QUE TIPO DE MESSIAS É JESUS? BORTOLINE, José - Roteiros Homiléticos Anos A, B, C Festas e Solenidades - Paulus, 2007 * LIÇÃO DA SÉRIE: LECIONÁRIO DOMINICAL * ANO: B – TEMPO LITÚRGICO: 24° DOM. COMUM - COR: VERDE
I. INTRODUÇÃO GERAL
7. Para nós, hoje, quem é esse servo sofredor? O critério para discernir parece ser este: a vida do povo. Todos os que lutam pela 1. Celebrar a Eucaristia é fazer memória da paixão, morte e res- vida do povo - e por causa dessa luta correm sérios riscos - são esse surreição de Jesus. Ele é o Messias, mestre, profeta e revelador do servo de Javé. projeto de Deus. Seu messianismo é marcado pelo sofrimento, morte e ressurreição, com os quais destrói a sociedade injusta que devora 8. A liturgia escolheu esse texto para relacioná-lo com o primeiro vidas humanas. Jesus é o Messias que chama as pessoas ao compro- anúncio da paixão no evangelho de Marcos e para salientar o messiamisso com seu projeto, Ser discípulo dele é fazer as mesmas coisas nismo de Jesus. Ele é o Messias porque dá a vida pelo povo, enfrenque ele fez para libertar o mundo da ganância que mata. Por isso, tando um tribunal iníquo que o levou à morte. Mas a vitória da justiça celebrar não é só fazer memória das ações libertadoras do Messias, não tardou em se manifestar, pois o Pai ressuscitou a Jesus de entre mas atualizá-las na prática concreta, pois a fé sem as obras é morta, À os mortos, tornando-o assim fonte de vida para todos os que assumem medida que celebramos, vamos crescendo na consciência de que o como própria a tarefa de serem, hoje, "servos de Javé". projeto de Deus nos chama ao compromisso. Celebrar a fé é encherse de força para enfrentar tudo o que impeça a vida e a liberdade do Evangelho (Mc 8,27 -35) : Jesus é o Messias ser humano. 9. Já salientamos, nos domingos anteriores, qual o objetivo do
evangelho de Marcos: sendo o primeiro texto de discipulado (catequese) da comunidade primitiva, tinha como finalidade principal 1ª leitura (Is 50,5-9a): Missão do servo sofredor responder à pergunta "Quem é Jesus?" Descobrindo, ao longo do texto, quem ele é, os que iniciavam sua caminhada de fé eram leva2. Estamos diante de um texto do Segundo Isaías (capítulos 40- dos a se confrontar com ele, percebendo assim o que significa ser 55). A perícope é chamada de "terceiro canto do servo de Javé". Os cristão. É a segunda e fundamental pergunta que atravessa todo o cantos estão assim distribuídos: 1º canto: 42,1-9; 2° canto: 49,1-6; 3° evangelho de Marcos. canto: 50,4-11; 4° canto: 52,13-53,12. 10. O evangelho de Marcos consta de duas partes, quase iguais em 3. Ao lermos qualquer um desses cantos surge logo a mesma tamanho. A primeira parte termina em 8,30, com a solene declaração pergunta feita pelo eunuco a Filipe: "De quem o profeta está falando: de Pedro: "Tu és o Messias" (8,29). De fato, logo a seguir (8,31), de si mesmo ou de outro?" (At 8,34). A resposta não é fácil. Até o temos novo começo: "Jesus começou a ensiná-los". A finalidade da momento, as opiniões dos estudiosos podem ser sintetizadas em primeira parte do evangelho era a de levar ao reconhecimento de que quatro tipos de interpretação de quem seja o servo sofredor: a. Inter- Jesus é o Messias (cf 1,1). E a finalidade da segunda parte é explicitar pretação coletiva: tratar-se-ia do povo de Israel; b. Interpretação que tipo de Messias é Jesus. Se a primeira parte desse evangelho individual: o servo sofredor seria uma pessoa anônima; c. Interpreta- começava no deserto, a segunda é o início do "caminho para Jerusação mista: ele seria ora Israel como um todo, ora um grupo de pesso- lém", o lugar do grande confronto com o poder econômico, político, as, ora uma pessoa só, como, por exemplo, o próprio profeta; d. religioso e ideológico centrado no Templo. A partir do momento em Interpretação messiânica: os cantos falariam de um messias do futu- que os discípulos, na pessoa de Pedro, reconhecem que Jesus é o ro ideal. Segundo os autores do Novo Testamento, esse futuro ideal Messias, inicia nova etapa, na qual o Mestre se dedica quase que encontrou perfeita realização em Jesus. exclusivamente aos discípulos, mostrando-lhes o caráter de seu mes4. O nosso texto - parte do terceiro canto pertence a uma seção sianismo e provocando-os a um compromisso maior com ele e com maior, que abrange os capítulos 49-55, e cujo tema central é a restau- sua causa. É na segunda parte do evangelho que encontramos os três ração e glorificação de Jerusalém, a cidade-esposa de Javé. Os exila- anúncios da paixão. Daqui em diante, Jesus insistirá muito para que dos usando linguagem de contexto matrimonial - se queixam de que seus discípulos renunciem a si próprios, tomem a própria cruz e o Deus tenha repudiado sua esposa (Jerusalém) e vendido seus filhos sigam. II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
como escravos. A resposta de Javé (50,1-3) precede imediatamente o a. Chegar a uma síntese de quem é Jesus (vv. 27-30) terceiro canto do servo sofredor. Embora não se saiba quem seja esse servo, podemos, pelo contexto que o antecede, perceber claramente 11. Passando pelos povoados de Cesaréia de Filipe (v. 27), Jesus qual seja sua missão: a de mostrar, à custa das ofensas e da própria está com seus discípulos a caminho de Jerusalém, onde acontecerá o condenação, que o amor de Javé é perene. desfecho final, onde realizará plenamente seu messianismo (cf 15,39. "Verdadeiramente este homem era Filho de Deus"). A pergunta feita 5. Os vv. 4-7 mostram o que Javé faz para o servo em vista do aos discípulos: "Quem dizem os homens que eu sou?" (v. 27) tem a bem do povo, e a responsabilidade do servo, plenamente obediente e função de levar seus seguidores a uma síntese daquilo que ele é. A fiel: O Senhor Javé (a expressão é repetida quatro vezes: vv. 4.5.7.9) resposta dos discípulos denota que as pessoas não chegaram a descodá ao servo uma língua de discípulo, para que possa levar conforto ao brir a identidade de Jesus: ele acaba sendo comparado a João Batista, povo; abre-lhe os ouvidos para que aprenda, como discípulo, a a Elias e a algum dos profetas (v.28). João Batista e Elias são persotransmitir o que ouviu, e lhe dá proteção. Em outras palavras, prepa- nagens clássicas que preparam caminhos. Jesus não é visto como ra-o e capacita-o para a missão. O servo, por sua vez, para não trair o coroa de um processo, mas como simples "precursor". Da opinião do conteúdo da mensagem, dá as costas aos que o torturam, isto é, não povo passa-se à convicção dos discípulos: "E vocês, quem dizem que oferece resistência; toma a iniciativa de oferecer a face aos que lhe eu sou?" (v. 29). A resposta de Pedro, representando os discípulos, é arrancam os fios da barba (ter a barba arrancada é sinal de grande a grande profissão de fé que encerra a primeira parte do evangelho de humilhação; o servo não liga para a perda da honradez); não esconde Marcos: "Tu és o Messias" (v. 29), ou seja, é a coroa, o ponto alto, a o rosto à ofensa maior. injúrias e escarros. O rosto manifesta os sen- realização das expectativas, o anunciado pelos "precursores". A timentos e desejos de uma pessoa. Torná-lo duro como pedra (v. 7) é palavra Messias (Christós, em grego), sintetiza o que Jesus é e faz: não levar em conta qualquer espécie de ofensa, em vista da opção mestre, profeta e revelador, com plenos poderes, ungido pelo Espírito assumida. de Deus (cf. 1,10). A palavra Messias suscitava grande expectativa 6. Nos vv.8-9a situação do servo se agrava. Sua mensagem atingiu política. Pedro parece reunir todas as esperanças populares na chegaas estruturas de poder opressoras. Além da difamação, perseguição e da de um líder político restaurador da realeza em Israel. Será que tortura, o servo será conduzido ao tribunal. O contexto desses versí- Pedro "enxergou" algo novo em Jesus, ou continua "cego" como o culos é o de um tribunal montado para eliminar, por meio de acusa- cego da cena anterior? (Cf evangelho do domingo passado.) ções falsas, aquele que procurava reerguer o povo desesperançado. 12. Assim encerra-se a primeira parte do evangelho de Marcos. Mesmo assim, o servo tem absoluta convicção de que a mentira não Contudo, é preciso ainda entender que tipo de Messias é Jesus. Por prevalecerá, porque seu advogado de defesa é Javé. isso ele recomenda silêncio aos discípulos (v. 30). Seu messianismo