Tribunal de Justiça do RS. Como eles julgam um caso de roubo.

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LAS Nº 70078856416 (Nº CNJ: 0250853-92.2018.8.21.7000) 2018/Crime APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. ROUBO MAJORADO. ART. 157, §2º, INC. II, DO CÓDIGO PENAL. FRAGILIDADE PROBATÓRIA NO TOCANTE À AUTORIA DELITIVA. SENTENÇA REFORMADA. ABSOLVIÇÃO DECRETADA. Não havendo provas seguras e inequívocas acerca da participação dos acusados na empreitada criminosa (roubo majorado), absolvição é medida que se impõe, fulcro no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal. No particular, a prova colhida durante a persecução penal não autoriza a manutenção da condenação do acusado. Ainda que presos em flagrante, com apreensão da res furtivae, a palavra/reconhecimento da vítima e da testemunha presencial, não é suficientemente esclarecedora para fins condenatórios. Mais, os réus negam a autoria delitiva, apontando desavenças com o policial, condutor do flagrante. Sentença reformada. APELOS DEFENSIVOS PROVIDOS. DETERMINADA A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA NA ORIGEM.

APELAÇÃO CRIME

QUINTA CÂMARA CRIMINAL

Nº 70078856416 (Nº CNJ: 025085392.2018.8.21.7000)

COMARCA DE SANTIAGO

LEONARDO REGINALDO MIRANDA

APELANTE

ARLAN CORREA DORNELES

APELANTE

MINISTERIO PUBLICO

APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam as Desembargadoras integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento aos recursos defensivos, para absolver os acusados, com fundamento no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal, determinando a expedição de alvará de soltura na origem, se por outro motivo os réus não estiverem presos.

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Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além da signatária, as eminentes Senhoras DES.ª GENACÉIA DA SILVA ALBERTON (PRESIDENTE) E DES.ª CRISTINA PEREIRA GONZALES. Porto Alegre, 12 de dezembro de 2018.

DES.ª LIZETE ANDREIS SEBBEN, RELATORA.

RELATÓRIO DES.ª LIZETE ANDREIS SEBBEN (RELATORA)

Adoto o relatório do parecer ministerial, fls. 285 e verso, ao expressar, in verbis:

“Trata-se de apelações interpostas por Leonardo Reginaldo Miranda e por Arlan Correa Dorneles (fls. 218/226v e 229/255) nos autos do processo em que restaram condenados nas sanções do art. 157, § 2º, inciso II, c/c artigo 61, inciso I, ambos do Código Penal. Para Leonardo foi aplicada a pena de 06 anos, 02 meses e 20 dias de reclusão, em regime fechado, mais 15 dias multa à razão unitária legal; quanto a Arlan, a pena foi estabelecida em 06 anos, 09 meses e 19 dias de reclusão, em regime fechado, mais 20 dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato (fls. 188/200v). Em razões, a defesa Pública, em favor de Leonardo, postula, preliminarmente, a nulidade do reconhecimento fotográfico ocorrido em sede policial, aduzindo que não seguiu o procedimento previsto no artigo 226 do Código de Processo Penal. No mérito, busca a absolvição, sustentando ausência de provas, para manter a condenação. Subsidiariamente, pede a desclassificação do delito de roubo para furto, a reforma do regime de

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LAS Nº 70078856416 (Nº CNJ: 0250853-92.2018.8.21.7000) 2018/Crime cumprimento de pena, para outro mais benéfico, assim como o afastamento da majorante do concurso de pessoas e da pena de multa (fls. 218v/226v). Por sua vez, a defesa constituída de Arlan requer, também, a absolvição do réu por insuficiência probatória. Em caráter subsidiário, pede a desclassificação do crime de roubo para furto, o afastamento da agravante da reincidência, a fixação da pena mínima, assim como do regime semiaberto para o início de cumprimento da pena (fls. 230/255). Devidamente processados os recursos, com a apresentação de contrarrazões (fls. 227/227v e 256/256v), vieram os autos com vista a esta Procuradoria de Justiça para exarar parecer.” Nesta instância, a Procuradoria de Justiça, fls. 285/291, exarou parecer, da lavra do Dr. Renato Vinhas Velasques, opinando pelo conhecimento e improvimento dos recursos. Vieram os autos conclusos. Esta Câmara adotou o procedimento informatizado e foi observado o art. 613, inc. I, do CPP. É o relatório.

VOTOS DES.ª LIZETE ANDREIS SEBBEN (RELATORA)

Os recursos - conclusos em 19.11.2018 a esta Relatora - são tempestivos, preenchem os demais requisitos de admissibilidade e, portanto, devem ser conhecidos. A preliminar se confunde com o mérito e com ele será analisada. Pretendendo a absolvição dos acusados, as defesas sustentam que a prova dos autos não autoriza a condenação dos mesmos pelo crime descrito na denúncia. Assiste razão às defesas. Explico. No particular, aos apelantes foi imputada a prática do crime de roubo (em concurso de agentes), isso porque, em 16.05.2017, por volta das 22h20min, teriam subtraído uma bolsa com documentos pessoais e dinheiro, de

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LAS Nº 70078856416 (Nº CNJ: 0250853-92.2018.8.21.7000) 2018/Crime propriedade da vítima Daniele. Segundo a acusação, os réus teriam abordado a vítima e ordenado, de forma intimidatória, a entrega da bolsa. Dos documentos da fase policial, verifico que há o auto de prisão em flagrante (a prisão, com apreensão da bolsa subtraída, foi realizada em via pública), bem como os depoimentos das testemunhas (policiais e amiga da ofendida) e da vítima. Em síntese, os policiais contaram acerca da prisão (realizada em via pública) e da apreensão do bem (segundo consta, a bolsa teria sido localizada a cerca de 30 metros do local da abordagem, após indicação dos próprios indivíduos). Mais, a vítima teria reconhecido ambos os réus após verificação da fotografia dos então presos. A vítima Daniele disse que os réus, que estavam lhe seguindo num veículo branco, foram os autores do assalto, tendo confirmado a autoria. Contou que estavam vestindo moletom com capuz, não lembrando a cor. Asseverou que após o assalto, os mesmos entraram no veículo e fugiram. Por fim, salientou que não houve violência ou grave ameaça para fins da subtração. A testemunha Maria, presente no momento do assalto, além de discorrer acerca da ação delitiva, corroborando o relato da vítima, confirmou que os indivíduos mostrados pelos policiais eram os assaltantes. Os flagrados exerceram o direito de permanecer em silêncio. No tocante à prova judicial, colaciono parte da sentença, in verbis:

“O acusado ARLAN CORREA DORNELES, em juízo, afirmou que a acusação de roubo é falsa, bem como não sabe o motivo de estar sendo acusado. Disse que, no dia do fato, estava indo a pé para o Bairro Missões para visitar alguns familiares. Afirmou que encontrou o corréu Leonardo somente na Delegacia. Contou que, no momento em que foi abordado, havia escurecido recentemente. Narrou que nada foi apreendido com o declarante. Mencionou que não viu a bolsa da vítima, tampouco sabe onde foi localizada. Argumentou que os policiais não gostam do declarante e, frequentemente é abordado por milicianos que querem lhe agredir. Elencou que conhece a vítima, que reside próximo à sua casa, contudo não tem desavenças com ela e que não tem motivos para indicá-lo como um dos autores do crime. Referiu que conheceu o corréu Leonardo no

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LAS Nº 70078856416 (Nº CNJ: 0250853-92.2018.8.21.7000) 2018/Crime Presídio. Falou que, na ocasião, vestia um casaco de cor azul com capuz, escrito GAP, calça e tênis. Disse que não recorda a roupa que Leonardo estava vestindo no dia do fato, pois não prestou atenção. Referiu que é mais baixo que Leonardo. O acusado LEONARDO REGINALDO MIRANDA, em juízo, negou a prática delitiva. Mencionou que foi abordado na rua Osvaldo Aranha. Alegou que o policial Cristiano lhe prendeu algumas vezes, e que é “encarnado” nele. Disse que conheceu o corréu Arlan na cadeia, sendo que não possuem nenhuma desavença, mas sim com pessoas que residem no mesmo bairro de Arlan, a pedreira. Contou que estava em liberdade condicional, sendo que foi abordado após as 22h, horário limite que poderia estar na rua. Elencou que a vítima não teve certeza, ao afirmar para o policial, que o interrogado tenha sido um dos autores do delito. Disse que não conhecia a vítima. Contou que havia saído de casa e estava indo para a casa de sua companheira, na Rua hipólito Garcia. Afirmou que acredita que a vítima tenha sido induzida pelos policiais a reconhecê-lo. Da prova oral: A vítima DANIELE DELLA FLORA COSTA, em juízo, disse que estava saindo do trabalho, aproximadamente às 22h, ocasião em que os acusados pararam o carro. Mencionou que cuidou a placa do carro e seguiu seu trajeto, a pé, até encontrar sua colega. Mencionou que o carro cruzou diversas vezes por elas, sendo que falou para sua colega que estavam sendo seguidas pelo veículo. Elencou que toda noite faziam o trajeto de seu trabalho até sua casa, a pé. Asseverou que foram abordadas pelos réus na esquina da escola Cristóvão, os quais haviam estacionado o carro mais para cima e estavam esperando a pé. Disse que um dos réus lhe abordou pela frente e o outro por trás. Referiu que não teve reação, entregou a bolsa e seguiu. Afirmou que ao olhar para trás, visualizou os réus entrando em um carro. Falou que, ao chegar à Delegacia de Polícia, deu as informações do veículo dizendo que os réus estariam naquele carro. Frisou, referente à abordagem, que os acusados pelo olhar mandaram que entregasse a bolsa. Mencionou ter ficado com muito medo e intimidada, motivo pelo qual não teve reação, somente entregando a bolsa. Relatou que sua colega conseguiu ir para o meio da

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LAS Nº 70078856416 (Nº CNJ: 0250853-92.2018.8.21.7000) 2018/Crime rua, onde havia mais movimento. Contou que os réus mandaram que seguisse sem olhar para trás. Referiu que obedeceu às ordens dos réus pois estava com medo que fizessem algo, como lhe desferir um tiro. Relatou que na bolsa estavam seus documentos e o valor de R$ 40,00 em dinheiro, bem como algumas passagens de ônibus. Disse que sempre encontra a sua amiga na esquina da Felice Automóveis para irem embora juntas. Alegou que pela placa do carro percebeu que os réus pararam na Rua General Canabarro, próximo a uma telemensagem. Disse que o veículo era um Celta ou um Corsa branco, com quatro portas, de placas 1199. Contou que, após o fato, foram até a Delegacia de Polícia passando as informações dos acusados, sendo um baixinho e vestindo moletom que, segundo sua colega, tinham letras, enquanto o outro era magro e alto. Disse que os policiais abordaram os acusados no referido veículo, sendo que sua bolsa estava há, aproximadamente, uns 30m do local da abordagem. Alegou que reconheceu os réus na Delegacia. Mencionou que os acusados agiram juntos. Disse que conhece Arlan há muito tempo, pois residem no mesmo Bairro, contudo não sabia seu nome. Asseverou que efetuou o reconhecimento fotográfico, bem como reconheceu o veículo. Informou que quando os réus foram encaminhados para Delegacia, sua bolsa estava junto. Por fim, disse que a sua colega também reconheceu os acusados. A testemunha MARIA DA GRAÇA DE OLIVEIRA MARTINS, em juízo, disse que estava junto com a vítima na ocasião do delito. Contou que estavam conversando quando Daniele lhe falou que estavam sendo seguidas por um carro, contudo, não prestou atenção. Disse que, próximo à escola Cristóvão, os réus atravessaram a rua, juntos, indo um pela frente e o outro pelas costas, anunciando o assalto, dizendo para não olharem e entregarem a bolsa. Referiu que ficou assustada e saiu correndo, contudo a vítima ficou parada, com medo, ocasião em que um dos acusados pegou a bolsa da ofendida. Mencionou que a vítima chegou a lhe mostrar o veículo, que era de cor branca. Disse que, após o assalto, os réus saíram em direção ao Centro e entraram no veículo que Daniele havia lhe mostrado. Asseverou que ficou chocada. Contou que um dos réus vestia moletom com capuz. Contou que foram até a Delegacia de Polícia repassando as informações do carro e das roupas dos acusados. Falou que os policiais localizaram os acusados, que

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LAS Nº 70078856416 (Nº CNJ: 0250853-92.2018.8.21.7000) 2018/Crime foram encaminhados à Delegacia onde Daniele realizou o reconhecimento. Mencionou que lhe contaram que os acusados já haviam dispensado a bolsa em umas “macegas”, quando foram abordados. Alegou que reconheceu os acusados na Delegacia, como os autores do assalto. Frisou que reconheceu o mais baixo pelo moletom que usava que, segundo Daniele, tratava-se de Arlan. Asseverou que o carro que lhe seguiu era o mesmo em que os réus entraram após o assalto. Contou que os policiais chegaram à Delegacia com os acusados e a bolsa. Disse que os réus, no momento da abordagem, usaram a palavra assalto. Corroborou que a palavra assalto lhe causa medo, motivo pelo qual assustou-se e saiu correndo. A testemunha CRISTIANO TROMBINI SOARES, policial militar, em juízo, disse que tomou conhecimento do fato quando realizava a lavratura de um flagrante na Delegacia de Polícia. Alegou que a vítima chegou no local afirmando ter sido roubada por dois indivíduos que estavam em um veículo de cor branca. Disse que a ofendida informou características dos acusados, bem como letras ou números da placa do veículo. Asseverou que saíram efetuar buscas, sendo que, pelo sistema, constataram que havia um veículo branco com os números indicados em Santiago. Contou que localizaram o veículo estacionado em uma rua no Bairro Irmã Dulce, sendo que um senhor, em via pública, de forma anônima, informou que dois indivíduos haviam saído do veículo e estariam subindo a rua. Referiu que quando abordaram os suspeitos, tratando-se de Frito e Arlan, tiraram fotos dos dois e enviaram para a Delegacia, tendo a vítima reconhecido os réus pelas fotos. Elencou que a bolsa da vítima foi localizada próxima ao local da abordagem dos acusados. Frisou que Arlan informou que havia largado a bolsa ali e assumido a autoria do crime. Asseverou que as informações de onde estava a bolsa da ofendida, foram repassadas pelos réus. Argumentou que a vítima reconheceu os acusados na Delegacia. Narrou que a vítima aparentava estar com medo, inclusive dos réus. Falou que, pelo que recorda, o carro estaria no nome de uma parente do corréu Arlan. Argumentou que conhece ambos os acusados de outras abordagens, sendo que já prendeu os dois por tráfico de drogas. Disse que “Frito” é mais alto que Arlan. Comentou que se os réus não tivessem indicado o local da bolsa, dificilmente teriam encontrado. “

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Dando

prosseguimento

à

análise,

importante

alguns

apontamentos. A vítima, embora tenha confirmado o relato da fase policial, bem como o reconhecimento quando da prisão (operado em razão do moletom e do fato de supostamente estarem próximo ao veículo apontado pela vítima - o condutor do flagrante contou que a abordagem se deu em via pública, na Rua José Caetano de Melo, nº 350), quando instada pela acusação se tinha ciência das características dos meliantes, repassadas à polícia, contou “não, eu sei que um era um pouco baixinho, ele estava de moletom, essas minha colega que lembra que tinha umas letras nesse moletom e o outro que estava atrás era um magro alto, não deu pra olhar direito, porque eu nem... nem olhei muito para não...” Mais, questionada pela defesa de Arlan se já conhecia os assaltantes, disse “sim, ele (Arlan) é quase meu vizinho, ele mora perto da minha casa lá.(...) se criaram junto tudo ali, de convivência, não pessoalmente, mas por conhecer ele há muitos anos ali. E continuou quando instada se o identificou de antemão “eu conheci o formato do rosto dele, quanto ele me abordou, mas eu não sabia direito falar quem era a pessoa, até que os policiais abordaram e mostraram a foto dele.”

Por fim, questionada pela defesa do corréu Leonardo acerca do

reconhecimento, disse que “eu mais conheci pela roupa, a roupa que estava, de moletom e... eu não vi, sinceramente, a pessoa de trás e não deu para eu olhar direito quem era, eu só sei que era uma pessoa alta e magra (...) (fls. 267/271).” A testemunha presencial, por sua vez, relatou que não conseguiu observar as características dos assaltantes, pois “estavam de capuz”. E mais, sobre a roupa, disse que “tinha um moletom com capuz, fechado na frente dos bolsos, não sei se era roxo ou azul, não vou conseguir te dizer bem, porque na hora tu só fica ali, tu não presta atenção, fica chocada, sei lá.” Ainda, sobre a identificação dos assaltantes, asseverou que ambos estavam usando capuz, não tendo visualizado os rostos. Mais, apontou que o reconhecimento da fase policial foi pelo “jeito deles”, pelo “moletom”, especialmente em relação a Arlan, “o mais baixo”, conforme relatado pela amiga/vítima Dani, pois “não sabe quem é” (fls. 271, verso/275, verso). O policial militar Cristiano, condutor do flagrante, corroborou o relato inicial quando da apresentação dos flagrados. No tocante às circunstâncias

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LAS Nº 70078856416 (Nº CNJ: 0250853-92.2018.8.21.7000) 2018/Crime da prisão, quando encontrado o carro apontado pela vítima, acrescentou que um “vizinho teria informado que dois indivíduos estavam subindo a tua ali, que saíram daquele Corsa”. Importante consignar que essa informação não foi relatada na fase policial. Confirmou que a vítima reconheceu os assaltantes pela fotografia enviada naquele momento. Segundo o condutor, a prisão deu algumas quadras acima (“eles estavam a umas quantas quadras, não sei precisar”) de onde estava estacionado o veículo (supostamente utilizado). A informação do local onde estava a bolsa teria sido repassada pelos acusados. Acerca das roupas, disse que as vítimas “teriam mencionado moletom preto, um estaria, e foi encontrado o moletom”. Mais, instado pela defesa, disse que o moletom estava “junto com eles, que um estava de moletom preto e o outro também, só que eu não me recordo que estava com qual, porque como eu disse para a senhora, aquela noite nós atendemos três ocorrências, mais ou menos parecidas, então não me recordo o que é de cada um”. Pois bem, a meu sentir, dos depoimentos da fase judicial, não é possível confirmar de forma incontroversa que a autoria efetivamente recai sobre a pessoa dos acusados. Existe pouca informação acerca das características dos réus. A abordagem se deu há dez quadras do local onde o veículo estava estacionado (segundo informações de um vizinho, de identidade não informada). Mais, tanto a vítima quanto a testemunha presencial não visualizaram o rosto dos assaltantes, pois ambos estavam usando capuz. Outro ponto importante, a vítima não soube precisar a cor do moletom. E mais, a cor da vestimenta apontada pela testemunha não é a mesma indicada pelo condutor do flagrante. E não é só isso. Na fase policial, o miliciano nada referiu acerca da denúncia anônima (em relação aos indivíduos que haviam estacionado o veículo), mencionando que a prisão teria se dado através das informações repassadas pela vítima. E o reconhecimento operado por fotografia, diante das diversas circunstâncias constatadas, realizado muito em razão da vestimenta, não deve ser considerado de forma absoluta, especialmente diante das parcas informações acerca das características dos assaltantes (conforme depoimentos prestados em juízo). Por fim, e não menos importante, tenho que o fato de os acusados terem sido apresentados à Autoridade policial juntamente com a res furtivae (nem todos os bens foram localizados), por si só, não confirma a autoria delitiva,

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DES.ª CRISTINA PEREIRA GONZALES (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a). DES.ª GENACÉIA DA SILVA ALBERTON (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª GENACÉIA DA SILVA ALBERTON - Presidente - Apelação Crime nº 70078856416, Comarca de Santiago: "À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO

AOS

RECURSOS

DEFENSIVOS,

PARA

ABSOLVER

OS

ACUSADOS, COM FUNDAMENTO NO ART. 386, INC. VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, DETERMINANDO A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA NA ORIGEM, SE POR OUTRO MOTIVO OS RÉUS NÃO ESTIVEREM PRESOS."

Julgador(a) de 1º Grau: ANA PAULA DA SILVA TOLFO

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