Monografia “O desenvolvimento histórico do estudo do desenho da criança”.

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JULIANA CASSAB LOPES

O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO PROCESSO DO ESTUDO DO DESENHO DA CRIANÇA

Monografia apresentada à Universidade de Franca para a aprovação no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu (Área de Concentração: Arte e Criatividade, Modalidades de Criação).

FRANCA 2001


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JULIANA CASSAB LOPES

O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO PROCESSO DO ESTUDO DO DESENHO DA CRIANÇA


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JULIANA CASSAB LOPES

O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO PROCESSO DO ESTUDO DO DESENHO DA CRIANÇA

Monografia apresentada à Universidade de Franca para a aprovação no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu (Área de Concentração: Arte e Criatividade, Modalidades de Criação).

FRANCA 2001


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DADOS CURRICULARES JULIANA CASSAB LOPES NASCIMENTO

07/10/1976 - ITUIUTABA/MG.

FILIAÇÃO

José Cassab. Orlanda Rosendo da Silva.

1994 - 1998

Curso de Graduação. UNIRP – Centro Universitário de Rio Preto Licenciatura Plena em Educação Artística com Ênfase em Desenho.

2002

Professora de Editoração Eletrônica do Departamento de Informática do SENAC de Ribeirão Preto.

2002

Professora de Laboratório Digital do Curso Técnico de Produção Gráfica - SENAC de Ribeirão Preto.


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A professora Lindalva Barbosa de Lorga Professora de educação artística consciente da linguagem utilizada no desenho pelos seus alunos, que lia os meus de uma maneira que me assombrava e deslumbrava, e que me estimulou a buscar o conhecimento para que eu entendesse, como ela e tantos outros, essa língua maravilhosa e misteriosa que é o desenho.


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AGRADECIMENTOS

A meu marido, Rodolfo, pela força, carinho, compreensão e apoio durante todo o processo de meu envolvimento com a pesquisa e execução deste trabalho. Obrigada hoje e sempre; a minha mãe, Orlanda, pelo amor incondicional, pela sabedoria e maneira irrepreensível com a qual norteou minha educação, a formação de meu caráter e valores ensinados, entre os quais a certeza que a paciência e a busca do conhecimento só farão somar benefícios as nossas vidas; a Prof. Dra. Susana Maria Moreira, pela atenção em ler, criticar, apontar os pontos a serem melhorados neste trabalho de pesquisa e se mostrar francamente aberta e disposta a ajudar; aos professores e funcionários da Universidade de Franca, pela colaboração e pronta atenção demonstradas nos momentos em que a ajuda foi solicitada; agradeço profundamente a todos, e em especial, mais uma vez, a meu marido, sem a colaboração e a atenção dispensadas, não teria sido possível a realização desta conquista que foi a finalização desta monografia; minha mais sincera gratidão.


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SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS ...............................................................................................................7 LISTA DE QUADROS .............................................................................................................9 RESUMO ................................................................................................................................10 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................11 I - DESENHO DA CRIANÇA, OS PRECURSORES DA DESCOBERTA DE UM NOVO UNIVERSO ................................................................................................................14 II - O DESENHO E AS TEORIAS DOS GRANDES FORMULADORES DOS ESTUDOS SOBRE A INTELIGÊNCIA, O DESENVOLVIMENTO E A PSICOLOGIA DA CRIANÇA................................................................................................25 III - A EDUCAÇÃO PELA ARTE, A VISÃO DE UM TEMPO ..........................................39 IV - MEIO SÉCULO DE ESTUDO DO DESENHO .............................................................50 V - ABORDAGENS DAS PRIMEIRAS ASSOCIAÇÕES ENTRE OS ESTUDOS DO DESENHO E DA ESCRITA.........................................................................53 VI - ABORDAGENS PSICOLÓGICAS DO DESENHO ..................................................... 58 VII - O DESENHO DA CRIANÇA POR DIVO MARINO ..................................................61 VIII - A INTERPRETAÇÃO DO DESENHO INFANTIL POR JOSEPH DI LEO..............81 IX - NOVAS PERCEPÇÕES DO PAPEL DO DESENHO ...................................................86 X - O DESENHO DA CRIANÇA POR FLORENCE DE MÈREDIEU ................................96 XI - ABORDAGENS ATUAIS ............................................................................................107 XII - O DESENHO DA CRIANÇA POR MAUREEN COX ..............................................114 CONCLUSÃO.......................................................................................................................142 BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................147 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................150


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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Desenho criança de dois anos – garatuja desordenada

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Figura 2 – Desenho criança de três anos – garatuja controlada

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Figura 3 – Desenho criança de dois anos – garatuja controlada

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Figura 4 – Desenho criança de quatro anos, Um Homem

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Figura 5 – Desenho estudante sete anos, Minha Família

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Figura 6 – Desenho Apanhando flores

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Figura 7 – Desenho estudante nove anos, Cena da Cidade

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Figura 8 – Desenho estudante nove anos, Jogando pegador no pátio da escola

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Figura 9 – Desenho estudante treze anos, Pensando

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Figura 10 – Desenho estudante, Segundo Grau

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Figura 11 – Traçado circular, criança de vinte meses

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Figura 12 – Aparecimento de formas isoladas

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Figura 13 – Traçado em forma de dentes de serra

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Figura 14 – Desenho Salim N. Abdala, oito anos

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Figura 15 – Desenho Walter Martins, nove anos

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Figura 16 – Desenho Elísio Ventura, sete anos

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Figura 17 – Desenho Magda Triani, dez anos

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Figura 18 – Desenho Jair Martins, sete anos

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Figura 19 – Desenho Wilma Barbosa, dez anos

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Figura 20 – Desenho Lília Sanches, sete anos

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Figura 21 – Desenho Felipe Petranu, oito anos

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Figura 22 – Desenho Aracy H. Galdo, três anos

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Figura 23 – Desenho Suely A. Pisani, quatro anos

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Figura 24 – Desenho Luis E. Ciampo, cinco anos

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Figura 25 – Desenho Ayrton Gallo, seis anos

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Figura 26 – Desenho Antonio D. Gallo, sete anos

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Figura 27 – Desenho Diva Gomes, oito anos

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Figura 28 – Desenho Isaura Spinelli, nove anos

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Figura 29 – Desenho Silvana Calefi, dez anos

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Figura 30 – Desenho Marilyn D. Campano, onze anos

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Figura 31 – Desenho Helena A. Fabri, doze anos

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Figura 32 – Desenho Werther Fabri Filho, treze anos

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Figura 33 – Desenho Sílvia Maria C. Bueno, oito anos

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Figura 34 – Desenho C. Camargo, dezoito anos

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Figura 35 – Evolução da figura do boneco

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Figura 36 – Vinte tipos de rabiscos básicos segundo Kellog

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LISTA DE QUADROS

QUADRO I – Dez principais temas abordados no desenho das crianças do sexo masculino segundo pesquisa realizada em Ribeirão Preto em 1955

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QUADRO II – Dez principais temas abordados no desenho das crianças do sexo feminino segundo pesquisa realizada em Ribeirão Preto em 1955

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QUADRO III – Dez principais temas abordados no desenho das crianças de ambos os sexos segundo pesquisa realizada em Ribeirão Preto em 1955

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LOPES, J. C. O desenvolvimento histórico do processo do estudo do desenho da criança. Franca: Universidade de Franca, 2001. Monografia. (Especialização Lato Sensu - área de concentração: Arte e Criatividade, Modalidades de Criação).

RESUMO Entender como é vista e discutida a questão do desenho infantil é uma necessidade para o professor de arte e para todas as pessoas que tem responsabilidade e contato direto com crianças. A conceituação, a significação e a postura a se adotar ao interagir com a criança e sua produção gráfica são aspectos que somente começaram a serem estudados a partir do final do século XIX, e esta monografia tem como objetivo a realização de uma pesquisa histórica e a hierarquização do desenvolvimento desse estudo, descrevendo o caminho percorrido desde as primeiras pesquisas, até os dias de hoje. Ao serem descritos, os estudos realizados vão traçando uma linha onde vemos as questões de causa e efeito que as posturas adotadas tiveram junto à educação artística aplicada nas escolas e na maneira do adulto lidar com o desenho de sua criança. Será visto que, a partir das novas descobertas e colaborações científicas, vão se formando novas propostas, que condizentes com o período histórico em que são formuladas, abrangem uma série de questões, como o estudo do desenho paralelo e aplicado aos desenvolvimentos cognitivos, físicos, emocionais, mentais e psicológicos da criança. O desenho está presente em todos esses campos e veremos parte do que foi verificado sobre esse tema até a atualidade. A colaboração científica deste trabalho será de, através da análise que se fará paralelamente aos fatos descritos, oferecer uma visão geral de um processo, estabelecendo através da história averiguada uma relação onde poderá se entender porque temos hoje a atual visão sobre o tema. Uma visão que vê o domínio do desenho como um dom, enquanto acreditamos que na verdade esse domínio possa ser adquirido através de estudo, treino e orientação. A história do estudo do desenho nos mostra que, devido ao fato do assunto ter sido descoberto em uma época de profundas mudanças, acabou-se por se tomar uma postura extremamente libertária sobre qual a maneira correta do adulto conduzir o contato da criança com seu próprio desenho. Afinal, depende do adulto o fornecimento à criança de materiais para que ela possa, desde muito pequena, se valer desse exercício e ferramenta de interação com o mundo. Veremos as últimas propostas e averiguações realizadas pelos estudiosos que visam mudar o quadro atual, que não direciona nem orienta esse trabalho de forma a oferecer a criança mais do que ela própria possa fazer sozinha, sem contato com o conhecimento formal que a atividade oferece e que poderia facilitar muito a maneira como a criança lida com essa sua habilidade ao longo, inclusive, de sua futura vida adulta. Procuraremos apontar as razões para que as pessoas tenham mais atenção e entendam parte dos vários significados contidos e que acompanham o desenho da criança. Entendê-la enquanto indivíduo e compreender algumas de suas questões básicas através da busca de um contato mais consciente com seu desenho, torna a tarefa de se chegar à criança mais fácil, afinal, ela se utiliza desse desenho também como linguagem, expressão e sabermos ler essa linguagem facilita muito o nosso acesso e participação junto ao mundo infantil.


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INTRODUÇÃO

O objeto de estudo desta monografia é a investigação do processo de produção do desenho da criança, partindo da abordagem histórica do nascimento e desenvolvimento do interesse dos estudiosos e suas teorias nesse campo. O estudo do processo de desenvolvimento da personalidade, capacidades motora, sensorial, cognitiva, lingüística e intelectual da criança e seu comportamento somente começaram a ser registradas no final do século XVIII, tendo como um dos pioneiros JeanJacques Rousseau. Uma ferramenta importantíssima para a realização desses estudos foi o desenho produzido pela criança, que passou a ser objeto de estudo de Ricci (1887), Luquet (1913), Dewey (1925), Goodnough (1926), Read (1943), Lowenfeld & Brittain (1947), Rioux (1951), Arnheim (1954), Piaget & Inhelder (1956), Marino (1957), Stern (1961), Kellog (1970), Mèredieu (1974), Gardner (1980), Cox (1995) entre tantos outros, passando a ser um capítulo à parte, abordado não somente em estudos abrangentes, como específicos. Psicólogos,

pedagogos,

artistas

e

educadores

enfocaram,

estudaram

e

desenvolveram diversas teorias e interpretações sobre a produção do desenho infantil. Foram


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utilizados ao longo desse período enfoques variados: aspectos referentes à natureza emocional e psíquica da criança, sendo o desenho utilizado como instrumento de avaliação de inteligência, personalidade e desenvolvimento mental. A análise da linguagem gráfica em seus aspectos formais e simbólicos. Suas relações com os desenvolvimentos motor, cognitivo, da linguagem e da escrita. O desenho como expressão artística da criança. E desses enfoques surgiu toda uma postura adulta em como lidar com a criança e seu desenho. Foram elaboradas ao longo do século XX várias classificações referentes aos estágios, características e fases do desenvolvimento infantil, baseados em fatores sociais, culturais, psicológicos e pedagógicos. Conhecer, entender e perceber a evolução desses estudos e como eles interferem hoje na compreensão das pessoas em relação à produção gráfica da criança é o que se buscará através desta monografia. Mapear, ordenar e hierarquizar esses estudos, apresentar um trabalho que reúna uma abordagem histórica de como nasceu, quem desenvolveu e quais foram as principais linhas de pesquisa utilizadas até o dia de hoje pelos estudiosos do desenho. Linhas que defendem alguns princípios que foram divergindo e outros que foram se completando ao longo do tempo, de onde surgiram as diferentes propostas educacionais de como direcionar a criança ao encontro de sua habilidade gráfica. Nosso interesse na abordagem desse assunto nasceu como necessidade de compreensão de um processo de desenvolvimento próprio, visto que o desenho sempre foi utilizado como forma de expressão significativa desde a infância até hoje, além de ser ferramenta importantíssima na atuação dos educadores no ensino da arte e no contato dos pais com o mundo de suas crianças. O aprofundamento desses conhecimentos e a pesquisa a ser realizada serão de grande importância ao entendimento e à compreensão do significado do desenho. Desta forma, nos valeremos das ferramentas necessárias para avaliar os vários aspectos do desenvolvimento da criança através do que ela desenha de maneira ampla e com maior aproximação científica, por meio de todo o processo investigado.


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Essa monografia buscará em dados pesquisados por outros autores a respeito do tema O desenho da criança seus apontamentos e conclusões, reunindo em uma publicação o histórico do desenvolvimento de um estudo que poderá servir de bússola para os que virão, se norteando através desta pesquisa, na busca do entendimento do processo. Poderão identificar alguns dos principais estudiosos que se envolveram, em ordem cronológica, em investigar o desenho infantil, a bibliografia produzida, suas idéias e como elas influenciaram os que vieram em seguida, concordando ou não, desenvolvendo teorias contrárias e contribuindo para o entendimento de um assunto inesgotável. Serão pesquisadas e citadas questões como a conceituação do desenho infantil, sua utilização em estudos do processo cognitivo da criança, de personalidade, da inteligência, aplicações nos processos de análises psiquiátricas e psicológicas, as abordagens e posturas educacionais e sociológicas que se desenvolveram, e a definição das etapas formais das representações gráficas das crianças até à adolescência, segundo alguns desses autores. Além de uma descrição mais generalizada buscando ordenar cronologicamente os vários estudos acerca do assunto, serão abordadas com mais profundidades o conteúdo de três obras: O desenho da criança, de Divo Marino, de 1957, O desenho infantil, de Florence de Mèredieu, de 1974 e O desenho infantil, de Maureen Cox de 1995. Abordá-las com maior destaque será interessante porque cada uma, de certa maneira, sintetiza as descobertas, discussões e propostas de sua época. Melhor ainda, uma questiona, complementa e reformula seqüencialmente o que a outra divulga. Uma apresenta uma nova visão em contrapartida à outra, gerando ao longo da leitura uma série de questionamentos, e nos fazendo formularmos os nossos.


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I - DESENHO DA CRIANÇA, OS PRECURSORES DA DESCOBERTA DE UM NOVO UNIVERSO

O que a criança significa enquanto ser humano em formação e a necessidade de seu entendimento são questões que só começaram a ser consideradas a partir do século XXVI. Isso se deu com as pesquisas de Jean Jacques Rousseau (1712-1778), um dos primeiros a conceber a criança como um ser dono de uma personalidade, diferente do adulto, com necessidades próprias e uma mentalidade relacionada a tais necessidades. Ele foi muito importante para o início de uma época que começava a entender a criança como uma entidade diferente e não um ente inferior, inacabado e incompleto, que precisava se tornar adulto o mais rapidamente possível. (MARINO, 1988, p. 87) A partir daí a criança passa a ser objeto de estudo e surgem, registrados por autores como Charles Darwin (1877), Hogan (1989), Clara e Willian Stern (1910), Preyer (1899), as biografias de bebê, estudos onde eram registrados detalhes observados sobre o comportamento e desenvolvimento desses autores a respeito de seus próprios filhos. (COX, 2001, p. 4) (GOODENOUGH, 1974, p. 25)


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O primeiro autor conhecido a publicar um estudo enfocando o desenho infantil é Ruskin, em 1857. Entre dezembro de 1895 e janeiro de 1886, Ebezener Cooke divulga um artigo, O Nosso Método para o Ensino da Arte e a Natureza da Criança, publicado no Jornal of Education, onde defende a prática do desenho à mão livre e o abandono da cópia sobre papel quadriculado, prática que levava, segundo ele, somente a uma representação mecânica e fria, não dando a criança a menor liberdade de expressão artística e individual e possibilidade de desenvolvimento imaginativo. Em 1887 o italiano Corrado Ricci, um famoso crítico de arte, publica L’Arte dei bambini, contendo pela primeira vez reproduzidos em um livro, uma coleção de desenhos reais de um grupo de crianças italianas observadas por ele. Observa a dificuldade que a criança demonstra em desenhar aquilo que vê, citando a ocorrência das transparências, os aspectos estéticos, a evolução na cor e possíveis relações com a arte primitiva. Ricci acredita que os desenhos que as crianças fazem não são uma tentativa de mostrar a aparência real dos objetos, mas expressões do que elas conhecem sobre eles. (CAMPOS, 1999, p. 13) Lichtwart, um alemão, publica no mesmo ano que Ricci (1887) a obra Arte na Escola, onde afirma que a criança, obedecendo à leis imutáveis no tempo e no espaço, apresentam uma relação clara entre suas primeiras tentativas e os desenhos dos primitivos, simplificando os objetos nas suas representações, (LICHTWART, 1887 apud MARINO, 1988, p. 88) inicia-se aí uma percepção da homogeneidade das representações gráficas, independente de raça ou tempo. Em 1895, James Sully publica o livro Studies in Childhood, onde utiliza a expressão “arte infantil” pela primeira vez, reconhecendo-a como uma arte individualizada, peculiar e com qualidades, mas que, preso aos conceitos da época ainda não tomada do espírito de liberdade que virá a seguir, ainda considera as atividades da criança algo a ser


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policiado e corrigido, citando esses desenhos e suas características como rebatimentos e transparências como sendo representações erradas e imperfeitas. (MARINO, 1988, p. 89) Sully considera a arte infantil uma arte embrionária e elabora três grandes fases que são retomadas posteriormente, onde cita a fase da garatuja informe, o desenho primitivo ou esquema e os desenhos mais elaborados, tematizados em personagens e animais. (RIOUX, 1951 apud COUTINHO, 2002) Ricci, Spencer, Cooke e Sully dão suporte através de suas observações e conclusões a uma nova maneira de se encarar a produção do desenho da criança, abrindo o caminho para toda uma série de estudos que vieram em seguida. (MARINO, 1988, p. 89-90) Herbert Spencer publica nesta época um ensaio sobre a educação intelectual, moral e física, seguindo uma tendência evolucionista. Baseia-se no estudo científico do desenvolvimento mental da criança. Essa psicologia que estuda a criança surge ocupando um lugar privilegiado entre as várias linhas de pesquisa que estão começando a se desenvolver entre os estudos psicológicos que surgem naquele fim de século. Spencer aborda o paralelismo da ontogênese1 à filogênese2. A chamada psicologia genética. (RIOUX, 1951 apud COUTINHO, 2002) Reconhece também o que é chamado de artista na criança, afirmando que a representação da criança busca recriar coisas de grande dimensão, que atraem pela cor e que, das quais pode-se verificar uma grande associação de idéias. Questiona não se o fato é que a criança faça bons desenhos, mas sim se ela desenvolve ou não a sua vida mental. Condena o hábito de desenhar copiando e dos exercícios das linhas retas, curvas e compostas, prática educacional da época,

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Ontogênese . [De ont(o)- + -gênese.] S. f. Biol. 1. Ontogenia. Ontogenia . [De ont(o)- + -genia.] S. f. Biol. 1. Desenvolvimento do indivíduo desde a fecundação até a maturidade para a reprodução; ontogênese. [Cf. filogenia (1).] . (Novo Aurélio, 2002)

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Filogênese . [De filo-1 + -gênese.] S. f. Biol. 1. V. filogenia (1). Filogenia . [De filo-1 + -genia.] S. f. Biol. 1. Evolução das unidades taxonômicas; história evolucionária das espécies; filogênese. [Opõe-se a ontogenia.] 2. Evolução (10). [Cf. filoginia.]. (Novo Aurélio, 2002)


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impostos às crianças quando alcançam a idade das lições de desenho. (MARINO, 1955, p. 134) Em 1895, James-Mark Baldwim publica O Desenvolvimento Mental na Criança e na Raça influenciado pelas teorias de Spencer, onde inclui um estudo da imitação gráfica de sua filha, de um ano e sete meses à dois anos e oito meses. Entre 1901 e 1904, Karl Lamprecht realizou a mais vasta investigação sobre desenhos de crianças da Alemanha, Suíça, Bélgica, Inglaterra, Suécia, Romênia, Rússia, Japão, Estados Unidos e África, feita até então, comparando esses desenhos com produções pré-históricas de povos primitivos. Estudo apresentado no Seminário de História Universal e da Civilização, da Universidade de Leipzig, apresentou como resultado uma teoria onde ele indica que haviam três caminhos para se demonstrar o desenvolvimento científico da psicogênese humana: a história da civilização, a etnografia e a psicologia da criança com ênfase no desenho como instrumento de pesquisa. Lamprecht contou com Levistein (1905) como colaborador. (COUTINHO, 2002) Nestes primeiros períodos de estudos muito se falou e se comparou o desenho da criança com a arte primitiva, o que não encontrou grande embasamento ao longo das abordagens que se seguiram. Por isso, não será discutido ao longo desta monografia as questões que foram levantadas referentes a essas comparações. Neste período de início de século XX as descobertas das cavernas cobertas de pinturas primitivas na França, o rompimento da arte figurativa com suas regras, dado ao nascimento das correntes modernistas, as descobertas científicas, evolucionistas e o nascimento da psicanálise montam um cenário onde as abordagens que veremos sobre essa nova descoberta, a valor da criança enquanto ser em formação e sua produção gráfica se fazem bastante coerentes neste contexto, mas que irão sendo revistas ao longo do estudo através das novas descobertas, abordagens e mudanças.


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Em 1907 Claparède, através de um estudo similar ao feito por Lamprecht, busca investigar as etapas evolutivas do desenho, buscando uma conexão entre a aptidão para o desenho relacionado à capacidade intelectual da criança. Na Suíça, Ivanoff (1909) baseado nas idéias de Claparède buscou encontrar um sistema para avaliação dos desenhos baseado em três critérios de igual importância: noção de proporção, concepção criativa e valor técnico e artístico. Katzaroff (1910) realizou uma pesquisa buscando apurar os temas desenhados pela criança com mais freqüência. Análise que se repetirá muitas vezes, feita por vários autores e sempre apresentando resultados pertinentes e que acrescentam alguma informação interessante sobre a criança e seu tempo. Nos Estados Unidos, Maitland (1895) também havia realizado uma pesquisa referente a essa quantização e seus resultados coincidiram amplamente com os obtidos por Katzarof. A diferença se deu apenas por que enquanto Katzarof dividiu os temas entre as idades, dos seis aos quatorze anos, Maitland computou um resultado geral. Enquanto Katzarof verificou através de seu método que a ordem estava dividida em primeiro lugar, ocorrências para temas variados, segundo, casas e terceiro, a figura humana, Maitland verificou que até os dez anos a figura humana era o tema mais reproduzido. (GOODENOUGH, 1974, p. 23-24) Neste período entre os precursores dos vários segmentos de estudos referentes ao desenho infantil, podem-se mencionar os nomes: Baldwin (1894), Herric (1893), Barnés (1892), Lukens (1896), Brown (1897), Shinn (1897), Roubier (1901), Partidge (1902), Kerchensteiner (1905), Levinstein (1905), Lobsien (1905), Major, (1906), Gotinga (1906), Budapest (1906), Claparède (1907), Schutyten (1907), Clark (1902), Kik (1908), Florença (1908), W. Stern (1909), Dix, (1912), Rouma (1913), Krotzsch (1917), Buhler (1919), Cyril Burt (1921), Hartlaub (1922), Dewey (1925), Wurff (1928), Britisch (1931). (CAMPOS, 1999, p. 13-14) (GOODENOUGH, 1974, p. 24-25)


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Kretzchmar (1902, 1910), Degallier (1905), Haddon (1904), Probst (1906), Verworn (1907), Dohleman (1908), Van Gennep (1911), Rouma (1913) e Grosse (1915) são os autores que abordam questões referentes a comparações de desenhos infantis em relação à produção de desenho pré-histórico. (GOODENOUGH, 1974, p. 26) Dentre os estudos realizados por todos esses pesquisadores, surgem conceitos como segundo Lukens (1896) “a criança primeiro se interessa pelo produto do gesto gráfico. Passa a se interessar pela ação de desenhar e dá livre curso à sua imaginação. Quando o espírito crítico se exerce, ela constata a insuficiência da sua produção e para de progredir”. Segundo Brown (1897) “inicialmente a criança se interessa pelo movimento; passando em seguida a se interessar pelo produto de seu gesto; logo a mão passa a obedecer a vontade e o desenho se aproxima mais e mais da realidade objetiva”, contradizendo Lukens. (COUTINHO, 2002) Levistein (1904), afirma que os “sinais e a imagem são uma linguagem para a criança. Desenhar significa descrever e não representar. Ela desenha qualquer coisa porque quer dizer qualquer coisa sobre isto que se desenha”. (MARINO, 1988, p. 92) Kerchensteiner (1905) analisou em Munique, na Alemanha cerca de dez mil desenhos feitos por crianças de sua região e classificou-os em três grupos principais e alguns intermediários: 1 Desenhos puramente esquemáticos. 2 Desenhos onde a criança busca representação do real. 3 Etapa em que criança busca a representação tridimensional. (GOODENOUGH, 1974, p. 24-25) Ele discute e compara questões como as diferenças entre os desenhos das crianças, especialmente dotadas, normais e débeis mentais3. E as diferenças entre as produções feitas

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Termo utilizado na época para designar deficientes mentais de todos os níveis.


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por meninos e meninas. Segundo suas pesquisas, a criança desconhece a terceira dimensão e não sabe representar o espaço, e que deve ser dada a ela a liberdade de desenhar, livre de cópias e da busca insistente em representar a realidade através delas. Alega que as crianças incluem em seus desenhos os aspectos principais de seu conceito sobre certa categoria de objetos, e que são esses conceitos, e não os objetos reais é que são os seus modelos. Segundo Willian Stern (1908) “a garatuja está no desenho infantil quase como o balbuciar está para o falar da criança”. Stern publica várias monografias sobre o tema e destaca a diversidade imaginativa que as crianças utilizam para representar o espaço, de acordo com sua idade. (MARINO, 1988, p. 93) Kik (1909) discute o que seriam as diferenças entre a verdadeira capacidade criadora e a mera perícia em se copiar. No estudo de desenhos de pessoas portadoras de desordens mentais e psicopatológicas, Reja (1901) e Rogues de Fursac (1918) são os pioneiros. Podendo-se citar Rouma (1913), Hamilton (1905), Kurbitz (1912). (GOODENOUGH, 1974, p. 26) Em 1913, Rouma publica Le language graphique de l’enfant, um estudo bastante detalhado para a época, feito a partir da observação cuidadosa dos desenhos realizados por crianças retardadas4 e normais, de ambos os sexos, colhidos em várias escolas. Assim como ela, muitos estavam interessados nos desenhos das crianças deficientes e o que eles poderiam contar sobre essas crianças. Nasce a partir deste interesse uma outra linha de pesquisa que busca entender distúrbios mentais através da utilização do desenho dessa criança. Evoluindo paralelamente ao estudo do desenho das crianças normais, temos aí um outro assunto, bastante ligado à psicologia, a psicopedagogia e à própria medicina, que buscava estudar, nesse primeiro momento, entender e classificar as questões relacionadas às deficiências. Não

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Termo utilizado na época para designar deficientes mentais de todos os níveis, assim como o termo débil mental.


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serão vistos detalhadamente os aspectos dessa linha, visto que não será possível abordá-la sem entrar em questões que não são objetivadas nesta monografia. Rouma não utilizou dados estatísticos, apresentando importantes conclusões teóricas. Ele enumera e distingue duas diferentes etapas do desenho feito pelas crianças normais sobre o tema da figura humana: 1

Etapa preliminar: a)

Adaptação da mão ao instrumento.

b)

A criança nomeia definitivamente as linhas incoerentes que está traçando.

c)

A criança anuncia antecipadamente o que pretende desenhar.

d)

A criança nota certas semelhanças entre os objetos e linhas que porventura tenha

feito despropositadamente. 2

Evolução da representação da figura humana: a)

Primeiros ensaios com intenção de representação, similares aos descritos na etapa

anterior. b) Etapa de renacuajo. c) Etapa de transição. d) Representação completa da figura humana vista de frente. e) Etapa de transição entre a representação frontal e de perfil. f) Perfil. (GOODENOUGH, 1974, p. 24-25)

Em 1919, Karl Buhler atenta para a relação existente entre a linguagem e o desenho. Hartlaub em 1922 lança o livro O Gênio na Criança, onde defende, com ardor, a necessidade de libertar o espírito criador da infância pela arte. (MARINO, 1988, p. 93)


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Em 1925, o americano John Dewey apresenta a idéia de arte como experiência em seu livro Experience, nature and art. Desde o início do século XX, Dewey estudava o processo criativo. Segundo ele, é uma tolice o uso do método de simplesmente rodear a criança de materiais e deixá-la agir como quiser. O professor se fizesse isso não passaria de um espectador do trabalho da criança e guardião de sua liberdade. Não há germinação espontânea na vida mental, e se a criança não receber sugestão do professor, receberá de qualquer maneira, vindo de casa, da rua, ou daquilo que outra criança estiver fazendo. Afirma que sem direcionamento o ato de criar ficará cansativo, casual e esporádico, e que a idéia que começava a tomar força na época, de que para desenvolver a expressão infantil, o professor deve cumprir o papel de impedir as influências externas impedindo a contaminação, não estariam corretas. (GEEMPA, 1990, p. 29-30). Dewey propõe que, para as crianças desenvolverem suas experiências cognitivas, o professor partisse de problemas e assuntos de interesse dos alunos, em um aprender fazendo. (FERRAZ; FUSARI, 1992, p. 27) Sua voz não foi ouvida naquele momento, onde se construía uma base para o movimento da livre expressão que perdura até os dias de hoje na abordagem de como se deve tratar o assunto em questão. Apesar de ser uma voz solitária em meio a uma multidão que clamava pela libertação do que chamavam a arte da criança, outros autores vieram, como veremos ainda nesta monografia e hoje questionam assim como Dewey, essa postura extremamente libertária. Wurff publica em 1928 o livro A Arte da Criança e advoga o aprimoramento da visão do mundo exterior pelo desenho baseado na experiência realmente vivida pela criança. (MARINO, 1988, p. 94) Esses primeiros estudos ainda não definiram ainda as várias nomenclaturas de fases do grafismo relativas às idades, como foi feito posteriormente, mas com suas conclusões, equivocadas ou não, foram as idéias para as primeiras bases teóricas que se seguiram no século XX. Nesse início do processo de estudo vigora a tendência da época, que


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presenciava o começo do rompimento da produção estética idealista e naturalista. As primeiras conclusões, muitas vezes ainda circulando entre os paradigmas de cada movimento, abriram os caminhos para o desenvolvimento de novas teorias. Por mais que estejam fundamentados em dados concretos, os resultados das pesquisas, em qualquer época, nunca estarão desassociados de seu tempo. O que virá a seguir, através da busca de pesquisadores, pedagogos, psicólogos, a libertação do traço da criança, é o retrato de um mundo que vivia também o período da libertação das construções visuais baseadas em leis, regras e normas, o período do modernismo. Até então também se pode dizer que foram os psicólogos que descobriram e sistematizaram um conhecimento interpretativo do desenho da criança, embora, apesar de todo o clima libertário, essas pesquisas se utilizarem como parâmetro para comparar, entender e estudar o grafismo infantil das produções adultas e dos cânones estéticos clássicos. Surge entre 1897 até 1938, em Viena, o trabalho de Franz Cizek, um artista que se tornou educador infantil, e que buscou demonstrar o que acreditava serem as vantagens estéticas e psicológicas do desenvolvimento espontâneo da arte infantil, reivindicando um valor estético aos desenhos criados pelas crianças. Em 1897, após muitas barreiras enfrentadas, abre sua primeira classe de arte para criança, uma instituição, que indo contra os conservadores do formalismo pedagógico da época, se propõe a deixar a criança criar, desenhar e pintar livremente. Em quarenta anos, verificou-se através dos trabalhos das crianças a repetição do processo de desenvolvimento do desenho, as fases. E instituiu-se um modelo para o que seriam as futuras escolinhas e ateliês de arte que se espalhariam pelos países ocidentais a partir dos anos 40. Divo Marino cita com muito entusiasmo o trabalho de Cizek, em seu livro O desenho da criança publicado originalmente em 1955.


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“Entreguem à criança somente o essencial, não tentem ensinar-lhes como se desenha, e sim incentivem nelas o uso (...) de seus materiais exteriores e interiores. A emoção dominante da verdadeira arte infantil deve ser a alegria da revelação! Que formoso é o mundo! Eu o vejo assim e assim posso fazê-lo! Um professor que tenha experimentado esse sentimento de maravilha e delícia pode ser o professor da arte infantil. Um professor de arte, que seja triste, é uma contradição, pois mesmo que possuísse todos os conhecimentos do mundo nada tiraria dele. Coagir as crianças e coibir seu poder de criar será sempre mais perigoso que deixar que elas se desenvolvam livremente.” (MARINO, 1988, p. 139)

Nesse período, na busca da valorização do desenho infantil, chegou-se a realizar exposições de desenhos infantis em galerias de arte e alguns desses desenhos e pinturas foram comercializados. Haviam pessoas entusiasmadas com o que acreditavam ser o valor estético da obra infantil, conceito que não resistiu ao tempo e foi superado. E é nesse clima de euforia e por que não dizer confusão de valores artísticos, que são dados os primeiros passos rumo a uma conceituação do desenho tanto na teoria quanto na aplicação da atividade na prática.


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II - O DESENHO E AS TEORIAS DOS GRANDES FORMULADORES DOS ESTUDOS SOBRE A INTELIGÊNCIA, O DESENVOLVIMENTO E A PSICOLOGIA DA CRIANÇA

Em paralelo as novas descobertas específicas relacionadas ao desenho, as pesquisas relacionadas à criança como um todo, seu processo de desenvolvimento educacional, físico, psicológico, mental e social eram temas amplamente discutidos, e nesse período, surgem os primeiros grandes estudiosos da educação, Lev Vygotsky, Célestin Freinet e Jean Piaget. Cada um colabora significativamente com as teorias relativas à construção e desenvolvimento do conhecimento humano, influenciando na educação e na forma com que o mundo passou a interagir com suas crianças. Esses pensadores divergem muitas vezes nos aspectos abordados, mas ao longo do tempo acabam por se complementarem. Suas descobertas em relação ao todo influenciaram o assunto em questão, porque obrigatoriamente, quando se estuda a criança, aborda-se o seu desenho, e é impossível falar sobre o desenho da criança sem citá-los e suas teorias.


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Quanto aos estudiosos que focam aspectos do desenho, neste período, destacam-se Georges Henri Luquet, Florence L. Goodenough, Henri Wallon e M. Prudhommeau. Na década de 20 do século passado, o russo Lev Vygotsky surge com a teoria social da inteligência, o socioconstrutivismo, uma corrente teórica que sustenta que a inteligência é construída a partir das relações recíprocas do homem com o meio. Suas idéias somente se propagaram na década de 60, pois tendo morrido em 1934 teve sua obra silenciada pelo regime stalinista. Sobre o desenho, diz que as crianças não estão preocupadas com a realidade; são mais simbolistas que realistas e, assim, produzem o desenho utilizando a memória, mesmo estando com o objeto à sua frente, por isso, suas experiências anteriores têm tanta importância; relaciona as construções imaginativas à quantidade de experiências acumuladas pelo sujeito-criador e demonstra especial interesse neste processo criador. Vygotsky não enumerou fases ou etapas em seus estudos, mas considerou que essas etapas na produção dos desenhos infantis seriam mais ou menos comuns para as crianças da mesma idade e que a linguagem tem relações com a escrita e o desenho. (PELLEGRINI, Nova Escola, n. 139, 2001) Sobre a criança e sua atividade criadora Vygotsky diz: “... quanto mais veja, ouça e experimente, quanto mais aprenda e assimile, quanto mais elementos da realidade disponha em sua experiência, tanto mais considerável e produtiva será, como as outras circunstâncias a atividade da sua imaginação.” (FERRAZ; FUSARI, 1993, p. 51-84 apud Vygotsky, 1990, p. 18)

Vygotsky conclui que a criança se conscientiza das diferenças mais cedo que das semelhanças, pois a percepção da semelhança exige uma estrutura de generalização e conceitualização mais avançada que a da dessemelhança. Por isso o papel da expressão artística é tão importante, pois ajuda a percepção da visualidade, sonoridade e tato, auxiliando a criança a perceber as diferenciações e facilitar a


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compreensão da realidade e sua representação. Vygotsky apresenta um trabalho contínuo e planejado para que a criança obtenha um maior domínio da realidade através da abordagem imaginativa e criativa nos processos pedagógicos. (FERRAZ; FUSARI, 1993, p. 58-60) Em 1913 e 1927 Georges Henri Luquet, antropólogo e pesquisador do desenho infantil, publica na França respectivamente os livros Les dessins d’un enfan e Le dessin enfantin. Luquet é considerado um pesquisador importantíssimo para o estudo de desenho, apesar de afirmar entre outras coisas que em função da “inabilidade e falta de atenção” a criança produz seus desenhos com muitos “erros e imperfeições” e que ela possui uma tendência “natural e voluntária” para o “realismo”. Fica claro através destas conclusões que, ainda apesar de toda a importância que começava a ser atribuída à criança, a influência do peso de toda uma história em que ele era considerado algo inacabado. Apesar disso, o trabalho de Luquet é visto até hoje como um grande marco no processo do estudo sistematizado do desenho. Ele iniciou seus estudos baseando-se no acompanhamento de sua filha, da qual conservou desenhos desde os três anos e três meses, quando desenhou pela primeira vez, até os oito. Processo que acompanhou numerando e anotando as circunstâncias de sua produção, ações e comentários. Luquet recolheu cerca de quinhentos desenhos de sua filha. Seu trabalho foi considerado tão valioso por ter sido o primeiro a incluir todos os desenhos realizados por uma mesma criança dentro de um período tão amplo. Luquet, assim como os outros estudiosos que vieram em seguida, buscou definir um processo progressivo e evolutivo para elaborar um sistema gráfico produzido pela criança. Ele distinguiu quatro estágios, onde o objetivo que ele julga haver nessas representações é a busca da realidade:


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1 Realismo fortuito: começa por volta dos dois anos e põe fim ao período chamado rabisco. A criança que começou por traçar signos sem desejo de representação descobre por acaso uma analogia com um objeto e passa a nomear seu desenho, procurando representá-lo como uma totalidade. Esse estágio subdivide-se em desenho involuntário e voluntário. No involuntário, há um gesto motor, feito pelo prazer de traçar linhas e sem atribuição de significados. No voluntário, a criança começa desenhar sem intenção de representar alguma coisa, e ao concluir o trabalho atribui aos traços uma significação. Em seguida, surge a intenção, que pode até mudar com uma interpretação final diferente do que foi primeiro idealizado, e por fim, a intenção inicial coincide com a final.

2 Realismo falhado ou incapacidade sintética: geralmente entre três e quatro anos tendo descoberto a identidade forma-objeto, a criança procura reproduzir esta forma, buscando diferenciar as categorias representadas. Sua grande preocupação é a representação diferenciada de cada um dos objetos, não integrando coerentemente nos conjuntos os diferentes pormenores que desenha. Considerando somente seu ponto de vista, omite ou exagera os detalhes de acordo com o grau de importância que ele vê naquele momento. É o estágio onde a criança começa a se preocupar com as propriedades gerais dos objetos; vizinhança/ separação, continuidade/ descontinuidade, dentro/ fora, etc.

3 Realismo intelectual: estendendo-se dos quatro aos dez-doze anos, caracteriza-se pelo de fato de que a criança busca desenhar conscientemente, não só aquilo que vê, mas aquilo que ali existe do objeto. Surgem nesta fase os processos como a descontinuidade, o rebatimento, a transparência, a planificação e a mudança dos


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pontos de vista. Nesta fase ela legenda seus desenhos com nomes, e eles passam a ser característica, parte do desenho. Começam a aparecer as representações de perspectivas, proporções e distâncias.

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Realismo visual: é geralmente por volta dos doze anos, marcado pela descoberta das leis e convenções da representação do desenho. Vigora a visão que o adulto faz do desenho; a reprodução mais próxima do que o olho enxerga do objeto, detalhamento, opacidade, perspectiva, proporção e distância. Concretiza-se o processo de aprimoramento que se verificou no estágio anterior.

Luquet coloca que não há uma distinção rígida entre os estágios, e que a evolução individual do desenho está sujeita a regressões. Assim como Kerschensteiner, acredita que os desenhos das crianças se baseiam em sua idéia ou conceito sobre o desenho. Firma-se aí o conceito do modelo interno da criança, e que esse modelo contém as informações sobre o que é fundamental para a idéia que a criança tem do objeto. (PILLAR, 1996, p. 41-51) Sua postura quanto à atitude do adulto em relação à produção da criança fica clara quando diz: “... julgo que, no que diz respeito ao desenho, o que terá de melhor a fazer o educador é apagar-se, deixar a criança desenhar o que quer, propondo-lhe temas sempre que ela necessita, sobretudo quando lhe pede, mas sem lhos impor e, sobretudo deixá-la desenhar como quer, a seu modo.” (LUQUET, 1969, p. 230)

Pela seriedade com que seu trabalho foi executado, baseado em pesquisa consistente, chegando a novas conclusões e de certa forma organizando todo o processo das descobertas e conclusões que haviam sido feitas até então, Luquet influenciou com suas opiniões todo o processo seguinte.


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Anos mais tarde, foi bastante criticado quanto ao fato de ainda se prender às idéias de que o produto gráfico da criança fosse cheio de imperfeições e que considerasse que a criança tinha em si uma necessidade de ir em busca da representação realista. Novas pesquisas buscaram mudar essa visão e, apesar das críticas quanto a essas questões, suas observações e apontamentos quanto aos detalhes referentes as fases e conclusões sobre o processo ainda é considerado pertinente nos dias de hoje. Em 1926 a pedagoga Florence L. Goodenough publica o livro Measurement of inteligence by drawings, onde aborda o assunto utilizando o desenho infantil como ferramenta de medição de inteligência. Em seu livro, baseado no apanhado de estudos citados e de seus próprios, ela publica uma série de conclusões:

1 Aparentemente no desenho da criança pequena, existe uma íntima relação entre a inteligência e a capacidade conceitual, atestada através do desenho. 2 Para a criança o desenho é um modo de expressão, de linguagem, não um meio de criar algo ligado a razões puramente estéticas. 3 No começo, a criança desenha o que sabe e o que percebe, entrando gradualmente em um período onde procura representar o que vê. 4 A criança exagera nos detalhes que julga importantes em detrimento dos outros menos importantes. 5 Os desenhos iniciais consistem, quase integralmente, em uma enumeração gráfica de itens. Idéias de número, proporção e relação espacial são subseqüentes no desenvolvimento. 6 Quando as crianças pequenas desenham objetos presentes diante de seus olhos, quase nada se ajusta na representação desse modelo, e a cópia não se diferenciará muito da mesma figura desenhada de memória.


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Até os dez anos, o tema principal é a figura humana.

Goodenough, assim como vários psicólogos da época, acreditava que a representação gráfica, como qualquer traço expressivo da personalidade, integra-se com processo de desenvolvimento psíquico. Seria então utilizado e desenvolvido um método projetivo, capaz de explorar as dimensões afetivas, na situação e na evolução tanto da criança como do adulto. Assim, em 1925 organizou o Teste Goodenough, baseado na representação da figura humana e na apuração de cinqüenta itens no desenho, relacionando a idade da criança e esses detalhes representados, é um dos primeiros testes que utilizou o desenho para abordagens psicológicas. (GOODENOUGH, 1974, 26-27) M. Prudhommeau, desde 1933 realizava estudos sobre o desenho infantil e, conhecendo o estudo realizado por Luquet, analisou o processo e se preocupou em estudar a motricidade, a evolução do grafismo da criança de acordo com seu desenvolvimento psicomotor. Além da observação direta da criança, como fez Luquet, Prudhommeau acreditava que, para se estudar e obter resultados científicos, era necessário um conhecimento global de toda a atividade da criança. Para isso, Prudhommeau utilizou o registro cinematográfico para gravar esses comportamentos infantis, onde quer que eles se produzem, sem provocar modificações. O ato registrado agora poderia ser analisado, comparado e repetido, de forma idêntica, tantas vezes quanto fosse necessário. O filme é chamado de Prelúdios e aprendizagem da marcha. Acompanhando uma criança, Claude, de seu nascimento até um ano e sete meses, ele observa as seguintes etapas do desenvolvimento da representação gráfica do menino até o que conclui ser o nascimento do desenho como linguagem, quando ele desenha o que indica ser um caranguejo visto anteriormente em uma praia.


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1 Do nascimento ao vigésimo sétimo dia, há a ausência do objeto em seus movimentos. Passa então a se interessar pelo objeto sem movimento, em uma progressão de interesse crescente que foi até dois meses. 2 A partir dos dois meses dias inicia-se o contato com o objeto, através da ação automática da mão; movimentos de orientação do objeto, depois da mamadeira, para a boca, no momento da dentição. Ocorre então o princípio da coordenação motriz entre o olhar e a manipulação do objeto. A criança apresenta o movimento da dar, sempre em relação com o objeto. Aos sete meses, quando sua evolução psicomotriz não se limita mais às relações diretas com o objeto, ela pega o objeto com uma só mão e o esfrega sobre outro. Ela alarga seu espaço e se orienta para o transporte, sucessivamente apresentando aperfeiçoamentos e então, à aparição do desenho. Essa fase que se estende até os onze meses. 3 No período de transição desses onze meses aparecem os primeiros rabiscos voluntários e ele se utiliza do objeto para o transporte de um lugar a outro, chegando aos primeiros passos. Observa-se que quase ao mesmo tempo se dá a aparição do primeiro grafismo e dos primeiros passos. A criança não segura ainda um lápis muito comprido com firmeza, e se o utilizar escorrega ou produz linhas diretas ou quebradas que não correspondem ao caminho percorrido pela mão. 4 Com um ano e seis meses a criança rabisca, ignorando ainda o espaço vazio do papel e atraída pelos traços, os aglomera uns sobre os outros. 5 Executa com um ano e sete meses, seus rabiscos habituais, declarando, que está “desenhando um caranguejo”. Esse é o primeiro desenho espontaneamente executado, representando uma intenção, feito de memória em sugestão a um animal visto pela criança passeando a beira-mar. Evoluindo daí o desenho infantil,


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intimamente ligado ao desenvolvimento da evolução da criança. (MARINO, 1955, p. 21-22)

Prudhommeau conclui que a aparição da atividade na criança é condicionada unicamente pela sua evolução psicomotriz. Conclui através de estudos que se seguem, questões sobre o paralelismo da evolução do grafismo-escrita e do grafismo-desenho, caracterizando a originalidade de cada um; compara a evolução de todas as formas gráficas: geométrica, a figura humana, as figuras não humanas; retifica direções na evolução do desenho e determinam índices para reconhecer, pelo desenho, os doentes mentais. (CAMPOS, 1999, p. 15) Ele desenvolveu, em 1933 um teste, a Folha Prudhommeau, onde declara identificar o nível mental da criança, teste esse incorporado ao Laboratório de Psicologia da Criança, dirigido por Henri Wallon, na França. Testes de medição de inteligência, como os de Goodenough e como os da Folha Prudhommeau são os primeiros de uma série que virão, e com o tempo, serão revistos e sendo modificados de acordo com as novas descobertas. Wallon, filósofo e médico, neste período, envolvido ativamente com as pesquisas referentes à psicologia da criança, discute entre outras questões a origem do desenho. Baseado nos estudos de Luquet, assim como Prudhommeau, ele conclui que a origem do desenho está no gesto, e que as representações gráficas das crianças surgem simultaneamente às suas representações gestuais. Para Wallon, o ato mental se desenvolve a partir do ato motor. Estabelece a idéia da transcrição gráfica, o desenho infantil das fases iniciais e representação, o desenho das fases posteriores. Na fase inicial, trata do sincretismo visual, que é o fato da criança descrever graficamente as várias partes de um objeto, sem que a sua estrutura básica seja alcançada, pois ela ainda não consegue extrair do todo (o objeto) seus aspectos estruturais. A percepção é múltipla, ativa e ela decompõe a figura desenhando os


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detalhes do objeto em partes justapostas ao longo do espaço gráfico. (FERRAZ; FUSARI, 1993, p. 64-72) O método adotado por Wallon é o da observação pura, faz isso porque considera que esta metodologia permite conhecer a criança em seu contexto, acredita que só é possível entender as atitudes da criança se a trama do ambiente no qual está inserida for entendida. Para Wallon, o ser humano é organicamente social e sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura para se atualizar. Através de seu estudo do desenvolvimento psíquico da criança, ele concluiu que o desenvolvimento humano é marcado por contradições, conflitos, retrocessos e reviravoltas, resultado da maturação e das condições ambientais, o que provoca em cada etapa desse desenvolvimento profundas mudanças, dando-se essa passagem pelos estágios de modo reformulativo, e não por ampliação. Os conflitos instalados nesse processo são propulsores do desenvolvimento. Considera que o homem é determinado fisiológica e socialmente, sujeito às disposições internas e às situações exteriores. Wallon apresenta cinco estágios de desenvolvimento do ser humano, que se sucedem em fases com predominância afetiva e cognitiva: impulsivo-emocional, sensóriomotor e projetivo, personalismo, categorial e predominância funcional. (MRECH, 2002) Célestin Freinet, pedagogo francês, contemporâneo de Vygotsky, Wallon e Piaget, elaborou a partir de suas idéias, uma pedagogia própria, a pedagogia Freinet, que é hoje utilizada no dia-a-dia da nossa educação em conjunto com outras, como o construtivismo que nasceu das idéias de Piaget. Freinet defendia o uso da livre expressão e da criatividade na produção de cada trabalho em sala de aula, seja o desenho livre, o texto livre, as aulas-passeio, a correspondência interescolar, o jornal, o livro da vida (diário e coletivo), o dicionário dos pequenos, o caderno circular para os professores, entre outras propostas. Essas técnicas tinham como objetivo favorecer o desenvolvimento dos métodos naturais da


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linguagem (desenho, escrita, gramática), da matemática, das ciências naturais e das ciências sociais. (PELLEGRINI, Nova Escola, n. 139, 2001) Segundo Freinet, esses exercícios são na verdade partes e momentos de um processo de aprendizagem, que ao partir dos interesses mais profundos da criança, propicia as condições para o estabelecimento da apropriação do conhecimento. Na sua concepção, a relação direta do homem com o mundo físico e social é feita através do trabalho (atividade coletiva) e liberdade é aquilo que decidimos em conjunto. A escola deve ser centrada na criança que não deve ser vista como um indivíduo isolado, mas parte de uma comunidade. As atividades manuais têm tanta importância quanto as intelectuais, questiona as tarefas escolares repetitivas opostas aos jogos e atividades lúdicas. Ele concebe a escola como um elemento ativo de mudança social, onde é proibido marginalizar as crianças das classes menos favorecidas. Propõe o trabalho/ jogo como atividade fundamental, baseados em experimentação e documentação. Valoriza amplamente a participação e integração entre famílias/ comunidade e escola. (MRECH, 2002) Suas idéias ajudam, nesse momento, a se impulsionar a teoria da livre-expressão, que se aplicará à educação artística que se adotará nesta época. Atualmente, a pedagogia Freinet é adotada em conjunto, em complemento e associação com outras teorias pedagógicas. Sozinha acaba sendo muito radical em proporcionar tamanha liberdade. Jean Piaget, em uma vida inteira dedicada ao estudo científico é responsável pela elaboração de novas idéias e conclusões em relação ao desenvolvimento e construção da evolução do ser humano que revoluciona o pensar e o agir sobre a educação. Desenvolve uma teoria do conhecimento e se embrenha em muitas investigações cujos resultados são estudados e investigados até hoje por psicólogos e pedagogos. Suas pesquisas recebem diversas interpretações que se concretizam em propostas didáticas também diversas. Piaget elabora em sua Teoria Psicogenética ou Epistemologia Genética, uma


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concepção de como a inteligência humana se desenvolve, que se firma então como a corrente teórica mais aceitável, ao contrário das teorias empiristas5 e racionalistas6, que eram as bases de um sistema que havia começado a ruir lá atrás, quando começaram a surgir os estudos de pensadores como Rousseau. Piaget concebe a teoria que é a partir do desenvolvimento progressivo das estruturas intelectuais que a aprendizagem se concretiza, ao contrário de Vygotsky, que defende que a aprendizagem é que estimula o desenvolvimento. Enquanto dos estudos de Vygotsky surge uma linha socioconstrutivista (ou sociointeracionista), de Piaget surge a linha construtivista (ou interacionista). Piaget afirma que vida é, em essência, auto-regulação. Auto-regulação inclusive da vida mental, pois para manter um equilíbrio dinâmico com o meio ambiente é que o homem desenvolve a inteligência. Quando o equilíbrio é rompido, o indivíduo age sobre o que o afetou buscando o reequilíbrio. Isso é feito por adaptação e por organização. A adaptação tem duas formas básicas: a assimilação e a acomodação. Na assimilação, o indivíduo usa as estruturas psíquicas que já possui. Se elas não são suficientes, é preciso construir novas estruturas. Isso é acomodação. Na assimilação e na acomodação se pode reconhecer a correspondência prática daquilo que serão mais tarde a dedução e a experiência: a atividade da mente e a pressão da realidade. A organização articula esses processos com as estruturas existentes e reorganiza todo o conjunto. Assim, o indivíduo constrói e reconstrói continuamente as estruturas que o tornam cada vez mais apto ao equilíbrio.

5

Concepção teórica que parte do princípio de que o desenvolvimento da inteligência é determinado pelo meio ambiente e não pelo sujeito. 6

Concepção teórica que parte do princípio de que o desenvolvimento da inteligência é determinado pelo indivíduo e não pelo meio.


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Essas construções seguem um padrão, em idades mais ou menos determinadas. São os estágios, que se dividem em vários sub-estágios, com formas específicas de inteligência. As etapas da evolução do raciocínio, segundo Piaget: 1 Sensório-motor (zero a dois anos): a partir de reflexos neurológicos básicos, o bebê começa a construir esquemas de ação para assimilar mentalmente o meio. A inteligência é prática. As noções de espaço e tempo, por exemplo, são construídas pela ação. O contato com o meio é direto e imediato, sem representação ou pensamento.

2 Pré-operatório (dois a sete anos): a criança se torna capaz de representar mentalmente pessoas e situações. Já pode agir por simulação, como se. Sua percepção é global, sem discriminar detalhes. Deixa-se levar pela aparência, sem relacionar aspectos. É centrada em si mesma, pois não consegue colocar-se, abstratamente, no lugar do outro.

3 Operatório-concreto (sete a onze anos): nessa fase, a criança já é capaz de relacionar diferentes aspectos e abstrair dados da realidade. Não se limita a uma representação imediata, mas ainda depende do mundo concreto para chegar à abstração. Desenvolve também a capacidade de refazer um trajeto mental, voltando ao ponto inicial de uma situação.

4 Lógico-formal (doze anos em diante): A representação agora permite a abstração total. A criança não se limita mais à representação imediata nem somente às relações


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previamente existentes, mas é capaz de pensar em todas as relações possíveis logicamente. (PELLEGRINI, Nova Escola, n. 139, 2001)

É importante citar essas etapas descritas por Piaget referente à evolução do raciocínio porque o pensamento e as conclusões de Piaget é o que vigora até hoje sobre o que se entende e se aceita por teoria do desenvolvimento do ser humano. Desenvolvimento intimamente ligado ao desenvolvimento do grafismo da criança, e logicamente Piaget não poderia deixar de colaborar também com o estudo do desenho da criança. A partir das pesquisas de Luquet, Wallon e tudo o que havia sido dito até então por centenas de estudiosos, Piaget elabora suas conclusões que acrescentam às idéias anteriores novas luzes. Em A Psicologia da criança, publicado por Piaget e Barbel Inhelder em 1951, há a abordagem de questões à respeito do desenho da criança, procurando estabelecer pontes entre o desenvolvimento gráfico e outros aspectos do desenvolvimento mental. É mencionado que o desenho pode servir, também, de base para teste de desenvolvimento cognitivo, o que abre as portas para o estudo e implantação do diversos outros testes do desenho, utilizados como apoio a diagnósticos de traços de personalidade, modalidade de pesquisa que já vinha sendo estruturada desde a década de 20. (GOBBI; LEITE, 1999) A partir de sua concepção dos estágios do desenvolvimento em etapas, visualizaram-se novas esquematizações do processo de desenvolvimento do desenho da criança. A partir das fases de Luquet no que diz respeito ao desenho da criança e de Piaget sobre o processo cognitivo, construiu-se ao longo dos anos através da abordagem de diversos autores, outras novas denominações para as etapas do desenvolvimento do desenho da criança, que serão ainda vistas nesta monografia.


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III - A EDUCAÇÃO PELA ARTE, A VISÃO DE UM TEMPO

Seguem agora os autores que, com suas obras acabaram por influenciar um comportamento ocidental quase que totalitário no que se refere em como se tratar o tema do desenho infantil na prática, Herbert Read e Viktor Lowenfeld. Herbert Read publica em 1943 o livro Educação pela arte, que dá início ao Movimento da educação através da arte. Read afirma que "o objetivo da arte consiste na comunicação do sentimento" (READ, 1976, p. 23 apud PILLAR, 1983, p. 34) e que a criança desenha símbolos ou sinais que expressam o que ela sente a respeito de determinado objeto, tendo em si ampla significação psicológica. Afirma, baseado nos estudos de Jung sobre os tipos psicológicos, que as funções mentais envolvidas na arte e na educação são o pensamento, o sentimento (percepção), a sensação e a intuição. Reflete também acerca da relação entre a produção artística e seu tempo, afirmando que a posição diferenciada do sujeito no tempo e no espaço reflete em sua produção cultural e o entendimento que se tem desta produção. "O artista depende da comunidade - toma o tom, o andamento, a intensidade da sociedade a que pertence". (READ, 1976, p. 165 apud GOBBI; LEITE, 1999) Defende a


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arte da criança como manifestação espontânea e auto-expressiva, e que o professor de arte e pais devem agir como estimuladores dessa livre-expressão. Em 1947 o austríaco Viktor Lowenfeld e W. Lambert Britain lançam nos Estados Unidos o livro Desenvolvimento da capacidade criadora, discutindo e defendendo sob uma série de argumentos a espontaneidade e livre expressão na produção do desenho da criança, assim como Read. Esse livro influenciou toda uma época e gerações de professores e pais, que adotando as idéias ali expostas, passaram definitivamente a utilizarem a postura de permitir à criança a possibilidade da total livre-expressão. E a idéia de que qualquer tentativa formal de se ensinar algo que se relacione a alguma regra ou convenção deva ser barrado firmemente, pois essa atitude cercearia a capacidade criadora da criança. Agora lhe seria amplamente permitido ir ao encontro de todo esse potencial, sem intervenções, interferências ou influências. Consideram que, o contato da criança com o mundo influencia a produção da mesma e que livre dessa influência alheia ficaria menos submetido a modelos externos. Lowenfeld dirigiu pesquisas sobre criatividade para o Departamento de Arte e Educação da Pennsylvania State University, nos Estados Unidos. A arte é abordada por ele como um meio para se compreender o desenvolvimento individual em suas diferentes fases e como desenvolvimento da consciência estética e criadora do indivíduo. Divulga as seguintes fases segundo seus estudos, dividindo o processo de desenvolvimento do desenho da criança entre as etapas:

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Garatuja: dos dois aos quatro anos a criança começa a desenhar fazendo rabiscos desordenados, ou as garatujas desordenadas, (FIG.: 1) que vão se ordenando pouco a pouco. Apresentando aparentemente muita satisfação e prazer em fazê-lo, aparecem aí as


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garatujas controladas. (FIG.: 2 e 3) Somente depois dos quatro anos a criança consegue transmitir, em seus desenhos, quaisquer objetos reconhecíveis.

FIGURA 1- Desenho criança de dois anos - garatuja desordenada. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 118

FIGURA 2 - Desenho criança de três anos - garatuja controlada. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 122.

FIGURA 3 - Desenho criança de dois anos - garatuja controlada. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 122.


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2 Pré-esquemática: aqui a criança faz suas primeiras tentativas de representação. Inicia-se por volta do quatro anos e estende-se até os sete. Representa um homem com cabeça e pés, e desenha também objetos do seu meio, com os quais teve contato. Colocadas desordenadamente no papel, variam bastante de tamanho. (FIG.: 4)

FIGURA 4 - Desenho criança de quatro anos, Um homem. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 150. 3 Esquemática: dos sete até os nove a criança desenvolve seu conceito definido de forma. Descrevem através do seu desenho partes de seu meio. Repete vez ou outra o esquema que criou para representar o homem.Utilizam uma linha reta, na base da folha para dispor os objetos e outros recursos para representar o espaço, como a dobragem (ou rebatimento). Para representarem espaço e tempo utilizam a inclusão no mesmo desenho de diferentes seqüências de tempo ou impressões espacialmente distintas. Utiliza em um mesmo plano a elevação para dar a impressão de profundidade. Utilizam o esquema de raios-X. (FIG.: 5 e 6)


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FIGURA 5 - Desenho estudante sete anos, Minha família. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 185.

FIGURA 6 - Desenho Apanhando flores. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 346. 4

Realismo Nascente: dos nove aos dez anos os desenhos ainda tem um caráter mais simbólico que representativo. Mais consciente do mundo e de si mesmo apresenta desenhos mais detalhados e minuciosos e já abandonam a linha de base, raios-X e a dobragem. Usa agora duas linhas de base já procurando dar perspectiva ao desenho e reconhece a possibilidade de sobrepor objetos uns sobre os outros. Passa a dar mais importância aos colegas, sendo essa a idade da turma. Desenha em menores dimensões, e


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não demonstra mais interesse e ansiedade em mostrar seus trabalhos e explicá-los, prefere, na verdade ocultá-los da observação dos adultos. (FIG.: 7 e 8)

FIGURA 7 - Desenho estudante nove anos, Cena da cidade. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 251.

FIGURA 8 - Desenho estudante nove anos, Jogando pegador no pátio da escola. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 273.


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Pseudonaturalismo: entre onze e doze anos, com a consciência em relação ao seu ambiente natural mais apurada, começa a se preocupar com proporções e profundidades. É o período do raciocínio e da autocrítica, e a criança ou esconde os desenhos ou os apresenta em forma de estórias em quadrinhos, com tom anedótico ou satírico. A figura humana passa a apresentar em seus detalhes evidenciadas características de diferenciação sexual. Para muitas crianças, este acaba sendo o período em que param seu desenvolvimento artístico. (FIG.: 9)

FIGURA 9 - Desenho estudante treze anos, Pensando. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 311. 6

Fase da Decisão: dos quatorze aos dezessete anos algumas crianças apresentam interesse pela arte visual e se desenvolvem, aperfeiçoando sua aptidões artísticas. Em certa medida, o desenvolvimento natural do jovem não de estende além desta fase, mas são demonstradas, agora conscientemente, aptidões artísticas mais apuradas. (FIG.: 10) (LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 54-56)


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FIGURA 10 - Desenho estudante, Segundo Grau. FONTE - LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 346. A cada etapa citada e devidamente destrinchada, são explicados os significados das cores, e a partir da fase pré-esquemática são sugeridos temas para a motivar e envolver a criança no processo de criação. São sugeridos também quais são os materiais artísticos mais apropriados a serem utilizados a cada fase. Lowenfeld afirma que “cada desenho reflete os sentimentos, a capacidade intelectual, o desenvolvimento físico, a acuidade perceptiva, o envolvimento criador, o gosto estético e até a evolução social da criança, como indivíduo”. (LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 35) Condena os livros ilustrados para colorir, pois são “perniciosos à expressão criadora da criança”. (LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 68) Oferece instruções muito bem definidas sobre como o professor deve proceder durante as aulas de arte, como deve ser sua postura e materiais ideais a utilizar, a cada fase.


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Lowenfeld (1977, p. 57) afirma que independentemente de questões geográficas, esses estágios do desenvolvimento são bastante uniformes em todas as crianças, principalmente nas primeiras fases de representação, antes que a influência cultural influa no seu desenvolvimento artístico. O que a criança desenha mudará de acordo com o meio onde vive e com o instrumento de desenho utilizado, mas todos passarão pelas etapas. A orientação quanto ao papel que o professor deve desempenhar junto ao seu aluno é bem definida: encorajar e apoiar a criança para que ela utilize a arte como verdadeiro meio de autoexpressão e não interferir em nenhum momento nas imagens produzidas pelas crianças. Esse apoio deve ser feito com bases não no produto final da criança e sim, ter como preocupação os processos pelos quais passam as crianças enquanto fazem seus desenhos. “... de maneira bastante surpreendente ainda encontramos, de modo casual, folhas mimeografadas que se entregam para aos jovens para colorir (...) do Dia de Ação de Graças, do coelho da Páscoa ou mesmo de uma árvore de Natal. (...) Expor uma aprendizagem artística que inclua tais tipos de atividades é pior que não dar aprendizagem alguma. São atividades pré-solucionadas que obrigam a criança a um comportamento imitativo e inibem sua própria expressão criadora, (...) não estimulam o desenvolvimento emocional, (...) não incentivam as aptidões (...). Pelo contrário, apenas servem para condicionar a criança, levando-a, a aceitar, como arte, os conceitos adultos, uma arte que é incapaz de produzir sozinha e que, portanto, frustra seus próprios impulsos criadores.” (LOWENFELD; BRITTAIN, 1977, p. 69-71)

Lowenfeld é responsável, ao lado de Read pela teoria que tomou grande propulsão no tratamento dado ao desenho infantil, a da livre expressão, influenciando o ensino da arte até os dias de hoje. Posteriormente a publicação de Desenvolvimento da capacidade criadora Lowenfeld lança, em 1954, o livro A criança e sua arte, um guia para os pais onde são feitas várias recomendações de como os pais devem se comportar em relação a seus filhos e sua arte, como entendê-la dentro das características de cada fase e como agir, seguindo as instruções entre “coisas que os pais devem ou não fazer”:


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“Devem fazer: considerar a expressão artística da criança como um registro de sua personalidade em formação. Não devem fazer: corrigir ou ajudar a criança em seu trabalho, procurando impor-lhe uma personalidade adulta. (...) Não devem fazer: considerar que o produto final do esforço infantil tenha alguma importância. (...) Não devem fazer: entregar a criança cadernos de figuras para colorir ou modelos de desenhos que a tornariam insensível ao ambiente. Devem fazer: compreender que as proporções erradas exprimem freqüentemente uma experiência. Não devem fazer: corrigir as desproporções do trabalho. (...) Devem fazer: matricular a criança em um curso de arte infantil. Não devem fazer: conservar a criança em casa chegadinha a eles. Devem fazer: deixar que a criança desenvolva sua própria técnica, mediante a experimentação. Não devem fazer: mostrar a criança como se pinta.” (LOWENFELD, 1977, p. 75-76)

Além de Lowenfeld, outros autores como Elizabeth M. Gregg em 1968 publicam livros como What to do when there´s nothing to do abordando a participação dos pais no desenvolvimento criador das crianças. Suas sugestões de como agir é dividida de acordo com a faixa etária das crianças: de bebês a cinco anos. Cita que as atividades gráficas e pictóricas aparecem a partir das crianças de três anos, os desenhos compostos por formas simples (círculos e cruzes) e ainda podem apresentar rabiscos. Afirma ser o desenho infantil um esforço da criança, buscando colocar seus pensamentos e sentimentos no papel, e não a expressão do mundo real. O quarto ano da criança é situado o período em que os desenhos começam a serem reconhecíveis pelos adultos. Nesta época apesar de não se importarem com proporções ou uso correto de cores, eles já tenham uma clara idéia do que querem desenhar. Gregg atribui aos pais a função de conduzir, conscientizar. Estimula os pais a elogiar e questionar as crianças no intuito de despertar a criança a perceber a distância entre seu desenho e a realidade, tendo como objetivo o aprimoramento. Lucille E. Hein, em 1973, publica Como entretener a los niños, não abordando exclusivamente os desenhos, misturando produção artística e trabalhos manuais. Afirma que


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desde muito pequena a criança ao demonstrar interesse por objetos aparentemente inúteis, está iniciando suas atividades criadoras, produzindo figuras, formas, modelando, desmontando e que os pais devem participar desse processo ativamente, brincando junto, dando modelos e ensinando técnicas variadas. Não se baseia em faixas etárias ou fases de desenvolvimento, mas reforça que a criança de três a seis anos, por não ter tido ainda contato com as escolas e seus fatores de uniformidade criativa, deve ter sua própria capacidade criadora valorizada, experimentando, criando, idealizando, improvisando, sendo original e manejando suas idéias com liberdade. Afirma que quanto mais a criança tiver a oportunidade de manipular e utilizar materiais diversos em suas atividades de arte e de trabalho manual, mais desenvolverá suas faculdades criativas. Dessas publicações dirigidas aos pais, foi a de Lowenfeld, sem dúvida, a mais lida. Suas teorias sobre o desenvolvimento do grafismo, divulgadas amplamente nas duas publicações, A criança e sua arte e o Desenvolvimento da capacidade criadora firmaram-se amplamente, incorporadas às instituições educativas de todo o mundo. Atualmente muitas críticas são feitas em relação a esse verdadeiro sistema de relação como o adulto deve-não-deve-pode-não-pode agir sobre a questão criança e seu desenho que foi estabelecido neste período. O trabalho de Lowenfeld não pode ser totalmente criticado e contribuiu sim, com a valorização do desenho, criatividade e produção da criança. Mas as questões levantadas hoje, e que veremos a seguir, discutem em como essa total liberdade pode por outro lado, privar a criança de um conhecimento formal que poderia ajudála a não abandonar a representação gráfica, fato que acontece por volta dos doze anos, verificado por todos esses autores posteriores. E como essa postura de certa maneira poderia ter relegado absurdamente a educação artística a uma disciplina considerada sem importância no currículo escolar.


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IV - MEIO SÉCULO DO ESTUDO DO DESENHO

Até o meio de século XX os estudos se intensificaram e o interesse no que a criança era capaz de produzir e seu significado cresceram. A UNESCO, reconhecendo o esforço de tantos em divulgar o processo de (re)conhecimento da nova teoria aplicada a criança e sua arte, editou em 1954, o álbum Art et Éducacion, sob orientação de Edwin Ziegfeld. Essa publicação continha desenhos de crianças de raças, idades e nacionalidades diferentes, com ensaios importantes sobre o assunto, pertencentes à autores como Amélie Hamadaine, Piaget, Herbert Head, Edwin Zigfeld, Matisse, Arno Stern e outros. (MARINO, 1988, p. 97) Segue abaixo trecho do artigo de Piaget publicado nesse álbum, que demonstra como a época estava assimilando as novas descobertas e as discussões que estavam sendo feitas quanto a como se comportar frente ao desenvolvimento de uma nova modalidade de conhecimento, o estudo da criança, suas características e de sua evolução enquanto ser humano único em formação e sua produção gráfica:


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“Dois fatos paradoxais são capazes de espantar as pessoas habituadas a observar o desenvolvimento das funções mentais e das aptidões na criança. O primeiro dos fatos consiste em que, freqüentemente, a criança pequena parece melhor dotada do que a criança de mais idade, nos domínios do desenho, da expressão simbólica (...) e por vezes na música. Quando se estuda as funções intelectuais ou os sentimentos sociais constata-se um progresso mais ou menos continuado, enquanto que no domínio da expressão artística, ao contrário, a impressão freqüente é de um recuo. O segundo fato (...) consiste em que é muito mais difícil estabelecer estágios regulares de desenvolvimento no caso das tendências artísticas do que no caso das outras funções mentais. (...) a criança pequena começa espontaneamente a exteriorizar sua personalidade e suas experiências interindividuais graças aos diferentes meios de expressão que estão a sua disposição: desenho e a modelagem, o simbolismo do jogo, a representação teatral (...), do canto, etc; mas que, sem uma educação artística apropriada que consiga cultivar estes meios de expressão e encorajar as primeiras manifestações estéticas, a ação do adulto e os constrangimentos do meio familiar ou escolar tendem em geral a frear ou contrapor-se às tendências artísticas ao invés de enriquecê-la. (...) os dois principais problemas psicológicos da educação artística são, portanto, compreender, em primeiro lugar, a quais necessidades fundamentais correspondem às manifestações iniciais da expressão estética infantil e, em segundo lugar, qual a natureza dos obstáculos que surgem ordinariamente no curso da evolução ulterior. Mas, aqui novamente - mais que em outros campos - é necessário evitar a tentação que ameaça cada vez que uma nova matéria é introduzida na escola: a educação artística deve ser, antes de tudo, a educação da espontaneidade estética e da capacidade de criação cuja presença é manifesta na criança pequena; e ela não pode, menos ainda que outras formas de educação, se contentar com a transmissão e aceitação passiva de uma verdade ou de um ideal totalmente elaborado: a beleza, como a verdade, somente tem valor quando recriada pelo sujeito que a conquista.” (FLECK, 2002, trad. de PIAGET, 1954, p. 22-23)

Em 1949 o pesquisador Pierre Naulle, levando em consideração apenas os países da Europa Ocidental e ao Estados Unidos, enumerou 357 autores que até então estudaram o desenho infantil. Segundo esses dados, 300 deles exploravam questões psicológicas e os outros 57 (20%), tratavam de aspectos estéticos, sociológicos, comparação entre povos de diferentes raças e períodos ou se referiram à pedagogia do desenho na infância. (CAMPOS, 1999, p. 14) No livro de Goodenough, Measurement of inteligence by drawings, é apresentado também uma extensa listagem de publicações, monografias, artigos e relatórios de autores que abordaram o assunto, e em 1974, na sétima edição do livro, são agregados outros dados referentes ao período citado (até 1948-1951) por Naulle e por ela mesma que excede, em número

muito

maior

a

contabilização

divulgada

anteriormente.

Desde

então,


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indiscutivelmente, até os dias atuais outros milhares de pesquisadores espalhados por todo o mundo se dedicaram e continuam se dedicando a esse estudo, em quantidade agora impossível de se classificar. Um ponto importante a se lembrar é que essa monografia se refere a um panorama mundial geral do desenvolvimento histórico do processo do estudo do desenho da criança, onde as influências, dados e teorias descritas vêm necessariamente de autores europeus e norte-americanos, que foram os detonadores das questões acerca do assunto em todo o mundo. A partir dos primeiros estudos divulgados em nível mundial, cada país começa a buscar suas próprias conclusões, assim como no Brasil, onde passam a se destacar vários nomes que se dedicaram e se dedicam à nossa criança e suas particularidades específicas. Abordar esse assunto daria vazão a um outro trabalho, se não muitos, não sendo possível colocar aqui todo esse universo que vai se formando a partir dos estudos pioneiros. Com certeza, formam-se universos paralelos muito especiais, onde características como a mistura de raças, a explosão de luzes, cores e formas com as quais crianças moradoras em regiões do globo como o Brasil e suas relações de afeto e proximidade com seu próximo poderiam ser fatores que modificariam os resultados dos apontamentos. Segue o estudo desse panorama geral, visto através da abordagem de autores essencialmente estrangeiros, com exceção a Divo Marino, que é utilizado como um dos autores-chave para o alcance do objetivo deste trabalho, que é buscar mostrar uma visão geral de como se deu o descobrimento do desenho infantil, como se definiram as principais linhas e para onde caminham as novas idéias.


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V - ABORDAGENS DAS PRIMEIRAS ASSOCIAÇÕES ENTRE OS ESTUDOS DO DESENHO E DA ESCRITA

Assim como Vygotsky associa as funções da linguagem e escrita com o desenho, afirmando “a escrita tem uma pré-história, em que devem ser considerados como precursores o gesto infantil, as primeiras expressões do desenho e o jogo simbólico”, (Vygotsky, 1931/1995, p. 183-206 apud CARVALHO, 2000) Alexander R. Luria, importante psicólogo e pesquisador russo, seguidor da linha vygotskiana, em trabalho que data de 1929, publica em seu artigo O desenvolvimento da escrita na criança, uma seqüência de estágios passados pelas crianças no processo da aquisição da escrita e sua relação com a representação gráfica. Segue abaixo:

1 Fase pré-instrumental ou imitativa: fase assim caracterizada pelo fato da ausência da utilização da escrita como instrumento a serviço da memória. Ter valor em si mesma, ser autocontida e indiferenciada.


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2 Escrita topográfica: fase em que a criança começa a fazer diferenciações primárias (com o uso de signos de baixa convencionalidade) relativas ao significado das palavras, utilizando para estas diferenciações a localização da grafia como recurso da memória e não necessariamente diferenças objetivas no traçado de cada conteúdo registrado. 3 Escrita pictográfica: fase em que a criança registra diferenciações presentes nos atributos do conteúdo, o signo é simbólico por ser um portador de significado que atua sobre o sujeito, aparecendo o desenho utilizado como mediador da memória e não mais como uma representação em si mesmo. 4 Escrita simbólica: quando a criança deixa de representar núcleos de significados e passa a desenhar a própria fala utilizando letras convencionais. (AZENHA, 1991)

Marthe Bernson, autora do livro Du gribouillis au dessin, de 1960, afirma que para a criança “existe uma espécie de magia em poder alinhar signos, ligá-los entre si e estão muito conscientes do que querem dizer e comunicar alguma coisa”. (BERNSON, 1960, p. 12 apud MÈREDIEU, 1999, p. 11). Bernson distingue três estádios do rabisco:

1

Estágio vegetativo motor: por volta dos dezoito meses, aparece o tipo de traçado próprio da criança, traçado esse mais ou menos arredondado, conexo ou alongado. O lápis não sai da folha formando turbilhões elípticos que partem do centro, (FIG.: 11) o que corresponde a uma simples excitação motora.


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FIGURA 11 - Traçado circular, Criança de vinte meses. FONTE - MÈREDIEU, 1999, p. 26. 2

Estágio representativo: entre dois e três anos, caracteriza-se essencialmente pelo aparecimento de formas isoladas (FIG.: 12), que aparecem pelo levantamento do lápis. A criança passa do traço contínuo para o traço descontínuo, em um ritmo mais lento, tentando por vezes fazer comentário verbal do desenho.

FIGURA 12 - Aparecimento de formas isoladas. FONTE - MÈREDIEU, 1999, p. 27. 3

Estágio comunicativo: começa entre três e quatro anos, se traduz por uma vontade de escrever e de comunicar-se com os outros, onde a tentativa de imitação do adulto se mostra mais. Traçando em forma de dentes de serra, (FIG.: 13) parece tentar reproduzir a


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letra dos adultos, buscando escrever e comunicar-se através dela. (BERNSON, 1966, p. 12 apud MÈREDIEU, 1999, p. 25-27)

FIGURA 13 – Traçado em forma de dentes de serra. FONTE - MÈREDIEU, 1999, p. 28. Segundo Florence de Mèredieu (1974), a evolução do desenho depende intimamente da evolução do da linguagem e da escrita. Ela afirma isso baseada nas conclusões de Bernson. A escrita exerceria uma verdadeira fascinação sobre a criança, por ser parte importante do universo do adulto, por isso a vontade de imitar a escrita dos adultos desde muito cedo. Na busca de se entender o processo de desenvolvimento da criança, o tema desenho e escrita se encontram muitas vezes. Vários autores que estudaram o processo da construção da escrita alfabética, buscaram uma relação do desenho com o desenvolvimento inicial do sistema de escrita. Entre os autores que analisaram essas relações, além claro de Vygotsky, Luria, Mèredieu e Bernson, podemos citar entre outros, Widlöcher (1971), Freinet (1989), Ferreiro e Teberosky (1991), Tolchinsky e Levin (1990), Goodman (1990), Luçart (1983), Landsmann (1995). Em 1964, no Journal de Psycologie, Liliana Luçart, observa que as origens do círculo e do quadrado são elaboradas em níveis diferentes, os traços circulares que nascem de movimentos contínuos são de tipo motor e correspondem simplesmente a uma descarga elétrica. E que ao contrário, os quadriláteros derivam de movimentos descontínuos e coincidem com a aquisição do controle dos pontos de partida e chegada, o controle múltiplo.


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Isso se dá devido a uma modificação da relação olho-mão; o olho que no começo segue a mão passa a guiá-la. (MÈREDIEU, 1999, p. 28)


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VI - ABORDAGENS PSICOLÓGICAS DO DESENHO

A psicologia também se utiliza amplamente da produção gráfica da criança para diagnósticos e essas abordagens visavam objetivos e aspectos diversos, como avaliação das fases do desenvolvimento, medida de inteligência, motricidade, traço e uso da mão, noção do espaço, função da percepção visual, papel da forma, verbalização perigráfica, objeto da reprodução, expressão, caráter, tipos, psicopatologia entre outros. No livro O teste do desenho como instrumento de diagnóstico da personalidade, da brasileira Dinah Martins de Souza Campos, publicado originalmente em 1969, são citados os seguintes pesquisadores envolvidos nos estudos referentes à aplicação do desenho como método de apoio para avaliação psicológica: Goodenough (1926), M. Prudhommeau (1947), Wallon, B. Székely (1960), H. Dorken, L. Bender (1932, 1937, 1938, 1940, 1943, 1944), John N. Buck (1948), Karen Machover (1949), Gallase, Spoerl (1940, 1941), Kotkov, Goodman, Berman, Leffel, Méier (1928, 1936, 1939), Brown (1943), Levine, Fisher, Waehner (1946), Zucker, Landisburg (1947), Koch (1949), Hammer (1958), Hulse, Eysenck, Shafer.


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Alguns desses psicólogos desenvolveram testes, como a Folha Prudhommeau, por M. Prudhommeau; Teste gestáltico visomotor, por L. Bender; Teste da casa-árvore-pessoa, HTP, por John N. Buck em 1948; Teste do desenho da figura humana, por Karen Machover em 1949; Baumtest, por Koch, 1949; Teste do desenho. Alguns desses testes foram aperfeiçoados ou modificados, sendo utilizados até hoje pela psicologia. (CAMPOS, 1999, p. 13-28) Neste livro, que em 1999 já se apresentava em sua trigésima primeira edição, Dinah Campos apresenta detalhadamente as técnicas de aplicação e normas de interpretação para o Teste HTP (Casa, árvore, família), de John Buck e do Desenho da família. Dentro das normas de interpretação, enumera alguns aspectos gerais do desenho a serem observados, dissecados detalhadamente em todas as suas possibilidades de variação:

1

Localização no papel (eixos, cantos, lados, margens).

2

Pressão e caracterização dos traços no desenhar.

3

Simetria.

4

Detalhamento.

5

Movimentos.

6

Tamanho da figura.

7

O uso da borracha.

São abordados com extremo detalhamento os elementos que podem aparecer em cada tema sugerido e suas significações, insistindo sempre que cada item do desenho não pode ser avaliado isoladamente, mas sempre em conexão com os outros dados do desenho. (CAMPOS, 1999, p. 38-109)


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O que pode ocorrer aos que consultarem esse livro é que as normas de interpretação utilizadas por Dinah, para cada detalhe que possa aparecer no desenho executado, estabelecidas segundo estudos de mais de trinta anos atrás, seja extremamente simplista e taxativo, e que utilizá-los desassociados não só da conexão com os outros elementos do desenho, mas em relação a todo o contexto em que a criança está inserida possa acarretar em interpretações extremamente errôneas e desastradas. De certo modo, as interpretações dos elementos fazem sentido, mas aplicá-las da mesma maneira a indivíduos diferentes seria no mínimo uma atitude irresponsável.


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VII - O DESENHO DA CRIANÇA POR DIVO MARINO

No Brasil, Sílvio Rabello é um dos poucos nomes que podem ser citados no envolvimento do processo inicial de descobrimento e exploração do desenho da criança. Em 1935, ele lança o livro Psicologia do Desenho Infantil. As idéias e experimentações circulavam pela Europa, mas no Brasil ainda eram fortes as raízes conservadoras do sistema educacional onde o ensino do desenho era baseado no sentido utilitário de preparação técnica para o trabalho. O objetivo era desenvolver habilidades técnicas e o domínio da racionalidade. Na prática, o desenho nas escolas trabalhava a reprodução de ornatos, cópias e a geometria. O ensino e a aprendizagem da arte baseavam-se na transmissão de conteúdos. (FERRAZ; FUSARI, 1993, p. 30-31) Sistema esse também utilizado no resto do mundo antes da revolução da livre-expressão. Um grande marco da divulgação e começo da implantação das idéias que estavam revolucionando a arte infantil no mundo, no Brasil, foi o desenvolvimento e a fundação da


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Escolinha de Arte, por Augusto Rodrigues, em 1948, no Rio de Janeiro, que se espalhou por todo o Brasil, semelhantes aos ateliês de desenho da Europa e dos Estados Unidos. Como sintetizador de todo essa linha de pensamento definida até então pelos estudiosos, segue agora a descrição das idéias de Divo Marino, um outro brasileiro, que lança em 1957, o livro O Desenho da Criança. Professor em Ribeirão Preto-SP, Marino procura fazer desse livro uma ferramenta para a realização de um trabalho de conscientização do meio educacional no Brasil para toda a discussão acerca da arte da criança e de como lidar com ela, de acordo com a efervescência que se constatava no mundo lá fora. Conta para seu país as descobertas que estavam sendo feitas, as conclusões (desde Rousseau, passando por Luquet e Piaget), os eventos (como o lançamento do álbum Art et Éducacion ). Enfoca as abordagens históricas e psicológicas que estavam sendo feitas pelos diversos pesquisadores em todo o mundo, divulga pesquisas realizadas por outros autores e por ele próprio. Aborda as conceituações do desenho a partir das etapas do desenvolvimento da representação gráfica pelo homem, forte linha de pesquisa na época, que estudava e comparava o desenho infantil ao desenho dos povos primitivos. Cita vários estudiosos, concordando com conceitos como o desenho infantil ser um meio de expressão e linguagem da criança e que estava sendo considerado um dos mais interessantes meios de estudo da mentalidade global. Citando Luquet, Marino (1957, p. 19-20) acredita que “o exame do desenho infantil permite pôr em evidência as analogias profundas ou o parentesco essencial da psicologia da criança com a do adulto”, embora existam diferenças graças à “condições especiais da infância”. Diz que o “mundo artificial” em que a criança vive, “arranjado pela sociedade e pela família” faz com que essas analogias sejam bastante suscetíveis. Afirma, de acordo com os estudos da época que todas as crianças desenham de maneira idêntica quanto à formalização das características e etapas, diferindo apenas no assunto que se apresenta em função da influência do meio. Verificar o progresso da criança


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normal dentro dos processos de aprendizagem da leitura, do cálculo e da escrita seriam tarefas fáceis, mas apreciar a evolução no desenho, segundo normas precisas já seria tarefa bastante difícil. Define o desenho como uma linguagem. Marino aborda as características e fases que estavam sendo reconhecidas como parte do desenvolvimento do desenho infantil, descrevendo a seguinte esquematização das etapas do desenho:

1 Etapa da Garatuja: entre as idades de dois/ três anos até quatro/ cinco a criança rabisca sentindo prazer nos movimentos musculares, obtendo como resultado traços indefinidos e manchas sem finalidade aparente.

2 Etapa da Linha: aos quatro anos a criança já apresenta um controle visual, um balbucio gráfico do período da garatuja. A criança desenha rabiscos que apresentam familiaridade com o meio. A figura humana é seu tema predileto representado por um círculo com dois pontos dentro (olhos e cabeça) e duas linhas ligadas ao círculo (pernas).

3 Etapa do Esquematismo: aos cinco anos a criança apresenta um plano geral da figura humana utilizando formas circulares, quadradas ou ovais para a cabeça e para o corpo. Aos seis ou sete anos acrescenta ao desenho anterior os braços e pernas, apresentados como formas de linhas paralelas que irradiam os traços dos dedos semelhantes a uma estrela. Acrescenta boca, nariz e pés. Utiliza normalmente o mesmo esquema para simbolizar tanto o homem e a mulher, quanto o animal, mudando apenas o sentido vertical ou horizontal da representação. Essa fase também é chamada de etapa do simbolismo.


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4 Etapa do Realismo Lógico ou Mental: buscando um realismo mais descritivo, por volta dos sete/ oito anos, a criança desenha o que sabe dos objetos, seguindo sua imaginação. Começa a abandonar seu esquema. Rebatimento, transparência e detalhes evidenciados são comuns. Começa a representar desenhos de perfil, mudando em um primeiro momento o rosto e depois o corpo. Não apresenta ainda representações com perspectiva ou terceira dimensão.

5 Etapa do Realismo Visual: aos nove ou dez anos a criança distingue o que vê e o que sabe, substituindo o realismo lógico pelo visual. Desenhos do natural são mais constantes. Surgem paisagens e terceira dimensão.

6 Fase da Regressão: entre os doze/ quatorze anos, com a adolescência, apresenta-se nos desenhos uma regressão ou estacionamento. Com o aumento da capacidade de observação e senso crítico, o adolescente faz comparações e se torna insatisfeito com sua representação, julgando-a inadequada, errada e feia. Julga-se incapaz de desenhar bem e desloca seu interesse para a expressão lingüística.

7 Etapa do Renascimento: em casos de retomada pelo interesse em desenhar, aos quinze anos pode se dar um renascimento, uma busca adolescente pela feição artística da representação gráfica.

Provavelmente Marino cita as fases assim classificadas em sua publicação de 1955, segundo C. Burti, que as definiu dessa maneira em 1940, em seu livro Mental and Scholatisc Tests. Quanto às características do desenho, explica:


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1 Transparência ou raio-X: baseando-se na idéia de que a criança utiliza o seu modelo interno e desenha o que pensa e não o que vê, o recurso da transparência, apontado como apogeu da fase do realismo mental ou lógica, acontece quando a criança desenha como se paredes, corpos, cenas se apresentassem num sistema radiográfico. (FIG.: 14 e 15)

FIGURA 14 - Desenho Salim Nassif Abdala, oito anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 48.

FIGURA 15 – Desenho Walter Martins, nove anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 49. 2 Rebatimento: acontece a superposição de uma figura sobre um plano, por movimento de rotação em torno de um eixo. O rebatimento se dá em figuras que estão em plano vertical para um plano horizontal ou vice-versa. Com total ignorância das regras da perspectiva, a


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criança desenha os chamados pormenores funcionais, sendo essa a sua solução técnica para poder colocar minuciosamente os detalhes. (FIG.: 16 e 17)

FIGURA 16 – Desenho Elísio Ventura, sete anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 49.

FIGURA 17 – Desenho Magda Triani, dez anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 50. 3

Pormenores funcionais: os detalhes funcionais são escolhidos pela sua função, onde a criança destaca o que acredita ser necessário acentuar para atribuir ênfase. No desenho abaixo, FIG.: 18, a criança desenha e explica que é “uma casa e uma caminhão de gasolina indo levar gasolina para o fogão da casa, e, também um automóvel com a direção, o motorista, e um menino pegando a rabeira”. Como vemos, ela se preocupou com os pormenores funcionais na representação dos motoristas, da mangueira e dos veículos.


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FIGURA 18 – Desenho Jair Martins, sete anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 51. 4 Egocentrismo: a tendência de fazer de si mesmo o centro do universo, onde desapercebida do mundo que a cerca, vive voltada para si. Ela apresenta no desenho essa tendência no seu desenho, manifestando precocemente a tentativa de representar o natural, copiar o desenho do adulto, a fotografia. Ela assim esta valorizando seu próprio eu, aceitando sua forma de ver mentalmente e corrigindo a representação gráfica do adulto.

5 Sincretismo: a criança representa fundidos aspectos impossíveis de serem observados acontecendo no mesmo momento e lugar. Mistura cenas, desenha ao mesmo tempo começo e fim de uma situação. Marino diz que essa característica denota a peculiaridade da “falta de lógica, um quê de contraditório e interessante”, (1957, p. 56) demonstrando claramente a mentalidade sincrética da infância. No desenho a seguir, FIG.: 19 a criança narrou graficamente a história da Bela adormecida apresentando sincretismo.


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FIGURA 19 – Desenho Wilma Barbosa, dez anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 57. 6 Sobreposição: não conhecendo a terceira dimensão, seus desenhos não apresentam a existência do espaço, volume e perspectiva. Os elementos aparecem soltos no espaço, uns sobre os outros, colocados em um mesmo plano. (FIG.: 20)

FIGURA 20 – Desenho Lília Sanches, sete anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 61.


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7 Dinamismo: traduz a tendência pela admiração dos movimentos. No desenho de Felipe, FIG.: 21, “o avião está bombardeando o navio que está no mar”, onde ele reproduziu uma cena que viu no cinema.

FIGURA 21 – Desenho Felipe Petranu, oito anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 60. 8 Rigidez: em contraste com o dinamismo, há também o aspecto da rigidez dos bonecos. Nas crianças pequenas, os bonecos apresentam braços e pernas esticados, ausência de emoção na fisionomia. Marino compara essa característica com a rigidez da arte egípcia. Em uma idade mais avançada a criança utiliza então as articulações nos membros.

9 Evolução, retrocesso e emperramento dos tipos: a evolução dos tipos representados se dá em paralelo ao desenvolvimento psíquico. Há uma coincidência entre a idade cronológica e a idade mental. Acompanhando a representação da figura humana feita por crianças de três a treze anos isso pode ser verificado. (FIG.: 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32)


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FIGURA 22 – Desenho Aracy H. Galdo, três anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 63.

FIGURA 23 – Desenho Suely A. Pisani, quatro anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 63.

FIGURA 24 – Desenho Luis E. Ciampo, cinco anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 64.


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FIGURA 25 – Desenho Ayrton Gallo, seis anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 64.

FIGURA 26 – Desenho Antonio D. Gallo, sete anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 64.

FIGURA 27 – Desenho Diva Gomes, oito anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 64.


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FIGURA 28 – Desenho Isaura Spinelli, nove anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 64.

FIGURA 29 – Desenho Silvana Calefi, dez anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 65.

FIGURA 30 – Desenho Marilyn D. Campano, onze anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 65.


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FIGURA 31 – Desenho Helena A. Fabri, doze anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 65.

FIGURA 32 – Desenho Werther Fabri Filho, treze anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 65.

O retrocesso dos tipos se dá quando a criança se vê na obrigação de repetir um desenho muitas vezes, onde acaba retrocedendo a tipos anteriores. No próximo desenho, FIG.:33 a criança queria desenhar uma fila, e ao fazê-lo foi se cansando e simplificando os desenhos.


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FIGURA 33 – Desenho Sílvia Maria C. Bueno, oito anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 66. Durante o quadro evolutivo das representações da criança durante a evolução dos tipos pode ocorrer emperramento. Esse emperramento gráfico permanece muitas vezes até a idade adulta, mantendo os esquemas representativos criados na infância. (FIG.: 34)

FIGURA 34 – Desenho C. Camargo, dezoito anos. FONTE - MARINO, 1957, p. 65. Marino observa que podem ocorrer grandes diferenças individuais entre as crianças quanto à idade em que transitam de uma fase para outra. Citando Luquet, caracteriza a aparição do realismo visual na criança como uma importante etapa na evolução psicológica da criança, onde ela está dando um importante passo em direção à vida adulta. Afirma, porém, que a esquematização das fases gráficas apresentadas poderão ser modificadas através das novas abordagens e pesquisas que ainda hão de vir.


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Marino realizou um trabalho de pesquisa bastante importante e completo, em um campo ainda pouco explorado na época no Brasil. Produzindo um material onde relaciona os conceitos, as descobertas e os caminhos que o estudo do desenho da criança percorrera até então, contribuiu para que o assunto passasse a ser abordado mais amplamente, em uma época em que o assunto desenho infantil ainda se encontrava ausente do universo escolar. Mostra os resultados de pesquisas realizadas por Rabello por volta de 1934 utilizando o Teste Decroly em Recife, comparado com os resultados obtidos anteriormente pelo próprio Dr. Decroly na Bélgica e por Faria de Vasconcelos em Portugal. Marino realiza o mesmo teste em Ribeirão Preto em 1954. Cita também a mecânica do Teste de Goodenough, e do Teste de inteligência pelo desenho da casa elaborado por Heloisa Marinho. Realizou também, no ano de 1955, em Ribeirão Preto-SP, a coleta de mil e duzentas páginas de desenho espontâneo de mil e duzentas crianças dos dois aos treze anos de idade, sendo cem crianças de cada idade: seiscentas do sexo feminino e seiscentas do sexo masculino. Através da coleta e análise tanto quantitativa quanto psicológica desses desenhos, ele apresentou reflexões referentes aos temas abordados nos desenhos; predominância de temas divididos em faixas de idade e sexo e abordagem dos fatores sócio-econômicos, políticos, culturais e sexuais enfocados nos desenhos. As conclusões de Marino foram que o meio exerce uma verdadeira tirania sobre o desenho infantil. O meio sócio-econômico de elevado teor acelera a sucessão das fases gráficas e que o baixo nível sócio-econômico as retarda. Enquanto o enfoque das crianças da zona rural apresentava acentuado fitomorfismo7 e zoomorfismo8, na cidade a máquina é a assunto de interesse. As crianças de um meio social mais elevado mostravam-se mais aptas 7

Fitomórfico . [De fit(o)- + -morf(o)- + -ico2.] Adj. 1. Relativo a fitomorfo. 2. Que tem atributos de uma planta, ou é representado por eles. Fitomorfo . [De fit(o)- + -morfo.] Adj. 1. Em forma de, ou semelhante a planta. • S. m. 2. Representação convencional de uma planta, como a que se vê, p. ex., na arte primitiva. (Novo Aurélio, 2002) 8

Zoomorfismo (ô-o). [De zo(o)- + -morf(o)- + -ismo.] S. m. 1. Representação de divindades sob a forma de animais. 2. O uso de formas ou de símbolos animais na arte, na literatura, etc. (Novo Aurélio, 2002)


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para o desenho, e que nesse meio, era maior a ocorrência de crianças bem dotadas. Nas crianças de bairros de alto nível sócio-econômico verificou-se a influência de temas relacionados ao cinema e histórias em quadrinhos. Nas de bairros menos favorecidos, religião, futebol e nacionalismo são alguns dos temas mais abordados. Marino diz que o desenho infantil acaba por ser um espelho que reflete os mais variados aspectos da vida social. Um curioso enfoque é dado ao que seria a representação pelos desenhos das meninas, que o autor classifica como expressões da alma feminina. São apresentados como temas abordados por elas o ambiente doméstico, o cuidado com a casa e o gosto pela costura. Marino diz que o incomum impressiona vivamente a criança e que fatos novos e que mudam sua rotina são prontamente apresentados em seus desenhos. São apresentadas tabelas detalhadas referentes aos temas mais desenhados pelos diferentes sexos, em cada faixa de idade, que vai de dois a treze anos, e a discussão quanto as suas significações psicológicas. Esse tipo de avaliação quantitativa trata-se ainda, nos dias de hoje, de um método de pesquisa bastante utilizado pelos estudiosos em todo o mundo. Em um resultado geral obtido por Marino no Brasil segue a seguinte classificação quanto aos principais temas abordados no desenho das crianças segundo pesquisa realizada por ele em Ribeirão Preto, em 1954.


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QUADRO I Dez principais temas abordados no desenho das crianças do sexo masculino segundo pesquisa realizada em Ribeirão Preto em 1955 Class.f Meninos

Número Desenhos

%

276

20%

247

19%

Animais Fig. humanas

Casas

241

19%

Árvores

177

14%

Navios

107

8%

Bandeiras

97

7%

Veículos

81

6%

Flores

33

6%

Brinquedos

21

2%

10º

Frutas

20

2%

FONTE – MARINO, D. O desenho da criança, 1957, p. 89.

QUADRO II Dez principais temas abordados no desenho das crianças do sexo feminino segundo pesquisa realizada em Ribeirão Preto em 1955

Class. Meninas

Número desenhos %

Fig. humanas 342

21%

Flores

309

19%

Animais

306

18%

Casas

304

18%

Árvores

193

12%

Frutas

99

6%

Navios

30

2%

Veículos

27

2%

Montanhas

24

1%

10º

Bolas

23

1%

FONTE – MARINO, D. O desenho da criança, 1957, p. 89.


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QUADRO III Dez principais temas abordados no desenho das crianças de ambos os sexos segundo pesquisa realizada em Ribeirão Preto em 1955 Class. Assunto

Número

%

Figuras humanas 276

20%

Animais

247

19%

Casas

241

19%

Árvores

177

14%

Flores

107

8%

Navios

97

7%

Frutas

81

6%

Bandeiras

33

3%

Montanhas

21

2%

10º

Bolas

20

2%

FONTE – MARINO, D. O desenho da criança, 1957, p. 90.

Afirmando que, o desenho infantil é “a linguagem autêntica da infância”, Marino diz que, (1957, p. 121) possivelmente, “se não existisse a escola e os processos de alfabetização, com a evolução da mentalidade infantil, a criança talvez criasse uma rudimentar linguagem escrita, na sua passagem para a linguagem adulta. A escola apressa esse processo de criar através da alfabetização, levando a criança de um mundo, o qual ela representa através de sua linguagem autêntica, a do desenho, para o mundo das letras e dos números. Mas enquanto a escrita é um ato mecânico, desenhar é um fenômeno muito mais graficamente complexo que escrever”. Para Marino, o desenvolvimento do desenho na educação deve ter como finalidade desenvolver a expressão e libertar o espírito criador da criança. Ela adquirirá, assim, um agudo senso de observação, usando o desenho para descrever o mundo exterior e as suas especulações psíquicas, e ao aprender a linguagem escrita, já estará melhor aparelhada para


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usar esse novo meio de expressão. Mas para isso, a prática do desenho deve ser livre e espontânea. Marino defende veementemente a liberdade de expressão do desenho da criança e que não se deve dar à criança uma ajuda que ela não precisa. Ela deve receber, sim, um estímulo constante, que a induzirá à expressão e autoconfiança para vencer as suas etapas de desenvolvimento. Chegará a realização do desenho propriamente dito através das experiências acumuladas em seu livre exercício, sem ser levada pela ajuda do professor. Ele sugere uma metodologia baseada nessa liberdade para que seja seguida pelos professores, apresentando uma orientação metodológica de como o professor deve se comportar em relação à produção gráfica da criança dentro de todas as etapas citadas. Na segunda edição do livro, ampliada e lançada em 1988, Marino cita e explica quarenta e uma orientações metodológicas sobre a prática da arte infantil, baseado nas experiências de Cizek. Entre elas “nunca impor um tema para a criança pintar, apenas sugerir quando necessário”, “não limitar a superfície do desenho”, “oferecer muito espaço”, “abolir até os dez anos a cópia, deixando-as livre para o ato criador”, “a cópia do natural só poderá ser oferecida quando se chega à etapa do realismo visual”, “acompanhar a evolução e conhecer seus problemas psicológicos através do estímulo em fazer as crianças explicarem seus desenhos”, “não permitir, de maneira nenhuma a prática do decalque”, “jamais estimular qualquer tipo de competição entre as crianças” e que a “missão do professor em uma classe de arte não é o de ensinar, e sim animar a criança e estimular o desenvolvimento de sua personalidade”.(1988, p. 110-140) O livro O desenho da criança, escrito por Divo Marino em 1957 é um retrato das idéias que vigoravam na época, onde o desenho infantil era “incompreendido por pais e professores que não entendiam que o desenho livre era a forma que a criança tinha de exteriorizar sua livre expressão, de desenvolver através dessa liberdade sua capacidade


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criadora, e que ficava preso à um sistema normatizado do ensino do desenho, que até então precisava ser aprendido, não compreendido” . A obra de Marino sem dúvida colabora muito para o entendimento e o esclarecimento sobre esse novo e importante tema que começava a ser discutido e tomar lugar no Brasil. Como ele mesmo define (1957, p. 9) essa era “a tendência em marcha no setor educacional de valorização das garatujas das crianças”. De maneira bastante didática e clara o livro enfoca o tema plenamente de acordo com os ideais da época, onde podemos ver sintetizados nessas palavras de Marino, no prefácio do livro, toda a visão desse tempo: “Hoje, apresentamos o livro O desenho infantil como uma nova trincheira defendendo o impulso criador, o direito de autoexpressão das crianças, o direito que a criança tem de procurar, ensaiar, experimentar e encontrar as suas próprias soluções, a sua maneira peculiar de exteriorizar idéias, pensamentos e emoções pelo desenho espontâneo. Desejamos também, criar uma mentalidade nova entre os pais e educadores a respeito do desenho infantil, uma mentalidade que não mais menospreze os rabiscos da criança.” (MARINO, 1957, p. 1213)


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VIII - A INTERPRETAÇÃO DO DESENHO INFANTIL POR JOSEPH DI LEO

Joseph Di Leo publica em 1983 um estudo baseado na interpretação psicológica do desenho infantil, onde analisa e estuda 120 desenhos de crianças de variadas faixas etárias. O trabalho realizado tem como função auxiliar nos procedimentos gerais de diagnóstico e terapia, já que o desenho, segundo ele, são reveladores do desenvolvimento psíquico da criança, e podem ser utilizados para ajudar a entender distúrbios psíquicos. O que acabou por acontecer é que esse trabalho de Di Leo ficou bastante presente no imaginário e na prática também dos profissionais de educação, apesar dos mesmos não terem realmente preparo para lidar com questões tão profundas como as que podem ser demonstradas pelo comportamento da criança e por seus desenhos. Buscando significados na produção gráfica da criança, Di Leo afirma que as crianças podem ser encorajadas a falar sobre seu desenho, não sendo inquiridas diretamente sobre “O que é isto?”, mas observadas e questionadas de maneira não específica “Fale-me


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alguma coisa sobre isso”. Citando as fases ou estágios do desenvolvimento das crianças já estudados amplamente por autores como Piaget, Freud e Erikson, afirma ser muito importante o conhecimento dessas fases por parte de quem irá ler o desenho. Citando Jung, atenta para o simbolismo contido nas representações da criança, que deve ser avaliado em relação ao desenho como um todo, contextualizado na realidade da criança. Os fatores que segundo ele devem ser observados são:

1 O uso do espaço da folha do desenho, pois a colocação dos elementos na folha, revelariam significados concretos. 2 A qualidade da linha utilizada; quebradas, leves, vigorosas, contínuas. 3 A orientação espacial utilizada, lateralidade, orientação de perfil, relações esquerdadireita. 4 A inversão de letras e números. 5 O aparecimento e a intensidade do sombreamento. 6 A integração, conexão entre os elementos dispersos na folha. 7 A simetria, o equilíbrio e a rigidez dos elementos. 8 O estilo individual de cada criança, que pode ser classificado em: contido ou exuberante, impressivo ou expressivo, realístico ou imaginativo. 9 E a relação entre o estilo do desenho e a qualidade da linha.

Di Leo afirma que esses fatores avaliados ajudam a entender a personalidade do indivíduo que criou o desenho, pois cada desenho reflete essa personalidade. (1985, p. 9-40) Ele se baseia, para avaliação dos desenhos, nos estágios do desenvolvimento cognitivo de Piaget e nas fases de representação do desenho abordadas por Luquet, e apresenta a conceituação das fases do desenho infantil da seguinte maneira: (1985, p. 41-42)


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1 Estágio sensório-motor •

Do zero a um ano; ela não desenha, apenas leva o lápis à boca. (A criança age por reflexos, pensa pela atividade motora.)

De um a três anos; aos treze meses aparece a primeira garatuja em ziguezague. Ela observa com atenção o movimento, deixando sua marca na superfície. O desenho é sinestésico. (O movimento gradualmente se direciona a um objetivo, a medida que o controle cortical é gradualmente estabelecido.)

Dos dois aos quatro anos; aparecem e predominam gradualmente os círculos, se tornando mais discreto em seguida. Vislumbra um objeto no circulo casualmente desenhado. Desenha geralmente o primeiro símbolo gráfico entre os três e quatro anos. A criança começa a funcionar simbolicamente. Desempenham maior papel aqui linguagem e outras formas de comunicação simbólica. A criança tem aqui uma visão altamente egocêntrica. Brinca de faz-de-conta.

2 Estágio pré-operacional (fase intuitiva) •

Dos quatro aos sete anos: Realismo Intelectual: desenha um modelo interno e não o que vê realmente. Desenha o que sabe que deve estar ali. Utiliza transparências (ou raiosX), visão simultânea, vista do alto e frontal no mesmo desenho, expressionismo e subjetivismo. A criança é egocêntrica e tem uma visão subjetiva do mundo, muito criativa, curiosa. O mundo ainda é de fantasia e imaginação. Focaliza-se em apenas uma característica do tempo, funciona intuitivamente e não logicamente.


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3 Estágio das operações concretas •

Dos sete aos doze anos: Realismo visual: a subjetividade diminui. Desenha o que é realmente visível. Ocorre uma mudança qualitativa e quantitativa, há uma passagem da visão egocentrista para uma visão mais objetiva. Não apresenta mais a técnica dos raios-X. As figuras humanas são mais proporcionais e realistas. Usa cores mais convencionais. Melhores noções de espaço. Pensa logicamente sobre as coisas, não é mais dominado por percepções imediatas, substitui o estágio pré-conceitual pelas operacionalizações concretas.

4 Estágio das operações formais. •

A partir dos doze anos: com o desenvolvimento da visão crítica, a maioria perde o interesse em desenhar. Os talentosos tendem a ampliar sua produção. Pensa sobre idéias e não apenas sobre aspectos concretos de uma situação. Considera hipóteses. Encara sua produção criticamente.

Afirma que durante a infância símbolos inconscientes impregnam a expressão gráfica. A escolha de um tema ou outro expressa os interesses e necessidades da criança. Cita vários deles, seus significados e o uso dos testes do desenho nas avaliações de personalidade. Temas náuticos, casas, animais, aspectos da natureza, a figura humana e a representação de suas partes e todo, a família e suas diferentes representações, detalhes, o aparecimento das diferenças sexuais nas representações, tudo é destrinchado resultando em material para avaliação psicológica da criança. Di Leo procura nos traçados, nas cores e nos rabiscos feitos pelas crianças trazer os sentimentos, angústias, ansiedades daqueles que os produziram. Aborda as questões relativas aos testes do desenho, afirmando que os testes desenvolvidos por Goodenough em 1926 e que foram aprimorados por Dale Harris em 1963


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baseados no desenho da pessoa (DAP), continuam, na década de 80 do século XX, sendo os testes mais confiáveis no que se refere a indicação de maturidade intelectual baseados em desenhos. Cita mais alguns pesquisadores envolvidos nos estudos pertinentes ao desenho e suas aplicações psicológicas; Morino Abele (1970), Burns e Kaufman (1970) que elaboram o Desenho cinético de família (KFD), Winnicot (1971), Muschoot e Demeyer (1974), Brumback (1977) que elabora o Teste do interior do corpo e Bolander (1977). Gobbi e Leite, (1999) analisando o trabalho de Di Leo apontam os problemas que podem se derivar dessa classificação e análise de desenhos sendo feitas por profissionais não qualificados na área de psicologia. Quando essa análise é feita por pessoas não especializadas, como profissionais de educação na escola e não por psicólogos em consultórios e clínicas os riscos de se errar profundamente é muito grande. Tentados a ler o significado do desenho de suas crianças, classificá-los no que seria normal se tratando de qual fase em que essas crianças estariam se colocando nos padrões das etapas formalizadas, muitos equívocos poderiam ser cometidos, e em contrário, em vez de auxiliar a criança, essas conclusões poderiam atrapalhar e estigmatizar. Concordamos que é importante atentar para o perigo que a constante busca de se identificar o desenho infantil quanto à suas questões psicológicas, sob pena de rotularmos, segregarmos e discriminarmos as crianças, mais do que já vêm sendo discriminadas por suas condições socioeconômicas, culturais, étnicas ou religiosas. O desenho na escola e na vida da criança dentro de casa deve ser pensado enquanto expressão, possibilidade de interlocução e, não como base diagnóstica.


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IX - NOVAS PERCEPÇÕES DO PAPEL DO DESENHO

Em 1954, Rudolf Arnheim publica nos Estados Unidos a primeira edição de Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. Essa obra é considerada um marco na bibliografia no campo da arte. Nas palavras de Herbert Read: “É um livro de primeiríssima importância, e inúmeros aspectos da psicologia da arte recebem, pela primeira vez, um tratamento psicológico. Terá, certamente, uma ampla influência e mesmo os artistas deverão tirar proveito de sua leitura”. (READ apud ARNHEIM, 2002, p. 508)

Suas teorias psicológicas sobre a percepção visual são questões baseadas na Teoria de Gestalt, que começou a ser elaborada por volta de 1910, através do estudo dos processos de organização da percepção, na Universidade de Frankfurt, uma Escola de Psicologia Experimental. Os psicólogos Kurt Koffka, Wolfgang Köhler e Max Wertheimer verificam a maneira como o cérebro organiza seus estímulos básicos acontece através do fato de que a forma é a primeira unidade da percepção, pelo princípio da lei da pregnância. O que acontece no cérebro não é idêntico ao que acontece na retina. A excitação cerebral não se dá em pontos isolados, mas por extensão. Não existe, na percepção da forma, um processo posterior de


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associação das várias sensações. A primeira sensação já é de forma, global e unificada. Por isso quando temos a sensação de olharmos para algo e não conseguirmos identificá-lo, isso significa que o nosso percepto mental não está organizado para nos proporcionar o sentido. Os gestaltistas acreditam que existem algumas leis ou princípios organizacionais da forma na percepção: 1 Lei da proximidade. 2 Lei da similaridade. 3 Lei da continuidade. 4 Lei do fechamento. 5 Figura-fundo. Arnheim complementa e desenvolve suas teorias integrando a arte e a percepção visual baseando-se nas idéias gestaltistas, concluindo entre outras coisas que a percepção visual não parte de particularidades, mas de generalidades, a definição da idéia de conceito visual é formada como a imagem mental de um objeto que se adquire por uma multiplicidade de percepções visuais do mesmo, pela sua captação através de inúmeros pontos de vista e contextos. (BACELAR, 1998) Sua obra torna-se obrigatória aos que queiram entender e conhecer a arte a partir de uma visão contemporânea, assim como Read declarou. Em relação à criança, ele questiona a teoria que os desenhos da criança derivem-se de fontes não visuais, abstratas. Para ele, elas “desenham generalidades e forma de maneira não projetiva precisamente porque desenham o que vêem” (ARNHEIM, 1980, p. 158 apud PILLAR, 1996, p. 35) e que essa “percepção consiste não no registro fotograficamente fiel, mas na apreensão das características gerais globais”. (ARNHEIM, 1980, p. 159 apud GEEMPA, 1990, p. 16) Contrapondo-se à idéia que os desenhos infantis derivam de conceitos abstratos, que seriam não perceptivos, Arnheim diz que as crianças se baseiam em conceitos


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visuais, e que ela não está fazendo arte, mas sim utilizando o desenho como ela usa todas as atividades, como um instrumento de exploração e de estabelecimento de relações com o mundo. Os conceitos não perceptivos, os abstratos, podem até ser utilizados, mas muito pouco. Desenhando o que observam, tentando desenharem a si próprias utilizando formas geométricas, círculos e linhas, ela assim o faz não porque seja ainda incapaz, mas “porque o simples desenho preenche todas as condições que espera encontrar em um retrato”. (ARNHEIM, 2000, p. 159 apud FOLIO, 2000) As representações que aparecem nos desenhos são feitas não através da projeção ótica do objeto físico, mas de uma invenção de uma configuração que represente, para a criança, as características físicas do modelo. As formas vão se desenvolvendo progressivamente, segundo regras de padrões simples que se diferenciem gradualmente para outros de maior complexidade. Arnheim critica o fato do adulto perguntar à criança, desde o primeiro dia, o que é o desenho, sendo pressionada e formando o conceito de que tudo o que ela produz, o desenho, a pintura, precisa ter um assunto, ser a descrição de alguma coisa. Isso a condiciona a acreditar que a arte tem que ser sempre representativa, considerando e se preocupando o tempo todo se conseguiu ou não representar algo reconhecível, pois é isso que lhe vem sendo cobrado. Assim, acaba por acontecer o distanciamento da questão básica de usar esse desenho como exercício de exploração do mundo que está começando a perceber e do qual esta começando a fazer parte. Ele não acredita em uma relação fixa entre a idade da criança e o estágio de seus desenhos, eles refletiriam, na verdade, as variações individuais em proporção ao seu crescimento artístico. Foi lançada em 2002 a edição brasileira de uma nova versão do livro de Arnheim, reescrita e revista por ele. Encontramos a seguinte opinião do autor referente à questão do ensino da arte: o trabalho da criança não deve ser considerado algo a ser superado o mais


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rápido possível para abrir caminho para uma representação mais qualificada. Cada estágio tem uma justificativa, capacidade de expressão e beleza próprias. Responde a questão tão discutida “Não seria a arte uma daquelas habilidades que se pode ou deve aprender sozinho?” com as seguintes ponderações: até certo ponto essa afirmação seria exata, pois a intervenção desfavorável do professor poderia desorientar o julgamento próprio do aluno e acabar por impedi-lo de descobrir algo que talvez ele próprio teria feito com maior proveito. Mas nesse momento, o professor que oferece gratuitamente a seus alunos recursos de perspectiva é tão culpado quanto o outro que faz a criança preencher com tinta as acrobacias acidentais de seus rabiscos. A expressão espontânea é certamente desejável, mas a expressão se torna caótica quando interfere na organização visual. Arnheim diz que a melhor sugestão seria se valer do fato que todo o ensino deveria se basear em uma consciência de que a concepção visual do estudante está se desenvolvendo de acordo com seus próprios princípios, e que as intervenções do professor devam ser dirigidas pela exigência do processo individual de crescimento em qualquer tempo. (ARNHEIM, 2002, p. 192-196) Em 1962, Arno Stern lança o livro Compreension del arte infantil, trazendo, assim como Arnheim, novas idéias ao cenário do estudo do desenho. Analisando o desenho infantil dentro de ateliê (escolinha de arte), ele fala a respeito de como o adulto deveria se comportar neste meio-ambiente. Nessa estrutura onde tudo se volta para a criança e o estímulo de sua produção, esse espaço oferecido acaba caracterizado como bastante privilegiado, e por isso mesmo já exerce algum tipo de influência. Apesar de concordar com a idéia da livre expressão, coloca que não é possível uma total espontaneidade da criança ao produzir seu desenho, pois o próprio meio, os adultos e as outras crianças invariavelmente estarão por perto, em contato. Apresenta a criança pequena como ser em estado primitivo, sem intencionar criar. Afirma que os rabiscos dos pequenos são uma maneira deles se


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expressarem, que o desenho é “um meio de fixar rapidamente as idéias que se apresentam e se sucedem no espírito” e que “a criança não reproduz lembranças visuais, mas traduz plasticamente sensações e pensamentos” (STERN, 1962, p. 19 apud PILLAR, 1996, p. 35). E que, enquanto está fazendo isso, está criando. Sugere ainda que não se devam estabelecer fases exatamente iguais entre todas as produções de crianças pertencentes a uma mesma faixa etária. Trata dos desenhos como processo evolutivo: etapas que se sobrepõem às quais não atribui denominações específicas. Não seguem uma seqüência rígida e o que realmente importa são os estilos reconhecíveis de cada criança, onde a representação não é tão importante, e sim as formas, os signos e estruturas. Stern distingue várias linhas na evolução da figura do boneco, a primeira tentativa de representação da figura humana do desenho infantil, partindo do círculo e do boneco girino inicial, até chegar progressivamente a uma figuração mais evoluída. Três dessas linhas: 1

O boneco-batata, nascido do girino de quatro membros. FIG. 35 A

2

O boneco-estrada, derivado do girino de dois membros. FIG. 35 B

3

O boneco-flor, que prolonga o girino de um só apêndice. FIG. 35 C


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A)

B)

C)

FIGURA 35 – Evolução da figura do boneco a) Boneco-batata. b) Boneco-estrada. c) Boneco-flor. FONTE - MÈREDIEU,1974, p. 34. (STERN, 1966, p. 7 apud MÈREDIEU, 1974, p. 33) Utiliza o termo "imagem residual", onde o desenho é o fator que origina a evolução, quando a criança passa a desenhar de uma forma mais elaborada, o desenho da fase anterior passa a ser a imagem residual. No desenho dos bonecos, iniciando a partir de um simples círculo munido de tentáculos, ele vai evoluindo para a representação de um corpo que ele próprio vai transformando, e se transforma também em boneco-sino, boneco-casa. “O boneco girino dá origem à imagem residual do sol – o que explica a proliferação de sóis com cabeça humana - do polvo, do leão, da mesa redonda com seus quatro pés deitados”. O desenho evolui nesse momento, de formas simples, círculo, quadrado, triângulo, imagens de abóbora do funil, signos e V, elementos que se combinando geram as diversas figuras do vocabulário infantil, (STERN, 1966, p. 28-31 apud MÈREDIEU, 1974, p. 15) e a arte seria uma maneira de completar a linguagem oral da criança, ainda incompleta. (GOBBI; LEITE, 1999)


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Rhoda Kellogg publica em 1970 o livro Analyzing children´s art, outro importante estudo em que documenta o desenvolvimento da estruturação gráfica da criança, desde os primeiros traços aleatórios até a formação das figuras humanas primitivas. Classificando extensamente essas estruturas nos vários estágios que caracterizou, dá ênfase ao padrão e à organização da percepção. Ao abordar a gênese dessas estruturas do desenho da criança, explica que as formas encontradas evoluem das percepções que elas desenvolvem de seus próprios rabiscos espontaneamente, levando-as a evoluir e organizar esses dados em novas formas. Kellog esquematiza um desenvolvimento global da criança entre os primeiros até por volta dos cinco anos da seguinte forma:

1 A criança pequena inicia a exploração dos diversos tipos de riscos, experimentando vários posicionamentos de seu traços na folha. Utiliza todas as áreas da folha, muitas demonstrando preferências de posicionamento. Além de receber informações visuais de seus traços, sente prazer cinético por meio dos movimentos que realiza com os braços. Kellog classifica as repetições existentes nos desenhos de crianças de todo o mundo como vinte rabiscos básicos: ponto; linha vertical simples; linha horizontal simples; linha diagonal simples; linha curva simples; linha vertical múltipla; linha horizontal múltipla; linha diagonal múltipla; linha curva múltipla; linha fluída aberta; linha fluída envolvente; linha zig-zag ondulada; linha de uma volta simples; linha de voltas múltiplas; linha espiral; círculos superpostos e linhas múltiplas; círculo com linhas múltiplas; linha circular espelhada; círculo simples cruzado e círculo imperfeito.


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FIGURA 36 – Vinte tipos de rabiscos básicos segundo Kellog. FONTE - COX, 1995, p. 17. 2 A criança percebe essas formas como unidades, ou gestalts. Na percepção desses traços, sejam quais forem, ela percebe uma espécie de diagrama emergente, uma forma básica sugerida pela massa de riscos sobrepostos. Passa em seguida a desenhar estes diagramas em posições isoladas, com um traço só e sem sobreposição. Por volta dos três anos a criança, combinado os vinte primeiros rabiscos básicos geram, numa produção espontânea, seis diagramas básicos: círculo ou oval; quadrado ou retângulo; triângulo; cruz; X; formas irregulares.

3 Passam então a pesquisar as combinações dos seus diagramas favoritos, sobrepondoos, contendo uns sobre os outros ou dispondo-os lado a lado. Essas combinações geram outras, os agregados, que possibilitam infinitas possibilidades de junção. São elas as mandalas; sóis; radiais; rostos e figuras solares e figuras humanas. Destacam-se nestas produções, as mandalas, que significam círculo mágico, provavelmente essa preferência se dá pela harmonia e simetria da forma. Nesta linha de raciocínio se encaixa também a produção dos quadrados pelas crianças. É a mandala que estimula a representação de formas circulares como o sol, que possibilita o desenvolvimento rápido da descoberta de formas como símbolos.


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4 Em um último estágio identificam-se quatro estruturas de desenho entre o segundo e o quinto ano de vida das crianças: padrões, figuras, desenho e expressão pictórica.

Kellogg diz que embora o desenho infantil seja considerado espontâneo, a presença da cultura nesse desenvolvimento pode alterá-lo, mas mantêm-se sempre suas estruturas básicas. Kellog pesquisou trezentos mil desenhos de crianças de todo o mundo priorizando os desenhos das crianças entre dois a quatro anos, que segundo ela, após essa idade diminuem sua produção ficando restritas à cópia ensinada e dirigida, inseridas em uma imposição social. Essa atitude verifica-se a partir dos oito anos de idade. Essa pesquisa foi muito importante pela diversidade geográfica e cultural dos pequenos desenhistas. (CAMARGO, 1989, p. 52-54) Em 1971, Dick Field, através do livro Change in Art Education ataca firmemente a metodologia da proposta temática feita às crianças pelos professores. Afirma que a criança não está fazendo arte, mas se utilizando do desenho para explorar o mundo que o rodeia, estabelecendo suas relações dentro dele. Esperar que a criança faça o desenho de alguma coisa e explique o que é, acaba por ter um efeito contrário ao que se espera da teoria da livre expressão, pois ela tem sua atenção mudada para o fato de, se o que faz é reconhecível ou não, e a natureza do seu trabalho se modifica. A criança acabaria por associar sempre a arte a uma atividade escolar, e que as pessoas esperam que ela sempre faça desenhos de coisas. (BARBOSA, 1995, p. 50) Arnheim, Stern, Kellog e Field colaboram com a mudança da abordagem que se fará a partir de agora. Seus questionamentos colocam em cheque algumas das posturas que vinham sendo aceitas, ensinadas e praticadas, e abrem caminho para leituras sobre a questão de desenho infantil como as de Mèredieu, que serão demonstradas a seguir nesta monografia.


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A teoria acerca do desenho da criança ser visto como arte passa a perder força, e mais adequada ao um novo período da história que se inicia, a euforia inicial passa a dar lugar a verificações mais livres de tantas paixões, calcadas em estudos científicos e psicológicos que começam a avançar em velocidade nunca vista. As novas idéias continuam coerentes com o novo mundo que começa a assimilar novas tecnologias, mídias, conhecimentos e conceitos em educação e arte.


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X - O DESENHO DA CRIANÇA POR FLORENCE DE MÈREDIEU

Florence de Mèredieu lança nos Estados Unidos, em 1974, o livro O desenho infantil, onde avalia de modo geral as idéias que vigoravam até então e contribui com novos questionamentos. Mèredieu leva em consideração os estudos dos teóricos da livre expressão, inserindo-os e adequando-os em um novo contexto. O questionamento é importante quando abre espaço para a formulação de novos ângulos de visão e idéias, e é isso que o trabalho de Mèredieu faz. Partindo de uma revisão histórica do período em que a descoberta do desenho infantil se deu, ela nos mostra alguns dos fatores que contribuíram para que o caminho trilhado até então pelos estudiosos em direção à questão se fez como tal estamos verificando. Analisa o cenário da época, como a assunto estava sendo visto e direcionado, e de acordo com os novos resultados científicos acrescentados a ele, mostra que esse cenário estava mudando. Apresenta suas observações quanto à utilização do desenho na área da psicologia e algumas implicações desse uso, se mal direcionado.


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Sua descrição do que seria o desenho para a criança e quais os fatores que desencadeiam sua evolução gráfica mostra que, na verdade, a ato da criança desenhar é o ato de ela interagir com seu mundo, pura e simplesmente, e por isso através desse desenho podese enxergar muito do que a criança é. Comenta que as mudanças ocorridas nas concepções relativas à infância e a evolução e difusão das técnicas gráficas e plásticas devem ser entendidas juntamente com a profunda mutação da arte que começou a acontecer desde o fim do século XIX. Tem-se a partir de então, uma maior facilidade em ter acesso ao próprio suporte do desenho, o papel, que, antes, caro e destinado a usos rentáveis, não estava disponível para o uso da criança. O interesse em torno da arte infantil dá-se juntamente com o crescimento do interesse pela desestruturação de todo um contexto rígido e cheio de formalidades que vigoraram até então. O folclore, o artesanato, a produção dos primitivos e dos doentes mentais, valorizados em função da pureza, espontaneidade e criatividade, nada deviam aos moldes e artes instituídas como corretos e profissionais. Eram trazidos por pessoas estranhas ao mundo da arte. O desejo de voltar ao ponto zero da criação, livre de amarras, era resgatado pela produção infantil, que realmente estava desenhando e pintando pela primeira vez. É nesse, e graças a esse ambiente cultural que se dá a descoberta e valorização do universo plástico e gráfico da criança. E é nesse mundo que nasce o mito, segundo Mèredieu, da espontaneidade infantil. Não vincular a produção gráfica e a visão da criança ao seu meio, ao que ela vive, percebe e a influencia seria um grande erro. Buscar significações e interpretações a todo custo também. Teria havido até então uma supervalorização da exploração das questões psicológicas e psicanalíticas, e outros aspectos, também importantes como os sociológicos e estéticos, ainda não haviam sido abordados e mesmo entendidos como tal.


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Os adultos vinham, na verdade, impondo à criança em suas interpretações e formulações de regras à sua própria imagem da infância. Falar em não influenciar a atividade criadora da criança sob nenhum aspecto seria algo impraticável, pois a criança nasce e se desenvolve no universo adulto, que age sobre a criança, condicionando-a. Mèredieu cita Arno Stern e suas questões referentes à importância maior das formas, signos e estruturas, e não à representação ou o assunto. A criança pequena utiliza-se de um repertório de símbolos gráficos, onde o que importa não é o tema, mas a expressão. Sob as diferentes imagens encontram-se analogias formais, e o tema não passa de um pretexto para a utilização de uma forma. Conforme a criança cresce e toma contato com o mundo, entrando principalmente na idade escolar, aos sete anos, os signos começam a ter significados, que aparecem sob a influência do mundo adulto. Utilizando-se agora do código gráfico universal, a língua e a escrita, o processo de socialização presente transforma também o desenho, que passa de expressivo a comunicativo. Mèredieu complementa que o desenho até pode ser definido enquanto linguagem própria da criança, mas de uma significância própria, com vocabulário e sintaxe exclusivas, ainda desconhecidas na verdade, até então, e que ainda precisam ser alvo de muitos estudos. Relativo ao processo de evolução psicomotora, atenta para o fato de a criança estar em perpétua mutação, passando por constantes etapas de evolução e regressão, e que isso se verifica através não de apenas um desenho isolado, mas de uma série que, para ter validade de interpretação, deve ser avaliada dentro do contexto em que foi elaborada. Questiona a série de etapas de evolução, buscadas e definidas pelos vários especialistas que abordaram o tema. Propõe uma idéia inversa; porque a evolução sucessiva do traço caminhava sempre em direção a um fim determinado, a figuração adequada do real, e não como uma desgestualização sucessiva? Outra questão interessante é sua observação acerca da representação em raios-X e plano deitado que a criança apresenta em seus desenhos.


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Representação situada pelos especialistas na etapa em que a criança desenha aquilo que sabe, misturando diversos pontos de vista, seria talvez, para a criança, a representação da noção que ela tem de viver em um mundo simbiótico, onde as experiências que vivem são múltiplas e indissociáveis dos personagens e objetos que ela vê. Mèridieu seqüencia a evolução do desenho da criança não elaborando etapas, mas abordando aspectos e tópicos. Citando as etapas do rabisco, segundo Bernson, começa a explicar a evolução da criança quando ela começa com o chamado desenho informal. É o borrão, o aglomerado, o rabisco, feito pelo primeiro pelo prazer do gesto e só depois pelo prazer do efeito, conforme outros autores já disseram anteriormente. É um momento decisivo, onde a criança percebe a relação causa-efeito de seu gesto, realizando a partir daí o grafismo voluntário. Rabiscar, borrar, sujar em um primeiro momento por razões instintivas e depois traçar, precisar, progressar os movimentos motores. O aperfeiçoamento motor, as formas que desenha, as primeiras combinações das mesmas, a evolução dos traços circulares sem interrompimento do gesto para as linhas retas verticais e horizontais e quadrados aparecendo por volta dos cinco anos demonstram uma evolução progressiva sobre sua própria atividade gestual. Aparece então o que vinha sendo pré-configurado a partir desses rabiscos, o boneco girino. Combina, enquadra e emoldura as figuras. Depois se solta e as combina novamente, se preparando para o boneco dotado de um corpo e quatro membros. Primeira figura que pode ser lida entre os traçados, é uma projeção no desenho da criança do seu próprio esquema corporal ou a demonstração do antropomorfismo da mentalidade infantil, que anima personagens e objetos, que acabam sendo representados esquematicamente como pessoas, dotados de alguma característica significativa que os distinga.


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Do boneco, signo privilegiado e egocêntrico, se derivam e se formam todas as outras imagens do grafismo infantil. Passando para a etapa do boneco, a criança passa do traço ao signo, distinção e aproximação entre um significado e um significante. O processo de socialização que vem a seguir transforma o desenho de imaginação em desenho de observação. No rabisco, apesar disso, o eu ainda predomina, assimilado ao real, onde a criança procura marcar seu próprio poder sobre os objetos. Principiando o processo de figuração, o rabisco voltado para o eu, narcisista, passa para uma conduta onde a preocupação da criança se volta para a busca da semelhança com o real. O que antes era lúdico passa a ser uma atividade que busca uma porta de acesso ao universo adulto. Descobrindo a possibilidade da representação do real por meio dos signos, a criança passa a narrar e figurar através deles, e raramente utiliza agora a abstração. Perguntando à criança “O que isso?”, o adulto acaba por reforçar ainda mais esse comportamento. Depois dessa etapa, dificilmente a criança utiliza o rabisco. O que antes era utilizado em função do prazer da criança em manejar formas, cores e matérias sem preocupação em figurar, pode ser comparado a uma encenação do corpo exprimindo-se e soltando-se, dinamicamente. Mèredieu lembra a questão da visão de espaço, que vem sendo imposto à criança como o adulto o vê e como as teorias que vêm desde a Renascença o concebem. A criança o experimenta de modo diferente, imaginário, existencial aberto e constituído pelo corpo. O espaço gráfico, precedido por outros, é um espaço representativo para a criança, de onde se origina o figurativo e que sempre está atrasado em relação ao perceptivo. O desenho não resulta de uma simples transferência do espaço perceptivo, ela o cria e o interpreta. A criança atribui grandeza afetiva aos objetos.


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Suas elaborações de um espaço coerente se formam ao mesmo tempo em que a construção da narração dos objetos. A visão infantil é caleidoscópica e simultânea. Constituir esse espaço gráfico é uma conquista que se estende entre a representação do objeto e do espaço, o rabisco se modifica. Há um momento em que o espaço não mais se confunde com o objeto, se torna meio, suporte, a criança passa a dominá-lo. Aparecem algumas características na representação desse espaço, o plano deitado, a transparência, a sobreposição e o escalonamento dos planos. O espaço topológico constitui o único espaço graficamente acessível, até os oito ou nove, quando a criança começa a obter as noções de mecanismos euclidianos, grandeza e forma. Aparecem muito nesta fase as inclusões de figuras dentro de outras, até haver a dissociação continente-conteúdo com as percepções de continuidade-descontinuidade, vizinhança, separação, envolvimento. Entre os espaços topológicos mais representados encontra-se a casa, onde ela vive o espaço. E nela a criança projeta angústias e sensações do próprio corpo. A forma com que a criança representa a casa às vezes se apresenta como uma evocação da casa dos seus sonhos, radicalmente diferentes de seu habitat natural. São expressas aí as suas relações afetivas. Mèridieu cita que Piaget distingue três fases na evolução do espaço:

1 Na incapacidade sintética, ou realismo fortuito segundo Luquet, a criança ignora completamente relações projetivas, euclidianas, de profundidade. Relações topológicas elementares começam a se organizar, e inacabadas, respeitam certa relação de vizinhança entre as figuras, embora apresentem certas falhas quando representam figuras mais complexas, ocorrendo justaposição entre figuras contínuas e, por exemplo, representação de olhos fora do rosto e móveis fora da casa.


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2 No realismo intelectual, fase que ocorre de oito a dez anos, apresentam-se relações topológicas. Entram em conflito as noções desse espaço topológico com o perspectivo que está começando a se formar, aparece aí a transparência do ponto de vista topológico que não entra em conformidade com o espaço perspectivo. A criança utiliza o plano deitado. Não há coordenação entre os elementos dispostos na cena. Quando começam a aparecer, dizem respeito à alguns pormenores. O que irá permitir adiante a figuração da perspectiva será a apreensão de uma relação entre o sujeito e o objeto observado.

3 No realismo visual, que começa a aparecer entre os oito e nove anos, a criança passa a se preocupar com distâncias, proporções e pontos de vista.

Mèredieu questiona se o aparecimento da perspectiva é uma etapa realmente da evolução do desenho ou um resultado de um condicionamento sócio-educativo da civilização ocidental. Sobre os estudos psicológicos do desenho, Mèridieu levanta dúvidas e questões muito pertinentes; a utilização de fórmulas para a leitura da disposição de traços, linhas, formas, distribuições de espaços, escolhas de cores, repetições de motivos ou ausência deles. Tudo parece muito simplista e contestável e esses elementos só poderão ser lidos com maior precisão se colocados e avaliados dentro do contexto desenho-autor-meio, no campo de suas tensões e oposições formais, interiores e sociais. Entre as distinções sensoriais e racionais oscilam as produções infantis, dois pólos do psiquismo que não podem ser utilizados de maneira rígida, sem considerar suas transições.


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Sobre o desenho como instrumento de diagnóstico para testes de inteligência e personalidade, Mèridieu cita os testes de Goodnough, da Casa (por F. Minkouska) e da Família. Concorda que o desenho realmente reflete as inibições, os distúrbios de inteligência e comportamento da criança, e que utilizá-lo como método de projeção é válido. Mas critica as abordagens preocupadas em classificar e reduzir por assimilação com tipos, mais do que compreender, fabricados pelo adulto. Utilizado como a ferramenta de apoio no tratamento psicanalítico, Mèridieu cita o fato de que Freud, no começo da psicanálise só se utilizou o desenho uma vez. Sem metodologia, como parte de uma análise dos sonhos e das angústias expressadas pela criança. Não era ferramenta principal, era apoio. Freud se mantém reticente quanto à aplicação de tratamento analítico às crianças. Quem, segundo ela, fundamenta métodos e estatutos à psicanálise infantil é Mélanie Klein. (KLEIN, 1968, p. 173 apud MÈREDIEU, 1974, p. 73) Utilizado por Klein junto com as atividades de brincar, a expressão gráfica e plástica adquirem caráter lúdico, dentro de uma teoria de expressão figurativa. Sophie Morgenstern, (MORGENSTERN, 1937, p. 73 apud MÈREDIEU, 1974, p. 75) psicóloga francesa, conclui através de estudo que é o inconsciente que preside a elaboração do desenho, que apresenta analogias incontestáveis com o sonho, onde encontram a mesma simbologia no desenho. Dolto (DOLTO, 1939, p. 153 apud MÈREDIEU, 1974, p. 77) afirma que através do desenho é possível entrar no cerne das representações imaginativas da criança. Afetividade, comportamento interior e simbolismo são mais bem compreendidos através do desenho que serve de orientação para as conversas com as crianças. Esses analistas insistem no parentesco profundo entre o desenho e o sonho, identidades parecidas, de estruturas e de função; há uma dramatização, condensação e


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deslocamento envolvendo o processo. A expressão gráfica e o sonho se complementam e na ação conjugada dos três processos atribuídos a eles mostra que há símbolos que podem ser decifrados mutuamente. Mais uma vez, relativo a esse tipo de teoria, Mèridieu atenta para necessidade de contextualização das interpretações. Contestando o que chama de mito de espontaneidade infantil, muito defendida por autores que ditaram os conceitos da época anterior, como Lowenfeld e Read, Mèridieu expõe sua visão sobre esse assunto afirmando ser realmente impossível acreditar em uma expressão pura e espontânea. O grau de sensibilidade das crianças às influências exteriores varia em função da idade, e embora enquanto pequena possa escapar delas, logo ela se encontrará integrada em um universo amplo de informações e estereótipos sociais profundos. Ela irá comportar em sua conduta e também na sua produção gráfica os clichês e imagens emprestadas. Há uma dificuldade muito grande em se manter os métodos de expressão livre no contexto em que a criança está inserida. Acaba por acontecer, após a entrada da criança na escola, uma imposição de símbolos que a própria escola traz, devidamente classificados: flor, árvore, passarinho, casa. São os códigos que ela passa a incorporar. Os temas se empobrecem e tudo o que não entra nesses padrões simbólicos são apontados como desvio, inquietante signo que aparece ali por algum motivo. Em contrapartida à uma proposta inicial de liberdade, acaba acontecendo uma verdadeira limitação. Mèridieu critica os ateliês de desenho (ou escolinhas de arte, como chamado no Brasil) instituídos mundo afora a partir das idéias da livre expressão. Reconhece a proposta de libertar a criança, liberá-la da influência social e familiar, reduzir ao máximo as intervenções do adulto, para que possa se expressar livremente, mas o define como um método que se a princípio pareceu generoso, revelou-se ambíguo e mal definido. Não adianta oferecer à criança uma liberdade na produção artística se ela, habituada com métodos de educação


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tradicional não suporta a proposta. Insiste que é impossível preservar a criança longe das influências, o que fatalmente se dá. Verifica o sucesso do ateliê se faz de acordo com as questões reativas à maneira pessoal que o professor o dirige e das particularidades do próprio grupo constituído pelas crianças. Escrito em 1974, o livro de Mèridieu aborda novos fatores que anteriormente não faziam parte do mundo das crianças, publicidade, cinema, televisão, revistas em quadrinhos. Esses novos fatores são agora parte do que a criança acaba expressando graficamente. Essa influência de uma mídia que passa a fazer parte criativa do dia-a-dia da criança faz com que ela mude os signos. Os temas Papai Noel, Páscoa, datas patrióticas retornam ciclicamente aos temas abordados no desenho, e eles são enxertados nos elementos do repertório infantil. Testemunhando sua época, o desenho torna-se um eco dos acontecimentos. A vida social e política que a criança percebe a seu redor são expressas em seu grafismo, onde utiliza um conjunto de estereótipos culturais, profundamente marcados pela ideologia da classe social e do país a que ela pertence. Mèridieu conclui dizendo que para se compreender a “civilização infantil”, seria preciso “limpar as portas da percepção, liberar-nos deste saber livresco e esclerosado que mascara a estrutura do novo mundo onde já vivemos”. (PIERRE-YVES, p. 508-509 apud MÈREDIEU, 1974, p. 111) A análise de Mèredieu é extremamente válida para o processo do desenvolvimento do estudo do desenho infantil, pois ela, com sua análise crítica, abre portas para novas discussões e conclusões. Apontando a teoria da livre expressão como mito, ela dispara abertamente contra as idéias instituídas até então, e lança novas luzes à questão. Mostra que, realmente, é impossível desassociar criança-cultura, e que sua produção é influenciada pelo meio e pelas expectativas desse meio em relação ao produto gráfico infantil.


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Isso nos leva a considerar o fato de que o adulto precisa aprender a compreender melhor o universo infantil. Escolhida para ser a segunda obra mais atentamente abordada nesta monografia, Mèredieu, em toda a bibliografia analisada, seria um divisor de águas entre dois períodos. Ela está situada entre o antes e depois do início dos questionamentos sobre a teoria da livre expressão.


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XI - ABORDAGENS ATUAIS

Nos anos 80 do século XX, podemos encontrar um número incrivelmente grande de pessoas envolvidas em estudar e investigar as mais diversas questões referentes ao conhecimento humano, em comparação às décadas anteriores. Com a instituição da era da informação e uma maior democratização do estudo científico, fica mais difícil citar um estudioso que revolucione ou contribua decisivamente para a elaboração de uma teoria. Nesse momento, buscar identificar individualmente os estudiosos torna-se uma tarefa impossível, pois são agora muitos os responsáveis pelas verificações e colaborações às novas descobertas acerca de um assunto. No Brasil, referente ao estudo de desenho infantil, destacam-se muitos nomes, assim como em todo o mundo. As abordagens que poderiam ser feitas a partir desse ponto são tão diversas que se bifurcariam em incontáveis pesquisas. Os fatores que são agregados agora ao desenvolvimento infantil levantam inúmeras questões a se investigar. Como essa monografia se propõe a uma investigação ampla e histórica das abordagens acerca do tema O


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desenho da criança, e começou sua busca em um âmbito internacional, ela abordará nesses capítulos finais ainda as colaborações vindas dos Estados Unidos e Europa. É importante registrar que a amplitude do assunto alcança campos maiores a partir dos anos 70, e que em nosso país podemos encontrar ricas e pertinentes contribuições feitas por pesquisadores, professores e psicólogos como Ana Mae Barbosa, Analice Dutra Pillar, Edith Derdik, Lucia Reily, Maria Fusari, Maria Heloisa Ferraz, Fayga Ostrower, Ana Albano Moreira, Maria da Graça Azenha, e tantos outros. Internacionalmente, colaborações aos atuais posicionamentos científicos quanto ao desenho da criança e suas vertentes são feitas por estudiosos como Marjorie e Brent Wilson, Jaqueline Goodnow, Howard e Beatrice Gardner, Norman Freeman, Ernest Gombrich, Pierre Francastel, Sofia Morazova, Maureen Cox, nomes também entre uma infinidade de outros pesquisadores. Howard Gardner é um pesquisador americano que nos dias de hoje tem exercido muita influência nos estudos acerca da inteligência. Gardner apresenta novas conclusões em sua teoria sobre as capacidades humanas, partindo do princípio que a inteligência é complexa demais para que os testes escolares comuns sejam capazes de medi-la. A base desses testes se fundamenta na idéia tradicional de que a inteligência é uma só e varia de nível de pessoa para pessoa. Gardner se contrapõe a isso, afirmando que há diferenças entre os tipos de inteligência. Em 1983, no livro Estruturas da Mente, ele definiu sete inteligências: 1) lógicomatemática, 2) lingüística, 3) espacial, 4) corporal-cinestésica, 5) interpessoal, 6) intrapessoal, 7) musical. Em uma obra mais recente, Inteligência, um conceito reformulado, Gardner, diz que a inteligência deve ser abordada conceitualmente, sem que se inclua todas as faculdades humanas, ou abarque somente as especificidades. Ele descreve mais quatro novas possíveis


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inteligências: 1) naturalista, 2) espiritual, 3) existencial, 4) moral. (GARDNER, 1999, p. 78 apud FOLIO, 2000) Gardner, através de um estudo minucioso contribui com os conhecimentos acerca da produção infantil, apresentando as seguintes conclusões referentes as etapas:

1

A fase pré-operacional de Piaget pode ser classificada em ondas de simbolização,

onde na primeira, entre os dezoito meses e dois anos, a criança capta símbolos, sendo capaz de entender a existência de eventos, ações e objetos. 2

A onda de mapeamento topológico, ocorre durante os três anos, quando a criança

entende relações de tamanho e formas advindas do símbolo que ela visualiza, por exemplo, dois círculos encostados um ao outro, podem representar uma cabeça e um corpo. 3

Com cerca de quatro anos, ocorre a terceira onda, o mapeamento digital, quando a

aptidão da criança caracteriza-se por captar quantidades e números com relativa precisão, ativa a percepção das relações espaciais, e lógico-matemáticas. 4

Em torno dos cinco, seis ou sete anos, as crianças são capazes de desenhar símbolos

que representam as lembranças de momentos passados, ou de alguém, o que seria a onda final de simbolização. (GARDNER, 1994, p. 68-69 apud FOLIO, 2000)

Em As artes e o desenvolvimento humano, dedica um capítulo à criança pequena como artista. Para Gardner, há noções ou sensos que já se encontram presentes na criança pequena: ela já aprecia e compreende as mensagens transmitidas pelos objetos de arte; há senso de ritmo e harmonia, necessitando de um pouco de refinamento. A criança de cinco anos já é capaz de “experienciar sentimentos quando contempla objetos simbólicos e de apreciar a linha entre realidade e ilusão” (1997, p. 180). Posteriormente atingirá o grau de jovem artista e jovem executor, tendo então desenvolvido muito de seu potencial artístico por


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ter entrado em contato com estas produções da humanidade. Quanto a isto, sobretudo os bem pequenos, imprimem em suas produções grande parte de sua personalidade, o que para Gardner, permite-nos conhecê-las melhor. O desenho surge aí como uma das linguagens, assim como as pinturas, para análises do desenvolvimento e da personalidade infantil. Segundo pesquisas de Gardner, a criança ao iniciar o ensino formal - por volta dos sete anos - trás consigo rigorosos cerceamentos, tanto neurobiológicos como convicções sobre as coisas e seu funcionamento, preconceitos e estereótipos poderosos. Já nessa idade a criança assimilou valores e metas de sua cultura. Neste contexto, a história da arte de todas as culturas em geral e a arte do nosso século em especial, oferecem-se como instrumento poderoso para um entendimento mais diversificado da realidade multicultural. Permitem à criança se familiarizar com modelos inexistentes em geral em seu ambiente doméstico, particularmente no de famílias de baixa renda. (GOBBI; LEITE, 1999) Gardner é um dos estudiosos que dirigem o Projeto Zero, um grupo de pesquisa da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Uma das questões estudadas nesse projeto é a idéia que as atividades artísticas são vistas como ocasiões para atividades mentais. A pessoa/ criança que transita pela arte teria condições de desenvolver suas capacidades cognitivas da mesma maneira que aquela estimulada pela ciência e pela matemática. Baseado nisso, no livro Inteligências Múltiplas, Gardner chama a atenção para algumas questões importantes referentes à educação artística da criança.

1 Afirma que abaixo dos dez anos, as atividades de produção das crianças devem ser centrais em qualquer forma de arte. Ativamente envolvidas no assunto, aprendem melhor. As crianças que demonstrarem talento para perceberem os componentes ou padrões de um objeto artístico devem ter a oportunidade de descobrirem isso


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sozinhas, o que Gardner observa ser um legado da teoria de Lowenfeld, sendo utilizado em uma época mais disciplinar. 2 Atividades perceptivas, históricas, críticas ou periartísticas devem estar estreitamente relacionadas e mesmo emergirem da própria produção da criança. 3 Os professores envolvidos nas aulas de arte necessitam possuir profundos conhecimentos para que possam não apenas introduzir os conteúdos através da linguagem ou da lógica, mas também através de seu pensar. 4 Motivar, envolver e encorajar o aluno a aprender arte através de projetos significativos, dentro de períodos significativos de tempo, onde possa haver desdobramentos em discussões e reflexões. 5 Expor a criança continuamente a vários níveis desenvolvimentais, conceitos nucleares como estilo, composição ou gênero e problemas recorrentes como executar uma passagem musical com sentimento ou criar uma imagem artística poderosa. Isso desenvolvido dentro de um currículo seqüencial no sentido de revisitar os conceitos e problemáticas de maneira gradativamente mais sofisticada. 6 Avaliar respeitando as inteligências específicas envolvidas, partindo de que a aprendizagem artística não se refere meramente ao domínio de habilidades ou conceitos. Os alunos precisam perceber que sua reflexão pessoal é respeitada. 7 Trazer para os alunos a compreensão de que as artes estão permeadas por questões de gosto e valor. Questões que importam para aqueles que se envolverão seriamente com as artes, e que trazidas a eles de maneira não autoritária ou impositiva, estejam sempre abertas à discussões e pontos de vista diferenciados. 8 Gardner coloca que a educação artística é importante demais para ser deixada a cargo de apenas um grupo, sendo na verdade um empreendimento cooperativo onde é necessário o envolvimento de toda a comunidade escolar.


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9 E que por fim, apesar de que, em termos ideais, todas as formas de arte devessem ser estudadas pelos alunos, isso em função do tempo seria impossível. Então, a proposta de que pelo menos uma fosse desenvolvida de forma mais ampla, podendo ser a visual, a musical, corporal ou dramática. Pois seria melhor para o aluno poder saber o que é pensar em alguma forma de arte e optar por assimilar as outras adiante do que conhecer todas superficialmente sem que nenhuma contribua para sua formação consistentemente.

Desses conceitos, nasceu em 1985 a proposta do ARTS PROPEL9, que busca desenvolver uma série de instrumentos de avaliação que pudesse documentar a aprendizagem artística durante o período final dos anos elementares e no segundo grau. Em paralelo, foram desenvolvidas também propostas e módulos curriculares para serem vinculados aos instrumentos de avaliação. Eram os projetos de domínio, uma série de exercícios, com elementos perceptivos, produtivos e reflexivos para cada área artística. O ARTS PROPEL se tornou um programa educativo e atualmente tem sido testado e utilizado não só nos Estados Unidos como fora dele. (GARDNER, 1995, p. 122-133). A tendência para abordagens que levam em conta as capacidades individuais, com as classificações generalistas cada vez sendo menos utilizadas, se faz muito presente nos dias de hoje. Gardner, com seus estudos, está influenciando bastante o pensar sobre os processos cognitivos humanos, e as colaborações de estudiosos em educação estão cada vez mais presentes junto ao estudo do desenho infantil, pois a expressão da criança através do que ela desenha, sua expressão artística, vem sendo considerada tão importante quanto a matemática ou a lingüística. Isso pelo menos no campo científico. A assimilação dessas idéias e sua prática é algo que ainda está por acontecer. 9

Propel significa propelir, impelir, impulsionar.


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O trabalho de pesquisa desta monografia cita não somente estudiosos ligados ao estudo específico do desenho, mas também estudiosos da educação com Piaget e Gardner. Isso é necessário porque, inegavelmente, quem estuda o desenvolvimento da criança não pode deixar de lado o aspecto de sua linguagem gráfica. Sempre que alguém se propõe a estudar a criança e seus mecanismos de interação, assimilação do mundo e desenvolvimentos mentais, nota e leva em consideração que o desenho se faz presente como valiosa colaboração ao entendimento do que a criança é. Gardner é um exemplo disso. Suas propostas quanto à maneira da arte ser ensinada a criança e de como o sistema teria que se preparar para que isso efetivamente aconteça é um reflexo das tendências da educação na atualidade.Valorizando a arte tanto quanto a ciência e a matemática, vemos através da proposta de sua proposta que, um ensino direcionado a capacitar o aluno a pensar, analisar, criar mecanismos próprios de avaliação através do contato e interação com o conhecimento, poderá contribuir muito para a formação do indivíduo em todos os aspectos. Apesar de dizer que a criança que apresenta o talento para o desenho, o chamado dom, para perceber mais facilmente a arte e seus mecanismos, deve ter a oportunidade de descobrir algumas habilidades sozinhas, deixa claro que, há a necessidade sim, de que ela tome contato com o conhecimento formalizado. Gardner não levanta questões específicas sobre a produção gráfica da criança, como a maioria dos autores abordados nesta monografia, mas suas opiniões são importantes para entendermos que, de acordo com a postura que tomamos sobre a maneira com que direcionamos o contato da criança com a arte depende de muita preparação e busca de um conhecimento por parte do próprio adulto, que deve ter consciência da importância do desenvolvimento dessa capacidade e saber como facilitar o acesso da criança à esse conhecimento. O adulto tem influência direta nesse processo.


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XII – O DESENHO DA CRIANÇA POR MAUREEN COX

O tempo que uma idéia leva para ser assimilada e entendida hoje é menor do que há cinqüenta anos atrás. A facilidade de acesso à informação facilita a circulação dessas idéias, embora ainda seja muito difícil quebrar paradigmas estabelecidos. Os estudiosos da educação de hoje falam em desenvolvimento de competências, que é a faculdade de mobilizar diversos recursos cognitivos (saberes, capacidades, informações, etc) para a solução de uma série de situações. (PERRENOU apud NOVA ESCOLA, 2002, p. 21) Criticam a fragmentação feita pela escola do currículo escola, onde a divisão do saber em áreas acaba priorizando certos conteúdos. E para que isso seja modificado, defendem uma integração entre os saberes, que devem ser vistos de uma maneira global e interligados, favorecendo uma melhor contextualização sobre o que é ensinado formalmente e a vida. (MORIN apud NOVA ESCOLA, 2002, p. 22) Propõe currículos que contemplem os temas transversalmente, que devem estar presentes em todas as disciplinas e séries. (COLL apud NOVA ESCOLA, 2002, p. 21) Atentam para a necessidade de um maior respeito às características sociais e culturais de cada um e da necessidade de desenvolvimento


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das capacidades críticas e de interação maior com o mundo. (TORO apud NOVA ESCOLA, 2002, p. 21) O mundo está mudando sua visão de si mesmo e hoje, a criança toma contato com ele de maneira mais direta e precoce que há anos atrás. Há uma aceleração do processo de conscientização da criança sobre as pessoas e seu meio, e isso, com certeza pode-se verificar na sua expressão e desenvolvimento gráfico. A análise do desenho infantil e suas implicações atuais são trazidas a esta monografia pelo trabalho de uma psicóloga americana. Escrito em 1995, este O desenho da criança, de Maureen Cox, autora de uma vasta bibliografia que aborda a representação gráfica atualmente, é o último dos três livros referentes ao desenho infantil que será abordado neste trabalho de pesquisa. Através de seu livro tomaremos contato com as mais recentes abordagens feitas sobre o desenho infantil nos anos 80 e 90. Autores que se destacaram nesses estudos são as ferramentas de apoio utilizadas por Cox para nos apresentar novas abordagens sobre o tema, onde ela, em combate direto frente à proposta de liberdade que dominou e ainda domina o ensino, e a visão que o adulto tem do papel do desenho, nos mostra sua opinião de que a educação artística da criança deve ser norteada pela busca do desenvolvimento criativo sim, mas através de um ensino formalizado, onde a proposta se baseie em auxiliá-lo a conquistar essa criatividade através do domínio de uma habilidade técnica, passada à criança pelos seus pais e professores. Primeiramente situando o assunto em sua perspectiva histórica, cita como principiou o interesse e os estudos formais a partir das teorias de Rousseau. Analisa os motivos os quais influenciaram a atual visão dos adultos, pais e professores em relação ao desenho infantil.


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Cox, assim como Méredieu, não se prende a fases rígidas do desenvolvimento do traço infantil, mas analisa detalhadamente todo o processo, questionando conclusões anteriores e citando pesquisas que comprovam suas observações. Faz sua análise da utilização do desenho como instrumento na área de psicologia. Apresenta o trabalho de pessoas que já estão utilizando as novas propostas que surgem em como direcionar o aprendizado do desenho pela criança na atualidade. Ela inicia o livro comentando o fato de a maioria das crianças pequenas demonstrarem prazer e interesse em desenhar, e que isso é utilizado em sala de aula pelos professores, que acreditam que a atividade artística é parte importante do desenvolvimento infantil. Observa que as crianças se preocupam muito com o fato de conseguirem desenhar objetos identificáveis, agrupando esses objetos na página de forma ousada e decorativa, não se importando com proporções anatômicas. Essas representações não precisam de ensino formal, são adquiridas ou inventadas. A criança desenvolve um jeito próprio de desenhar uma variedade de objetos comuns, com um tipo de esquema ou fórmula para cada objeto, formando aí um repertório razoavelmente grande, que compõe os desenhos tão característicos da criança. No fim da infância, entretanto, a criança toma parte de um processo em que há uma grande relutância em desenhar, e quando o faz, tenta meticulosamente elaborar imagens, usando régua e borracha. O adulto então, se solicitado a desenhar, se esquivará, e se o fizer, o que se apresentará é uma notada falta de habilidade, o que não seria concebível se essa falta de competência se aplicasse a outros aspectos, como ler, escrever ou fazer contas. Mas não há problema neste fato, ele pode viver muito bem sem desenhar. Como muitos autores afirmaram anteriormente, Cox atribui isso ao fato da necessidade que a criança começa a apresentar, aos oito ou nove anos, a necessidade de representar não somente desenhos identificáveis, mas também visualmente realistas. Donas agora de uma autocrítica e expectativas extremamente


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grandes e fortes, se não conseguirem serem bem sucedidas em suas aspirações, o desenho fica relegado a segundo plano. O importante, o objetivo, é conseguir fazer ficar parecido, desenhar a partir do que se vê ao vivo. Para atender a essa necessidade que a criança passa a expressar, é necessário ensinar a ela de maneira mais estruturada as técnicas necessárias para atingir tais construções. Geralmente, elas não recebem o auxílio que precisam, e ficando sem poder atender seus próprios padrões, agora exigentes, que impõe a si mesmas, acabam por concluir que não sabem desenhar, se tornando enfim, um adulto que não sabe desenhar. Cox coloca as razões pelas quais a criança não recebe essa informação formalizada que solicita. Pais e professores, também inábeis, não se interessam ou possuem confiança necessárias para ajudá-las. Muitos consideram a habilidade artística um dom, que definitivamente se possui ou não. O ensino deve ser oferecido do apenas a essas crianças, ainda em fases posteriores, afinal elas são promessas artísticas e nesse caso, vale investir nelas. Outro fator seria o fato de a sociedade ocidental não considerar importante para pessoas comuns a capacidade da representação realista. Cox cita que em outras sociedades isso não acontece. Na chinesa as crianças ainda bem pequenas apresentam desenhos bem sofisticados. No Reino Unido até a segunda guerra mundial o ensino formal do desenho ocorria no currículo básico escolar. Este cenário se fez pela divulgação da crença, já citada anteriormente, da necessidade de oferecer à criança a oportunidade da auto-expressão, não sendo direito a interferência ou direcionamento realizada pelo professor. A necessidade do desenvolvimento criativo da criança exigiria total ausência de envolvimento do adulto no processo de criação da criança. Cox critica essa postura adotada até hoje pelo sistema educacional, questionando porque não se adota essa mesma postura a outras matérias como línguas ou música. Atenta para o fato de que as artes oferecem, sim, uma oportunidade para as crianças inventarem e experimentarem suas próprias idéias, o desenvolvimento de uma genuína criatividade. Mas,


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por outro lado diz ser importante, em determinado momento, um direcionamento, o que parece ser totalmente condenável até hoje. O que se verifica realmente, é que o processo estagna, e que desenhar não é uma simples questão de auto-expressão espontânea, mas há uma necessidade do aprendizado e assimilação de habilidades e técnicas básicas. Nos primeiros anos é possível aprender com pouco ou nenhum ensino formal, mas quando a idéia do que constitui o desenho, para a criança entrando na adolescência, não se conclui, ela passa a acreditar que é incapaz, e o interesse é abandonado por completo. Cox define, ao longo do livro, baseado em conceitos e observações feitas através de muita pesquisa, tanto desenvolvidas por ela, quanto por outros estudiosos, como começa o processo de descobrimento dos traços e adiante como se chega à produção da representação dos objetos reais. Cox utiliza como exemplo constante a observação que faz do processo de desenvolvimento de sua filha, Amy. Começando pelo rabisco da criança, Cox cita o conceito elaborado por Bender (1938), e que se firmou como realidade por muitos anos de que o prazer da criança em rabiscar provinha unicamente dos movimentos rítmicos do braço, sem que a aparência dos traços importassem para a criança. Ela discorda citando Gibson, (1969) que em pesquisa afirma que os traços são importantes, e que se a criança receber um objeto parecido com um lápis, mas que não deixe marcas, ela perde rapidamente o interesse pela atividade toda. Não parece, entretanto, preocupada em preservar seu trabalho, e cobre traços anteriores rabiscando sobre eles. A criança produz traços ondulados e parece meio que surpresa com eles, o que demonstra que de início não foram intencionais. Vai com a prática desenvolvendo controle para manter esses rabiscos dentro dos limites do papel. O que antes eram traços largos,


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abrangentes, se tornam mais controlados. Ela gradualmente o controla, buscando dominar determinadas formas. Cox cita os estudos de Kellog (1970), sua identificação dos vinte tipos de rabiscos básicos da formação dos diagramas, combinações e conjuntos e sua progressão até chegar a figurar a partir deles a primeira construção das figuras humanas e dos que se seguem a partir deles. A contestando, no entanto, baseia-se nas observações de outra estudiosa, Claire Golomb (1981). Apesar dessas idéias de componentes no desenho apresentadas por Kellog pareça oportuna e convincente, identificam-se problemas. Nem todas as crianças apresentam essas várias formas intermediárias. Elas muitas vezes produzem rabiscos básicos até fazerem os desenhos figurativos. Colomb verifica em estudos que apenas 4% de um universo de 250 crianças entre cinco e oito anos pesquisadas apresentaram os rabiscos e os diagramas. O que para Kellog parecia simples e óbvio, não se apresentava tão esquematizado assim. Golomb concorda em uma representação mais amplamente utilizada pelas crianças em duas das categorias de rabiscos apresentados por Kellog: os redemoinhos, laços e círculos e as múltiplas linhas paralelas, dispostas densamente. Reforçam a opinião de que não há a necessidade de se passar por uma elaborada fase de rabiscos até se chegar à fase mais figurativa, pesquisas realizadas por Alland (1983), Gardner (1980), Millar (1975), Morris (1967) Allend e Beatrice Gardner (1978). Dannie Wolf e Martha Danes Pery (1988) descrevem as primeiras representações, como representações baseadas em um objeto, destinadas a representar relações e acontecimentos do mundo real. É um simbolismo não convencional. Em seguida aparece uma representação gestual, segundo Wolf e Reny ou representação da ação. (MATTHEWS, 1984, 1989, 1991) Isso se dá por volta do segundo ano de vida, onde elas interagem com o que representam, saltitando uma caneta hidrográfica


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pela folha, dizendo coelhinho e criando uma trilha de pegadas pontilhadas, ou fazendo um zumbido, enquanto traça várias voltas pela página. Por volta de vinte meses, as crianças começam a fazer traços para representarem um objeto inteiro ou uma pessoa. Alguns nomeiam essas representações, antes ou depois de executá-las, mas não há semelhança perceptível pelo adulto em relação com o objeto real. Talvez elas os nomeiem simplesmente por imitação do comportamento adulto. Não sabem como construir a figura, mas captam a idéia que pode nomeá-las. Captam também vários aspectos nesse negócio de fazer desenhos. Sabem que cada parte de um objeto pode ter seu próprio traço ou forma. Adquirem boas noções de como as formas podem ser dispostas na página, apesar de terem certa dificuldade de organizar esse conhecimento espacial. Cox sugere que nesse momento, o adulto passe a ajudá-los a lembrar onde e que partes precisam colocar como forma de explorar um conhecimento latente. Às vezes, neste período, elas notam em seus rabiscos espontâneos uma semelhança casual com algo que elas conhecem. Elas não intencionam desenhar algo a princípio, mas depois de fazê-lo, reinterpretam e acabam revelando aí um novo significado. Em seguida, em um outro momento, elas desenham por acaso uma forma básica de um pássaro, e reconhecendo depois, a possibilidade, ela intencionalmente lhe acrescenta suas outras partes. Esse é o período realismo fortuito, segundo a classificação já conhecida de Luquet. Cox sugere que o adulto incentive a criança nesse período, induzindo-a a descobrir semelhanças entre as formas que produz e os objetos reais. Assim, a partir daí, a criança passa a desenhar essa semelhança intencionalmente. Ela exercitará agora, os tipos de linhas e formas para utilizar nos novos objetos a serem desenhados. A busca de uma semelhança visual se relaciona com o movimento do objeto ou sua função. A forma desenhada não é mais um símbolo arbitrário. As crianças estão empenhadas em resolver como fazer os traços no papel de modo que possamos reconhecer


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seu significado. Cox cita Jacqueline Goodnow (1977) que chama esse processo de busca de equivalentes. Quando começam a fazer os desenhos figurativos, elas não abandonam definitivamente os rabiscos. Elas retrocedem e avançam várias vezes, pois a produção de uma forma figurativa é algo que exige muito esforço. E ela se utiliza dos rabiscos vez ou outra tanto para se distrair, experimentar e desenvolver novas maneiras de usar linhas ou retomar a satisfação de fazer algo que já domina bem, como compensação do esforço que ainda há por vir na tarefa de tentar figurar. Antes de abordar as primeiras formas reconhecíveis, que no caso são referentes à figura humana, Cox trata das linhas. Nessa transição de rabiscos para figuração, se deparando com o fato de como usar as linhas e formas que ela já domina para criar semelhança com os objetos reais, surgem os mesmos esquemas ou unidade gráfica. (GOODNOW, 1977) As crianças fazem uso das regiões, nome dado por Joelm Willats (1985-1987) a uma área englobada por uma linha e das linhas, buscando nessas duas representações desenhar partes. Essas regiões se encompridam e as linhas únicas passar a serem reservadas para elementos como fios de cabelo. Usam também os pontos. O contorno oclusivo, termo utilizado por David Mar em 1977, denota o limite externo do círculo (as bolas) desenhado sobre o fundo. A região englobada pela linha representa a superfície do círculo (ou bola). Para a criança essa linha circular representa toda a superfície da bola, mas o espaço dentro da linha representa o interior da bola. A criança quando aprende a modificar a forma das regiões, passam a usá-las onde forem adequadas, em lugar de linhas únicas, mas a princípio essas regiões são usadas para representar todo o volume do objeto, e somente mais tarde, ela as utiliza para representar alguma parte ou o total da sua área externa; somente em um terceiro momento a região começará a ser usada como


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contorno oclusivo, mostrando apenas a parte da superfície do objeto que pode ser vista a partir de determinado ângulo de observação. Segundo conclusões de Emiel Reith (1988) essas relações de construção do espaço ainda são muito confusas para a criança, e a compreensão das linhas oclusivas e a capacidade de usá-las são muito raras até oito ou nove anos. Esse desenvolvimento do uso da linha como contorno oclusivo é o que capacita a criança a representar objetos em termos de realidade virtual captada com os olhos, passo essencial para o desenho realista. Os primeiros desenhos da figura humana surgem por volta dos três anos e se mantém como um dos temas preferidos da criança até os dez anos em média. Começam desenhando as figuras de girino ou cefalópodes. Neste princípio, os estudiosos não chegaram a uma conclusão se, a linha única que envolve uma área aproximadamente circular, o corpo, tem em si representada somente cabeça ou se o tronco está ali presente. Cox concorda com a teoria de Goodnow (1977), de que a barriga é colocada pela criança simplesmente na parte que seja mais longa, o círculo ou as pernas. Quando a criança passa a representar com mais freqüência a figura onde o círculo representa apenas a cabeça e os detalhes, como barriga e braços ficam mais deslocados para baixo, segundo vários autores (LUQUET, 1927; ARNHEIM 1974; FREEMAN, 1980; COX E PARKIN, 1986) acredita-se ser essa a transição entre a forma girino e a convencional. Para a criança coordenar, reconhecer e lembrar de todas as formas utilizadas para representar a figura humana, ela tem que descobrir que partes são usualmente incluídas e que partes são opcionais. Para isso ela precisa utilizar uma complexa coordenação de conhecimento e habilidade. Aparecem nessa transição problemas como ela não saber desenhar determinado detalhe ou onde encaixá-lo. Cox sugere que os adultos ajudem as crianças na construção desse


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desenho e apresenta alguns resultados de pesquisas já realizadas com crianças entre dois e seis meses e três anos e cinco meses, onde esse empurrãozinho demonstra que as crianças não possuem grandes dificuldades em conceber a figura humana, amontoando-a a partir de seus seis segmentos básicos: 1) cabeça, 2) tronco, 3) dois braços, 4) duas pernas. Cox diz que, embora saibam montar corretamente, na hora de seqüenciar parte a parte, a criança acaba por esquecer ou uni-las em lugares errados. Sugere que o adulto interfira ditando às crianças as partes enquanto desenham. Tendo efetuado pesquisa executando o que sugere, com crianças de idade média entre três anos e dez meses, chega à conclusão que a maioria das crianças acrescentam as partes conforme lhes é ditado, mas que elas não conceberam ainda que o corpo tem seu contorno separado abaixo da figura e que aquelas que desenham o corpo com contornos fechados, não utilizando grandes segmentos como os desenhados convencionalmente por adultos. Em uma etapa adiante, Cox pesquisa os resultados obtidos em se oferecer a criança uma figura humana completa para cópia. Elas não conseguiram. Foi preciso que, na tarefa de copiar, as crianças vissem como cada parte é desenhada e integrada na figura. Os resultados demonstraram que a cópia passo a passo ajudou as crianças, desenhistas do girino, a entender como a figura humana é convencionalmente desenhada, mas que em um exercício seguinte, em um dia diferente, boa parte deles não manteve o esquema copiado, retornando à etapa do girino. Finalizando uma questão da pesquisa, Cox verificou que as crianças desenhistas do girino não apenas relutaram em seu próprio modo de desenhar a figura humana como também demonstram ter preferência por ele e não atribuir valor à outras formas que as crianças de outras idades utilizam para os produzirem. Em sua concepção, ainda que saibam e entendam sobre as várias partes do corpo humano, consideram sua forma de representação ainda perfeitamente adequada.


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O padrão de transição entre a representação do girino à forma convencional varia muito e verificou-se que durante essa transição, o retrocesso se deva às vezes, à situação da criança no momento em que está desenhando. Se for um teste, ela se esforça em desenhar a pessoa da melhor maneira que puder. Se não for necessário, ou a figura se apresentar apenas como coadjuvante da cena, ela se concentra em outros aspectos e resolve rabiscando uma versão rápida de uma pessoa. Em certo ponto, elas começam a progredir, motivadas talvez pelas críticas dos outros ou mais provavelmente em uma ação decisiva e pessoal, partindo em busca de outras formas de representação. As crianças vão se desenvolvendo, e por volta dos cinco anos já apresentam uma figura humana com o tronco claramente distinto da cabeça da figura. (KOPPITZ, 1968 apud COX, p. 58) Desenham já mais partes do corpo; mãos e pés, detalhes como sobrancelhas, cílios, vestimentas, cordões de sapatos. Ela não utiliza ainda linhas de contorno contínuas para toda a figura, e aos seis anos a maioria desenha partes de linhas para limitar uma região. Acrescentam elementos, e eles passam a ter seus próprios limites separados ou compartilhados. Por volta dos oito ou nove anos, aparecem ambos na forma do corpo. Fundem ainda pescoço, ombros e braços. Quando ocorre um esboço do contorno da figura inteira, ou de partes principais dela, surge um avanço, pois há uma mudança do desenho de regiões limitadas para o esboço de contorno, a criança está construindo uma lista mental das partes e as inter-relacionando. As mudanças nos estilos de representação ocorrem em função, além da busca do realismo, pelo interesse da criança em desenhar a figura participando de alguma atividade. (FERSON, 1985 apud COX, 1995 p. 59)


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Nesse momento surge a necessidade de desenhar a figura de perfil, que o fazem pela primeira vez desenhando, ou apontando pés e cabeça na mesma direção ou colocando o tronco em vista frontal. Cox cita observação de Guillaumin (1967) onde ele afirma que a maioria das figuras de perfil aponta para a esquerda, pois sendo a maiorias das pessoas destra, pareça mais fácil colocá-las desse modo. No início da adolescência, eles já desenvolveram um modo de desenhar a figura humana que é reproduzido quase automaticamente. Se desenharem algo a partir de um modelo real, dificilmente sairá parecido, embora haja um desejo de se conseguir isso. Quando mais velhas e decididas a aperfeiçoar seu desenho, as crianças o fazem geralmente de duas maneiras, ou copiando o estilo de outros artistas que produzem caricaturas ou histórias em quadrinhos, ou tentando desenhar modelos vivos, se deparando com questões de proporção, contorno, luz e sombra. Aqui há a utilização ampla do contorno oclusivo, e eles são utilizados dentro de outros contornos externos. Ao longo de todo esse processo, várias características se notam repetir. Quando pequenas, as figuras das crianças parecem bizarras. Vê-se grande desproporcionalidade e Cox cita algumas observações feitas por outros estudiosos sobre isso. Embora não consigam controlar o tamanho relativo de cada elemento, elas notam e comentam as desproporções. Piaget e Inhelder (1956) afirmam que a capacidade de lidar com a proporção ao representar algo só surge por volta dos oito anos de idade. O fato de as crianças desenharem a cabeça com proporções grandes se dá por uma conseqüência da própria importância que a cabeça tem para elas: (LOWENFELD, 1939; LARK KOROVITZ, LEWIS E LUCA, 1973 apud COX, 1995 p. 61) o fato de que ela precise desenhá-la grande para conter todos os outros detalhes, ou mesmo a falta de planejamento do desenho disposto na folha. Quando pequenas, muitas vezes desenham o corpo e então vão vesti-lo, aparecendo um efeito de transparência.


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Outra característica, chamada por Luquet em 1927 de constância de tipo, é o estilo próprio do esquema básico que cada criança elege para si como o seu. São características perceptíveis e que se repetem tanto em um nível individual quanto por grupos normais e geográficos. As figuras que aparecem em ação vão se modificando de representações inicialmente rígidas e ligadas a uma linha vertical subentendida como o solo. Quando mais novas e somente por volta dos sete anos, começa-se a notar alterações no tronco das figuras. Podem acrescentar cabelos esvoaçantes, apresentar as figuras de perfil, colocar linhas de movimento indicadas com tracejamento como as histórias em quadrinhos. (GOODNOW, 1977) No início, as figuras de animais desenhadas pela criança se assemelham muito às figuras humanas. Ela repete a mesma fórmula, no início, verticalizando e depois acabam por colocar a figura em posição horizontal. Cox conclui que, nesse processo, enquanto a criança está na fase do girino, elas parecem entrincheiradas em seu próprio estilo e na medida que ficam mais velhas ficam mais abertas às influências alheias. Sobre o uso dos desenhos da criança como instrumento de uso diagnóstico, Cox cita, assim outros estudiosos, o pioneirismo de Goodenough (1926) e seu teste para medir a inteligência. O teste, revisto e ampliado por Dale Harris em 1963 passou a ser considerado, inclusive por Goodenough, como um medidor de maturidade intelectual e não de inteligência, se destinando a avaliar o nível real da criança e não o potencial. Cox cita Elizabeth Koppitz (1968) e o teste de Draw a Person (DAP) desenvolvido por ela, o Teste de Inteligência Stanford-Binet, o Teste de Inteligência WISC (Wechsler Inteligence Scale for Children). Para a autora deste O desenho da criança, esses tipos de testes são confiáveis, mas que deviam ser considerados úteis por fornecer uma estimativa do nível de desenvolvimento da criança, pois


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por serem baseados em uma contagem complexa de detalhes incluídos no desenho, acabam por perder muita informação relacionada à estrutura da figura. Aqui, agora em 1995, as crianças antes chamadas de retardadas são denominadas crianças com dificuldade de aprendizagem, dificuldades que vão de leves a graves. Cox cita os seguintes pesquisadores envolvidos nas comparações entre os desenhos das crianças normais e as com dificuldades de aprendizado; Kerschensteiner (1905), Burt (1921), Goodenough (1926), Earl (1933), McElwee (1934), Israelite (1936), Golomb e Grossman (1977), Cox e Hawarth (1989). Relativo aos testes de personalidade, cita Eynsenck (1965) e Machover (1949, 1951). Cox diz que o teste de Machover tornou-se um dos testes psicológicos mais usados em clínicas e hospitais e continua sendo empregado amplamente nos dias de hoje. Citando dois pesquisadores, Clifford Swensen (1968) e Haward Roback e os resultados de seus estudos acerca da validade do teste de Machover, conclui que, a justificativa válida para o uso do teste seria o fornecimento oferecido por ele de uma impressão global confiável do ajuste da criança, mas julgamentos de casos isolados, como qualidade do traço, ou modo de desenhar isso ou aquilo, não deveriam ser considerados confiáveis. O valor dele é limitado, podendo-se determinar nível geral do ajuste da personalidade da criança. Além de serem utilizados como mensuradores de desenvolvimento, reveladores de personalidades os desenhos são utilizados também como ferramenta para avaliar ajustes ou distúrbios emocionais. A omissão, inclusão, ampliação, redução, desligamento, proporções incomuns e sombreamento de elementos são os indicativos de que algo não vai bem. Cox cita Joseh Di Leo e o livro Interpretação do desenho infantil (1973) já abordado anteriormente nesta monografia, onde ele, apesar de enfocar o assunto se baseando fundamentalmente nas questões referentes aos ajustes e desajustes que o desenho poderia


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indicar, não deixa de concordar com o fato de que o uso destes desenhos para o diagnóstico de distúrbios emocionais não deixa de ser potencialmente problemático. No teste de Koppitz (1968), além das avaliações dos indicadores de desenvolvimento, há também os indicadores emocionais. Ela, no entanto adverte que não há sentido em se determinar diagnósticos baseados em indicativos únicos, já que problemas e ansiedades podem ser externados por crianças de diversas maneiras em ocasiões especificamente diferentes. Goodenough inclusive, em estudo publicado em 1950 em parceria com Dale Harris diz: “Muitas das características consideradas anormais nos desenhos de uma única criança ou de um pequeno e seleto grupo perdem seu aparentes significado quando se tornam conhecidos a idade e o sexo dos indivíduos estudados e as condições em que os desenhos foram feitos.” (GOODENOUGH; HARRIS, 1950 apud COX, 1995, p. 95)

Quando Cox trata do conceito a criança desenha o que conhece e não o que ela vê que vem de Ricci (1887) Kerschensteiner (1905) e Luquet (1913), ela considera as observações feitas por esses autores, onde a idéia do que o desenho das crianças pequenas se baseiem em sua idéia ou conceito sobre o objeto. As principais características ou detalhes, contidos no modelo interno ou mental são utilizados quando ela precisa representar. Cox complementa essa idéia com a afirmação de que esses modelos são tão utilizados porque, a criança reconhecendo que os objetos podem ser vistos de diversos ângulos e que esses ângulos acabam por esconder alguns de seus detalhes cruciais, escolhe o seu modelo porque sabe que, a partir dele, o objeto que ela representou, sem dúvida nenhuma, será compreendido e entendido. Por outro lado se, ao ser pedido a ela que desenhe um objeto observando-o, e se pelo ângulo, uma xícara parecer uma caneca pela omissão da asa, e nada for dito sobre o que é o objeto que está em cima da mesa nem seu nome, a criança desenhará o que vê, ali no caso, algo que se parece com uma caneca.


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Em certo ponto, ao tentarem fazer desenhos mais realistas, se lhes é dado um modelo, elas então tentarão desenhar o que estão vendo, embora, não tendo a técnica necessária, elas não obterão muito êxito. Cox observa neste ponto uma questão interessante. Segundo alguns, o que desencadeia um desejo de mudança nos traços da criança são as pressões e críticas alheias, que as fazem mais autocríticas ainda. Para Cox, a mudança parte da própria criança, que captando a aparência dos objetos reais, se torna consciente da precariedade de seu próprio desenho comparado, inclusive com os que vê a sua volta. Seria neste ponto importante dar a ela um ensino específico. Nas relações de representação dos objetos juntos no papel em variadas relações especiais, as crianças se utilizam dos recursos de encobri-los parcialmente ou totalmente. Aos cinco anos ela já representa a omissão completa de um objeto de seu desenho se ele estiver totalmente encoberto na cena e não houver razão particular para sua exclusão. Quando o objeto está parcialmente encoberto ocorrem as transparências. Muitas vezes elas ocorrem deliberadamente, a criança desenhou tudo o que tinha a frente, mas também pode ser acidental, devido a sua própria descrição da cena. Elas aparecem mais freqüentemente quando o objeto encoberto e o que esconde estão relacionados estruturalmente, e mais raras quando a cena desenhada contém um objeto atrás do outro. Desenhar a cena realmente como ela está sendo vista só virá a ocorrer por volta dos oito anos. Quanto ao planejamento da organização da cena, as crianças muito pequenas sabem como dispor os elementos especialmente para fazer uma figura humana reconhecível. Há uma adaptação das figuras ao papel, elas desenham obedecendo tanto a referências internas à figura, quanto a referências externas, a da folha. Elas organizam seus desenhos utilizando uma linha de solo. Usam em seu primeiro momento a que está pronta, a da beira da página, ou uma implícita. Mas dentro da


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faixa dos oito anos, grande maioria já faz uso da linha de solo traçada. Utiliza às vezes uma linha de solo e uma de horizonte, dispondo agora de uma cena unificada. Apresentam alterações relativas a perpendicularidade dos objetos, utilizam múltiplas linhas de base, e quando a disposição especial de algumas cenas não se ajusta à esses arranjos, elas utilizam a técnica do rebatimento. Quando descobrem que uma linha oblíqua cruzando a folha sugere profundidade, elas a usam para mostrar mudança de direção. Linhas paralelas são utilizadas para dar noção de profundidade superior e inferior. Usam o estilo oblíquo-paralelo para indicar a profundidade dos objetos, e a altura no papel para indicar a distância entre o objeto e o observador. Em torno dos sete anos, elas relacionam a indicação pela altura com a indicação do tamanho e desenham aí o objeto mais alto menor do que aquele mais abaixo. O domínio da perspectiva linear ou convergente geralmente nem chegam a ser adotado pelas crianças, o que ocorre muitas vezes somente quando há orientação. Cox observa que, quando se trata da questão da criança se aprofundar na arte de escrever ou na música, o caminho tomado é o de, em primeiro lugar, que a criança domine as técnicas básicas, copiando o que o professor apresenta, e que a explosão de criatividade se dê depois de muita prática e exercício, e que geralmente, há sempre um pouco de cópia em quase tudo que se faça necessário aprender. Por que, então, deve-se esperar que na arte, as crianças se desenvolvam sem ajuda, orientação, acompanhamento e estímulo? O papel do adulto não seria o de apenas esperar que a criança encontre seu próprio caminho. A cópia seria necessária, afinal em toda a história da arte, os maiores artistas faziam da cópia e estudo da obras dos mestres que os antecediam, exercício obrigatório para que depois progredissem, conquistando estilo próprio.


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Cox defende a cópia como algo a ser feito e direcionado de maneira positiva e instrutiva. A criança teria seu interesse pelo desenho estimulado e isso seria de grande ajuda para a ampliação de seu conhecimento sobre as várias maneiras de se desenhar as coisas. Não tendo o efeito de sufocar a criatividade, a cópia serviria para revelá-la. Essa cópia abordada por Cox não diz respeito ao objeto tridimensional, mas de outro desenho a traço, chamado por Mitchelmore, em 1985, de desenho bidimensional ou exercício isográfico. A cópia do desenho tridimensional é chamada de desenho tridimensional ou exercício homográfico. Enquanto no exercício isográfico, pode-se verificar a fidelidade da cópia colocando-a em cima do modelo, já no exercício homográfico as cópias feitas se apresentam com muitas variáveis. Segundo Bee e Walter (1968) e Maccorby e Bee (1965) as crianças percebem a diferença entre as formas geométricas simples muito antes de saber desenhá-las. Testes de desenvolvimento ou inteligência se utilizam de tarefas de reprodução ou cópia, levando em conta o que é previsto ser feito em determinada idade. A criança demora até conseguir desenhar as formas. Precisa desenvolver controle motor para fazer o lápis produzir exatamente os tipos de traços que ela quer que ele faça. Ela precisa também entender que copiar significa reproduzir o modelo o mais fielmente possível. Essa cópia difere do desenhar o tridimensional, onde não é preciso tentar reproduzir o modelo com exatidão. O fato do desenvolvimento da capacidade de se copiar ser posterior à capacidade de se distinguir as formas relaciona-se com a maneira com que elas analisam as figuras. Com dois ou três anos, as crianças, ao examinarem os objetos, os percebem de maneira geral e não exploram cada detalhe sistematicamente. (ZAPOROZHETS, 1965 apud COX, 1985, p. 88) Mas, a tarefa de se copiar um quadrado a traço segue um processo seqüencial, onde cada forma deve ser mentalmente dividida em suas partes constituintes e cada parte desenhada em


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ordem. (MACCOBY, 1968 apud COX, 1985, p. 88) Se alguém mostrar à criança como fazer isso, terá sido dado à ela um caminho para que continue sozinha, enquanto simplesmente darlhe um quadrado já desenhado, a fará ter que iniciar o processo do zero. Citando estudos de Connolly (1968), Huttenlocher (1967), Bryant (1974) e Anwar e Hermelin (1962), Cox diz que o processo que a criança precisa vencer até que consiga copiar, pode ser suavizado ensinando a criança, em primeiro lugar, a construir sua cópia com palitos de fósforos, o que possibilita a construção de figuras mais corretas. E que também o fato do modelo ser colocado no alto da folha e deixar a criança fazer sua cópia abaixo é um método mais eficaz que quando modelo e cópia são colocados lado a lado. Cox analisa as dificuldades da criança em desenhar os elementos geométricos. Ao desenhar linhas verticais e horizontais são poucos os problemas que a criança enfrenta ao fazê-lo, mas ao tentar reproduzir linhas oblíquas o processo é mais demorado. O que se conclui disso, é que essa dificuldade se dá pelo fato da criança não ter referências, no próprio papel que utiliza para desenhar essas formas triangulares de poligonais. As bordas do papel são horizontais e verticais, e aí já se verifica a questão da cópia. As referências dadas pelos limites do papel auxiliam as crianças em suas representações quando elas são quadradas, mas não ajudam quando elas procuram representar um losango. O suporte para o desenho também é importante, e pode tanto ajudar quanto atrapalhar. Esboços de círculos são desenhados pelas crianças desde muito pequenas, quando elas descobrem as possibilidades onduladas ou espiraladas de seus rabiscos. Citando Bender (1938) e Inhelder e Piaget (1956), que afirmam serem esses movimentos os precursores do círculo, pois ao contrário das figuras mais complicadas, são feitos em um movimento contínuo, sem que o lápis precise ser levantado do papel. As crianças pequenas não fazem distinção entre as diferentes formas que desenham, distinguindo apenas se são abertas ou


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fechadas. As crianças acabam por utilizar o círculo para representar todas as formas fechadas pela facilidade que possuem em desenhá-las. Só quando passam a analisar as propriedades de beiradas, ângulos, distâncias relativas, as propriedades euclidianas, é que elas passam a utilizar o círculo para as formas curvas e do quadrado para as formas angulares. É só mais tarde é que conseguirão apontar as diferenças entre círculo e elipse, quadrado, retângulo, e triângulo. As dificuldades iniciais das crianças em desenhar os objetos oblíquos se dão pela maneira que precisa guiar o lápis. Uma forma de se desenhar um quadrado ou triângulo, é fazer cada linha separadamente. Levantando o lápis ao completar cada linha. Outra forma é, não levantando o lápis do papel, mudar abruptamente de direção quando se chega nos cantos. Baseando-se em estudos de Lazlo e Brodeville (1985), Naeli e Harris (1976), Freeman, Chen e Hambly (1988), Bayraktar (1985), Moore (1987) e Littleton (1991). Cox conclui que freqüentemente a criança apresenta uma tendência à perpendicular, desenhando um ângulo agudo de modo mais perpendicular do que deveria ser. A fidelidade da cópia feita pela criança está ligada ao fato de ela já conhecer ou não o objeto, de saber sua identidade. Se a figura for uma casa, ela provavelmente não se deterá às linhas e ângulos do desenho a traço oferecido como modelo. Ela irá construir seu objeto como habitualmente o costuma desenhar. Ao copiar um desenho abstrato, sem significado, a cópia será feita com muito mais exatidão, pois a criança precisará prestar mais atenção ao que está tentando representar. O recurso da cópia segundo Cox deveria ser fomentado e utilizado para fins criativos. Analisando a questão da criança que apresenta mais talento que as outras para o desenho, Cox mostra que, embora os professores e pais menosprezem as orientações formais de se ensinar à criança o desenho de modo realista, é exatamente esta aptidão que determina em nossa sociedade se a criança tem ou não talento, dom para a arte. Citando Lark-Horovitz,


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Lewis e Luca (1973), Cox diz que, em geral, mas não sempre, crianças com talento artístico estão acima da média de inteligência, muitas apresentando alta capacidade intelectual. Passam pelas etapas de desenvolvimento comuns à todas as crianças, mas isso se dá de maneira acelerada. Interessadas em desenhar novos temas, conhecer materiais e técnicas diferentes, refletem em seus desenhos uma observação detalhada dos objetos e uma flexibilidade maior em representá-las se movimentando e em posições diversas. O traço é fluído, variando entre o forte e o sutil. Utilizam o espaço e a composição de modo avançado e não se amedrontam diante do desafio de representar os grupos de figuras. Alem dessa habilidade e de imaginação intensa, essas crianças possuem uma ótima memória visual, e Betty Lark Horovitz (1973) acredita que seja esse o fator mais indispensável tanto para o desenho quanto para a arte. Cox complementa a questão colocando que, embora memória visual e talento artístico estejam relacionados, não se deve pressupor que um acarrete sempre o outro, e que, ao treinar as crianças em recordar a aparência das coisas, poderia-se aperfeiçoar sua habilidade em desenhar. Quanto à questão tão discutida no início do estudo referente ao trabalho da criança, em usar-se o termo arte, Cox afirma não considerar os desenhos infantis como arte. Ela sustenta essa opinião dizendo que, se “arte é considerada uma representação deliberada de uma cena de modo a causar no observador um determinado sentimento ou emoção, então precisamos questionar se as crianças são capazes disso. A expressão que vimos no rosto de uma figura feita por criança e nos agradou, pode na verdade, ter sido acidental; a criança pode não tê-la feito intencionalmente e talvez não seja capaz de reproduzi-la. Ao contrário de um verdadeiro artista, o artista infantil pode não ter nenhuma pretensão de se comunicar; talvez esteja simplesmente desenhando para si mesmo”. (1995, p. 210-211)


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Cox cita a pesquisa realizada por Ellen Winner e Howard Gardner em 1987, quando ambos foram à República Popular da China, para entre outras coisas, descobrir porque as crianças chinesas desenham tão bem. Na China, as crianças comuns alcançam um altíssimo nível de habilidade no desenho. Isso se dá porque lá, o domínio de diversas técnicas de desenho, tanto a tradicional quanto a ocidental é levado tão a sério quanto o domínio da caligrafia. Padrões rígidos são utilizados neste ensino, onde todas as lições são baseadas em copiar esquemas dados pelo professor e pelo livro, desenhando a partir de desenhos. Com esse exercício isográfico, as crianças vão gradualmente formando um grande repertório de esquemas que poderão juntar para compor uma cena, sendo aí a execução criativa da tarefa. Não há a expectativa ou incentivo para que se desenhe a realidade. Se por um lado parece haver uma estranha rigidez no sistema de ensino do desenho na China, o que poderia parecer aos olhos ocidentais um escândalo, o que acontece é que após certo tempo as crianças conquistam habilidade suficiente para poderem criar trabalhos verdadeiramente criativos e originais. Essa é a linha adotada pelos chineses quanto à essa questão. Cox sugere uma troca entre as culturas. Ocidentais e orientais deveriam aprender um com o outro. Os orientais introduzindo um pouco mais de liberdade em suas propostas de trabalho visual junto às crianças, e os ocidentais adotando em nossa abordagem do desenho um pouco de disciplina e do ensino de técnicas básicas. As duas posturas combinadas proporcionariam às crianças um alto grau de capacidade técnica e a conservação e expressão de suas próprias idéias criativas. Cox cita o trabalho de Betty Edwards que, ao lançar em 1979 o livro Desenhando com o lado direito do cérebro, traz uma nova proposta para o aprendizado do desenho. Em 1964, Roger Sperry publica pesquisa onde revela que as duas metades do cérebro tendem a se especializar em diferentes tipos de raciocínio: a esquerda está ligada ao raciocínio verbal e a


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direita ao raciocínio visual, espacial. Juntas participam do complexo processo cognitivo, atuando juntas ou separadas, intercambiando os dois tipos. Baseada nessas revelações, Edwards diz que a razão pela qual a maioria das pessoas desenha tão mal é que nos valemos do hemisfério esquerdo quando analisamos uma cena, e essa descrição e classificação sobre o que sabemos sobre os objetivos conflitam com a aparência real da cena. Utilizando o lado direito, não pensamos sobre o que os objetos na cena realmente são, olhamos suas formas e arestas, e são esses detalhes relacionados que espacialmente é o que forma toda a configuração visual. Utilizamos com mais freqüência o lado esquerdo de ver as coisas, e essa classificação feita dos objetos vistos afeta a maneira como o modelo é visto, não deixando espaço para uma classificação simples, abstrata, onde a cena é descrita não como um conjunto de objetos tridimensionais, mas como um arranjo plano, de linhas e formas fáceis de serem copiadas no papel, se faça. Cox comenta a história do processo do ensino do desenho. Antes da Segunda Guerra Mundial os alunos recebiam regularmente ensino planejado de desenho. Cita a série de livros para professores escritos por E. A. Branch, Desenho criativo, O segundo livro do desenho criativo e O livro do desenho a lápis (todos editados por Evans Brothers, Londres, esgotados), que continham exercícios rígidos. Cita Earl Barnes (1892) e George Kerschensteiner (1905), que defendiam a intervenção do adulto quando a criança atingir a faixa dos nove anos de idade. Em 1911, James Riddel, ao escrever sobre o ensino do desenho na A enciclopédia do professor, condena a corrente que tomava forma na época, a visão da liberdade criativa, que se formou mais tarde com Lowenfeld (1957). Cox cita Brent Wilson (1985), que denuncia a visão romântica dessa época, “afirmando que, na verdade, o desenvolvimento de todas as nossas capacidades surge através


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da interação – o dar e receber – de nossa herança genética com o meio em que nos encontramos”. Seria impossível colocarmos as crianças isoladas das imagens e influências contaminadoras à nossa volta. Afinal, a possibilidade de um desenvolvimento imaculado da originalidade é um mito, desenvolvimento gráfico e cultura estão inseparavelmente ligados. A visão da liberdade total da capacidade criadora, adotada por mais de meio século, extremamente presente e que ainda vigora no ensino da educação artística. Cox afirma que gostaria de ver os professores interessados em proporcionar exercícios de desenhos mais estimulantes, de maneira planejada e consciente, e é isso que ela defende durante toda abordagem de seu livro. Assim como Lowenfeld e tantos outros que abordaram o assunto, Cox, baseada em suas idéias oferece sugestões práticas para pais e professores. Defende que os pais deveriam estimular a criança oferecendo o material – papel e giz-de-cera, canetas hidrográficas ou lápis, lousa e giz – e mostrar o que se pode fazer com ele. Vendo o que o adulto está produzindo e como isso pode ser divertido, a criança se verá estimulada a experimentar também. No período anterior a um ano, quando elas ainda não tem controle motor, não deve ser uma idade limite para o começo desse estímulo. Ele pode começar mesmo nessa época, contanto que sem grandes expectativas dos pais. Quando já tiver mais prática em manejar o material, os pais podem introduzir uma brincadeira de imitar, desenhando um tipo de linha e a criança, vendo o gesto, imitar o adulto. As crianças podem depois disso colorir os campos que podem nascer dessas linhas, colorindoas ou já sabendo desenhar, embelezando a cena com outros desenhos. Cox diz que, apesar de muitos professores preferirem o uso de giz-de-cera grosso ao lápis preto comum, o uso do lápis é apropriado, pois permite que a criança desenhe mais rapidamente e possa fazer detalhes delicados, as figuras feitas à lápis tendem a serem mais desenvolvidas.


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Sugere que os pais desenhem coisas reconhecíveis, como gente e animais, deixando partes para que a criança complete. A idéia de que seja essencial para a criança passar pelos estágios inicial de rabiscar e desenhar formas antes de chegar ao desenho figurativo, segundo Cox, não deve ser regra. Mesmo porque é muito difícil se apontar com precisão o primeiro desenho figurativo, pois muitas vezes a figura completamente irreconhecível é apontada como um gato ou a mamãe. Sobre a questão de se perguntar diretamente à criança sobre seu desenho, Cox cita M. J. Parsons (1987), que defende a discussão e o fornecimento de material adequado à criança. A discussão levaria a criança a esclarecer para si mesma o que não sabe, enfrentar os problemas de representação e ajudar o próprio adulto a entender o desenho do filho. Ao abordar o papel do professor, Cox coloca mais uma vez a questão de que ser bom em arte, não é uma busca valorizada quanto ser bom em ler, escrever e fazer contas. A educação artística dada nas escolas não auxilia a criança que diz não saber desenhar. É necessária uma condução sensata e proveitosa da questão, onde é preciso encontrar um meio termo entre dar à criança uma solução rápida e fácil, ou até desenhar por ela, e em extremo oposto dizer-lhe que use sua imaginação e faça o melhor que puder. Cox cita LarkHorozovitz, que argumenta: “o professor deve certificar-se de que tudo o que é ensinado serve para finalidades criativas e que ao mesmo tempo os professores não deve exorbitar uma posição condescendente e uma atitude do tipo tudo é válido”. (LARK-HOROVITZ, LEWIS E LUCA, 1973 apud COX, 1995, p. 243) Por volta dos três anos, a representação da figura humana começa a tomar forma através do girino, sendo já totalmente abandonada, geralmente por volta dos cinco anos. Durante essa transição, Cox sugere que não se interferir muito, não fazendo críticas, comentários e conclusões sobre os desenhos, mas sim pedindo à criança que falem sobre eles.


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As discussões devem ser construtivas, e mais tarde, entre seis e oito anos, essas discussões são ferramentas para ajudar a criança a compreender questões sobre problemas que irão surgir na busca de suas representações, e possíveis soluções para eles. Cox descreve o trabalho desenvolvido por Grant Cooke (1986) que desenvolveu uma maneira muito interessante de dar as crianças pequenas algumas das convenções básicas do desenho sem sacrificar a criatividade e a auto-expressão. A idéia de tema é desenvolvida da seguinte maneira: a bicicleta mágica. Com uma bicicleta de verdade sobre a mesa da sala de aula, a professora convida seus alunos de cinco a seis anos a ajudá-la a desenhar obedecendo as suas instruções na lousa. As crianças participam desse processo de interação e discussão junto à professora de como se deve desenhar a bicicleta, desenvolvendo linguagem, capacidade de comunicação e ao mesmo tempo participando e acompanhando o processo de construção do desenho. No fim do exercício, a professora descobre um pedaço de papel amassado na cestinha da bicicleta e esse papel contendo a mensagem “Eu sou uma bicicleta mágica e posso ajudar você”, que gera um debate sobre como essa bicicleta poderia ser mágica e, nesse momento, a professora, apagando na lousa o desenho feito de maneira a não deixar as crianças imitá-lo, pede a elas que desenhem uma aventura que elas mesmas poderiam ter em sua própria bicicleta mágica. Nesse momento, o peso de ter que saber como desenhar a bicicleta é retirado e as crianças ficam livres para incorporá-lo em seu trabalho expressivo e imaginativo. Cox cita Norman Freeman (1980), que diz “as crianças não são apenas criaturas que expressam sua essência através do desenho; são também principiantes aprendendo a desenhar”. (COX, 1995, p. 247) Depois dos oito anos, exercícios como o anteriormente descrito devem ser feitos, de maneira a se mostrarem cada vez mais interessantes e desafiadores. Buscando defrontar as crianças cada vez mais com problemas mais complexos e provocar muito debate, questões sobre como um objeto pode ser desenhado passam a serem estimulantes.


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Cox descreve com mais detalhes a experiência de Betty Edwards em resposta à questão de que na adolescência, a maior parte da idéia dos jovens esteja muito adiante de sua habilidade de desenhar. Esse é o momento crucial, onde ele acaba por abandonar toda essa história de saber desenhar. Edwards, lecionando arte nos anos 60, não entendia por que seus alunos não conseguiam simplesmente olhar uma cena e desenhar exatamente o que viam. Utilizou-se de uma tentativa incomum: ofereceu aos alunos um desenho famoso para que copiassem, mas que fosse feito estando o desenho de ponta cabeça, saindo o próprio desenho do aluno também de ponta cabeça. As cópias saíram muito melhores do que se tivessem sido feitas a partir do tema concreto que o desenho oferecia se tivesse sido mostrado corretamente. Daí ela tirou a conclusão relativa à questão do uso dos lados direito e esquerdo do cérebro já citados anteriormente. Além do exercício de se desenhar estando o modelo de cabeça para baixo assim fazendo que o lado esquerdo não reconheça com o lado esquerdo as formas, e sim com o direito, que o reduzirá a uma unidade bidimensional, composta de linhas e formas sobre a superfície plana - Edwards sugere outras técnicas, abordadas detalhadamente em seu livro Desenhando com o lado direito do cérebro. Cox conclui o livro dizendo que é preciso a aquisição de uma habilidade técnica, apesar de a arte não se restringir somente a essa habilidade. Apesar de que, o fato é que sem um certo grau dessa habilidade técnica, não haveria arte nenhuma. O livro de Cox é um interessante trabalho que mostra a evolução da abordagem do tema. Extremamente detalhista, considerando as pesquisas de vários colegas, ela apresenta suas conclusões baseando-se sempre em sua firme opinião sobre a necessidade do apoio metodológico que o adulto deve dar à criança. Ela leva em conta todo um processo de descobertas, citando Luquet, Piaget, adequando estudos anteriores aos atuais e sendo bastante crítica, assim como Mèredieu e tantos outros de seu tempo, em relação às posturas liberais


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adotadas por todo um período, e que ainda é presente e atuante, pois são as crianças criadas nesse sistema liberal que são os responsáveis pela educação das crianças de hoje. Não se prendendo a rígidos períodos de classificação do processo evolutivo do desenho, traça de maneira leve, e apoiada em resultados práticos, uma linha descrevendo as etapas dentro as quais as habilidades vão se desenvolvendo. Sugere como os adultos, pais ou professores, podem atuar nas fases desse desenvolvimento ativamente, buscando em cada atividade de apoio o estímulo e a atenção da criança para seu ato de desenhar. Mostra como isso pode ser feito e é bastante convincente em suas argumentações. Atualizada, nos mostra as idéias que estão surgindo e que com certeza, ainda passarão a serem consideradas com mais atenção nos próximos anos. Quem sabe se começarmos a considerar e utilizar as propostas de estudiosos como Cox, no futuro teríamos um outro panorama dentro das salas de aula e na maneira das pessoas se expressarem. O abandono do desenho acaba com possibilidades interessantíssimas de expressão do indivíduo. Ao crescer dentro dessa proposta que surge neste final de século XX e começo de XXI, como seriam as relações do adulto com a habilidade de desenhar e seu produto gráfico? O que seria descrito através desse desenho? Essas e muitas questões ainda estão por serem respondidas, acreditamos que, com certeza, a conscientização do homem sobre si mesmo e das suas ferramentas de interação com o mundo (seu desenho é um deles), irá alterar a maneira com que tratamos hoje essa questão.


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CONCLUSÃO

O universo estudado através desta monografia acabou se mostrando muito maior do que a principio se imaginava. Na busca das colaborações que os estudiosos foram dando ao tema, verificou-se um grande número de publicações, o que resultou em uma vasta referência bibliográfica compilada através desses autores citados. Essa compilação por si só já é uma colaboração, pois oferece uma visão geral das obras que abordaram o assunto em mais de cem anos de estudos, e quem se interessar em aprofundar-se mais poderá se utilizar dela como guia. Os estudos e visões sobre o tema revelaram-se extremamente ligados a todo o contexto histórico da época em que eles estavam sendo desenvolvidos. Estudá-los e entendêlos torna-se um processo dependente do conhecimento e compreensão do período histórico em que eles se dão. Buscou-se dar ao leitor uma visão dessas questões ao longo da descrição do trabalho. Partindo dessa conclusão verificou-se que o descobrimento do traço infantil e suas significações se deram em um período eufórico da história da sociedade ocidental, quando o


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homem começava a avançar rumo ao aprofundamento de seus conhecimentos científicos de maneira nunca feita antes. Assim como o descobrimento da própria criança enquanto indivíduo pensante, a construção de um sistema educacional que atendesse essa criança misturou-se, no campo das artes, com a libertação artística frente às formalizações impostas por séculos de história da arte. Isso influenciou decisivamente a maneira com que os estudiosos passaram a tratar a produção gráfica infantil. Os primeiros estudiosos foram, cada um, contribuindo com pequenas conclusões que foram abrindo caminho para abordagens mais detalhadas e direcionadas, como as realizadas por Luquet, que foi o grande colaborador para todo o processo de descobertas que se seguem. O estudo do tema O desenho infantil se fez paralelamente ao desenvolvimento dos estudos relativos à educação, cognição e desenvolvimentos psicológico, mental e físico da criança. Eles nasceram e caminham juntos, estando aí a justificativa da abordagem dos trabalhos dos estudiosos da educação como Vygotsky, Freinet, Piaget, Klein e Gardner. E também dos estudiosos ligados às questões psicológicas como Goodenough, Bender, Wallon, Machover, Koppitz, Luria, Di Leo e Harris. A escolha das três obras, cujo título é o mesmo, mas escritas em períodos diferentes do século XX, foi feita pela identificação da capacidade que cada uma teria em dar respostas e complementar a outra. O tom libertário que foi instituído no primeiro período que segue às primeiras abordagens formou o quadro que vemos hoje. Read e Lowenfeld e o próprio período histórico onde a arte conhecia novas formas de expressão como o impressionismo, expressionismo, cubismo e abstracionismo influenciaram todo o comportamento ocidental acerca da criança e


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seu desenho. Arte nesta época era sinônimo de liberdade e confundiram a expressão gráfica da criança, elemento recém-descoberto, com arte, gerando todo o quadro verificado. A obra de Marino, apoiada neste pilar, mostra exatamente a orientação e posicionamento do período. Mèredieu, na década de 70 do século XX, levanta questionamentos sérios sobre os resultados dessa postura instituída e esses questionamentos encontram respostas no trabalho de pesquisa que se seguiu nos anos posteriores, e que são trazidas a essa monografia por Cox. No que se refere ao posicionamento do adulto junto ao desenvolvimento gráfico da criança, conclui-se que a melhor maneira de se agir é dar a ela liberdade de expressão, mas com estímulo constante apoiado em direcionamento e conhecimento formal, como sugerido por Cox. Esse direcionamento deve ser feito por professores e pais conscientes do processo de desenvolvimento do desenho de suas crianças. Eles devem ser capazes de ajudá-las, partindo de seu próprio conhecimento, sabendo lidar com esses novos aspectos, o que implicaria em ter que se re-ensinar hoje, toda uma geração criada na era da livre expressão, a entender, compreender e aceitar o que se propõe a partir de agora. Concordando-se com Gardner, acredita-se necessário haver uma boa compreensão por parte de todos, das potencialidades que o domínio da questão artística tem a oferecer ao indivíduo. Não somente quando ele é criança, mas também em sua vida adulta. Desenhar estimula a capacidade de enxergar além, perceber e não somente de ver. Enxergar as partes e entender como delas se faz o todo. Sintetizar, se necessário, detalhar, se preciso. Desenhar aumenta a percepção do homem sobre seu espaço, suas relações com o mundo, sua comunicação e entendimento de si mesmo. Acreditamos que o estudo, a compreensão e os resultados obtidos quanto ao desenho da criança está diretamente ligado à maneira com que o adulto vê e interage com o assunto. As posturas adotadas pelos pais e sistemas educacionais interferem na produção


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gráfica infantil, pois ela não tem como escapar das conseqüências do direcionamento que o adulto lhe dá, mesmo quando aparentemente ele procura a deixar livre. Por isso, o papel do adulto precisa ser muito bem definido e esclarecido. Professores e pais precisam entender urgentemente o peso que têm neste processo, para poderem agir de maneira a contribuir, orientar, e não limitar. Acreditamos que o ser humano tenha em si, mesmo que não demonstre, todas as capacidades. Seríamos como um grande armário cheio de gavetas, que contido nelas estão a habilidade de lidarmos com todos os tipos de conhecimentos neste mundo. Gardner teria apontado somente uma pequena parte dessas potencialidades. Nascemos com algumas dessas gavetas trancadas definitivamente por toda nossa existência. Mas elas estão ali. A maioria das pessoas as mantém assim, explorando apenas aquelas que já vem biológica e geneticamente predispostas a se abrirem. O meio também atua nesse processo, e percebemos isso claramente quando, por exemplo, à custa de muito esforço nos percebemos dominando e fazendo coisas que jamais imaginamos sermos capazes de realizar. São gavetas fechadas que foram abertas. A chave para abrirmos essas gavetas é o conhecimento, e assim acreditamos poder ser desenvolvida a habilidade gráfica no indivíduo. Ela já está lá, presente. Seríamos capazes de realizar qualquer tarefa, mas isso, infelizmente, às vezes fica limitado devido a fatores sociais, ambientais, distúrbios psicológicos, deficiências físicas e mentais. No que se refere à capacidade de desenhar, seguindo essa linha de raciocínio, concluímos que todos os indivíduos já nascem tendo essa gaveta semi-aberta. Afinal, todos fazem uso do desenho em sua infância, e cabe ao adulto proporcionar à criança a oportunidade de abri-la totalmente, explorando todo o potencial oferecido pelo fato de que essa gaveta já está em contato com o mundo e não trancada. O abandono do desenho que se verifica acontecer na adolescência, seria também o abandono do uso de uma linguagem. Estamos abdicando da possibilidade de nos


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expressarmos ao abandonarmos o desenho. Estamos permitindo que nossas crianças desistam de usar a expressão gráfica. E o pior, aceitamos isso como algo natural, afinal, se depois da adolescência o indivíduo não desenhar, é por que, realmente, ele não tinha o dom. A necessidade de representação do real, que se discute e não se concluiu até hoje, ser natural ou incutida na criança por uma questão sociológica, e a falta de direcionamento para que a criança seja capaz de realizar esse trabalho, nos trás o cenário visto hoje. O desenho é considerado uma habilidade somente ao alcance de quem já nasce para isso. Acreditamos que não, que o desenho é uma linguagem muito especial, assim como disse Mèredieu, e nos utilizarmos dela por toda a vida só poderia nos trazer benefícios. Buscou-se através dessa monografia o entendimento de um processo histórico de desenvolvimento de um tema e concluímos que esse objetivo foi alcançado. Agora, esta pesquisa levará o leitor se perguntar, “Mas, o que vem depois?”. O que será que está sendo discutido acerca desse assunto tão apaixonante exatamente agora, e que mexe tão profundamente conosco e com a nossa identidade. Afinal, todos já fomos crianças um dia e sem dúvida nenhuma, embora talvez não nos lembremos como, utilizamos o símbolo gráfico para nos expressarmos. E descobrir a quantidade de significados contidos neles, que nos contam histórias de nós mesmos, acaba por nos deixar tristes a lembrança que todo esse material está perdido lá no passado. Com certeza, o material dos nossos filhos será guardado e lido muitas vezes, pois a contribuição maior desse trabalho consiste em alertar os colegas professores e pais para o fato de que há um universo escondido no meio daqueles traços, pedaços de papel, lápis e giz, e que realmente vale a pena nos alfabetizarmos na língua que nos permite entender e participar desse universo.


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BIBLIOGRAFIA

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