestão, a força muscular e outros.2
O núcleo supraquiasmático, que está localizado no hipotálamo, é um regulador interno que gera o ritmo circadiano, o qual depende de “reloginhos” moleculares que cooperam para ajustar as mudanças das atividades em cerca de 1 dia. Em outras palavras, o núcleo supraquiasmático é um marca-passo do organismo, que controla o alerta e o sono.2
A luminosidade, por sua vez, é muito importante para o controle do ritmo circadiano. Por milhares de anos, os humanos tinham somente a luz como marcador de alerta e sono. Hoje, com a luz artificial, temos outros marcadores, como os sociais (hora de trabalho e estudo, por exemplo). Esses marcadores são chamados de Zeitgeber (do alemão “doadores de tempo”).2
A luz natural é nosso principal marcador ou regulador de ritmo (Zeitgeber).





Luminosidade e melatonina
A luz estimula receptores na retina, que são ativados e se comunicam com o núcleo supraquiasmático, pelo nervo óptico, por meio do trato retino-hipotalâmico.36 Em resposta ao estímulo da luz, o núcleo supraquiasmático faz conexão com a glândula pineal, regulando a produção e a liberação da melatonina. A luz solar é o regulador do tempo mais importante, que age via núcleo supraquiasmático.2
O leitor pode me perguntar: a luz artificial funciona na regulação do ritmo circadiano?
A resposta é: muito menos do que a luz natural. Medimos a quantidade de luminosidade com uma escala em Lux, com “x”. A luz artificial média chega de 200 a 500 Lux; já a natural vai de 5.000 a 10.000 Lux. Isso demonstra a grande diferença da potência da luz natural quando comparada com a artificial. Por essa razão, a luz natural funciona muito melhor com controle dos ritmos circadianos.36
Há também controle local dos ritmos circadianos, como nas células de órgãos como tireoide, músculos, pâncreas, pele, dentre outros. É importante frisar que o sistema circadiano obedece a uma hierarquia que traz em primeiro lugar o cérebro, que regula a necessidade de dormir à noite até a hora de acordar. Há uma relação inversa entre a liberação de melatonina e a temperatura do corpo, visto que, conforme chegamos perto do horário de dormir, diminuímos a temperatura do corpo e aumentamos a liberação de melatonina. Para dormir bem, precisamos de menor temperatura interna e boa liberação de melatonina!2
O leitor já deve estar imaginando que, se mantivermos a temperatura interna mais alta (atividade física noturna) e tivermos mais exposição à luz à noite (com bloqueio na liberação


Jetlag e outros distúrbios do ritmo circadiano
da melatonina), poderemos ter uma dessincronização do ritmo circadiano.2
Outro eixo importante no controle circadiano é o controle do estresse (hipotálamo-hipófise-adrenal). O cortisol (hormônio com ação fundamental no controle de atividades de estresse e inflamação) normalmente é liberado pela manhã e é importante na regulação de várias funções do organismo.
Os hormônios e a concentração de substâncias na corrente sanguínea seguem um padrão metabólico conforme o ritmo circadiano:
Pico de insulina às 16h.
Pico de triglicerídeos e colesterol às 18h.
Pico de secreção de ácido gástrico às 22h.
Pico de cortisol às 6h.
Pico de hemoglobina às 11h.
A alimentação segue também o ritmo circadiano. Hoje sabemos que a maior ingestão de calorias à noite leva a mais chance de obesidade!37
E a melatonina, ajuda no sono?
A resposta é: depende sobre qual problema do sono estamos conversando. A melatonina ajuda pouco nos pacientes com insônia, como vimos no Capítulo 7. Porém, será muito importante no tratamento das alterações do ritmo circadiano que veremos a seguir.





A melatonina ajuda pouco nos pacientes com insônia, mas é muito importante no tratamento das alterações do ritmo circadiano, como o jet lag .

Jetlag
O jet lag é um distúrbio de ritmo circadiano causado por exposição a alterações externas do ambiente de maneira rápida, como cruzar diferentes fusos horários em viagens de avião. Essa exposição acaba criando a necessidade de dormir e acordar em horários dessincronizados com o sistema circadiano interno.1
A exposição à luz em horários fora do padrão habitual (local de origem antes da viagem) leva a uma dessincronização ou ruptura dos ritmos circadianos, afetando todas as funções do organismo. Quanto mais fusos horários forem cruzados, maior o impacto no ritmo circadiano e mais demorada a adaptação.1





Jetlag e outros distúrbios do ritmo circadiano
Os indivíduos com jet lag podem ter dificuldade em adormecer na hora local e de se manterem acordados de dia no local visitado com diferente fuso horário. A sonolência ocorre por privação do sono e por desalinhamento circadiano. Normalmente, precisamos de um a três dias a cada hora de mudança no fuso horário para total adequação.38
E os atletas, quando vão competir no exterior?
Uma estratégia que pode ser usada em casos de competições esportivas é programar a chegada e a saída dos atletas bem próximo ao horário do jogo ou da competição. Assim, retiramos o fator circadiano, com menor necessidade de adaptação e melhor desempenho. Essa estratégia serve em competições curtas, como um único jogo. Em casos de torneios ou competições mais longas, o tempo de adaptação dos atletas deve ser considerado no planejamento da comissão técnica!38
O jet lag é a dificuldade de se adequar ao horário de destino após uma viagem, depois de cruzar diferentes fusos horários em viagens de avião por uma dessincronização do relógio biológico com os horários locais.



Atraso de fase
É um desalinhamento do ritmo circadiano endógeno com prejuízos físico, mental, cognitivo e social, levando a queixas de insônia e/ou sonolência diurna excessiva. Os indivíduos com esse distúrbio geralmente têm o padrão chamado de vespertino. O ritmo circadiano é atrasado mais do que 2 horas, com os indivíduos deitando-se mais tarde e acordando mais tarde, com duração de sono normal.1
Essas pessoas têm dificuldades para acordar, com problemas na escola e no trabalho. O atraso de fase pode ser visto em qualquer idade, mas é muito comum em adolescentes. Dessa maneira, faz muito sentido que os horários escolares sejam pensados levando em consideração essa característica biológica de atraso de fase. Hoje, com aulas iniciando às 7h da manhã, o desempenho escolar dos jovens pode ficar naturalmente comprometido.39

O atraso de fase é a tendência, em mais do que 2 horas, de deitar mais tarde e acordar mais tarde, muito frequente em adolescentes.





Jetlag e outros distúrbios do ritmo circadiano
Avanço de fase
Caracteriza-se por um avanço da fase, dormindo mais cedo e acordando mais cedo. Essas pessoas têm dificuldade em permanecer acordadas até a hora convencional de dormir, comparadas com outras pessoas ou membros da família, além de acordar muito cedo. Os idosos possuem o avanço da fase mais frequentemente, devido a um padrão fisiológico que ocorre com o envelhecimento.1

O avanço de fase é a tendência de dormir mais cedo e acordar mais cedo que tende a aumentar com a idade e é frequentemente visto em pessoas mais idosas.
Ritmo não 24 horas ou livre curso
O ritmo não 24 horas, ou livre curso, é caracterizado como atraso progressivo de 1 a 2 horas, além do número de horas normal que se tem em um dia. É um distúrbio de ritmo muito comum quando perdemos a ação da melatonina, como nos casos de pessoas cegas que perdem a percepção da luz em mais de 90%, com perda da regulação da luz no núcleo supra-


quiasmático. A cada dia, o paciente dorme e acorda 1 hora mais tarde, acumulando as alterações com o decorrer dos dias. Podemos ainda ter um padrão de livre curso nos transtornos psiquiátricos, pacientes com demência ou deficiência intelectual.40
O ritmo não 24 horas, ou livre curso, é frequente em pessoas com perda importante da visão, por uma perda do estímulo de luz natural e falha do sistema de regulação da melatonina.

Diagnóstico
Existem várias estratégias utilizadas para avaliar e monitorar o paciente com distúrbios do ritmo circadiano: Diários do sono: existem vários modelos de diários de sono. Eles nos ajudam a entender os hábitos de sono dos pacientes, além de ajudar na percepção do próprio paciente sobre os hábitos de sono. Isso ajuda não somente no diagnóstico, mas também no tratamento de distúrbios do sono, como discutido nos Capítulos 4 e 7.


Jetlag e outros distúrbios do ritmo circadiano
Actigrafia: avalia movimentos e nos ajuda a identificar possíveis períodos de sono e de atividade. Possui a vantagem de avaliar o padrão circadiano de maneira objetiva por vários dias, o que não é possível em um exame único de polissonografia, por exemplo.
Curva de melatonina: a melatonina geralmente é liberada cerca de 90 a 120 minutos antes da hora normal de dormir sem luz forte. A coleta pode ser de sangue ou de saliva, a cada 30 a 60 minutos, cerca de 6 horas antes e 1 hora após a hora de dormir.
Curva de temperatura: como conversamos, o bom sono depende da queda da temperatura. A curva de temperatura nos ajuda a ter ideia do padrão dos horários de queda da temperatura e da predisposição para dormir.
A dificuldade maior é que avaliamos a temperatura central, medida no reto (desconfortável) ou no sistema vascular (invasiva).
O diagnóstico dos distúrbios circadianos será realizado pela história clínica, pelo uso de diários do sono e pela actigrafia, além das curvas de melatonina e de temperatura.



Tratamento
O tratamento dos distúrbios do ritmo circadiano é adequar o relógio biológico interno às necessidades sociais do ambiente. São usadas medidas comportamentais para adequação, além do uso da melatonina (doses baixas) e da exposição à luz (5.000 a 10.000 Lux). É importante esclarecer ao leitor que, para cada tipo de distúrbio de ritmo circadiano, teremos diferentes manejos, variando de indivíduo para indivíduo.
O tratamento das alterações de ritmo circadiano depende de medidas comportamentais, farmacológicas (melatonina) e de exposição luminosa.
As medidas precisam ser individualizadas e ajustadas conforme o distúrbio de ritmo e o ambiente.







Retrospectiva
O ritmo circadiano é um ciclo biológico de cerca de 24 horas, que afeta funções como sono, temperatura corporal, liberação de hormônios, entre outras. Sua dessincronização ocorre quando há um desequilíbrio entre o ritmo interno do organismo e os horários de sono-vigília externos.
O atraso de fase é um distúrbio em que as pessoas tendem a dormir e acordar mais tarde, geralmente observado em adolescentes. Já o avanço de fase é caracterizado por dormir e acordar mais cedo e é mais comum em pessoas idosas.
O ritmo não 24 horas, ou livre curso, ocorre quando há um atraso progressivo no ritmo circadiano, muitas vezes devido à perda de visão ou distúrbios psiquiátricos.
O diagnóstico dos distúrbios do ritmo circadiano envolve histórico clínico, diários de sono, actigrafia, curvas de melatonina e de temperatura. Já seu tratamento envolve medidas comportamentais, melatonina em doses baixas e exposição à luz, adaptadas à necessidade de cada paciente e ao tipo de distúrbio.










Capítulo 14 Trabalhadores de turno


Introdução
A industrialização vem se alastrando por todo o mundo. Países ditos como em desenvolvimento cada vez mais possuem parte de sua população em atividade profissional em indústrias. A incidência de trabalhadores de turno, por consequência, vem aumentando globalmente.2
O trabalho noturno faz parte da sociedade moderna devido à necessidade de serviços disponíveis 24 horas por dia. Todos nós, leitores, que não trabalhamos em turnos, não temos a percepção de quão frequente é esse tipo de trabalho na nossa sociedade moderna.
Nós precisamos, ou precisaremos, de algum serviço em horários noturnos. Não é admissível que cheguemos a um hospital e não encontremos ninguém para nos ajudar. Assim como, em casos de incêndio à noite, temos a importante ação dos bombeiros de plantão. E assim por diante. Atualmente, caros leitores, mais de 15% das pessoas trabalham de turno!2
Os distúrbios de sono, em pessoas que trabalham em turnos, manifestam-se por meio de queixas de insônia ou sonolência excessiva e estão relacionados à quantidade de horas que a pessoa trabalha em horários que, normalmente, ela estaria dormindo.1





Você sabia que cerca de 15% de todos os trabalhos envolvem turnos?

O que é trabalho de turno?
Vamos conversar, leitor, um pouco melhor sobre o termo “trabalho de turno”. Existem inúmeros tipos de horários nesse estilo de trabalho, incluindo:1
Turnos vespertinos (pela tarde).
Noturnos.
Matutinos (pela manhã).
Rotativos.
Divididos.
Plantão noturno.
Turnos de trabalho de longa duração, que incluem horas de trabalho à noite.


Por exemplo, grande parte dos profissionais da saúde são considerados profissionais de turno e podem ser classificados como exclusivos trabalhadores noturnos, exclusivos diurnos ou de turno alternante.
Os turnos alternantes são a troca de horários de tempos em tempos, e são mais difíceis de ser implementados, pela dificuldade logística. Esse tipo de turno, em que há troca do dia pela noite e vice-versa, mexe com horários de toda a equipe e não é realizado rotineiramente.
Normalmente, o turno noturno em profissionais de saúde é chamado de 36 horas por 12 horas. Ou seja, 36 horas de repouso e 12 horas de trabalho noturno, rodando continuamente. Assim, os profissionais trabalham uma noite inteira e descansam por 36 horas, para voltar ao trabalho novamente.
Existem turnos da tarde, da noite, pela manhã, rotativos, divididos e de trabalho de longa duração à noite.



Quais as consequências do trabalho de turno?
O trabalho noturno contraria uma determinação biológica do ser humano de realizar suas atividades de vigília durante o dia e dormir à noite. Nesse contexto, o trabalho de turnos pode ser uma das causas da dessincronização do ritmo circadiano e, portanto, é considerado um fator estressor, causando estresse e levando à maior prevalência de obesidade e ao aumento do risco cardiovascular.41
Privação de sono: o trabalho em turno noturno gera maior número de queixas relacionadas ao sono e à saúde, pois interfere na estrutura do sono e resulta em perda crônica dele.42
Aumento de estresse: caminhoneiros que trabalhavam em horários irregulares, inclusive durante a noite, relataram piores condições de saúde e apresentaram maiores concentrações de cortisol (hormônio de estresse), inclusive nas folgas, sugerindo resposta mais prolongada ao estresse.43
Obesidade e diabetes: o aumento do índice de massa corporal (IMC) e dos triglicerídeos e a diminuição do colesterol da lipoproteína de alta densidade (HDL-c), o chamado colesterol bom, são achados frequentes em trabalhadores de turno com provável explicação na alteração do ciclo circadiano. A diminuição do consumo de frutas e legumes e o maior consumo de álcool são descritos em trabalhadores de turno. Um aumento do IMC (medida de peso), com obesidade centrípeta (maior acúmulo de gordura central, como abdômen e vísceras), é visto em trabalhadores de turno, com piora da obesidade e maior risco de diabetes em trabalhadores homens com carga horária excessiva.44


Sintomas gastrointestinais: os trabalhadores de turno se queixam mais de alterações gastrointestinais, que estão associadas aos hábitos alimentares, estado psicológico e qualidade do sono. Quase 50% desses trabalhadores reclamaram de pelo menos um sintoma gastrointestinal grave, com relação à depressão, à ansiedade, ao estresse e à qualidade do sono.45
Risco de acidentes: as pessoas que trabalham em turnos noturnos acumulam déficit de sono e aumentam o risco de acidentes com erros.46
Aumento do risco cardiovascular: há vários estudos com aumento do risco cardiovascular em trabalhadores de turno, sendo maior em trabalhadores com maior número de horas em atividade em escalas.41
Distúrbios psiquiátricos: trabalhadores de turno possuem maior risco de depressão e ansiedade, piorando conforme o aumento da frequência dos turnos.47
Isolamento social: o trabalhador do turno normalmente trabalha enquanto a família, que vive horários tradicionais, dorme. Assim, as atividades sociais ficam prejudicadas. Um exemplo é a maior prevalência de divórcios em pessoas que trabalham de turnos.43





As principais consequências do trabalho de turno são:

privação de sono, obesidade, aumento do risco de doenças do coração, diabetes, risco de acidentes, alterações gastrointestinais e psiquiátricas, além do isolamento social.
Como evitar os problemas de saúde em trabalhadores de turno?
O primeiro passo para evitar os danos à saúde nos trabalhadores de turno é entender as características de cada um a ser contratado.
Caro leitor, faz muito sentido contratar para turnos pela manhã as pessoas com mais tendência a acordar cedo; e para trabalhar em turnos noturnos, aqueles que naturalmente dormem mais tarde. Certo?
Sim, porém, mesmo que a caracterização da preferência circadiana de trabalho (manhã ou noite) seja fácil, realizada por questionário, isso não é feito na rotina!


Vamos discutir algumas estratégias utilizadas para minimizar o impacto do trabalho de turno na saúde dos trabalhadores.
• Medidas para profissionais de turno
Ambiente iluminado no trabalho: o ambiente de trabalho no turno noturno deve ser bem iluminado, para evitar que o trabalhador caia no sono.
Atividade física durante o turno: uma atividade física leve a moderada durante o turno de trabalho auxilia a se manter acordado e diminuir o risco cardiovascular.
Alimentação: ingerir alimentos considerados mais leves na parte da manhã, evitando café, chocolates e outros estimulantes antes de se deitar, após a noite de trabalho. Manter saladas e alimentos mais saudáveis prontos para serem ingeridos, quando chegar em casa. Além disso, evitar consumo de café em excesso ou álcool.
Óculos escuros após o plantão: ao sair do plantão pela manhã, o trabalhador deve usar óculos escuros, para evitar que a luminosidade natural venha a inibir a liberação de melatonina, que será importante para o sono durante o dia e ajudará esse trabalhador a descansar após o plantão.
Oportunidade de sono: os momentos dormindo não devem ser picados nem compostos de cochilos interrompidos, com duração de, pelo menos, 6 horas sem interrupções.
Ambientação: um ambiente escuro e silencioso no sono de dia é fundamental! A colaboração da família ajuda muito na rotina do sono após o plantão.


Uso de medicamentos para dormir: esse uso tem sido estudado e recomendado em alguns trabalhos. Entretanto, o controle médico cuidadoso do tipo de medicamento e as reações dessas substâncias em cada organismo devem ser monitorizados.48
• Medidas para empresas com profissionais de turno
Modificações climáticas/culturais de segurança: normas sociais que beneficiam os trabalhadores de turno podem ser implementadas pelas lideranças empresariais, com estabelecimento de metas e feedback para normas relacionadas à segurança no trabalho, que deve ser prioridade, em comparação a outros concorrentes objetivos.
Modificação estrutural: mudanças na organização interna dos sistemas de gestão de segurança na empresa, como direitos e obrigações dos trabalhadores, envolvimento dos trabalhadores nas decisões, sistemas de gestão de segurança e regimes de certificação: ambiente físico, engenharia de controle e modificação de máquinas, equipamentos e produtos.
Intervenções de segurança multifacetadas: combinação de componentes nos principais tipos de intervenções de segurança. A revisão exclui intervenções secundárias e terciárias, como programas de tratamento de lesões no local, reabilitação e retorno ao trabalho.
Campanhas de segurança pública: dirigidas à população em geral e intervenções de segurança baseadas na comunidade.48



Medidas individuais e cooperativas são fundamentais para diminuir o impacto do dano à saúde dos trabalhadores de turnos.









Retrospectiva
Trabalhadores de turno frequentemente sofrem de distúrbios do sono, como insônia e sonolência excessiva, devido à realização de atividades durante horários tradicionalmente associados ao sono.
Estratégias para minimizar o impacto do trabalho de turnos na saúde dos profissionais incluem manter um ambiente de trabalho bem iluminado, praticar atividade física durante o turno, adotar uma alimentação equilibrada, evitar o consumo excessivo de café e álcool, usar óculos escuros após o turno noturno e garantir oportunidades de sono ininterrupto.
Empresas podem adotar medidas de segurança e modificação estrutural para proteger a saúde dos trabalhadores de turno, incluindo mudanças no ambiente físico, engenharia de controles, modificações em máquinas e equipamentos, intervenções multifacetadas de segurança e campanhas de segurança pública.
Priorizar a segurança e a saúde dos trabalhadores de turno é crucial para mitigar os riscos associados a esse tipo de trabalho.









Referências


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2. Kryger MH. Principles and practice of sleep medicine. Connecticut: Elsevier; 2016.
3. Sono. Michaelis. 2023. Disponível em: https://michaelis.uol.com.br/ moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/sono.
4. American Academy of Sleep Medicine™ (AASM). The AASM manual for the scoring of sleep and associated events: rules, terminology and technical specifications. Westchester, IL: AASM; 2007. Disponível em: https://www.sleep.pitt.edu/wp-content/ uploads/2020/03/The-AASM-Manual-for-Scoring-of-Sleep-andAssociated-Events-2007-.pdf.
5. Melatonin. Drugs and lactation database (LactMed®). Bethesda; 2006.
6. American Academy of Sleep Medicine™ (AASM). The international classification of sleep disorders: diagnostic & coding manual. Westchester, IL: AASM; 2005. Disponível em: https://www.worldcat. org/pt/title/international-classification-of-sleep-disordersdiagnostic-coding-manual/oclc/67281425.
7. Coelho F, Murray J. AVC e sono. São Paulo: Manole; 2014.
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Listagem de siglas


Aβ: beta-amiloide.
ACTH: hormônio adrenocorticotrófico.
AMB: Associação Médica Brasileira.
AMS: atrofia de múltiplos sistemas.
ARBZ: agonistas do receptor benzodiazepínico.
ATM: articulação temporomandibular.
AVC: acidente vascular cerebral.
BZD: benzodiazepínicos.
BiPAP: pressão positiva nas vias aéreas a dois níveis.
CPAP: pressão positiva contínua nas vias aéreas.
DA: doença de Alzheimer.
DCL: demência por corpos de Lewy.
DM: diabetes mellitus.
DP: doença de Parkinson.
EEG: eletroencefalograma.
EM: esclerose múltipla.
ESE: Escala de Sonolência Epworth.
GH: hormônio do crescimento.
HAS: hipertensão arterial sistêmica.
HTA: hipertensão arterial.
HDL-c: colesterol da lipoproteína de alta densidade.
IAH: índice apneia-hipopneia.
IAM: infarto agudo do miocárdio.
ICSD: The International Classification of Sleep Disorders.


IMC: índice de massa corporal.
N1: sono superficial.
N2: sono intermediário.
N3: sono profundo.
NASA: National Aeronautics and Space Administration.
NREM: non-rapid eye movement.
PA: pressão arterial.
PAS: pressão arterial sistólica.
PVT: Psychomotor Vigilance Task.
REM: rapid eye movement.
RI: resistência à insulina.
SAOS: síndrome da apneia obstrutiva do sono.
SED: sonolência excessiva diurna.
SNC: sistema nervoso central.
SSS: Escala de Sonolência Stanford.
SUS: Sistema Único de Saúde.
TAG: transtorno de ansiedade generalizada.
TB: transtorno bipolar.
TCC: terapia cognitivo-comportamental.
TLMS: teste de latências múltiplas do sono.
VAS: via aérea superior.



Dr. Fernando Morgadinho Santos Coelho é um especialista na área da medicina do sono, com uma carreira dedicada a pesquisa, tratamento e educação sobre questões relacionadas ao sono. Com vasta experiência no campo da medicina, ele é amplamente reconhecido por suas contribuições no diagnóstico e no tratamento de distúrbios do sono.


Autor de várias publicações de destaque na área, Dr. Fernando Morgadinho é uma autoridade quando se trata em falar desse assunto. Seu comprometimento em promover a importância do sono adequado e melhorar a qualidade de vida o tornou um defensor incansável do bem-estar através do sono. O livro, “Sono Nosso de Cada Dia”, é um reflexo de sua paixão por compartilhar conhecimentos e ajudar as pessoas a compreender e superar os desafios relacionados ao sono.



A sociedade moderna tem passado por situações –pessoais, profissionais ou coletivas – de “tirar o sono”. E, por falar nele, o que fazer para mantê-lo regulado e reparador? “Sono nosso de cada dia” trata sobre as causas e as consequências da falta de sono e suas peculiaridades nas diversas idades.
Tudo isso e muito mais tem sido desenvolvido pela Medicina do Sono (criada em 2012) cujas pesquisas respondem às muitas dúvidas sobre o sono de bebês, crianças, adolescentes, adultos e idosos. Você vai conhecer (ou reconhecer) as distintas doenças e distúrbios do sono, para compreender melhor problemas que podem estar muito próximos.
Em linguagem fluida e acessível, o Dr. Fernando Morgadinho pincela as características do sono –e de distúrbios a ele relacionados – com muita maestria. Entenda mais sobre esse importante processo; saiba como melhorar esse momento e, claro, a qualidade de vida que todos almejam.

