Catálogo "Ímpares"

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ÍMPARES CATÁLOGO

Pesquisa e coordenação geral Marli Silveira

Curadoria Juliane Mai

Casa das Artes Regina Simonis
Foto: Gianne Vianna

“ÍMPARES” EXPOSIÇÃO

Pesquisa e coordenação geral Marli Silveira

Curadoria Juliane Mai

04/04 a 03/05

Visitação: Ter a Sex 10h às 12h - 13h às 17h; Sáb - 10h às 14h

Entrada gratuita e traje livre

Casa das Artes Regina Simonis

R. Mal. Floriano, 651. Centro. Santa Cruz do Sul. RS

Expediente

Projeto: Exposição “Ímpares”

Pesquisa e coordenação geral: Marli Silveira

Curadoria: Juliane Mai

Artistas: Dulce Helfer, Eliana Baumhardt, Elusa Borowski Morsch, Gianne Vianna, Isabel Goldmeyer, José Arlei Cardoso, Juliane Mai, Magui Kampf, Márcia Marostega, Monique Arabites, Regina Schneider, Riele Kraether, Santelmo, Silvani Gassen Dal Forno, Traudi Meurer e Vanise Garlet. Participação especial de mulheres privadas de liberdade do Presídio Estadual Feminino de Rio Pardo/RS, que são o mote principal do presente projeto e que também produziram obras de arte para a exposição, por meio de oficinas artísticas e literárias

Produção cultural: Roberto Pohlmann

Design gráfico: Gianne Vianna

Tesouraria: Roberto Pohlmann

Assessoria de imprensa: Marli Silveira e Juliane Mai

Expografia: Juliane Mai

Assistentes de expografia: Henrique Gonçalves e Riele Kraether

Clipagem: Juliane Mai

Fotógrafo das obras e dos eventos: Ricardo Pohlmann

Documentário e vídeo da exposição: Ramal 314 (Ricardo Pohlmann e Roberto Pohlmann)

Monitoria: Henrique Gonçalves

Equipe de apoio no presídio: Tatiana Limberger e Juliana Affonso

Atividades: 03.04 - Vernissage

12.04 - Lançamento do livro “Corpos Ardidos”, de Marli Silveira e bate-papo com os artistas e mediação de Juliane Mai

02.05 - Lançamento virtual do catálogo da exposição

03.04 - Finissage com um pocket show da Banda Ramal 314

Visitas guiadas com escolas da rede municipal, estadual e particular da cidade durante todo o mês

Promoção: Associação Pró-Cultura, mantenedora da Casa das Artes Regina Simonis

Apoio Cultural: Comissão de Cidadania e Direitos Humanos, Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande Do Sul e Bene Sole Alimentos

Financiamento: FUNCULTURA - Fundo Municipal de Cultura, através da Prefeitura Municipal, Secretaria de Cultura e Câmara dos Vereadores de Santa Cruz do Sul

Local e data: Casa das Artes Regina Simonis. Rua Marechal Floriano, 651. Centro de Santa Cruz do Sul. Rio Grande do Sul. Brasil. De 03 de abril a 03 de maio de 2025. De terças a sábados

Todos os direitos deste material são reservados à coordenação e pesquisa de Marli Silveira e à curadoria de Juliane Mai. Proibida a reprodução deste material sem conhecimento e aprovação por escrito das mesmas

Agradecimentos

A Exposição Ímpares é dedicada às mulheres privadas de liberdade do Presídio Estadual Feminino de Rio Pardo/RS, reunindo diferentes linguagens artísticas com o objetivo de visibilizar o fenômeno do encarceramento humano, de modo especial, das mulheres. Os coordenadores da Exposição, Marli Silveira, Juliane Mai, Roberto Pohlmann, e os 16 artistas visuais, Antelmo Stoelbenn, Dulce Helfer, Eliana Baumhardt, Elusa Borowski Morsch, Gianne Vianna, Isabel Goldmeyer, José Arlei Cardoso, Magui Kampf, Márcia Marostega, Monique Arabites, Regina Schneider, Riele Kraether, Silvani Gassen Dal Forno, Traudi Meurer e Vanise Garlet, agradecem, inicialmente, à Direção do Presídio Estadual Feminino de Rio Pardo/RS pelo apoio na realização das atividades com as mulheres privadas de liberdade e que se explicita nas 32 obras, além do livro Corpos Ardidos (Mali Silveira), que integram o acervo da Ímpares. Agradecem à Associação Pró-Cultura Santa Cruz do Sul, mantenedora da Casa das Artes Regina Simonis, que não mediu esforços, por meio da sua diretoria, para receber e garantir as condições para a realização da Exposição Ímpares. Agradecimento que se estende a todos os integrantes da Associação, amigos e parceiros. À Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul/AL-RS, pelo apoio institucional conferido à Exposição. Ao apoio institucional do Poder Público Municipal, Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa, FUNCULTURA - SEDUC. Aos parceiros Ricardo Pohlmann, Carlos Lisboa, Carini Paschoal e Felipe Dame. Aos familiares, amigos e parceiros que colaboraram para o desenvolvimento, execução e realização da Exposição Ímpares.

Às mulheres privadas de liberdade do Presídio Estadual Feminino de Rio Pardo/RS, com e por elas!

Marli Silveira

Coordenadora Geral da Exposição Pesquisa

Produção Promoção Realização

Apoio

Apresentação

ÍMPARES

A exposição Ímpares reverbera nas telas, lentes e formas, cenas, gestos e paisagens desdobrados por mulheres reclusas, trazendo ao capturado e ou percebido o que é da ordem do incomparável, das experiências únicas e que revelam a fragilidade e ecos da condição humana no mundo. São experiências-limites e limiares entrecruzadas com e nos olhares que implicam a vida empurrada para o aprisionamento, esticadas, contudo, na direção de uma liberdade possível. Nas 32 obras, criadas por 16 artistas de Santa Cruz do Sul e Vera Cruz, e nas composições das mulheres privadas de liberdade do Presídio Estadual Feminino de Rio Pardo, se explicitam nuances da vida humana, olhares dispostos também na direção do intangível, do ímpar, das experiências vividas na sua concretude mais pulsante, mas que também podem se implicar pelas cercanias dos outros.

A exposição, coordenada por Marli Silveira, com curadoria de Juliane Mai e coordenação executiva de Roberto Pohlmann, se inscreve tanto como um projeto que objetiva a visibilização das mulheres privadas de liberdade por meio de obras visuais, quanto a fruição, por parte da comunidade, artistas e mulheres reclusas, dos seus aspectos artísticos e sociológicos, permitindo uma aproximação dos contextos humanos e culturais postos em diálogo. Há outro aspecto fundamental: a condução pedagógica do olhar, esse processo silencioso e sensível que a arte, e talvez somente ela, provoca, tornando possível a construção de um pacto de generosidade.

Desde 2012, quando dei início aos encontros com as mulheres privadas de liberdade, mesmo com as trocas de cartas com um homem privado de liberdade, em 2022, não reunia as condições para escrever sobre o fenômeno do encarceramento a partir da perspectiva que assumi para tratar do tema sem escondê-lo, sensacionalizá-lo ou estetizá-lo ao ponto de ser naturalizado/tolerado. Visibilizar sem emudecer; dizer sem ocupar o lugar das mulheres, que mesmo tornando público seus textos, continuavam a ser lidas a partir do lugar da precariedade, que são as regiões humanas incluídas pela exclusão, sem valor ou importância para uma sociedade regida pela lógica instrumental-produtivista, preconceituosa e violenta. Pessoas, comunidades e grupos humanos posicionados dentro de um “fora”.

Nos últimos meses, ao retomar meus encontros com as mulheres privadas de liberdade, passei a reconhecer, na categoria do testemunho, que pode ser explicitado, o testemunho, tanto pelas narrativas e literalidade, quanto pela visualidade expressa na pintura, na fotografia e na performance, uma possibilidade vigorosa de dizer com, de permanecer próxima e ajudar a esticar os sentidos, lamentos e desejos de tantas mulheres que habitam lugares impróprios, violentos e desumanos. E aqui não me refiro ao “lugar” propriamente físico, com suas celas, grades e muros. Refiro-me a um dos contemporâneos campos de exclusão (Agamben) e a lastimável e imoral conivência que perfaz um tipo de proximidade que fingimos não existir. A questão norteadora do percurso não é a discussão sobre a inocência, mas a de se reconhecer que estamos muito longe de responder ao apelo da condição humana.

O emudecimento a que estão sujeitas as mulheres, assim como os homens que se encontram privados de liberdade, não diz respeito apenas ao não poder falar, não ter os canais para serem ouvidas, mas também ao fato “intransponível” de que mesmo falando, o que dizem não repercute. Diz respeito também a uma espécie de inelutabilidade,

inelutabilidade, pois não encontram as condições para elaborar saídas para outras possibilidades, impedidas de estender a vivência necessária da radical experiência do cárcere, como empurradas para a invisibilização e a condição de vidas matáveis, não passíveis de luto.

Reconhecer a importância da literatura e da arte originada desse encontro ou desencontro entre a perspectiva fragmentária e memorialística com a crise do historicismo e da razão instrumental é o mote da Exposição Ímpares. A implicação testemunhal das experiências humanas, logradas pela catástrofe do progresso articulado à lógica da exploração, domínio e banalização da natureza e da vida, arranca de outras histórias e epistemologias, a possibilidade de inscrever o testemunho/memória como tecido ético-político de uma narratividade sensível à falta, à violência e ao esquecimento. Reconhecer a força dos testemunhos das mulheres privadas de liberdade também deve obedecer a própria dinâmica da nossa disposição para atender à reivindicação de dignidade das mulheres reclusas.

Há um incômodo sentido pelas mulheres privadas de liberdade, ardidas da dor do desamparo e da solidão, subsumindo seus afetos e compreensão ao descompasso entre o que ainda sonham e o que lhes é permitido sonhar, incapazes de interromperem uma situação que não depende das próprias atitudes. Incômodo que se aventura também na nossa direção, pois não sabemos como lidar com tamanha proximidade e a absurda capacidade de assumirmos com relativa tranquilidade o lado perverso do inquisidor. Corpos indesejados, pisados, maltratados, corrompidos e precarizados. Muitas mulheres perdem todas as referências e o espaço das celas se transforma em limbo, encurtando o tecido menos doloroso do limiar. Mas também ardem porque inflamam seus poros de perspectivas advindas da própria fragilidade e condição de poder transitar por modos possíveis, abertos pela indeterminação humana.

A largura do espaço entre a cela e a rua. A experiência da concretude do tempo misturada às grades e concreto, cismado do compromisso de não passar. Ouvir a distância; sentir o cheiro do vazio, o peso do nada. Eis o meu compromisso, o nosso compromisso com o que segue: permanecer com as mulheres, não as abandonar, pois omeu testemunho é acima de tudo uma vontade de humanidade que se insurge como tarefa para dividir a dor e o lamento das mulheres encarceradas.

Texto parcialmente reproduzido do livro CorposArdidos (Bestiário, 2025)

QUAL É A TUA PRISÃO???

A exposição ÍMPARES foi concebida a partir de uma pesquisa realizada ao longo de dois anos pela escritora MARLI SILVEIRA, que visita quinzenalmente a Penitenciária Estadual de Rio Pardo/RS para realizar atividades literárias com as detentas.

Por meio do empenho em formar uma sociedade mais justa e igualitária, a ideia de movimentos socioculturais dentro do presídio é promover a inclusão e a visibilização de mulheres privadas de liberdade, levando em conta sua condição básica de direitos humanos. Não temos a intenção, de forma alguma, de levantar questões sobre inocência, mas sim, de apresentar situações que são inerentes aos seres humanos e que existem questões para as quais não nos cabe julgamento, e sim acolhimento, independente das ações cometidas.

Ímpares é formada por 32 obras produzidas por 16 artistas, de Santa Cruz do Sul e Vera Cruz, convidados a retratar a condição da reclusão humana a partir do olhar pessoal de cada um, somadas a obras feitas por mulheres privadas de liberdade em oficinas artísticas dentro do presídio. A visitação segue uma linha invisível, permeando sonhos, esperanças, dores e anseios, envolvendo as artes dos profissionais costuradas com pinturas, desenhos e colagens das presas, além de um espaço reservado para as escrituras originais das mulheres enclausuradas, que fazem parte do livro “Corpos Ardidos”, de Marli Silveira, escritora e coordenadora da presente Mostra.

Te convido a viver essa experiência, com a mente e o coração abertos, refletindo sobre os caminhos da vida e nossas prisões existenciais, que podem não ser físicas e nem impostas por outrem, mas por nós mesmos, muitas vezes em profundo segredo, como questões únicas, privadas, ÍMPARES; e que somadas, fazem parte de um mesmo todo.

Juliane Mai Curadora

ARTISTAS

Dulce Helfer

Eliana Baumhardt

Elusa Borowski Morsch

Gianne Vianna

Isabel Goldmeyer

José Arlei Cardoso

Juliane Mai

Magui Kampf

Márcia Marostega

Monique Arabites

Regina Schneider

Riele Kraether

Santelmo

Silvani Gassen Dal Forno

Traudi Meurer

Vanise Garlet

Dulce Helfer

Minhas imagens simbolizam mulheres que apesar de carregarem o peso da solidão e isolamento, são fortes e seguem lutando, mesmo que sozinhas.

Dulce Helfer. “Sozinha”. Fotografia preto e branco. 50 x 70 cm. 2008

Dulce Helfer. “O Peso que a Mulher Carrega”. Fotografia preto e branco. 50 x 70 cm. 2008

Eliana Baumhardt

Minha poética inspiradora é motivada pelo imaginário da minha infância, dos meus amores e seus símbolos, da natureza, da flora e seus elementos, principalmente, do olhar que cativa, transmuta e enternece. Os suportes de que me aproprio são variados e surgem, muitas vezes do inesperado, dando vazão às técnicas e possibilidades motivadoras. Meu encanto está no criar e no fruir poeticamente, utilizando-me da minha essência como meio de condução.

Eliana Baunhardt. “Pensante”. PVA, corante PVA, dermatográfico e grafite sobre papel. 60 x 45 cm. 2025

Elusa Borowski Morsch

Escuridão... realidade ou sentimento. Todos temos áreas escuras dentro de nós, mas buscar os pontos claros é missão individual e íntima. Mesmo que usemos lentes escuras, encontraremos frestas de luz que abrigam a possibilidade de se alargarem e desenvolverem asas que voarão a horizontes impensados e promissores.

A esperança, o crescimento e a vontade agem como ferramentas para rasgar o véu sombrio e permitir a passagem do claro. A alavanca para a redenção está ao nosso alcance, talvez exatamente onde achamos que não exista luz.

Elusa Borowski Morsch. “Ponto de Luz I”. Acrílica e carvão sobre tela. 70 x 50 cm. 2025

Elusa Borowski Morsch. “Ponto de Luz II”. Acrílica e carvão sobre tela. 50 x 70 cm. 2025

Gianne Vianna

Em minhas obras, busco trabalhar com a ideia de um olhar para a mulher sob a “carapuça de impotência”, que lhe é colocada , muitas vezes, como condição para a sua existência, no sentido de investigar o que “resta” quando dissocia-se a mulher-indivíduo da mulher vista e compreendida a partir do seu papel referenciado pelo patriarcado, trazendo o olhar para uma mulher-humana, indivíduo com emoções, vontades e ideias.

Gianne Vianna. “Coração Salgado”.

Fotografia digital sobre canvas.

50 x 70 cm. 2025

Gianne Vianna. “Silêncio”. Fotografia digital sobre canvas.

50 x 70 cm. 2025

Gianne Vianna. “Olhos de Rio”. Fotografia digital sobre canvas. 50 x 70 cm. 2025

Sempre vi as sereias como mulheres aprisionadas num corpo que não é o seu. A mitologia as define como criaturas sedutoras e perigosas, das quais convém manter distância.

A âncora da cauda, enterrada na areia que escapa da ampulheta, remete a um aprisionamento no espaço e no tempo, um tempo que se esvai e não volta mais.

O controle da própria vida torna-se um horizonte que, embora distante e inalcançável no momento, é fonte de luz e esperança.

Isabel Goldmeyer. “Sob Controle”. Acrílica, grafite e carvão sobre tela. 70 x 50 cm. 2025

José Arlei Cardoso

Eu trabalho a ideia da prisão sem muros, sem paredes, sem grades. Aquela prisão do cotidiano, que aprisiona as mulheres a códigos de conduta, a questões morais, a preceitos religiosos e a obrigações familiares. As grades que limitam as mulheres não são sempre visíveis, mas estão sempre presentes, em cada sombra psicológica que representa o medo, a violência, a insegurança e a incompreensão.

José Arlei Cardoso. “Eva”. Aquarela, acrílica e nanquim sobre tela. 50 x 50 cm. 2023

José Arlei Cardoso. “Sombras”. Acrílica e nanquim sobre tela. 50 x 70 cm. 2025

José Arlei Cardoso. “Espelho”. Aquarela, acrílica e nanquim sobre papel. 42 x 30 cm. 2024

Juliane Mai

Minhas obras se encaixam no conceito do expressionismo abstrato, representando meus sentimentos sobre o enclausuramento e os desafios significativos dessa condição para a harmonia entre corpo, mente e espírito.

As restrições físicas, a privação de estímulos e o isolamento social podem desequilibrar essas três dimensões essenciais do ser humano, levando a uma série de consequências negativas para a saúde e o bem-estar geral. Reconhecer essa interligação é crucial para desenvolver estratégias de alívio dos efeitos do aprisionamento e para promover a recuperação daqueles que o vivenciam.

Muitas vezes é preciso apenas uma “Brecha” para que o indivíduo possa encontrar um “Meio” de continuar vivendo ou apenas sobrevivendo, buscando o equilíbrio dessa tríade.

Juliane Mai. “Brecha”. Acrílica sobre papel especial.

60 x 60 cm. 2025

Juliane Mai. “Meio”. Acrílica sobre papel especial.

60 x 60 cm. 2025

Magui Kampf

Apresento três imagens da Série Abandono, que foram produzidas no ano de 2019, em Santa Cruz do Sul, fotografada por Melissa Braga.

No ensaio, busco transmitir emoções que permeavam meu ser, especialmente as emoções de angústia e solidão.

O espaço fotografado ajuda a retratar o íntimo da figura humana e seus universos e possibilidades.

As emoções retratam a luta, o conflito pela liberdade de espírito, em retomar a própria vida e deixar a obscuridade.

Magui Kampf. Fotógrafa: Melissa Braga. “Retorno”, da Série Abandono. Impressão em Canson Matte 200 gr. 40 x 60 cm.

2018

Magui Kampf. Fotógrafa: Melissa Braga. “Menina”, da Série Abandono. Impressão em Canson Matte 200 gr. 60 x 40 cm. 2018

Magui Kampf. Fotógrafa: Melissa Braga. “Socorro”, da Série Abandono. Impressão em Canson Matte 200 gr. 60 x 40 cm. 2018

Márcia

Marostega

“Na exposição Ímpares, apresento duas obras que retratam a figura feminina em um contexto de reclusão, abordando a complexidade da experiência de mulheres que cumprem pena em instituições prisionais. Através dessas representações, busco não apenas dar visibilidade a essas histórias, mas também trazer uma reflexão sobre transformação, resiliência e a possibilidade de um novo começo.

Os elementos visuais escolhidos dialogam diretamente com essa ideia de mudança. As libélulas e borboletas, inseridas em cada uma das composições, são símbolos de renovação, leveza e metamorfose. Assim como esses insetos passam por processos de transformação em suas vidas, também essas mulheres, no tempo de reclusão, encontram a oportunidade de refletir sobre suas trajetórias e cultivar a esperança de um futuro diferente.

A linguagem artística que desenvolvi combina grafite e acrílica sobre tela, explorando o desenho de forma gráfica e a pintura em momentos pontuais. Essa abordagem permite um equilíbrio entre linhas expressivas e camadas de cor, intensificando a narrativa visual e transmitindo as emoções presentes nas figuras femininas retratadas. O contraste entre a precisão do desenho e a fluidez da pintura reforça a dualidade entre a realidade do aprisionamento e a liberdade interior possível através da transformação.

Essas obras são, portanto, um convite à contemplação e à empatia, estimulando a percepção da resiliência humana e da capacidade de mudança que habita em cada indivíduo.

Márcia Marostega. “Sem Título”. Acrílica e grafite sobre tela.

60 x 60 cm. 2025

Márcia Marostega. “Sem Título”. Acrílica e grafite sobre tela.

60 x 60 cm. 2025

Monique Arabites

Em “Sobre Voos e Enraizamentos”, mãos enraizadas no presente oferecem voo para uma libélula– criatura efêmera, presa entre o ir e o permanecer, bem como Iara, no folclore brasileiro, que, embora encantadora, é prisioneira de dois mundos – a terra e o rio.

O animal é voo interno, revelação do oculto. Para a mulher privada de liberdade, esse voo é solitário – encarar a própria psique entre muros e silêncios. A libélula, então, torna-se símbolo: transformação, resiliência, liberdade, onde as grades não alcançam. Já em “Penas”, uma figura feminina encolhe-se no ventre aberto de uma ave, morrendo e renascendo como filha de Uirapuru, que por amor virou pássaro, assim como os relatos de muitas dessas mulheres que se ressignificaram no amor, mas ali, também, encontraram seu maior algoz. São os anos no cárcere, o amor motivo da condenação. Penas que caem de pássaros enclausurados que anseiam voos.

As imagens falam de vidas suspensas entre liberdade e reclusão, onde sentimentos são germinados em sonhos semeados para (sobre)viver.

Monique Arabites. “Sobre Voos e Enraizamentos”.

Nanquim sobre papel. 50 x 70 cm. 2025

Monique Arabites. “Penas”. Nanquim sobre papel. 50 x 70 cm. 2025

Regina Schneider

Corpos sagrados, gaiolas do tempo, da alma, da vida. Gaiolas de medo, que prendem em si o feminino, e sem escolhas, fica o pássaro com asas que não voa.

Regina Schneider. “Gaiola da Alma”. Modelagem em tela de aço galvanizado. 30 x 60 cm. 2025

Regina Schneider. “Anjo Cru”. Acrílica e pasta de modelagem sobre tela. 50 x 70 cm. 2025

Riele Kraether

A obra “Horas de Solidão” retrata uma mulher isolada que sente a dor da solidão em um espaço onde o tempo parece estagnado.

Palavras na composição refletem suas emoções complexas, trazendo à tona lembranças, pensamentos e reflexões sobre suas escolhas. Os minutos lentos intensificam o medo e a incerteza, criando ruídos internos e um silêncio perturbador.

Riele Kraether. “Horas de Solidão”. Pastel e lápis carvão sobre tela. 70 x 50 cm. 2025

Santelmo

O poema “Liberdade”, escrito na prisão, em 1939, por Carlos Marighella, serviu como inspiração para escolha das imagens que apresento nessa exposição.

Liberdade

Carlos Mariqhella

Não ficarei tão só no campo da arte, e, ânimo firme, sobranceiro e forte, tudo farei por ti para exaltar-te, serenamente, alheio à própria sorte.

Para que eu possa um dia contemplar-te dominadora, em férvido transporte, direi que és bela e pura em toda parte, por maior risco em que essa audácia importe.

Queira-te eu tanto, e de tal modo em suma, que não exista força humana alguma que esta paixão embriagadora dome. E que eu por ti, se torturado for, possa feliz, indiferente à dor, morrer sorrindo a murmurar teu nome”

2025

Santelmo. “Socó”. Fotografia. 70 x 50 cm.
Santelmo. “Moçambique”. Fotografia. 50 x 70 cm. 2025

Silvani Gassen Dal Forno

Aprisionamento e Liberdade são conceitos multifacetados e complexos, presentes em diversas áreas de nossa vida, tanto individual, social e política.

As telas de aprisionamento e liberdade são uma forma poderosa de expressão artística, capaz de despertar reflexões sobre a condição humana e a importância da liberdade.

A escolha dos elementos, formas, cores e simbolismos, foram pintadas para tentar transmitir uma mensagem.

A história da minha tela retrata as paredes de uma casa: uma de dentro para fora ,”Aprisionamento”, outra de fora para dentro, “Liberdade”, com uma porta e uma fechadura.

Na tela do aprisionamento, são usadas cores em tons escuros e símbolos que representam a opressão, e a tela da Liberdade usa cores mais solares e vibrantes, com simbologia de esperança e busca da liberdade.

Silvani Gassen Dal Forno. “Aprisionamento”. Acrílica sobre tela. 60 x 60 cm. 2025

Silvani Gassen Dal Forno. “Liberdade”. Acrílica sobre tela. 60 x 60 cm. 2025

Traudi Meurer

Os elementos arquitetônicos cobogós, utilizados em muros e divisórias, fazem parte do conceito destas obras. Eles criam limites, mas permitem vislumbrar o outro lado, preservando a ideia de liberdade. Nas celas do presídio, porém, a única visão do céu é através de uma pequena abertura – um vislumbre distante, com a liberdade sempre inacessível. Essa limitação reforça a sensação de confinamento e distância, agravando o sofrimento da reclusão.

Muitas mulheres privadas de liberdade recebem poucas ou nenhuma visita, aprofundando o sentimento de abandono e solidão. O ambiente frio e hostil, somado à monotonia dos dias, favorece a tristeza e a depressão.

O desejo de liberdade se transforma em um turbilhão de pensamentos angustiantes: Quando tudo isso vai acabar? Quando poderei voltar à liberdade e ver o céu inteiro? Quando poderei sentir o cheiro da natureza e conviver com pessoas queridas? Quando terei a chance de um novo recomeço?

Traudi Meurer. “Sonho de Liberdade I”. Acrílica sobre tela. 60 x 60 cm. 2025

Traudi Meurer. “Sonho de Liberdade II”. Acrílica sobre tela. 60 x 60 cm. 2025

RUPTURA: A cena captura a luta de uma mãe separada de seu filho por uma cela escura e fria de uma prisão.

A solidão abre espaço para uma dolorosa lembrança: a delicadesa e inocência de seu filho buscando amor e segurança na sua mão.

A prisão não apenas a separa de sua liberdade, mas também interrompe o vínculo maternal, arranca-lhe a possibilidade de oferecer carinho e proteção.

SÚPLICA: A obra retrata uma mulher aprisionada e abandonada por seu companheiro e familiares. A mão estendida é um pedido silencioso por socorro. Na lágrima, o reflexo da dor e desespero de quem se sente refém e sem alternativas. As grades envelhecidas contrastam com seu rosto delicado e vulnerável que clama por liberdade e por ser ouvida...

Vanise Garlet
Vanise Garlet. “Ruptura”.
Mista sobre tela. 60 x 60 cm. 2025
Vanise Garlet. “Súplica”.
Mista sobre tela. 50 x 70 cm. 2025

Expografia

Vernissage

Lançamento do livro Corpos Ardidos, de Marli Silveira

Sobre o livro

Marli Silveira ocupa a cadeira de nº 13 da Academia Riograndense de Letras (ARL) e, atualmente, é a presidente da Academia de Letras de Santa Cruz do Sul. Realiza Estágio Pós-doutoral no Programa de Pós-graduação em Filosofia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS.

Com dezenas de livros e trabalhos publicados, destacam-se, na temática do encarceramento humano: Entre peles e poesias (Edunisc, 2017); Liberdade rasurada - narrativa de dor e liberdades (Besourobox, 2019), e Cartas de liberdades (Bestiário, 2023). Marli Silveira é a Escritora Homenageada da 35ª Feira do Livro e 1ª Festa Literária Internacional de Santa Cruz do Sul (2025).

Há livros que se impõem como clamores de Alteridade. Corpos ardidos nos convoca. Em um movimento que transcende o registro, Marli Silveira borda na tessitura da linguagem os ecos das vozes silenciadas das mulheres privadas de liberdade. O cárcere aqui não é apenas uma estrutura de concreto e ferro, mas um mecanismo de exclusão, de desumanização. A autora, ao dar corpo ao testemunho, faz do livro um espaço de insurgência, onde a palavra, antes calada, se inflama e exige ser escutada. O testemunho que emerge dessas páginas não se encerra na leitura: ele se prolonga na inquietação, na urgência de leitura: ele se prolonga na inquietação, na urgência de revisitar as fronteiras da justiça, da moral, da compaixão. A linguagem, orbitando entre a literatura e a filosofia, não estetiza a dor, mas a reivindica como prova incontestável da violência estrutural que se perpetua em nossa sociedade. E assim, Corpos Ardidos se torna mais do que um livro: é um chamado, um espelho incômodo que reflete a face oculta da sociedade, aquela que se acostumou a olhar sem ver, a ouvir sem escutar. Aqui, a literatura e a filosofia não apenas interpretam o mundo, mas se insurgem contra sua indiferença.

Felipe Karasek Psicanalista | Doutor em Filosofia (PUCRS) Pós-doutor: Filosofia e Psicanálise (PUCRS)

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