Entrevista Tempo de Medicina

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Miguel Guimarães recusa instituição que apenas reage a notícias que vão aparecendo

Arquivo «TM»

«A Ordem tem que ser mais proactiva e deve marcar alguma agenda política» Três anos depois de ter sido eleito, Miguel Guimarães perfila-se de novo como candidato à presidência do Conselho Regional do Norte (CRN) e com a garantia de permanecer no cargo. Um pouco cansado mas pronto para assumir funções, tem como mote de campanha o apelo a uma forte participação eleitoral e, mesmo em tempos difíceis, «não desistir de lutar» Manuel Morato

Disposto a abrir a Ordem aos distritos médicos, o urologista acha que a instituição deve marcar mais a «agenda política». Tido em alguns círculos como elegível numa futura candidatura a bastonário, garante que isso não está nos seus projectos, mas «quando chegar à altura logo se verá» «TM» — Depois de um mandato em que a gestão da Ordem não se afigurou fácil, sente-se motivado para um novo desafio? Miguel Guimarães (MG) — Quem está na Ordem dos Médicos e leva o cargo a sério, encara isso como uma missão pública. É certo que temos lutado muitas vezes, e algumas delas sem sucesso, e isso é desmotivador. No entanto, estamos relativamente bem colocados, até porque assumir a presidência deu-nos um know-how que não tínhamos antes. Como agora a perspectiva de as coisas se alterarem desfavoravelmente é maior do que há anos atrás, achei que não podia desistir perante o repto que os colegas me lançaram e senti-me na obrigação de dizer “sim”. «TM» — Que significado vê no facto de ser o único candidato à presidência do CRN? MG — Isso pode ser positivo. Pode querer dizer que se trabalhou relativamente bem, que os colegas reconheceram que o trabalho foi esforçado, e que valeu a pena, e não justificaria candidatarem-se agora; ou pode significar que as pessoas estão completamente desmotivadas com as instituições que representam os médicos neste momento. É verdade que em Coimbra e Lisboa há duas listas candidatas, mas também só há um candidato a bastonário. Para mim, o significado é irrelevante, embora as pessoas especulem. No fundo, mais do que relevar haver ou não mais do que uma

lista, dou relevância — isso sim — a outro facto: à participação eleitoral. Esse tem sido, de resto, o mote da campanha.

O que pode melhorar «TM» — Atendendo ao programa de acção, acha que alguma coisa pode ser melhorada no próximo mandato? MG — Acho que o segundo mandato da Ordem deve ser caracterizado por uma acção mais proactiva, porque tem sido mais reactiva que proactiva, ou seja, reage às notícias que vão aparecendo. É certo que isto vai continuar a acontecer, porque quando sai uma notícia os jornalistas querem saber a opinião do bastonário. Mas acho que, nas questões essenciais, a Ordem tem que ser mais proactiva e, no fundo, deve marcar alguma agenda política no sector da saúde em áreas essenciais que lhe dizem mais respeito. «TM» — Falamos de que tipo de questões? MG — Estamos a falar das questões da qualidade, que são transversais a muitas matérias. Muitas vezes pensamos em qualidade em termos de indicadores de patologia, etc., mas os primeiros indicadores vão mais longe, como por exemplo, as condições em que os médicos exercem a actividade, em que fazem consulta. Há médicos que estão a ver muito mais doentes do que deviam — às vezes em duas horas vêem-se mais de 20 doentes — e isto é praticamente impossível. A Ordem tem que definir, como critério fundamental, aquilo que são os tempos de consulta. «TM» — Que articulação pretende fazer com os conselhos distritais? MG — Neste mandato vamos abrir a Ordem completamente aos distritos, que vão ter toda a liberdade para agir, vão continuar a ser estimulados, mas agora os

Miguel Guimarães: «Mais do que relevar haver ou não mais do que uma lista, dou relevância — isso sim — a outro facto: à participação eleitoral»

Programa apela para a «autonomia da Medicina» e defesa do acto médico 4

«Defender a dignidade dos médicos e da Medicina», «defender os direitos dos doentes ao acesso à Saúde», «defender a qualidade e autonomia da Medicina e do acto médico», «defender a inviolabilidade das competências médicas», «defender a ética e deontologia da profissão», «defender a eficácia e transparência dos mecanismos de auto-regulação médica», «defender e unir os médicos» são os «pilares fundamentais» do programa de candidatura (Lista A) aos Corpos Gerentes da Secção Regional do Norte para o triénio 2014-2016, que tem como lema «Defender os médicos e os doentes, consolidar reformas, preparar o futuro». No manifesto entretanto divulgado («Pela defesa da Medicina que escolhemos quando decidimos ser médicos»), a Lista A admite «não desistir de lutar» pelo SNS, carreiras e formação médica, pela qualidade da Medicina e cuidados de saúde, pela qualificação, respeito pelas competências médicas, pelo futuro dos jovens médicos e pela solidariedade inter-pares

Miguel Guimarães: «Vamos abrir e Ordem completamente aos distritos, que vão ter toda a liberdade para agir, vão continuar a ser estimulados, mas agora passam a participar nas reuniões do Conselho Regional»

distritos do Porto, Braga, Bragança e Vila Real passam a ter assento e a participar nas reuniões do Conselho Regional. Passam a estar a par de tudo que se está a passar na Ordem, participam nas decisões e vão-lhes ser dadas coisas para fazer. Além disso, já começámos a descentralizar — o Juramento de Hipócrates este ano, pela primeira vez na história, foi feito em Braga, e correu muitíssimo bem. Este primeiro passo já foi dado.

«Não estou a trabalhar para ser bastonário» «TM» - O que o levou a apoiar a recandidatura do bastonário? MG — Apoiamos porque achamos que fez um trabalho globalmente bom, com muitos aspectos positivos e outros provavelmente negativos, como nós, mas maioritariamente positivos, e por isso merece completamente a nossa confiança. «TM» — Tem sido apontado, em alguns círculos, como um candidato potencialmente elegível para bastonário dos médicos. Como encara essa possibilidade? MG — Acho que a questão é muito precoce. Falava-se nisso aqui no Norte mas tive o cuidado, há vários meses atrás, de dizer ao professor José Manuel Silva que lhe ia dar o meu total apoio e que não me ia candidatar — e não ia mesmo. Não faz parte dos meus objectivos ser bastonário, ou dito de outra forma, não estou a trabalhar para ser bastonário. «TM» — Mas, a este propósito, usaria a frase “o futuro a Deus pertence”? MG — Sim, o futuro a Deus pertence, nunca se sabe o que pode acontecer. Quando chegar a altura logo se verá. Versão alargada em www.tempomedicina.com

2 de Dezembro de 2013 • Tempo Medicina


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