Newsletter Outubro 2014

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JA! JUSTIÇA AMBIENTAL 5 de Outubro, 2014

Boletim # 38


“Roba, pero hace obras” (Rouba, mas faz obras) Cidadania, Corrupção e Consciência Política

Há dias, chamou­nos a atenção a seguinte manchete: “Roba, pero hace obras”. A notícia era de um jornal Peruano, e a frase era de Susana Villarán, Alcaldesa (Presidente do Concelho Municipal) de Lima, a capital do Peru, e candidata a reeleição no sufrágio que teve lugar hoje (5/10/2014). Em campanha, e em jeito de provocação a um dos seus adversários políticos, Villarán dirigiu uma sagaz crítica ao eleitorado peruano, afirmando que este era demasiado passivo face à corrupção. “Essa expressão rouba mas faz obras é conhecida, (…) esse tipo de tolerância que todos temos começa nas nossas casas, nas escolas, encontra­se em todas as partes e é uma cultura terrivelmente danosa.” – disse a dirigente peruana. Escusado será dizer que estoirou uma enorme controvérsia, e nos dias que se seguiram, grande parte dos mais importantes órgãos noticiosos Sul Americanos mencionaram o caso. Apesar de pouco ou nenhum interesse ter a actualidade política do Peru para nós moçambicanos, não conseguimos deixar de achar esta notícia deveras interessante, fruto de um contexto social muito familiar e, como tal, digna de ser partilhada. Com as nossas eleições gerais à porta, e num país onde há e se fala tanto em corrupção como o nosso, achamos que poderíamos usá­la como mote para partilhar algumas ideias.

Quantos de nós não ouvimos já, a propósito de eleições no país, a seguinte barbaridade: “Mais vale deixar esse no poder, ao menos já está rico. Se vier outro, ainda vai ter de enriquecer.” Este é um exemplo da tolerância a que se referia Susana Villarán e que tem de deixar de existir na nossa sociedade também para podermos andar para a frente. A corrupção política, seja em que forma, volume ou medida for, não é aceitável de modo algum e não deve ser tolerada. Outra barbaridade, é a crença que as acções e decisões correctas que alguém numa posição de poder faz em prol dos outros, servem, como numa balança, de contrapeso para as coisas ética e moralmente incorrectas que fazem. O bom desempenho de um político dá­lhe credibilidade, não o direito de fazer e desfazer da coisa pública como se fosse sua. Afinal, o trabalho daqueles em posições de poder não é servir condignamente aqueles que o lá colocaram? Não recebem por isso um salário? Porque é que quem é apanhado a burlar ou a roubar o seu patrão é preso e despedido e os políticos corruptos deste país não o são? Estas ideias podem parecer básicas, mas muita gente muito bem formada por vezes esquece­se. Mas o problema da corrupção em Moçambique é bem mais profundo e vai muito além da tolerância à corrupção da classe política. Muito além... O problema maior é que, entre quem pode, corromper é socialmente admissível. É admissível subornar a polícia. É admissível “comprar” uma carta de condução. É admissível contornar a Lei da Terra para ficar com “aquele terreno”. O resultado: nós Moçambicanos, depois de muito corrompermos quando chegamos ao topo da hierarquia achamos que temos o direito de ser corrompidos. É um problema cultural do qual estamos todos bem cientes e que há muito devíamos, como povo, estar empenhados em solucionar. E não podemos dar­nos ao luxo de esperar que sejam os nossos dirigentes a tomar a iniciativa.

Como sociedade, temos de ser mais exigentes. Para que a nossa democracia cresça, temos de crescer também e exigir que os nossos dirigentes cresçam connosco. Nós é que temos de guiá­los, não podemos continuar a permitir que escolham o nosso rumo. Temos de mostrar­lhes o caminho pelo qual queremos ir. Temos de aprender a impor a nossa vontade, e eles têm de aprender a acatar como sua responsabilidade cumpri­la. Daqui a pouco mais de um mês teremos eleições e a possibilidade de escolher quem nos vai representar nos próximos anos. Façamo­lo com inteligência, e independentemente de quem ganhe, para que as coisas mudem verdadeiramente, temos de deixar claro desde o início que quem manda neste país somos nós, o povo. Democracia é isso.

III Conferência Internacional da Terra Mais uma Conferência Internacional da Terra, organizada pela União Nacional de Camponeses, teve lugar nos dias 1 e 2 de Outubro na sala de conferência das telecomunicações de Moçambique. Foi um privilégio ouvir os testemunhos dos camponeses, as suas preocupações e apelos... que infelizmente na sua maioria permanecem sem solução, sem resposta. As questões mais abordadas foram: ­ Conflitos de terra que se agravam um pouco por todo o país. Os camponeses competem por terra, que por direito os pertence com os grandes projectos como plantações e outros megaprojectos; ­ A falta de mercado e de vias de escoamento do produto, que por vezes leva a que este acabe apodrecendo; ­ A competição desleal com os produtos importados da África do sul e da Swazilândia, apesar de grande parte dos produtos dos camponeses serem produtos orgânicos, os consumidores acabam por escolher o produto mais barato e com melhor aparência em detrimento da produção local; ­ Consultas comunitárias mal conduzidas e tendenciosas, privilegiando muitas vezes o envolvimento apenas dos representantes e não da comunidade como um todo favorecendo a que muitas vezes os líderes sejam ou enganados ou até comprados em troca de alguns benefícios em detrimento do bem estar de toda a comunidade; ­ A falta de incentivo e de uma política especifica para a conservação das sementes locais e do conhecimento local, empurrando os camponeses para a compra de sementes melhoradas que levam a que tenham baixa produção. ­ O Prosavana, pelo facto de estar a ser imposto e ser um programa do topo para a base e que põe em risco a terra e os meios de subsistência dos camponeses, abraçando de forma clara o agro negócio; ­ Outras questões levantadas foram a falta de créditos agrícolas bonificados, a falta de extensionistas, etc... Os problemas são inúmeros, o sentimento de abandono é generalizado e o medo de questionar e de reclamar é permanente. Como podemos estar perante este cenário num país que não se cansa de glorificar a excelente e progressista lei de terras, e o facto de mais de 80% da sua população depender da agricultura?


Outra questão muito discutida foram as sementes, a qualidade das sementes locais vs as sementes melhoradas e sementes geneticamente modificadas, que pensavamos nós não eram permitidas em Moçambique mas que claramente o MINAG tem todo o interesse em introduzir, pelo já tem inclusive campos experimentais. Na sua apresentação o representante do MINAG fez largos elogios aos benefícios dos organismos geneticamente modificados, claramente questionáveis, e referiu inclusive que não podemos ter aversão às novas tecnologias. As preocupações dos camponeses são ignoradas, as preocupações de organizações não governamentais são ignoradas, quando não são acusadas de interesses externos, apesar das inúmeras evidências nos mostrarem que quem está a hipotecar o futuro do país é o governo ao aderir a todas as formas de desenvolvimento ganancioso, baseado na extração de todo o tipo de recursos naturais e mercantilização da natureza. Exemplos dos grandes e sérios impactos do agro negócio, dos organismos genéticamente modificados (OGM) e destes novos programas como o Prosavana são inúmeros, mas mesmo assim teimam em não aceitá­los, teimam em seguir o caminho do lucro em detrimento das pessoas e do ambiente. A convição do representante do MINAG relativamente aos benefícios dos OGMs e o facto de ter se esquecido de mencionar 1 único ponto negativo evidenciou o caminho que o governo está a escolher relativamente a este assunto, apesar da clara contestação dos camponeses presentes, apesar do posicionamento da UNAC e de várias outras organizações da sociedade civil.

e voltamos a questionar então porquê estes conflitos permanecem até hoje sem solução... o maior cego é de facto aquele que se recusa a ver. A III Conferência da Terra veio confirmar a total falta de alinhamento entre o que os camponeses querem e como querem desenvolver e o que o governo ambiciona ser o desenvolvimento económico ideal para Moçambique, desenhado ao mais alto nível com os seus parceiros de cooperação e não com os moçambicanos, na base de programas já implementados noutras partes do mundo para beneficiar países como o Japão, que é um dos principais actores tanto no PEDEC como no Prosavana. Todas e quaisquer organizações que questionem e que procurem melhor entender estes programas são rotuladas por alguns membros do governo como servindo interesses externos, é até hilariante ouvir estes comentários de programas que são completamente importados, e que são contra o desenvolvimento...tudo para evitar ter que responder às questões complicadas que tem vindo a ser consistentemente colocadas... Uma das perguntas que vários camponeses fizeram nesta Conferência foi “mas afinal este governo serve a quem?”...ninguém ousou responder!

A forma como são abordados temas tão sensíveis como o de OGMs é assustadora, só são referidos e considerados os “aspectos positivos”, nenhum aspecto negativo foi sequer mencionado. Os camponeses disseram claramente que querem a sua semente nativa, não querem sementes melhoradas pois estas não germinam, não querem pagar por sementes a cada época, não querem ficar dependentes das grandes empresas do agro negócio. Mas como os próprios representantes referiram, eles não estavam preparados para debater a questão naquele fórum, foram convidados apenas para apresentar o seu trabalho. Ainda nesta conferência foi muito resumidamente apresentado o PEDEC – estratégia de Desenvolvimento do Corredor de Nacala, que segundo o apresentador visa definir estratégias de desenvolvimento económico do corredor de Nacala, salvaguardando os aspectos sociais e ambientais. Como salvaguarda estes aspectos sociais e ambientais continua um mistério, bem como tantos outros detalhes deste imenso e ganancioso programa. Várias questões permaneceram no ar pois a grossa maioria dos presentes desconhece por completo o programa, e o apresentador pouco ou nada de concreto respondeu, mas assegurou que o estudo de 400 páginas dá os devidos detalhes e responde às preocupações. O representante da GAZEDA, responsável pela apresentação do mesmo referiu ainda que o PEDEC não inclui o Prosavana que são programas distintos. E por fim os relatos e testemunhos sobre os actuais conflitos de terra, foram minimizados por um dos representantes do governo dizendo que a lei de terras é bastante clara e não há espaço para debate, se há conflito de terra resolve­se com a lei de terras. Segundo o mesmo não há qualquer dúvida relativamente a esta aspecto, e

Uma recordação da marcha de Agosto 2012, quando da reunião da SADC, este ano foi no Zimbabwe, e é simples o que os camponeses e o povo dizem “Nada de nós (as pessoas), sem nós.


VAMOS CONSEGUIR PARAR A CHACINA AOS NOSSOS ELEFANTES? Num artigo do nosso boletim de Junho do ano passado (I) sobre os tristes relatos que davam conta de uma segunda extinção dos rinocerontes em Moçambique (uma vez que estes já haviam sido extintos em território nacional e reintroduzidos), fizemos referência à possibilidade de extinção em nosso território de uma outra espécie, os elefantes.

As autoridades responsáveis e com mandato para actuar não agem, nem sequer comentam o problema para não terem de explicar como (não) estão a abordá­lo. Talvez tenham esperança que ele se resolva por si só... E se depender de si assim será: daqui a 4 anos (5 era no ano passado) não teremos elefantes nem problemas. Realmente, só pode ser essa a sua linha de pensamento, de outro modo não se compreende o porquê de toda a sua apatia com algo tão grave. Infelizmente esta postura já é habitual. Afinal, esta permanente incapacidade de tomar quaisquer medidas urgentes e necessárias para solucionar problemas e atentados ambientais graves, seja em defesa dos nossos elefantes, das nossas florestas ou do nosso meio ambiente em geral, é o modus operandi do nosso executivo. Quando não tivermos qualquer recurso natural (sejam animais, florestas ou rios), não teremos mais necessidade de os proteger, e consequentemente não teremos qualquer problema ambiental.

Estudos publicados na altura advertiam que estavam a ser mortos 4 a 5 elefantes por dia, a maioria dentro das nossas reservas, e que se algo não fosse feito urgentemente para mudar esse cenário os elefantes em Moçambique seriam extintos em cinco anos. Essas alegações eram corroboradas por depoimentos tanto de cientistas internacionais como de guardas dos parques. Um pequeno documentário num dos canais moçambicanos, com filmagens chocantes de elefantes mortos e carcaças, foi também televisionado na altura.

Correcto? Não? Então porquê esta inércia? Alguém, por favor, nos pode ou consegue explicar? A respeito disto, em Agosto deste ano foi lançado um elucidativo novo estudo sobre o mapeamento global do mercado ilegal de marfim. Este estudo, intitulado Out of Africa: Mapping the Global Trade in Illicit Elephant Ivory, da autoria de Varun Vira, Thomas Ewing, e Jackson Miller(II), vem deitar ainda mais lenha à fogueira, revelando dados actuais chocantes sobre o contrabando mundial deste produto. O estudo, cuja leitura aconselhamos vivamente a todos os interessados, afirma que o período de 2009 a 2013 foi o pior na história desde que a comercialização de marfim foi banida, e que só em 2013 foram apreendidas acima de 50 toneladas de marfim. Apesar de ser difícil determinar o número correcto de elefantes abatidos para gerar esse porte, sabe­se que pelo menos 20.000 elefantes são mortos anualmente, e que a sua população mundial está em declínio e a caminho de uma possível extinção.

Mas como tudo no nosso país, um ano passou e nada foi feito. Pior, a situação agravou­se e apesar das várias denúncias da sociedade civil e da imprensa, os elefantes continuam a ser chacinados.

Para piorar a situação, por exemplo na China, o preço do marfim subiu de USD $5/kg em 1989 para USD $2.100/kg em 2014. Isto, por si só, fomenta um aumento absurdo no tráfico de marfim e faz com que este deixe de ser “somente” um problema ambiental e passe a ser também um caso de crime organizado com África como ponto focal, no qual países como Moçambique, frágeis em virtude de uma débil fiscalização da vida animal, são os principais alvos.


Dada a gravidade da situação e a fraca ou inexistente acção de muitos dos nossos governos, cidadãos em mais de 100 cidades do mundo juntaram­se na organização de uma marcha global, no dia 4 de Outubro, para protestar contra a actual matança indiscriminada e para exigir que sejam tomadas medidas sérias antes que seja tarde demais.

Dos cinco anos de estimativa para a extinção dos elefantes em Moçambique, sobram agora quatro e nada foi feito. Mas como diz o ditado, “a união faz a força”. Acreditamos que grande parte dos moçambicanos tem consciência da importância de preservar a nossa biodiversidade, a nossa riqueza natural e apelamos a todos que se unam sob esta bandeira e exijam do executivo que tome medidas céleres, práticas e efectivas para salvar os elefantes. Vamos agir para que parem com esta matança desenfreada e sem dó.

Mas o tempo não pára, e quando terminarmos de escrever este artigo, 1 ou 2 elefantes terão sido mortos em Moçambique. Quando você o ler, daqui a uma semana, mais de 30... Já não chega só perguntar PORQUÊ e indignarmo­ nos perante o que não está a ser feito. É hora de agir, de passar à acção, de exercer o nosso direito e dever como cidadãos zelosos e atentos. A inacção e negligência do nosso governo a propósito deste tipo de problemas, é reflexo da nossa apatia como sociedade em exigir que estes sejam resolvidos. E se o amor à mãe natureza não for motivo suficiente para compelir­nos, pensemos que vários são os países africanos que há muito perceberam que a sua biodiversidade é uma enorme riqueza, e destes, muitos os que dela tiram enorme proveito. África do Sul, Tanzânia e Quénia, por exemplo, têm receitas turísticas enormes em virtude da sua gestão inteligente desses recursos. Se permitirmos que se continuem a extinguir espécies em território nacional como vem acontecendo, todos ficaremos um pouco mais pobres.

A luta continua, desta vez pelos elefantes e pelos rinocerontes. (I)Artigo em :justicaambiental.org/index.php/pt/.../2013?...junho (II)Estudo disponível em inglês em http://www.wwf.se/source.php/1578610/out%20of%20africa.pdf

Plantações Florestais como forma de desenvolvimento sustentável: REALIDADE OU UTOPIA? Nos últimos anos o número de empresas florestais dedicadas ao plantio de monoculturas de pinho e eucalipto tem aumentado significativamente em Moçambique. Este aumento tem­se verificado principalmente nas províncias de Niassa, Nampula, Zambézia e Manica, que se diz possuírem condições agroecológicas propícias para o estabelecimento de povoamentos florestais. Ano após ano, essas empresas vão adquirindo cada vez mais terra para as suas plantações sob pretexto de estarem a contribuir para o desenvolvimento do país através do pagamento de impostos e da criação de novos postos de trabalho. Além disso, alegam que os grandes investimentos que fazem para produção de madeira e produtos florestais


através das suas plantações, são em prol de se alcançar desenvolvimento sustentável, na medida em que elas contribuem para o reflorestamento de áreas marginais, melhoramento das condições de vida das comunidades locais e sequestro de carbono da atmosfera no âmbito das mudanças climáticas. No entanto, estudos feitos indicam que as plantações florestais constituem ecossistemas extremamente simplificados, onde não se procura manter um estado equilibrado entre os seres vivos, procurando­se sim, favorecer as espécies plantadas previamente seleccionadas, proporcionando­lhes uma produtividade elevada. Ou seja, os factores de produção são dirigidos exclusivamente para as espécies plantadas e não para o ecossistema como um todo. A introdução de espécies exóticas abarca sempre riscos para o ambiente. O eucalipto (Eucalyptus), por exemplo, é um dos géneros preferenciais dos promotores, e um dos mais controversos pelas suas propriedades e características fisiológicas. Vários são os estudos focados nos efeitos directos do cultivo de eucaliptos em várias partes do mundo (e. g. Poore & Fries, 1985; Evans, 1992). Segundo Schneider (2003), em virtude destes estudos alguns países limitaram e outros até proibiram o cultivo de eucalipto pelos impactos ambientais negativos que este causa. Estes estudos chamam atenção a três preocupações principais: (i) o seu consumo excessivo de água pode baixar o nível de lençóis freáticos, (ii) a supressão do crescimento de outras plantas vizinhas, que pode resultar em fraca capacidade para controle de erosão do solo e, por outro lado, ser propensa a rebrotação e (iii) a baixa aptidão de florestas de eucaliptos para a fauna bravia. Mas, mesmo assim, os promotores das plantações ainda insistem em chamá­las de florestas, muitas das vezes sem ter em conta que a única componente que elas têm em comum é que nas duas formações ocorrem árvores. Fora esta semelhança, não é difícil verificar as diferenças óbvias: numa floresta há diversidade de espécies arbóreas, arbustivas, trepadeiras, herbáceas, gramíneas, lianas, entre outras formações vegetais, cuja combinação gera habitats naturais para uma diversidade de espécies faunísticas, e cujos ecossistemas interagem com elementos como nutrientes do solo, água, energia solar e clima, garantindo deste modo a dinâmica natural de todo o bioma. O surgimento e actividade de várias companhias florestais em Moçambique já começa a fazer­se sentir na vida das populações locais, e infelizmente, não de forma positiva. Isto verifica­se pelo facto dessas empresas ocuparem terras férteis pertencentes às comunidades locais e não áreas degradadas ou marginais como alegam. O motivo é simples: as plantações comerciais necessitam de terras não degradadas para terem uma boa lavra, com baixos custos de produção por planta, livres da compra de insumos como adubos, fertilizantes, etc. A situação torna­se ainda mais preocupante sob o ponto de vista social, quando tais empresas fazem promessas de geração de emprego a longo prazo, sendo que na realidade as grandes plantações geram emprego directo fundamentalmente nas fases de plantio e de colheita. Após a fase de plantio, o número de trabalhadores tende a baixar significativamente e há uma rescisão massiva de contratos laborais. Para mais, os escassos empregos gerados são, em geral, de muito baixa qualidade, sendo, na maioria das vezes, de carácter temporário, com baixos salários e em condições de trabalho

caracterizadas pela má alimentação, o alojamento inadequado e o incumprimento da legislação de trabalho em vigor. Acidentes e doenças em resultado de más condições laborais são igualmente comuns. Actualmente, o argumento de que as plantações florestais contribuem para o melhoramento do meio ambiente tem sido muito usado como propaganda para promovê­las. Não se sabe ao certo até que ponto essa propaganda, alegando que as plantações contribuem para o sequestro de grandes quantidades de carbono, melhoramento de solos, conservação da flora e fauna e regulação do ciclo hidrológico entre outros benefícios, constitui a verdade, visto que em muitos casos as plantações surgem em substituição de florestas ou outros ecossistemas (como matagais, pradarias, etc.) e o desmatamento desses ecossistemas que albergam enormes quantidades de carbono para dar lugar a plantações, por si só, liberta para a atmosfera uma quantidade de carbono superior a aquela que uma plantação em crescimento poderá alguma vez capturar, inclusive a longo prazo. Adicionalmente, as plantações aceleram a erosão hídrica e eólica, na medida em que para a sua implantação ocorre a remoção da vegetação, tornando o solo descoberto nos primeiros dois ou mais anos e pobre em nutrientes, sem falar da compactação do solo fruto do uso de maquinaria pesada. Uma vez removida a vegetação natural, ocorre a consequente perda e destruição de habitats naturais que, por sua vez, cria condições para a perda de biodiversidade local: o desaparecimento de espécies de flora e fauna como resultado da alteração do padrão de distribuição paisagístico do local. A questão é pertinente: serão as plantações florestais realmente o rumo para um desenvolvimento sustentável? Nós estamos convictos que Não.

A Conferência de Líderes Mundiais é SÓ conversa São os Povos que Detêm as Soluções Climáticas Foram os líderes mundiais e as suas promessas pouco credíveis quem, na semana passada, preencheu todas as manchetes de jornais a propósito da Conferência Climática das Nações Unidas de Nova Iorque, mas se quer saber sobre as verdadeiras soluções para a actual crise climática, é sobre o que se passou nas ruas que precisa de se informar. Centenas de milhares de cidadãos e activistas ambientais juntaram­se à Marcha Climática dos Povos, e marcharam, em cidades pelo mundo a fora, de Nova Iorque a Kathmandu, Londres, Delhi e Amesterdão, naquela que foi a maior mobilização climática da história. Milhares marcharam também, paralelamente, nas marchas Flood Wall Street, que apelam à responsabilização das corporações pelo seu papel na actual crise climática.


A nossa mensagem para os ditos ‘líderes mundiais’ é a seguinte: Esta Conferência Climática e as vossas promessas vazias não nos trarão perto de resolver as alterações climáticas; vocês têm de assumir compromissos reais e tomar as medidas correctas, caso contrário, saiam do nosso caminho. Chega de conversa, é hora de agir. Não queremos as vossas fracas e facultativas promessas. O que precisamos é de mais ambiciosos e equitativos cortes de emissões, com base cientifica e vínculos legais. Também necessitamos de financiamento e tecnologia para que os países em desenvolvimento possam lidar com a crise. Na Conferência, ouvimos somente as mais vagas promessas de financiamento, sem quaisquer datas ou especificações reais. A Conferência Climática das Nações Unidas de Nova Iorque estendeu o tapete vermelho para o mundo de negócios. Os líderes de países desenvolvidos têm vindo a negligenciar a sua responsabilidade de evitar uma catástrofe climática, uma vez que as suas prioridades têm vindo a ser progressivamente guiadas pelos estritos interesses económicos e financeiros das corporações, companhias de energia suja e elites abastadas. Nem todas as acções sobre as mudanças climáticas são correctas. Infelizmente, temos uma longa lista de acções erradas ou ‘falsas soluções’ para as alterações climáticas, que são frequentemente apresentadas como soluções. Estas incluem as Mega­barragens, gás natural, o dito “carvão limpo”, a captura e armazenamento de carvão, os organismos geneticamente modificados, os agrocombustíveis, os mercados de carbono, a agricultura climate smart, a energia nuclear, o “offsetting” e mecanismos como o REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal).

Estas falsas soluções distraem­nos das mudanças societárias e económicas reais que existem e são as verdadeiras soluções necessárias para acabar com a crise climática.

Primeiro, e antes de qualquer outra coisa, precisamos de reduzir as nossas emissões de gases de estufa na fonte. Também precisamos de modificar a forma como produzimos, distribuímos e consumimos energia. A energia suja está a causar a mudança climática e a afligir trabalhadores e comunidades locais. Exigimos uma energia comunitária limpa e sustentável – é direito do povo ter acesso à energia; decidir e possuir as suas fontes de energia sustentáveis e os seus padrões de consumo sustentáveis. E o que disse o representante do Ministério da Energia de Moçambique em Nova Iorque? “O nosso objectivo é melhorar o acesso a energias renováveis, aumentar a eficiência energética e promover a urbanização de baixo carbono”. Mas que acções é que estão a ser tomadas? Estão a agir de acordo com o que dizem? Não, na verdade estão a fazer o exacto oposto. Ao invés de apoiar soluções de pequena escala de energia renovável para os 80% do povo moçambicano sem acesso a energia, o governo está a promover mega­projectos, explorações de carvão, petróleo e gás de larga escala, mega­barragens e usurpações de terra de larga extensão. Mas nós faremos com que respondam pelas suas promessas e pressioná­los­emos a implementar um desenvolvimento limpo e focado no povo, mesmo dentro da actual economia suja e focada em poluir.

Os Mega Projectos em Tete estão em Vias de reassentar o Governo De acordo com informações que nos chegam, as multinacionais que operam no Distrito de Moatize, Província de Tete, irão nos próximos tempos reassentar até o Governo. Isto deve­se ao facto das infra­estruturas do Governo Local estarem situadas numa zona que, ao que tudo indica, foi concessionada para mineração. agora.

Mas como assim? – deve você estar a perguntar­se

Ora, a atribuição de licenças de concessão mineira para largas extensões de terra, vem do Governo Central e não do Governo Local. E tal como entre piratas e ladrões, aparentemente não há grande código de ética entre estes dois poderes, e para prová­lo o Governo Central concessionou a área onde se encontram as infra­estruturas do Governo Local. Para quem vê de fora, isto até pode parecer engraçado, mas para quem vive em Moatize e procura o Governo Local para resolver os vários conflitos que ao longo dos anos têm surgido com estas empresas, esta notícia não podia ser mais triste. Afinal, o Governo Local é tão fraco que vai dar lugar a mais uma mina... Como se sentirão os oleiros e camponeses cujas terras foram usurpadas pela Vale e que continuam a lutar pelas indemnizações que lhes foram prometidas? Ainda há semanas, no dia 14 de Setembro, viram a Força de Intervenção Rápida desmantelar uma manifestação pacífica e

legal (uma vez que dispunha de todas as autorizações necessárias) antes desta poder chegar ao seu destino – os portões do Projecto Moatize, da mineradora Brasileira. Agora, certamente já saberão porquê que as autorizações que pediram não serviram de nada: pediram ao Governo errado.


Como se sentirão os camponeses de Ntchenga, entre outros, que ficaram sem o seu gado, seu sustento, e que há mais de 4 anos o vêem “passear” dentro do recinto vedado da concessão da Vale e não conseguem reavê­lo?

Como se sentirão os familiares e amigos das duas crianças que morreram afogadas dia 20 de Setembro no Bairro do Bagamoyo, em Moatize, após cairem numa vala escavada pela Vale ao fazer prospecção de carvão? Um dos pais, indignado, quis procurar satisfações junto da empresa e foi brutalmente espancado pelos seus seguranças. Como se sentirá este homem? Terá esperança de ver justiça feita? Como se sentirão aqueles que vivem nas margens do rio Nyakamadzi, e que já não podem usar as suas águas porque estão poluídas por serem usadas para lavar carvão?

Será que algum dia teremos uma Governação que Promova o Respeito pelos Direitos Humanos em Moçambique? Foi lançado nos dias 28 e 29 de Agosto do ano em curso, o draft do 1º Relatório Nacional sobre Negócios e Direitos Humanos em Moçambique, uma louvável iniciativa do Ministério da Justiça e da Liga Moçambicana dos Direitos Humanos. O relatório, que ainda está aberto a inputs e já conta com diversas sugestões das várias instituições envolvidas na sua elaboração, aborda várias questões pertinentes no âmbito da promoção de uma governação que incuta ao meio corporativo o necessário respeito pelos direitos humanos em Moçambique. Ou seja, a sua finalidade é promover a responsabilidade corporativa ao seu nível mais básico: o respeito pelos direitos humanos; e para fazê­lo, sugere­se uma estrutura assente em três pilares: Governo, Empresas e Sociedade Civil. 1º Pilar: Governo Um líder tem de liderar como exemplo, e o nosso Governo é tudo menos um exemplo a seguir. Como é que é suposto crermos que, o Procurador Geral da República de um sistema judiciário tão “idóneo”, “responsável” e “autónomo” que as suas figuras mais altas são nomeadas e exoneradas pelo Presidente da República, irá ter a coragem política de exigir dos empresários em Moçambique que cumpram com uma política de responsabilidade corporativa, sabendo que os mais importantes e poderosos empresários do nosso país estão intrinsecamente ligados ao nosso executivo? Para mais, parca ou nenhuma é a capacidade de fiscalização do Ministério de Trabalho, e custa­nos a crer que as empresas venham a sair do seu caminho para cumprir com directrizes de responsabilidade corporativa sem ser por temerem que o seu incumprimento traga multas ou outras represálias. Custa­nos a crer na solidez deste pilar. 2º Pilar: Empresas

Em Ntchenga, as pessoas vivem com água contada que lhes é trazida uma vez por mês. Não têm água suficiente nem para fazer convenientemente a sua higiene e vêem frequentemente o seu gado morrer por beber do rio.

Sobre estas nem nos vamos alargar muito por motivos óbvios. O seu objectivo é crescer, lucrar, gerar receitas, fazer dinheiro. São a parte menos interessada neste ‘filme’, pois são quem, no fim do dia, arcará com os custos de promover este avanço. Se depender de si, nada mudará certamente. 3º Pilar: Sociedade Civil

Enfim... a quem deverá recorrer afinal toda esta

Verdade seja dita, no papel tudo é muito bonito, no entanto, o que se verifica na prática é a invariável aliança entre o Governo e o Empresariado em detrimento da Sociedade Civil e dos seus direitos. As autoridades governamentais, ora não têm a experiência e capacidade para lidar com as grandes empresas, ora estão ‘embrulhadas’ em conflitos de interesse.

gente?

Muitas das Organizações da Sociedade Civil, que supostamente deveriam compor o 3º pilar desta estrutura, parecem frequentemente mais interessadas em lutar pelos seus interesses institucionais e agendas, competem entre si, enveredam esforços e realizam actividades redundantes e que resultam apenas na produção de relatórios para agradar a doadores. No meio de tudo isso, acabam por esquecer­se da sua missão.


Por sua vez, as Organizações da Sociedade Civil não têm nem meios, nem o necessário apoio do Governo para proteger a Sociedade Civil; e, em contrapartida, as Empresas, tirando proveito das lacunas e fragilidades do sistema, são frequentemente muito ardilosas em contornar Governo e Sociedade Civil de modo a atingir os seus objectivos, atropelando, sem quaisquer escrúpulos, os direitos humanos dos povos. Ou nos unimos realmente ou não chegamos a lugar algum...

Grindadráp – Matança Anual de baleias e golfinhos nas Ilhas Faroé (Dinamarca) As Ilhas Faroé, um protetorado Dinamarquês, de invejável beleza com uma tradição vergonhosa, um ritual bárbaro que é mantido em nome da tradição e da importância cultural. Todos os anos, em particular nos meses de Julho e Agosto, milhares de baleias piloto são empurradas para as margens das ilhas e cruelmente assassinadas. Os grupos de baleias piloto e outros golfinhos em migração são empurrados para enseadas onde homens, mulheres e crianças de todas as idades aguardam com clavas, lanças, facas e tesouras, levando as baleias a uma morte lenta e extremamente agonizante. Para além da tradição e da suposta importância cultural deste ritual monstruoso não há qualquer outra justificação para estes rituais... alguma carne das baleias mutiladas é aproveitada e distribuida pelas populações locais, mas a maioria é descartada numa vala comum debaixo da água. Em ambos casos as baleias e golfinhos são empurrados para a margem e enseadas por barcos que fazem muito barulho de modo a confundi­los, e uma vez nas enseadas e margens a matança começa... Em ambos os casos são brutalmente mutilados e torturados até à morte. Em ambos os locais, activistas de várias organizações como o Sea Shepherd já foram inclusive presos, por tentarem salvar estes animais, no Japão foram presos por cortar uma rede que mantinha os golfinhos presos, fazendo como que fugissem e nas Ilhas Faroé, recentemente por evitarem que um grupo de golfinhos fosse empurrado para as margens. Foram mais tarde libertos, com algumas sanções.

O Massacre anual de Golfinhos em Taiji – Japão Já tivemos o des­prazer de escrever em protesto contra o massacre anual de golfinhos em Taiji no Japão, mas infelizmente este continua. Ano após ano mais e mais golfinhos são brutalmente massacrados numa das cenas mais crueis e desumanas que se possa presenciar. Após o lançamento do documentário “The Cove” em 2009, muitos de nós acreditamos que o massacre iria terminar dada a dimensão da contestação a nível mundial, mas enganamo­ nos, continua e está acontecer neste momento. O massacre ocorre todos os anos de Setembro a Março, apesar dos intermináveis protestos e do trabalho incansável de organizações como o Sea Shepherd e outras. De Setembro de 2012 a Março de 2013, foram brutalmente assassinados 899 golfinhos e 247 capturados e vendidos para cativeiro...

são inúmeros os apelos junto ao governo japonês para pôr fim a esta prática cruel e desumana, mas os mesmos são ignorados e o massacre continua. Vamos continuar a protestar protestar protestar até que seja impossível ignorar!!!

Referencias, fotos e mais informação: http://www.seashepherd.org/

http://www.earthraceconservation.org/grinds­faroe­islands

Este ano, como de costume, vários activistas voluntários estão em Taiji a protestar de forma muito controlada e a testemunhar e registar esta barbaridade sempre que possível para que o resto do mundo saiba o que se passa ali.

"Só quando a última árvore for derrubada, o último peixe for morto e o último rio for poluído é que o homem perceberá que não pode comer dinheiro." Poverbio dos Indios Cree JA! JUSTIÇA AMBIENTAL AV: Mao­Tsé­Tung n°: 549,1°Dto. Maputo, Tel: 21496668 Mais informação na nossa pagina: Inglês: http://www.ja4change.org/index.php/en/ ; Português: http://www.ja4change.org/index.php/pt/ No nosso Blog: Inglês:https://ja4change.wordpress.com ; Português:http://justicaambiental.wordpress.com Conselho Editor: Anabela Lemos, Daniel Ribeiro, Janice Lemos, Vanessa Cabanelas e Ruben Manna Lay­out: Ticha


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