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A ascensão do mercado de livros eróticos

Para a sexóloga Caroline da Silveira Schlossmacher, leitura do gênero proporciona diminuição do tabu sobre a sexualidade feminina

Por Maria Ferreira dos Santos e Ricardo Dias de Oliveira Filho

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Lançado em 2011, “Cinquenta Tons de Cinza”, de Erika L. James, se tornou um fenômeno, resultando na continuação em dois outros livros e na adaptação cinematográfica sob direção de Sam Taylor-Johnson. Devido ao sucesso da saga, outras editoras e produtoras seguiram caminho similar, desenvolvendo obras como “Bridgerton” (2000), de Julia Quinn, “After” (2014), de Anna Tood, “A Barraca do Beijo” (2021), de Beth Reekles e “Através da Minha Janela” (2022), de Ariana Godoy.

Apesar da visibilidade adquirida por meio do audiovisual, o gênero erótico, ou hot, está presente desde a época das ficções criadas por fãs, popularmente conhecidas como fanfics, que tiveram início nos anos 90 e 2000 com histórias que, em geral, envolviam famosos ou personagens fantasiosos, como vampiros e magos. “Eu comecei a ler fanfic e a escrever. Foi assim que entrei no mundo do hot”, declarou Camila Cocenza, autora de livros românticos e eróticos, em entrevista ao Contraponto. Não à toa algumas dessas obras chegaram originalmente em sites e aplicativos de fanfics, como o Wattpad, para depois serem publicadas pelas editoras.

Ao Contraponto, Caroline da Silveira Schlossmacher, psicóloga e sexóloga, explicou o porquê de tanto interesse no gênero. “A literatura erótica te dá a possibilidade de mergulhar nas fantasias sexuais, em que você pode imaginar o(a) personagem principal da forma que te agrada, além de outras coisas proporcionadas pela leitura. O crescimento também se dá ao fato de que estamos, cada vez mais, falando de forma mais tranquila sobre sexualidade, desconstruindo o tabu”. O posicionamento da profissional é semelhante ao de Cocenza. Para a escritora, a leitura, justamente por ser um tabu, “acaba tornando-se mais instigante”.

Os vídeos que viralizam nas redes sociais, as trends, também podem ser encarados como fatores relacionados à ascensão do gênero literário. “Na Amazon alguns autores sempre estavam ali [na lista de mais vendidos]. Depois que começaram as publicidades via TikTok e Instagram, abriu espaço para todos. Um vídeo que viraliza te leva ao top 1, top 5”, apontou Camila.

Um exemplo disso é a conta no Instagram “@debsleitora”, em que a produtora de conteúdo Debora Luísa se dedica a falar sobre o assunto. “Eu acho que esse gênero sempre foi muito grande, tanto que, quando você entra na Amazon, só livros eróticos estão no topo. Acredito que tem crescido cada vez mais por conta do bookstagram e booktok, que tem divulgado a existência dos livros. Todo dia tenho seguidoras que falam ‘nossa, eu não sabia que tinha livro assim. Onde encontro?’, o que é bem legal, porque você vê que o interesse pela leitura tem crescido também”, disse a influenciadora.

Paralelamente, a libertação sexual tem forte impacto, uma vez que, historicamente, o lugar de sensualidade não era ocupado pela comunidade feminina. A atualidade quebra com o silêncio, trazendo ao mercado escritoras e leitoras. Cocenza defende que anos atrás uma mulher lançar um livro erótico era impraticável. Além do protagonismo e espaço adquirido hoje, a partir do momento que a mulher entende seu corpo, ela se torna dona de sua própria sexualidade e poder.

Sobre as consequências individuais e coletivas em relação à ascensão, Schlossmacher explicou: “O que mais pode gerar como contribuição é o empoderamento feminino, a diminuição do tabu que cerca a sexualidade, além da normalização de que as mulheres têm interesse sexual e que devem explorar a própria sexualidade. No que diz respeito à individualidade, a literatura erótica pode proporcionar autoconhecimento e melhorar a autoestima”.

Embora o gênero desperte empolgação na comunidade leitora, há divergências em relação à romantização de relacionamentos não saudáveis e/ou a criação de parâmetros irreais, uma vez que algumas das obras apresentam personagens atrelados ao estereótipo de “homem dominador”, como também da mulher como ser inexperiente ou sedento. Diante desse cenário, a psicóloga alerta: “Uma pessoa não precisa ser autoritária e muito menos abusiva para ser sexy. Ao contrário, diálogo e acolhimento podem gerar mais tesão. Esse é um ponto importante para chamarmos a atenção, visto que ainda, infelizmente, é comum existirem relacionamentos abusivos e, principalmente, violência contra a mulher”.

© Montagem: Maria Ferreira dos Santos

Antes encarados como tabu, livros eróticos impulsionam libertação sexual da comunidade feminina

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