2
Jornal da Golpilheira
. abertura .
Outubro de 2013
.editorial.
Mais um... dá 17
Mais um ano de edições… e já lá vão 17, desde 1996. Entramos, assim, no 18.º ano de publicação, o ano em que, se o jornal fosse uma pessoa, estaria a entrar na maioridade. É usual fazer aqui um pequeno balanço, ano após ano, neste mês de aniversário. E os balanços começam a parecer-me todos iguais, mais coisa menos coisa. É muito o trabalho, é por amor à Golpilheira que continuamos a fazê-lo, é pelo reconhecimento que temos tido dos assinantes e leitores que ainda nos vão sobrando algumas força e uma pitada de vontade para seguir em frente. Seria mais fácil e até mais proveitoso dormir melhor as noites, em vez de fazer meia dúzia de noitadas por mês para levar a cabo esta missão. Seria mais cómodo não ter de ir aqui e ali para tirar umas fotos, não ter de puxar pela cabeça para escrever e escrever e escrever, muitas vezes sobre as mesmas coisas ano após ano, não ter de correr “seca e meca” para conseguir uns patrocínios, cada vez mais às migalhas e com descontos, para conseguir os cerca de mil euros mensais que o jornal nos custa, só em impressão, correios e comunicações (contar as horas de trabalho seria um exercício demasiado penoso). E vale a pena? Quando folheio as encadernações destes anos, suspiro. Sim, vale a pena. Temos ali a história da nossa freguesia (e até, em boa parte, do nosso concelho) contada ao pormenor, mês após mês, ano após ano, desde o tempo em que tinha duas escolas a funcionar (e agora só tem meia), mas não tinha farmácia, nem posto médico (que voltou a deixar de ter), nem edifício da junta, nem jardim-de-infância, nem um restaurante etnográfico, nem um pavilhão desportivo, nem salões nas igrejas, nem passeios nas ruas, nem… tantas outras coisas que passou a (ou deixou de) ter. Quando ouço na rua um elogio a um trabalho bem feito (curiosamente, vem mais de pessoas de fora da nossa terra), sorrio. Sim, vale a pena. É um legado que deixamos aos vindouros, para que saibam como cresceu e evoluiu a nossa terra, mas também um repositório de cultura, de partilhas de saber, de ideias, de causas, de lutas, das alegrias e tristezas que passaram por nós. Tudo isso com a marca de qualidade que exigimos sempre de nós (pelo menos, tentamos). No saldo, esperamos que também esta pequena gota tenha contribuído para o caudal de crescimento que a Golpilheira registou nos últimos anos. Basta-nos isso. E se temos de agradecer aos colaboradores do jornal (perdoem-me os outros, mas… obrigado Manuel Rito!), bem como aos assinantes e leitores, neste aniversário apetece-me agradecer em especial aos anunciantes. Sim, são eles que permitem que isto continue, pois sem dinheiro não há milagres. E muitos deles (a esmagadora maioria) não fazem publicidade, fazem um donativo, que até deveria ser isento de IVA (mas não é). Isto porque os seus anúncios são apenas uma forma de ajudarem o jornal, de marcarem presença neste projecto, de mostrarem que vale a pena investir na cultura e na informação de proximidade da sua terra. A eles, o nosso muito obrigado pela amizade e pela confiança. Em jeito de permuta, uma sugestão: vão ver quem são e façam lá as vossas compras e negócios. Isto não é publicidade, é agradecimento a quem nos ajuda.
Antes de convidar o leitor a visitar comigo a Capela do Fundador, gostaria que apreciasse as duas sepulturas que estão na nave lateral, no lado direito de quem entra na igreja pela porta principal (que é por aí que devem começar todas as visitas), nas proximidades daquele panteão. A primeira é de Diogo Gonçalves de Travaços, regedor das terras do Infante D. Pedro (o Infante das Sete Partidas e notável regente do Reino durante a menoridade do seu sobrinho e genro D. Afonso V) e aio dos seus filhos, pelo Infante armado cavaleiro na conquista de Ceuta. Não se sabe a razão do sepultamento de Diogo de Travaços no Mosteiro, a que talvez não tivesse sido estranha a doação de bens ao respectivo convento. A cobertura da campa é artisticamente lavrada com um D gótico iluminado (adornado). Mesmo à entrada da Capela do Fundador está a sepultura de Martim Gonçalves de Macedo, natural de Macedo de Cavaleiros, que salvou a vida ao Mestre de Avis na batalha de Aljubarrota ao matar um castelhano que já tinha derrubado o nosso Rei e, com este seu acto heróico, salvou também a liberdade da Pátria. Por ter usado então a maça de armas (espécie de lança curta tendo num dos seus extremos uma pega para a mão e no outro bicos ou pregos) começou a ser conhecido por Martim da Maçada em vez de Martim de Macedo e é assim que está designado no seu túmulo. Em reconhecimento e em homenagem, el-Rei D. João I mandou sepultá-lo à entrada do seu panteão. O heróico escudeiro transmontano teria falecido cerca de 1425. A Capela do Fundador é um autêntico santuário da Pátria, por ser guardiã dos restos mortais de algumas das maiores figuras e das mais decisivas, quanto ao cumprimento da Missão
DR
Luís Miguel Ferraz Director
Curiosidades e Mistérios no Mosteiro de Santa Maria da Vitória (IV)
Fotografia da Capela do Fundador da colecção da Papelaria Saitam, de António do Rosário Matias.
de Portugal naquele tempo, da nossa História. Portugal cumpriu já várias missões, como a da Reconquista Cristã, a dos Descobrimentos e a da Expansão Ultramarina, em que deu “vários mundos ao Mundo”, faltando-lhe ainda cumprir outras de expansão universal para o que terá de meter ombros primeiramente à tarefa de se regenerar e reorganizar. Este belíssimo panteão mandou-o D. João I construir ao mestre, que se crê hoje ser catalão, Huguet. Foi este arquitecto responsável pela obra conventual durante 36 anos (14021438). Na Batalha passou a maior parte da sua vida, aqui falecendo e sendo sepultado na Igreja de Santa Maria-a-Velha, aquele templo que existia no terreiro a leste do Mosteiro e que foi estupidamente destruído no século XX, perdendo-se as ossadas dos vários mestres ali sepultados. Foi Huguet também que, a convite de el-Rei D. Duarte I, iniciou as Capelas Imperfeitas. O túmulo central da Capela do Fundador encerra os restos mortais de D. João I, o Príncipe que, encabeçando a resistência ao invasor castelhano, assegurou e consolidou a independência do nosso País e com ela a nossa liberdade, ao mesmo tempo que iniciou a época mais
brilhante e progressiva, material e espiritualmente, da História Nacional, e os de sua mulher D. Filipa de Lencastre, princesa inglesa da família dos Lencaster, de grande cultura e firmeza moral, excelsa educadora não só dos seus filhos, a Ínclita Geração, mas da corte portuguesa. Encimam o túmulo as suas estátuas jacentes, consideradas do melhor que há na escultura do século XV. O régio casal está rodeado, a Sul, pelos seus filhos, os Infantes D. Fernando, D. João e mulher D. Isabel de Barcelos, D. Henrique, o iniciador dos Descobrimentos, e D. Pedro e a mulher D. Isabel de Urgel. A Oeste estão, desde 1901, os túmulos de D. Afonso V e da mulher D. Isabel de Coimbra (filha do Infante D. Pedro e, portanto, prima direita de D. Afonso), de D. João II e do filho deste, o Príncipe D. Afonso que morreu aos 16 anos duma queda de um cavalo, nas proximidades de Santarém. A vida da Rainha D. Isabel de Coimbra foi trágica. Casando muito nova com D. Afonso V, teve três filhos, o mais velho dos quais perdeu à nascença ou em tenra idade e está sepultado, em pequeno túmulo artisticamente lavrado, que desde os anos 40 do século XX se encontra nas Capelas
Imperfeitas. Nasceram-lhe depois a Infanta que é presentemente conhecida por Santa Joana Princesa que, jovem, professou no Convento de Jesus de Aveiro, onde está sepultada, e outro João que haveria de ser o Príncipe Perfeito, D. Joao II. D. Isabel sofreu imenso com a guerra travada entre seu pai, o Infante D. Pedro, e o seu marido D. Afonso V, guerra alimentada pelas intrigas dalgumas figuras tenebrosas da corte. O Infante D. Pedro acabou por ser morto, na batalha de Alfarrobeira, em 20 de Maio de 1449. Tenho de ficar por aqui. Até para o mês que vem, se Deus quiser. José Travaços Santos Algumas obras de apoio: “De Macedo a Macedo de Cavaleiros – A Figura de Martim Gonçalves de Macedo”, de Pedro Gomes Barbosa e Carlos Santos Mendes. Edição da Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros; “Vésperas Batalhinas”, do Professor Doutor Saul António Gomes; “História de Portugal”, do Professor Doutor Joaquim Veríssimo Serrão; “Santa Maria da Vitória – Batalha”, do Dr. Sérgio Guimarães de Andrade; “Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira”.