Jornalesas

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Concurso Literário / Concurso de fotografia 30 de novembro do ano da Graça de 1519

A

3º Lugar ex-aequo

qui me encontro eu, Gustavo Couto, em mar aberto, com a embarcação a oscilar, ensopado de água e de vinho, pois ainda não houve sol que me aquentasse. Venho de me encontrar com o capitão Magalhães, que enviou um pombo-correio, oriundo de Sevilha, com um convite irrecusável: encontrar-me com ele, nos Alcáceres Reais da cidade, e reaver antigos camaradas. E lá fui eu, sedento de um bom abraço e de uma boa caneca! Sou um modesto nobre da região de La Alondra, os meus servos não possuem grandes terras, nem bens de espécie nenhuma, nos tempos que correm, mas o título e o respeito ninguém mos tira! Continuo a ser o seu Senhor! No passado, viajei com o mestre Colombo, na sua primeira jornada ao novo Mundo. Nesse tempo, eu ainda era alguém importante! Mas tudo mudou, após ter sido atacado pelos corsários de sua majestade, a rainha de Inglaterra, e de ter perdido três dedos da mão esquerda e o olho direito, nas pelejas contra os inimigos. Porém, apesar de tudo, devido à amizade desenvolvida nas cortes de el-rei D. Manuel, mestre Magalhães convidou-me para participar no seu projeto. Aceitei de imediato, e aqui me encontro, “em vinhaça de mares”, à aventura! Relembro que, na última viagem, após chegada ao palácio de Sevilha, deparei-me com três antigos companheiros de viagem ao novo mundo: Diogo Ribeiro, um cartógrafo de Piães; Álvaro de Vaz de Almada, primeiro conde de Abranches e Duarte de Lemos, terceiro senhor da Trofa. Abracei-os efusivamente, cerrando os dentes (porque um homem não chora!) e relembrei as nossas saídas em Nassau, o cheiro a mar, os braços das prostitutas, de rostos pintados e promessas de amor barato, o baloiçar dos barcos e o mascar tabaco nas longas madrugadas… Entretanto, chegou o mestre Magalhães, cortando-nos as lembranças e a cumplicidade. Não esquecerei nunca as palavras que proferiu, em tom firme e determinado: “Caríssimos, enunciou ele - encontramo-nos em frente deste palácio porque acabei de fazer uma negociação com o Rei D. Carlos e com o Bispo de Burgos. Acabaram de nos conceder 5000 reis para realizarmos uma expedição, à volta do mundo, e demonstrar-

mos mais uma vez que a sua forma é esférica!” Eram precisas estas palavras de alento, por parte do mestre, para alegrarem o meu dia! Tive a possibilidade de regressar aos meus tempos gloriosos de marinheiro, vinte anos depois da primeira viagem, e de poder revivificar tudo de novo com os meus companheiros! Fui bafejado pela sorte! Assim que voltámos ao mar senti-me em casa novamente! É embriagante tornar a sentir o cheiro a madeira molhada, ver o horizonte próximo e distante, sentir o balançar do barco que me sacode o corpo, ébrio de vinho e de emoção. Neste momento, atravessamos os mares do Norte de África, cortamos as águas azuis e salgadas do Atlântico, repletos de esperança e satisfação. Por hoje vou-me! Os velhos ossos pedem lençóis improvisados, em convés balançante, embalo eterno no conforto das ondas. Amanhã voltarei, se Deus, Nosso Senhor, assim o quiser! Tenham uma noite serena, in Domine Dei, Ámen Capitão Gustavo Couto. 3º Lugar do Concurso Literário ex-aequo Gustavo Couto , 11ºG 5º Lugar do Concurso de Fotografia Ana Lúcia Camelo, 8º E

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4º Lugar do Concurso de Fotografia Estrela Pinto, 8º E

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