Revista Brasis Afro -

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UM OLHAR SOBRE A

INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

Uma visita a terreiros de Candomblé da cidade de Londrina/PR NESTA EDIÇAO ENCARTE DE LITERATURA

NEI LOPES NEI LOPES Uma vida dedicada Uma vida dedicada à cultura negra à cultura negra

MUSEU AFRO BRASIL A história do negro preservada

CANDOMBLÉ CANDOMBLÉ Uma transformação Uma transformação de de vidavida



Eli Antonelli


orto Seguro, 1850 o tataravô chega ao Brasil num navio negreiro, o tumbeiro, como era chamado. Desconhecia complementamente a lei Euzébio de Queiroz, a qual se fosse cumprida não teria selado o seu destino. Os ingleses haviam proibido o Brasil de traficar escravos a partir daquele ano, mas o tráfico clandestino era intenso. Foram quase quatro meses dentro de um espaço reduzido e com cheiro repugnante, que lembraria por muitos anos. Poucos africanos sobreviveram a travessia do oceano e seus corpos eram mantidos juntos, sem higiene e sem dignidade. Ele, o tataravô, um negro lindo, príncipe em sua aldeia do Zimbábue, forte, dono de conhecimentos ancestrais que lhe conferiam habilidades para forjar o ferro e produzir suas próprias ferramentas de guerra e de plantio. O tataravô cumpria uma pena perpétua por ter simplesmente a pele negra. Era corajoso e ousado, trabalhou duro, apanhou muito se submetendo as condições degradantes que o colonizador impunha. O pau de arara seu destino certo a cada tentativa de levantar a voz, gritar a injustiça aos seus algozes ou a seus irmãos de pele negra, que não o compreendiam, por maldade ou propósito do colonizador que misturava as tribos, as nações para que esses não se comunicassem, não se unissem. Roçando o canavial, o tataravô derramava o suor real, deixava para trás na distância e na memória, sua cultura, suas crenças, quase esquecera de seus orixás e seus rituais. Numa colheita conheceu Iaporã da tribo patoxó, com ela teve o bisavô. O mesmo sangue negro, agora com traços indígenas espalhado no chão. O mesmo sangue real do pai e o espírito guerreiro dos ancestrais presentes na mãe fizeram do bisavô um bravo. E a resignação que nunca existiu ficara evidente com a primeira fuga, para um lugar de sonho, chamado quilombo. Distante do homem branco que tentava impor até mesmo sua própria religião ao povo negro, o bisavô ia perdendo seus traços. Nem sequer lembrava de sua história, fora separado dos pais ainda bebê. Sua mãe como índia, assim como as negras deveria também amamentar a filha fazendeira. A mesma criança branca que um dia foi responsável pela separação dele e de seus pais fez-se sua esposa. Ao voltar para o quilombo levando nos braços a moça branca apaixonada, foi assassinado. No ventre da jovem o avô que nasceu no mesmo ano que a princesa endeusada por muitos, analisada por outros, assinava à lei que dava aos negros a liberdade. Agora o avô, negro, indígena com traços brancos estava livre. Era 14 de maio e o avô tinha o futuro pela frente, mas foi arrancado dos braços da mãe branca. O avô foi entregue a uma negra moradora de um casebre, viveu em condições simples mais com amor. Lá estava ele na mesma cidade que de braços abertos recebia os loiros de olhos azuis, os imigrantes e estabelecia que em 50 anos a população brasileira iria embranquecer. E era esse o discurso dos governantes. E assim passou o tempo e o avô não desanimou foi ativista da imprensa negra, gritou alto a injustiça, entrou para o clube dos negros, já que não podia entrar em outros clubes. O avô não pode estudar, a escola mantinha as portas fechadas e a ele não era concedido esse direito.

http://abolition.e2bn.org

EDITORIAL

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A BELEZA DO MAR E OS RASTROS DOLORIDOS DE UM PASSADO


Foi na imprensa que encontrou a bela moça negra e casou-se. O pai nasceu e veio os anos 1950, tempos de luta, e o pai entrou para o movimento negro. Fortaleceu, construiu, lutou pelos seus direitos. E viveu o suficiente para ver o resultado de suas lutas em 1990. Viveu ainda mais alguns anos para gritar na Marcha Contra o Racismo pela. Cidadania e a Vida. O filho pode ver o resultado aos poucos sendo concretizados. Deixava para traz o legado trazido pelos seus ancestrais em que os colonizadores arrancaram seu passado, sua cultura, sua religião, sua dignidade e agora as lutas, o sofrimento dava lugar à esperança. Terminou a faculdade aos 23 anos e descobriu que a namorada estava grávida. Os tempos eram outros, havia recursos e possibilidades. De férias, em Porto Seguro com a namorada grávida, admira o imenso mar azul, em cada onda tranqüila um pedaço do passado. Ele, o filho olha ao longe e pensa no futuro do neto que está por vir. Uma luz cristalina que bate na água produzindo um efeito de magia, destaca os raios do sol que ofuscam sua visão e impedem de ver a beleza da linha do horizonte onde tudo começou.

Editora Chefe: Eli Antonelli Orientadora Uni. Positivo: jornalista e doutora Elza Ap. Oliveira Filha Fotos: Eli Antonelli, Leandro Taques, Assessoria de Comunicação Nei Lopes, Marcio Marins, Assessoria de Comunicação Zuruca, Marcio Del Nero Q & Comunicações, Assessor de Comunicação Guilherme de Queiroz, Arquivo Pessoal Enrique Armando Caroço Pisarro, Assessoria de Comunicação Cidinha da Silva, Nerea, banco de fotos www.stx.hu. Assessoria de Comunicação Seppir Projeto Editorial: Eli Antonelli

Eli Antonelli

Diagramação: Eli Antonelli, Karolyne Schueda, Roberta Perozza, Associação de Ogãs de Londrina

A revista Brasis Afro nasce com propósito de contar essa história e dar luz a essas vozes da escravidão à luta negra. Proporcionando aos educadores apoio para construção dos alicerces de uma nova concepção de educação racial no Brasil. A proposta é aumentar, fortalecer e acender as discussões naqueles que são detentores do conhecimento e que têm como missão formar os cidadãos do amanhã. A lei 10.639/2003 que a torna obrigatório o ensino da cultura afrobrasileira e história da África nasceu para fazer a diferença, criar uma auto estima nas crianças e jovens negros reduzindo a evasão escolar e vai além cria a partir de sua efetivação, a consciência de valorização da identidade do negro, da história do negro na população de modo geral. Ao longo das próximas edições a revista Brasis Afro pretende não apenas trazer temas para discussão, mas criar um elo de comunicação direta com os educadores por meio do Observatório da lei 10.639/2003. O site trará matérias complementares e será um canal aberto para divulgação das práticas em sala de aula, dando luz as criticas, sugestões e ideias para as futuras edições deste veículo de comunicação. Além dos educadores, a Revista Brasis Afro firma um compromisso de ser uma ferramenta de divulgação e discussão das ações propostas pelos vários organismos, instituições, ongs, governo que se colocam como defensores das ações etnicorraciais fechando assim, um ciclo de construção de novas ideias e quebra de paradigmas preconceituosos. Eli Antonelli Editora Chefe

Publicidade: Ações em prol das relações etnicorraciais - Campanha quem é de Axé diz que é Agradecimentos: equipe NEAB/UFPR, NEREA/PR/ASSOCIAÇÃO DE OGÃNS LONDRINA/Forum de Relações Etnicorraciais do Paraná/Fórum de Relações Etnicorraciais do Pará/Alagoa Gande/Forúm de Religiões de Matriz Africana/Grupo Clóvis Moura/ Glauco Souza Lobo/Museu AfroBrasil/ Universidade Estadual de Londrina/ UEL/Museu de Medicina Terreiro de Jesus/Bahia/Assessoria de Comunicação SEPPIR/ Central de Atendimento: 41 8426-5545 eliantonellijornalismo@gmail.com www.observatoriodalei10639.blogpost.com.br Gráfica: Digitize e WL Impressões Apoio Colaborador/ Impressão e distribuição:


INSTITUCIONAL

A MÚSICA COMO ATITUDE

Zuruca o rapper paulista fala das suas letras que discutem violência e preconceito. O hip hop como ferramenta de reflexão

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PERFIL

JOYCE RIBEIRO Ministério da educação prepara novo material para fortalecimento das ações da prática do ensino da história da África e cultura afrobrasileira nas escolas

A história e reflexões sobre questões raciais de uma das mais importantes jornalistas negras do Brasil .

ENTREVISTA Audiência

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Ministro da Promoção e Igualdade Racial expõe as conquistas e desafios das políticas raciais

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ENSAIO FOTOGRÁFICO

MUSEUS

SUMÁRIO

NOVOS RUMOS DA LEI 10.639/2003

UM PASSEIO PELO MUSEU AFRO BRASIL Um dos mais importantes museus da cultura negra do Brasil, no coração do Parque Ibirapuera. Um convite ao conhecimento e encantamento.

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Durante 40 dias o fotográfo Leandro Taques percorreu 18 provincias de Angola. As imagens captadas mostram um povo diante de um país em paz depois de 27 anos de guerra.

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ESPECIAL

UM OLHAR SOBRE A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA A base principal do preconceito é a desconhecimento afirma as familias do candomblé de Londrina que sofrem com ações e falta de políticas específicas. Oito terreiros abrem as portas para mostrar sua crença e se mostram prontos para quebrar os mitos contra a religião. Pag.

E o aluno pergunta Mãe de santo responde dúvidas sobre candomblé

FORMAÇÃO

Eli Antonelli

PRÁTICAS - BAHIA

CORAL AFRO

E A MATEMÁTICA? Colégio em Salvador aplica a lei 10.639 em projeto voltado à matemática

Duzentos jovens se revezam em apresentações do primeiro coral afro ligado à lei 10.639/2003

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ARTIGO

14 DE MAIO DE 1888, E AGORA? O blot www.observatoriodalei10639/2003 .blogpost. com.br abre a discussão da trajetória do negro no Brasil após a abolição

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NOTÍCIAIS

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PROXIMA EDIÇÃO


INSTITUCIONAL

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO PREPARA NOVO MATERIAL PARA FORTALECIMENTO DAS AÇÕES DA LEI 10.639/2003

Durante um ano 15 pesquisadores coordenadoram uma pesquisa com foco na prática da legislação nas escolas

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o ano de 2003, quando instituições internacionais se mobilizavam para implementar ações de combate ao racismo em várias países, o Brasil se fez presente em atuação, criando a lei 10.639 em 09 de janeiro de 2003. Estabelecida como um marco histórico nascia com objetivo de ser o ponto de partida da renovação na qualidade social da educação no país e a largada para as lutas antirracistas. Após sua sanção a lei foi regulamentada pelo Parecer 003/2004 e pela Resolução 01/2004 do Conselho Nacional de Educação. Instrumentos pelos quais a lei passava a ser orientada. Focando no fortalecimento das atribuições para efetivação da legislação em 2009 o Ministério da Educação e o Ministério da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – SEPPIR estabeleceram e institucionalizaram as funções de cada organismo atuante para o cumprimento da legislação federal por meio do Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Etnicorraciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira. Dando seguimento a essas ações de orientação da legislação, um grupo de pesquisadores, em conjunto com a UNESCO e com o governo federal realizou ao longo do último ano uma pesquisa em âmbito nacional com foco na práti-

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ca da lei 0.639/2003. A professora Wilma de Nazário B. Coelho da Universidade Federal do Pará, que compôs a equipe, representante da região norte, explica que a pesquisa teve como objetivo geral fundamentar um estudo prático pedagógico da lei em todas as escolas do Brasil, procurando reconhecer e identificar as atividades no ensino básico de escolas estaduais e municipais e verificar qual processo de institucionalização da Lei em todas as Unidades Federadas e em uma amostra de municípios. O trabalho foi realizado coordenado pela doutora Nilma Lino Gomes da Universidade Federal de Minas Gerais e contou

com representantes de todas as regiões do país. Em conjunto com representações nos Núcleos Ações Etnicorraciais de cada Estado – NEAB’s e um grupo de bolsistas realizaram a pesquisa em cada estabelecimento. “As escolas receberam um questionário on line inicialmente, que foi encaminhado aos NEABs onde foi identificado de que forma era realizado a prática da

lei “Com este material foi selecionado trinta escolas de cada região e destas identificou-se seis e foi observado o enfrentamento pedagógico”, explica. A partir de todo o trabalho realizado pelos pesquisadores será constituído um livro que dará embasamento a políticas que visem fortalecer a legislação em vigor. O material foi enviado para o Ministério da Educação para os procedimentos necessários de finalização do material.

PESQUISADORES Alessandra Rocha – UFMG Aline Alves – UFMG Andréia Rosalina – UFMG Elaine de Oliveira – Ações Afirmativas Maria Lucia Pires – UFMT Moises de Melo Santana – UFRPE Natalino Neves da Silva – Ações Afirmativas Paulo Vinicius – UFPR Rodrigo Edmundo UFMG Vanda Prochedes Ações Afirmativas Wilma de N. B. Coelho UFPA Mario Coelho UFPA Ivani Pinto Nascimento - UFPA

Acesse a legislação relativa a relações etnicorraciais http://observatoriodalei106392003. blogspot.com/


A música como atitude Letras que discutem violência e preconceito Assessoria de Comunicação Zucuca

José Carlos Cardoso dos Santos, o pequeno Zuluca, recebeu o apelido como referência à tribo africana Zulu, e Ca veio de Carlos. Mas sua coragem desde criança, demonstrando atitude em situações de preconceitos deram a ele um novo apelido “Zuruca” que significa Zuru, “criança peralta”. Sua família, originária da Bahia, instalou-se em São Paulo quando ele ainda era pequeno. Zuruca lembra com carinho dos finais de semana com os pais: “Marcou o esforço da minha mãe para que nada nos faltasse, apesar das dificuldades com moradia, do dinheiro do aluguel, da comida na mesa havia sim, muita união”, relembra. Já na época da escola, era possível identificar suas inspirações para a poesia. “Ao descobrir que tinha facilidade, comecei a escrever. Um belo dia percebi que o meu caminho era a música e assim corri atrás do meu sonho. As pessoas ao meu redor gostavam de minhas músicas e aí tomei gosto, e é o que faço até hoje. Quando percebi que as pessoas me incentivavam e que a música estava em minhas veias comecei a fazer composições, com vontade de fazer vocabulários inovadores, diferentes dos que existiam. Era o que desejava”, conta.

Com o passar do tempo Zuruca criou o grupo de samba “Puro Samba da BV”, foi aí que o que estava no papel começou a virar realidade. “De início, tive como inspiração grandes escolas de samba como: X-9, Mocidade, Vai-Vai e a Nenê de Vila Matilde. Concorremos com o nosso samba nessas grandes escolas e ficamos muito felizes por participar, pois era o começo do nosso sonho que se realizava”. Isso ocorreu em 1987 e em 1995, o grupo chegava ao fim. Porém não significou um ponto final, e o menino Zuruca continuou curtindo e trabalhando com a música, sua arte, sua vida. Hoje compõe suas letras trazendo a bagagem cultural que conquistou ao longo dos anos. Não existe um artista específico que o influencia. Em cada música, há um toque da essência dos artistas que sempre ouviu: “Sou muito eclético, sempre gostei de todo tipo de música tanto nacional como internacional, desde que tivesse conteúdo. É um exemplo de que um rapper é aculturado e tem excelen-

te gosto musical, um bom samba, um blues com eterno B.B, king, e o soul funk com James Brown, The O’ojays, Nwa, RDMC, Jorge Ben Jor, Bebeto e Racionais MC’S”, conta. Suas letras são intensas e falam de situações do dia a dia com reflexão, falam da auto estima de lutar pelo que se quer: “Falo do preconceito que existe e está aí. Ele não é uma grande realidade das pessoas que tem que ser respeitar e fazer-se respeitar. Principalmente para a nova geração da periferia. Em muitas cidades do Brasil há jovens se matando. A violência ainda é o vilão. E jovens se matando por nada, não há sentido, não há ideal e uma parcela de culpa é da sociedade. Onde poucos ganham muito e muitos ganham pouco e assim gera o efeito dominó nos filhos do Brasil, nos herdeiros da violência, das drogas, da prostituição, da falta de oportunidades”, destaca.

Assessoria de Comunicação Zucuca

Suas letras são intensas e falam de situações do dia a dia com reflexão Apresentação na emissora MTV 09


Mãe África, Negro na missão

Uganda Pelourinho Malaui triste Fato quem nos deve vai paga o pato

Em pouco tempo pais Brasil virou, Maquina assassino um barril de pavio

Direito Humano explique qual que é Humano a ver navio varia casa de sapé

Ancestralidade, do negro brasileiro. Nigéria furtada nosso terreiro Costa do Marfim sofre tirania Bantos. Daomé Sudaneses pra Bahia Congo Moçambique Angola city Maceió Rio de Janeiro Minas e Recife Fortaleza Ceara afro-descendência, negro. Quilombola vida longa resistência Trabalha estudar e da às mãos Ajude seu irmão negro na missão Somos os progresso viva os negros Somos o poder a etnia dos guetos Beleza tristeza sorriso no rosto Esse é o nosso povo Refrão Mãe África negro na missão Mãe África siga na missão Mãe África negro na missão Mãe África siga na missão,Mãe África

Assassinato em massa mapa da fome Nações Unidas assinatura tem seu nome 1º de Abril são suas verdade To sintonizado na realidade Firme esperança forte liderança Dandara articulo Obama conquisto João Candido o Almirante negro Lutou se ligo venceu o preconceito Refrão Mãe África negro na missão Mãe África siga na missão Suprema dinastia afro veloz. Nunca se calar firme a nossa voz Enquanto pulsar bombear o sangue Negro na missão é o nome Berço Africano começo do tempo Quilombo vivo a favor do vento

Serra Leoa na guerra pobreza terra De mineiro de imensa riqueza

Novo Egito no velho testamento O Maior pais negro nove, nove por cento.

Europa leva maior parte do torro Da África estão tirando todo tesouro

No Brasil a maioria da raça a massa Cabo verde embaça Em Portugal na Inglaterra França Amisterdan Poder patrício aos negro, que vem na Van.

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Assessoria de Comunicação Zucuca

Negro na missão


mais cruéis de racismo, em sua opinião, é quando isso ocorre por meio da abordagem policial. Não só a violência presente no racismo é tema de suas composições, mas a violência de uma forma mais ampla. A música, para o rapper, é a força que atua na emoção nas atitudes, é alma que influencia o pensamento das pessoas.

Assessoria de Comunicação Zucuca

O preconceito racial é tema recorrente nas letras do rapper. “O racismo é atitude de pessoas doentias, sem amor e sem alma, pessoas vazias”, diz ele. Para combater esse mal, Zuruca acredita que é importante jamais se calar e ficar atento a discriminação silenciosa que está nas marcas, no olhar, nos comerciais, em pequenos detalhes. Uma das formas

“O racismo é atitude de pessoas doentias, sem amor e sem alma, pessoas vazias”

Trajetória musical Trajetória musical Em 2000 recebeu um convite do Grupo Racionais Mc´s para participar de uma de suas letras “1 por amor 2 por dinheiro”, que foi lançada no álbum “Nada como um após outro dia”. A participação que levou a formação de um grupo de rap com batida funk dos anos 70 chamado ROSANA BRONK´S. Esse nome se originou no time de Futebol da região e foi o primeiro, nome do bairro onde nasceu o rapper, onde mora até hoje na periferia do Jardim Rosana zona sul de São Paulo. O grupo é formado por Zuruca, Negreta, Maspingon, Du Bronx e DJ.Cula. “A partir desta formação começamos a evoluir e caminhar com os Racionais Mc´s, em eventos musicais com participações nos shows”, conta. Durante sete anos abriram o shows dos Racionais Mc´s. Em 2007 o selo Cosa Nostra lançou o primeiro CD “Jogar para ganhar”, que foi na mesma época do lançamento do DVD “1000 trutas 1000 tretas”, onde fez parte da equipe de montagem do cenário e de produção executiva. Para o futuro Zuruca pretende lançar um cd com 12 faixas com o título “Esse é o nosso Brasil”, fruto do projeto Fuzão Brazil (Zuruca do Rosana Bronk’s SP Jd. Rosana e Bangstars de Curitiba).

www.myspace.com/zuruca www.myspace.com/rosanabronks www.facebook.com/zuruca

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MUSEUS

Um olhar sobre os museus

Um passeio pelo museu

Afro Brasil Com 5 mil peças em seu acervo, o Museu Afro Brasil se consolida como um dos mais importantes espaços culturais da atualidade. Localizado num local privilegiado, dentro do Parque Ibirapuera em São Paulo, é parada obrigatória para a reflexão do papel do negro na construção do país


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Histórico nte no meira ação afirmativa releva O Museu Afro Brasil foi a pri o de jet pro outubro de 2004, nasceu do co país. Inaugurado em 23 de s a mstico Emanuel Araújo preste plá ista art o m, me ho um vida de ão de obras dicados à pesquisa e coleç pletar 70 anos, sendo 40 de gra africana na am a história da matriz ne e documentos que registr do expoAo longo dos anos foi fazen ira. sile bra ra ltu cu da ão ruç a de const enou por 10 anos a Pinacotec ord Co es. art as iad var is ma s sições da je com padrão is museus do mundo e ho São Paulo, um dos principa internacional. mplo, a importantes como, por exe Emanoel trouxe exposições al para on aci ern ndes nomes do cenário int arte de Rodan e outros gra s esculturas que fazia isso, produzia sua em po tem o sm me Ao sil. o Bra sem a mpor exposições que tratas co e ar ion lec co em ava up e se preoc matriz negra africana.

Eli Antonelli

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Eli Antonell

A Mã pacto c o Afrobrasileira om o cu foi a prim ida durante e as come doso trabalho ira exposição d de Ema e grand moraçõ de Arte no e es do ce M ntenário el. Ocorreu em imtivo que oderna de São da a 198 Pa g a contrib erou um livro c ulo – MAN. O r bolição no Mu 8 esultado ontemp seu uição d la o fo costum es, arqu negro no perío ndo vários elem i tão posiitet entos, c do do s erudita, om éc artes plá ura, ourivesaria sticas, e , literatu ulo XVIII ao XX o scultura , dança, ra, música pop nos Na sequ teatro e u ência idioma. lar e mesmo tema tra Emanuel prod uziu ou tando d 500 ano tras ed sd po e Alm o Brasil, em 2 iversas formas exposições co 000, com . Outro mo a que fe ma a sou por z diversos parte da Most exposição O N rco foi nos ra eg Es de visita ntes em tados. Só em S do Redescobrim ro de Corão Paulo todo o p e recebeu nto e paseríodo q u d e o is ficou no Outra e Parque milhões xposiçã foi Neg Ib irapuera o de de ras . 600 obr Memórias - p staque, antes d ara nun as entre a c r ia ção ca fotografi culturas as, filme esquecer, que do museu, e s, objeto c compus pinturas. As ob s de ou ontou com ras, orig eram a r in o e á -afrobra e prata, sileira e xposição, repre rias desde o sé esa heran c s u e lo XVI q n t avam o ça da es ue imaginá cravidão rio luso -


museus Um olhar sobre os museus

MUSEU AFRO BRASIL

Os espaços são aproveitados há Informações e cultura dentro e fora do museu

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entro de uma proposta moderna, o museu Afro Brasil não é simplesmente um conjunto de obras classificadas por períodos históricos com sua explicação logo ao lado. A narrativa é construída a partir das disposições de suas peças e é cuidadosamente pensada pelo idealizador do museu e atual diretor curador, Emanuel Araújo. Este cuidado pode ser observado em todas as alas dos três andares do prédio, a começar pelo térreo, onde se localiza a exposição “Cartões Postais da África”. O visitante, num primeiro olhar, pode achar que na sala encontra-se uma série de cartões postais que revelam como era e é a sociedade nos países africanos. Mas, conforme se aprofunda na riqueza das imagens e no texto apresentado, esse visitante per-

cebe que a intenção é questionar. A coordenadora de planejamento Ana Lúcia Lopes explica que o mais importante é a relação travada entre as obras. E isso é encontrado em todos os espaços do museu. “Esta composição é que conta as histórias, é a junção de uma peça com outra peça, um texto no meio é uma narrativa “museal” é isso que faz a história ficar diferente”. A ideia de é não ser um museu classificatório, com isolamento de datas, seguidas de informação e isso se comprova avaliando a forma das exposições: “As perguntas que o diretor faz com o curador dessa exposição dos cartões postais da África, por exemplo , faz a mostra virar outra coisa. Você poderia ter os

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cartões postais arrumados ali e só. Mas é muito mais que isso, você se pergunta: Por que será que faziam este tipo de coleção? A quem interessava este tipo de registro? É uma narrativa a serviço da reflexão. Nada está por acaso no museu”, garante Ana Lucia. Uma outra característica marcante no Museu Afro Brasil é que as histórias presentes nas exposições são escritas em primeira pessoa. Ana explica que as narrativas estão na perspectiva do negro pelo fato do diretor curador ser negro. ”Eu não poderia contar as histórias que Emanuel conta, porque não tenho essa história. Quando ele põe emoção, é o sentimento de quem viveu. Eu ponho a emoção de quem se emociona com o sentimento dele. O museu não é do negro, ele é um


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O grande diferencial do trabalho do curador Emanuel Araújo consiste na forma de mostrar uma verdade camuflada por muito tempo. Na exposição “Escravidão” são mostrados os instrumentos de castigo que a maioria das pessoas tem determinado fetiche para ver. “Aqui elas vão ver mais que isso, pois o foco não está no castigo e sim na dignidade. Quando você pega àquela parede exposta de instrumentos observa que as ferramentas eram feitas pela mão escrava, pela mão africana. Então, você para e pensa na competência daquela elaboração”, declara. Ana complementa com uma frase de Manoel Querino em que esse afirma que o verdadeiro colonizador do Brasil foi o africano, porque ele absorveu a cultura indígena, a portuguesa e desenvolveu no Brasil a cultura africana. Frase sempre repetida pelo curador Emanuel, segundo a coordenadora.

As reações diante das histórias são as mais variadas, desde aqueles que ficam incrédulos com a dignidade e força do negro, alegando que se isso fosse a realidade não teria havido a escravidão. “Alguns se incomodam e se afastam. E é a partir daí que entra a narrativa que contempla as informações da relação que todo o contexto compreende. E há aqueles que

Eli A ntone lli

O museu recebe diariamente professores com grupos de alunos e são acompanhados por 14 educadores que estão aptos a recepcioná-los e recontar cada espaço e sua importância. Ana destaca que a demanda é sempre crescente e que, além desse trabalho, são realizadas exposições itinerantes, principalmente dentro do Estado de São Paulo, pois o Museu faz parte da Secretaria de Cultura. “Mesmo com as exposições itinerantes, entendemos que é importante a visita aqui nesse espaço, para que possa ser visto toda essa materialidade que é chocante”, diz ela.

São três andares de emoção, arte e história. No primeiro andar ficam as exposições temporárias que complementam as demais. No segundo e terceiro andar encontram-se as exposições permanentes. Um acervo que conta uma história dividida em três linhas: trabalho, ancestralidade e arte, compondo seis núcleos: trabalho e escravidão, arte, religiosidade, história e memória.

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se emocionam e muito”, conta.

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museu do Brasil com a perspectiva do negro africano sempre”, explica. Ana complementa dizendo que mesmo que venha um artista italiano, o que fica é como o curador enxerga e como ele traz. “Ele vai privilegiar sempre essa relação permanente da arte marcada pelo negro africano. Inclusive na diáspora, ele vai trazer artistas de outras países e também trará artistas brancos, mas não importa, ele trabalha com a ideia universal da arte, o olhar a escolha é sempre dele”, afirma a coordenadora.


MUSEUS

O OLHAR DAS CRIANÇAS NA ARTE E HISTÓRIA DOS POVOS AFRICANOS Assessoria de Imprensa Col. Rainha da Paz

Intervalo da visita, as crianças fazem o lanche discutindo o que viram

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prática da lei 10.639/2003 não é restrita ao ensino público, todos os colégios devem aplicar em seu curriculum ações voltadas às discussões etnicorraciais. Em São Paulo , o colégio privado Rainha da Paz é destaque nas ações do desenvolvimento das atividades. As turmas do quinto ano do ensino fundamental têm como tema de estudo no terceiro trimestre a influência dos povos africanos na formação e composição da cultura brasileira . A orientadora educacional e pedagógica Ana Carolina Rebouças Bressane explica que a discussão inicia com a problematização de diferentes visões de historiadores que justificam a vinda dos escravos africanos para o Brasil. “Após essa análise trabalhamos quais foram as condições deste deslocamento e a chegada ao Brasil, com a discussão sobre as atividades que eles vieram 16

desenvolver, dificuldades encontradas, movimentos de resistência e legado cultural trazido”, conta. O colégio busca utilizar diferentes fontes históricas como referências para este estudo, como: vídeos, cartas, imagens, poesias, letras de canções. Para complementar os estudos é utilizado o livro paradidático intitulado "Agbalá", escrito pela autora Marilda Castanho, editado pela Cosacnaify. “Este material é composto de textos informativos e de ilustrações da própria autora. Este ano, recebemos a autora em nossa escola para uma conversa. Ela contou para as crianças todo o processo de produção do livro, com ênfase para a construção das ilustrações, que são belíssimas”, destaca. Outra atividade desenvolvida foi o trabalho com o filme "Amistad" “Ponderamos que este não era um filme para ser passado na íntegra para

os alunos, por conta da complexidade de sua trama, na questão política e pela exibição de algumas cenas. Então sugeri que a professora que havia indicado o filme preparasse um trabalho de contação do fato apresentado no longa e que a partir deste relato as professoras pudessem selecionar as cenas, de acordo com os interesses dos grupos. O envolvimento dos grupos foi incrível”, destaca. Este é o terceiro ano em que os grupos dos quintos anos do Ensino Fundamental I fazem a visita orientada ao referido museu. O colégio tem investido no aprimoramento desta prática. Neste ano, foi introduzido duas novas ações: a participação de professores das disciplinas de Artes e Educação Física no trabalho de monitoria e a leitura do roteiro de visitação, editado pela Imprensa Oficial.

“A visita foi muito legal. Eu fiquei muito triste quando eu fui naquela sala que tinha o navio negreiro e tinha todos aqueles objetos de tortura, isso mexeu muito comigo. Algumas pessoas até ficaram com medo” Victoria Picchi Khoury - 5º ano A


A primeira ação teve como objetivo integrar ainda mais os conhecimentos tratados nas diferentes áreas do saber. O professores de Educação Física e Música desenvolveram um trabalho com a manifestação do maculelê. “Na Festa Junina de nossa escola, os grupos apresentaram a dança, aliando um trabalho de expressão corporal, voz

e instrumento. A professora de Artes trabalhou no ateliê com as obras de Rubem Valentim e desenvolveu trabalhos de releituras e criações”, destaca. A segunda ação teve como intuito implicar nossos alunos com a visita proposta e também propiciar uma aproximação com os núcleos que compõem o es-

paço e com o acervo. “Outro cuidado que tivemos foi o de selecionar os núcleos do museu em que focaríamos nosso olhar. A quantidade de núcleos escolhida foi pensada no sentido de possibiltar um maior aprofundamento das questões apresentadas e um espaço garantido de discussão para as crianças”, relata Ana.

“No Museu Afrobrasil eu aprendi bastante sobre a cultura africana. Com o caderno que lemos e vimos imagens consegui aprender muito. Foi como ver tudo aquilo que está no caderno em 3D e outras coisas além do que estava no caderno” Emilia T.G.G.Pereira - 5ºano A Assessoria de Imprensa Col. Rainha da Paz

“Na visita ao museu eu aprendi muita coisa, embora a maioria das coisas que eu aprendi lá já estavam no caderno do museu, mas do mesmo jeito é muito mais emocionante quando os monitores explicam e a gente vê tudo de perto.Eu adorei ver a roupa do Iansã, que é uma orixá que leva uma espada, ela é muito brava e divide seus poderes com o marido. Quando eu crescer eu vou querer ser estilista de moda então a parte que eu mais gostei foi de ver as roupas dos Orixás” Giovana Marques Yamamoto - 5º ano A

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Foto crédito: Marcio Del Nero Q & R Comunicação

JOYCE RIBEIRO UMA DAS MAIS IMPORTANTES NEGRAS JORNALISTAS DO BRASIL

NA PRÁTICA

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auteiros, p ro d u to res, repórteres e editores passam apressados para os últimos detalhes da edição do jornal que vai ao ar em pouco tempo. Ainda resta o fechamento da matéria principal, a repórter está em desespero pela fonte oficial, um economista que cancelou a entrevista. Ela busca a substituição rapidamente, o pauteiro ainda tenta os últimos contatos por telefone. Neste momento, a apresentadora que compõe a equipe do jornalismo da emissora lembra de uma fonte que poderia substituir o entrevistado cancelado com igual qualidade nas informações. Contato feito, a repórter animada corre para executar a entrevista e entra ao vivo com o economista. Um detalhe observado apenas pela apresentadora: a fonte indicada era um economista negro.


Para os mais desatentos esse fato pode não ter chamado a atenção, mas mudar o estereótipo da forma como o negro é retratado na televisão, que é hoje o meio de informação mais importante da população brasileira, é um trabalho realizado pela jornalista Joyce Ribeiro. Um público acostumado a ver o negro na televisão apenas retratado de forma marginalizada, o bandido, o morador da favela, o analfabeto, agora acostuma-se a perceber que o negro está ocupando outros espaços e que precisa de visibilidade. Com 10 anos na área da comunicação, aos 32 anos, casada, a paulistana formada pela Universidade Metodista Unidas (FMU), com pós graduação em Economia e Política pela PUC São Paulo, é um ícone para milhares de jovens negros e negras no Brasil.

As premiações Em 2009, a jornalista passou por um dos momentos mais marcantes de sua vida, recebeu o prêmio Raça Negra, um importante reconhecimento para os profissionais negros. O prêmio tem por finalidade valorizar os profissionais que se destacaram durante o ano em dez áreas: apresentador de TV, esportista masculino, esportista feminino, grupo de pagode, ator, atriz, cantor, cantora, rap, e jornalismo televisivo. o recantora, rap, e jornalismo televisivo. Joyce concorreu com personalidades relevantes no cenário nacional. “Fiquei imensamente feliz, concorri com gente que admiro a Dulcineia Novais, o Abel Neto do esporte da Rede Globo, gente de várias emissoras, fazendo um trabalho legal. Fiquei honrada por ter sido lembrada e por estar junto com esses profissionais que têm sua relevância”, conta.

Um ponto importante no Prêmio Raça Negra é que a escolha dos ganhadores é feita pelo público, por meio de uma seleção popular na internet. “Foi o reconhecimento das pessoas. Quando entrei no jornalismo, nunca imaginei isso, claro que você entra numa profissão com o olhar positivo, vai dar certo. Mas ser homenageada desta forma foi uma surpresa que me deixou muito feliz. Vou guardar para sempre, foi maravilhoso, uma festa bonita com grande emoção”, relembra. E o reconhecimento da jovem jornalista não parou por aí. Em maio deste ano outra importante premiação contou com a participação de Joyce: o Prêmio Camélia da Liberdade, promovido pelo Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP), foi criado com a expectativa de reconhecer instituições de ensino que incentivam o acesso de negros à educação, através do sistema de cotas, e que também valorizam o ensino da cultura afrobrasileira. Foram contempladas as categorias: universidade, personalidade, imprensa e empresa. A jornalista foi escolhida por ser a única negra à frente de um telejornal, em rede nacional, demonstrando assim a valorização e competência da mulher por meio do seu desempenho. “Esse prêmio foi estendido ao SBT, pois eles reconhecem a ação da emissora nesse sentido de valorização. A diferença dessa premiação foi a seleção, que é feita por um grupo de pessoas ligadas diretamente às questões raciais. Foi um momento muito importante estar presente nessa seleção escolhida de forma criteriosa por pessoas engajadas realmente em temas focados na dificuldade da vida da população negra em nosso país”, ressalta.

“Ganhar o Prêmio Raça Negra foi o reconhecimento das pessoas. Quando entrei no jornalismo, nunca imaginei isso, claro que você entra numa profissão com o olhar positivo, vai dar certo. Mas ser homenageada

desta

forma foi uma surpresa que me deixou muito feliz. Vou guardar para sempre, foi maravilhoso, uma festa bonita com grande emoção”

Joyce iniciou suas atividades no SBT em 2005, fez repórtagens, e aos foi construindo sua história e mostrando seu talento. Em pouco tempo já assimiu o Jornal do SBT manhã ediição da noite, substiindo a jornalista que admira, Ana Paula Padrão.


Crêdito: Roberto Nemanis/SBT O boletim de ocorrência vai ao ar em duas edições e tem como proposta trazer reflexão sobre o problema da violência no Brasil

Estar à frente de um jornal em rede nacional foi uma experiência relevante na carreira da jornalista. “Comecei cobrindo as ausências da Ana Paula Padrão que estava desenvolvendo um projeto no núcleo de jornalismo no SBT. Foi um momento marcante. Passei a fazer o SBT Brasil e também fiz o Jornal SBT manhã”, conta.

do vôos maiores. E desde outubro de 2009, Joyce apresenta o telejornal Boletim de Ocorrência no SBT - primeira edição às 19h10, com 30min de duração e segunda edição 22h10 com 15min de duração. O programa, que vai ao ar em rede nacional, coloca Joyce à frente de uma equipe de jornalistas em todo o país, responsáveis pelas reportagens que ela apresenta e comenta. O programa Novos vôos traz uma proposta diferente dos notDurante sua trajetória na emis- iciários policiais aos quais o público está sora, Joyce também fez reportagens acostumado. e trabalhou com previsão do tempo. O objetivo do programa é disMas o talento da profissional abre cutir a violência urbana, focar no crespossibilidades de estar sempre alçan20

cimento da violência e analisar o impacto disso na sociedade atual, que faz com que as pessoas não convivam harmonicamente, se fechem e criem medo de pessoas estranhas, mudem o comportamento social. O programa busca, não somente mostrar os casos de violência, trazer uma conscientização a respeito da necessidade de denunciar. Além de ser um programa que utiliza sua força enquanto veiculo de comunicação para cobrar das autoridades as ações necessárias para redução da criminalidade no país.


“Muitas pessoas criticam os programas ligados às questões de violência, que bom seria se não Em junho desse ano, pouprecisasse falar da violência no Novos Rumos Joyce planeja dar andamen- co antes da promulgação da Brasil. Mas, ela existe, precisa e to também a área acadêmica, seus lei que cria o Estatuto da Igualcarece de reflexão”

dade Racial, Joyce esteve com o ministro da Igualdade Racial, São três focos: conscientização, Eloi Ferreira Araujo. Um dos cobrança e informação. “Nosso país pontos abordados na conversa é gigante e muitas vezes as pessoas foi o mercado de trabalho para não sabem como agir em casos de o negro no Brasil. A polêmica violência. Buscamos dar também questão do incentivo fiscal esse direcionamento. Muitas pessoas para contratação de negros foi criticam os programas ligados às um dos temas. “Acredito na imquestões de violência, que bom seria portância sim deste incentivo, se não precisasse falar da violência mas é como a questão das cono Brasil. Mas, ela existe, precisa e catas, tem que ser uma medida rece de reflexão”, analisa. temporária. As ações afirmatiOutro ponto importante é a vas dão um resultado positivo. não exposição das pessoas, vítimas É só observamos o caso dos da violência. Joyce destaca que na EUA, ressaltando é claro as difemaioria das vezes as pessoas aparerenças de nossa sociedade, mas cem como anônimas: “Temos esta não podemos negar o sucespreocupação em todas as nossas so do processo que ocorreu produções, na maioria dos casos são naquele país. Eles colocaram as próprias pessoas que buscam o Sistema de Cotas programa para contar suas histórias, O interesse nessa área dá a ações afirmativas em vários querem que tenham visibilidade e Joyce um olhar questionador sobre setores como esporte, cursos, que, desta forma, haja algum anda- a situação do negro no país. Pen- empresas e universidades”. mento nas punições ou alguma mu- sando, por exemplo no sistema de Joyce acredita que o impordança de atitude”. cotas, Joyce opina favoravelmente à tante é não criar a ideia de que O programa procura repetida- existência delas, porém acredita que este profissional está sendo mente focar nas questões da violên- devem ser adotadas como medida beneficiado com uma ajuda. cia contra a mulher e também abusos emergencial com prazo de início “É preciso tomar cuidado para em crianças. “Procuramos incentivar e fim. “O ideal é que todos tenham que não estejamos criando um as mulheres a buscar ajuda logo na realmente as mesmas condições. As profissional discriminado. Por primeira agressão e não deixar a situ- cotas corrigem uma situação desfa- isso essa necessidade de não ter ação chegar a um nível elevado. E em vorável, pois na condição que o negro o sistema de cotas para sempre, casos de abuso infantil, procurarmos vem enfrentado ao longo do tempo ele deve ocorrer e, em paralelo, contextualizar sempre as situações não teria condições de concorrer às estar sendo corrigidos os desem que isso pode ocorrer. Para que vagas em universidades públicas, vios, as distorções na sociedade, mães fiquem atentas e nunca deix- com pessoas que têm condição de para que os negros consigam em as crianças com estranhos, paren- pagar um preparo em cursos par- realmente, em pé de igualdade, tes de parentes, amigos de amigos, ticulares de qualidade. Não se trata o acesso à escola, à faculdade, gente que não tenha total confiança. de dar uma ajuda para entrar na uni- disputar as vagas normalmente É preciso prevenir sempre para que versidade, é uma medida para repa- de emprego. As cotas devem possamos reduzir o numero desses rar uma situação desigual”, comenta. servir apenas para alavancar, um pontapé inicial”. crimes”, ressalta. projetos a longo prazo são focar no jornalismo e se especializar na área social, mas especificamente em Ciências Sociais. Pretende para 2011 iniciar uma pós graduação na área, pois acredita que o curso irá contribuir para seu trabalho no jornalismo de TV, com aprofundando mais nas questões sociais, facilitando a construção das discussões. Espera que a análise mais próxima da sociedade lhe desperte para um velho sonho de escrever um livro: “Não achei exatamente a linha do que quero escrever, minha expectativa é que com essa pós venha a ter um despertar sobre o que desejo realmente levar às pessoas”.

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PERFIL “As cotas corrigem uma situação desfavorável, pois na condição que o negro vem enfrentado ao longo do tempo não teria condições de concorrer às vagas em universidades públicas, com pessoas que têm condição de pagar um preparo em cursos particulares de qualidade. Não se trata de dar uma ajuda para entrar na universidade, é uma medida para reparar uma situação desigual”

Militância é no dia a dia Apesar de não fazer parte de nenhum movimento social negro organizado, a jornalista se colocar como um militante real nas causas da população negra, o que é bem observado a partir da qualidade e preocupação com seu trabalho, “Cada profissional, em diferentes áreas, pode contribuir para ações de redução de discriminação em nosso país, é preciso observador como, às vezes na necessidade de indicação de um profissional para uma vaga de emprego, valorizando de alguma forma a população negra”, afirma. Na área de comunicação em que está situada, Joyce acompanha muito a falta de visibilidade do negro e, quando este é mostrando, é sempre de forma estereotipada. Para ela, o negro deve estar inserido no contexto da mídia para também promover mudanças. São necessárias, segundo a jornalista, ações efetivas: “O negro precisa ocupar espaços também dentro de uma produção, não necessariamente tem que estar à frente

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de reportagens, mas estar inserido no processo como produtor, pauteiro, enfim, em várias funções para que esteja sempre comprometido com a comunicação e, a partir de seu olhar, mude este enfoque estereotipado que muitas vezes é dado”. O olhar sobre o negro no jornalismo No jornalismo, por exemplo, Joyce diz que, pela correria que é a produção, muitas vezes passa batida a necessidade de colocar profissionais negros nas reportagens, o que acaba fazendo com que esses sejam vistos sempre na área da marginalização. “A exposição das fontes oficiais acaba sendo 100% branca. E tem muita gente boa aí produzindo, muito profissional negro competente que está apto a dar opinião e conduzir os assuntos de forma qualificada. A questão é atender a demanda e utilizar também esses profissionais”. Apesar das dificuldades Joyce acredita que esse cenário tem mudado. “Eu sou uma eterna otimista e percebo que realmente temos uma mudança, ainda que pequena, mas com o tempo o resultado seria bem positivo”, garante.


É preciso tomar cuidado para que não estejamos criando um profissional discriminado. Por isso essa necessidade de não ter o sistema de cotas para sempre, (...)As cotas devem servir apenas para alavancar, um pontapé inicial”.

Assessoria Guilherme de Queiroz

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Guilherme de Queiroz


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A construção do imaginário do negro começa também na escola e Joyce identifica isso muito bem, salientando a importância da educação no processo de construção da imagem do negro na sociedade. A sua infância foi relativamente tranquila, residiu em bairros na zona sul de São Paulo, onde não havia uma predominância tão acentuada da população negra o que resultou em determinadas situações inconvenientes no seu período escolar. “Existem regiões em São Paulo em que há uma forte presença da população negra, normalmente nas zonas norte e leste. Nas escolas que estudei o número de crianças negras era reduzido e, portanto, isso causava um certo embaraço para mim, pois ocorriam, sim, situações de preconceito, de apelidos. Eram coisas isoladas, que não chegaram a trazer um grande transtorno, mas realmente ocorriam”, conta. Joyce declara que acredita que o papel do educador, do professor é fundamental nesse momento. “É preciso que o professor esteja preparado para agir nesses momentos para que as crianças aprendam a entender a questão das diferenças no nosso país. E com o mundo cada vez mais globalizado elas tendem a se fortalecer, não somente na questão do negro, mas a presença de varias etnias constantemente”. Para a jornalista a mudança de situações de preconceito podem ser transformados a partir da educação. “O racismo é processo construído no imaginário da pessoa, se ela cresce vendo situações de preconceito e ninguém falando nada ela vai naturalizar isso e vai agir também. Se isso não é alimentado no imaginário daquele cidadão que está em formação, ele não irá reproduzir isso no futuro e irá agir de forma ativa em casos de abusos que presenciar. Se a gente quer uma sociedade mais tolerante, com um respeito pelo outro é preciso trabalhar isso para que, o quanto mais cedo uma criança perder a essa visão incorreta, ela será uma pessoa melhor e, consequentemente, teremos uma sociedade melhor e mais justa”, ressalta. Recebe todos os dias muitas manifestações de carinho e reconhecimento por ser trabalho, principalmente de jovens negros que percebem nela um ícone e um bom exemplo de trajetória de sucesso. Para esses jovens e crianças negras que sonham e almejam as mais diferentes carreiras Joyce fala da necessidade da busca constante do conhecimento e

do preparo que precisa ter para ser um profissional bem sucedido: “Sou muito grata pela torcida e pelo carinho que as pessoas manifestam pelo meu trabalho. Eu sei exatamente o que um negro está pensando ao me assistir. Só devo agradecer às mensagens recebidas por pessoas do Brasil todo. São pessoas que realmente acompanham meu trabalho e torcem por mim, isso dá mais forças nessa caminhada. Deixo uma dica para os jovens: estudem sempre. É o preparo mesmo que faz a diferença. Você tem que estar muito bem preparado quando a oportunidade aparecer, isso para qualquer área que escolher. Não há uma fórmula mágica. O importante é não desistir, por mais difícil que seja a trajetória, só assim vamos mudar essa realidade e construir uma sociedade mais justa”.

O negro precisa ocupar espaços também dentro de uma produção, não necessariamente tem que estar à frente de reportagens, mas estar inserido no processo como produtor, pauteiro, enfim, em várias funções para que esteja sempre comprometido com a comunicação e, a partir de seu olhar, mude este enfoque estereotipado que muitas vezes é dado”.

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TRAÇOS E RECORTES DA FORÇA DE UMA NAÇÃO


Durante 40 dias as lentes do fotógrafo Leandro Taques captaram sob um olhar experiente uma Angola cheia de expectativa diante de um futuro até bem pouco fictício. A paz chegou depois de 27 anos de uma guerra que dizimou a população, mas não destruiu a esperança da construção da nação. Taques, junto com o jornalista Julio Cesar de Lima passaram por18 províncias durante 40 dias. As fotos foram feitas sempre com o consentimento das pessoas a partir das entrevistas de Lima, o que tornou as imagens muito mais fortes. A ideia de fazer o livro surgiu a partir de uma viagem que Taques fez a Angola, sem recursos resolveu fazer um trabalho de fotografo free-lancer, quando percebeu a importância do trabalho que poderia desenvolver retornou ao Brasil para tentar uma parceria que foi fechada com a Petrobras. Registrar o pós-guerra já era um desejo de Taques, em 2002 iniciou um trabalho no Afeganistão e Paquistão, histórias de guerra sempre chamaram sua atenção “O que mais me fortaleceu a fazer a obra foi que li muito sobre a guerra civil e a própria história de Angola e a partir do momento que cheguei no país tudo mudou. O país estava há pouco tempo em tempo de paz, apenas quatro anos depois de quase três décadas de guerra a partir daí resolvi fazer o projeto”, conta A fotografia tem o poder de transformar as pessoas a partir de seu impacto para Taques viajar para Angola por si só já foi uma experiência fantástica “Mas, viver uma cultura diferente é muito mais intenso, me interesso muito em sempre conhecer outras formas de viver, outras culturas. E uma cultura de um povo que sofreu tanto tempo com uma guerra civil e pensar que nós, no Brasil nunca tivemos uma guerra, então é muito significativo”, destaca. Além das fotos, Taques assina o texto de abertura o restante ficou por conta de Lima, que também esteve com o fotógrafo nas outras experiências de registro de pós guerra. O que mais surpreendeu o surpreendeu foi a vontade do povo em reconstruir o país, a mesma força que pode ser conferida em cada imagem. 27


O retrato da Paz mostra o povo angolano com seu jeito simples e com olhar no futuro. Taques destaca que no olhar é possível ver a esperança na nova fase que se estabelece co mo fim da guerra em 2002. Foram quase 30 anos de combate entre o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) o qual contava com a força da URSS e pela União Nacioanl pela Independência total de Angola, a chamada UNITA que contava com apoio dos EUA e também da África do Sul. O fotográfo explica no prefácio que o MPLA, a Unita e a Frene Nacional de Libertação de Angola - FNLA, a qual perdeu forças ns primeirso anos da guerra, lutaram pela independência de Angola, que dependia então de Portugal. A independência veio em 1975 e iniciou a Guerra Civil entre os movimentos, que desejavam o poder no país.“Essa guerra só terminaria em 2002 ciom a morte do líder da Unita, Jonas Savimbi, deixando o MPLA como vencedor e ainda hoje no poder”, conta Taques.



“Se em quatro anos de paz já nos organizamos a ponto de levar a seleção de futebol para a Copa do Mundo, o que não poderemos fazer por este país e por sua população em 20 anos? Viva a paz!’ (relato de um trabalhador angolano dentro de uma can-

donga - van que faz o transporte urbano - para o fotográfo e jornalista Julio Cesar Lima.”)

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“São milhares de pessoas que lutaram e viveram, em sua maioria, mais de um adécada no interior das florestas angolanas ou se refugiaram em favelas na capital Luanda. Elas sentem, mas não aproveitam os ventos do progresso” jornalista Julio Cesar Lima


6,5 quilometros por via terrestre 48 cidades visitadas 11 das 18 provincias 5 mil fotografias 18 horas de entrevistas 6 horasa de filmagem “Em meio a tudo isso, a satisfação imensa de se envolver com um povo hospitaleiro, alegre, simples e cheio de vontade de recuperar o tempo perdido durante a guerra, que muitos nem entenderam. Só a viveram, sem outra escolha”

ESPECIAL


ESPECIAL

UM OLHAR SOBRE A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA Seis comunidades do candomblé relatam as dificuldades para aceitação de sua religião.


Eli Antonelli


ESPECIAL

“Sou mais um sacerdote de religião de matriz africana. Cresci a em uma roça de candomblé porque minha mãe carnal era yalorisá. Eu era um moleque que via muitas pessoas com fé nos orixás e tinham orgulho em dizer que eram do candomblé. Existia intrigas, sim, claro que sim, mais todos eram unidos em invocação aos ancestrais. Eu era só um menino não sabia a importância daquelas funções: de trabalho em dia de atos, oros, toques, palavras em yorubá ou bantu, as mulheres os homem trabalhavam limpando frangos, outros tirando coro de cabrito... Não entendia nada. Achava que era um sofrimento, pois era um olhar de menino sobre aquilo. Eu via os ogãs que já se foram, tocarem muito, cantarem até que o dia raiasse. A cada batida nos atabaques, a cada palavra que saía da boca do círculo da roda passou a encantar-me. Assim meu culto me fez ogan, não sei se bom, não sei se mau, mas ogan. Então entendi que não era sofrimento e sim fé, carinho devoção aos orixás. Acredito que sou predestinado a defender meu povo de religião de matriz africana doa a quem doer. Que ainda tanto sofre com intolerância, jogo político e de vaidades...”

Ogan Carlos Augusto de Souza - Oloye Ogã alagbe Omimlewade Presidente da Associação de Ogã de Londrina/PR

Eli Antonelli

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Marcio Marins

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rimeiros dias da primavera, após uma chuva forte, Londrina amanhecia com um sol tímido em meio aos seus 20º C. E é nesse clima aconchegante que aguardamos a chegada do presidente da Associação dos Ogãs de Londrina e Região, Carlos Augusto de Souza, chamado de Ogã Carlinhos. Nossa presença na cidade se deve por uma denúncia que levantava uma série de situações de intolerância religiosa contra a população praticante do candomblé na região. Histórias tristes fortalecidas por um desabafo do Ogan Carlinhos postado no grupo de e-mails do Fórum de Educação para Relações Etnicorraciais do Paraná em agosto deste ano. Trecho desse relato que abre esta matéria, foi um desabafo de alguém que presencia as dificuldades e a luta constante dos adeptos do candomblé para que sua crença seja vista como uma religião como outra qualquer. E com esse intuito aceitamos o convite para conhecer as casas dessas pessoas, sua vidas e suas histórias. Londrina está localizada na região norte a 379km da capital paranaense e tem uma forte presença de terreiros de candomblé. Estima-se que sejam 450 terreiros em Londrina e região. Mesmo com um número considerável de adeptos da religião de matriz africana, a prática de situações de desrespeito é constante. Às 09h de uma sexta-feira o Ogan Robson Borges Arantes é quem nos recebe na entrada do hotel, vestido com roupas tradicionais de religião de matriz africana, todo de branco com um aketé na cabeça, Arantes nos conta que é desta forma que normalmente vai trabalhar assumindo sua religiosidade.O jovem de 31 anos é pedagogo, especialista em psicopedagogia, arte-educador e atua na coordenação pedagógica dos projetos de convivência e fortalecimento de vínculos familiares, são 17 unidades espalhadas nas regiões periféricas da cidade e centro. No caminho até a cidade de Cambé, região metropolitana de Londrina, onde iríamos nos encontrar com o Ogan Carlinhos repassamos a programação do dia, estamos a caminho de nossa peregrinação rumo às oito casas de candomblé. Já com Ogan Carlinhos nossos anfitriões repassam algumas informações básicas para o entendimento da religião. O candomblé originou-se da população negra brasileira que faziam parte de diversas etnias como os ewes, bantus, yoruba e fons. Com as misturas dos negros escravos ocorreram divisões de nações, e os grupos de povos negros derão base à religião: negros fons ou nação jeje; negros yorubás ou nação ketu e negros bantus. A partir delas, as casas se diferenciam na forma de tocar o atabaque, e também pelo grupo de divindades veneradas e pelo idioma específico. Outro ponto destacado pelos Ogãs é o nome que os adeptos recebem após passar pelas fases de integração à religião. Essas fases são chamadas de obrigações estas fases variam de axés, mas normalmente passa pela iniciação e se renova nos 1, 3, 5 e 7 anos. Os nomes dos adeptos da religião tem origem nos idiomas yoruba , bantu. e fon. Destacaram ainda que os pais e mães de santo são chamados de babalorixá e yalorixá, respectivamente e são responsáveis pelos terreiros. Além desses, existe própria função de Ogan, responsáveis principalmente por tocar atabaques, são conhecidos como os mestres de cerimônia, pois são eles que conduzem toda a cerimônia. Existem ainda, as ekedes, que são as pessoas que cuidam dos terreiros, responsáveis por toda a organização.

Ogan Robson Arantes - Londrina


O candomblé e os órgãos de fiscalização Mãe Lufangmin conta sua luta para provar a regularidade do terreiro


Eli Antonelli

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Nossa primeira parada é no terreiro Recanto de Oxalufan da yalorixá Lufangmin. O Ogan Carlinhos explica que o termo “terreiro” foi cunhado pelo fato que antigamente as casas de candomblé eram construídas sempre em guetos, fundos de vales, lugares sem estruturas. O Ogan Robson complementa informando que o local de culto aos orixás pode ser também chamado de roças, termo bastante utilizado em Londrina, ou ainda, templo, ilê, abaças, tendas, e isso depende de cada comunidade. Quem nos recebe na casa de mãe Lufangmin é seu filho, e herdeiro da casa, Marco Antonio Rodrigues de Oliveira, no candomblé é chamado de Aladamegi, o jovem vem sendo preparado para substituir mãe Lufangmin. Logo na entrada o que chama a atenção são as plantas muito bem cuidadas que trazem ao local um contraste com o branco constante. Durante a conversa com mãe Lufangmin e seu filho, é destacado que o branco é a cor predominante em todos as roças de Candomblé. Na entrada do terreiro deparamos com aroeira, cameleira branca que é ligada ao orixá Tempo e um pé de boldo que representa Oxalá, orixás que regem a casa. As plantas no candomblé é a própria energia vital. Mãe Lufangmin teve seus primeiros contatos com a religião de matriz africana em 1978, inicialmente com a Umbanda, ainda quando morava em São Paulo. Nas primeiras idas às cerimônias da Umbanda já sentia algo forte. “Foi então que o santo bolou e ocorreu várias vezes, não teve jeito, sabia que era um chamado”, conta. Ogan Carlinhos explica que este termo “bolar” significa quando há incorporação do santo na pessoa. E isso ocorre apenas em

Eli Antonelli

ESPECIAL

Mãe Lufgmin e seu filho tem um carinho e respeito especail pelos Ogas Carlinhos e Robson

“Foi então que o santo bolou e ocorreu várias vezes, não teve jeito, sabia que era

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um chamado

O Orixá Oxalá é filho de Olorum, Deus algumas pessoas. Quem tem a funsupremo. Controla a ção de ogan, que funciona como um reprodução e come mestre de cerimônia do candomblé, cabra, pombo branco o qual conduz todo o ritual e tame milho branco. Suas bém toca os atabaques, não recebe a vestes são brancas e é conhecido como Quemincorporação. Outra função que tamOxalufã. Sua imagem n o sbém não há incorporação são os ekeé um velho que anda r e c e -des, que cuidam dos terreiros. Esses são responsáveis também por cuidar curvado apoiado be na da mãe ou pai de santo quando esses num basão chamado c a s aincorporam e ficam em transe. paxorõ. Chamado d e Mãe Lufangmin passou a fretambém de Oxaguiã, m ã eqüentar a roça de pai Meloango, o um jovem guerreiro L u -qual fixou o terreiro em Londrina em armado de um pilão e f a n g -1986. Quando do falecimento dele, mãe Lufangmin assumiu a casa em uma espada de metal http://www.2brazil.info 1995. prateado e de um escudo. 41


Eli Antonelli Ao longo desse tempo conquistou o respeito dos vizinhos, mas não foi um processo simples “Bem no início quando chegamos, houve um vizinho que não está mais na região, que tentou mobilizar todos, fazendo um abaixo assinado para nos tirar daqui. Sem mesmo conhecer quem éramos e o que era a religião. Não obteve êxito, os vizinhos não lhe deram ouvidos e hoje temos uma boa relação com todos”, afirma Oliveira. Oliveira está sendo preparado por mãe Lufagmain para substituí-la. Uma característica da religião de matriz africana é o conhecimento ser passado dos mais velhos para os mais novos de forma oral aos poucos. “Esse é o processo de transmissão do conhecimento, pois a pessoa tem que estar bem preparada e é respeitado as fases até ela ter um preparo suficiente, Oliveira ainda não está pronto, ele ainda é um iaô, que são aqueles que já iniciaram no candomblé, mas não completaram

o período de 7 anos de preparação”, explica mãe Lufangmin. Um grande risco no processo é a perda de informações e conhecimentos dos mais antigos ao longo dos anos devido ao processo de transmissão ser em etapas. O Ogan Robson questiona mãe Lufangmin se ela tem certeza que tudo que sabe Oliveira está recebendo. Robson coloca que é importante rever esse processo, afinal o que ocorreria se numa fatalidade, ela morresse repentinamente. Uma das preocupações também dos adeptos da religião de matriz africana debatidos é a internet. A comunicação oral característica da cultura africana é valorizada no candomblé. O ogan Arantes reconhece a importância desse método que manteve o contato com os ancestrais a milhares de anos, mas admite que observa na sociedade atual, com o advento da globalização, uma forte mudança. Para ele, duas dificuldades vem ocorrendo na transmissão do co-

nhecimento adquirido pelo povo do candomblé.: o tempo das pessoas que está cada vez menor e a figura do mestre vem senso substituída e muitas vezes questionada. “Quando se trata de tempo podemos fazer uma ligação com o passado, que nos permitia dar mais atenção para as coisas, temos casos de pessoas que cumpriram seus preceitos de dentro do ilê e alguns duravam até um ano, hoje o que vemos é que as cerimônias de iniciação e obrigações estão se adequando as necessidades de cada pessoa, sendo realizadas em um fim de semana. Hora, se não temos como ficar em um local o tempo necessário, quando é que teremos tempo para escutar as palavras, os ensinamentos dos mais velhos? “ Um outro ponto destacado pelo Ogan é a substituição dos ensinamentos orais por livros, vídeos e endereços na Internet “Todos estes métodos fazem muitas vezes que a figura da Iyalorisá e Babalorisá sejam questionadas, já que os conteúdos lidos muitas vezes não batem com as falas ou não falas dos mestres” Diante desse cenário, o Ogan Robson avalia que como as culturas se fazem e se transformam é necessário se apropriar dos meios de comunicação e criar métodos de aproximação entre os adeptos e os ilês” O desafio é como tornar o sagrado agradável em meio as dificuldades pessoais de cada um, A cada dia estamos perdendo informações importantíssimas, pois nossos mais velhos estão indo e não conseguem passar tudo o que sabem” afirma. Mãe Lufangmin assume que tem essa preocupação, também, e diz que para prevenir tem anotado todos os conhecimentos que adquiriu ao longo dos anos, todos os rituais sagrados nos menores detalhes o que foi recebendo por outros mais velhos.


O candomblé é antes de tudo uma religião que não tem discriminação, aceita as pessoas como elas são. E por isso é comum receber visitantes e dar a atenção aos que necessitam. Normalmente nos terreiros pessoas desesesperadas aparecem em busca de apoio são mendigos, pessoas envolvidas com drogas, alcoolismos, muitas são as situações em que essas pessoas batem à porta de mãe Lufangmin. Oliveira. conta que foi numa dessas ocasiões que ela normalmente, deixou entrar em sua residência um fiscal da Secretaria Municipal do Ambiente do Município de Londrina – SEMA, acompanhado de dois homens. “Os homens disseram que receberam uma denúncia, olharam todo o espaço que se encontrava complementamente limpo e sem nenhuma realização de cerimônia naquele momento. Mas, independente disso autuaram a casa, alegando que ali ocorria na intimação constou que o fiscal esteve no local e constatou que era uma casa de candomblé e que ocorria sacrifícios de animais e havia poluição sonora e que aquilo era um ato hediondo”, conta. Como resultado da intimação a casa ficou sem suas atividades religiosas de maio até ao início do mês de setem bro, quando o processo foi analisado por uma instância superior que pediu o arquivamento. Na carta de defesa mãe Lufangmin ressalta que na o sacrifico de animais é uma ato realizada por diversos cultos religiosos e é protegido pela Constituição Federal, como prática a um ente superior.

Oliveira explica que esses sa- continuaremos na mesma situacrifícios devem seguir rigorosamente ção, sem saber se amanhã baterá as determinadas regras e que o pro- novamente a nossa porta ou uma cesso deve ser indolor e o mais rápi- outra pessoa proibindo a realizado possível para que o animal não ção das atividades religiosas. No tenha sofrimento nenhum. O jovem Rio Grande do Sul há uma lei que explica ainda, que a carne do ani- garante a prática religiosa, isso é mal é utilizada para alimento, nada é o que precisaríamos aqui” destadesperdiçado. Até mesmo o couro ca Oliveira. desses animais é utilizado para a fa- A Associação de Ogans de bricaçaõ dos instrumentos musicais. Londrina está providenciando ”O processo não chega a ser violento junto a Secretaria Municicomo é no caso do abate de animais pal um documento em que nos locais em que esses são realiza- constara a autorização para dos. Por exemplo, o abate todos os terreiros da prática de frangos que ocorre todos os dias, religiosa, sem que haja prodecepando suas cabeças, num ato blemas com fiscalização. violento e que ninguém fala nada”, declara. Após o arquivamento do processo a casa voltou as suas atividades. Mãe Lufang- “Os homens disseram que receberam min e seu herdeiro esperam uma denúncia, olharam todo o espaço que essa situação não volte a ocorrer. “É complicado es- que se encontrava complementamenperarmos alguma ação do te limpo e sem nenhuma realização governo atual, pois se ele sair

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http://ocandomble.wordpress.com

ESPECIAL

Abordagem da fiscalização no terreiro Recanto de Oxalufan

independente disso autuaram a casa, alegando que ali ocorria na intimação constou que o fiscal esteve no local e constatou que era uma casa de candomblé e que ocorria sacrifícios de animais e havia poluição sonora e que aquilo era um ato hediondo”

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ESPECIAL

OS PASSOS DA INTOLERÂNCIA NA ESCOLA

Aline, filha de mãe Caiçutê, conta as dificuldades das crianças em assumir a religião

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Eli Antonelli

a casa de mãe Caiuçutê o branco contrasta com o azul delicado de Yemanjá, orixá que rege a roça Ilê de Roda Luna. As plantas no jardim da frente dão o colorido para a atmosfera tranquila que rege o espaço. Tudo é cuidadosamente limpo e delicado na casa que existe desde 1986. Mãe Caiuçutê entrou para a religião do candomblé depois de sofrer um grave problema de saúde para o qual não conseguiu ajuda da medicina convencional. Na época, seu pai foi indicado a levá-la para ser atendida por um caboclo que disse à jovem que ela estava predestinada à religião e, como numa determinação, per-

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guntou se ela iria por amor ou pela dor. Hoje, totalmente recuperada, a mãe de santo usa a religião para trazer às pessoas a mesma paz e serenidade que um dia encontrou num momento de crise. Durante o almoço, alguns filhos - como são chamados os adeptos das casas - chegam ao terreiro para mostrar o barracão a uns visitantes. São recebidos com o mesmo sorriso costumeiro, em sua residência encontram-se também mais duas jovens que auxiliem mãe Caiuçutê com as necessidades da roça. Além dos filhos de santo, ela tem três filhas de sangue. A mais jovem, de 12 anos, se prepara ansiosamente para o início de mais um dia letivo. Correndo para não perder o horário, a menina ainda encontra tempo para relatar as situações de preconceito que sofreu na escola. Aline Gabriele Alves de Souza cursa atualmente a 6ª série do ensino fundamental e, apesar da pouca idade já sofreu intensamente na pele o preconceito à religião. Aline conta que passou a ser chamada de “macumbeira” pelas colegas de classe, inclusive com citações escritas no quadro negro e em outros locais da escola. Mas, apesar de ser ainda uma criança, não se deixou pressionar, reagiu ativamente afirmando que o ato das alunas


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Eli Antonelli

Iemanjá, a rainha do mar, conhecida como mãe D’água, Iara, Sereia e Janaína, em diversas regiões do país ela é cultuada na passagem do ano, momento em que ocorre as oferendas de velas, pentes, flores, espelhos, sabonete esperando que Iemanjá leve a tristeza e traga felicidade aos seus devotos.

era preconceito e ela poderia, junto com a mãe, tomar uma atitude jurídica contra as pessoas que a estavam humilhando publicamente no espaço escolar. De imediato afirmou que chamaria a patrulha escolar para que esses tomassem uma posição. E foi o que fez. Por coincidência, a policial que a atendeu também era adepta de religião de matriz africana. As meninas que a humilharam tiveram que limpar os locais em que pincharam as ofensas nos muros e quadros. A escola se posicionou favorável a Aline, dando a ela todo apoio possível, não havendo necessidade da manifestação da mãe diante da situação.

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ESPECIAL

Lembranças da discriminação

Eli Antonelli

A falta de conhecimento do candomblé é uma das causas da intolerância

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idade de Ibiporã é onde está localizado o terreiro Ilê Axé Ayra do pai Obalogi. Apesar do leve sorriso no rosto que demonstra uma pessoa alegre e de bem com a vida, pai Obalogi não esconde que já sofreu na pele a intolerância da religião, de forma velada, discreta ou por meio de ações mais violentas: “Já chegaram, inclusive, a jogar tijolos em minha casa, não se importando a quem iria acertar. As pessoas que fizeram isso são radicais adeptos de algumas religiões evangélicas”, conta. Na ocasião, pai Obalogi buscou ajuda na delegacia, porém o tratamento foi surpreendente e, de vítima, ele virou acusado. “Ouvi de um antigo delegado que se continuassem com as ações do terreiro ‘iriam sentar a borracha’”, relembra. A intolerância para ele nada mais é do que a falta de informação, o completo desconhecimento sobre as religiões de matriz africana. Apesar de tudo que já passou, pai Obalogi acredita em mudanças, afirma que é importante haver maior divulgação do que é a religião do candomblé para que não haja mais discriminação, principalmente por representantes públicos. “Esses devem respeitar ainda mais e defender a liberdade de culto. Aliás, a prefeitura é que tem um papel bem importante nessa ação, para que haja mais divulgação do que é o candomblé, inclusive nas escolas”, afirma. Em uma situação em que sofreu um acidente, no qual parte de uma laje atingiu sua cabeça, pai Obalogi conta que ouviu de um médico que deveria procurar Jesus, pois poderia acontecer de toda a laje cair sobre ele. “O médico esqueceu que este tipo de acidente de teto inteiro caindo sobre os fiéis, aliás, já aconteceu em igrejas e templos evangélicos mais de uma vez”, destaca. Para pai Obalogi, é importante as pessoas conhecerem que o pai de santo tem uma formação de opinião, tem a responsabilidade de contribuir na formação humana com seus conselhos e ensinamentos. Afirma que é comum associarem a religião de matriz africana com o demônio: “Mas se você parar para pensar vai perceber que o ‘demônio’ está realmente naqueles que não permitem que os outros professem sua crença que vivem para atormentar os praticantes de outras religiões”, conclui. Abalogi destaca a importância da valorização do candomblé e das demais crenças. “As religiões de matriz africana advêm de uma cultura milenar, como a própria história do povo negro, mas mesmo assim, ainda continuam sendo tratados de forma desumana”, conclui.

“Mas se você parar para

pensar vai perceber que o ‘demônio’ está realmente naqueles que não permitem que os outros professem sua crença que vivem para atormentar os praticantes de

outras religiões


A caminho de seis décadas dedicadas ao Candomblé Com 68 anos, mãe Kaiu Unde Logo na chegada do terreiro da mãe Kaia Unde, nos deparamos com uma igreja evangélica bem na frente da casa. São 19h30 e o culto está iniciando, o pastor fala aos fieis de sua adoração a Deus, ainda no portão podemos escutar e acompanhar a adoração. E é com o mesmo respeito que deseja, que mãe Kaia Unde nos recebe e fala dos vizinhos. Conta que no início quando os pastores se instalaram na frente de sua casa, em que vive há 23 anos, houve muitos problemas “Foi complicado, pois muitos fiéis, os mais radicais não conseguiam conviver pacificamente. Eles agrediam com palavras duras, e o mais cruel oravam apontando para a minha casa como se o mal estivesse instalado aqui. E não era algo só para eles, utilizam o microfone e toda a vizinhança podia ouvir”, relembra. Mãe Kaia Unde foi pioneira na região, veio de Ilhéus na Bahia e quando chegou na vizinhança só havia mato, nenhuma casa “Aos poucos a região foi sendo povoada, mas como chegamos aqui antes, as pessoas passaram a respeitar normalmente. Dona de um olhar tímido, com uma voz mansa, mãe Kaia Unde passa uma tranqüilidade para aqueles que estão à sua volta. Uma pessoa simples, com gestos leves e delicados que discretamente detém um conhecimento ancestral de sua religião. A relação com o candomblé começou bem cedo, ainda no Estado da

dedicou 58 anos de sua vida ao candomblé

Bahia “Eu tinha 10 anos quando os médicos diagnosticaram uma doença muito grave, segundo eles era incurável. Como estava desenganada por todos os médicos que meus pais conseguiram me encaminhar, minha madrinha resolveu me levar escondida de meus pais, que eram evangélicos, para ser benzida”. Mãe Kaia unde conta que ficou neste local até se recuperar, quando voltou para casa de seus pais a situação ficou muito tensa “Era visível que eu havia passado por um processo de aproximação com a religião, haviam cortado o meu cabelo, durante o ritual. Meus pais não aceitaram estar diante da filha mesmo com vida, mas ligada agora à religião”, relembra. Hoje, mãe Kaia Unde está com 68 anos, e diz com orgulho que 58 anos foram dedicados a vida dentro do candomblé. Ela é a mais velha da religião na cidade. Com relação a situações de discriminação que sofreu, ela conta que os vizinhos evangélicos, hoje, depois de dois anos, tem por ela uma relação de respeito. “Hoje há diálogo, conversamos, inclusive faço ação social aqui no terreiro e muitos deles vem até aqui para buscar roupas e alimentos. Temos hoje, uma boa relação, conquistada aos poucos. Conversar é a melhor forma. É com o conhecimento na religião que Eli Antonelli se reduz a discriminação” diz.

eons c o nã agre ais c s i e d l ra te. E cruel ais n e m s ,o cam o mais omo s fi i c i é c a pa as ,e s fi a uito nviver s duras ha c não er n i M “ m o a E mc e lavr ui. ra a guia om pa ndo pa ado aq rofone c l a ta ic inst pon om diam a e s m s am ve iza ir” orav al esti es, util ouv l a m i e d se o ó para a po ç n s a algo vizinh a toda

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ESPECIAL

“As religiões de matriz africana deveriam ser prioridade, pois confundem-se com a própria história do nosso país. É a história dos escravos que formaram a nossa nação, do povo que sofreu, foi dizimado. Do povo que deixou a herança cultural”

A beleza do candomblé enquanto herança cultural É preciso paciência e respeito para entender a religião cultuada desde a época dos escravos no Brasil

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casa Ilê de Dandaluna e Ogum, Viva Deus Neto em Londrina foi fundada em 1983 pela mãe Hominitã; quando faleceu deixou sua filha Tumbuladê, Maria Angélica Ferreira Freitas, como herdeira. Diferente dos demais terreiros, Tumbaladê é uma ekede, ou seja, ela não incorpora os orixás, sendo assim, mãe Adamuralê veio auxiliar nos trabalhos da casa e está com ela em todas as atividades. Logo no início da conversa uma das primeiras questões levantadas é o fato do ensino religioso nas escolas dar privilégios às demais religiões e não contemplar o candomblé: “As religiões de matriz africana deveriam ser prioridade, pois confundem-se com a própria história do nosso país. É a história dos escravos que formaram a nossa nação, do povo que sofreu, foi dizimado. Do povo que deixou a herança cultural, por exemplo na comida,

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no angu, na feijoada. É uma dívida com o povo negro”, destaca Tumbuladê. A jovem mãe de santo conta que o filho de 10 anos sofreu uma situação tensa na escola “Alguns colegas passaram a discriminá-lo e colocar apelido em meu filho insistentemente, chamavam-no de ‘feijão preto’ de forma ofensiva e pejorativa A professora que deveria se posicionar para evitar que situações como esta continuem ou aumentem, simplesmente disse a ele que deveria pedir para que eu entrasse com um processo e ganhasse dinheiro com a situação. Essa não é a postura de uma educadora, que está ali para ensinar não só um conteúdo, mas para auxiliar na educação também”, desabafa. Tumbaladê acrescenta que a postura correta da professora, no seu entender, era chamar as duas crianças, conversar e explicar porque era ofensivo e que aquela atitude não de-


.”“Na escola chamam as

crianças de macumbeiros e mal sabem o que palavra macumba significa simplesmente um instrumento musical” veria se repetir. “E isso é muito comum, principalmente aos adeptos das religiões de matriz africana, chamam as crianças de macumbeiros. Mal sabem o que palavra macumba significa simplesmente um instrumento musical”, afirma. Para ela, o que falta é conhecimento para não discriminar. “A religião tem sua beleza, como todas as outras, e a dança mal vista por muitos faz parte de toda uma integração com espiritual”. Mãe Adamuralê acrescenta que para cada orixá há um modo especial de dançar e a representação é uma festa muito bonita. “Ele, (o orixá) vem vestido de peças coloridas de acordo com o orixá que representa no barracão, e é uma simbolização do que ele era, um guerreiro, por exemplo. Ele habita entre os seres humanos e é o senhor dos caminhos. Oxum, por exemplo, é banhada no rio, é a beleza, delicadeza, afasta o grande mal. Uma coisa que é preciso entender: um orixá não castiga, ele educa”, explica. Outro ponto que é sempre levantado com preconceito são as oferendas aos santos. Mãe Amaduralê

http://racismoambiental.net.br

Ogum é herói civilizador, corajoso foi ele quem ensinou os homens a forjar o ferro e o aço. Tem sete instrumentos de ferro: alavanca, machado, pá, enxada, picareta, espada e faca e ajudo o homem a vencer a natureza. Antes de ser temido é amado pelos adeptos da religião.

explica que as oferendas são alimentos colocados na natureza, mas com respeito. “Há todo um cuidado, não existe ação de poluição e degradação da natureza. Todos os alimentos são possíveis de serem absolvidos pelos peixes e o resto são coisas que se dissolvem tranquilamente”, conta. Mas essa falta de conhecimento, deste cuidado, tem causado muitos problemas. “É muito comum fazermos as oferendas e já deparar com a polícia, por causa de alguma denúncia. Isso ocorre muito na cidade de Bandeirantes, cidade próxima em que há uma bela cachoeira onde são feitas as oferendas. É comum mal ser feita a oferenda e já chegar um carro de polícia, o que não ocorreria com tanta rapidez se fosse um assalto, um roubo, talvez”, desabafa. Conhecer a cultura e como funciona a religião é o ponto central para redução da discriminação, de acordo com a maioria dos adeptos. Um aspecto abordado é a questão do equilíbrio que o candomblé traz na vida das pessoas. Segundo Amaduralê, é comum trazerem pessoas com deficiência mental grave para que recebam a paz dos orixás e sejam tratadas. “Em São Paulo, por exemplo, no hospital para deficientes mentais em Pirutuba, já há um respeito pelas religiões espíritas é permitido a visita aos pacientes, para trazer a eles maior tranqüilidade”, conta. Tumbarolê complementa que houve uma situação inusitada em que o marido trouxe uma moça de 25 anos acorrentada para a roça, pedindo urgência em algum tipo de ajuda. “Ela já havia agredido os filhos e o marido e quebrado toda a casa, estava desesperada. Minha mãe Hominitá que atendeu. Deu um banho de ervas nela e a acalmou. Ela olhava para minha mãe com ódio, bufando. Mas, mesmo assim, a mãe pediu para soltá-la. Ela se tranqüilizou e voltou para a família”. A religião exige dedicação: “Todos os dias é um aprendizado, é preciso humildade para aprender sempre e perguntar aos mais velhos. Você pode viver 100 anos, mas não vai saber um terço de tudo que há no candomblé. É preciso paciência. Estou sempre aprendendo uma comida de santo nova, sempre alguma informação diferente”, diz Tumbarolê.

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Candomblé

O candomblé como

TRANSFORMAÇÃO

VIDA

de

Aos críticos das religiões, àqueles que se declaram não necessariamente ateus, mas não confiam e não acreditam na força e na importância de uma religião podem se surpreender e quiçá mudar de ideia ao conhecer a trajetória de Enrique Armando Caroço Pisarro, pai XX, do terreiro Templo de Ogum Ilê Axé Brasil Chile. >>

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ESPECIAL

A

religião do candomblé não fazia parte da vida do sacerdote da Igreja Dominicana da cidade Santiago no Chile. Em plena ditadura de Pinochet nos anos 70, uma das mais violentas em que a humanidade conheceu Enrique daria os primeiros passos de uma história que o levaria à religião do candomblé há muitos quilômetros de onde vivia. Páginas de uma história que só depois de muitos anos tomou sentido. Um Chile arrasado durante 17 anos em que o governo combateu os partidos de esquerda que defendiam o poder constitucional. No meio do regime autoritário em que se estima que foram dizimados mais de 50.000 pessoas, vitimas da mais cruel ditadura do Chile, Enrique se encontrava, mesmo sendo de direita, não sendo comunista e não fazendo parte da leva de inimigos do governo, foi preso e expulso de seu país de forma cruel. Mas, não sem antes ser torturado e ter seu corpo brutalmente multilado. Em meio ao relato de sua saída do Chile, Enrique fala pausadamente e tenta remontar os acontecimentos. Apesar de ter passado muito anos, as lágrimas continuam a escorrer pelo seu rosto ao relembrar toda a violência e dor que sofreu. Conta que ao encontrar amigos jornalistas que também sofreram a tortura, ainda choram “Não é um sentimento de raiva que ficou, mas uma emoção muito forte que só entende quem passou”, destaca. Nas mãos segura uma bandeira do Brasil, costurada por uma amiga que foi fuzilada na praça do governo. Expulso de seu país, distante de suas raízes Enrique chegou ao Brasil, na cidade de Londrina no Paraná, com a esposa e o filho “Estava numa situação miserável, não tinha condições nenhuma de manter minha família, não tinha a documentação necessária e tínhamos fome. Passamos muita fome”, relembra. Enrique buscou ajuda na igreja e não encontrou apoio “A única pessoa que me ajudou na igreja foi Geraldo Majela, o qual me auxiliou com a questão da documentação”. Um dos momentos mais difíceis foi quando teve que fazer uma operação do ouvido, mas uma seqüela da tortura deixada pela ditadura de Pinochet “Eu não pensava em outra coisa a não se me suicidar. Aqui no Brasil, muitos foram os padres que se mataram depois do golpe de 1964, e como eles eu não via saída”, conta. Foi quando Enrique se aproximou da religião de matriz africana, não tinha muitas informações. Mas, seguiu o conselho de algumas pessoas e se aproximou primeiramente da Umbanda. Enrique carregava uma bagagem cultural e intelectual muito ampla formação em Teologia, Filosofia, Parapsicologia, Técnico Agrícola e Veterinária, mesmo diante de todo o conhecimento que adquiriu na sua vida era do lado espiritual que precisava urgentemente de ajuda espiritual, pois a vida não mais fazia sentido para ele “Nos primeiros contatos senti medo, achava que era bruxaria. Com o tempo foi se acostumando.”


Candomblé

Mas mesmo fazendo parte iniciando o processo das etapas dentro da religião, Enrique não acreditava em nada. “Até o momento da minha obrigação eu ria de tudo aquilo”, afirma. Enrique se emociona novamente ao contar que houve um momento marcante na religião do candomblé que o ligou definitivamente à crença nos orixás e foi quando ocorreu a mudança na sua vida. Mas, como em muitos momentos da religião este momento único não é passado para outras pessoas. Diante da mesa deparamos com a obra “Reflexiones y Propuestes de S.E el Presidente de La República” de Ricardo Lagos Escobar, na obra os horrores da ditadura e a lista dos prisioneiros. O número de prisão de Enrique 456520 é o número do orixá que o rege XXX. Hoje o terreiro xxxx realiza atividades sociais, como ajuda aos mais necessidades e distribuição de cestas básicas. O mesmo amor que dedica à religião no Brasil foi o que o impulsionou para criar o Templo de Ogum Ilé Chile Brasil tempo no Chile, o primeiro do país. Mas, como ocorre no Brasil em Santiago situações de não aceitação da religião também são comuns. Enrique fala de uma manifestação que ocorreu um dia após a visita do presidente Lula no país, uma forma de tentar ter uma visibilidade por parte das autoridades. Na ocasião os manifestantes foram severamente reprimidos. “Foi um apoio também aos estudantes da Universidade de Santiago que usam facões em suas danças aos Orixás, ocorreu em frente ao Palácio Presidencial e teve um caráter político também uma manifestação contra o ministro do interior.


Uma das mais sensíveis formas de intolerância é o não cumprimento da legislação da liberdade religiosa que encontra-se prescrito na constituição, para Enrique essa é a forma mais cruel de discriminação. Mas, as feridas não são somente institucionais há três anos num momento de paz e encontro com o equilibro ouviu uns ruídos intensos que pouco a pouco reconheceu sua origem, seu Templo estava sendo apedrejado. Mesmo passado o tempo ainda é possível ver as marcas na casa e da violência dos impactos que poderiam atingir alguma pessoa e causar uma tragédia. A agressão ocorreu outras vezes, Enrique afirma que a situação parou de ocorreu graças a força da oração e da fé em seus orixás. A intolerância e a discriminação nem sempre ocorre de forma tão expressiva, ela pode ser mais discreta e desta forma às vezes muito mais intensa, como nos casos de legislação não respeitada pelo poder público e mesmo por membros da sociedade civil, Enrique conta que em uma oportunidade foi vítima de difamação por parte de um padre da igreja católica “Foi durante uma visita de um grupo de pessoas do Chile que estavam na cidade, vieram no templo, mas devido a ação do padre em falar do Tempo e da religião de forma preconceituosa os meus conterrâneos não retornaram, saindo com uma imagem negativa”, conta. Atualmente, Enrique tem muitos vizinhos que são evangélicos de várias correntes, porém com o passar do tempo vou conquistando o respeito das pessoas. Os vários anos de sofrimento durante a ditadura, a tortura mais cruel que um ser humano pode agüentar, os anos sem poder voltar ao seu país, a força de uma religião que o abraçou e o seduziu, a ajuda as pessoas que passam

Uma das mais sensíveis formas de intolerância é o não cumprimento da legislação da liberdade religiosa que encontra-se prescrito na constituição, para Enrique essa é a forma mais cruel de discriminação. Mas, as feridas não são somente institucionais há três anos num momento de paz e encontro com o equilibro ouviu uns ruídos intensos que pouco a pouco reconheceu sua origem, seu Templo estava sendo apedrejado. Mesmo passado o tempo ainda é possível ver as marcas na casa e da violência dos impactos que poderiam atingir alguma pessoa e causar uma tragédia. A agressão ocorreu outras vezes, Enrique afirma que a situação parou de ocorreu graças a força da oração e da fé em seus orixás. A intolerância e a discriminação nem sempre ocorre de forma tão expressiva, ela pode ser mais discreta e desta forma às vezes muito mais intensa, como nos casos de leg-


Foto do arquivo pessoal

Foto do arquivo pessoal


ESPECIAL

PERGUNTAS E RESPOSTAS CANDOMBLÉ

O ensino das religiões de matriz africana é apontado por professores como o maior desafio do trabalho da lei 10.639/2003. Para tornar a tarefa mais fácil a BRASIS Afro tratá a cada edição uma séria de respostas das principais dúvidas que os alunos levantam na sala de aula. As questões serão sempre respondidas por Yalorixá e babalorixá. A convidada desta edição é a Mãe de Santo da Umbanda e Yalorisá do Candomblé do terreiro Ile Asé Omi Ire Osun, conhecida como como Mãe Cris da Osun. Para a primeira rodada foram escolhidas 7 perguntas que mais se repetiram de um grupo de leigos que foi solicitada a formulação dos questioanmentos.

1- REVISTA BRASIS Afro: O uso de bebida alcoólica não pode ser visto como uma droga capaz de induzir a alucinações e perda de realidade, causando a ilusão que se esteja incorporando uma entidade ? Qual a finalidade da bebida e o que simboliza?

Toda bebida pode causar a ilusão mental! Porém esclarecemos: no candomblé não se faz uso de bebidas alcoólicas durante os rituais , já na umbanda é utilizada. Na verdade o uso da bebida vem de uma cultura antiga, ente índios e negros já se utilizava desta e foi sendo incorporada nos cultos de umbanda pela identificação dos espíritos com os homens! Para alguns setores representa um processo de troca de energia entre o homem e o espírito.


2- REVISTA BRASIS: Segue algum livro ou escrituras?

Não, em função da perseguição vivida pelos negros em que eram proibidos de cultuarem sua fé! Passou se a religião de forma oral e de pai para filho

3) Qual é o papel da Mãe ou O mesmo de um pai e uma Pai de Santo? mãe!

4) Como chega a ser um pai ou mãe de santo? Na umbanda através dos anos vividos na experiência e no candomblé é definido nos búzios e pela anos de obrigação tomada. Em ambos os casos é passado pelo pai de santo em que vc é filho. 5) O Candomblé faz vodoo? Não quem faz vodu são feiticeiros! Algumas nações chama os orixás por outros nomes como :Angola é Inkice, Ketu é orixá, No jeje e nagô são chamados de Vodun.

6- O maniqueísmo usado Não, por que o candomblé pela maioria das religiões não prega o bem e o mal para encontra similaridade no nas não existe o céu e inferno Mande suas perguntas. candomblé ? ou similar, para nos viver em Acesse o blog: harmonia e equilíbrio é nossa www.observatoriodalei10639.blogpost.com.br meta as escolhas fazem parte da vida !

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ENTREVISTA Ministro da Igualdade Racial Eloi Ferreira Araujo

O ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL Após 10 anos de preparação Estatuto da Igualdade entra em vigor Foi exatamente no dia 21 de março de 2003, Dia Internacional da Eliminação da Discriminação Racial em que em todo o mundo as pessoas refletiam sobre as injustiças cometidas, que o Governo Federal criou a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – SEPPIR. O estabelecimento desse órgão do governo voltado à essa temática é o resultado do trabalho e da luta e do reconhecimento do Movimento Negro brasileiro. A SEPPIR é responsável prioritariamente pela promoção da proteção dos direitos dos indivíduos e grupos raciais e étnicos afetados pela discriminação. Tem papel de trabalhar com políticas de diferentes ministérios e órgãos do governo que estejam vinculados à promoção de igualdade racial. Acompanha e promove o cumprimento de acordos e convenções internacionais voltadas ao combate a discriminação e deve auxiliar o Ministério das Relações Exteriores nas a trabalhar nas políticas internacionais, aproximando com as nações do Continente Africano;

Nesta primeira edição do Debate com o Ministro Eloi Ferreira de Araújo buscaremos tratar prioritariamente do Estatuto da Igualdade Racial, tema recorrente nos ultimos meses que foi sancionado pelo presidente Lula a partir da lei 12.288 em 20 de julho de 2010. O Estatuto é o resultado de um processo de 10 anos de estudo e debates. Documento que está vinculado à missão foco da SEPPIR que é estabelecer iniciativas contra as desigualdades raciais no País. O Estatuto nasce a partir da necessidade de garantir à população negra a igualdade de oportunidades e pela defesa dos direitos étnicos individuais.


AudiĂŞncia com o ministro


Entrevista com o ministro Eloi Ferreira BRASIS: Nos últimos sete anos o Brasil avançou no desenvolvimento de políticas públicas para a comunidade negra de uma forma intensa, como nunca havia acontecido durante séculos no Brasil. Gostaria que o senhor comentasse a importância e o significado desse período de ações em prol da população negra. Ministro Eloi: Esses últimos sete

anos foram muito significativos. Foi o resultado de todo ambiente internacional com o combate ao racismo, a etnofobia contra situações de intolerância racial e aqui Brasil, não foi diferente disso. Os movimentos sociais, principalmente o movimento social negro, criaram condições para superar o racismo com mecanismos para avançar nessa questão. E o presi-

O

dente Lula, com sua sensibilidade criou então a Secretaria de Combate ao Racismo que é hoje um Ministério com esse propósito. Inicia-se internamente o primeiro grande debate da formulação de políticas publicas para combate a desigualdade racial. Dando maior visibilidade às questões importantes como o reconhecimento das comunidades remanescentes de quilombo, fortalecimento da Fundação Cultural Palmares, que trata das matérias de reconhecimento cultural e da certificação das comunidades quilombolas, com ações efetivas com a preocupação com a doença falciforne, que é uma doença mais comum na população negra. E em virtude de combate a discriminação racial surge com muita ênfase o

ministro Eloi Ferreira de Araújo é de Itaperuna no Rio de Janeiro. Filho de lavradores viveu até sua juventude na cidade de Petrópolis até a juveantude. Em 1981formou-se torneiro mecânico no SENAI, no mesmo periodo em que iniciou sua militância política e fundou o Partido dos Trabalhadores na cidade. Com passagem pelo PcdoB voltou em 1994 ao PT. No Rio de Janeiro formou-se zootecnista exercendo a profissão até 1980. Depois da Assembléia Nacional Constituinte em 1987 transferiu-se para Brasília e passou a chefir o gabinete do deputado federal Edmilson Valentim da liderança negra. E em 1989 passou a chefir o gabinete do vereador Edson Santos na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, desempenhando por cinco mandatos consecutivos. Formou-se em Direito na década de 1990 e direcionou seus conhecimentos da área para o interesse público, mas direcionado aos problemas do

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debate com a política de cotas na universidade publica. E surge muito oportunamente, pois isso é o mais importante no ensino superior: ingressar na universidade pública. E os negros por conta da desigualdade histórica e contemporânea não têm igualdade de condições para ingressar numa universidade publica, muitas vezes. A escola não trata os iguais. Ela não trata os desiguais igualmente. Há uma desvantagem muito grande. Não há como negar. BRASIS: E como mudar? Ministro Eloi: A política de cotas é

uma medida dessas capazes de trazer mudanças. E foi feita e expôs muita coisa.

solo urbano e do transporte público. Em 2002 finalizou o Mestrado em Engenharia de Transporte pela Coordenação dos Programas de Pesquisa e Pós-graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE/UFRJ). Em sua dissertação trabalhou a regulamentação dos serviços públicos ante as conquistas da nova Constituição brasileira. Em 2007 passou a exercer função na mesa diretora da Câmara Municipal do Rio de Janeiro para atuar como consultor técnico daquela Casa Legislativa. Assumiu a Secretaria Adjunta da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República SEPPIR/PR. Representando a Seppir em diversos eventos de relevância internacional. E em março de 2010, assumiu o cargo de Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República - SEPPIR/PR.


Ministro em reunião

Ela deu a maior visibilidade da desigualdade que a população negra experimenta. As cotas colocaram um debate na sociedade. E elas sempre foram adotadas no Brasil. A principal foi a Lei do Boi (5.465, de 3 de julho de 1968), que estabelecia uma regra 50% das vagas dos cursos de ciências agrárias eram para os estudantes das escolas agrícolas ou para proprietários de terra e aos seus filhos. Eram destinadas aos cursos de ciências agrárias, veterinária, agronomia e outros dessa área. E nunca se falou nada, não se menciona. Contudo, quando se fala de cotas para pretos e pardos e indígenas nas universidades públicas, então parece que o céu vai cair. E vem a frase “Vão tirar minha vaga?”. E de quem é aquela vaga? Alguns até dizem que é necessário as cotas sociais. As cotas sociais por mais justas que sejam, mais relevantes, elas não tratam de reparar a gravidade que foi a escravidão. Nós, os descendentes de escravos brasileiros, os negros brasileiros experimentamos trezentos e oitenta anos de escravidão. Isso não é pouca coisa.

O Estatuto da Igualdade Racial é uma lei, e como tal, exige que haja um processo de regulamentação.

BRASIS: E com o advento da abolição não significou que o povo negro deixava de sofrer. Ministro Eloi : A escravidão teve o fim, mas acabou numa situação sem

nenhuma condição de inserção do povo negro na sociedade, foi de maneira dura, sem emprego, sem moradia. E como reparar? Quando o colonizador chegou aqui, fez de maneira severa aos proprietários originais da terra que eram os indígenas. E depois de trezentos e oitenta anos com uma super exploração do trabalho humano, com uma violência sem par não houve nenhuma política de reparação. E nesse Brasil criado com trabalho escravo, não há possibilidade de tratar desta forma contemporaneamente que todos ficaram iguais em cento e vinte e dois anos. Não ficaram. Não houve políticas públicas para dar oportunidade de igualdade para todos.

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Entrevista com o ministro Eloi Ferreira Araujo

Ministro Eloi e Pai Kinambazambi representante do candombé no Paraná

Presidente do movimento negro de Campo Largo Alexandre César apresenta ao ministro o primeiro universitário quilombola do Paraná Claudecir Ferreira Machado do Quilombo Palmital dos Pretos

Sabemos que há resistências e elas devem ser debatidas respeitosamente. Mas não podemos nos calar diante da desigualdade racial. BRASIS: Esse processo respalda a necessidade de haver cotas?

Ministro Eloi É preciso que haja cotas. No serviço público, por exemplo, em alto escalão em cargos de nível superior você não vê a presença dos negros, o serviço é branco, arrisco a dizer quase 100%. No médio e elementar há, mas o que é isso? É preciso ter cota para ser mais igualitário esse processo. O Brasil não é um país europeu é um pais miscigenado, multicultural, são 50,6% de pretos e pardos. É preciso levar esse segmento a ter representatividade em todos os segmentos da atividade econômica, da administração pública, da esfera cultural e da atividade social. É necessário política para isso. É difícil? É. Não devemos nos abater e silenciar com isso. Devemos ser duros. E perseguir o objetivo de fazer um país mais justo mais fraterno e mais igual. Não devemos nos calar, não. BRASIS: Existe muita ação contrária a cada tentativa de mudança, como lidar com isso? Ministro Elo: Sabemos que há resistências e elas devem ser debatidas res-

peitosamente. Mas não podemos nos calar diante da desigualdade racial. Não só os negros, por exemplo, não devemos nos calar enquanto o indígena foi tão violentado em seus direitos, também. Não podemos de forma alguma, se realmente temos uma visão de uma sociedade justa, humanitária. Nós temos que enfrentar esses problemas.

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Audiência com o ministro

BRASIS: Da aprovação o Estatuto da Igualdade Racial recebeu críticas pesadas, em decorrência da exclusão de alguns itens que constavam no projeto inicial, como as cotas, a representatividade dos negros em partidos políticos e o incentivo para contratação com isenção fiscal. Apesar disso, o que faz ainda assim o Estatuto um documento forte? Ministro Eloi: O Estatuto é um docu-

mento de ação afirmativa é a primeira lei que o Brasil tem em 122 anos de abolição que trata especificamente de condições de inclusão de 50,6% da população brasileira para atividade econômica, cultural e social. Essa lei, 12.288 de 20/07/10 foi um projeto que tramitou por mais de 10 anos e depois desse tempo conseguimos ter êxito em sua aprovação. E durante todo esse período houve a participação muito intensa do movimento social negro, da sociedade civil e do governo brasileiro que se empenhou para sua aprovação e elaboração. Ele é o resultado de um esforço muito grande. E este documento é o primeiro que descreve com riquezas o que são as ações afirmativas. E foi exatamente ação afirmativa que possibilitou, por exemplo, a America do Norte ter um presidente negro. O Estatuto da Igualdade Racial define de maneira meridiana o que é desigualdade racial, o que é população negra e estabelece ali as diretrizes para construção da igualdade de oportunidade.

diretrizes do que é desigualdade, o que é ação afirmativa ela ainda aponta como fazer essas ações. Assegura por exemplo, a proteção das comunidades quilombolas, das comunidades de região de matriz africana, avança em questões de segurança e da justiça, avança no capitulo da moradia. Ele insere o trabalho para população negra e avanço na direção da proteção da saúde. É um documento muito interessante e importante. BRASIS: É um grande desafio mostrar a importância do Estatuto àqueles que são contra? Ministro Eloi: Esse documento acabou recebendo um tanto de ata-

ques. E por que esses ataques? É que ainda tem um resíduo na sociedade que acaba por não se conformar com o fato da população negra poder participar em igualdade e oportunidades. É pequeno mais é um resíduo que faz barulho, mas do que a gente gostaria. Pessoas que tem poder econômico, financeiro e poder de comunicação. Atrapalham as conquistas. Um dos pontos é a questão de cotas. E o estatuto como é um diploma de ação afirmativa, ele permite sim levar estudantes para universidades, porque o que saiu do documento foi a palavra “cotas”. E essa palavra não é o sinônimo de ação afirmativa, ela é um tipo de ação afirmativa é uma forma de ação afirmativa. E para ingressar na universidade pode sim haver ação afirmativa como cotas, renda salarial, pontuação, local de moradia... São formas de cotas essas ações afirmativas. E o estatuto prevê isso.

BRASIS: A existência do Estatuto é uma forma de assumir que no Brasil há racismo e que está sendo combatido? Ministro Eloi: O Estatuto quebra defini-

tivamente a ideia de democracia racial. Esse mito da democracia racial cai por terra . Ele é produto que define as diretrizes. E se não for o suficiente essa vitoria, que é profunda, de definir essas

Ministro recebe cesta de produtos quilombolas

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Entrevista com o ministro Eloi Ferreira Araujo

BRASIS: Quais os próximos passos do Estatuto de Igualdade Racial? Ministro Eloi: No mês de outubro

o Estatuto passa pela fase de regulamentação. Esperamos concluir um estudo completo das matérias para regulamentação. O Estatuto da Igualdade Racial é uma lei, e como tal, exige que haja um processo de regulamentação. Esperamos ter algumas sugestões para essa regulamentação. Se não for concluído, se não ficar pronto e acabado, esperamos já ter uma parte da regulamentação efetivada. BRASIS: Então é possível trabalhar essas questões que ficaram de fora na regulamentação? Ministro Eloi : O tema que saiu do

Estatuto e que não pode ser regulamentado diz respeito à reforma política. A presença do negro nas chapas dos partidos políticos. Fora daí todos os temas estão contemplados. BRASIS: E com relação à questão do incentivo para contratação de negros em empresas? Ministro Eloi: Nós estamos traba-

lhando na regulamentação e esse é um dos temas que será tratado. O emprego e trabalho iremos tratar isso via regulamentação. Não precisa ter uma lei específica para isso. Podemos estimular, via os percentuais da população negra que constam no IBGE, dá para trabalhar todos esses temas. É como eu disse só não dá para trabalhar reforma política, pois tem que haver uma representação em debate, uma discussão maior. BRASIS: O Estatuto inclui o ensino

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Ministro Eloi junto a crianças

da História da África e cultura afrobrasileira o que isso muda com relação à lei já existente? Ministro Eloi : Essa incorporação reafirma o ensino da historia da Áfri-

ca e cultura afrobrasileira nas escolas. Vem para reforçar o dispositivo legal e criar mais condições para implementação do Plano Nacional. BRASIS: Existe um material sendo produzido com foco na história da África, que material é esse e quando estará disponível? Ministro Eloi: Neste mês de outubro estará concluído essa obra que

contém 8 volumes bastante extensos. Estamos terminando um trabalho patrocinado pela UNESCO, aliás foi a própria UNESCO quem elaborou e reuniu historiadores, cientistas sociais e pesquisadores, eles fizeram um trabalho de conhecimento aprofundado da África, mas partindo não do olhar daqui para África, mas de dentro da áfrica com informações apuradas e levantadas. É o maior material da historia da África que se tem conhecimento nesta época. Ele esta pronto em inglês uma obra de 8 volumes, muito complexo e muito longo. A tradução esta concluída. No mês que vem ele estará disponibilizado em domínio público, para que todos tenham conhecimento. Essa obra servira de parâmetro para todo elaboração do material da historia da África para formular a disciplina da historia da áfrica que é base da lei 10.639/2003. Esse material é imprescindível para o trabalho de educação, para que todos tenham acesso. o trabalho guarda um nível de informações sem unidade. A lei 10.639 terá uma referencia unitária nessa documentação.


Audiência com o ministro

BRASIS: A SEPPIR está realizando também aumento do número de bolsas para pesquisadores da população negra do programa PIBIC – AF para estudantes que tiveram cotas sociais ou raciais, qual a importância desta ação? Ministro Eloi: É uma parceria entre BRASIS: Que mensagem pode deixar para o educador que ainda não se comprometeu com o que determina a lei federal em vigor no Brasil desde de 2003 que coloca a necessidade esse ensino? Ministro Eloi: São resistências que serão

superadas. À medida que o tempo esta passando, vamos superar. Quem deseja a construção de um Brasil com a auto-estima elevada. Com a participação de todos os segmentos que compõem a nossa nação tem que abraçar essas causas abraçar a história da do passado, reconhecer ao presente para construir um futuro de igualdade. Reconhecer que tem que ensinar a importância do negro para nossa juventude. Por exemplo, o estatuto não é uma lei para negro. É uma lei para nação. Uma lei do Brasil, do povo brasileiro, para poder construir a igualdade a gente esta mostrando essa direção. Alguns vão ficar recalcitrantes, serão retardatários. Nós temos paciência gandhiana. E haveremos de continuar a tê-la para poder construir um pais mais justo. Não vamos afastar nem um momento dessas defesas

SEPPIR com o CNPQ o programa de Iniciação Científica, já assinei inclusive o convênio. Serão distribuídas para o período 2010-2011 um total de 800 bolsas entre sessenta 60 universidades públicas em todo o Brasil, são 200 a mais do que no período 2009-2010. Desta forma vamos estimulando, fazemos um papel de formiguinha, mas queremos trabalhar para que todos possam chegar lá, guiando a população dos jovens negros para que possam ingressar no mestrado e no doutorado, também. O nosso Brasil não é unicolor, ele é multicolor. Temos que ver isso em todos os extratos de nossa sociedade. BRASIS: No mesmo momento da sanção do Estatuto da Igualdade Racial foi anunciado uma novidade: a criação de mais uma universidade, a UNILAB. Como é este esse projeto? Ministro Eloi : É a Universidade Luso-

-Afro-Brasileira que já está criada. Ela tem sede no município de Redenção no Ceará. Em 2011 já estará em funcionamento com 50% de alunos brasileiros e 50% africanos, com possibilidade de intercâmbio entre professores para troca de informações. É um sonho do presidente Lula, é uma forma de mudar a perversidade que a humanidade tratou a África até aqui.

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NOTICIAS

IX FEIRA CULTURAL PRETA

IX FEIRA PRETA TRAZ PRODUTOS E ATIVIDADES ARTÍSTICAS ETNICORRACIAIS

No dias 18 e 19 de dezembro acontece a IX FEIRA PRETA no Centro de Exposições Imigrantes em São Paulo. O tema deste ano é “A Chegada do Negro no Brasil”. Além da venda dos produtos focados na cultura negra, a feira conta com diversas atrações como artes plásticas, fotografias, filmes, literatura, dança, teatro e demais linguagens culturais. O evento é promovido pelo Instituto Feira Preta, uma organização social sem fins lucrativos, que desenvolve projetos voltados à integração e valorização da cultura negra. Com foco no crescimento econômico que se observou nos últimos anos e no consumo da população afrobrasileira, o Instituto promove ações que estimulem ainda mais o empreendedorismo da população negra, por meio de treinamentos e orientações. Mais informações: (11)3031-2374 www.feirapreta.com.br local: Centro de Exposição Imigrantes Endereço: Rodovia dos Imigrantes, km 1,5

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V Simpósio Internacional de História e Cultura Negra De 03 a 05 de novembro ocorre o V Simpósio Internacional de História e Cultura Negra do litoral norte do Rio Grande do Sul Local: Faculdade Cenecista de Osório, As inscrições poderão ser feitas por meio do site www.facos.edu.br Mais informações no telefone 51 36631763 - Coordenação de História

DIVERSIDADE, MARCOS LEGAIS E EDUCAÇÃO NA AMAZÔNIA Nos dias 25 a 27 de novembro ocorre o II Seminário Nacional e IV Seminário Regional sobre Formação de Professores e Relações ÉtnicoRaciais, promovido pelo Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Formação de Professores e Relações ÉtnicoRaciais GERA/UFPA/ GEPRE/UNAMA. O evento tem como objetivo ampliar o debate sobre discriminação racial e a escola, envolvendo aspectos teórico-metodológicos no trato pedagógico com essa temática em sala de aula, buscando a reflexão circunstanciada e a formulação de encaminhamentos. Durante o seminário será apresentado o resultado atingido por diversos pesquisadores. E tem ainda como objetivo destacar as especificidades dessas questões em se tratando da realidade amazônica. O seminário é dividido em três eixos temáticos Educação para as Relações Étnico-Raciais, Educação na Amazônia: experiências e práticas pedagógicas e Juventudes negras e corporeidades. As inscrições para apresentação de trabalho poderão ser realizadas até 15/10/2010 Local: Local: Auditório da FACI Mais informações: www.seminariogera2010.com.br

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E A MATEMÁTICA? ONDE ESTÁ? Laços e traços da matemática no ensino da cultura africana na escola Newton Sucupira em Salvador

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O aluno da escola pública de um modo geral, não

reconhece sua identidade racial, cultural, social e pessoal. “Sua auto-estima é fragilizada e a escola não o prepara para trabalhar com os desafios que surgem Diante de tanta luta e resistência pela valorização e auto-estima, podemos citar que a nossa Constituição no seu artigo 5º afirma que todos somos iguais perante à Lei. Porém, isso não acontece, pois o negro continua sendo discriminado A lei 10.639/2003 abre infinitas possibilidades de ser aplicada nas mais variadas disciplinas, uma das estratégias de sucesso é o caráter multidisciplinar com o qual as atividades podem ser elaboradas, fazendo com que o estudante obtenha um conhecimento mais amplo e com maior compreensão dos diversos assuntos que podem ser abordados nas disciplinas. Com foco nisso o corpo docente e “Nós, educadores, devemos procurar através de direção da atividades relacionadas à consciência e valorização Escola Técnica Estadda raça negra, combater a discriminação manifestadaual Newton Sucupira, em gestos, comportamentos e palavras.” localizada no bairro Mussurunga em Salvador, aceitou o desafio proposto pela professora de matemática,

Eliete Ferreira dos Santos, de desenvolver um projeto que buscasse englobar matemática, artes, português, redação e geografia. O foco era destacar a contribuição da cultura africana para o desenvolvimento da Matemática e assim construir gráficos, analisando e interpretando dados após realização de pesquisas na comunidade escolar. O projeto foi realizado a partir do conhecimento adquirido durante a formação no Centro de Estudos Afro-orientais do Programa Preparatório para promoção da Igualdade etnicorracial da Univesidade Federal da Bahia, em 2006. A professora partiu do pressuposto que o estudante da Escola Pública não apresenta uma perspectiva de futuro. Desta forma, o projeto buscou despertar nos jovens o seu valor no contexto de formação dentro da sociedade enquanto negro e afro-descendente: “Vivemos num país multicultural, que é uma característica do nosso povo. Porém, as discussões relativas ao multiculturalismo só assumem a sua devida posição com a publicação dos Parâmetros Cur-

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riculares Nacionais em 1997, que instituíram como um dos temas transversais, a pluralidade cultural. Vale ressaltar que os PCN representam um avanço no que diz respeito às discussões que envolvem uma educação multicultural no Brasil”, argumenta a professora. Para Eliete, o aluno da escola pública de um modo geral, não reconhece sua identidade racial, cultural, social e pessoal. “Sua

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auto-estima é fragilizada e a escola não o prepara para trabalhar com os desafios que surgem em decorrência dessa lacuna”, destaca. A partir dessa análise, a professora concluiu que os estudantes não se situam dentro de um povo formador da cultura afro-brasileira, sentindo-se discriminados, sem auto-estima e alienados de sua importância na sociedade. Daí o valor de desenvolver esse trabalho na Escola Newton Sucupira, que está localizada numa

região bastante carente de Salvador, no bairro Mussurunga. “Nós, educadores, devemos procurar através de atividades relacionadas à consciência e valorização da raça negra, combater a discriminação manifestada em gestos, comportamentos e palavras, as quais trazem a marca do preconceito, da exclusão, das desigualdades sociais que afasta e estigmatiza os grupos sociais. Em função de tudo isso, o estudante tem sua auto-estima fragilizada o que reflete um comportamento muitas vezes agressivo no âmbito escolar e fora dele”, raciocina ela.


Para Eliete, a auto-estima é fundamental para o pleno desenvolvimento do indivíduo, po- E A MATEMÁTICA? ONDE ESTÁ? dendo levá-lo a ser de fato um cidadão e a se per-  na coleta de dados; ceber como um ser uno e macro em um universo  na construção de gráficos (percentagens); plural. “Valorizar o que ele é, o que ele pensa e faz, é  na confecção das máscaras (formas geométricas e simetria); o primeiro passo da escola para que o aluno possa  na música (métrica, solfejo, tempo); encontrar sua identidade pessoal e cultural, fortal-  na confecção das máscaras (formas geométricas e simetria); ecendo suas relações interpessoais com o mundo  na música (métrica, solfejo, tempo); ao seu redor”, destaca.  no trançado (manter o equilíbrio e a simetria no ato de trançar) A estudante Dione da Silva participou do – esteiras, abanos, cestas, mantendo a contagem correta dos projeto em 2006 e foi uma das alunas mais dedica componentes da tecelagem; das nas atividades práticas. Por conta da gravidez,  na culinária (dosagem certa das medidas). Dione deixou os estudos e retornou em 2010. Hoje, aos 21 anos, a jovem conta que participar do projeto foi sem dúvida uma das experiências mais significativas que teve no Colégio: “Foi um momento de integração, que todos os alunos participaram e se entregaram à pesquisa e à prática das várias temáticas africanas”. Dione relembra que a proposta A legislação veio para modificar o grande ranço que lançada pela permanece no meio de nós e só esta geração poderá professora Eliete foi muito bem transformar este sonho em realidade, pois ela reforça aceita pelos alu- a perspectiva de uma educação multicultural voltada nos. “A turma foi dividida em gru- para a ampliação do acesso à informação sobre a pos e cada um fidiversidade da nação brasileira cou responsável por pesquisar determinado tema e fazer a prática que seria apresentada numa feira para o público geral. Uma das coisas que mais gostei foi o trançado de cabelo, eu já fazia nas minhas bonecas quando criança, mas foi interessante entender o processo e fazer o trançado nas alunas do Colégio. Cheguei a ficar de madrugada fazendo as tranças na casa das minhas amigas, para as oito horas do dia seguinte estar no Colégio e dar sequência a todo o trabalho da feira”, conta. O trabalho permitiu a Dione conhecer as mais diversas manifestações culturais do continente africano. “Aprendi muito com toda a nossa pesquisa e envolvimento, não chegamos a estudar todos os países, pois são muitos, mas os que estudamos deu para ter uma ideia interessante e diferente da África”, destaca. Uma das coisas que mais chocou a jovem foi o contraste da existência de países com mais re-

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também a identificarem a presença

Nova proposta em 2010

A partir dos bons resultados com o projeto Gestar de 2006, a Escola resolveu novamente apostar no trabalho da professora e, mais uma vez, um programa dentro dos mesmos parâmetros está em desenvolvimento com o nome “Em Busca da Identidade”. “O objetivo é aplicar trazendo elementos da interdisciplinaridade no diálogo entre as disciplinas envolvidas, mais uma vez como Português, Redação, Artes, Geografia e Matemática desenvolvendo atividades próprias da matemática ligadas às demais, momento em que as parcerias são fundamentais para que o aluno perceba a interação entre as diversas áreas do conhecimento”, comenta Eliete. A professora irá incentivar os alunos a não só refletirem sobre padrões vigentes na sociedade relacionados a cor, beleza, sexualidade que influenciam na formação do indivíduo de forma negativa, como

da cultura africana nas manifestações culturais do povo brasileiro como na literatura, música, culinária, pintura, entre outras. “O foco é esta identificação, é observar a presença das mais diversas manifestações culturais de matriz africana. Este projeto de valorização e identidade dos afro-descendentes servirá para que o aluno possa sentir-se valorizado enquanto cidadão e lute pelo seu espaço na sociedade para que a desigualdade entre negros e brancos venha deixar de acontecer” Eliete acredita na importância do trabalho e na mudança que ele vem trazendo para seus alunos, contribuindo na eliminação das desigualdades e no reconhecimento da identidade do negro. “Diante de tanta luta e resistência pela valorização e auto-estima, podemos citar que a nossa Constituição no seu artigo 5º afirma que todos somos iguais perante à Lei. Porém, isso não acontece, pois o negro continua sendo discriminado”, avalia.

Receita de Acarajé da Bahia Ingredientes 2 kg de feijão fradinho; 3 dentes de alho; Azeite de dendê para fritar Sal a gosto.

Mudar a situação de desigualdade e o ranço que permanece ainda sobre a população negra é um dos objetivos a ser atingido com o trabalho da Lei 10.639/03: “A legislação veio para modificar o grande ranço que permanece no meio de nós e só esta geração poderá transformar este sonho em realidade, pois ela reforça

Logo, c2= (b-a)2 + 2 x a x b = b2+a2.


CANTO AFRICANO EM

SALVADOR

Duzentos jovens se revezam na formação do coral da história e cultura afrobrasileira e indígena


A

conscientização da importância da ação na prática pedagógica do ensino das relações etnicorraciais por parte de gestores públicos, diretores e educadores vem ocorrendo gradativamente nas diversas unidades de ensino no país. Algumas instituições ainda estão se adaptando nas práticas necessária par efetivação da lei. Paralelo a esse cenário existem escolas que saíram à frente, mesmo antes da legislação entrar em vigor já trabalhavam o conteúdo de questões raciais e temáticas africanas em suas discussões. Esse é o caso do Colégio Estadual Newton Sucupira, no bairro Mussurunga, em Salvador. Desde 2001, o professor Nilson Zuannes tem dado andamento aos trabalhos do Coral Estudantil da Bahia, focado em músicas de origem indígena e africana. Além de trabalhar a questão da cultura africana, ainda atende a determinação da lei 11.645/2008 e insere a questão africana e a temática indígena no currículo escolar.

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Coral canta Nkosi Sikelel I-Afrika, Shosholoza(mus. da Africa do Sul), Koi Thangaré, Aiê Ntooto Nilé no evento de lançamento do programa federal Mais Educação na Escola

O objetivo central do Coral, segundo Zuannes, é buscar a possibilidade de capacitar os estudantes da rede estadual e suas comunidades. “Buscamos humanizar melhor nossos estudantes como cidadãos inteligentes, sensíveis, estéticos, reflexivos, criativos e responsáveis, no coletivo, por melhores qualidades culturais na

vida em grupo dentro da Escola e da comunidade, com ética, respeito e diversidade”, comenta. Aliado a isso, o Coral é uma forma de fazer uma retratação histórica das culturas. Todo esse trabalho foi mais intensificado a partir do curso de especialização realizado pelos professores no de História e Cultura


“Buscamos humanizar melhor nossos estudantes como cidadãos inteligentes, sensíveis, estéticos, reflexivos, criativos e responsáveis, no coletivo, por melhores qualidades culturais na vida em grupo dentro da Escola e da comunidade, com ética, respeito e diversidade”

Maestro Zuannes apresente a obra da aluna Dione que está inscrita em um concurso cultura do Estado da Bahia

afrobrasileira e indígena promovido pela Secretaria da Educação da Bahia no período de 2008 e 2009. O diretor do Colégio, Rui José Braga Duarte, avalia que o resultado do trabalho tem sido bastante positivo. “Nosso Colégio foi pioneiro em fazer essa a Ação ligada à lei 10.639, existe sim outros coros com a temática africana, mas não com essa ligação direta com as demandas da legislação. Já fazíamos isso antes de 2003 e quando surgiu a demanda federal, veio a calhar, o projeto só foi ganhando mais força”, destaca. A cada ano a iniciativa vem crescendo e, pela segunda vez, há um convite para fazer uma apresentação em Paris/França. “Infelizmente não conseguimos os recursos necessários para levar nosso coral à França no ano passado, mas eu consegui ir com meus próprios recursos, pelo menos para levar ao nome do Coral. Cantei com meninos da Itália e da Espanha, e o resultado foi bem positivo. Tanto é que novamente temos este convite da Unesco, para cantar em Paris este ano mais uma vez”, conta o professor Zuannes.

Dione de Souza Oliveira se dedica ao coral e a arte em pinturas

Além dessa apresentação, o Coral foi convidado a mostrar seu trabalho na Angola. “Nossos alunos são carentes em sua maioria, precisam apenas de um pouco de incentivo para expressar seu talento. Temos aqui no Colégio também a produção de arte com pinturas sendo desenvolvida. Por exemplo, a aluna Dione Souza de Oliveira, tem 21 anos, e mesmo sendo mãe com todo o trabalho que isso significa, consegue achar tempo e se dedica de forma intensa à arte. Tem muito talento e está desenvolvendo um projeto com material simples, são pinturas em telhas, para participar de um concurso cultural aqui Estado”, comenta. 75


Música nas veias O professor conta que os estudantes vão descobrindo aos poucos os mistérios da África e vão se encantando. “É interessante quebrar este conhecimento equivocado que eles têm que a África é um só país. E é interessante quando descobrem que o Egito é um país africano e que todas aquelas divisões no mapa são países e não Estados. A língua portuguesa oficial em Angola, por exemplo, foi uma descoberta para eles.” O fato da realização da Copa do Mundo de Futebol ter ocorrido na África do Sul também auxiliou para o desenvolvimento do trabalho. Zuannes desenvolveu com jovens estudos relacionados ao hino da juventude da África do Sul, “Nkosi Sikelel’I Afrika; So Bashiya Ba Hlala Ekhaya”: “Eles ficaram encantados ao perceber que já haviam escutado esta canção por aqui. Djavan gravou esse hino e foi interessante mostrar isso a eles, como nossos afrodescendentes estão inseridos na cultura negra. A partir disso eles passaram a valorizar muito mais. E se reconhecer neste processo”, afirma.

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Pinturas em telha provam que para produzir arte não é necessário mais que talento e matéria prima simples Atualmente cerca de 200 jovens estão inseridos no projeto. A participação é livre e cresce rapidamente o interesse, segundo o professor. “O projeto vem dando frutos importantes como a conscientização dos estudantes, pais e comunidade em geral, em relação ao significado da África no Brasil. Nas apresentações são feitas convocações de acordo com os convites que recebemos para que todos tenham chances”. O trabalho tem sido reconhecido por órgãos importantes do Estado da Bahia, como Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado; Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação; Faculdade de Educação; Tribunal de Justiça, Secretaria da Educação e Secretaria da Cultura.

O baiano Nilson Zuannes do Bairro da Liberdade é o maestro que canta e encanta os jovens alunos do Colégio Newton Sucupira, neto da mistura de portugueses com africanos-brasileiros teve a ligação com a música desde os 14 anos com as primeiras composições lançadas em dois CDs lançamento de 2 livros: "Lado Oculto"- 1988 e "êxodo's" de 1998. No ano de 2002 foi lançado mais uma obra sua o CD intitulado "Livre ArbítrioPré concepção Blues" - 2002. Zuannes conta com 25 anos como músico independente. Formado em licenciatura em em Ed. Artística pela UCSal, tem Pós em História e Cultura Afro-brasileira pela Faculdade Visconde de Cairu e Especialização em Adm. Pública (UEFS-Ba); Lic. em Musica (IMUCSAL). A música faz parte da vida do professor Zuannes “Minhas referencias musicais são o Blues, o Jazz, o Samba e o Maracatu” O coral coordenado pelo professor tem foco nos títulos apresentadas no Coral: "Banzo Maracatu"(autor Dimas Sedicias); "Refavela" (autor- Gilberto Gil); "Xango" (Arranjo de Villa-Lobos); "Aiê Ntooto Nilé" (Arranjo de Sérgio Souto); Nkosi Sikelel I-Afrika - Hino do Congresso Nacional Africano (de Enoke Sontonga); Koi Tchangaré Musica ritual da Tribo Suruí (Grupo Mawaca); Menino do Pelô (de Saul Barbosa)


ARTIGO ARTIGO

14 DE MAIO DE 1888,

E AGORA? O 14 de maio de 1888 foi se-

guramente um momento muito mais importante do que a própria abolição. Após a assinatura da lei áurea, milhares de negros em todo o Brasil comemoraram a tão sonhada liberdade. A abolição foi conquistada não por bondade do homem branco, mas por uma série de fatores de interesses econômicos de uma nova sociedade que nascia e que

precisava de um mercado consumidor. Além disso, os negros não ficaram submissos àquela realidade, houve processos de manifestações, revoltas, ataques e criação de quilombos - esses a maior prova da resistência negra. Com as fazendas ao fundo, o negro olhava para o seu destino logo à frente: foi provavelmente um misto de alegria e

pavor. No coração a dúvida do que a sociedade brasileira teria a oferecer àquele contingente de negros sem direitos estabelecidos, sem destino, sem terra, sem nada. A falta de ação política daquele momento em 14 de maio de 1988 gerou uma herança de desigualdades que persiste nos dias atuais. O governo brasileiro não assegurou nenhum tipo de política pública, por menor que fosse resguardando um mínimo de possibilidade do negro afirmar-se enquanto cidadão no fim do século XIX e no início do século XX. E para tornar sua situação ainda mais complexa, foi criado incentivos para a imigração de europeus o trabalho na agricultura e pecuária em todo o país. Milhares de imigrantes vieram para o Brasil sedentos por oportunidades e terras que não foram negadas. E desta forma, o negro viu as possibilidades de conquistarem seu papel de cidadão na sociedade desaparecer. As terras que não foram destinadas para eles deixaram como opção a busca de espaços urbanos de situações precárias que constituíram as favelas. Esse foi o ressarcimento dado à população negra em pagamento aos séculos que seus pais, avós e demais ancestrais dedicaram a construção e desenvolvimento do grande país, Brasil.


www.sxc.hu

Nós, população brasileira, descendentes diretos dos imigrantes que há pouco tempo chegaram aqui, negamos até mesmo a mistura em nosso sangue da descendência do povo negro. Somos negros, todos somos negros, porque somos brasileiros. Mas negamos isso, negamos, porque achamos - e falamos isso em alto e bom som - que os negros têm as mesmas condições que todos. Que cotas, ações afirmativas isso tudo é bobagem, que devemos é melhorar o ensino básico. Tratar lá o problema lá na ponto com as criancinhas e dar a elas a oportunidade de mudar essa história. Não estamos errados, é preciso sim mudar o ensino básico inicial, dar total condição para que nossas crianças negras tenham possibilidade de competir de igual para igual em tudo com os demais, que não são mais do iguais a eles. Porém, não percebemos que há uma situação a ser mudada agora, de imediato. Existe racismo no Brasil. Existe preconceito em todos os espaços. E este negro herdeiro do dia 14 de maio de 1888 passa por situações que muitas vezes nós não tomamos conhecimento. São situações de discriminação no serviço público. Há relatos de mau atendimento e até de negativa de atendimento por ser negro no sistema de saúde. Parece mentira, mas, não são mentiras as situações em que o negro tenta manifestar sua religiosidade de matriz africana, o candomblé, a umbanda... Não, não é uma seita ou um culto: é uma religião. A mesma que a nossa de homem branco. A mesma que leva à Deus e que exige respeito para com o seu irmão de sangue, de amor. Seja esse Deus a forma como cada um o enxergar. É vergonhoso em pleno século XXI, ainda ligar uma televisão e ver o negro retratado de forma inferir. Nas novelas, em que este é o empregado, é a mocinha mais “saidinha”. Na maioria das vezes, não há família negra, como se esse fosse sempre o empregado da família, desgarrado de qualquer relação familiar. O Brasil é negro. Mais da metade da população (53,3%) é de negros e pardos. É a segunda maior nação negra do mundo. Os demais têm sangue da população negra, de seus parentes nas veias. Nossa cultura é negra, nosso língua, nossas cores, nossa bossa nova, nosso samba. E o governo brasileiro do final do século XIX, início do século XX estava errado. Não precisamos de um país branco para ser desenvolvido. Nós precisamos de respeito às diferenças, todas elas, sejam com os imigrantes, seja de qualquer país que abraçarmos os latinos, os chineses, os japoneses, todos bem vindos. Precisamos de respeito para com os nosso índios , nossas origens , respeito às comunida-


dades tradicionais. Respeito ao negro brasileiro. Só assim, com as mesmas condições verdadeiramente, não só por ações afirmativas do governo, mas por ações efetivas e diretas de cada brasileiro vamos assegurar uma sociedade mais justa e humana. Só a partir do momento que pudermos afirmar às nossas crianças negras:

“ E este negro herdeiro do dia 14 de maio de 1888 passa por situações que muitas vezes nós não tomamos conhecimento. “

Vocês têm todos os direitos. E não só em palavras, mas com atitudes. Só assim teremos um Brasil inteiro, desenvolvido que deixará de ser uma eterna província e passará a ser considerado uma nação efetivamente.

OPINIÃO

Presidente Associação Comunidade Afrobrasileira de Campo Largo-PR Alexandre Cesar

“O fim do império brasileiro, e a construção da nova República não previa as garantias que ali nascia a constituição. Para compensações pelos séculos.de escraturas, só incentivos aos emigrantes europeus. Isso foi, o erro triplo na formação de um Estado de preconceito de marca, ou estratégia junto para aniquilar com a comunidade negra. No processo institucional, nas repartições públicas, como na iniciativa privada. Observa-se que á cultura da comunidade negra sempre foi colocada no plano simbólico de manifestações “culturais ou mítico”, Ressalto mais, uma vez, estratégia ou política de Estado? Quando vemos a educação, saúde, renda, trabalho, habitação e justiça e outros setores da Sociedade,negarem o preconceito de marca, é mais revoltante. Porque ele é sutil e excludente nas oportunidades da vida cidadã. No tocante aos professores da rede de ensino tanto na pública ou na privada, infelizmente, não

resta outra alternativa se não, continuar realizando e pressionado através dos movimentos sociais, gestores das Instituições a se aplicar a Lei 10.639/03 e a 11.645/09. Sem contar que dentro da classe, existe muita resistência de por parte de alguns professores que ainda carregam muito preconceito de marca e de racismo. Há muita coisa a se desconstruir. Até porque boa parte dos professores, principalmente dos ciclos I,II,III e IV não sabem, onde fica o continente africano. Isso é verídico, por mais que parece surpreendente, verefiquei na prática em oficinas realizadas e conversas informais com muitos professores. Eu, defendo uma formação, política e de cidadania para comunidade afrobrasileira. Temos a cultura nesse país, de um povo sem Memória. Essa, é a herança que temos, dividir para buscar uma “Sociedade Igualitária e que seja um País de todos”. Axé! Somos, o Quilombo do Séc.XXI, com uma roupagem do “mundo moderno”.

Participe, acesse o blog www.observatoriodalei106392003.blogpost.com


EXTRA

Próxima Edição NUNCA HOUVE RESIGNAÇÃO Uma viagem na luta de resistência da população negra contra a força brutal do colonizador. Um olhar sobre ações de revolta, quilombos, heróis negros, passando pela imprensa negra e chegando aos movimentos sociais.

HISTÓRIA HERÓIS NEGROS

Em 2010 completa 100 anos da Revolta da Chibata. O principal mentor do movimento foi o marinheiro João Cândido, Brasis Afro traz uma análise do movimento a partir da tese de doutorado de Alvaro Pereira do Nascimento Cidadania, cor e disciplina na Revolta dos Marinheiros de 1910”.

COTAS NO SERVIÇO PÚBLICO Você é contra ou a favor de cotas para negros em concursos públicos? Participe da enquete, acesse www.observatoriodalei106392003.blogpost. Brasis Afro trará uma discussão sobre a lei em vigor no Estado do Paraná desde 2003.

ENTREVISTA

MVBILL NO PALCO

Conheça a história do happer, sua luta pela comunidade, letras e atividades sociais da CUFA e sua opinião sobre ações da lei 10.639/2003

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MUSEUS VISITA AO MUSEU FACULDADE DE MEDICINA TERREIRO DE JESUS EM SALVADOR BAHIA Para entender as religiões de matriz africana é preciso se despir de preconceitos e aceitar que existem religiões diferentes e que pregam o mesmo respeito e amor para suas divindades e pessoas. Localizado no Pelourinho, o museu conta com um acervo importante para o conhecimento e reflexão de religião.


Racismo Nem branco, tão pouco negro Talvez rubro, vermelho De indignação e vergonha. (Jorge Jacinto, 2010)







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