Catálogo Otto Stupakoff - A expressão além do glamour

OT TO STU PA KO

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A EXPRESSÃO ALÉM DO GLAMOUR

IN DI CE

1 . INTRODUÇÃO 2. O ESTÚDIO 3. MODA E GLAMOUR 4. EXPRESSIVIDADE 5. REFERÊNCIAS

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1 . INTRODUÇÃO 2. O ESTÚDIO 3. MODA E GLAMOUR 4. EXPRESSIVIDADE 5. REFERÊNCIAS

IN TRO

DU ÇÃO

O interesse em realizar uma exposição voltada para a fotografia de Stupakoff, relacionando o cenário da moda brasileira e o seu anti-glamour, veio da apreciação da qualidade expressiva que os ensaios fotográficos do artista carregam. Vale constar que, segundo o próprio fotógrafo, teria sido ele o responsável pela primeira fotografia de moda autoral brasileira e assim, nasce as intrigantes questões: que tipo de fotografia é essa? E o que tem Otto de pioneiro?

A exposição Otto Stupakoff: a expressão além do glamour convida-nos a refletir acerca do papel valioso que o fotógrafo cumpre para a inserção do Brasil no cenário internacional da moda.

Para mais, busca-se refletir sobre como o valor de seu trabalho

Hotel St. Regis, “Harper´s Bazaar”, Nova York Data: 1972 Acervo MAM - doação do artista

escapa a foto única, residindo na poética da composição, que além de glamour, capturou instantes, emoções, movimentos, enfim, a expressão.

Dividida em três etapas, cada uma delas nos convida a vivenciar um pouco da mensagem colocada por Otto. Começando por uma imersão num ambiente aconchegante, como ele acreditava que um estúdio fotográfico deveria ser; passando o olhar logo após para a fase mais lucrativa de sua carreira, a fotografia da haute couture, na qual encontram-se ensaios feitos para Vogue das mais diversas nacionalidades, Harper’s Bazaar entre outras publicações influentes do mundo da moda. Tirando suas modelos do estúdio, jogando-as no urbano, traz-se o discurso de contraste entre o

glamour do figurino e o anti-glamour da metrópole.

A terceira, e talvez, mais importante parte da exposição, consiste em retratos e séries que carregam um ar espontâneo, uma naturalidade. Com ela, pretende-se contemplar as multifaces do artista e suas muitas viagens pelo mundo e experimentações no limite do abstracionismo, reconhecendo que apesar de ter feito seu nome em meio à indústria da moda, sua criatividade e paixão pelo sublime transpassam todo seu trabalho, seja esse publicitário ou experimental.

Júlia de Simoni Damante

ES TÚ DIO

Estúdio de Otto Stupakoff em Porto Alegre Data: 1964 Técnica: fotografia p&b Revista Módulo, 4a edição, 1964 (p.15 e 16)

(...) o estúdio com suas quatro paredes e seus fundos infinitos não o continha, não comportava sua personalidade exuberante e aventureira. Sua folha em branco haveria de ser preenchida no planeta todo, subordinada ao seu olhar obsessivo em busca da beleza, a qual sempre dizia perseguir. Por isso seu périplo pelo mundo.” (Wolfenson..)

Richard Avedon Data: 19 Técnica: fotografia p&b

Quando pensa-se acerca da fotografia de moda, logo vem à mente os estúdios, fundos infinitos, característicos dos ensaios performados pelos eminentes fotógrafos americanos Richard Avedon e Irving Penn, que tomavam corpo quase sempre em locações internas, onde se consegue minimizar os imprevistos. Otto Stupakoff, com sua personalidade exuberante e aventureira, por outro lado, não se restringiu às quatro paredes e fundos infinitos, uma vez que incorpora o improviso e a imponderabilidade como aspectos constituintes de seu processo de trabalho. Ainda assim, “para ele, o ateliê/estúdio era frequentemente seu porto seguro, um local fechado em si, protegido das variações do tempo, da imponderabilidade das cenas exteriores, do choque com a realidade

das ruas e, mais que tudo, palco para suas fabulações e esquetes, onde pôde exercer parte de sua variada e particular dramaturgia”.

(Wolfenson…)

Seu atelier, então, era composto como um “não estúdio”, um lugar de acolhimento e conforto, muito mais próximo a um ateliê de artista do que a um estabelecimento próprio à função profissional.

Alí, tinha seu refúgio, e fazia deles sua oficina de compilação de ideias e de exercício de suas aptidões.

Irving Penn Lisa Fonssagrives-Penn in Balenciaga Data: 1950 Arquivo da Conde Nast

Outro fotógrafo que inspirou o trabalho de Stupakoff foi Helmut Newton, que normalmente montava seus sets em hotéis de luxo ou nas ruas das famosas capitais europeias. Suas modelos eram altas e possuem formas alongadas, posavam na maior parte das vezes nuas e carregavam em si um caráter andrógino. Cada retrato comporta uma situação, convidando os espectadores a imaginar o antes e o depois de cada uma delas.(p.14)

Pode-se inferir que, no começo de sua carreira, o mercado da moda se encontrava ainda em desenvolvimento, o que permitiu

que ele atuasse como autor e inovador, com muito mais liberdade.

Ao final da década de 60, com a mediação de editores de moda, diretores de arte e clientes, o fotógrafo se vê inserido num novo contexto de trabalho com intensa profissionalização no segmento de produção de imagem de moda e Otto odiava a ideia de alguém determinar o que o fotógrafo deveria fazer. (Wolfenson…)

Helmut Newton esquerda: “Rue Aubriot” para Vogue.

Paris, França direita: Nova York, USA

Otto Stupakoff Sharon Tate, em Santa Mônica, “Harper´s Bazaar” Data: 1971

MO DA

GLA MOUR

Norman Parkinson Nena von Schlebrügge para Vogue Britânica Data: 1958

Edward Jean Steichen Greta Garbo Data: 1928 Silver gelatin print 10 x 8 inches

O início da fotografia de moda data do século XVIII, quando imagens de vestuário elegantes eram impressas nas revistas e, na maior parte das vezes, coloridas à mão. Paris constituía-se como o centro desse tipo de produção e também exportava para outros países europeus, como a Inglaterra. A técnica da fotografia surgiu por volta de 1830, e não demorou muito para que o métier de fotografia de moda se conformasse. Ainda assim, a impressão em massa só foi possível após o desenvolvimento do halftone printing, que se deu na primeira década do século XX.

Dada a dificuldade da grande divulgação para o público, as primeiras fotografias de moda consistiam em pessoas da aristocracia e atrizes usando suas próprias roupas. Foi apenas na déca-

da de 1930 que as fotografias entraram no ramo da publicidade.

Edward Jean Steichen foi um dos primeiros fotógrafos do ramo e teve uma importância significativa em transformar esse tipo de fotografia em algo mais ilustrativo e sensual do que uma mera divulgação do produto, afinal, “é através da propaganda, da publicidade comercial nos jornais e revistas, principalmente, que se forma o gôsto do público em nossos dias” (Wolfenson..)

Otto Stupakoff Data: 1964 Técnica: fotografia p&b

Na década de 1940, Norman Parkinson chega ao mundo fashion com uma nova perspectiva: “As mulheres das fotografias deles (referências aos seus precursores, como Steichen) eram rarefeitas, um punhado elitista. Minhas mulheres se comportavam de maneira distinta — elas dirigiam carros, iam às compras e tinham filhos. Eu queria capturar esse lado das mulheres. Eu as queria nos campos, pulando sobre montes de palha, não acredito que elas precisavam ter os seus joelhos pregados um ao outro.

Sempre havia espaço em uma revista para a fotografia proveniente de estúdios cheirosos, com pisos de mármore, com lírios caindo de grandes vasos de flores, mas também havia espaço para o meu tipo de fotografia” 1(p.10) Assim, foi um dos responsáveis por revolucionar a fotografia de moda na Europa, tirando suas modelos do estúdio rígido e colocando-as ao ar livre, na cidade, num cenário muito mais dinâmico e propício para a espontaneidade.

Durante a década de 50, quando Otto Stupakoff começava a trilhar os primeiros passos de sua carreira, o fotógrafo que sintetizava a direção que a fotografia de moda estava tomando no pós-Guerra era Richard Avedon que, com seu viés modernista, trouxe o inesperado para a haute couture.

1 But the women in their photographs were a rarefied few, an elitist handful. My women behaved quite differently - they drove cars, went shopping, had children and kicked the dog. I wanted to capture that side of women. I wanted them out in the fields jumping over the haycocks - I did not think they needed their knees bolted together. There was always room in a magazine for the scent-laden marble-floored studios with lilies falling out of great bowls of flowers. but there was also room for my sort of photography.”

Otto Stupakoff Duda Cavalvanti Data: 1964 Rio de Janeiro, RJ, Brazil

Richard Avedon Data:

Foi ao final dessa década que Otto faz uma viagem ao Rio de Janeiro junto com a modelo e sua então companheira Duda Cavalcanti, e produz aquela que ele reivindicou como a primeira fotografia autoral de moda do país.

“Jamais havia visto uma foto de moda publicada no Brasil, antes de eu fazer a primeira. Pedi ao Dener (Pamplona, estilista) um vestido emprestado. Coloquei na mala, peguei um ônibus para o Rio de Janeiro, combinei com minha namorada, Duda Cavalcanti, e fomos para a casa do Heitor dos Prazeres, amigo pintor e sambista, que morava numa casa art nouveau. Nesse terraço, coloquei a Duda com o vestido do Dener, que ele havia feito. Era um vestido branco e azul-marinho. Nesse dia, no terraço da casa de Heitor, a Duda vestindo Dener, foi feita a primeira foto de moda no Brasil. Essa foto, que fiz para mim (mesmo), nunca foi publicada”. A foto que Otto descreve em uma entrevista, nunca identificada com precisão, é representada por esta imagem ao lado, também com sua musa Duda Cavalcanti. “

Otto Stupakoff Duda Cavalvanti Data: 1964 Rio de Janeiro, RJ, Brazil

- Otto Stupakoff citado em ALLEONI, 2012, p. 82 Otto Stupakoff Duda Cavalvanti, Ensaio para a Rhodia Data: 1964 São Paulo, Brasil

Em 1961, seguindo a lógica proposta por Parkinson nos anos 40, tira-se as modelos do estúdio e coloca-as na cidade, junto a outras personalidades da época e assim, é realizado o maior encarte sobre moda veiculado na imprensa do país até aquele momento, com 24 páginas, intitulado “A Personalidade da Moda para o Inverno”. (Revista Manchete, 1961, p. 6). Constituiu-se como uma campanha para a Rhodia e, além da Revista Manchete, as imagens foram publicadas nas revistas O Cruzeiro, jornalística, e nas femininas Jóia e Claudia, esta última lançada no mesmo ano de 61 como a primeira revista feminina do Brasil.

A composição apresentou enorme repercussão pelos retratos de personalidades como Tom Jobim, Jorge Amado, Oscar Niemeyer, Manabu Mabe e Millôr Fernandes, fotografados ao lado das principais modelos da época. Pode-se dessa maneira, trazer a discussão de cotidianização da moda, que já estava posta a mais de duas décadas no âmbito internacional no Brasil.

Otto Stupakoff Campanha para a Rhodia A Personalidade da Moda para o Inverno”.

Data: 1961

Otto Stupakoff Kristi Hager, Castelo de Lindenhurst, “Harper´s Bazaar”, Nova York Data: 1970

Otto Stupakoff Leslie Bogart, filha de Humphrey Bogart e Lauren Bacall, “Harper´s Bazaar” Edificio Dakota, Nova York Data: 1967 Otto Stupakoff Puerto Vallarta, México Data: 1974

EX PRES SÃO

“De nossa parte, somos testemunhas da invariável tenacidade do artista, de sua consciência em busca do extremo limite da beleza. Assim nascem as verdadeiras obras de criação, pois essa última luz, a mais bela e verdadeira, Otto traz em seu coração, resulta de seu amor à vida” (p..)

Otto Stupakoff Amor Oriental Data:

Nesse contexto, destaca-se a produção paralela de Stupakoff, as imagens que contém temática voltada sobre nu e a beleza feminina, expressão maior de sua busca pela beleza, feitas em sua maioria em ensaios não comissionados, ao registrar pessoas com quem mantinha um relacionamento próximo e afetivo.

“Fotografou-as em sessões realizadas em seus estúdios ou em sua casa, com um olhar único e sensual, tentando exaurir todas as possibilidades do encontro, produzindo de forma visceral”.

(Wolfeson…)

Uma referência evidente e determinante nas imagens do universo feminino de Otto foi Balthus, o pintor francês de origem polonesa (1908-2001), que costumava retratar nus de mulheres na fase de transição para a vida adulta, além de outras grandes influências como os pintores Paul Gauguin, Van Gogh, e Henri Rousseau.

Nesse tipo de produção fica evidente a intenção do fotógrafo em optar por motivos de sua vida cotidiana, ressaltando um detalhe ou outro através de uma composição determinada.

“Uma pessoa ou um animal que passa, um pedaço de rua ou de casa, etc. Nada acentuadamente dramático ou grandioso, em si.

Tento fazer ressaltar o dramático ou o original nas coisas mais simples.” (p.15)

Na naturalidade das cenas por ele orquestradas, conduzidas da maneira mais orgânica e improvisadamente possível, dentro de um contexto quase que de brincadeira, deu vida a momentos fugazes, tomando como lema a célebre frase de Frank Horvat, pioneiro mundial na fotografia de moda: “a fotografia como a arte de não pressionar o botão”, que poderia igualmente ser atribuída à Stupakoff

Contemplando essas obras, pode-se afirmar que o fotógrafo foi muito mais do que apenas um ícone da fotografia de moda autoral.

Como por ele mesmo colocado: “Fotografei uma campanha de tintas buscando na natureza suas cores, para a Vasp fotografei crianças nas vinte e nove cidades que ela servia, [fiz] anúncios para o lançamento do Alfa Romeo e ainda assim me chamam de fotógrafo de moda.”

Otto Stupakoff Homenagem a Balthus, “Glamour”, (Nova York) 1977

Otto Stupakoff Balthus, “Harper´s Bazaar”, New York Data: 1970

Balthus Thérèse rêve, 1938

Balthus Thérèse sur une banquette, 1939.

BIO GRA FIA

Nasceu em 28 de junho de 1935, em São Paulo, no bairro do Tatuapé, descendente dos Cunha Bueno por parte de mãe e de russos, alemães e italianos pelo paterno. Aos 10 anos muda-se com a família para Porto Alegre. Cinco anos mais tarde, abandona os estudos e se torna piloto civil, concomitantemente, passa a se interessar por cinema e compõe seu primeiro curta-metragem: Missão. A aproximação do fotógrafo com a fotografia era de caráter lúdico, “Fotografava paisagens, meu cachorro, as coisas que eram importante para mim!” (p.3 d’art)

No início da década de 50, muda-se para os Estados Unidos com intuito de estudar na Art Center College of Design em Pasadena, na Califórnia. Durante os três anos que passou cursando o Bachelor Professional Arts teve contato com pintores, artistas de diversas formas de expressão como como Ansel Adams, Minor White, Edward Weston, Dorothea Lange, Imogen Cunningham, Lisette Model e Nancy e Beaumont Newhall, o que enriqueceu notavelmente seu repertório pessoal. Além do mais, o curso “ensinava fazer tudo” o que foi ótimo quando retornou para o Brasil, pois possuía a técnica para fazer desde publicidade a ensaios fotográficos. ainda trabalha como correspondente da revista Manchete em Hollywood.

“O professor faz uma ligeira explanação de modos e meios de se obter uma fotografia e, em seguida, determina um assunto para a classe. Os alunos executam o trabalho e, por meio da crítica e da comparação dos resultados obtidos, corrigem-se os erros e aperfeiçoam-se qualidades” Wolfenson p.16

Após o término do curso volta para Porto Alegre e sente a necessidade de ter um estúdio, visto que naquele momento estava acostumado em trabalhar dessa maneira. Com a colaboração de Max Hermann Schlupmann, desenhou o projeto da construção, embora pouco conhecesse de arquitetura, uma de suas paixões.

A pequena casa consta das seguintes peças: estúdio, dois laboratórios, quarto e banheiro. Com verdadeiro senso de arquiteto, Stupakoff procurou tirar partido do terreno, das árvores e da proximidade de um rio. O piso do estúdio foi construído em interflex sobre asfalto e pregado em armação de vigas de madeira. Os vidros são foscados com jato de areia, sendo do mesmo material a claraboia. “ p16. Seu pai financiou o empreendimento que, depois de pronto foi fotografado por Stupakoff, o que rendeu até uma publicação de quatro páginas na edição n°4 da revista Módulo, coordenada por Oscar Niemeyer. Contudo, apesar da grande qualidade arquitetônica, logo após que a obra foi concluída Otto se deu conta que não havia trabalho.

Em 1956, após essa tentativa frustrada de se estabelecer em Porto Alegre, vai ao Rio de Janeiro, onde começa a se afirmar profissionalmente com trabalhos como fotografia para capas de disco e monta sua primeira exposição. Passa a fazer parte da idade da pedra da fotografia publicitária.Permanece lá, sem estúdio, por uns três anos.

Em 1957, volta à São Paulo, sua cidade natal, onde abre um estúdio na Praça da República, mais precisamente na Avenida Ipiranga, em cima da joalheria Casa Castro. Analogamente ao seu trabalho autônomo, fecha um contrato com a Standard Propaganda, o que fez com que seu estúdio ficasse subutilizado, visto que seus ensaios eram realizados no último andar da Standard Propaganda e, quando esse espaço não era o suficiente, valia-se da locação do Teatro Cultura Artístico. Nesse contexto, se consagra como fotógrafo de campanhas publicitárias e sonhava em fotografar mulheres em imagens tão sublimes quanto “quadros de natureza morta”.

“me ensinou a iluminar vidro por transparência, metal por reflexo, a combinação dos dois e daí pra frente (...)”

Foi nessa fase que também fechou uma parceria com a Rhodia, onde encontrou a possibilidade e os insumos para explorar seu eu artístico. Como colocado por Bob Wolfenson: “sua obra não cabia em fotos emolduradinhas de páginas inteiras, ou simplesmente uma atrás da outra, numa sequência lógica. era preciso dar conta dessa personalidade em constante erupção” (p.17) e a Rhodia, inicialmente, permitiu que ele explorasse isso. Até os anos 50, os anúncios de moda da Rhodia eram de tinta nanquim, eram desenhos de moda e mesmo assim, tinham caráter cinemático, as pessoas esperavam o lançamento da revista como se fosse um filme. Segundo Otto, toda essa liberdade se deve à Lívio Rangan, “foi ele que, encantado com o que viu, do que eu já tinha feito, me deu toda a trela possível para eu poder trabalhar em cima e criar”(p.9). Assim, nunca houve layout algum para a Rhodia.

Os dois — Otto e Lívio — se juntaram a Licínio de Almeeida e formaram uma equipe de trabalho. “As ideias visuais, estéticas de beleza vinham de mim; a parte comercial vinha de Lívio e a parte de direção de arte vinha de Licínio” (p.10)

Apesar dessa grande liberdade proporcionada, continuavam tendo que respeitar alguns limites: possuíam de seis a doze páginas por anúncio, o que muitas vezes tornava-os rígidos — “a gente tentava fotografar em movimento e não podia usar a foto porque dava problema”.

Em 1958 saiu da Standard para montar seu próprio estúdio, “para poder exercer minha profissão com um pouco mais de amplitude” (p.10), visto que a relação com a Rhodia o estava sufocando.

Na Rua Frei Caneca 1348, adquiriu uma casa antiga, de estilo colonial português, situada num grande terreno. Na parte de trás, construiu um hangar, que passara a ser o estúdio, enquanto a casa servia de recepção. Contava com uma equipe de nove pessoas, trabalhando o dia todo.

Naquela época, encontrar modelos para serem fotografados era tão difícil quanto a aquisição de insumos para fazer a fotografia. “Produtos químicos não havia mesmo. Não tinha modelo, não tinha filme, não tinha revelador, não tinha nada.”. E quando encontrava modelos disponíveis, elas não tinham prática, o que foi incorporado como uma vantagem em sua obra: “aquele modelo que pensa enquanto está sendo fotografado e que vive a cena como se estivesse em uma peça é muito raro” (p.11)” Dessa forma, através desses imprevisíveis acontecimentos, nascia a verdadeira essência do seu trabalho. seu gosto pelos imprevisíveis acontecimentos criados por modelos e/ou atores a partir de uma direção sua” (p.16)

Paralelamente, realizou um incrível trabalho pessoal com retratos de artistas que indiretamente poderiam servir como fonte de renda, um trabalho de prestígio ou até mesmo forma de pagamento, permitindo que o fotógrafo trocasse seus retratos por obras dos outros artistas. Se dedicava também às colagens, como uma maneira de manter a integridade de seu trabalho. “ (...) sem comercialização nenhuma. Então, a colagem era a maneira pela qual eu me expressava, expressava meu inconsciente” (p.12) Como fonte de inspiração, tinha seu amigo Wesley Duke Lee, artista plástico brasileiro.

Otto Stupakoff Kolkotta, Jardim Botânico Data: 2004 Técnica: papéis colados sobre papel

Otto Stupakoff Rei Changragupta Data: 2004 Técnica: papéis colados sobre papel

Otto Stupakoff A fortaleza branca Data: 2004 Técnica: papéis colados sobre papel

No início da década de 60, passa a fazer editoriais para a Revista Cláudia, pertencente à Editora Abril.

“A Abril era a forma, como ainda é hoje, de me tornar mais conhecido” (p.12). Durante essa experiência, conhece Luís Carta e Thomaz Souto Corrêa, com quem realizou alguns trabalhos de estilo freelancer de ilustração para contos e histórias.

Em 1965, muda-se para Nova York, e dá-se início a fase mais produtiva de sua carreira, que se estendeu até os seus anos parisienses. Recomeça a carreira fotografando novamente capas de LP, desta vez para a Columbia Records, além de compor conjuntos menos conhecidos de retratos, nus, instantâneos de rua, fotografias de suas muitas viagens pelo mundo e experimentações no limite do abstracionismo.

Teve contato com fotógrafos como Richard Avedon, Irving Penn, Art Kane, Alexey Brodovitch e logo começou a fotografar para a Harper’s Bazaar. Em 1967 - primeiro ensaio de moda para Harper ‘s Bazaar - Leslie Bogart depois disso sua carreira editorial decolou - outras revistas publicações como Look, Esquire e Glamour.

Seu trabalho com a renomada publicação de moda americana começou de forma inesperada: Bea Feitler, designer e diretora de arte brasileira, ligou para ele e perguntou se ele poderia vir ao Plaza Hotel num prazo de trinta minutos para fotografar Oskar Werner, um dos protagonistas do filme “Jules et Jim” de François Truffaut, que já estava de saída do Hotel. Segundo Otto, “o meu estúdio ficava cinco minutos a pé dali, distância que eu fiz, provavelmente em dois minutos, correndo com a minha 35mm”.

Entre 1972 e 1976 se radica em Paris, onde começa a trabalhar para a Vogue nas suas edições francesa, italiana, alemã e inglesa, além de Elle e Marie Claire. realizando editoriais de moda marcantes, como um número especial sobre Baden-Baden, na Alemanha, e em conjunto com os principais nomes da alta-costura e do prêt-à-porter, como Emanuel Ungaro, Christian Dior, Yves Saint Laurent e Givenchy. Produziu editoriais de moda ao lado dos fotógrafos Guy Bourdin, Frank Horvat, Helmut Newton e Philippe Halsman, entre outros. Essa intensa atividade para a Vogue, entre 1972 e 1975, o levou a ser listado no rol de fotógrafos que integraram a publicação Vogue 100: A Century of Style.

Decide em 1981 se estabelecer definitivamente em Nova York, onde atua intensamente nos anos 1980 e 1990 fotografando para revistas e realizando projetos como o livro Art to Wear, de Julie Schafler Dale, de 1992, a documentação sobre as vítimas do Khmer Vermelho no Camboja para o fundo humanitário Cambodja Trust, em 1994, e muitas viagens pelo mundo, incluindo quatro viagens ao Ártico.

Em 2005 é montada a exposição-homenagem “Moda Sem Fronteiras”, organizada e curada por Wolfenson, com assistência de Lazlo é montada no âmbito da São Paulo Fashion Week daquele ano.