Jornal Umbanda Brasil Ed. Nanã

Page 3

14 | Jornal Umbanda Brasil

Espaço Afro-Brasileiro

Julho 2018 Por

Bàbálòrísá Mauricio D’ Òṣàgiyán

Nanã Deusa Dos Mistérios religiosos, e nesse momento Nana faz-se compreender, pois nos primórdios da História os mortos eram enterrados em posição fetal, remetendo a uma ideia de nascimento ou renascimento. O homem primitivo entendeu que a morte e a vida caminham juntas, entendeu os mistérios de Nana. Nana é o princípio, o meio e o fim; o nascimento, a vida e a morte. Ela é a origem e o poder. Entender Nana é entender o destino, a vida e a trajetória do homem sobre a terra, pois Nana é a História. Nana é água parada, água da vida e da morte. Nana é o começo porque Nanã é o barro e o barro é a vida. Nana é a dona do axé por ser o orixá que dá a vida e a sobrevivência, a senhora dos ibás que permite o nascimento dos deuses e dos homens. Nana pode ser a lembrança angustiante da morte na vida do ser humano, mas apenas para aqueles que encaram esse final como algo negativo, como um fardo extremamente pesado que todo o ser carrega desde o seu nascimento. Na verdade, apenas as pessoas que têm o coração repleto de maldade e dedicam a vida a prejudicar o próximo se preocupam com isso. Aqueles que praticam boas ações vivem preocupados com o seu próprio bem, com a sua elevação espiritual e desejam ao próximo o mesmo que para si, só esperam da vida dias cada vez melhores e têm a morte como algo natural e inevitável. A sua certeza é a imortalidade da sua essência. Nanã, a deusa dos mistérios, é uma divindade de origem simultânea à criação do mundo, pois quando Odudua separou a água parada, que já existia, e liberou do “saco da criação” a terra, no ponto de contato desses dois elementos formou-se a lama dos pântanos, local onde se encontram os maiores fundamentos de Nana.

Nana, a mãe maior, é a luz que nos guia, o nosso quotidiano. Conhecer a própria vida e o próprio destino é conhecer Nana, pois os fundamentos dos orixás e do

Senhora de muitos búzios, Nana sintetiza em si morte, fecundidade e riqueza. O seu nome designa pessoas idosas e respeitáveis e, para os povos Jeje, da região do antigo Daomé, significa “mãe”. Nessa região, onde hoje se encontra a República do Benin, Nana é muitas vezes considerada a divindade suprema e talvez por essa razão seja frequentemente descrita como um orixá masculino.

É na morte, condição para o renascimento e para a fecundidade, que se encontram os mistérios de Nana. Respeitada e temida, Nana, deusa das chuvas, da lama, da terra, juíza que castiga os homens faltosos, é a morte na essência da vida.

Sendo a mais antiga das divindades das águas, ela representa a memória ancestral do nosso povo: é a mãe antiga (Iyá Agbà) por excelência. É mãe dos orixás Iroko, Obaluaiê e Oxumaré, mas por ser a deusa mais velha do candomblé é respeitada como mãe por todos os outros orixás. A vida está cercada de mistérios que ao longo da História atormentam o ser humano. Porém, quando ainda na Pré-História, o homem se viu diante do mistério da morte, em seu âmago irrompeu um sentimento ambíguo. Os mitos aliviavam essa dor e a razão apontava para aquilo que era certo no seu destino. A morte faz surgir no homem os primeiros sentimentos

Candomblé estão ligados à vida. A nossa vida é o nosso orixá.

Características dos filhos de Nanã Os filhos de Nana são pessoas extremamente calmas, tão lentas no cumprimento das suas tarefas que chegam a irritar. Agem com benevolência, dignidade e gentileza. As pessoas de Nana parecem ter a eternidade à sua frente para acabar os seus afazeres; gostam de crianças e educam-nas com excesso de doçura e mansidão, assim como as avós. São pessoas que no modo de agir e até fisicamente aparentam mais idade. Podem apresentar precocemente problemas de idade, como tendência a viver no passado, de recordações, apresentar infecções reumáticas e problemas nas articulações em geral. As pessoas de Nana podem ser teimosas e “ranzinzas”, daquelas que guardam por longo tempo um rancor

ou adiam uma decisão. Porém agem com segurança e majestade. As suas reações bem equilibradas e a pertinência das suas decisões mantêm-nas sempre no caminho da sabedoria e da justiça. Nanã fornece a lama para a modelagem do homem Dizem que quando Olorum encarregou Oxalá de fazer o mundo e modelar o ser humano, o orixá tentou vários caminhos. Tentou fazer o homem de ar, como ele. Não deu certo, pois o homem logo se desvaneceu. Tentou fazer de pau, mas a criatura ficou dura. De pedra ainda a tentativa foi pior. Fez de fogo e o homem se consumiu. Tentou azeite, água e até vinho-de -palma, e nada. Foi então que Nana veio em seu socorro, apontou para o fundo do lago com seu ibiri, seu ceptro e arma, e de lá retirou uma porção de lama. Nanã deu a porção de lama a Oxalá, o barro do fundo da lagoa onde morava ela, a lama sob as águas, que é Nana. Oxalá criou o homem, o modelou no barro, com um sopro de Olorum ele caminhou, com a ajuda dos orixás povoou a terra. Mas tem um dia que o homem morre e seu corpo tem que retornar à terra, voltar à natureza de Nana Buruku. Nanã deu a matéria no começo, mas quer de volta no final tudo o que é seu. Nanã proíbe instrumentos de metal no seu culto A rivalidade entre Nanã Buruku e Ogum data de tempos, Ogum, o ferreiro guerreiro, era o proprietário de todos os metais, eram de Ogum os instrumentos de ferro e aço, por isso era tão considerado entre os orixás, pois dele todas as outras divindades dependiam.

Julho 2018

Jornal Umbanda Brasil | 03

Falando de Espiritismo

Espiritismo, que religião é está? Jesus Cristo não é o enviado de Deus à Terra. É apenas um espírito mais evoluído que serve de guia para toda a humanidade. (Parte 1) Criado por um pedagogo, o Espiritismo surgiu na França no século XIX. Hoje, o Brasil possui a maior comunidade espírita do mundo. Saiba tudo sobre a religião que considera a morte apenas uma etapa da evolução pessoal e que acredita na vida em outros planetasJesus Cristo não é o enviado de Deus à Terra. É apenas um espírito mais evoluído que serve de guia para toda a humanidade.A morte de um ente querido, por mais dolorosa que seja, não deve ser encarada de forma absolutamente negativa. Muitas vezes, é apenas o encerramento de uma missão no mundo dos vivos.

professada por 2,3 milhões de brasileiros, segundo o último censo do IBGE.

A enorme receptividade do Espiritismo no Brasil é mais um dos inúmeros paradoxos da fé em terras tupiniquins. Embora a pátria-mãe do Espiritismo seja a França – país de Allan Kardec, o homem que, no século XIX, compilou e decodificou os princípios que até hoje orientam os 15 milhões de adeptos no mundo todo –, foi no Brasil que essa religião, gestada numa era em que a ciência se desenvolvia vertiginosamente, encontrou terreno fértil para se alastrar do Oiapoque ao Chuí. Por quê? A resposta está tanto no Espiritismo quanto Vivemos cercados de espíritos, alguns bons, ou- no povo brasileiro. tros ruins. O que é As afirmações acima – que batem de frente com os princípios fundadores de muitos credos, entre eles a fé católica e todas as demais religiões dela derivadas – costumam ser proferidas de maneira desassombrada pelos espíritas em centenas de centros espalhados pelo Brasil. Pudera. Fazem parte das idéias básicas de uma religião

Religião ou doutrina? Se você perguntar a algum freqüentador assíduo de centro espírita, provavelmente receberá a seguinte resposta: o Espiritismo é uma doutrina revelada pelos espíritos superiores a Allan Kardec, que a codificou em cinco obras: O Livro dos Espíritos (1857), O Livro dos Médiuns (1859), O Evangelho Segundo o Espiritismo (1863),

Aconteceu na Umbanda

O Céu e o Inferno (1865) e A Gênese (1868). Mas isso explica muito pouco. Doutrinas há de todas as cores e matizes ideológicos. O Marxismo também é uma doutrina baseada em um livro fundamental (no caso, O Capital, de Karl Marx), mas nem por isso deve ser encarado como uma religião. A Psicanálise, também. Assim ocorre com outras filosofias. A diferença básica está na forma de encarar a realidade. “Se você explica a realidade social pela realidade transcendente, sua visão é religiosa”, afirma Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti, professora do Departamento de Antropologia Cultural da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e estudiosa do Espiritismo no Brasil. Isso quer dizer que, sim, o Espiritismo é uma religião – pois apresenta toda uma série de explicações espirituais e divinas para eventos tão comezinhos quanto o mau humor do seu vizinho e tão devastadores quanto a morte de alguém em sua família. Típico rebento do século XIX – o mesmo das teorias evolucionistas de Charles Darwin, da Tabela Periódica, da redescoberta das filosofias orientais e do Positivismo de Auguste Comte –, o Espiritismo consegue a proeza de mesclar Catolicismo primitivo (caridade), Budismo (reencarnações), Darwin (evolucionismo) e um caldeirão de credos esotéricos que estavam em plena voga nos anos 1800 – e que geraram filosofias tão diversas como o Espiritualis-

3º Arraia de Aruanda

Sem a licença de Ogum não haviam sacrifícios; sem sacrifício não havia orixá, Ogum é o Oluobé, o Senhor da Faca, todos os orixás o reverenciavam, mesmo antes de comer pediam licença a ele pelo uso da faca, o obé com que se abatiam os animais e se preparava a comida sacrificial. Contrariada com essa precedência dada a Ogum, Nanã disse que não precisava de Ogum para nada, pois se julgava mais importante do que ele. “Quero ver como vais comer, sem faca para matar os animais”, disse Ogum. Ela aceitou o desafio e nunca mais usou a faca, foi sua decisão que, no futuro, nenhum de seus seguidores se utilizaria de objetos de metal que sacrifícios feitos a ela fossem feitos sem a faca, sem precisar da licença de Ogum. Lenda tirada do livro Mitologia dos Orixás - Reginaldo Prandi - 2001 Ilê Asé Amosun Endereço: Rua Tacoativa N 44 Pirituba Vila Bonilha Telefone (011) 9.8214.9496. Atendimento aos domingos 14:30

No dia 23 de junho, a Federação Espirita de Umbanda Caboclo Itapuarê, realizou sua terceira festa Junina, no Canto dos Caboclos em Caieiras, São Paulo. Evento este que já está se tornando parte do calendário do povo da região, como boa festa junina teve comidas típicas, brincadeiras, e tradicional fogueira de São João.

mo de Emannuel Swedenborg e a Teosofia de Madame Blavatsky. “É uma religião de síntese”, afirma Maria Laura. E só poderia ser assim mesmo. Seu iniciador, Allan Kardec (1804-1869), era um pedagogo que fundou na própria casa um curso gratuito de Química, Física, Anatomia e outras ciências que galvanizaram as mentes curiosas do século XIX e ajudaram a preparar o terreno para as revoluções científicas da nossa era. Kardec inclusive chegou a estudar Medicina, mas logo abandonou os planos de atuar nessa profissão. É por essa razão que, desde o início do movimento espírita, ele sempre fez questão de apresentar, com um vocabulário inspirado nas ciências, eventos como comunicação com espíritos e o movimento de objetos sem ação humana aparente. Num texto bastante famoso, o iniciador do Espiritismo explica seu método: “Apliquei a esta nova ciência, como tinha feito até então, o método de experimentação; nunca elaborei teorias preconcebidas: eu observava atentamente, comparava, deduzia as conseqüências…”. A identificação explícita com o método de dedução científica foi uma tentativa de livrar o Espiritismo da pecha de irracionalidade num tempo em que a Razão era um verdadeiro dogma. E também foi – numa estratégia inversa – uma afirmação do Espiritismo como reunião de doutrinas religiosas, científicas e filosóficas para fazer frente às verdades incontestáveis da Igreja Católica. E essa, logo iria mostrar seu desagrado com a nova religião. Porque a afirmação do Espiritismo foi uma luta difícil e demorada, como se verá a seguir.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.