Fanzine Quitanda no Quintal

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UMA AVENTURA GOSTOSA

Material produzido durante os meses de julho e agosto de 2022 nas oficinas de comunicação comunitária do projeto Legado de Brumadinho. Conheça o projeto:

Texto, fotografias e ilustrações: Flávio, Janaina, Juliana, Pâmela, Patrícia, Serena e Vinícius

Facilitação da oficina: Eveline Xavier e Mila Barone

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SUMÁRIO

Sobre nós CEJA

CEJA e AVRABUM de mãos dadas pela vida

Brumadinho Cozinha Comunitária Caça

Butequeria Águas Claras

tradição do famoso pastel da festa de São Sebastião

Música Franguinho

15 16 26 33 36 40 48 52

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palavras
A
na panela Receitas 09
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SOBRE NÓS

Conheça a equipe de comunicação comunitária responsável pela criação desse fanzine.

FLÁVIO LUIZ

28 anos, morador de Brumadinho desde 1994.

Hoje, sou casado com Serena, temos um príncipe de nome Davi. Faço estágio em Brumadinho e sou formado em Direito.

Sendo assim, gosto de conviver com as pessoas, sou comunicativo e amo interagir. Conhecer novas culturas é o que me move. Faço deste curso um mar de oportunidades para alimen tar meu aprendizado e aprimorar as técnicas de comunicação.

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JULIANA

JANAÍNA

Tenho 20 anos, estou cursando gastronomia, sou moradora de Bru madinho desde o meu nascimento. Meus pais e familiares também são brumadinhenses.

O projeto de comunicação foi algo que me chamou muito a atenção, pois sempre tive interesse em apren der e tem sido muito bom lidar com os desafios e melhor ainda é aprender coisas que vou levar pra vida.

29 anos, mãe do João e da Alice, for mada em pedagogia, leciono desde 2014. Tenho experiência com alfabe tização dos anos iniciais e de jovens e adultos. Sempre gostei de design gráfico. Fiz muitas peças personali zadas, como convite e panfleto para contribuir com a renda de casa. Sou residente em Mário Campos e, em fe vereiro de 2019, perdi o meu sobrinho Bruno Rocha na tragédia-crime da empresa Vale. Vi na comunicação vi sual uma forma de expressão e estou no aprendizado diante dos desafios para obter conhecimentos e poder multiplicá-los posteriormente.

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PÂMELA SILVA

Tenho 24 anos e sou formada em estética e cosmetologia. O meu primeiro contato com comunicação e publicidade foi através da minha página comercial no instagram, onde comecei a fazer minhas primeiras postagens profissionais.

Após a brutalidade do maior acidente de trabalho do Brasil, ocorrido em 25 de janeiro de 2019, perdi minha irmã mais velha, Priscila Elen Silva. Uma vida feliz e que sabia amar tudo que tocava. Hoje, me empenho na luta, junto à associação dos familiares – AVABRUM, para que esse tipo de tragédia-crime nunca mais aconteça. Para que não sejam ceifadas mais vidas como as das nossas 272 Joias.

Eu me chamo Patrícia, tenho 45 anos, sou moradora de Brumadinho. Atualmente, sou dona de casa, mãe do Igor e do Davi. Também tenho três netos: Iago, Yasmin e Eloá. Minha família é minha maior riqueza.

PATRÍCIA
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SERENA REIS

28 anos, moradora de Brumadinho desde 2016. Sou casada com o Flávio e mãe do príncipe Davi. Tenho minha família como meu maior alicerce e minha inspiração para a vida. Sou Engenheira de Alimentos como formação e trabalho atualmente no setor de planejamento em uma empresa de cozinhas industriais. Sempre apreciei vivenciar novos desafios, por isso te nho muita dedicação para aprender e conhecer o novo. Por fim, eu diria que sou uma pessoa que vai atrás dos seus objetivos, tem muita força de vontade e busca constantemente pela evolução.

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VINÍCIUS

21 anos, brumadinhense e filho de brumadinhenses, passei minha vida inteira na cidade antes de mudar para fazer faculdade.

Sou estudante de Radiologia e de Odontologia pela Universidade Fede ral de Minas Gerais e realizo estágio na área de radioterapia no Hospital do Baleia.

Sempre fui bem comunicativo e in teressado em aprender coisas no vas. Vi no CEJA a oportunidade de me aproximar da comunidade e de aperfeiçoar minha técnicas de co municação.

Espero conseguir auxiliar na busca pela justiça e reconhecimento da cidade de Brumadinho.

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CEJA

Comunicação Expressiva pelas Joias

Vidas são as joias mais preciosas que existem. Por isso, somos uma rede criada para falar de vidas que se foram, mas jamais serão esque cidas. Somos o grupo de Comu nicação Expressiva pelas Joias. Somos o CEJA.

O CEJA se inicia em 18 de junho de 2022, com 20 participantes, jovens e adultos engajados na luta da ressignificação e pela denúncia escrita, visual e verbal da tragédia-crime, ocorrida em 25 de janeiro de 2019, responsável pela morte de 270 vidas e 2 nascituros.

Unidos pelo desastre industrial que é o segundo maior e o mais letal do século 21, o CEJA tem o propósito de uma nova visão. Em meio ao luto e à dor da perda dos familiares das vítimas do rompimento, desejamos agir para que os jovens que estão a se inserir no mercado de traba lho em cidades com mineração ativa não precisem trabalhar com uma bomba relógio acima de suas cabeças.

Através da comunicação, queremos lutar por justiça pelas 272 vidas interrompidas.

O CEJA se compromete!

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CEJA E AVABRUM: DE MÃOS DADAS PELA VIDA

O rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão, da Vale, em Bru madinho, no dia 25 de janeiro de 2019, provocou a morte de 272 pessoas. Quatro vítimas continuam desaparecidas. Houve ainda muitos danos irreparáveis à natureza. Várias consequências marcam a nossa vida até hoje, e seguirão marcando. Em 2022, por exemplo, a enchente de janeiro levou uma grande quantidade de minério e de metais pesados, que haviam sido deixados pela lama, para o cotidiano das pessoas.

Todo esse horror nos traz a reflexão sobre o impacto negativo, causado pelas ações do homem no meio ambiente e na vida das pessoas. E so bre como muitas vezes o lucro vem primeiro que a vida.

Mais de três anos e meio já se pas saram e há em nós uma sensação de impunidade em relação à tragédia. Será que não vai haver a responsa-

bilização criminal que se espera num caso tão grave? Enquanto isso, os bombeiros continuam as buscas pelas vítimas ainda não encontradas. E as famílias seguem em luta para que a memória das 272 Joias permaneça viva.

É nessa luta que a nossa rede de jovens, a rede CEJA, se conecta à AVABRUM.

A AVABRUM

AVABRUM é a sigla da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos do Rompimento da Barragem Mina Córrego Feijão em Brumadinho. A instituição nasceu do luto e cons trói uma luta por justiça, encontro e memória. Condena a lógica do lucro acima da vida e age para que tragédias evitáveis como a de Brumadinho não se repitam.

Sérgio Amaral, integrante da diretoria

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da AVABRUM, fala um pouco sobre a origem da Associação: “nossa ins tituição nasceu com o objetivo de lutar por justiça, pelo encontro de todas as vítimas, pela reparação justa a todos os familiares de vítimas e para ajudar a todos os familiares no enfrentamento à Vale, junto com os órgãos de justiça que apoiam nossa causa. Desde o dia 25/01/2019, um mundo de caos e dor está presente em centenas de lares. A associação sobrevive pela honra das 272 vidas ceifadas, para que a memória e to das as boas lembranças sejam eter nizadas, e para amenizar um pouco a dor que faz parte da vida desses familiares, que ainda sofrem muito com a perda”.

TRAUMA

A presidente da AVABRUM Alexan dra Andrade lembra que a entidade nasceu de um trauma: com o rom

pimento da barragem, os familiares das vítimas tiveram suas vidas de vastadas e passaram a participar de buscas, Comissões Parlamentares de Inquérito, audiências públicas. Ao se encontrarem nesses espaços, perce beram a necessidade de criar uma instituição que os representasse e que fosse um apoio para todos. Afinal, a morte passou a fazer parte do dia a dia das pessoas. Brumadinho já não era mais a cidade que muitos antes consideravam tranquila, aco lhedora e segura. Naquele fatídico 25 de janeiro, junto com a lama, veio uma avalanche sofrimento. Para Jo siane Melo, que também é dirigente da AVABRUM, depois da dor imensa das perdas, veio o caos: a cidade foi se tornando um canteiro de obras; foi se inchando, pois recebeu dezenas de empresas e milhares de novas pessoas; teve um aumento enorme no custo de vida; a saúde mental da população se degradou.

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Josiane chama a atenção a profundidade do trauma experimentado pelos familiares. Ela conta que, assim como outros familiares de vítimas da tra gédia-crime, evita sair na rua, para não ouvir pessoas dando mais valor a vantagens econômicas, como as indenizações, do que às vidas perdi das. Esse tipo de atitude fere muito, violenta o seu luto e a sua dor. Ela termina indicando que “a tragédia-cri me começou no dia 25 de janeiro de 2019, mas ainda não findou. Nós, os familiares, nos sentimos prisioneiros dentro de casa, cheios de angústia. E circular pela cidade traz mais sofrimento: nos deparamos a cada minuto todo com todo o tipo de consequência dessa tragédia criminosa. E isso nos lembra, de forma incessante, das vidas de nossos familiares, que foram ceifadas”.

RESSIGNIFICAÇÃO

Diante de toda a dor que Brumadinho vem vivenciando desde 2019, a AVABRUM busca ajudar os familiares das vítimas e a população como um todo a ressignificar o rompimento e seguir adiante.

A ressignificação da dor pelas mortes daqueles que amamos é o processo de construir novos sentidos para essa

experiência tão traumática, buscando aprendizagens e criando modos de promover a vida, como uma forma de honrar quem se foi.

E, para honrar as vidas perdidas, é preciso atuar para fazer a diferença, no presente. Acreditando nisso, a AVABRUM se dedica a conscientizar as pessoas acerca da luta por memória e justiça; a denunciar a seriedade do problema das barragens, que pode levar a outras tragédias como a de Brumadinho; e a promover ações que gerem oportunidades de educação, bem-estar, cultura e lazer para a população. É o que nos contaram, num bate-papo, as dirigentes Alexandra Andrade, Andresa Rodrigues, Josiane Melo e Maria Regina da Silva.

Andresa destaca como exemplo disso o Centro de Convivência. Localizado à rua Aristides Passos, 421(centro de Brumadinho), o espaço foi criado pela AVABRUM para acolher e apoiar os familiares das vítimas. Lá, várias atividades e a própria interação entre os familiares ajudam cada um e cada uma na caminhada de enfrentamento à dor. A unidade oferece alternativas para atenuar os problemas de saúde e psicológicos dessas pessoas, como a massoterapia e a yoga, além de cur sos, encontros e eventos culturais.

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LEGADO

As dirigentes da AVABRUM nos explicaram, por fim, que o projeto Le gado de Brumadinho, do qual fazemos parte, tem como pilares honrar a memória das 272 vidas perdidas no rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, e auxiliar a AVABRUM na luta por justiça, encontro e memória. Por meio de várias frentes de ação, o projeto busca trabalhar temáticas como a proteção da vida no traba lho, construir oportunidades para comunidades e pessoas atingidas e promover momentos de valorização da cultura e da arte na ressignificação da memória da tragédia-crime e das vítimas. Na frente de ação da nossa oficina de comunicação comunitária, a ideia é falar de temas de cidada nia em fanzines, vídeos e programas de rádio. Na comunicação institu cional, são criadas campanhas de conscientização sobre acidentes de trabalho, para que novas tragédias-crime sejam evitadas. Na frente de memória e cultura, vários eventos e ações artístico-culturais sensibilizam as pessoas acerca do valor da vida e a importância de construir memoria coletiva. Por fim, há uma frente de formação, que leva lições de empre endedorismo e gestão para jovens e para iniciativas sociais da cidade.

AS

QUE JAMAIS SERÃO ESQUECIDAS

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JOIAS
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BRUMADINHO

Para o primeiro fanzine da rede CEJA, resolvemos falar de Brumadinho, ci dade em que nossa rede está e com a qual temos um forte vínculo de afeto. E decidimos mostrar esse lu gar especial a partir da sua cultura alimentar. Nada melhor do que falar de uma cidade a partir de seus aro mas, das suas tradições culinárias e de seus sabores, não é mesmo? E Brumadinho, além de oferecer várias oportunidades de contato com a natureza e ter vários tipos de atrações turísticas, conta com uma culinária de dar água na boca...

Mas, para começar, vamos falar de nossas origens e contar um pouco de como é a nossa terra. O município de Brumadinho, localizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a cerca de 49 quilômetros da capital mineira, tem esse nome por se loca lizar perto da antiga Vila de Brumado Velho. E a vila foi chamada de Bruma do pelos bandeirantes, em virtude das brumas que cobriam toda a região montanhosa na qual ela se localizava. Montanha é o que não falta por aqui... nem atrações turísticas de beleza ímpar! Uma caminhada por elas leva até o Forte de Brumadinho, que é uma atração imperdível. E a Serra da Moeda é ideal para um passeio de mountain bike ou até mesmo para saltar de parapente. Quem visita ou

mora na cidade e está em busca de boas opções de cultura e lazer pode escolher ainda dar uma ida ao Museu Inhotim e aos alambiques artesanais.

E tem a gastronomia – assunto prin cipal do nosso fanzine –, que é muito especial. Casa Branca, local que fica em meio às montanhas da Serra do Rola Moça, é uma parada obrigatória pra quem curte iguarias culinárias. A região tem bons restaurantes (de comida caseira a contemporânea e típica), pizzarias e hamburguerias tradicionais, entre muitas outras opções.

Mas falar de comida em Brumadinho é uma aventura especial. Confira essa aventura nas próximas páginas!

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A manhã nasce com um toque de esperança, já tomou logo meu café com leite ou será que era leite com café?!

Banho de sol acompanhado pela brisa dos ventos na varanda.

Olhar longe e sereno, apreciando a beleza de onde moro. Vinicius

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Os olhos se arregalam e é difícil conter o sorriso no rosto, A emoção toma conta e gritinhos entusiasmados saem da boca. Depois de um dia agitado No café da tarde tem rosca de moranga, tem café fresquinho, tem doce de leite e também pé de moleque.

Pâmela

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COZINHA COMUNITÁRIA

O Comitê Gestor do Dano Moral Coletivo - DMC foi criado a título de in denização social pelo rompimento da Barragem em Brumadinho. Ele é responsável por direcionar a verba da indenização a projetos que con tribuam no suporte e acolhimento dos familiares de vítimas fatais e dos atingidos.

Rodrigo Lopes, educador ativo em projetos sociais há mais de 10 anos, foi um dos responsáveis pela escrita e apresentação do projeto Cozinhas Comunitárias - Paraopeba ao DMC. Hoje, com o projeto já aprovado, ele gerencia o curso e ainda irá ministrar algumas atividades. “Estou tendo a oportunidade de fazer a gestão de um trabalho importante para Brumadinho e região. O projeto consiste no desenvolvimento de cinco unidades produtivas semi-industriais, que tem como objetivo produzir alimentos,

como pão de queijo, salgados e doces congelados e semi-preparados, que precisem apenas de fritar ou assar e estejam prontos para comer logo na sequência”, conta o educador.

Brumadinho e região têm produções de mexerica, hortaliças, leite, queijos, ovos e o projeto busca valorizar essas produções e fazer a economia local girar, integrando os produtores direta e indiretamente ao curso, além de ampliar o alcance do trabalho para o maior número de pessoas.

Cada cozinha criada no âmbito do projeto irá abrigar trinta cooperados capacitados e contará com equipamentos, insumos e espaços adequa dos para a produção dos alimentos. A construção das cozinhas está na reta final e a etapa de capacitação também está avançada. Após a conclusão das obras, a turma de cooperados/ alunos iniciará as aulas práticas e,

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após a finalização do curso, a cooperativa irá se organizar para dar início às vendas.

Conversamos com Júlia Silva, de 59 anos, aluna do curso, sobre sua tra jetória na culinária e descobrimos que, nos finais de semana, ela já ti nha o hábito de vender frango assado com batata e farofa - segundo ela, o melhor frango da cidade! Júlia de senvolveu o próprio tempero e não compartilha o segredo com ninguém. Por um tempo, também ajudou o sobrinho a fazer pizzas em Brumadinho para aliviar os pensamentos, depois da perda de seu filho Wallace. Agora,

com o início do projeto das cozinhas comunitárias, Júlia terá a oportuni dade de explorar mais o universo da culinária e aprender a fazer novos pratos, além de poder ajudar outras pessoas com sua saborosa comida e ter mais uma possibilidade de com plemento de renda.

O professor Rodrigo explica que a presença feminina tem grande rele vância para o projeto e conclui reafirmando sua vontade em contribuir para que, por meio do curso Cozinhas Comunitárias - Paraopeba, o sentido da vida dos cooperados passe a ter um sabor diferente.

Levanta pela manhã, primeiro que o sol, biscoitos sobre a mesa, é uma beleza.

Logo vêm os cachorros, sentiram o cheiro dos bolos. Depois vêm os gatos, procurando os ratos, que barato!

Escuto passarinho, vou abrir um vinho.

Vinho só não compensa, tem que pegar o petisco na dispensa.

Flávio

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H I H A E G M

Y N R O N C E U H C J C O M M R I O O T

S E C I N C R

36 CAÇA PALAVRAS
Ó
A A A A T U I V M F S R L A A O É A O T S B R S G A U H R E O F N R A U I R E I A N M C E J A A M
37 * AMOR * AVABRUM * CAFÉ * CEJA * COMUNICAÇÃO * COMUNIDADE * COZINHA * CULTURA * ENCONTRO * FAMÍLIA * JOIAS * JUSTIÇA * MEMÓRIAS * PASTEL * QUINTAL * QUITANDA * TEMPERO * TRADIÇÃO S E T E Q R O O E S L A C O M U N I D A D E U N I C A Ç Ã O F G C F E J U S T I Ç A O O Q E G E R G I B M O Z U Q U I N T A L Í N I I H P C E R N E L N N T T A N R I D O I A H A A S N L S A C A S A N A T R A D I Ç Ã O T D T E M P E R O H T U A S L N D R Y D N B I

A xícara de café e uma fatia de queijo com afeto. Meu olhar para acompanhar. E o melhor jeito de despertar um sorriso seu pela manhã. Patrícia

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BUTEQUERIA ÁGUAS CLARAS

Thais é uma jovem de 34 anos, estatura mediana, bastante extrovertida e gosta de conversar. Tem cabelos lon gos, pretos, cor de pele clara e mãos sempre cuidadosas e higienizadas para elaborar os pratos diários.

O convite de entrevista foi aceito imediatamente e Thaís ainda afir mou que fomos os primeiros a fazer esse trabalho. Durante a conversa, sentimos sua alegria transbordando ao compartilhar um pouco sobre seu restaurante.

A escolha por Thaís para ser a entrevistada se deu devido à sua simpatia, boa vontade em falar da comida da roça, seu orgulho em ir para a cozinha e fazer o que gosta. Além de amigos, somos clientes fiéis do bar e restau rante Butequeria Águas Claras. Nos sentimos em casa ao entrevistá-la.

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Qual é seu nome, a cidade onde nasceu e a quanto tempo é moradora de Brumadinho?

Meu nome é Thais Olívia de Olivei ra Evangelista Dias, tenho 33 anos, nascida em Belo Horizonte, mas, 3 dias depois do meu nascimento, retornamos para Brumadinho. Desde então, sou domiciliada e residente da cidade e moro no bairro Águas Claras. Apenas nasci em Belo Horizonte.

Thais, como você aprendeu a fazer seus pratos?

Você poderia falar sobre seu percurso profissional até se tornar chefe de cozinha?

Trabalhei durante 11 anos na área de saúde, como concursada da Prefeitura de Betim. Na época, eu gostava da área e segui por algum tempo nessa carreira por acreditar que era o que eu queria. Realmente, é uma profissão muito bonita, mas sofrida e triste, porque vemos coisas ruins, choramos e sentimos muita pressão. Nos dedicamos tanto que passamos a não nos cuidar. Após adoecer, per cebi que não queria mais isso para mim, porque gosto de sorrir e brin car. Trabalhar em bar e restaurante é diferente, as pessoas estão sempre felizes, sorrindo e se descontraindo. Cozinhar, então, não há nada melhor!

Meu pai é chefe de cozinha industrial e minha mãe, dona de casa, sem pre cozinhou bem. Por isso, tivemos acesso fácil à culinária. Na minha casa, a mesa sempre esteve cheia, com pratos variados e Natais fartos. Meu pai cozinhava pouco em casa; suas produções eram comumente para fora, mas ele sempre tinha his tória dos pratos que havia feito. Acho que foi daí que peguei o gosto pela culinária.

E em relação aos ingredientes que você usa para cozinhar, você tem facilidade em encontrá-los, ou tem alguns pratos que são sazonais?

Eu trabalho com porções variadas e algumas são mais comuns, como batata frita, mas cozinho também uma grande variedade de peixes. Em determinadas épocas, não encontramos algumas espécies, como o filé de aruanã, da região amazônica, e, por isso, é um peixe sazonal. Nos fins de semana, trabalho também com o almoço. Como meu bar e restaurante fica na região rural de Brumadinho, procuro fazer pratos da roça: angu e couve, costelinha com quiabo, frango ao molho pardo, vaca atolada. Quero

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que quem vá ao meu restaurante, possa sentir o gostinho de roça; quero que a pessoa coma uma mandioca com uma carne bem gorda, não um strogonoff!

esse peixe em uma versão mais su culenta. O filé de tilápia é uma carne mais seca, mas se estiver em postas, mesmo com alguns espinhos, sua pele conserva a suculência e, quando você dá a primeira mordida, sente aquele sabor de peixe fresco.

Qual o carro chefe ou prato estrela do restaurante?

O carro chefe das porções é o peixe, mais especificamente a tilápia em postas. Aqui em Brumadinho, se tem o costume de comer filé de tilápia, mas no meu restaurante, quis trazer

Quando pensamos nos pratos ao invés das porções, existem alguns que eu vendo mais. O tropeiro à mi neira tem grande saída, assim como a galinhada, o angu com costelinha e couve com molho especial! Esses são os pratos que vendemos mais.

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Eu tento trazer a essência de cidade de interior, porque se formos comer em qualquer cidade grande encontramos batata frita, isca de boi e por co, mas não torresmo, mandioca ou costelinha com quiabo. Nossa cidade está perdendo as características de ser interiorana, mas ainda é interior e quero conservar isso.

À medida que a entrevista ia corren do, a cada prato que ela descrevia, a cada detalhe dos sabores de sua cozinha, víamos seus olhos brilhan do e ficávamos com a boca cheia d’água. Terminada a conversa, Thaís nos proporcionou um delicioso mo mento com uma boa cerveja gelada, uma enorme porção de batata frita acompanhada de maionese da casa e deliciosos bolinhos de abóbora com carne. Deu até vontade de pedir a receita e tentar fazer em casa.

A entrevista também deixou Thais com boas expectativas. Vimos que a cultura da comida de roça está per dendo as características, seja pela falta de tempo das pessoas, seja pelo cansaço, mas o mundo precisa de mais comida da roça mineira. O que Thais faz representa a antiguidade do interior das cidades e a relação mais próxima que os povos antigos tinham com a terra. É um conjunto perfeito para uma boa alimentação e lembrança dos antepassados.

E como você ligaria o seu restaurante com a identidade de Brumadinho?
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Pula da cama tão cedo que nem mesmo o sol saiu! Chama a mãe, se arruma e sobe o morro! Lá no alto, faz café e frita biscoito de polvilho, Rapidinho anima os trabalhadores que dali seguem!

Pâmela

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Acendeu o farol dos olhos, o café está pronto. Coração dispara, o cheiro se espalha, queijo sobre a mesa.

Ele não foi como se fosse, sobre a mesa está o doce.

Não esquecerei daquela boa outra vez.

O leite ao pé da vaca, de sobremesa uma jaca. Serena

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A TRADIÇÃO DO FAMOSO PASTEL DA FESTA DE SÃO SEBASTIÃO

Com um sorriso no rosto, Maria do Espírito Santo de Souza, de 75 anos, recepcionou o CEJA para uma breve entrevista. Natural de Rio Manso, mas moradora de Bru madinho desde 1977, é uma senho ra de aparência gentil e amigável, de estatura mediana e com carisma e energia de dar inveja.

Logo de cara aceitou o convite para uma conversa sobre a tradição do famoso pastel da Festa de São Sebastião. Nunca antes ela havia dado uma entrevista sobre a iguaria e com prontidão aceitou compartilhar um pouquinho conosco. A conversa foi descontraída, ali mesmo na varanda de sua casa, onde cuidou dos seus filhos e ainda mora com seu marido, no Bairro Santa Efigênia, perto da paróquia onde a Festa acontece.

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Como surgiu a tradição do pastel?

Surgiu pela nossa vizinha, Maria Gegê, que começou a fazer a massa do pas tel e canjica na sua casa e, como vizinhos sempre se ajudam, começamos a nos reunir para ajudá-la. Eu aprendi a fazer o recheio de carne e a canjica para a produção das vendas.

Como a pandemia atrapalhou na tradição?

A pandemia atrapalhou muito, pois fi camos 2 anos sem poder fazer a Festa. Este ano foi sofrido, mas quando a festa voltar vai ser muito bom. Tenho fé que em 2023 terá!

Desde quando a senhora ajuda na tradição?

Não sei, tem muito tempo! São mais de 20 anos que eu ajudo na produção dos pastéis, mas eu não sei ao certo quanto tempo.

O que a senhora acha sobre a nova geração para ajudar a manter esse legado?

Este ano, não chegou gente nova. As pasteleiras já não estão dando mais conta, então acho que as novas gerações tem que ajudar mesmo.

Como é sua participação na prática dos pastéis?

Em casa, eu faço o recheio de carne e a canjica. Na igreja, eu ajudo a montar o pastel, abrir a massa, cortar e fechar a massa, mas nunca ajudei a fritar.

Como você se sente em ajudar na tradição?

É muito bom, a gente se sente tão bem! É um sentimento muito bom de poder ajudar a igreja e estar em comunhão com pessoas conhecidas e amigos.

Dona Maria vê com muita importân cia o interesse e ajuda dos que estão vindo para manter essa prática viva, pois as senhoras mais velhas já estão ficando cansadas e o principal quitute da Festa de São Sebastião não pode desaparecer. Ela ainda faz um pedido para que os mais novos continuem participando e ajudando. O pastel se tornou uma tradição da igreja e dos devotos que sempre comemoram a data com muita fé.

Sem dúvidas, com toda essa energia e carisma, conseguimos sentir a empolgação da festa que já começa no preparo dos pastéis feito pelas mãos de senhoras tão gentis e de fé. À medida que Dona Maria ia contando, veio saudade na boca.

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MÚSICA

FRANGUINHO NA PANELA

Composição: Moacir dos Santos e Paraíso*

O recanto onde moro é uma linda passarela

O carijó canta cedo, bem pertinho da janela

Eu levanto quando bate o sininho da capela

E lá vou eu pro roçado, tenho Deus de sentinela

Têm dia que meu almoço, é um pão com mortadela

Mas lá no meu ranchinho a mulher e os filhinhos Tem franguinho na panela

Eu tenho um burrinho preto bão de arado e bão de sela Pro leitinho das crianças, a vaquinha Cinderela Galinha tá no terreiro e o papagaio tagarela

Eu ando de qualquer jeito, de butina ou de chinela Na roça se a fome aperta, vou apertando a fivela

Mas lá no meu ranchinho a mulher e os filhinhos Tem franguinho na panela

Quando eu fico sem serviço a tristeza me atropela Eu pego uns bicos pra fora, deixo cedo a corruptela Eu levo meu viradinho é um fundinho de tigela

É só farinha com ovo, mas da gema bem amarela É esse o meu almoço, que desce seco na goela

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Mas lá no meu ranchinho a mulher e os filhinhos Tem franguinho na panela

Minha mulher é um doce e diz que sou o doce dela Ela faz tudo pra mim e tudo o que eu faço é pra ela Não vestimo lã nem linho é no algodão e na flanela É assim a nossa vida, que levamos na cautela Se eu morrer Deus dá um jeito, pois a vida é muito bela

Não vai faltar no ranchinho pra mulher e os filhinhos Um franguinho na panela.

Aponte o seu celular para o qrcode para escutar a música!

* Moacir Santos foi um arranjador, compositor, maestro e multi-instrumentista brasileiro. É considerado por diversos críticos um dos grandes nomes da história da MPB (música popular brasileira). Paraíso é um cantor, compositor e produtor de destaque no cenário da música sertaneja.

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Trimm, Trimm, às seis da manhã, com um pulo em baixo do chuveiro, em segundos estou sentada à mesa, cheirinho de café, me distrai dos ponteiros que passam a correr. Manhã de sol, leva o filho para a escola e dirige para o trabalho, trim... trim.... corre para casa, pausa para o almoço, casa de minha mãe, tomate picadinho com cebola batidinha, recarrego as energias e lá vou para o segundo turno, leva a filha para escola e dirige para o serviço, corre corre o dia todo, o trabalho não espera.

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As férias chegaram, com ela o cheirinho acolhedor de café e biscoito sendo assado no fogão a lenha abraça a casa toda. Mesa recheada e farta de doces e quitandas feitos com muito carinho, faziam os finais de tarde o melhor momento do dia. Juliana

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RECEITAS

COXINHA DE FRANGO DA DONA REGINA

Põe peito de frango pra cozinhar.

Bota a água pra ferver E na água põe sal

E põe um quadradinho de caldo Knorr

E põe azeite.

Depois de levantar fervura põe farinha de trigo E aí mexe, mexe, mexe.

Na hora que a panela de pressão chiar, fica mais 15 minutinhos e de pois desliga.

Tira a massa da panela pra esfriar.

Tira a pressão da panela do frango. Na hora que a tampa cair, já dá pra mexer.

Tira o peito de frango e põe pra esfriar.

Depois desfia o peito de frango.

Pega a panela da massa

E põe tempero E põe sal E põe azeite

E põe o frango desfiado

E põe colorau pra dar uma corzinha. Depois de refogar tem que deixar es friar mais um pouquinho.

Esfriô?

Aí pode modelar, Mas tem que fazer bem redondinha E tomar cuidado com a pontinha.

Passa na água E passa na farinha de pão

E pra fritar tem que tá com o óleo bem quentinho. [...]

Mas mãe e as medidas? Ah menina, as medidas é tudo no olho.

Aí amassa a massa até ficar lisinho. Se pregar na mão, aí pega um tiquinho de manteiga.

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BROA DE FUBÁ COM QUEIJO

Ingredientes

250 ml de fuba;

250 gramas de açúcar; 250 ml de leite; 200 ml de óleo vegetal; 3 ovos;

1 pitada de sal;

1 colher de fermento em pó;

1 copo de queijo ralado.

Modo de preparo

Adicione no liquidificador o fubá, açúcar, leite, óleo vegetal, sal e os ovos e bata tudo, depois adicione o fermento em pó e queijo ralado e bata delicadamente. Colocar a massa em uma assadeira e levar para assar em forno médio até dourar.

PÃO DE QUEIJO

Ingredientes

150ml de óleo

150ml de água

150ml de leite

500g de polvilho azedo

13g de sal ( 1 colher de sobremesa)

3 ovos

200g de queijo meia cura ralado

25g de queijo parmesão

Modo de preparo

Em uma panela coloque óleo, a água, o leite e leve ao fogo para ferver.

Coloque o polvilho e o sal em um ti gela grande.

Assim que o líquido estiver fervendo, despeje-o sobre o povilho e misture bem com uma colher de pau. Deixe a mistura amornar.

Adicione os ovos e misture com a mão para envolver bem os ingredientes. Acrescente os dois queijos e misture bem com a mão.

Lave as mãos e comece a modelar os pães, se a massa estiver grudando, unte as mãos com óleo.

Coloque em uma forma e leve para assar em forno preaquecido a 180º por aproximadamente 35 minutos.

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FILÉ DE ARUANÃ

Corte o filé em isca e tempere com limão.

Sal a gosto.

Pimenta do reino moída na hora, alho picado fresco e tempero especial da chefe.

Empane os filés em uma mistura de farinha de trigo, fubá fino e uma pi tada de sal.

Por fim

Frite em óleo quente para obter uma casquinha crocante.

Aqui na Butequeria servimos os filés de aruanã acompanhados com molho especial da casa e limão-cravo.

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O que é, o que é? Não se come, mas é bom para se comer.

O que é, o que é, uma comida que liga e desliga?

Eu sou uma coisa que desaparece no calor e permanece no frio.

Sou marrom por fora Branco por dentro E sou muito duro. Quem sou eu?

COCO

Vestida de Amarelo No cacho me criei E até o macaco encantei Quem sou eu?

63 TALHERSTRONONOFFMANTEIGA -
BANANA

Chegamos ao fim do Quitandas do Quintal! Esperamos que você tenha aproveitado a leitura. Se quiser continuar compartilhando conosco esta jornada de ressignificação e denúncia artística e jornalística da tragédia-crime, convidamos a todos para acessarem nossos conteúdos em áudio e vídeo!

Os comunicadores e as comunicadoras da rede CEJA - Comunicação Expressiva pelas Joias que trabalharam com a linguagem do vídeo produziram uma reportagem sobre o rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, e a luta da AVABRUM por encontro, justiça e memória. Nela, vocês encontrarão entrevistas com familiares, homenagens às vítimas, relatos dos participantes da CEJA, cobertura de ações e muito mais! Também poderão assistir o conteúdo no canal do YouTube do projeto Legado de Brumadinho.

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Já o nosso grupo de rádio produziu conteúdos de áudio digital sobre suas histórias de vida, a importância do projeto Legado de Brumadinho e o protagonismo jovem nas oficinas de comunicação comunitária. Criaram ainda matérias sobre a prática da yoga, a Festa do Bacon de Brumadinho e a Cavalgada de São Sebastião.

Você pode conferir os programas de rádio na íntegra no canal do Spotify do Legado de Brumadinho. E a Regional FM (87,9) vai veicular, diariamente, pequenos trechos e chamadas anunciando os programas.

Faça parte do movimento e acompanhe nosso trabalho de comunicação em defesa da vida! A partir de 22 de setembro, teremos conteúdos no ar todas as semanas!

Para conhecer e ter acesso aos links de todas as nossas produções, basta acessar:

Leia nosso fanzine em: https://bit.ly/3E7ConN

Veja nossos conteúdos de vídeo em: https://bit.ly/3Spctwl

Ouça nossos programas de rádio em: https://spoti.fi/3SmiRED

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FANZINE

VÍDEO

RÁDIO

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Projeto realizado com recursos destinados pelo Comitê Gestor do Dano Moral Coletivo pago a título de indenização social pelo rompimento da Barragem em Brumadinho, em 25/01/2019, que ceifou 272 vidas. COMITÊ GESTOR::
REALIZAÇÃO: PARCERIAS:

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