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Breakdance nas Olimpíadas: Símbolo de Resistência Negra e Periférica

A história da modalidade de dança que estará presente nos Jogos Olímpicos de 2024

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© Julia Takahashi

Competição de Breakdance Julho de 2022, em São Paulo

Por Dayres Pereira, Gabriela S. Thier e Júlia Takahashi

Em 2019, o Comitê Olímpico Internacional (COI) incluiu quatro novas modalidades para o programa dos Jogos Olímpicos de Paris, de 2024. Entre elas, estará presente a primeira categoria de dança esportiva, o Breakdance, do qual teve uma primeira aparição nos Jogos Olímpicos da Juventude de 2018, em Buenos Aires, na Argentina. Essa inserção dos novos esportes é uma tentativa de trazer maior diversidade aos jogos, como comenta Tony Estanguet, presidente do Comitê Organizador dos Jogos de 2024.

“Nosso objetivo, desde o início, foi destacar o que foi a força dos Jogos durante 32 edições, a diversidade dos esportes e a emoção que resulta no rendimento, ao mesmo tempo em que aproveitamos a oportunidade que nos oferece o COI, para melhorar o programa e oferecer uma nova dimensão”. Contudo, a visibilidade que o Break conquistou até chegar aos Jogos Olímpicos traz uma história de grande resistência, desde o século XX.

Tendo a crise de 1929 como marco inicial para o aumento da violência e da pobreza nos Estados Unidos, a população dos bairros do Bronx e do Brooklyn, em Nova York, na década de 50, começa a procurar novas formas de manifestação para reafirmarem suas existências na sociedade norte-americana. Assim, os DJs Afrika Bambaataa e Kool Herc foram os artistas que incentivaram os jovens de comunidades a resolverem suas discussões e diferenças por meio da dança, nas batalhas que aconteciam nos quarteirões dos bairros nova-iorquinos, chamadas de Block Partys, com a batida da música de RAP e Hip-Hop. O objetivo era fazer movimentos físicos com certo grau de dificuldade a ponto de seu adversário não conseguir fazer o próximo.

Dessa forma, os jovens das periferias denunciavam a dura realidade da segregação racial dos guetos nova-iorquinos e as condições sociais em que viviam. As performances serviam para manifestar a revolta que sentiam por imensa desigualdade, buscando apontar a exclusão social e ao mesmo tempo fugir de padrões já estabelecidos pela cultura vigente, que refletiam acomodações e continuidades.

O break, no entanto, não se limitou apenas ao debate da resistência. Além de aludir às formas de posicionamentos, o estilo revelava uma valorização de suas identidades, dos lugares de onde são e vieram, da ancestralidade de suas culturas, uma maneira de as carregarem para além dos subúrbios --- para a cidade e o mundo.

Além disso, a escolha da prática, principalmente nas ruas, era um jeito simbólico de ocupá-las, referindo-se à questão do lugar social, de marcarem presença em seus ambientes comuns de convivência. Também era um modo de pacificar disputas territoriais nas regiões. Assim, o Hip-Hop e o Break se espalharam pelo país e pelo mundo rapidamente, criando novos movimentos e modalidades. Mesmo com suas raízes consolidadas em Nova York, é inegável a existência de conexões e semelhanças na cultura de comunidades negras, que já existiam ao redor do mundo bem antes do break.

Um fato que confirma isso são as similaridades que alguns dos movimentos da capoeira, esporte de origem afro-brasileira, tem com o breakdance, como, por exemplo, o “pião de cabeça”, que é muito parecido com o “head spin”. Ambos os movimentos se baseiam em girar o corpo com as pernas para o alto se apoiando com a cabeça no chão.

Tempos depois da cultura hip-hop se popularizar entre os norte-americanos, o estilo chega ao Brasil por meio de grupos como o Public Enemy – que fizeram seu primeiro show na cidade de São Paulo em 1984 – e também da televisão, que ajudou a globalizar o breaking. Thaíde, um dos fundadores do Back Spin (1985), o mais antigo grupo ainda ativo no país, e Nelson Triunfo, pernambucano conhecido como o pai do hip-hop brasileiro, são alguns dos pioneiros que se identificaram com o movimento. Juntos, os dois incentivavam os jovens a adentrarem ao novo estilo, ajudando-os a deixarem de lado a violência fortemente presente em bairros periféricos naquela época.

Foi com esse propósito que o Break foi inserido nas Olimpíadas. O presidente do COI, Thomas Bach, comentou à ESPN sobre o ingresso das quatro modalidades. “Os quatro esportes propostos estarão totalmente em linha com a Agência 2020, porque contribuem para que o programa seja mais equilibrado, quanto a gênero e mais urbano, e oferecem uma oportunidade de se conectar com uma geração mais jovem”. Além disso, Estanguet acrescenta: “Trata-se de uma disciplina espetacular e muito diferente de tudo já visto até agora em uma Olimpíada que, além disso, exige uma disciplina e um rigor fora do comum”.

Sendo essas semelhanças culturais e a marginalização de comunidades negras algo global, não é impensável que o uso da dança e do esporte para superar essa realidade também seja global. O breakdance representa um estilo de vida por meio de uma forma de existir no mundo: a arte. Logo, a modalidade ainda é forte fonte de criação de vínculos entre a juventude e suas comunidades, de modo que tem ganhado cada vez mais visibilidade.

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