autoDRIVE #57 - fevereiro 2023

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Numa tendência que vai acelerar, a maior parte das novidades são elétricas (Audi Q8/SQ8, DS3…), mas a beleza desta edição da nossa revista está na diversidade. A par dos elétricos, temos híbridos (então não é que o Toyota Prius agora é, quase, um desportivo???), gasolina com um dos melhores motores de combustão de sempre, o seis cilindros em linha turbo da BMW que move o Toyota GR Supra de caixa manual e o irreverente Morgan Plus Six, e até um Diesel!

E isto permite que se possa ter uma ideia real das vantagens e inconvenientes de cada uma das soluções: os elétricos aceleram bem e são estupidamente fáceis de conduzir, mas o elevado peso está lá sempre presente e prejudica a agilidade e o conforto; os Diesel permanecem imbatíveis quando se trata de fazer quilómetros sem parar, mas a quantidade de medidas necessárias para reduzir as emissões de partículas (até quatro catalisadores e AdBlue) fazem deles motores caros de produzir, comprar e manter; os híbridos cinéticos e as pequenas ajudas elétricas conseguem mesmo reduzir as emissões e consumos, mas nunca vão ser suficientes para o atual fundamentalismo político (aliás, por serem tão interessantes até parece que são um inimigo, sendo tratados como tal…); os motores a gasolina são imbatíveis em matéria de relação peso/potência (Caterham 340R) e prazer de condução, para além de se terem tornado sóbrios no apetite, só que são encarados como um crime para o planeta. Num mundo perfeito, teríamos BEV para a cidade, híbridos e Diesel para grandes distâncias e gasolina para os desportivos, pelo menos enquanto o hidrogénio e evoluções como “carros nucleares” não chegam.

Do lado da história, o Alfa Romeo 75 2.0 Twin Spark, o Mercedes-Benz 190 (W201) e o Lancia Rallye 037 concentram as atenções; enquanto o Paulo Marmé nos recorda porque Ken Block já é imortal e o João Santos Matos tem tanto para dizer sobre a inflação (e os custos de manutenção da principal marca sueca) que até teve que fazer uma segunda crónica para poder falar do seu Amor incondicional à Lancia e ao 037.

Boa leitura!

EDITORIAL
PEDRO SILVA
Gasolina, Diesel e elétricos. SUVs, desportivos exclusivos, familiares e caixas de sapatos. Temos tudo nesta AD #57! E… pró menino e prá menina!
4
Diretor

HONDA

TOYOTA ADAPTA AE86 AO HIDROGÉNIO E À ELETRICIDADE ATUALIDADE 9 42 NEW DRIVE NEW DRIVE 36 PHEV, COM 223 CV E AUTONOMIA EV DE 69 KM TOYOTA PRIUS NEW DRIVE 40 100% ELÉTRICO À ESPERA... DAS FROTAS CITROËN Ë-C4 X 24 NEW DRIVE PEUGEOT 408 PLUG-IN HYBRID 225 E-EAT8
BATERIA DE 114 KWH BRUTOS E 503 CV DE POTÊNCIA NEW DRIVE 30 1.5 ETSI 150 CV (MILD-HYBRID) CUPRA LEON CRÓNICA 10 “CARRO SUECO, REVISÃO ESPANHOLA?” POR: JOÃO SANTOS MATOS NEW DRIVE 34
E COM NOVO CORAÇÃO ELÉTRICO DE 156 CV DS 3 E-TENSE GRANDE PLANO 50 TEST DRIVE 46
HÍBRIDO
AUTONOMIA:
GLC 220 D 4MATIC
12
SER NEW DRIVE 18 O MOTOR 2.0 TURBO SUBIU APENAS 9 CV, PARA OS 329 CV, MAS… UI UI (E: UPA UPA!)
AUDI SQ8 E-TRON
RENOVADO
SISTEMA MICRO
DE 48V.
MAIS DE 1000KM! MERCEDES-BENZ
VIDA SOBRE RODAS
Ken Block - RIP (1967-2023) #43: O NÚMERO QUE TODOS QUERIAM
CIVIC TYPE R FL5 TOYOTA GR SUPRA CAIXA MANUAL

MORGAN PLUS SIX MEGA DRIVE 60

PARECE ANTIGO, MAS É NOVINHO E TEM MOTOR BMW E CAIXA AUTOMÁTICA ZF 8HP

ADVENTURE DRIVE 68

CATERHAM 340R

PISTA SECA E MOLHADA!

LANCIA RALLY 037 MAGAZINE 78

O ÚLTIMO CAMPEÃO DE RALIS COM DUAS RODAS MOTRIZES!

84

ONCE UPON A DRIVE MERCEDES 190 W201

NO FINAL DE 1982 FOI APRESENTADO O MÍTICO 190, ‘AKA’ “BABY-BENZ”

CARROS COM HISTÓRIA 72

ALFA ROMEO 75

2.0 TS (1989)

O ÚLTIMO ALFA DE TRAÇÃO

ANTES “DA FIAT CHEGAR”

EVENT DRIVE 90

“PASSEIO DOS INGLESES”

19ª EDIÇÃO, MAIS DE 250 CARROS

QJ MOTOR SRK400 MOTO

RECÉM-CHEGADA MARCA CHINESA

OFERECE 6 ANOS DE GARANTIA

CRÓNICA 98

“O MEU PRIMEIRO LANCIA”

POR: JOÃO SANTOS MATOS

ESTREIA DA 32ª TEMPORADA TOP GEAR
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RIDE 92

Yangwang U9 é um hipercarro “barato” vindo da China

MODELO ELÉTRICO PRODUZIDO PELA SUBMARCA DA BYD

TRAZ 1306 CV, O QUE... É MUITO CAVALO DO CHINÊS

A BYD lançou uma submarca destinada a modelos de luxo e de altas prestações 100% elétricos, a Yangwang. E um dos dois modelos de apresentação do novo emblema é este U9, um hipercarro elétrico com um preço invulgarmente baixo tendo em conta as prestações que anuncia: 140 mil euros, no mercado chinês (para o qual se destina, para já, em exclusivo). O Yangwang U9 traz um desenho agressivo e evolui a partir da plataforma Yisifang. O sistema propulsor, batizado e4, conta com quatro motores, um por roda, que permite controlo independente e um potente sistema de vectorização de binário com tração integral. Segundo o fabricante, cada motor

SUVs Alpine com plataforma Lotus

Alpine tem um plano ambicioso para os próximos anos que passa, em primeiro lugar, por um novo A110 elétrico, sendo este desportivo desenvolvido em conjunto com a Lotus. Para a base da gama figurará também um Alpine 5, que será uma espécie de versão “apimentada” do novo Renault 5, mas com 220 cv. Além disso, está na forja para 2024 um SUV desportivo do segmento C, o GT X-Over, que será feito a partir da mesma plataforma do Nissan Ariya. Contudo, a principal surpresa, segundo a Autocar, é o recurso a uma plataforma da Lotus, a mesma do Eletre, para produzir dois SUV elétricos de referência. Ao que tudo indica estão na calha dois modelos crossover de estilo GT, ambos da classe dos 5 metros de comprimento e 2 toneladas de peso. Estas propos -

oscila entre 220 e 240 kW de potência, o equivalente e a 295 e 322 cv, respetivamente. Isto significa que os quatro motores geram uma potência conjunta entre 880 e 960 kW, ou seja, 1296 e 1306 cv. Desta forma, o carro consegue acelerar de 0 a 100 km/h em 2 segundos. A capacidade da bateria ainda não foi revelada, mas sabe-se que será utilizada uma bateria totalmente nova, relativamente compacta, chamada Blade Battery. Esta atual proliferação de carros desportivos com potências acima dos 1000 cv mostra bem a facilidade que há em tirar potência de um motor elétrico; afinal, dar corrente e impedir que derretam não é uma questão de física nuclear. //

tas ainda sem nome conhecido, uma concorrente do Porsche Macan (do segmento D) e outra do Cayenne (do segmento E), serão lançadas em 2027 e 2028, respetivamente. Estes modelos destinam-se, sobretudo, ao mercado norte-americano e chinês. Este pleno da Alpine tem por objetivo que, em 2030, 15% das suas vendas sejam fora da Europa.//

Atualidade 8

Toyota adapta AE86 ao hidrogénio e à eletricidade

A conversão de clássicos em elétricos está cada vez mais na moda. Agora foi a própria Toyota a apresentar dois “restomod” do AE86 no Salão de Tóquio, um a hidrogénio e outro elétrico (é pró menino e prá menina).

O primeiro chama-se AE86 H2 concept e foi feito com base na carroçaria Trueno, com faróis retráteis e pintura em dois tons (preto e branco). Por fora está praticamente igual ao modelo original. Debaixo do capot mantem-se o tradicional motor 1.6 de quatro cilindros (16 V 4A-GE DOHC), com injetores, tubagens e velas adaptadas ao sistema que utiliza hidrogénio como combustível. Os depósitos de hidrogénio estão armazenados na bagageira e estão revestidos em carbono. A potência é dirigida às rodas traseiras através de uma caixa manual. A acompanhar o H2 foi apresentado o AE86 BEV concept

Jeep Avenger é o Car of the Year

O Jeep Avenger é o Car of the Year (COTY) 2023, num prémio que foi anunciado no Salão de Bruxelas, na Bélgica. Aquele que é o primeiro SUV elétrico da marca norte-americana obteve 328 pontos, incluin do 21 primeiros lugares entre os 57 membros do júri, onde se inclui o colaborador da autoDRIVE, Francis co Mota. Esta é a primeira vez que um modelo da Jeep recebe o prémio COTY.

Em segundo lugar ficou o Volkswagen ID. Buzz, com 241 pontos, tendo sido a preferência entre 16 dos ju rados. Em terceiro ficou o Nissan Ariya com 211 pontos. Os restantes carros a votação nesta 60ª edição do COTY eram o Kia Niro, o Renault Austral, o Peugeot 408 e a dupla Subaru Solterra/Toyota bZ4X. Disponível na Europa, Japão e Coreia do Sul, o Aven-

com carroçaria Levin e faróis convencionais. A decoração é similar à do H2 e o mais interessante está também no miolo do carro. Este BEV utiliza um motor elétrico de 48 cv e 250 Nm retirado de uma pick-up Tundra híbrida e uma leve bateria de apenas 13,6 kWh de capacidade de um Prius plug-in, complementando o conjunto com componentes oriundos de modelos da Toyota e da Lexus. A maior surpresa é o recurso a uma caixa manual de seis velocidades, que segundo a Toyota contribui para manter uma distribuição de peso ideal. Nos dois modelos são utilizados bancos restaurados, além de cintos feitos a partir de materiais reciclados. Para fazer estes dois “restomod” a Toyota recorreu a alguns fornecedores de aftermarket. Não está previsto que venham a ser produzidos em escala, mas… era fixe! //

ger é o primeiro elétrico da Jeep. Está disponível numa versão de tração dianteira com motor de 154 cv/115 cv e 260 Nm. A bateria de 54 kWh de capacidade permite uma autonomia máxima até 400 km (WLTP) e já tem 200 encomendas em Portugal. //

Atualidade 9

Carro sueco, revisão espanhola?

2023! Desde o ano passado que a inflação anda armada em boa. Pensa que é boa, toda boa, e diz: “eu faço o que quero e bem entendo!” Está descontrolada e ninguém a mete na ordem! Faz o que quer e não poupa ninguém. Mesmo assim, há um país da Zona Euro que, apesar da sua presença se fazer sentir e ser alta, é o menos afetado: a Espanha. Não obstante tal facto, como o país do Fernando Alonso, e Roberto Martinez, tem muita pinta, eis que durante os próximos seis meses (ou até que a inflação baixe) passou o IVA dos bens de primeira necessidade para… hhmmm zero por cento, numa medida já conhecida como “nicles IVA”. Se o português que vive perto quanto baste da fronteira já ia sempre atestar o carro “em pesetas”, se os caramelos do outro lado da cerca já sempre nos soaram melhores e se o ‘Corte Inglés’ de Badajoz é mais chamativo por ser um ‘Outlet’, que é que logo sucedeu com esta ajuda do fisco espanhol aos seus?

Pois que instantaneamente acionou os tugas de perto (e de semi-perto) a irem já a correr até às “tiendas de nuestros hermanos de España” tratar do avio mensal. Pão, ovos, legumes, verduras, leite, fruta ou cereais. Em Portugal é 6, lá era 4, agora é 0. Zero por cento. E isto faz-me lembrar uma velha história do “Mundo Automóvel” que não se trata de um mito urbano até porque… me foi contada a mim, na primeira pessoa e posso atestar a veracidade de ter sido proferida. A esta história (ou vá, vamos até salvaguardar dizendo “estória”), eu dou o nome de “Carro sueco, revisão espanhola”. E antes de a contar devo começar por dizer que muito estimo o “Clube Volvo Fans Portugal” (que existe!). Devo também afirmar que: eu sou volvista. O meu pai é volvista e a sua irmã é volvista. Logo, a minha tia também é volvista. O meu médico é volvista. E o meu melhor amigo aqui na autoDRIVE é volvista! Mas… desde sempre que sou apenas mais um aficionado que quando chega a hora de ir à revisão quase se desfilia do partido e fica em ponto de desafeto. Porquê? Porque qualquer intervençãozinha na assistência oficial da casa da Gotemburgo, em Portugal, faz o chuchu

brasileiro parecer barato. Mesmo para quem tenha tido outros carritos, ditos, Premium, o momento de passar o cartão (mesmo que contactless) pela maquineta de pagamento da oficina Volvo é… um momento sempre ‘hardcore’. Ainda por cima, dada a menor tradição de sucesso da marca em Portugal (por não sermos um país abastado), não se encontram por aí facilmente “mecânicos suecos” independentes para nos ajudar, e mesmo que os encontremos… as peças… os óleos, é tudo taxado em coroas da realeza sueca.

Estes dois enredos (de Ayamonte, Badajoz e restantes terras irmãs) e o da assistência Volvo pela ‘tugaland’ lembram-me uma história que há uns anos um senhor que me confidenciou e sobre a qual fiquei sempre a pensar: será mesmo verdade? Falávamos dos nossos carros suecos e do Amor-ódio, dada a questão “assistência”, e ele disse-me que a dada altura da sua vida, marcava as revisões em Espanha, levava a mulher e a filha, pernoitavam num hotel, comiam fora, traziam uns ‘regalos’ mais uns caramelos e mesmo assim poupavam na revisão periódica - quando esta era das mais exaustivas. Pareceu-me uma história rebuscada, e na doutrina do “chico-espertismo da bazófia”, mas… “olhe que não, olhe que não” e ainda “é fazer as contas”, citando os famosos políticos. Ao ver estes exemplos do “pão” e do “leite” vividos em 2023, reavivo tal conversa e mais a interiorizo como verdadeira e se calhar uma, muito, boa ideia para cada um de nós se manter volvista sem o “tal embaraço” da oficina (ou isso… ou então emigrar de vez para Espanha, onde a língua é estranha, mas os impostos bonitos)! //

CRÓNICA 10
Editor-Geral / Diretor Comercial JOÃO SANTOS MATOS
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Ken Block (1967-2023)

KEN BLOCK PARTIU NO MÊS PASSADO. CORRIA COM O #43

E FAZIA O QUE POUCOS ERAM CAPAZES DE FAZER COM

CARROS: UMA CONDUÇÃO IRREVERENTE QUE PARECIA

UMA BRINCADEIRA TELECOMANDADA E MUITO FAZIA

SONHAR QUEM O VIA A CONDUZIR DAQUELA FORMA. OS

EMPOLGANTES VÍDEOS “GYMKHANA” TORNARAM KEN

BLOCK UMA LENDA ETERNA E INSUBSTITUÍVEL

Talentoso piloto de ralis profissional, Ken Block morreu tragicamente aos 55 anos no Utah, EUA, após um acidente com uma moto de neve. O piloto percorria uma encosta íngreme no condado de Wasatch, Utah, quando a moto se virou, caindo em cima dele. Foi declarado morto no local. Em sua homenagem, a FIA decidiu retirar do uso no Mundial de Ralis de 2023 o #43, o número de Ken Block.

UM CAMPEÃO SEM NUNCA TER SIDO

Nunca foi campeão do mundo de ralis e nem sequer esteve alguma vez perto disso, apesar de ter triunfado em mais de 25 ralis de nível nacional em diferentes países e ter marcado pontos no WRC. Contudo, é um dos nomes mais mágicos e incontornáveis de sempre do circuito de ralis, ou, mais ainda, do universo motorizado com que qualquer “petrolhead” se identifica. Por uma razão: Ken Block é único. Sim: apesar de ter morrido, Ken Block ainda é. E não há exageros na afirmação. O piloto norte-americano é, a par do outro “monstro” que é Travis Pastrana (seu amigo, também), uma das épicas referências para todos os que vibram com automóveis pela forma única como elevou ao patamar excelsius a sua paixão e a sua mestria de condução, por entre power slides e gincanas. De resto, apesar das provas oficiais que disputou em diferentes ralis e campeonatos (como o Rally America e o Global Rallycross), foi com os seus entusiasmantes vídeos no YouTube que Block ganhou reconhecimento global. E fez com que qualquer apaixonado por carros desejasse ser Ken Block. A capacidade de fazer de cada produção

“Gymkhana” uma ode automóvel capaz de banalizar as mais inesquecíveis cenas de ação de carros do cinema tornam-no uma vibrante inspiração e dão-lhe entrada direta para o livro dos imortais.

Entre as manobras ousadas de Block, na “Gymkhana Nine – Raw Industrial Playground”, em 2016, da série “Gymkhana”, consta a travessia de uma passagem de nível com o Ford Focus RS RX, que o piloto usava no Campeonato Mundial de Rallycross, de lado (e com as quatro rodas no ar) vendo o comboio a passar-lhe à frente, ou um powerslide numa zona portuária com parte das rodas traseiras a ficarem de fora do cais do porto e a espreitarem as águas do Lago Erie, enquanto o carro “dançava”.

“O momento em que pendurei a parte de trás do carro naquele pontão, foi realmente stressante”, contou, na altura, Block. “Mas, é algo que queríamos fazer na vida real e que as pessoas só tinham visto em imagens geradas por computador. Esta é a melhor parte destes vídeos: tudo que faço com o carro e que capturamos na câmara é real, ao vivo. Fazemos alguns takes para conseguir cobrir todos os ângulos, mas no final é tudo verdade, nada é simulado”.

FÃ DE DESPORTOS RADICAIS

Nascido a 21 de novembro de 1967, na Califórnia, Kenneth Paul Block cresceu na cidade de Huntington Beach, no litoral da Califórnia. Fã de desportos radicais, Ken Block começou a competir em provas de skate locais, durante a adolescência. Aspeto interessante na trajetória de Ken Block –

Vida Sobre Rodas 12
Texto — Paulo Marmé

atendendo ao seu talento “sobrenatural” para conduzir – é que o piloto se envolveu com o automobilismo desportivo apenas aos 37 anos de idade. Ken passou a infância e adolescência em Long Beach, Califórnia, em cima de skates a realizar manobras radicais. Desejava seguir arquitetura, mas acabou a entrar num curso de design, durante o qual comprou uma moto e participou em competições amadoras de trial e motocross. Após a licenciatura, Block foi trabalhar como designer numa empresa de artigos desportivos, de onde saiu para o Colorado com o sonho de se tornar um “snowboard bum” (um “vagabundo do snowboard”). Ken Block concluiu, porém, que o seu jeito em cima de uma prancha sobre a neve não seria suficiente para se tornar snowboarder profissional. Block regressa, então, à Califórnia, ao skate, entrando também na faculdade de arquitetura. Aí conheceu Damon Way, irmão do renomeado praticante Danny Way (que, em julho de 2005, a partir de uma rampa, fez um salto de

18,60 metros na muralha da China, com um skate).

Fãs de skate, juntos decidem desenvolver artigos específicos para praticantes da atividade, montando em 1992, uma empresa de artigos desportivos, a Droors Clothing, que posteriormente se transformou na DC Shoes, em 1994, virada para calçado. O sucesso foi imediato: no final de 1995, a DC fechou o balanço com vendas de 7 milhões de dólares. O crescimento atraiu a cobiça dos grandes players do setor, levando a que, em 2004, a insígnia DC fosse comprada pela Quiksilver a troco de 87 milhões de dólares (cerca de 81 milhões de euros, na conversão atual). Com esse encaixe, Ken Block começou a investir nas suas atividades e a apoiar atletas das mais diversas modalidades, do skate ao surf, do motocross ao snowboard, passando pelas bicicletas de BMX. Block idealizou ideias excêntricas como os half-pipes gigantes (DC Super Ramp) e a Mega Ramp para a criação de manobras mais extremas. Ken conhece, então, Travis Pastrana, que estava a

“KEN ERA UMA VERDADEIRA LENDA E A MEMÓRIA DESTA VERDADEIRA LENDA VIVERÁ CONNOSCO PARA SEMPRE” -

PRESIDENTE DA FIA, MOHAMMED BEN SULAYEM, SOBRE KEN BLOCK. “TUDO QUE FAÇO COM O CARRO E QUE CAPTURAMOS NA CÂMARA É REAL, AO VIVO” – KEN BLOCK

começar a participar nos ralis, modalidade muito pouco difundida nos EUA. Perguntou a Pastrana como entrar nos ralis, tendo Travis indicado o curso do Team O’Neal, no qual Ken logo mostrou aptidões naturais. Em pouco tempo estava a disputar provas com Pastrana.

Block começou a sua carreira de ralis com um Subaru WRX STi 2005, da equipa Vermont SportsCar. E em 2006, Ken inicia a sua carreira como piloto profissional ao ser contratado, juntamente com o amigo Pastrana, para compor a Subaru Rally Team USA. Block terminou em segundo lugar no Rally America National Championship, de 2006, atrás do companheiro de equipa Pastrana.

Além dos ralis na América do Norte (cujo campeo-

nato incluía provas no Canadá e México) e que ajudaram a divulgar, os dois amigos também participaram numa nova modalidade que estava a surgir: os X Games, nos quais eram realizadas manobras radicais, algo em que Ken Block se destacou pelo domínio absoluto da máquina.

VISIONÁRIO

Visionário, Ken Block foi capaz de olhar para os ralis como forma de oferecer espetáculo a um público que –tal como ele – é apaixonado por automóveis e motores. Foi neste contexto que fez os seus dois primeiros filmes “Gymkhana”, em 2008 e 2009, ambos usando o seu fiel

Vida Sobre Rodas 14

“GO FAST, RISK EVERY THANG” (“VÁ RÁPIDO, ARRISQUE TUDO”): ESSE ERA O LEMA DE KEN BLOCK

Subaru Impreza WRX STi como “partner in crime”. O radical piloto, conhecido pela sua competitividade e por nunca desistir, acumulou cinco medalhas nos X Games (em que era um dos prediletos dos adeptos), incluindo três de prata (X Games 2007, X Games Los Angeles 2012 e X Games Munich 2013) e duas de bronze (logo na sua primeira participação nos X Games 2006, com o Subaru WRX STI, e nos X Games 2008). Destas participações que lhe valeram medalhas, a de 2012, em Los Angeles é épica: Ken Block, em Ford Fiesta RS WRC, terminou com apenas três rodas, já que a borracha do pneu traseiro direito se desprendeu da jante!

CONCEITO HOONIGAN

Em 2010, enquanto Pastrana foi fazer uma experiência na Nascar, Ken foi contratado pela Ford, que juntamente com a empresa de bebida energética Monster, investiu para tornar Ken uma estrela mundial em demonstrações de habilidades ao volante.

Ken abre, então, uma empresa para divulgar os seus projetos e peripécias: a Hoonigan Racing Division que, além de participar em competições, também dá continuidade à produção de vídeos de ação divulgados em canais de TV de conteúdo desportivo e, sobretudo, no YouTube.

Em 2010 é, assim, filmada a terceira “Gymkhana”, sendo a primeira com o Ford Fiesta de ralis.

Até 2018, Ken Block realizou mais sete vídeos “Gymkhana” (para um total de dez), sempre com a Ford (no 7º vídeo, Block guia um Ford Mustang 1965 com estética radical e com 865 cv, no 8º é usado um Fiesta RX43, na 9ª produção Block conduz um Focus RS e no 10º vídeo

podem ser vistos cinco veículos – Fiesta, Focus RS, Escort RS e Ford F150, de 1977).

Nasce, deste modo, a palavra “Hoonigan”, termo que o próprio Ken Block criou e que definia como “uma pessoa que opera um veículo a motor de maneira agressiva e pouco ortodoxa, mas não se limitando apenas a drifting, burnouts, donuts, incluindo também as famosas ações de ‘aeronáutica’ automóvel”.

Hoonigan também é uma marca de uma linha de vestuário que pretende destacar um estilo de vida daqueles que são apaixonados pelo automobilismo e demonstram essa paixão conduzindo os seus carros com um toque de rebeldia. Uma das máximas da Hoonigan, presente até nalgumas t-shirts, tem a inscrição “Kill all tires” (uma das preferiddas da autoDRIVE), uma sugestiva frase que remete para pneus queimados pela condução praticada.

Fundador e piloto da sua equipa de rali Hooningan Racing Division (anteriormente conhecida como Monster World Rally Team, devido ao patrocínio das bebidas Monster Energy), Block revolucionou o marketing dos desportos de ação e o cinema de desportos motorizados, sabendo aproveitar as redes sociais para dar espetáculo que nunca tinha estado acessível, tornando-se um ícone mundial dos desportos motorizados.

Além de astro nas pistas, o piloto fez aparições no mundo dos videogames, uma das quais em Need for Speed de 2015, onde os jogadores interagiam com o piloto e até podiam guiar o seu Ford Mustang Hoonicorn.

Fez ainda a promoção de DiRT 3, jogo de corridas desenvolvido pela produtora britânica Codemasters e lançado em 2011 para PlayStation 3, Windows e Xbox 360. Essa “promo” é um “show” visual, com o Fiesta de rali conduzido por Ken Block a contornar inúmeros obstáculos,

KEN BLOCK (1967-2023) 15

ALÉM DA SUA CARREIRA NO AUTOMOBILISMO, BLOCK INICIOU A SUA PRÓPRIA SÉRIE NO YOUTUBE CHAMADA “GYMKHANA”, QUE MOSTRAVA AS SUAS

HABILIDADES DE CONDUÇÃO, CARROS DE RALI PERSONALIZADOS, PISTAS PERIGOSAS E ROTAS CHEIAS DE OBSTÁCULOS

num cenário que faz parte de uma das fases da versão anterior do jogo, a fábrica termoelétrica desativada em Battersea, no bairro de Londres. Block também participou pelo menos duas vezes no programa Top Gear da BBC, em 2009 e em 2016, a última das quais incluindo uma incrível sequência de drifting com o “Hoonicorn” com muita borracha queimada de pneus, em Londres, com o ator Matt LeBlanc (da série “Friends”).

A franquia “Gymkhana” conquistou os fãs de automóveis no planeta, obtendo mais de 600 milhões de visualizações apenas no YouTube. Nos últimos anos, Block alargou o espírito das gincanas a outros terrenos, adicionando às suas franquias de vídeo a “Climbkhana” (que teve dois filmes, além de outros três com “Behind the scenes”) e a “Terrakhana” (um vídeo feito em que o mote era condução em grandes áreas de paisagens naturais), continuando com estes spinoffs de “Gymkhana” a atrair

novos entusiastas de todo o globo, graças às suas derrapagens supercontroladas em espaços apertadíssimos. A derradeira desta que seria uma nova franquia foi “Electrikhana”, para carros 100% elétricos e que teve apenas um episódio, aqui já com uma nova parceria com a Audi (terminada a ligação com a Ford em 2021), com Block aos comandos de um Audi S1 e-tron quattro Hoonitron, uma reinterpretação do lendário Audi Sport quattro S1, no qual, de resto, visualmente se baseia. No “Electrikhana”, e como era timbre quando o piloto apanhava um carro nas mãos, a diversão é suprema: o S1 Hoonitron (500 kW, ou 680 cv, e 640 Nm de binário) é posto a rodopiar e a fazer drifts pelas ruas, casinos e parques de estacionamento de Las Vegas, com Ken Block ao volante. Único! Este vídeo deveria ser o primeiro de um conjunto de outros que Block faria em conjunto com a Audi para divulgar veículos elétricos.

Vida Sobre Rodas 16

DUAS VEZES EM PORTUGAL

O contrato com a Ford (que vigorou durante 11 anos, de 2010 até 2021) também possibilitou a Ken Block realizar o sonho de participar nalgumas provas do Campeonato Mundial de Rali (WRC). Foi mesmo o primeiro piloto norte-americano a ser inscrito numa prova do mundial: foi no Rali de Portugal de 2011. As coisas, contudo, não correram bem, dado que ainda no shakedown, no reconhecimento do percurso, na zona de Faro, Ken Block teve de ser assistido no hospital, juntamente com o seu copiloto, Alex Gelsomino, após capotar com o Fiesta RS WRC. Os ferimentos foram ligeiros, Nessa temporada terminou em 8º (em França) e em 9º (no País de Gales), que lhe valeram 6 pontos na classificação geral individual do campeonato WRC.

Em 2013, Block foi 7º no Rali do México e em 2014 participou na penúltima prova do WRC dessa época, na Catalunha, onde terminou no 12º lugar. Apesar de ficar encantado com a habilidade de Ken em se adaptar facilmente ao comando do carro, Malcolm Wilson, chefe do M-Sport World Rally Team, que representava a Ford no campeonato, nunca viu em Ken Block um potencial campeão na competição. Eventualmente por entender que Ken era demasiado “Hoonigan” para se adaptar à disciplina que uma equipa exige.

Block, que foi também uma enorme força motora para o desenvolvimento dos ralis nos EUA e também com-

DESIGNAVA AS COREOGRAFIAS

QUE FAZIA AO VOLANTE

petiu em provas de rallycross e drifting e corridas de montanha, fez em 2016, a sua segunda passagem por Portugal para disputar a prova inaugural do Campeonato Mundial de Rallycross (WRX), realizada no Circuito Internacional de Montalegre.

Em 2022, Ken Block disputou o American Rally Association Championship ao lado da sua mulher, Lucy, e da sua filha de 16 anos, Lia. “Este ano, Ken estava tão feliz. Nas corridas, ele estava feliz por correr com Lucy e por ter a sua filha a correr e por ter os seus filhos na maioria das corridas”, afirmrou Travis Pastrana à ESPN. “Poucas pessoas chegam ao ponto nas suas vidas em que tudo se encaixa, e ter tudo levado assim é ainda mais devastador”.

“Go fast, risk every thang” (“Vá rápido, arrisque tudo”): esse era o lema de Ken Block que, numa entrevista em 2019 ao Henry Ford Museum of American Innovation, afirmou que as suas manobras e acrobacias ao volante eram uma grande fonte de alegria na sua vida, mas “trazer a criatividade do skate e do snowboard para o mundo automóvel, provavelmente, foi o mais divertido para mim, e esse lado criativo é, talvez, aquilo que mais me lembrarei.”

Com a sua morte, não haverá mais a magia de pneus derretidos a chiar “made by Block”. Resta a esperança que Travis Pastrana possa prosseguir o seu legado nas gincanas. Mas, no fundo, todos sabemos que nunca haverá outro “Hoonigan” como Ken Block, que deixou também uma mulher e três filhos. //

“AÇÕES DE ‘AERONÁUTICA’ AUTOMÓVEL”: ERA ASSIM QUE BLOCK
KEN BLOCK (1967-2023) 17

Honda Civic Type R

ESTE É O ÚLTIMO CIVIC TYPE R, PELO MENOS TAL COMO O CONHECEMOS. A HONDA NÃO ANUNCIOU O QUE VAI FAZER DO SEU DESPORTIVO DE TRAÇÃO À FRENTE NO

FUTURO, MAS O MAIS CERTO É SER HÍBRIDO. ASSIM, PARA UMA DESPEDIDA EM GRANDE FOMOS CONHECÊ-LO NO AUTÓDROMO DO ESTORIL E PELAS BELAS ESTRADAS DA ZONA OESTE

Um dia perfeito pode começar assim: tempo frio mas seco, o sol a brilhar, um dos novos Civic Type R parado à minha espera no “pit lane” do Autódromo do Estoril e a pista só para mim durante 45 minutos. Única condição imposta pela Honda foi ser acompanhado por um instrutor profissional, com a promessa de estar sentado a meu lado para ajudar e não para me obrigar a andar mais devagar; pelo contrário, a ideia é ajudar-me a ser mais rápido e explorar ao máximo o potencial do novo Type R FL5. Gosto! Numa troca de palavras de circunstância, confirmo só que conheço bem a pista, onde testei e competi em dezenas de carros ao longo de trinta anos, e arrancamos para o meu “slot” logo com o modo +R ligado, para não perder tempo com detalhes. Embraiagem muito civilizada, caixa manual de seis com o comando ainda mais rápido e suave do que na geração anterior e um motor que ronrona tranquilamente ao longo das boxes até entrar em pista. As primeiras curvas feitas com cautela, para dar hipotese aos Michelin Pilot Sport 4S (que desceram de 20” para 19” com medida 265/30 R19) de ganharem alguma temperatura, aproveitando também para perceber o ponto de ataque dos travões.

A direção, que tem uma coluna seis vezes mais rígida (para mais precisão e transmitir maior sensação de solidez ao condutor) e uma nova assistência elétrica mais rápida, mostra precisão cirúrgica desde as primeiras curvas e uma perfeita relação esforço/ efeito. O volante forrado a alcantara tem uma pega excelente e está perto da vertical, enquanto os bancos são bastante envolventes, o que faz desta uma

das melhores posições de condução desportivas do segmento, e ainda mais baixa do que antes. Saio da curva VIP em segunda e acelero a fundo na reta interior até as “shift-lights” passarem de amarelo a vermelho. Logo a seguir o mesmo para a terceira velocidade e a quarta chega perto do limite quando atingo a zona de travagem e tenho que carregar forte no pedal do meio. Em pista, o motor 2.0 turbo, que subiu apenas 9 cv, para os 329 cv e tem mais 20 Nm, atingindo agora os 420 Nm às 2200 rpm, é usado constantemente nos regimes mais altos. Mas sente-se que o faz com enorme facilidade, com uma margem de segurança que faz adivinhar a tradicional longevidade dos motores Honda. É o mesmo motor do FK8, ainda não levou nenhuma ajuda híbrida, é um motor “puro” e tradicional que os engenheiros apuraram ainda um pouco mais. São detalhes, mas que contam, como a redução do número de lâminas da turbina, que têm uma nova forma, aumentando a eficiência em 3% e reduzindo a inércia em 14%; o estudo da eficiência das turbinas foi algo que os engenheiros do motor de F1 trabalharam muito para tornar o motor Honda a força que é hoje. Foi também aumentado o caudal de ar de admissão em 10% e o intercooler é mais permeável. O radiador é maior, o fluxo no escape aumentou 13% e o CPU foi reprogramado. Em resumo, sobe de regime até às 7000 rpm com uma facilidade que nem parece ser turbocomprimido. A Honda anuncia os 0-100 km/h em 5,4 segundos e uma velocidade máxima de 275 km/h. A reta da meta do Estoril não chega para mais do que 220 km/h.

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Texto — Francisco Mota Fotos — Manuel Portugal

O MOTOR 2.0 TURBO, QUE SUBIU APENAS 9 CV, PARA OS 329 CV, E TEM MAIS

20 NM, ATINGINDO OS 420 NM ÀS 2200 RPM, EM PISTA É SEMPRE USADO ACIMA

DAS 3500/4000 RPM. MAS SENTE-SE QUE O FAZ COM ENORME FACILIDADE

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O CHASSIS DE BASE É O MESMO DO FK8, MAS COM A SUSPENSÃO

VAMOS AO ATAQUE!

Termino a primeira volta com uma boa radiografia do estado da pista e daquilo com que posso contar no Type R. Aumento de imediato o ritmo, com o instrutor a incentivar-me para o fazer e dando algumas sugestões úteis, de quem conhece o carro muito melhor do que eu: usar a terceira velocidade em vez da segunda em duas curvas e confiar no binário para uma extração rápida e eficaz. Resulta!

A subir ou a descer, as passagens de caixa são sempre um gozo, ora deixando o “rev-matching” fazer o seu ponta-tacão eletrónico (agora também o faz nas reduções de 2ª para 1ª), ou fazendo-o eu, só pelo gozo de ouvir o som do motor, parte do qual vem de um sintetizador, pelos altifalantes. Mas a redução de massa do volante-motor em 18%, que levou a uma descida de 25% na sua inércia, é que permite fazer as passagens com tanta rapidez e fluidez.

A atitude em curva é aquilo que esperava. Uma in-

serção na trajetória extrememente rigorosa e com muita informação a chegar às mãos, caso seja preciso fazer correções. Os pneus da frente começam por resistir muito bem à subviragem, mesmo se a pressão de uma sessão de condução em pista com hora para acabar me faz levar o esforço demasiado longe, por vezes, com entradas em curva demasiado rápidas. A inclinação lateral em curva é mínima, com um comportamento muito estável e milimetricamente controlado. A suspensão foi modificada face à anterior geração FK8 do Type R. A suspensão traseira multibraço é nova e na da frente há mais camber negativo, para termos mais área de contacto (e aderência) em apoio. As vias foram alargadas em 26mm, na frente, e 20mm, atrás, e a distância entre-eixos aumentou 35 mm. Os amortecedores variáveis foram recalibrados e o centro de gravidade desceu uns milímetros; aquela evolução incremental tão do agrado dos japoneses. Apesar de o meu instrutor me aconselhar a não pisar muito os corretores mais altos, que instabilizam

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REVISTA (NOVO EIXO) TRASEIRO, NOVO AMORTECIMENTO E TRABALHADO PARA PROPORCIONAR UM REGISTO DE CONDUÇÃO AINDA MAIS PRECISO E EFICAZ; QUEDAS DE RECORDES AGUARDAM-SE…

A DIREÇÃO, QUE TEM UMA COLUNA SEIS VEZES MAIS RÍGIDA

E UMA

um pouco o Type R, acabo por inadvertidamente o fazer, sentindo a maneira como o Civic reage em bloco a estas trepidações mais violentas. A rigidez estrutural subiu 15% nesta geração FL5, apesar de a plataforma ser a mesma. O segredo está na aplicação de 3,8 vezes mais adesivo estruturais, nome pomposo para cola. Nunca é fácil sentir a aerodinâmica a funcionar num carro de turismo, em que atingimos muito mais depressa o limite dos pneus do que da “downforce”. Mas, apesar de a asa traseira ser muito mais discreta do que a do FK8, a verdade é que o apoio aumentou e agora chega aos 90 kg, à velocidade máxima.

As primeiras voltas mostraram que o novo Civic Type R aposta tudo na eficiência. Percebe-se que o seu objetivo é ser o tração à frente mais rápido do mercado e, por isso, não é o tipo de carro para brindar o condutor com grandes derivas de traseira, quando provocado. A rotação para entrar em curva é liderada pelos limites da suspensão dianteira de pivot descentrado, não pelas liberdades atribuídas à

suspensão traseira. Aqui há pouco lugar para malabirismos, sendo mais compensador adoptar uma condução “limpa” e usar a estabilidade da traseira para dar mais confiança na inscrição em travagem e carregar velocidade. Com o passar das voltas, claro que os pneus da frente começam a perder um pouco daquela aderência que tinham nas primeiras duas voltas, mas isso apenas obriga a ser um pouco mais paciente na altura de voltar ao pedal da direita. Uma coisa é certa, o autoblocante faz o seu trabalho e garante uma tração perfeita, mesmo na difícil saída da chicane do Estoril.

Aliás, no fim da sessão, uma inspeção dos pneus mostrou um desgaste muito uniforme, sem degradação nos ombros. A meio do meu “slot”, o instrutor aconselhou a fazer uma volta para arrefecer os pneus e, sobretudo, os travões. Após vinte minutos a fundo, o pedal começou a ficar um pouco mais macio na violenta travagem do fim da reta da meta, apesar de o arrefecimento dos discos ter sido aumentado. Nada de preocupante, apenas a exigir mais força.

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NOVA ASSISTÊNCIA ELÉTRICA MAIS RÁPIDA, MOSTRA PRECISÃO CIRÚRGICA DESDE AS PRIMEIRAS CURVAS, BEM COMO UMA PERFEITA RELAÇÃO ENTRE ESFORÇO E EFEITO

EM ESTRADAS SECUNDÁRIAS, COM MENOS TRÂNSITO, CURVAS EXIGENTES, MAS PISO IMPERFEITO, A SUSPENSÃO MOSTROU-SE

POUCO TOLERANTE. EM MODO SPORT, O AMORTECIMENTO FICA

MUITO FORTE, TANTO EM COMPRESSÃO COMO EM EXTENSÃO

AINDA MAIS RADICAL

No final deste “treino” com direito a “coaching” de um profissional que sabia o que estava a fazer, a conclusão que fica é a de que o Civic Type R está ainda mais adaptado a uma condução exigente e intensiva em pista, sem destruir os pneus, nem perder performance de forma significativa. Depois há o LogR, um sistema de telemetria com imensa informação para estudar entre duas sessões de condução em pista, com items que só poderiam surgir num carro japonês, como a referente ao “Tyre Friction Circle”, que dá uma medida de como se estão a usar os pneus: ou bem, ou mal...

O gozo que se tira da condução em pista vem da precisão com que este FL5 lida com as ordens do condutor e da maneira como as transmite à pista para avançar o mais eficientemente possível. O motor agrada pela resposta imediata e aptidão em rodar nos regimes mais altos; e a direção pela rapidez, precisão e comunicação. Só faltava ver como o Civic Type R se comportava na estrada.

O dia perfeito em pista tornou-se num quebra-cabeças quando passei para a estrada. Mesmo no percurso aconselhado pela Honda, por estradas nacionais da zona Oeste, há algo que não se consegue mudar num país como o nosso: o final da manhã de um domingo solarengo faz todos os caracóis sairem

para a rua. Guiado em ritmo de passeio, foi possível tirar algumas conclusões de outro tipo de utilização. Tanto o motor como a caixa e a embraiagem se mostraram perfeitamente aptas a uma condução diária, com toda a facilidade e suavidade de um familiar que continua a ser muito espaçoso. E com um ambiente interior vincadamente desportivo. E claro que, apesar de manter a mesma plataforma do modelo anterior, o estilo é muito mais discreto, sem perder um visual desportivo de que ninguém duvida. No modo Comfort e com piso em muito bom estado, o Type R sente-se firme, mas não muito desconfortável, percebendo-se que os amortecedores estão a trabalhar para o conforto. A fina e alta asa traseira em nada dificulta a visibilidade para trás. O ruído de rolamento é muito baixo e o aerodinâmico também: por outras palavras, o Type R faz percursos de IP, IC e autoestrada sem incómodos.

MAS ABANA EM MAU PISO

Porém, em estradas secundárias, com menos trânsito, curvas exigentes e piso imperfeito, a suspensão mostrou-se pouco tolerante. Em modo Sport, o amortecimento fica muito forte, tanto em compressão como em extensão, não deixando as rodas processar os altos e baixos da estrada e tornando a condução nervosa. Pior ainda em modo +R, que sobe

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ao terceiro nível de amortecimento.

Voltei ao modo Comfort e a situação melhorou um pouco, até porque a direção fica demasiado pesada em Sport. O melhor mesmo é usar o novo modo Individual, que permite acertar seis parâmetros ao gosto do condutor. A suspensão nunca deixa de ser muito amortecida, mas a verdade é que também não chega ao final do curso.

Em bom piso, ou melhor, em excelente piso, o Type R tem a mesma atitude que vi em pista, muito eficiente, claramente sobredotado. Mas as oportunidades de usar o motor em toda a sua gama de regimes são poucas. Mais vale surfar a curva de binário e reduzir o nervosismo da condução.

A quota de unidades do novo Type R para Portugal é de dez e já estão todas vendidas há muito tempo. O importador terá mais vinte clientes em lista de espera, mas não sabe se os vai poder satisfazer. E isto, apesar de uma subida colossal do preço, que passou dos 52 190 euros para os 69 500 euros: é a Honda a aproveitar que o FL5 será o último da sua espécie, para aumentar os lucros. Espertos!

Em resumo, nesta última geração do Civic Type R a seguir o conceito convencional, sem nenhum sistema híbrido, a geração FL5 ficou mais radical que a FK8. Muito eficiente em pista (a Honda diz que é o tração à frente capaz de gerar mais aceleração lateral), mas menos utilizável quando a estrada não é perfeita, devido a uma suspensão muito firme. Enfim, se é para celebrar o final de uma era que seja memorável e com um mínimo de compromissos! //

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo 4 cilindros em linha, transversal dianteiro, injeção direta, turbo e intercooler, 2 vec, 16 válvulas, comp. 9,8:1

Cilindrada 1996 cc (86 x 85,9 mm)

Potência 329 cv/6500 rpm

Binário 420 Nm/2200~4000 rpm

TRANSMISSÃO

Tração dianteira, autoblocante

Caixa de velocidades manual de 6 vel.

CARROÇARIA/CHASSIS

Monobloco em aço Suspensão McPherson, pivot descentrado, à frente, e multibraço, atrás. Amortecimento variável de três estágios

DIREÇÃO

Pinhão e cremalheira, assistência elétrica Diâmetro de viragem 12,1 m

TRAVAGEM

Discos ventilados de 350 mm à frente Discos sólidos de 305 mm atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4594 mm

Largura 1890 mm

Altura 1407 mm

Distância entre-eixos 2735 mm

Peso 1429 kg

Mala 410 a 1212 litros

Depósito 47 litros

Pneus 265/30 R19

PRESTAÇÕES

Relação peso/potência 4,34 kg/cv

Velocidade máxima 275 km/h

Aceleração 0-100 km/h 5,4 segundos

CONSUMOS

Combinado 8,2 l/100 km

Emissões 186 CO2 g/100 km

PREÇO 69 500 euros

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE

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Peugeot 408

Plug-In Hybrid 225 e-EAT8

A SÉRIE 4 DOS MODELOS PEUGEOT ESTÁ DE REGRESSO.

MAS O OBJETIVO A ATINGIR AGORA É OUTRO: INOVADOR

NA ABORDAGEM ESTILISTA E COM UMA GRANDE APOSTA

NAS MOTORIZAÇÕES ELETRIFICADAS, O NOVO PEUGEOT

408 PROMETE, PELO MENOS, CATIVAR TODAS OS OLHARES

POR ONDE PASSE. JÁ O CONDUZIMOS. SAIBA TUDO!

O novo Peugeot 408 não pretende ser apenas mais uma proposta da marca do leão para o muito importante segmento C que já lidera. Pretende, sim, ser uma alternativa mais emocional ao 308 e ao seu irmão SUV, o 3008, mas posicionando-se no topo do segmento, e os responsáveis da marca não escondem que podem até assim conseguir conquistar alguns clientes da categoria imediatamente acima, campeonato onde a Peugeot joga com o 508. E para o conseguir, o novo 408 aposta numa silhueta inédita na Peugeot e que quer romper com a atual tendência SUV do segmento, a de um dinâmico, mas igualmente elegante, “fastback-SUV coupé” ou o que lhe queiramos chamar.

As ambições dos responsáveis da marca francesa são grandes, mas também os argumentos do novo 408 não nos passaram despercebidos neste primeiro contacto dinâmico na região de Barcelona. Impactante à primeira vista, o 408 destaca-se pela irreverência adicional conseguida pelo seu invulgar formato de carroçaria, bem como por uma postura parcialmente inspirada no conceito SUV, patente nas proteções da carroçaria, bem como numa altura livre ao solo de 188 milímetros. Porém, se é a traseira que mais define este tal formato fastback, a frente salta à vista pela imponente grelha, pintada no mesmo tom da carroçaria e que transmite uma original sensação de movimento, ainda que estática. Também a iluminação dianteira com faróis ultrafinos – possíveis devido à tecnologia Matrix LED – contribui para o imenso carácter do 408, com a assina-

tura de luz a prolongar-se ao pára-choques através de tiras de LED em forma de presas. A carroçaria do 408 destaca-se, ainda, pelo desempenho aerodinâmico, onde as “orelhas de gato” na zona posterior do tejadilho são responsáveis por guiar o ar até ao spoiler traseiro, elementos que são funcionais, mas também, assumidamente, de estilo.

MOTORES A GASOLINA E HÍBRIDOS! 100% ELÉTRICO CHEGA MAIS TARDE

Até se dar a chegada, já confirmada, da sua versão 100% elétrica e apesar de estar disponível com o motor 1.2 PureTech, a gasolina, de 130 cavalos, a grande aposta ao nível das motorizações são, sem dúvida, os dois propulsores híbridos recarregáveis, com 180 e 225 cavalos. Embora os responsáveis da marca reconheçam a importância e a provável maior expressão da primeira e menos potente versão no mercado nacional, foi com a última e mais potente da gama que tomámos contacto nos cerca de 100 quilómetros que nos foram propostos para esta primeira experiência ao volante. A Peugeot irá propor pelo menos uma versão eletrificada de cada um dos seus modelos até ao final de 2023 e assume o compromisso de apenas comercializar veículos puramente elétricos na Europa em 2030, o que justifica esta grande aposta nas versões híbridas do novo e inédito 408.

New Drive 24 ,
Texto — João Isaac

A MOTORIZAÇÃO HÍBRIDA PLUG-IN DE 180 CAVALOS DEVERÁ SER A DE MAIOR EXPRESSÃO COMERCIAL NO MERCADO PORTUGUÊS, DISPONÍVEL A PARTIR DE 44 600 € QUANDO ASSOCIADA AO NÍVEL DE EQUIPAMENTO ALLURE. UMA MOTORIZAÇÃO 100% ELÉTRICA TAMBÉM JÁ FOI CONFIRMADA PELA MARCA

PEUGEOT 408 25

A LONGA DISTÂNCIA ENTRE EIXOS DE 2.787

MILÍMETROS É GARANTIA DE

MUITO ESPAÇO LIVRE NO BANCO TRASEIRO PARA AS PERNAS DOS PASSAGEIROS. JÁ A SILHUETA FASTBACK LIMITA OS CENTÍMETROS LIVRES EM ALTURA PARA QUEM ALI DECIDIR VIAJAR

PRIMEIRAS SENSAÇÕES AO VOLANTE

O percurso de teste iniciou-se com uma primeira etapa maioritariamente feita em autoestrada, quilómetros onde nos apercebemos do quão bom rolador o 408 sabe ser. Confortável, refinado e bem insonorizado – vidros duplos à frente ajudam - o fastback da Peugeot proporciona, do ponto de vista do condutor e do passageiro da frente, uma experiência muito idêntica à do 308, algo que é, na verdade, uma boa notícia. Desde logo pela sensação de qualidade transmitida pelos materiais empregues, mas acima de tudo pelo ambiente moderno e digital providenciado pelo i-cockpit da Peugeot, um conceito sobre o qual já muito foi dito devido à estranha combinação de um volante compacto e com um painel de instrumentos posicionado acima deste, mas que, segundo a marca, já convenceu 9 milhões de utilizadores desde a sua introdução há dez anos. E segundo nos confidenciaram, quem adere já não quer outra coisa. O evoluído sistema de infoentretenimento é, igualmente, idên-

tico ao estreado pela mais recente geração 308 e recorre, também, aos i-toggles configuráveis, botões virtuais que podem ser personalizados como atalhos sensíveis ao toque para aceder às diversas funções oferecidas. Também os sistemas de segurança, como o regulador de velocidade adaptativo, a tecnologia de visão noturna, o assistente ativo de manutenção na faixa de rodagem com correção da direção, o reconhecimento alargado de sinais de trânsito, bem como os alertas de ângulo morto e de tráfego traseiro são destaque no 408, alimentados pela informação proveniente de seis câmaras e nove radares.

ATRÁS, MUITO ESPAÇO PARA PERNAS, MAS MENOS PARA A CABEÇA

Se à frente as boas sensações são partilhadas, como referido, com o 308, as diferenças são mais notórias nos lugares traseiros, onde os passageiros podem beneficiar da superior distância entre eixos do novo 408

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COM O DESIGN DINÂMICO DESTA INÉDITA SILHUETA FASTBACK, A PEUGEOT PRETENDE, NÃO SÓ, CIMENTAR A SUA LIDERANÇA NO SEGMENTO C, COMO, POSICIONANDO O NOVO 408 NO TOPO DESTE, CONQUISTAR ALGUNS CLIENTES DO SEGMENTO IMEDIATAMENTE ACIMA

- com 2.787 milímetros, supera em 55 milímetros a de um 308 SW, ficando apenas aquém da de um DS 9 com quem também partilha a plataforma EMP2através do muito espaço livre disponível para os joelhos, algo facilmente comprovável ao aceder ao banco de trás. Por outro lado, o perfil fastback assumido, com uma linha de tejadilho descendente e um vidro traseiro que por pouco não está colocado totalmente na horizontal, significa que o espaço disponível para a cabeça no banco traseiro é algo limitado para os ocupantes mais altos, bem como que a visibilidade traseira sai também prejudicada. Ainda assim, apesar do carácter mais desportivo e emocional do 408, o novo fastback da Peugeot consegue, nesta versão híbrida plug-in, oferecer uma bagageira com 471 litros de volume, um valor bastante bom, ainda que seja 65 litros inferior ao da versão puramente a combustão. Deixámos para trás a serenidade das autoestradas e levámos o 408 a um traçado mais exigente do ponto de vista da dinâmica. É verdade que, apesar das constantes curvas e contracurvas do belíssimo percurso, nunca encontrámos asfalto suficientemente degra-

dado que pudesse desequilibrar o chassis do 408 em situações de maior apoio e exigência, mas regressámos impressionados pela sua estabilidade e desempenho em curva, suportados pelas vias largas, por uma direção rápida e, acima de tudo, por um amortecimento bem julgado, capaz de oferecer o indispensável conforto acima referido, bem como o controlo que se espera num modelo com estas aspirações de posicionamento e potência oferecida, conseguindo-o sem recorrer a uma suspensão variável.

GAMA E PREÇOS

Quanto a consumos, não nos foi possível, para já, realizar um teste à autonomia elétrica, mas a Peugeot declara que é possível percorrer 64 quilómetros com uma carga da bateria de 12,4 kWh e 100 kW de potência. Relativamente às possibilidades de carregamento, o 408 está equipado, de série, com um carregador de bordo de 3,7 kW, estando um de 7,4 kW, também monofásico, disponível como opção. Com

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esta opção mais potente, e através de uma wallbox de igual potência, a bateria pode ser carregada em uma hora e quarenta minutos. Já no que diz respeito à gama nacional 408, esta compreende três níveis de equipamento, Allure, Allure Pack e GT, cujos preços se iniciam, respetivamente, nos 35 800€, 37 450€ e 40 250€. As motorizações híbridas estão disponíveis a partir de 44 600€e o topo de gama GT que conduzimos, com motorização de 225 cavalos, tem um preço base de 50 150€. As primeiras unidades do novo Peugeot 408 chegam a Portugal ainda durante o mês de dezembro do ano passado.

O novo Peugeot 408 revelou, nesta primeira oportunidade de nos colocarmos ao volante, uma muito interessante dupla personalidade, revelada a vários níveis. Sabe ser um bom estradista, mas não se importa de mostrar um lado mais dinâmico e emocional. Dispõe de uma motorização eficiente que é, também, potente. Mas, acima de tudo, é um modelo que pretende cativar por um visual diferente e, segundo a marca, inesperado, mas que mantém, igualmente, intactas, ou inclusivamente melhoradas, as sempre indispensáveis capacidades familiares que se esperam encontrar num modelo de segmento C. //

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo 4 cilindros em linha, 1.598 cc, em posição dianteira, transversal, com injeção direta de gasolina, turbocompressor + motor elétrico

Potência 180 cv às 6.000 rpm

Binário 250 Nm às 1.750 rpm

Motor elétrico integrado na caixa de velocidades com 110 cv e 320 Nm

Potência combinada 225 cv

TRANSMISSÃO

Tração dianteira

Caixa automática de 8 velocidades e-EAT8

CARROÇARIA/CHASSIS

Monobloco em aço

MacPherson à frente e eixo de torção atrás

DIREÇÃO

Pinhão e cremalheira de assistência elétrica

TRAVAGEM

Discos dianteiros ventilados

Discos ventilados

DIMENSÕES

Comprimento 4687 mm

Largura 2062 mm

Altura 1478 mm

Distância entre-eixos 2787 mm

Peso 1706 kg

Mala 471 litros, ou 454 litros com sistema de som Focal opcional

Depósito 40 litros

Pneus 205/55 R19

PRESTAÇÕES Velocidade máxima 233 km/h (135 km/h em modo elétrico)

Aceleração 0-100 km/h 7,9 segundos

CONSUMOS WLTP

Combinado 1,2-1,3 l/100 km

Emissões 24-30 g/km

PREÇO a partir de 42 800 euros

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE

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QUILÓMETROS ELÉTRICOS”
UMA CARGA DA BATERIA DE 12,4 KWH E 100 KW DE POTÊNCIA
A PEUGEOT DECLARA QUE É POSSÍVEL PERCORRER “64
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seat.pt

Cupra Leon

E-TSI 150 CV DSG

TAL COMO NO FORMENTOR, O MOTOR 1.5 TSI DE 150 CV PASSA A ESTAR DISPONÍVEL NO CUPRA LEON, CRIANDO

ASSIM O MODELO MAIS ACESSÍVEL DA MARCA, COM UM PREÇO DE ENTRADA ABAIXO DE 34 000€ NO 5 PORTAS E POUCO MAIS DE 35 300€ NA CARRINHA

A Cupra está a ser um dos raros casos (recentes) de sucesso na criação de uma nova marca automóvel, e uma das razões está nos seus valores e na capacidade de os carros cumprirem essa promessa, pelo que está na altura certa para tornar o acesso aos estilo de vida Cupra menos oneroso. O novo Cupra Leon 1.5 TSI e 1.5 eTSI de 150 cv vem ocupar esse espaço e tem a responsabilidade de ser a porta de entrada às sensações Cupra. De uma forma inteligente, e sem descurar o seu rumo via à eletrificação (que até inclui uma parceria com um dos maiores fabricantes de carrinhos elétricos do Mundo, a Scalextrix, já que é preciso que os jovens brinquem com Cupra para, em adultos, aspirarem a ter um), a administração da Cupra compreende que até 2035 há muito dinheiro para ganhar nos carros a combustão, sobretudo nos segmentos mais acessíveis; 63% das vendas Cupra são de veículos a combustão pura, com a gasolina a dominar claramente.

SEM CONCORRÊNCIA

E o novo Cupra Leon encaixa, precisamente, numa faixa de mercado que tem vindo a ser abandonada por todos os outros construtores, a dos compactos familiares a combustão de aparência e condução desportiva, onde acaba por estar, virtualmente, sozinho; não se encontra em nenhum outro configurador a mesma combinação de potência, desempenho, versatilidade, imagem e comportamento do Cupra Leon 1.5 TSI e 1.5 eTSI. E se juntarmos à lista de especificações desejadas a carroçaria carrinha, então, ainda é mais complicado arranjar uma correspondência; era, porque o Leon Cupra também está disponível com a carroçaria Sportstourer. Grande parte do apelo do Cupra Leon está no visual e nos equipamentos tecnológicos equivalentes aos das

versões mais potentes, os VZ. Em concreto, a característica pintura mate está disponível em opção, assim como os bancos estilo baquet em pele (de série vem com os bancos Sport em pele e tecido) e as jantes de 18” maquinadas com o visual Black & Cooper (de série são as maquinadas Black & Silver). No habitáculo contamos com o cockpit virtual 10,25”, pedais em alumínio, sistema de infotainment com ecrã tátil (o de 12” é opção), a iluminação envolvente de cor selecionável e decoração típica da Cupra. Já no que respeita à tecnologia e segurança, o Cupra Leon conta com as normais assistências à condução, com destaque para os faróis Active Led que permitem manter sempre os máximos ligados, bem como o feixe de luz apontado a placas de informação e/ ou possíveis obstáculos: peões; ciclistas...

ASSINATURA CUPRA

A versão que estamos a conduzir é a de caixa DSG7 de dupla embraiagem. A opção pela caixa DSG implica que o motor 1.5 turbo é a especificação eTSI com hibridização ligeira; basicamente, um alternador mais potente que permite desligar o motor em desaceleração e voltar a ligar quando se volta a acelerar. Com os seus 150 cv, consegue conciliar prestações suficientes para ser divertido com facilidade e conforto de condução. E o comportamento dinâmico alinha pela mesma bitola. Sem a garra das versões VZ, como é normal, o Cupra Leon é envolvente, preciso e controlado na forma como aborda a estrada e descreve as curvas, ao mesmo tempo que conserva a suavidade e o conforto de rolamento desejáveis num carro que faz o dia a dia do serviço familiar. Esta unidade está equipada com a suspensão com amortecimento variável adaptativo opcional, alargando ainda mais o leque das virtudes da suavidade e

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Texto — Pedro Silva

O CUPRA LEON PASSA A SER A PORTA DE ENTRADA NAS SENSAÇÕES CUPRA. ESTÁ DISPONÍVEL EM CARROÇARIA DE 5 PORTAS E SPORTSTOURER, A PARTIR DE, RESPETIVAMENTE, 33 937€ E 34 372€

CUPR LEON E-TSI 31

COM CAIXA MANUAL OS 0 A 100 KM/H

SÃO CUMPRIDOS EM 8,9 S, SENDO QUE

COM A CAIXA DSG ESSE TEMPO BAIXA

PARA OS 8,7 S. AS EMISSÕES DE CO2 VARIAM DE 127 A 144 G/KM

controlo em função do modo de condução selecionado. E, por falar nisso, nesta versão 1.5 o Cupra Leon não permite desligar o ESP, tendo apenas a função ESP Sport que deixa alguma margem de escorregamento, mas, em contrapartida, oferece o modo de condução Cupra entre os disponíveis e a caixa DSG possui um verdadeiro modo manual sequencial, no qual as patilhas no volante (de série) autorizam boa dose de autoridade ao condutor; as passagens para a mudança seguinte ainda acontecem automaticamente quando se atinge o regime máximo, mas quando temos o seletor em M podemos explorar o binário a baixo regime; o kick down só entra quando se força o acelerador para lá do ponto de resistência.

Em suma, o Cupra Leon tem tudo para continuar a expandir o sucesso da marca de Barcelona, pois representa uma proposta muito completa para quem precisa de um “faz tudo”, mas não quer abdicar de ter um carro “boa pinta”, capaz de oferecer alguma emoção ao volante e com consumos razoáveis; médias de 7 l/100 km. A única dúvida é se devemos comprar com caixa DSG ou manual; se for para ter o máximo de prazer e poupar cerca de 2400€, o manual é melhor opção.

Por fim, só por curiosidade, noutros mercados, incluindo o espanhol, também está disponível a motorização

2.0 TSI de 190 cv com caixa DSG. A razão de não termos esta opção em Portugal está nos nossos impostos, que não permitem obter uma relação preço/potência racional face aos Cupra Leon VZ com motorizações mais potentes, precisamente o inverso do que se passa do lado de lá da fronteira; a diferença entre o Cupra Leon 1.5 eTSI 150 DSG e o 2.0 TSI 190 DSG não chega a 1000 euros! //

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo Quatro cilindros em linha a gasolina, injeção direta, quatro válvulas por cilindro, turbocompressor

Cilindrada: 1498 cc (74,5 x 85,9 mm)

Potência 150 cv às 5000~6000 rpm

Binário 250 Nm das 1500~3000 rpm

TRANSMISSÃO

Tração dianteira Caixa automática de seis relações

CARROÇARIA/CHASSIS

Monobloco em aço

Suspensão MacPherson, à frente e multibraços, atrás

DIREÇÃO

Pinhão e cremalheira com assistência elétrica variável

TRAVAGEM

Discos ventilados de 288 mm à frente Discos sólidos de 272 mm atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4398 mm

Largura 1799 mm

Altura 1442 mm

Distância entre eixos 2683 mm

Peso 1395 kg

Mala 380 litros

Depósito 45 litros

Pneus 225/40 R18

PRESTAÇÕES

Velocidade 214 km/h

Aceleração 8,7 segundos

CONSUMOS/AUTONOMIA (WLTP)

Combinado 6,0 l/100 km

Emissões 136 g/100 km

PREÇO

A partir de 36 289 c/ caixa DSG

New Drive 32 AVALIAÇÃO
AUTO DRIVE

A GRANDE NOVIDADE DO RENOVADO DS3 É O NOVO CONJUNTO MOTOR BATERIA DA VERSÃO E-TENSE, COM

O PRIMEIRO A SUBIR A POTÊNCIA PARA OS 156 CV E A SEGUNDA A AUTORIZAR ATÉ 404 KM DE AUTONOMIA

Depois da renovação do DS7, o “best seller da marca”, que aconteceu ainda antes do verão do ano passado, o DS3, que representa cerca um quarto das vendas, era o único carro da marca que ainda não apresentava a nova face DS, pelo que chegou agora a sua vez. Para além da renovação estética, que também passou pelos interiores, com novos padrões e cores, a estreia de uma opção de pintura tricamada, única no segmento, e uma atualização do infotainment para o padrão atual da restante gama (ecrã maior, com melhor definição, software mais rápido e uma conetividade ampliada/simplificada), a grande novidade do renovado DS3 está no novo módulo de propulsão elétrica, mais potente e com mais autonomia.

O motor de 156 cv de potência em pico (durante 10 segundos consecutivos) e 260 Nm de binário é fabricado em França pela EMOTORS, uma subsidiária da Stellantis/PSA. O motor utiliza seis polos e o enrolamento de cobre no rotor é do tipo Hairpin Winding (como, por exemplo, no Porsche Taycan), ou seja, em vez de múltiplos fios de cobre de secção muito fina é usado um fio de vários mm de grossura (cerca de 2/3 mm) com secção quadrada. Isto permite várias vantagens, das quais as mais significativas são a maior densidade de potência (é possível colocar entre 20 a 30% mais de cobre no mesmo volume), a melhor dissipação de calor, o menor ruído eletrostático e, muito importante, maior facilidade de produção por máquina com a redução dos custos. Para a aplicação no DS3, conseguimos saber que o novo motor atinge um regime máximo de 10 000 rpm, mas tem potencial para crescer. A nova bateria de 102 células, distribuídas por 17 módulos, viu a sua capacidade bruta aumentada para 54 kWh graças a um ganho de 10% na densidade energética, ganho esse conseguido com a utilização de uma liga melhora para os elétrodos, o NMC811; 80% níquel, 10% manganês e 10% cobalto. Com o carregador embarcado de 11 kW carrega de 0 a 100% em 5h45m

numa Wall Box e tem uma potência máxima de carregamento rápido de até 100 kW, o que permite ir de 10 a 80% em 30 minutos. A autonomia homologada em ciclo misto WLTP passou assim dos 360 para os 404 km, valor mais do que adequado a um utilitário.

É BOM, MAS PESADO

Mal nos sentamos ao volante, que permanece de diâmetro correto e boa pega, notamos que os comandos do infotainment e das assistências à condução estão lá integrados, bem como se torna evidente o design retocado da consola central e o ecrã de infotainment de 10,3”, com leitura muito mais cristalina. A condução e a performance do novo motor de 156 cv são, respetivamente, fácil e disponível (sem ser brilhante), mas o peso extra face às versões a gasolina é bem evidente, tanto nas travagens (sempre podemos selecionar o modo B com mais regeneração para ajudar) como na firmeza que as molas da suspensão precisam de ter, e que condiciona o conforto e a suavidade de rolamento a baixas velocidades; abaixo dos 50 km/h o Puretech 130 é nitidamente mais hábil a processar as irregularidades do piso. Em concreto, a diferença de peso é de 301 kg (1324 para o Puretech 130 e 1625 kg para o E-Tense), e nas estradas de montanha que rodeiam Valência é bem notória a maior inércia do E-Tense, com o Puretech 130 a ser muito mais ágil e natural nas travagens e mudanças de direção, para além de, também, recuperar velocidade com menos esforço; até aos 100 km/h a performance é muito similar, mas dai em diante o motor a gasolina tem mais alma e acelera com mais convicção. Talvez por isso mesmo, e também por este ser o segmento em que o preço representa um entrave maior à compra, o DS3 E-Tense representa cerca de 35% das vendas e o Puretech é o mais vendido. //

New Drive 34
DS3 E-Tense
Texto — Pedro Silva

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo elétrico, síncrono, de íman permanente com seis polos, dianteiro transversal, 400V de tensão

Potência 156 cv

Binário 260 Nm

TRANSMISSÃO

Tração dianteira

Caixa automática de uma velocidade

CARROÇARIA/CHASSIS

Autoportante em aço Suspensão dianteira/traseira

MacPherson/eixo de torção

DIREÇÃO

Cremalheira e assistência elétrica

TRAVAGEM

Discos ventilados de 302 mm à frente Discos sólidos de 249 mm atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4118 mm

Largura 1791 mm

Altura 1534 mm

Distância entre eixos 2558 mm

Peso 1625 kg

Mala 350 a 1050 litros

Bateria 54 kWh brutos/50,8 kWh úteis

Pneus 215/55 R18

PRESTAÇÕES

Velocidade máxima 156 km/h

Aceleração 9,0 segundos

Carregamento 100 kW CC/11 kW CA

CONSUMOS WLTP

Média 15,6kWh/100 km

Emissões de CO2 0 g/km locais

Autonomia 404 km

PREÇO

A partir de 43 150 euros (Bastille)

DS3 E-TENSE 35
DRIVE
AVALIAÇÃO AUTO
UM DOS PORMENORES DE DIFERENCIAÇÃO DO DS3 ESTÁ NAS LETRAS ‘DS AUTOMOBILES’ QUE ESTÃO NA TAMPA DA MALA: SÃO DE AÇO INOXIDÁVEL E COLADAS INDIVIDUALMENTE

Toyota Prius Plug-In Hybrid

A QUINTA GERAÇÃO DO TOYOTA PRIUS CHEGA A PORTUGAL

DURANTE O VERÃO, MAS JÁ TIVEMOS OPORTUNIDADE DE O GUIAR, EM VERSÃO PRATICAMENTE FINAL. O PRIUS

PASSA A ESTAR DISPONÍVEL NA EUROPA APENAS COM

MOTORIZAÇÃO PHEV, COM 223 CV E AUTONOMIA EM MODO ELÉTRICO DE 69 KM. O ESTILO MUDOU MUITO, MAS A DINÂMICA NÃO MUDOU MENOS

Vinte e cinco anos depois de apresentada a primeira geração do Prius, a Toyota entra na quinta geração do seu primeiro modelo híbrido de grande produção. Durante este quarto de século, vendeu 5 milhões das quatro gerações anteriores do Prius, num total de 22 milhões de modelos híbridos produzidos pelo gigante japonês. Esta quinta geração do Prius marca uma viragem do modelo a vários níveis, desde logo por passar a estar disponível apenas na versão PHEV, na Europa. A marca pensa que tem uma oferta completa de HEV e que deve posicionar o Prius de uma forma distinta da restante gama. Contudo, no Japão (onde é fabricado) e nos EUA, o Prius vai continuar a ter uma versão HEV.

Esta quinta geração do Prius usa a quinta geração do sistema híbrido da Toyota, que foi estreada no Corolla Cross e estará disponível no resto da gama Corolla em breve. Parte de um motor 2.0 a gasolina de 152 cv e junta um motor elétrico de 163 cv, resultando numa potência total combinada de 223 cv, uma subida importante em relação aos 122 cv da geração anterior. Foram feitas modificações no sistema híbrido, nomeadamente no gerador separado, que deixa de contribuir para a tração, ao contrário do que acontecia antes. Simplesmente porque, com o motor EV mais potente, deixa de ser preciso. A bateria de iões de Lítio também foi muito melhorada subindo a capacidade em 50% e atingindo os 13,6 kWh. Tem células mais eficientes, o que permitiu reduzir o seu número em 30% e, incluíndo a sua caixa exterior, manteve sensivelmente o mesmo peso. Ainda assim, o peso total do Prius subiu 50 kg, face ao PHEV anterior. Existe um painel solar no tejadilho que a Toyota diz acrescentar 8,0 km de autonomia por dia, se o Prius ficar todo o dia a apanhar sol. Na

prática, uma semana parado ao sol consegue carregar a bateria por completo. Quanto à plataforma, é a segunda evolução da GA-C usada pela Toyota em vários modelos do segmento C, com maior rigidez torcional e à flexão e uma descida de peso de 24 kg. A distância entre-eixos subiu 50 mm, mas o comprimento desceu 45 mm, ficando-se pelos 4,6 metros. A altura desceu 50 mm e o ponto mais alto deixou de estar sobre os lugares da frente, sendo recuado em nome da elegância. A largura aumentou 22 mm. Em termos aerodinâmicos, o que se perdeu em Cx, recuperou-se em superfície frontal projetada, fazendo com que a resistência ao avanço seja idêntica.

O estilo foi também muito modificado, com uma frente mais afilada, capot e para brisas praticamente com a mesma inclinação, um perfil quase de “shooting brake” e um painel traseiro vertical, com um óculo traseiro muito inclinado e sem escova. Por fim, o desenho dos faróis dianteiros e das luzes traseiras dão ao Prius uma elegância que os seus antecessores nunca tiveram.

Este primeiro teste decorreu na Grécia, em estradas de bom e mau piso, com retas longas e traçado mais sinuoso, mas durou menos de duas horas e, por isso, não houve hipótese de confirmar os 69 km de autonomia em modo elétrico que a marca anuncia. Teremos que fazer um teste mais prolongado para confirmar os consumos de gasolina em modo híbrido, sobretudo com a bateria descarregada. O sistema tem quatro modos de condução: Eco/Normal/Sport/Custom, sendo o último configurável na resposta do acelerador, assistência da direção e climatização. Depois há quatro modos de propulsão: Auto HV/ EV, que é o modo híbrido; EV, que é o modo 100% elétri-

New Drive 36
Texto — Francisco Mota

ESTA QUINTA GERAÇÃO DO PRIUS USA A QUINTA GERAÇÃO DO SISTEMA HÍBRIDO DA TOYOTA, QUE FOI

ESTREADA NO COROLLA CROSS E ESTARÁ DISPONÍVEL NO RESTO DA GAMA COROLLA EM BREVE

TOYOTA PRIUS PLUG-IN HYBRID 37

A SUSPENSÃO FOI MODIFICADA FACE À PRIMEIRA ITERAÇÃO

DA PLATAFORMA

GA-C, COM MAIOR RIGIDEZ NOS APOIOS E NOS CASQUILHOS, QUE PERMITEM MAIOR RIGIDEZ LATERAL. AS BARRAS ESTABILIZADORAS SÃO MAIS GROSSAS

E A REDUÇÃO DO PESO DA SUSPENSÃO DA FRENTE FOI DE 20%

co; HV, que é o modo “save” onde não é gasta a carga da bateria e o modo “Charge”, que carrega a bateria em andamento. Os botões são os mesmos do RAV4 PHEV, estão na consola e são confusos de usar. Os bancos estão posicionados a um nível baixo, o que não facilita o acesso aos lugares de trás, mais ainda porque o tejadilho é baixo, limitando o espaço para a cabeça. O comprimento para as pernas é bom, mas o lugar central é bem mais estreito que os outros dois e a mala tem apenas 284 litros de capacidade, apesar de a bateria estar colocada sob o banco de trás e o depósito de gasolina ter só 40 litros. Na frente há mais espaço e a posição de condução é muito boa, com o volante bem posicionado em relação aos pedais e banco, regulações amplas e banco com razoável nível de conforto e de sustentação lateral. A visibilidade para diante e para o angulo ¾ dianteiro não levanta problemas, mas para trás, através do retrovisor, é bem pior. Contudo, existe também um retrovisor que se transforma num ecrã e que projeta a imagem captada por uma câmara apontada para trás. O painel de instrumentos digital é para ser visto por cima do aro do volante, que assim o tapa ligeiramente, e a qualidade dos materiais do interior não está ao nível do Corolla, com muitos plásticos duros de aspeto simples.

Em modo elétrico, que funciona até aos 135 km/h, a resposta do motor é mais do que suficiente para condução em cidade e atinge algum brilhantismo em estrada. Ouve-se um distante zunido do motor, mas o ambiente

sonoro está razoavelmente insonorizado. Passando ao modo híbrido, o sistema continua a dar prioridade à tração elétrica e, mesmo quando o motor a gasolina entra em ação, tudo se passa com suavidade, do ponto de vista da transmissão. O modo “B” de maior retenção na desaceleração, pode configurar-se em três níveis, mas isso só pode ser feito no confuso computador de bordo e só com o Prius parado. Seria melhor se tivesse patilhas no volante para esse efeito, mas mais caro. Quanto ao ruído do motor, existe maior proporcionalidade entre o movimento do acelerador e a subida de regime do quatro cilindros a gasolina. A baixas rotações e em recuperações, é bem percetível a intervenção do motor elétrico, com uma resposta isenta de tempo de espera. Isso nota-se ainda mais no modo de condução Sport, que aumenta a reatividade do sistema. Com uma aceleração 0-100 km/h anunciada em 6,8 segundos, o Prius sente-se mais leve e rápido do que os seus 1605 kg declarados poderiam deixar supor. A velocidade máxima é de 177 km/h.

A suspensão foi modificada face à primeira iteração da plataforma GA-C, com maior rigidez nos apoios e nos casquilhos, que permitem maior rigidez lateral. As barras estabilizadoras são mais grossas e a redução do peso da suspensão da frente foi de 20%, tendo ainda mais camber negativo. Tudo isto resulta numa inesperada agilidade em estradas com muitas curvas. O Prius tem pouca inlicação lateral, muito bom controlo dos movimentos da carroçaria e precisão na entrada em curva, com uma

New Drive 38

O ESTILO FOI MUITO MODIFICADO, COM

UMA FRENTE MAIS AFILADA, CAPOT E PÁRA-BRISAS PRATICAMENTE COM A

FICHA TÉCNICA

MOTOR

MESMA

INCLINAÇÃO, UM PERFIL QUASE DE SHOOTING-BRAKE E UM PAINEL TRASEIRO VERTICAL, DE ÓCULO TRASEIRO INCLINADO

direção bem calibrada em termos de desmultiplicação e assistência. A tração dianteira é sempre muito eficaz e controlada, com os pneus Yokohama Bluearth GT de medida 195/50 R19 a não revelarem perdas de motricidade. Assim, este novo Prius rapidamente revela uma atitude desportiva que as gerações anteriores nunca tiveram, e nem sequer se encontra no Corolla. A suspensão traseira independente tem aqui uma palavra a dizer, mas é claro que há um preço a pagar. O conforto em mau piso, ou sobre tampas de esgoto desniveladas é pior do que na anterior geração do Prius. As rodas não perdem contacto com o solo, mas transmitem solavancos aos ocupantes. Um compromisso para o qual se espera a reação dos clientes, tanto mais que os acertos para o Japão e EUA são os mesmos desta versão Europeia.

As mudanças nesta quinta geração do Prius, que chega a Portugal no Verão e deverá manter-se na casa dos 40 mil euros, são tão extensas que o reposicionam na gama Toyota como um modelo ainda mais “especial” do que no passado. Estar apenas disponível em versão PHEV pode ser bom para quem tenha acesso aos incentivos fiscais, o que não acontece com os compradores particulares. A dinâmica mais envolvente é o sinal, mais uma vez, de que as diretivas do CEO Akyo Toyoda continuam a ser seguidas: “não fazer mais nenhum Toyota aborrecido de guiar.” O patrão manda, e bem!//

Tipo Quatro cilindros em linha a gasolina, 1987 cc, injeção direta, quatro válvulas por cilindro 152 cv. Motor elétrico de 163 cv, bateria de 13,6 kWh

Potência combinada 223 cv (combinado)

TRANSMISSÃO

Tração dianteira, Trem epicicloidal de variação contínua

CARROÇARIA/CHASSIS

Monobloco em aço, Suspensão MacPherson, à frente e independente, atrás

DIREÇÃO

Pinhão e cremalheira elétrica

Diâmetro de viragem n.d.

TRAVAGEM

Discos ventilados à frente

Discos sólidos atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4600 mm

Largura 1782 mm

Altura 1420 mm

Distância entre eixos 2750 mm

Peso 1605 kg

Mala 284 litros

Depósito 40 litros

Pneus 195/50 R19

PRESTAÇÕES

Velocidade 177 km/h (modo EV: 135 km/h)

Aceleração 6,8 seg.

Rel. peso/potência 7,2 kg/cv

CONSUMOS/AUTONOMIA (WLTP)

Combinado n.d/100 km

Emissões n.d g/km locais

Autonomia EV 69 km

PREÇO n.d.

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE

TOYOTA PRIUS PLUG-IN HYBRID 39

Citroën ë-C4 X

POIS, NÃO É UM SUV, NÃO É UM COUPÉ, É UM POUCO DE AMBOS, É A NOVA PROPOSTA DA CITROËN NO SEGMENTO FAMILIAR. O Ë-C4 X É 100% ELÉTRICO E APOSTA NUMA

ESTÉTICA DIFERENTE PARA MARCAR O SEU ESPAÇO

A Citroën conseguiu em 2022 a melhor performance de vendas dos últimos anos em Portugal, muito por mérito de uma gama atual e variada. Ora, o novo ë-C4 X vem acrescentar ainda mais variedade à gama, com um estilo de carroçaria pouco comum no segmento e que soma o charme de um SUV coupé rebaixado com mais espaço para bagagens a uma boa dotação de equipamento de série em que a suspensão de batentes hidráulicos aparece logo no nível base. Head-up display a cores, infotainment conectado do My Citroën Drive Plus, assistência de condução nível 2 e luxos como o interior em alcantara ficam para a versão de topo do ë-C4 X, o Shine Pack.

FACILIDADE ELÉTRICA

Numa análise puramente objetiva, a Citroën é um dos construtores com a vida mais facilitada na transição elétrica, já que os seus aspetos de diferenciação de marca passam pela tecnologia e o conforto; na realidade, o ponto menos conseguido dos seus carros revolucionários, com exceção do AX, sempre foi o uso de motores antiquados. E a facilidade/simplicidade de condução permitida pelos motores elétricos é um aliado perfeito do conforto, até porque também são silenciosos e isentos de vibrações. Por isso, para ser um verdadeiro Citroën o ë-C4 X só precisa de ser confortável. É essa a sua promessa básica. E, com os amortecedores que integram batentes hidráulicos (tanto em compressão como extensão) e os bancos “esponja extra”, sob certas condições, isso é verdade. Em concreto, sempre que a velocidade sobe acima dos 50 km/h, a estrada coloca carga suficiente para as molas começarem a mexer e o amortecimento a trabalhar, aparecendo a tal sensação de levitar que a Citroën promete. Porém, como o elevado peso da bateria obriga a que se usem molas mais firmes, a baixa

velocidade o rolamento não é particularmente filtrado, com a rugosidade do piso a chegar ao habitáculo e obstáculos citadinos típicos, como as bandas sonoras (em Inglaterra, pátria do humor ácido, há quem lhes chame polícias deitados), a provocarem uma aceleração vertical excessiva na sua transposição. Fora da zona confortável, tanto para o carro como para os ocupantes, ficam também as estradas mais enroladas com curvas lentas e sucessivas. Aqui o ë-C4 X revela ser lento a responder à direção e pouco ágil a curvar; o carro não roda com naturalidade e sentimos que há um certo desagrado em querer mudar de direção. E nem sequer se tratar de subviragem. Não, o ritmo máximo que o ë-C4 X incentiva não se aproxima desse nível. É mesmo o carro a dizer: eh pá, não gosto de curvas, deixa lá isso e vamos procurar um belo IP, IC ou AE, com curvas suaves mais ao meu gosto. Nessas condições o Citroën ë-C4 X revela ser um excelente rolador. O motor elétrico de 136 cv (até porque estes só estão disponíveis em Sport, em Eco são apenas 86 cv) não vai quebrar nenhum recorde de velocidade (de facto até é lento a ganhar velocidade acima dos 100/110 km/h), mas permite uma performance descontraída e acessível: basta acelerar. O problema é o preço, que começa nos 39 747€ da versão base Feel (Feel Pack 40 107€, Shine 42 447€ e Shine Pack 43 746€), o que só torna o ë-C4 X competitivo no mercado das empresas (que tem fortes incentivos fiscais para os BEV), pelo que é entre as frotas e as plataformas TVDE que a Citroën espera encontrar a maior parte dos seus clientes do ë-C4 X; pode parecer ridículo, mas desde a pandemia a comunidade TVDE passou a ser um dos maiores compradores de carros elétricos novos, pelo que é um mercado a não descurar, sobretudo porque a combinação de espaço atrás e tamanho da bagageira (embora o acesso não seja o de uma verdadeira quinta porta) do ë-C4 X é das melhores do mercado face ao preço. //

New Drive 40
Texto — Pedro Silva

A BATERIA É DE 50 KWH E A AUTONOMIA MISTA WLTP DE 360 KM. O SISTEMA DE CARREGAMENTO RÁPIDO A 100 KW EM CORRENTE CONTÍNUA POSSIBILITA OBTER O EQUIVALENTE A 100 KM DE ALCANCE EM 10 MINUTOS

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo elétrico, síncrono, de íman permanente, dianteiro transversal, quatro polos, 400 V de tensão

Potência 136 cv

Binário 260 Nm

TRANSMISSÃO

Traçãodianteira

Caixa automática de uma velocidade

CARROÇARIA/CHASSIS

Autoportante em aço Suspensão dianteira/traseira MacPherson/eixo de torção

DIREÇÃO

Cremalheira e assistência elétrica

TRAVAGEM

Discos ventilados à frente Discos sólidos atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4360 mm

Largura 1800 mm

Altura 1520 mm

Distância entre eixos 2670 mm

Peso 1616 kg

Mala 380/1250 litros

Capacidade da bateria 50 kWh

Pneus 195/60 R18

PRESTAÇÕES

Velocidade máxima 150 km/h

Aceleração 9,7 segundos

Carregamento 100 kW CC/11 kW CA

CONSUMOS WLTP

Média 15,3 kWh/100 km

Emissões de CO2 0 g/km locais

Autonomia 353 km

PREÇO

A partir de 39 797 euros (Feel)

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE

CITROËN Ë-C4 X 41

Audi SQ8 e-Tron

COMO É QUE SE CONSEGUE FAZER COM QUE UM SUV

COM 2,8 TONELADAS DE PESO GOSTE DE CURVAS? SE ALGUÉM TEM RESPOSTA PARA ISSO É A AUDI. VENHA

CONHECER O NOVO AUDI SQ8 E-TRON E AS PAISAGENS VULCÂNICAS DA ILHA DE LANZAROTE

Regra geral, a apresentação dos novos carros elétricos é consumida com imensos slides de power point sobre as novas tendências de consumo, os novos clientes tecnológicos com consciência verde e, infelizmente, muito pouco sobre o carro. E há uma razão para isso, é que todos os motores elétricos de indução de fluxo radial são iguais; na verdade, tirando a sofisticação eletrónica do controlo de potência e a refrigeração líquida, no essencial são pouco diferentes dos motores montados nos nossos carrinhos de slot com que brincámos. São fabulosos! Potentes, leves, fáceis de construir e muito fiáveis, mas, francamente, é algo sobre o qual é difícil ficarmos excitados depois de começarmos a ter namoradas… Pelo que, para tentar empolgar e melhorar a dinâmica, o SQ8 joga a carta dos três motores (um à frente e dois atrás). E para marcas cujo historial e a experiência de condução assenta em alguns motores a combustão míticos e diferentes (quem falou num certo 5 cilindros turbo?), como a Audi, esta falta de “pica técnica” é um problema que é necessário superar para se oferecer ao cliente a sensação de conduzir um Audi.

O FEELING AUDI

Posto isto, não estranha pois que a maior parte dos slides tenham sido sobre uma coisa que se chama o feeling Audi, que não é mais do que uma mistura de solidez, precisão e progressividade. Como bons alemães, os engenheiros da Audi testam e quantificam

tudo, sendo essa combinação das sensações subjetivas ao volante com os resultados das medições que serve para estabelecer os padrões do feeling Audi. Assim, para além de contar com suspensão pneumática de amortecimento e altura ao solo variáveis, vectorização de binário e repartição de potência variável entre os dois eixos, o novo Audi SQ8 foi especialmente trabalhado ao nível dos componentes da suspensão, principalmente na rigidez das peças estruturais e das uniões/apoios, por forma a reduzir o tempo de resposta entre o movimento das mãos no volante e a resposta direcional do carro, mas fazendo com que esta aconteça sempre de forma precisa, controlada e proporcional. Em concreto, a Audi definiu para os novos Q8 e SQ8 e-Tron (face ao anterior) mais 10% de resposta à direção, menos 10% de ângulo de volante para as mesmas condições de taxa de mudança de direção e aceleração transversal, mais 10% de precisão, mais 20% de tato e feedback no volante e menos 10% de movimento de carroçaria, tanto longitudinais (travagem e aceleração) como transversais (curvas) para o mesmo valor de aceleração transversal.

DINÂMICA EVOLUÍDA

Nas outras publicações, provavelmente, vai poder ler imenso sobre a autonomia e os gráficos dos ciclos de carregamento, mas aqui essa parte fica resumida ao fundamental. O novo software de controlo da temperatura e preparação para carga da bateria permi-

New Drive 42
Texto — Pedro Silva

O NOVO AUDI SQ8 E-TRON ESTÁ DISPONÍVEL COM

CARROÇARIA SUV E SUV COUPÉ, AMBAS COM A BATERIA DE 114 KWH BRUTOS E 503 CV DE POTÊNCIA

AUDI SQ8 E-TRON 43

O SQ8 TEM TRÊS MOTORES. UM DIANTEIRO DE 169 CV E DOIS TRASEIROS

DE 133 CV CADA UM. O ESP PODE SER DELIGADO E A ELETRÓNICA ESTÁ AFINADA PARA MAXIMIZAR O DESEMPENHO DINÂMICO

te que esta carregue durante mais tempo em carga rápida, enquanto a autonomia é o que é: devido ao elevado peso nunca conseguimos médias inferiores a 30 kWh/100 km nas estradas de Lanzarote, mas também não tentámos, o que nos dá mais de 300 km sem preocupações; por outro lado, admitimos que, usando menos performance do que a disponível num Dacia Spring e percursos mais planos, se poderá chega perto dos 500 km, mas para esse uso todo o Audi SQ8 parece algo… exagerado!

O que nós na autoDRIVE apreciamos é uma boa dinâmica, e isso o SQ8 tem. É claro que os 2800 kg de peso não desaparecem, sendo evidentes no esforço necessário no pedal do travão a baixa velocidade, para imobilizar o SQ8, ou nas transferências de apoio mais rápidas, nas quais nem a direção, muito rápida e precisa, consegue mascarar que a massa mostre a sua pouca vontade de mudar de direção depois de já estar comprometida com o azimute oposto. Ou seja, o SQ8 não é um carro, naturalmente, ágil, mas devido ao trabalhos realizado pela Audi no chassis pode

ser convencido a ser ágil. Como vimos, uma das coisas que a Audi trabalhou bastante foi a rigidez lateral de toda a suspensão, por forma a que os comandos do volante cheguem ao asfalto sem atraso nem folga. E chegam! O SQ8 entra em curva com extrema precisão, com um mínimo de rolamento de carroçaria e mantém a trajetória sem desvios. Dá gosto apontar às curvas. Felizmente, o elevado peso está colocado de forma equitativa pelos eixos e nas partes baixas do chassis, o que reduz a altura do centro de gravidade, pelo que ajuda, tal como o efeito de vectorização de potência no eixo traseiro e a distribuição de potência variável pelos dois eixos. Tração e aderência não faltam, bem como uma boa sensação de controlo. É claro que para estes ritmos mais rápidos o melhor modo de condução é o Dynamic, pois a suspensão fica mais firme (reduzindo também a altura ao solo) e há mais vectorização de binário quando temos elevados ângulos de direção aplicados; com um motor para cada roda traseira o SQ8 não necessita de diferencial atrás, mas pode aplicar forte vectorização em aceleração e

New Drive 44

ainda travar a roda dianteira interior para eliminar a subviragem. Por fim, para o tal feeling Audi também conta muito a relação correta entre autoridade e progressividade dos comandos, coisa que se pode sentir no tato dos travões e até na diversão e controlo que a possibilidade de alterar a retenção elétrica nas patilhas do volante nos oferece.

No capítulo dinâmico há ainda a realçar a excelente aceleração, que não se banaliza após os 100 km/h, e o competente trabalho da suspensão pneumática adaptativa, que mantêm a carroçaria nivelada e sujeita a reduzidas acelerações verticais, mas controla bem as enormes rodas a moverem-se para cima e para baixo a acompanharem o perfil da estrada. E esta é a grande diferença entre uma marca comum e um construtor que sabe que um carro, seja elétrico, a fusão nuclear ou extrato de pipoca, é um objeto dinâmico e que a qualidade de condução sentida no golpe de volante faz (toda) a diferença. E o resto? O resto são números… //

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo 1 motor elétrico sincrono transversal á frente de 169 cv e 2 motores elétricos assíncronos transversais atás de 133 cv

Potência combinada 503 cv (pico)

Binário combinado 973 Nm

TRANSMISSÃO

Tração às quatro rodas, repartição de potência variável entre eixos e entre as duas rodas traseiras (vetorização)

Caixa de uma relação

CARROÇARIA/CHASSIS

Alumínio estampado e soldado

DIREÇÃO

Pinhão e cremalheira de assistência elétrica variável

TRAVAGEM

Discos ventilados de 400 mm à frente Discos ventiladosde 350 mm atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4915 mm

Largura 1976 mm

Altura 1617 mm

Distância entre eixos 2928 mm

Peso 2725 kg

Mala 62 + 528 a 1567 litros

Bateria de iões de lítio com 114 kWh

brutos e 106 kWh úteis

Pneus 285/45 R20

PRESTAÇÕES

Velocidade 210 km/h

0-100 km/h 4,5 seg.

Carregamento 170 kW CC/22 kW CA

CONSUMOS (WLTP)

Combinado 23,5 kWh/100 km

Emissões 0 g/km CO2 locais

Autonomia 513 km ciclo misto

PREÇO

Não homologado

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE

AUDI SQ8 E-TRON 45
A QUALIDADE DOS MATERIAIS NO HABITÁCULO É TOPO DE GAMA E O AMBIENTE TRANSMITE QUALIDADE, SEGURANÇA E CONFORTO AOS, SORTUDOS, OCUPANTES

Mercedes-Benz GLC

220D 4MATIC

MAIS DE 1000 KM DE AUTONOMIA REALIZÁVEIS E UM SUV

VERDADEIRAMENTE CONFORTÁVEL SÃO COISAS QUE JÁ

NÃO SE USAM, A NÃO SER QUE TENHAMOS AO NOSSO

SERVIÇO O RENOVADO MERCEDES-BENZ GLC 220 D 4MATIC COM SISTEMA MICRO HÍBRIDO DE 48V

A Mercedes-Benz é o único construtor que mantém a aposta nas motorizações Diesel híbridas e logo com vários níveis de potência e capacidade. Em concreto, este 220 d é a motorização base do renovado GLC, combinando o 4 cilindros Diesel 2.0 de 197 cv/440 Nm com um alternador motor de arranque de 23 cv/200 Nm e uma pequena bateria de iões de lítio de 48V. Já agora, nesta edição 2023 a adição do alternador/motor de arranque está longe se ser a única melhoria aplicada ao OM 654 M biturbo, bem pelo contrário. Para começar, uma nova cambota com o curso aumentado em 2 mm (passou de 92,3 mm para 94,3 mm) elevou a cilindrada dos anteriores 1950 cc para os atuais 1993 cc, para além de que esse curso extra ajuda a extrair mais trabalho e rendimento da combustão. Nesse mesmo sentido, a pressão de injeção foi puxada dos 2500 bar para os 2700 bar, os dois turbocompressores passaram a ser arrefecidos a água e são ambos de geometria variável, enquanto os seus pouco comuns e robustos êmbolos de aço (reduzem o atrito devido à menor dilatação, o que permite tolerâncias do cilindros mais apertadas e suportam pressões e temperaturas mais elevadas, o que melhora o rendimento termodinâmico) passaram a ter os canais internos de refrigeração, que reduzem a temperatura da coroa, cheios de sódio, para uma ainda mais eficaz capacidade de suportar altas temperatura sem derreteram. E para respeitar as normas de poluição são necessários nada menos do que quatro catalisadores, sendo esta uma das razões porque os Diesel são tão caros de produzir: um catalisador para os óxidos de azoto; um para as partículas e que captura ainda mais óxido de azoto; mais dois catalisadores de oxidação, um montado perto do motor, logo à saída dos turbos, e

outro debaixo do carro, sendo que ambos contam com injeção de AdBlue controlada eletronicamente.

UM MERCEDES A SÉRIO

Bons bancos, bons materiais, um infotainment evoluído e uma atmosfera (da qual podemos escolher a cor da iluminação noturna e o motivo, mais luxo ou mais desportivo) que nos faz sentir vontade de prolongar a cada viagem. E não é só aspeto. Com suspensão pneumática de altura ao solo e amortecimento variáveis, direção ativa nas rodas traseiras, aquele que é, provavelmente, o melhor motor Diesel de quatro cilindros do mercado, caixa automática de 9 velocidades, tração permanente às quatro rodas e um excelente head up display a cores (definição e leitura perfeitas), o GLC também possui aquela superioridade técnica que se associa à marca.

O único problema é que a assinatura sonora do 4 cilindros Diesel em cargas de acelerador mais elevadas acaba por nos fazer descer à terra: o que é isto? Ora, este acordar é ainda mais notório porque, sempre rolamos sem pressa, a caixa e a ajuda elétrica fazem maravilhas para manter o ruidoso parceiro Diesel discreto. E, usando esta parte silenciosa da performance do GLC 220 d, conseguimos fazer consumos na casa dos 5 l/100 km, o que é excelente para um SUV familiar com mais de 4,7 m de comprimento e duas toneladas de peso, resultando numa autonomia acima dos 1000 km. Mas, talvez, mais impressionante ainda é a capacidade de se andar a ritmos rápidos (sermos o carro mais rápido na estrada) com consumos na casa dos 7 a 8 l/100 km.

E não é só nos consumos que este OM 654 M melhorado

Test Drive 46
Texto — Pedro Silva Fotos — Luís Duarte

ESTA UNIDADE FICA PERTO DOS SEIS DÍGITOS, MAS É

POSSÍVEL TER UM GLC 220 D COM A SUSPENSÃO DE MOLAS

PNEUMÁTICAS E AMORTECIMENTO ATIVO, DIREÇÃO ATIVA AO EIXO TRASEIRO E ‘PACK OFFROAD’ POR MENOS DE 90 000€

MERCEDES-BENZ GLC 47

e hibridizado conquista o condutor, já que a performance é muito boa, com uma resposta ao acelerador suave e progressiva desde os baixos regimes e aquele poder de aceleração contundente entre as 2000 e as 3000 rotações típica dos Diesel turbo.

CONFORTO COMO DEVE SER

Para nós um SUV deve ser, antes de tudo, confortável. Pelo que, em termos de conforto, o GLC 220 d é a nossa definição de SUV, somando um pisar refinado e felino (são as rodas que sobem e descem e não a carroçaria e os passageiros que balançam) a um excelente controlo de carroçaria. Tem tato e pisar de carro bom! De carro caro! Como deve ser! É claro que há algum movimento de carroçaria quando curvamos mais depressa, mas é bem controlado e amortecido, sem deixar acumular inércia. É claro que um Stlevio ou um Macan são mais ágeis e rápidos na resposta à direção, mas o GLC tem um ritmo próprio e, sobretudo, uma relação entre a rotação do volante, a inclinação da carroçaria e o girar de todo o carro muito progressiva e linear, o que contribui para a elevada qualidade de condução que sentimos.

Nesta motorização o sistema de tração integral 4MATIC tem uma repartição base de binário entre os eixos de 45% para a frente e 55% para trás, sendo que estas per-

centagens se podem alterar dinamicamente em função das condições de aderência e do modo de condução selecionado: Off Road; Eco; Comfort; Sport e Individual, sendo que neste último podemos parametrizar a resposta do conjunto motor/caixa, da suspensão e da direção. A juntar a isto ainda podemos optar por manejar a caixa em modo manual e colocar o controlo de estabilidade em off, pelo que não faltam opções de configuração. O nosso modo de condução preferido é o Eco, pois é o que tem a resposta mais suave e progressiva do acelerador e aquele em há mais ajuda da máquina elétrica e uma otimização do rolamento por inércia, com o motor a combustão desligado. E mesmo quando nos aparece uma estrada mais divertida pela frente, o Eco ou o Comfort (com a caixa em modo manual) permanecem como os melhores, principalmente se mantivermos a caixa em modo automático: o Sport coloca o motor a funcionar a regimes demasiado elevados, o que não é a melhor opção neste 220 d que tem a sua melhor faixa entre as 2000 e as 3600 rpm; e a suspensão mais firme também não casa com o carácter do GLC 220 d, pois, se o rolamento se reduz, também ficamos com um amortecimento algo artificial e perdemos a excelente harmonia entre o golpe de direção, a rotação do GLC e o ângulo de ataque que assume em apoio. Aqui, convém lembrar que uma boa parte desta facilidade natural para enrolar curvas tem de ser creditada ao trabalho da direção ativa no eixo tra-

Test Drive 48

O HABITÁCULO POSSUI UMA QUALIDADE FABULOSA, INFOTAINMENT INCLUÍDO, PODENDO TER VÁRIOS

seiro, que vira até 4,5 graus em fase oposta ao dianteiro. Aliás, o GLC é tão bom a curvar que até vale a pena desligar o ESP e deixar a traseira rodar, o que podemos conseguir quer com manipulação das transferências de peso, com o acelerador (pisos de menor aderência), ou ambos. O GLC não é o SUV mais dinâmico, mas tem um golpe de volante de qualidade e com assinatura Mercedes, no estilo pouco esforço muito efeito. Para fazer quilómetros sem parar é difícil fazer melhor, mesmo considerando um preço que começa abaixo dos 75 000€, mas que depressa derrapa para perto dos 100 000€. A

“PORRA” É O PREÇO!

Em conclusão, só há mesmo duas coisas que não gostamos neste Mercedes-Benz GLC 220 d 4MATIC, o preço e o ruído do motor Diesel em cargas elevadas. Em tudo o resto é um SUV como todos deviam de ser e, perdoem lá a próxima afirmação, até porque é verdade, um carro muito mais polivalente do que qualquer dos seus concorrentes elétricos a bateria. Ah pois é! //

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo 4 cilindros em linha, dianteiro longitudinal, injeção indireta + motor elétrico síncrono ISG

Cilindrada 1992 cc

Bateria iões de lítio (48 V)

Potência combustão 197 cv às 3600 rpm

Potência elétrica 23 cv

Binário comb. 440 Nm 1800~2800 rpm

Binário elétrico 200 Nm

Potência combinada 197 cv

Binário combinado 440 Nm

TRANSMISSÃO

Tração às quatro rodas permanente Caixa automática de 9 velocidades

CARROÇARIA/CHASSIS

Aço e alumínio estampado e soldado

DIREÇÃO

Pinhão e cremalheira de assistência elétrica variável

TRAVAGEM

Discos ventilados à frente Discos ventilados atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4716 mm

Largura 1980 mm

Altura 1640 mm

Distância entre eixos 2888 mm

Peso 2000 kg

Mala 600 a 1640 litros

Depósito de combustível 62 litros

Pneus 215/55 R17

PRESTAÇÕES

Velocidade 219 km/h

0-100 km/h 8,0 seg.

CONSUMOS (WLTP)

Combinado 5,2 l/100 km

Emissões 136 g/km CO2

PREÇO

Base 73 650€

Unidade ensaiada 97 918€

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE

MERCEDES-BENZ GLC 49
‘ESTILOS’ DIFERENTES

Toyota GR Supra 340 cv & caixa manual

METADE DA PERFORMANCE E 100% DO PRAZER DE CONDUÇÃO DE UM DESPORTIVO ESTÃO NA CAIXA DE VELOCIDADES. É QUASE IRREAL O QUANTO UMA (MUITO BOA) CAIXA MANUAL PODE MUDAR A PERSONALIDADE DE UM CARRO. BEM-VINDOS AO GRANDE PLANO DO TOYOTA GR SUPRA DE CAIXA MANUAL. PARA HOMENS! (E SENHORAS, E JOVENS E QUEM MAIS QUISER!!)

O Toyota GR Supra com caixa de velocidades manual é a história de um motor e da forma como os engenheiros da Toyota conseguiram oferecer aos entusiastas a capacidade de terem total controlo na performance desse motor, de serem os únicos a decidir o quanto, o como e o porquê, algo que só uma caixa de velocidades manual consegue garantir. Sem desmerecer nenhuma das excelentes máquinas de condução que a BMW já produziu até hoje, começando nos 02 e seguindo com um sem número de criações adornadas pela poderosa letra M na designação de modelo, a verdade é que a grande razão cósmica de os astros se terem alinhado para permitir que a marca bávara tivesse evitado a falência no início dos anos sessenta do século XX (ou sido adquirida pela Mercedes-Benz, o que esteve em estudo), foi a criação deste fabuloso motor 3.0 de seis cilindros em linha turbo. Nas suas várias gerações/evoluções, que se estrearam em 2006, sempre foi um motor brilhante, com tudo o que faz as delícias de um condutor exigente: binário instantâneo; potência a todos os regimes; solto a subir de rotação; suavidade de turbina; sonoridade cativante... Enfim, tudo! Assim, e sabendo que a Toyota não precisa de defesa para as suas decisões (o sucesso, bem como a quantidade de propostas em todos os segmentos, tipos de energia e perfis de utilização em todos os cantos do mundo são disso o melhor testemunho), a verdade é que, tendo o Supra de ser movido por um seis cilindros em linha, é perfeitamente lógico que a Toyota tenha optado por escolher aquele que, talvez, seja o melhor seis cilindros em linha já produzido.

INTIMIDADE MANUAL

Agora, como já vimos, para tirar o máximo de prazer de um motor como este, sobretudo nesta faixa de potência e performance, nada como uma boa caixa manual, pois só assim existe aquela sensação de ligação mecânica/direta entre o acelerador e as rodas traseiras, para além de sermos nós, que estamos no comando da máquina, quem fica com o controlo total e absoluto, quer da quantidade de potência usada quer da forma de uso. Mas porquê? Porque sim! Ora, a pedido de vários clientes, foi isso que a Toyota fez: o “petrolhead” CEO da Toyota deu luz verde ao projeto, mas não passou um cheque em branco, pelo contrário, disse “façam-no, mas com boa e criativa engenharia dentro de um orçamento limitado”. E para o conseguir a Toyota virou-se para o banco de peças da ZF, buscando a carcaça capaz de suportar o binário e as relações mais adequadas à fabulosa curva de potência do seis cilindros em linha: os 340 cv estão presentes entre as 5000 e as 6000 rpm, mantendo-se acima dos 300 cv até às 7000 rpm de regime máximo. Porém, a Toyota sabe bem que, no atual estado da arte e da indústria, uma caixa manual só vale a pena se for uma excelente caixa manual. Ou seja, se adicionar à experiência de condução sem a condicionar. Por isso, a embraiagem foi dimensionada para ter o peso, progressividade e rapidez corretas, parte do material insonorizante exterior foi retirado (reduz o peso e permite um feed-back auditivo mecânico adaptado a um desportivo)

Grande Plano 50
Texto — Pedro Silva Fotos — Luís Duarte

É CADA VEZ MAIS RARO TERMOS UM BOM DESPORTIVO NESTA CLASSE DE POTÊNCIA E PERFORMANCE COM

UMA CAIXA MANUAL. SÓ ISTO TORNA O SUPRA GR MANUAL NUM CASO “ESPECIAL DE CORRIDA”

TOYOTA GR SUPRA 51

PARTE DESTE NOVO CARÁCTER É DEVIDO A NOVAS

BORRACHAS COM MAIOR VULCANIZAÇÃO NAS BARRAS

ESTABILIZADORAS, AMORTECIMENTO AVS REVISTO E UM NOVO SOFTWARE/AFINAÇÃO DA DIREÇÃO ASSISTIDA; ESTAS

MELHORIAS SÃO EXTENSÍVEIS A TODAS AS VERSÕES

e a eletrónica de comando foi programada tanto para proporcionar uma função ponta-tacão automática (que pode ser desativada em Sport), como para que o controlo de binário do motor nas passagens a fundo seja fluído, evitando assim as desagradáveis pancadas e vibrações no diferencial traseiro; para além de estragarem a experiência de condução, que se torna algo rude, até agrícola, estes picos de binário prejudicam a tração e aumentam o desgaste do diferencial, dos apoios da suspensão e dos amortecedores. E, como é quase tradição nas caixas ZF manuais, se a frio o manuseamento do punho de comando pode parecer algo duro, assim que o óleo atinge a temperatura de funcionamento, por mais “porrada” que leve,

a alavanca funciona com a precisão e facilidade de um sistema bem oleado; até parece que a caixa “xupa” as mudanças, tanto em Normal como em Sport. A isto não será estranho um detalhe típico da cultura nipónica, com os engenheiros a darem-se ao trabalho de estudar (e testar) qual o comprimento ideal da alavanca e o peso certo para a bola no topo da mesma, tudo para se obter o momento e a inércia ideais que suavizam o movimento. Impagável! Sobretudo porque é uma daquelas soluções que produz um efeito na qualidade de condução exponencialmente superior ao investimento envolvido; umas poucas centenas de euros para peças protótipo e outro tanto para o combustível dos testes. Simples, elegante e eficaz.

Grande Plano 52

TUDO PARTE DE UM “SEGREDO”, QUE É O FACTO DE TODOS OS CONTROLOS ESTAREM MUITO BEM HARMONIZADOS, POSSUINDO O TATO, O PESO E A PRECISÃO CORRETOS PARA A MÁXIMA INTIMIDADE

MAIS VÍCIO DO QUE NECESSIDADE

No limite, até parece um contrassenso colocar uma caixa que dá tanto prazer de manusear num motor que, verdadeiramente, podia funcionar com duas relações, uma baixa e uma alta. Neste caso seriam a 3ª e a 6ª. A 3ª faz todo o trabalho dos 25/30 km/h até um pouco acima dos 160 km/h, que são atingidos com o taquímetro a marcar 7000 rpm, enquanto a 6ª tem um raio de ação que vai dos 50 aos 250 km/h. Em qualquer uma delas, sentir o crescendo da entrega de potência do seis cilindros é uma experiência fabulosa e, nitidamente, mais visceral do que na versão automática. Em resumo, a 3ª é a relação ideal para as serras e para a maior parte das

curvas em pista, enquanto a 6ª serva para tudo o resto numa condução mais... preguiçosa. Todavia, apesar de tudo isto, é impossível resistirmos ao prazer de trabalhara o comando… 2ª, 3ª, 4ª, 5ª, 4ª, 3ª, 4ª, 3ª, 2ª e, começar de novo, até porque a experiência auditiva é ainda melhor do que na versão automática, seja porque as diferentes relações trabalham o seis cilindros em combinações diversas de aceleração e velocidade de subida de regime, seja porque a retirada da concha de insonorização superior do cárter da caixa de velocidades liberta novas frequências sonoras que apimentam a experiência de condução. E, ainda para mais, os comandos estão muito bem calibrados, pelo que acelerar, travar, curvar, enfim, tudo serve como pretexto para interagirmos com o GR Supra! A máquina está viva e quer brincadeira…

TOYOTA GR SUPRA 53

PRAZER, CRIATIVIDADE E CONTROLO

E, para a brincadeira, as vantagens da distribuição de peso de 50% para cada eixo, conjugadas com um baixo centro de gravidade (o Supra tem o centro de gravidade mais baixo que o GR 86, o que o coloca ao nível de um Alpine 110, Porsche Cayman ou Alfa Romeo 4C), são evidenciadas na amplitude de manipulação que está à disposição de quem está aos comandos, noemadamente, quando se usam as transferências de peso para modificar/controlar/determinar a atitude do GR Supra; para cada combinação de velocidade, ação sobre o volante, força de retenção do motor ou toque nos travões, o Supra reage de forma diversa. Por exemplo, se entramos em curva

soltos, de 5ª ou 6ª, e embalados com uma velocidade suficiente para gerar uma aceleração transversal significativa, basta uma rotação mais assertiva do volante para conseguirmos um deslizar benigno, lento e progressivo da traseira; ou seja, diversão acessível com segurança, controlo e pouco desgaste de material, combustível incluído. Por outro lado, em curvas mais lentas, de 2ª ou 3ª, é possível colocar o Supra nos travões e entrarmos já completamente atravessados em estilo rali, com a traseira a rodar logo na inscrição, sendo que, depois, usamos o acelerador e a direção para controlar e prolongar a deriva a gosto. Nesta altura é importante dizer que, em parte, esta variedade de opções é dada por uma afinação da suspensão que conta com molas relativamente brandas nos primeiros milímetros do curso (mesmo em

Grande Plano 54
PARA
DE UMA CAIXA
O CONTROLO DE TRAÇÃO (COM A NOVA FUNÇÃO PONTA-TACÃO), A RESPOSTA DO ACELERADOR E A TRAVAGEM FORAM CONFIGURADOS
AS NECESSIDADES
MANUAL

Sport, o amortecimento variável AVS não contraria esta brandura inicial, até porque os amortecedores não determinam a transferência total de peso, apenas a taxa de variação a que este acontece), deixando assim alguma sensibilidade para se sentir a aderência e jogar com a inércia. Isto seria uma crítica para um carro afinado para pista, mas que faz todo o sentido num desportivo de estrada, pois permite preservar o curso necessário para absorver irregularidades e manter um bom conforto de rolamento. De resto, a forma mais rápida e eficaz de conduzir o GR Supra iMT passa por praticarmos uma inscrição em travagem forte, o que tem por efeito comprimir os tais primeiros milímetros da suspensão, absorvendo/eliminando assim a fase branda (ou “folga”) e deixando-nos assentes na zona de máximo controlo

e apoio do binómio molas/amortecedores. Esta técnica de condução permite obter um posicionamento assente nas quatro rodas e uma plataforma estável para receber a potência, otimizando a tração conferida pelo diferencial autoblocante ativo e resultando numa velocidade de saída de curva mais elevada. O passo seguinte é priorizar a utilização do motor na faixa das 4000/5000 rpm na saída, em oposição ao uso nas 1000 rotações seguintes, já que assim podemos acelerar mais cedo e com mais intensidade sem provocar perdas de estabilidade da traseira, ficando apenas um realinhamento natural em potência com (eventual) necessidade de uma ligeira correção de volante sem aliviar o pé; ou seja, 95% das curvas em estrada ou pista são para ser feitas em 3ª e 4ª velocidades. Mais uma vez, o seis cilindros é uma autên-

A ELETRÓNICA PASSOU A TER FUNÇÕES COMO O HAIRPIN+ (DEIXA ESCORREGAR A RODA INTERIOR 5%) PARA UMA ROTAÇÃO MAIS NATURAL

TOYOTA GR SUPRA 55
NAS CURVAS FECHADAS E O ARP QUE EVITA PIÕES

tica fonte de força e disponibilidade, proporcionando todo o controlo, direccionalidade de acelerador e aceleração necessárias a médios regimes; as suas curvas características de binário e potência fazem inveja aos motores elétricos.

Em conclusão, com os controlos de tração e estabilidade desligados (tem um novo modo Track), o Toyota GR Supra iMT é um carro para condutores evoluídos (em pisos/situações de baixa aderência pode mesmo considerar-se um carro exigente), capaz de reagir,

retribuir e satisfazer na (exata) medida da qualidade e técnica das ações colocadas nos seus comandos. E a prova da vantagem que representa ter menos peso, melhor distribuído e colocado o mais baixo possível está na divisão 2 do DTM (que corre com carros na especificação FIA GT4), onde o carro menos potente de todos, o Toyota Supra GT4 venceu a maioria das corridas e o campeonato, derrotando de forma fácil e regular os mais potentes (mas mais pesados e menos aerodinâmicos) BMW M4.

A CAIXA MANUAL É CERCA DE 7 KG MAIS LEVE QUE A AUTOMÁTICA. ISTO

A PAR DE OUTRAS MEDIDAS (JANTES DE 19” FORJADAS MAIS LEVES, INSONORIZAÇÃO REDUZIDA E BANCOS MAIS FINOS) PERMITIU REDUZIR O PESO EM PERTO DE 40 KG FACE AO GR SUPRA AUTOMÁTICO

Grande Plano 56

COCKPIT MINIMALISTA

Sólido e bem construído que é, a verdade é que, para os apreciadores dos habitáculos repletos de ecrãs e comandos digitais, a instrumentação pode parecer demasiado simplista. Nós preferimos apreciar o facto de esta ser focada na informação essencial e com um mínimo de distrações (afinal, no GR Supra manual o grande motivo de entretenimento para o condutor é, pasme-se, a condução…), sendo fácil de selecionar os quatro níveis do controlo de estabilidade (num único botão), optar entre os modos de condução Normal e Sport ou

fazer o espelho do smartphone sem ter de esperar uma eternidade. De igual modo, a instrumentação, com o conta rotações central com um ponteiro físico e o head up display, fornece toda a informação necessária para conduzirmos o GR Supra com prazer e segurança. E, nunca é demais dizer, obrigado Toyota por, ao mesmo tempo que investem e investigam os caminhos do futuro do automóvel, terem o cuidado de nos continuar a oferecer carros que gostamos de conduzir; um motor brilhante, tração traseira com uns pneus de muita aderência, autoblocante e uma caixa manual para sermos nós a mandar. Ou seja, a mesma e simples receita de sempre. Não é preciso complicar! //

TOYOTA GR SUPRA 57
OS DETALHES FAZEM A DIFERENÇA! OS ENGENHEIROS DA GAZOO RACING EXPERIMENTARAM VÁRIOS PESOS NO TOPO DA ALAVANCA ATÉ ATINGIREM O TATO CORRETO

AVALIAÇÃO 8,5

A TOYOTA ESTÁ A TORNAR-SE O REFÚGIO DE TODOS OS QUE GOSTAM DE CONDUZIR, SENDO A MARCA QUE POSSUI (E INVESTE) A GAMA MAIS VARIADA DE DESPORTIVOS; POR EXEMPLO, EM PORTUGAL, A AUDI APENAS VENDE O TT ROADSTER COM O 2.0 DE 245 CV, TRACÇÃO DIANTEIRA

E CAIXA DE DUPLA EMBRAIAGEM, E O NISSAN 400Z NÃO CHEGOU À EUROPA. ASSIM, SE ESTIVERMOS A FALAR DE COUPÉS EQUIPADOS COM MOTORES DE SEIS CILINDROS

E CAIXA MANUAL A ESCOLHA AINDA FICA MAIS REDUZIDA, COM A ÚNICA OPÇÃO AO TOYOTA GR SUPRA 3.0

IMT A SER UM PORSCHE CAYMAN 4.0

GTS, CUJO VALOR FINAL REAL FICA NUNS ENORMES 140 000€. ORA, A GRANDIOSIDADE DO NOVO GR SUPRA 3.0 IMT ESTÁ EM PERMITIR-NOS

UMA EXPERIÊNCIA DE CONDUÇÃO

EM VIAS DE EXTINÇÃO, TEMPERADA COM A DOSE EXATA DE TECNOLOGIA MODERNA (AJUDA E AMPLIA AO INVÉS DE LIMITAR OU CASTRAR), A UM PREÇO QUE NÃO FOI INFLACIONADO.

Grande Plano 58

PVP BASE

84 560 €

MOTOR TÉRMICO

TIPO

84 560 €

PVP CARRO TESTADO 1570 kg

PESO DO CARRO TESTADO

KM DO CARRO TESTADO

12 623 km

SUSPENSÃO

Coração

Se há um motor que deve ser apreciado sem filtros é este seis cilindos de 340 cv e 500 Nm da BMW, por isso a Toyota o casou com uma caixa manual ZF de seis velocidades e gestão inteligente iMT; gere o binário de forma a termos as passagens mais rápidas e suaves e proporciona a função ponta-tacão. O diferencial é do tipo autoblocante ativo de controlo eletrónico.

Gasolina, 6 cilindros em linha, turbo, injeção direta, dupla árvore de cames à cabeça, 24V, dianteiro longitudinal (atrás do eixo)

CILINDRADA

DIÂMETRO VS CURSO

TAXA DE COMPRESSÃO

POTÊNCIA (CV/RPM)

BINÁRIO COMBINADO

2998 cc

82x94,6 mm

11,0:1

340/5000~6500

500/1600~4500

DADOS DE FÁBRICA TRANSMISSÃO / DIREÇÃO

Caixa manual ZF de 6 velocidades iMT com ponta-tacão automático

RELAÇÕES DE

(KM/H A 1000 RPM) DIFERENCIAL

1ª 8,7; 2ª 15,4; 3ª 23,2;

4ª 30,3; 5ª 35,7; 6ª 42,2;

M.A. 9,6

Autoblocante ativo com variação de bloqueio de 0 a 100% Pinhão e cremalheira com assistência elétrica variável

TRAVÕES, RODAS, PNEUS

TRAVÕES DIANTEIROS

TRAVÕES TRASEIROS

Discos ventilados 348 mm

Discos ventilados 345 mm

255/35 R19, 9j; 275/35 R19, 10j

BANCOS DESPORTIVOS C/MEMÓRIA

APLICAÇÕES EM CARBONO

CÂMARA TRASEIRA

FARÓIS MATRIZ DE LED

ECRÃ TÁTIL

PAINEL DE INSTRUMENTOS DIGITAL

CAIXA MANUAL IMT

PNEUS MICHELIN PILOT SUPER SPORT

AUTOBLOCANTE ATIVO

JANTES FORJADAS DE 19”

SOM FOCAL

MODOS DE CONDUÇÃO HEAD UP DISPLAY

ESCAPE DESPORTIVO

GARANTIA 7 ANOS/160 000 KM

Esqueleto

Centro de gravidade baixo, vias largas e distribuição de pesos 50/50 para cada eixo. A caixa manual e as novas jantes de 19” forjadas permitem reduzir o peso em 21,8 kg, enquanto a redução do material insonorizante e os bancos mais leves poupam outros 16,5 kg. A suspensão tem amortecimento adaptativo revisto e casquilhos mais rígidos nas barras estabilizadoras. Assistência de direção recalibrada.

Ambiente

Simples e funcional! O head up display permite termos as informações necessárias (incluindo a tão fácil de exceder velocidade) mesmo na frente dos olhos e o conta-rotações está em grande plano no centro do paínel de instrumentos. A consola central tem aplicações em carbono de série e um desenho novo, para permitir que a alavanca de comando da caixa manual (reposicionada) possa ser manobrada sem que os de dedos do condutor batam na consola.

Origem

O Supra é o coupé desportivo com motor dianteiro de seis cilindros em linha e tração traseira. O primeiro Toyota com essa arquitetura/conceito é o famoso e raro 2000 GT, enquanto o Supra original foi lançado em 1978 com um 2.0 de 125 cv, para concorrer com o popular Datsun/Nissan Z. No Japão, o nome original era Celica XX (duplo X) e nos outros mercados tinha sim o nome Celica Supra. Esta designação deriva de ambos usarem a plataforma do Celica, mas os XX/ Supra estavam equipados com motor seis em linha.

CONCORRENTE

Porsche 718

Style Edition 300 cv

O Porsche 718 Cayman pode ser adquirido na sua versão base por menos de 80 000€, mas o mais recente Style Edition apresenta uma relação preço/ equipamento mais atrativa por um pémio extra que ronda os 4000€. O motor é mais pequeno e menos potente, mas é um dos poucos coupés desportivos que ainda permite uma experiência de condução “caixa manual”. Já para termos um Caymam com seis cilindros é preciso equacionar seis dígitos.

TOYOTA GR SUPRA 59 x TOYOTA GR SUPRA 3.0 IMT 0—100KM/H 9,9s km/h seg 12,9s 15,9s 20,8s 3,4s 2,3s 220 200 180 160 140 120 80 60 40 20 6 12 18 24 30 100 ACELERAÇÃO DADOS DO TESTE RECUPERAÇÕES C/CAIXA TRAVAGEM RUÍDO INTERNO COMPORTAMENTO 3,0 segundos 1,4 5,1 segundos 3,8 segundos Neutro/Sobrevirador 80-120 KM/H (EM 3ª) 82,6 160—0 KM/H (M) ACELERAÇÃO LATERAL (G) 80-120 KM/H (EM 5ª) 134,0 200—0 KM/H (M) 120 KM/H (DB) 80-120 KM/H (EM 4ª) 67,3 140—0 KM/H (M) TENDÊNCIA 12,5 259 (limidada) 23,2 0-400M (SEGUNDOS) VEL. MÁXIMA (KM/H) 0-1.000M (SEGUNDOS) CONSUMOS l/100 km 11,3 MÉDIO 4,6s 33,3 100—0 KM/H (M) 8,3 50—0 KM/H (M) 7,9s 6,1s 1,4s Largura 1854 mm Distância entre eixos 2470 mm Comprimento 4379 mm Altura 1292 mm 4,6 seg.250 km/h 8,8 l/100 km 0—400M VELOCIDADE MÁXIMA CONSUMO MÉDIO WLTP L/100 KM 198 g/km EMISSÕES CO2 WLTP G/KM JANTE DE 18”
DIREÇÃO
CAIXA
TRANSMISSÃO
DIANTEIRA TRASEIRA CAPACIDADES
1570 kg
kg/cv 167,78 Nm/l 52 litros 113,4 cv/l 290 litros
- PESO/POTÊNCIA BINÁRIO ESPECÍFICO DEPÓSITO POTÊNCIA ESPECÍFICA CAPACIDADE DA MALA
Triângulos sobrepostos, AVS Triângulos sobrepostos, AVS
EQUIPAMENTO
– 4,61
PESO
Série Série Série Série Série Série Série Série Série
Série Série Série Série Série Série

Morgan Plus Six

SE QUER TER SENSAÇÕES DE CONDUÇÃO ÚNICAS E FAZER

DE CADA MOMENTO QUE LEVA O ACELERADOR AO FUNDO

DO CURSO UM ATO RELIGIOSO, ENTÃO O MORGAN PLUS SIX É O SEU CARRO

Baixo, com uma frente extralonga, um habitáculo colocado em cima do eixo traseiro e possuidor duma assinatura estética de outros tempos, na qual, facilmente, os apreciadores da marca fundada em 1901 por Henry Frederick Stanley Morgan reconhecem a inspiração do +4 de 1963, o Morgan Plus Six é um daqueles carros que não passa despercebido em lado nenhum, funcionando como um poderoso desbloqueador de conversa! Aliás, se não se sente confortável com tanta personalidade ou em ser abordado por estranhos na rua, compre antes uma daquelas “caixas de sapatos com rodas” completamente anónimas, não um Morgan.

UM QUARTO COM VISTA SOBRE…

O Morgan Plus Six é um carro pequeno, mas tem uma frente, desproporcionalmente, gigante. Tão grande, que uma das primeiras coisas a que o cérebro precisa de se ajustar é ao facto de o Plus Six chegar às curvas antes de nós. Ou seja, como é tradição na marca, o eixo dianteiro está tão à frente (as rodas dianteiras são mesmo a primeira coisa do carro) e nós sentados tão atrás, logo antes das rodas traseiras, que se só viramos o volante quando chegamos à curva… já fomos! Vá, sobretudo enquanto ainda vamos devagar, não é assim tão grave, apenas ficamos intrigados como é que um carro tão leve com uma direção tão direta e precisa nos obriga a um golpe extra de volante para não acabarmos com a frente em contramão. Mas, mas, não existem mais carros de capot longo? Então e um Caterham, por exemplo? Na verdade, sim, mas, no caso concreto do Caterham, não só vemos as rodas da frente (e até o quanto e para que lado estão viradas), como dadas as reduzidas dimensões e a posição de condução com as pernas ainda mais estendidas do que no Morgan Plus Six, os pés do condutor acabam por estar logo ali atrás das rodas, pelo que os nossos sensores de posicionamento ajustam-se rapidamente a essa

realidade posicional. Ora, no caso do Morgan Plus Six, as rodas não só estão cobertas, embora seja muito fácil de ver onde se encontram, como ficam umas boas dezenas de centímetros à frente dos pedais, o que obriga a um maior reajuste dos ditos sensores no nosso cérebro. De resto, a vista panorâmica sobre a longa frente e a aceleração selvagem são os dois pontos que diferenciam a experiência de condução do Morgan Plus Six de um outro carro qualquer, já que as sensações que provocam são únicas. Nem será exagero dizer que, em matéria de momentos ao volante, há um antes do Morgan Plus Six e um depois do Morgan Plus Six.

ACELERAÇÃO SELVAGEM

Desde o +8, desenhado por Peter Morgan com o motor V8 em alumínio de origem Land Rover, que os Morgan mais potentes se caracterizam por acelerações demolidoras. Se os +8 construídos entre 1968 e 2004 ainda eram feitos com base na tradicional plataforma estreada em 1936, que combinava uma base de travessas de aço com uma estrutura de carroçaria realizada em madeira de freixo, as versões de 2012 a 2018 já tinham por base o chassis em alumínio prensado colado desenvolvido para os carros de competição da classe GT e para o Aero 8, numa definição tecnológica mais próxima dos novos Plus Six lançados em 2020; em 2021 a marca produziu nove unidades da versão especial Plus 8 GTR, com escapes e eletrónica específica para atingir os 380 cv, hardtop, aerodinâmica, jantes, travões e suspensão específicos. Bom, os 340 cv do Plus Six ficam 40 cavalos aquém da potência do Plus 8 GTR, mas o seis cilindros em linha BMW turbo tem uma disponibilidade de binário explosiva logo a baixos regimes (500 Nm das 1600 às 4500 rpm) que mais do que compensa essa desvantagem. Os 4,2 segundos anunciados para os 0 a 100 km/h não fazem justiça à capacidade de aceleração do Plus Six. Primeiro,

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Texto — Pedro Silva Fotos — Luís Duarte

DAS 4000 PEÇAS QUE COMPÕEM UM MORGAN PLUS SIX APENAS CERCA DE 1% SÃO MANTIDAS DA ANTERIOR GERAÇÃO LANÇADA EM 2002

A NOVA PLATAFORMA CX-GENERATION MISTURA A TECNOLOGIA

MODERNA DO CHASSIS EM ALUMÍNIO COLADO E REBITADO COM A

TRADIÇÃO CLÁSSICA DA ESTRUTURA DO HABITÁCULO REALIZADA EM MADEIRA DE FREIXO, QUE FOI MUITO REFORÇADA E MELHORADA

porque, apesar do diferencial autoblocante, devido ao baixo peso e aos pneus de dimensão relativamente reduzida (uns Avon ZV7 de medida 245/40 R18), é impossível colocar toda a potência no chão: mesmo em asfalto seco de elevada aderência, um arranque a fundo é uma experiência memorável e que tem tanto de extasiante como de aterrador; a diferença depende da experiência e capacidade de quem está aos comandos; os pneus gritam, fumegam e assinam o seu desagrado no asfalto com duas linhas pretas aos esses, enquanto o condutor tem de guiar o Morgan com o volante para o manter apontado à direção desejada, sendo que esta selvajaria se mantêm até esgotarmos a 3ª, já para lá dos 100 km/h. Divertido, empolgante e até politicamente incorreto de uma forma deliciosa (ou viciosa, estou indeciso…), mas

não é assim que se sente toda a estupidez do poder de aceleração do Plus Six. Não, para dar uma hipótese justa das rodas traseiras conseguirem colocar a potência no chão temos de estar, pelo menos, a 50/60 km/h antes de esmagarmos o pedal da direita sem contemplações. Esteja o Plus Six em modo Normal, Sport ou Sport+, pouca diferença faz. O seis cilindros BMW e a caixa automática ZF de oito velocidades selecionam a relação mais baixa possível, que a essas velocidades é a 2ª, e o Morgan dispara a “comer estrada” com uma ferocidade que faz lembrar monstros do passado, como os famosos AC Cobra Shelby 427, até porque estamos sentados tão atrás com vista panorâmica sobre o logo capot que conseguimos ver a frente a levantar sob o efeito da transferência de peso; a suspensão dianteira de paralelogramo bem tenta

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OS BANCOS POSSUEM UM FORMATO SIMPLES E BOM APOIO

LATERAL (UMA BOMBA MANUAL PERMITE REGULAR O APOIO LOMBAR), ATÉ PORQUE ESTAMOS ENCAIXADOS NUM TUBO, MAS

SÃO ALGO DUROS E POUCO (OU QUASE NADA) AJUSTÁVEIS

combater esse movimento com geometria anti arfagem, mas não consegue conter todo o poder do “lado negro da força”; 80 a 120 km/h em 2,2 segundos e 80 a 180 km/h em menos de 8 segundos. Irra! Que é bruto... E com a caixa em modo manual a sensação de força ainda pode ser mais instantânea. Seja em 2ª, 3ª, 4ª, 5ª ou 6ª velocidades, desde que a agulha do taquímetro esteja acima das 2000 rpm recebemos uma patada nas costas de cada vez que aceleramos a fundo, e é uma patada em dois estágios: um primeiro momento de força bruta e, depois, acima das 4500 rpm aparece uma urgência estilo catarata que exige coragem e concentração para não sermos mariquinhas e quebrarmos o encanto desta vertigem passando à relação seguinte ou, se formos mesmo de uma cepa ainda mais assustadiça, aliviar o acelerador;

esta aceleração em dois momentos é algo que só sente devido ao baixo peso/inércia do Morgan, pois nem no Toyota GR Supra das páginas anteriores (que pesa mais 500 kg e usa o mesmo motor) se consegue sentir esta transição às 4500/5000 rpm de forma tão acentuada; os 340 cv estão presentes entre as 5000 e as 6500 rpm. De resto, por falar no pedal do acelerador, este é, basicamente, a mesma peça usada em milhares de BMW e tem o seu curso e peso (força da mola) otimizado para estes, que são (pelo menos) 500 kg mais pesados do que o Morgan, pelo que tem um curso de gatilho demasiado curto e um tato demasiado pesado para o considerado ideal num carro com a relação peso/potência do Morgan Plus Six, que para proporcionar o doseamento ideal devia combinar um curso superior e uma tato mais macio;

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O PLUS SIX ANO MODELO 2023 VEM COM ALGUMAS EVOLUÇÕES DE SEGURANÇA, COMO A PRESENÇA (PELA PRIMEIRA VEZ) DE CONTROLOS DE TRAÇÃO E ESTABILIDADE CALIBRADOS PARA CADA MODO UM DOS MODOS DE CONDUÇÃO: NORMAL, SPORT E SPORT+

essa afinação longa e macia permitiria termos mais controlo no nível de potência colocado nas rodas traseiras, algo fundamental quando debaixo do pé direito temos perto de 350 cv sem a rede de um controlo de tração…

E NAS CURVAS NÃO É PARA INICIADOS

O nosso Plus Six é de 2021, pelo que é a especificação do modelo lançado em 2020, ainda sem controlo de tração e estabilidade; a adoção destas ajudas eletrónicas é uma das novidades do Plus Six ano modelo 2023. Com uma

roda em cada canto (só um Caterham se lhe compara neste quesito), suspensão que combina paralelogramos adaptados a partir de uma geometria MacPherson na dianteira com um eixo de quatro braços na traseira e a nova plataforma CX-Generation em alumínio colado e rebitado (demorou três anos a desenhar e desenvolver), o Plus Six é um carro desenhado para proporcionar um excelente desempenho dinâmico. A construção em perfis e extrusões de alumínio colado, rebitado e aparfusado popularizada pelo Lotus Elise, não só a resposta ideal para desportivos de pequena série em termos de flexibilidade de alterações e custo/facilidade de produção,

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ESTA UNIDADE ESTÁ EQUIPADA COM ALGUMAS OPÇÕES DE PERSONALIZAÇÃO

VALIOSAS, COMO AS JANTES PINTADAS EM PRETO, A CAPOTA AZUL, O

TABLIER EM RAIZ DE NOGUEIRA, E O REGISTO FOTOGRÁFICO DA PRODUÇÃO!

como garante baixo peso e elevados níveis de rigidez. Em concreto, a nova CX-Generation aumenta em 100% a rigidez à torção face ao chassis de 2002 dos Plus 8 e Aero 8 e acusa apenas 98 kg de peso na balança; já agora, também aumenta em 200 mm o espaço para as pernas dos ocupantes a partir de um incremento de apenas 20 mm na distância entre eixos. Depois, a taragem de cada conjunto mola amortecedor, do tipo “coil over”, e a rigidez dos apoios foram otimizados para oferecer o melhor compromisso entre comportamento e conforto de rolamento em todos os tipos de piso.

A somar a tudo isto temos ainda o baixo centro de gra-

vidade e um peso reduzido bem repartido por ambos os eixos, pelo que não admira que o Morgan Plus Six mude de direção sem inércia e curve plano com as quatro rodas bem assentes no asfalto. Quando se começa a forçar o ritmo o que aparece primeiro é a subviragem, motivada tanto pelos pneus dianteiros mais estreitos como por uma opção de afinação consciente. Da mesma forma, a direção, direta, informativa e com um ganho de peso progressivo com o aumento dos níveis de apoio e aceleração lateral, também acaba por ser mais pesada do que podia (assim inibe condutores mais nervosos de destabilizarem o Plus Six com golpes de volante desne-

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O HABITÁCULO TEM AQUELE AMBIENTE TÍPICO DOS DESPORTIVOS

BRITÂNICOS DO PÓS 2ª GUERRA MUNDIAL, MINIMALISTA E FUNCIONAL; A ÚNICA MODERNICE É UM ECRÃ POR TRÁS DO VOLANTE. DE RESTO, O MORGAN PLUIS SIX É SEMPRE MELHOR VIVIDO SEM CAPOTA...

cessários), exigindo um pouco mais de empenho físico. Em asfalto seco a tração é excelente, até porque dada a disponibilidade de força e o escalonamento curto da ZF 8HP nas quatro primeiras relações, mesmo em curvas lentas a 3ª é a relação ideal. Mas claro que existe potência para equilibrar o Plus Six de acelerador e até soltar a traseira, isto desde que o condutor tenha a experiência e o conhecimento para tal; e gostávamos de um acelerador ligeiramente mais leve e com mais curso. É que, sobretudo em pisos molhados, o Plus Six não é carro para se meter em mãos menos preparadas. Agora, sabendo o que estamos a fazer e mantendo o respeito pelo Morgan Pkus Six, é um prazer utilizar as patilhas no volante para usar a caixa em modo manual sequencial, o que nos autoriza mais controlo no despejar da potência, e sentir a inebriante aceleração a extrair-nos

das curvas apenas com um toque de contrabrecagem. Já os travões, potentes, seguros e com pinças de quatro êmbolos na frente, podiam ter um pouco mais de ataque inicial, potência e resistência à fadiga, já que são o fator limite quando exploramos toda a enorme performance encerrada no Plus Six numa serra perto de nós; de resto a Morgan sabe isso, já que outra das evoluções da versão de 2023 são os travões Continental/AP Racing.

O CUSTO DE SER DIFERENTE

Esta unidade de demonstração do importador nacional está para venda na Auto Restelo por 119 000€, um valor correto face aos 133 767€ que custaria saído de fábrica. Agora, para muitos será um valor impensável para um

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OUTRA ALTERAÇÃO PARA O MODELO

2023 SÃO OS AMORTECEDORES DE TARAGEM PROGRESSIVA E NOVOS

CASQUILHOS QUE MELHORAM O CONFORTO A BAIXA VELOCIDADE E A PRECISÃO A ALTA VELOCIDADE

carro em que é complicado mantermos uma conversa a velocidades de autoestrada sem elevar a voz (algo que o hard top opcional pode melhorar significativamente por 6000€, sendo um extra de equacionar para quem quer fazer longas distâncias no Plus Six). Porém esse não é o tipo de cliente do Morgan Plus Six. O cliente da Morgan é alguém que aprecia a diferença, conhece a história da marca e quer uma experiência de condução capaz de fazer os desportivos atuais parecerem “carrinhos de ir ao pão”. Ou seja, a experiência de condução de um Morgan só se consegue a bordo de um Morgan, sendo que para esta se tornar ainda mais mecânica só falta a opção de uma caixa manual, algo que a Morgan poderia ir buscar ao Toyota GR Supra iMT das páginas anteriores; e que fabuloso devia ficar o Plus Six com um “stick shifter”! //

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo 6 cilindros em linha BMW, injeção direta gasolina, 24V, distribuição variável Valvetronic, turbo, dianteiro, longitudinal Cilindrada 2998 cc

Potência 340 cv das 5000~6500 rpm

Binário 500 Nm das 1600~4500 rpm

TRANSMISSÃO

Caixa automática, ZF 8HP, 8 velocidades Tração traseira com autoblocante

CARROÇARIA/CHASSIS

Madeira de freixo e alumínio/alumínio

DIREÇÃO Cremalheira com assistência elétrica

TRAVAGEM

Discos ventilados à frente de 315 mm

Discos ventilados atrás de 294 mm

DIMENSÕES

Comprimento 3890 mm

Largura 1756 mm

Altura 1220 mm

Dist. entre eixos 2520 mm

Via dianteira 1492 mm

Via traseira 1492 mm

Peso 1075 kg (vazio), 1229 kg (EU)

Mala - litros

Dep. combustível 55 litros

Pneus 225/40 R18 - 245/40 R18

PRESTAÇÕES

Relação peso/potência 3,16 kg/cv (vazio)

0 a 100 km/h 4,2 s

Velocidade máxima 267 km/h

CONSUMOS

Combinado 7,4 l/100km

Emissões 170 g/km

PREÇO

Novo (modelo 2023) a partir de 120 203€

Unidade ensaiada 119 000€

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE

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Caterham 340R

UM DIA DE CHUVA E SOL. UMA PISTA MEIO SECA

COMPETIÇÃO COM PNEUS QUE GOSTAM DE TEMPERATURA

E UMA ÚNICA INSTRUÇÃO: NÃO BATAS!

Queres vir ao autódromo dar umas voltas no Caterham 340R na quinta feira? Claro que quero! Ok, tens um slot de 10 minutos, isto é, se ninguém estragar o carro antes de chegar a tua vez. Já agora, poucos momentos depois recebo uma mensagem de whatsapp com uma tabela de pilotos e respetivos slots em pista, onde posso ver que o meu é entre as 14:45 e as 14:55. Sou o décimo sétimo e a sessão de testes começa às 9:00; menos mal, com a previsão de chuva pela manhã não invejo os que vão ser recebidos pelo asfalto frio e molhado.

NOVA CATEGORIA

Já agora, enquanto não chega a altura de me sentar ao volante, há tempo para apresentar o Caterham 340R, a novidade que a CRM vai introduzir em 2023 no Troféu Super Seven By Toyo Tyres, criando assim uma classe intermédia entre os 320R e os 420R. O 340R tem o mesmo motor Ford Duratec 2.0 16V do 420R, mas numa especificação ligeiramente mais branda, desenvolvendo “apenas” 170 cv às 7250 rpm e 175 Nm às 6500 rpm, acoplado a uma caixa manual em H de cinco velocidades. O peso anunciado pela marca é de 560 kg, mas como varia com a especificação, pelo que neste R de corridas deve rondar os 545 kg. Comparativamente, os 320R usam o motores 1.6 Ford e Rover com cerca de 135 cv e também uma caixa manual, enquanto os 420R casam o 2.0 Duratec na versão de 185 cv com uma caixa de velocidade sequencial Sadev de 6 relações. Outra diferença importante está em que os 340R e 420R possuem diferencial autoblocante, enquanto o 320R tem um diferencial aberto. Da mesma forma, os dois mais potentes possuem os pneus traseiros de medida mais larga; a unidade de testes do 340R que pilotámos estava equipada com essa medida majorada das borrachas posteriores, mas a CRM ainda não decidiu se vai manter ou fazer os 340R correr com quatro pneus da mesma dimensão, como os 320R, o que tornará a pilotagem mais desafiante e dá mais folga aos pilotos

dos 420R menos bravos de não serem envergonhados. A ideia é criar uma classe intermédia e colocar mais um degrau na progressão, incentivando a acenção e um mercado de carros ativo entre os pilotos. De resto, como carros de competição os Caterham são dos melhores investimentos que existem, pois, como permanecem competitivos e com muitas opções onde correr, tanto em Portugal como na Europa, praticamente não desvalorizam, além de possuírem, por larga margem, a manutenção mais barata face aos tempos por volta que realizam e à competitividade das corridas; começa logo pelo baixo peso fazer com que consumam poucos pneus, travões e… até daquele néctar com aroma “octanado” que tanto apreciamos; 200€ por corrida.

SOZINHO EM CASA

Na verdade, é sozinho em pista, mas como não há nenhum filme com esse nome fica mais “cool” o subtítulo sozinho em casa.

Fato de competição, botas, capacete e deslizo pela abertura lateral do roll bar de competição para dentro do 340R, manobra muito facilitada pelo volante amovível de encaixe rápido. Estou com sorte! A chuva matinal passou e, timidamente, até se consegue ver o sol a espreitar. Mas é só sorte. Não muita sorte. O ar está húmido e, ao contrário do que é habitual no circuito do Estoril, não há vento, pelo que a pista não está seca nem molhada. Está as duas coisas. Enquanto penso em tudo isto, coloco o capacete e aperto/tensiono os cintos de seis apoios, o Tiago Raposo Magalhães vem junto a mim para dar a tática: “Podes ir, tens três voltas, diverte-te e, faças o que fizeres, não saias da pista.” Até parece, mas não é falta de confiança no piloto, é mesmo porque. com a pista entre o seco e o molhado, há dois ou três pontos no Estoril em que a diferença entre a glória e a tragédia não anda muito longe. Por isso vamos com calma. E de imediato dá para perceber que não está nem para trajetória de seco nem de

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MEIO MOLHADA. UM DOS NOVOS CATERHAM 340R DE
Texto — Pedro Silva Fotos — CRM Motorsport

molhado. É caso a caso. Aliás, na primeira volta vou com tantas cautelas que uso a 2ª em três curvas em que não é, de todo, necessário: a 3, a Vip e na entrada da parabólica interior. Mas este quebrar de velocidade excessivo dá para perceber que, mesmo em condições de pista longe das ideais, com os Avon “gordos” no eixo traseiro (no troféu os pneus são os Toyo R888R) e o diferencial autoblocante, o 340R tem imensa tração, permitindo usar/dosear o motor a altos regimes na sua zona de entrega de potência mais agressiva. Parabólica interior, entrar por dentro em 2ª, lento demais, acelerador, ops, escorrega, ir mais por fora à procura de aderência, 3ª, e apontar a uma saída mais reta a tocar já no final do corretor. Resulta, mas, definitivamente, dá para entrar de 3ª com mais velocidade. Fica para a próxima volta. Porém, mais uma vez, o Caterham mostra as enormes vantagens que o baixo peso acarreta num carro (seja ele qual for, ainda mais quando estamos num feito para percorrer uma pista o mais rápido possível), já que permite executar todas estas mudanças de abordagem apenas com pequenos ajustes de direção e acelerador. Adoro este carro! Na curta reta a caminho da orelha a força e a aceleração proporcionadas pelo motor Duratec de dois litros são bem evidentes; com a sua aerodinâmica de porta de celeiro, os Caterham ganham muito tempo face a carros mais potentes e pesados nos primeiros 200 m das retas, onde recuperam velocidade de forma muito mais rápida. Por outro lado, esta dificuldade em abrir o buraco no ar acima dos 160/180 km/h é um vetor fundamental da competitividade e emoção das corri-

das dos Caterham, e tudo sem necessidade de ajudas artificias estilo DRS ou Push to Pass, já que quem vai na frente acaba por “aspirar” os que vêm atrás. Ou seja, tomando o Estoril por exemplo, quem sai da Vip ou da parabólica Ayrton Senna a liderar um pelotão de Caterham raramente prevalece na frente no final da reta; na verdade, no caso da reta da meta, que tem mais de 900 m, há espaço e tempo suficientes para que os grandes beneficiados sejam os carros que vinham em 3ª ou 4ª lugar, ou até que o primeiro se deixe ultrapassar relativamente cedo e ainda consiga ser, de novo, aspirado pelo seu adversário. O resultado são corridas memoráveis, tanto para quem está no cockpit como para quem está a ver, discutidas até ao último metro, sendo que, também em oposição ao que é hábito, este efeito de aspiração ainda é mais poderoso nas versões mais potentes, uma vez que estas aceleram mais rápido até à velocidade “de muro” crítica. Lindo, até pareço o Michel Vaillant! Consigo pensar em tudo isto na meia dúzia de segundos que o 340R demora até chegar à curva da orelha, que com a sua entrada a descer em releve invertido dá sempre momentos de pilotagem interessantes. Mas hoje estou cauteloso, pelo que só provoco uma pequena escorregadela na saída; cauteloso, mas não morto, além de que o estilo e o prazer são fundamentais.

E agora o grande desafio do Estoril, a curva do Tanque, a única que resta do desenho original, e, como tal, à moda antiga: cega; estreita; rápida; com os rails logo no limite do asfalto e margem de erro zero… Esta curva extraordinária fica mesmo no limite dos terrenos do

CATERHAM - CIRCUITO DO ESTORIL 69

autódromo, pelo que não permite o afastamento dos rails e a criação de uma grande escapatória e obrigou à construção da odiada e lenta variante que, no entanto, apesar de não representar o desafio do Tanque é uma zona muito técnica, quer para pilotos quer para afinação do carro. Por tudo isso não faço a curva do Tanque vai para mais de vinte anos; as corridas que tenho disputado, os testes e as apresentações usam o percurso homologado pela FIA que passa pela variante. Mas hoje é pelo Tanque, uma curva que é definida pela velocidade que escolhemos carregar e pelo golpe de volante inicial, dois comprometimentos que temos de fazer… às cegas, exigindo coragem, precisão, consistência e treino. Na curta reta a subir que antecede esta aventura dá para esgotar a 3ª e engrenar 4ª, pelo que já vamos bem aviados de velocidade quando a consciência obriga a um toque de travão antes de entrarmos em 4ª, opção consciente que faz com que o 340R seja menos nervoso na última dificuldade que o Tanque reserva, um topo em pleno apoio que leva a que os carros fiquem leves e percam, momentaneamente, aderência; isto faz do Tanque um rara curva em três dimensões, como a combinação Eau Rouge e Raidillon em SPA ou o Saca Rolhas em Laguna Seca.

A seguir travamos e reduzimos para 3ª para deslizar-

mos pela esquerda dos esses (aqui podemos manipular muito bem o 340R com os travões e o acelerador para obtermos a atitude que quisermos). Entramos na parabólica a meia pista em 3ª, “short shift” para 4ª e mantemos uma aceleração controlada até avistarmos a saída, momento em que esmagamos o acelerador; esta parte da pista está seca e dá até para alargar a saída por cima do corretor.

Nesta altura vejo que o outro Caterham que estava em pista entra na Box, o que quer dizer que nas próximas duas voltas tenho o autódromo só para mim. É repetir tudo só que um pouco mais depressa, usando a 3ª nas curvas 3, Vip e parabólica interior (mais velocidade, ainda mais tração e reações mais progressivas da traseira na reacelereção), curtindo as delícias dum ponta tacão suave (na pista de aderência incerta a traseira pode descolar se as reduções forem muito agressivas e sem compensação de rotação do motor) e duma manipulação do realinhamento final de acelerador, já com o volante praticamente direito. É claro que, para não correr riscos, e mesmo com o 340R a provar que estanca facilmente no final da reta, travo com a placa dos 100 à vista e uma pressão moderada no pedal (maravilhas de um peso combinado carro piloto inferior a 650 kg). De resto, todas as travagens são todas feitas com

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boa margem de segurança, não vá o diabo tentar... Aliás, como estou a gostar tanto do 340R e no final da 2ª volta vejo que não está ninguém no muro das boxes a controlar as passagens, ainda penso em não entrar na seguinte e prolongar mais dois minutos a diversão. Porém, mandam as regras de um bom convidado que se cumpram as instruções do anfitrião, até porque queremos continuar a merecer essa confiança. Pronto, está feito, e com o carro impecável como me foi pedido. Ainda assim, a experiência foi suficiente para constatar que o 340R representa um bom salto face ao 320R (até diria que fica mais próximo do 420R do que do 320R), com um conjunto motor caixa bem superior, mais potência a todos os regimes e caixa mais rápida com relações bem próximas, bem como dotado de diferencial autoblocante.

QUERO CORRER! QUANTO CUSTA?

Bom, bom, está comprado. Agora é só preciso saber quanto custa. Mas, antes de revelar o valor, vou começar por dizer o que está incluído; o pessoal do marketing das marcas ensinou-me que é assim que se faz, para despertar o interesse. Então, pelo valor que vamos revelar no fim, a CRM Motorsport tem o prazer de lhe vender um Caterham 340R Championship (a versão de competição, mas matriculável ao contrário do 420R) completamente novo, com arco de segurança FIA, duas bacquets homo-

logadas da Tillett, um volante Momo Suede amovível com encaixe rápido e jantes pretas. Como ao comprar o 340R se torna um piloto de corridas, a CRM acrescenta ao negócio um dia de testes, seis fins de semana de corridas com inscrições e seguro de prova (4 deles ibéricos e com duas corridas cada um), acesso ao lounge da CRM nos circuitos e serviço de fornecimento de peças nas provas. Tudo isto tem um custo de 49 950€ mais IVA, ao que será preciso somar os custos das estadias, deslocações, combustível (200€ por prova), pneus (450€ a cada duas provas, ou três vezes por ano), licença, fato de competição completo e algum para despesas imprevistas. Isto é se quiser ser dono do 340R, o que representa um ativo que, praticamente, não perde valor.

A outra hipótese é alugar o carro, o que tanto pode ser feito para a época toda como corrida a corrida; os preços variam entre os cerca de 3500€ para um teste no Autódromo do Estoril e um pouco mais de 7000€ para a corrida mais cara das disputadas em Portugal e Espanha (o Caterham 340R também lhe permite estar nas corridas do troféu europeu, que visita pistas como SPA e Monza, entre outras) e só tem de aparecer com a licença, o fato e capacete. Se fizer o campeonato todo nestes moldes (seis fins de semana e doze corridas), o custo ronda os 45 000€ mais IVA.

Tudo dito, agora vou preparar uma apresentação para ir à caça de patrocinios e dum companheiro de aventura para dividir as despesas, já que o carro pode ser partilhado: de preferência com quem não bata. //

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Alfa Romeo 75

2.0 Twin Spark (1989)

O ÚLTIMO ALFA ROMEO DE TRAÇÃO TRASEIRA DESENHADO

O mercado dos carros clássicos, ou apenas antigos (avisamos já que não vamos ter aqui esta apaixo-nante discussão/dissertação, isso é bom para tertúlias, ou Facebook, que o papel é caro…) tem um funcionamento curioso. Quando uma combinação marca/carro entra na moda os preços disparam até que ficam, como dizem os profissionais, fora do mercado; a tradução para as pessoas normais é tão estupidamente caros que deixam de se conseguir vender. Como em tudo na vida e na natureza, se algo sai outra tem de entrar para se manter o equilíbrio. Assim, a resposta do mercado é substituir o foco de interesse para outro carro dessa marca. Ora, em matéria dos Alfa Romeo dos anos setenta e oitenta, o 75 tem tudo para ser o próximo alvo desta corrida: tração traseira com soluções técnicas exclusivas da Alfa; o motor de quatro cilindros com duas árvores de cames à cabeça e (em algumas versões) duas velas por cilindro; estética inconfundível plena de personalidade e até um bom pedrigree de competi-ção, tanto em ralis (Grupo N e A, com Yves Loubet) como pista (Grupo A com os 1.8 Turbo e Turbo Evo-luzione). E quais as versões/motorizações mais interessantes? Bom, os V6 Busso 2.5 ou 3.0 e os Turbo já começaram a disparar, pelo que, para nós, a melhor experiência de condução do Alfa Romeo 75 está nos primeiros 1.6 da Série 1 com dois carburadores duplos e nos dois litros Twin Spark com injeção, o qual acrescenta mais potência e um diferencial autoblocante de série.

DUPLA IGNIÇÃO E VARIADOR DE FASE

O Alfa Romeo 75 (Tipo 161 e 162B) foi o último carro projetado pela marca antes da aquisição pela Fiat. Foi apresentado em 1985 para substituir o Giulietta e vendido até 1992. A plataforma e a mecânica partilhavam muitas das peças e arquitetura com o seu antecessor, destacando-se o conjunto embraia-gem/caixa e diferencial transaxle montado junto ao eixo traseiro, o que melhorava a distribuição de pesos e representava um refinamento técnico único no segmento, e que no mercado normal só era (também) usado pela Porsche. O veio de transmissão de duas peças é aparafusado diretamente na cambota e roda à mesma velocidade do motor, enquanto o eixo traseiro conta com uma ponte De Dion em que os discos estão colocados na saída do diferencial, para reduzir o peso não suspenso, e na frente temos uma geometria de triângulos sobrepostos com barra de torção encastrada no triângulo inferior. Em fevereiro de 1987 o motor 2000 ganhou uma nova cabeça com duas velas por cilindro, menor abertura do ângulo das válvulas, para assim se obter uma conduta de admissão mais vertical, mais reta e com espaço para uma válvula de maior diâmetro, bem como variador de fase na admissão (solução estreada pela Alfa no Spider de 1980). Tudo somado, a melhoria dos rendimentos volumétrico e termodinâmico permitiu ganhar 20 cv de potência, passando dos

Carros com História 72
E PROJETADO ANTES DA COMPRA PELA FIAT AINDA PODE SER COMPRADO POR VALORES RAZOÁVEIS, PELO QUE É APROVEITAR ENQUANTO ESTÁ
ASSIM
Texto — Pedro Silva Fotos — Luís Duarte

O ALFA ROMEO 75 DEVE O SEU NOME POR TER SIDO LANÇADO NO MERCADO NO ANO EM QUE A MARCA CUMPRIA OS SEUS 75 ANOS DE PRODUÇÃO

128 cv às 5400 rpm para os 148 cv às 5800 rpm. Depois, em outubro de 1988 veio o restyling, denominado Série II (Tipo 162B) e reconhecido pela nova grelha e pelos grupos óticos traseiros em vermelho. Matriculado no início de 1989, o 75 2.0 TS que protagoniza o “Carros com história” é uma das primeiras unidades da Série II que chegou a Portugal.

CALOR E… EQUILÍBRIO MANIPULÁVEL

A injeção Bosch Motronic ME7, a direção assistida e o ar condicionado fazem com que o 75 2.0 Twin Spark seja uma bela proposta para um clássico de uso diário, ou pelo menos frequente; nos tempos que correm, com a moda do teletrabalho, acaba por ser um excelente tónico capaz de tornar mais felizes aqueles dias em que temos de ir ao escritório… Na verdade, o maior entrave a este tipo de uso está no

facto de, como é norma nos carros italianos, começarem a faltar no mercado de peças de reposição alguns elementos de carroçaria, que podem ser coisas tão simples, mas cruciais, como as quatro borrachas que separam/isolam os alargamentos das cavas das rodas do metal da carroçaria. Como já vimos a embraiagem e a caixa do 75 estão montadas junto ao eixo traseiro, pelo que este afastamento do motor não lhes permite beneficiar do calor rejeitado por este para ajudar a aquecer o óleo lubrificante, o que justifica uma certa dureza e renitência para o manuseio nos primeiros quilómetros; em dias frios pode tardar mais de 10 km até aquecer, pelo que convém ir para o escritório pelo caminho mais longo, algo que ao volante de um Alfa Romeo até acaba por ser a opção mais natural, e sentir as engrenagens com carinho até que o óleo ganhe temperatura e atinja o grau de viscosidade correto, pois enquanto este se encontra espesso os sincronizado-

Carros com História 74

PARTE DO SUCESSO COMERCIAL DO 75 DEVE SER ATRIBUÍDO A UMA COMPLETA GAMA DE MOTORES, COM SEIS MOTORES A GASOLINA DE QUATRO E SEIS

CILINDROS (1.6, 1.8, 1.8 TURBO, 2.0, 2.5 V6 E 3.0 V6) E DOIS DIESEL (2.0 TURBO E 2.4 TURBO)

res são algo lentos e pouco eficazes a desempenhar a sua função. Mas não é defeito, é feitio decorrente da solução transaxle. Na realidade, para ficar fluido e natural, o 75 precisa de algum calor e duma condução decidida. Se é uma realidade indiscutível que a injeção torna mais fácil a condução no meio do trânsito, também o é que não há nada com a mesma resposta ao acelerador do que um motor Alfa Romeo com um corpo de carburador para cada cilindro, pelo que, a baixas velocidades, seja do carro seja do regime de rotação do motor, o potente dois litros deste Série II acaba por ser menos explosivo do que o 1600 com dois Weber duplos de um 75 Série I, para além de também perder muito do cantar de indução; parte da resposta perdida é causada pelas preocupações com as emissões e consumos, que não deixavam a injeção enriquecer tanto a mistura na aceleração inicial, o que ajuda a acordar o motor e proporciona

uma subida de regime mais rápida. Lá está: calor; decisão e carga!

De facto, apesar de ser um dos primeiros motores de série com variador de fase na distribuição, o ponto forte do dois litros são os médios regimes, entre as 3000 (que marca o fim da faixa verde sólida do conta rotações, a mais económica e ecológica) e as 5000 rpm; principalmente em 2ª e 3ª, quando sen-timos bem o pico dos 186 Nm de binário colocado às 4000 rpm, relações em que o “bialbero” também sobe sem dificuldade até às 5800/6200 rpm (a zona amarela). Depois de ter o óleo à temperatura de funcionamento a caixa fica mais rápida e suave, se bem que continue a apreciar um manuseamento firme e preciso, em que o domínio do ponta tacão facilita muito reduções rápidas a alto regime. A retribuição está lá, apenas temos de fazer por merece-la.

E o mesmo se passa com o comportamento dinâ-

ALFA ROMEO 75 2.0 TWIN SPARK 75

COM VARIADOR DE FASE NA ADMISSÃO, DUAS VELAS POR CILINDRO, CAIXA TRANSAXLE E DISCOS TRASEIROS MONTADOS JUNTO AO

DIFERENCIAL PARA REDUZIR O PESO NÃO SUSPENSO, O 75 ERA UM

CARRO BASTANTE EVOLUÍDO E DIFERENTE DE TODOS OS CONCORRENTES

mico. Sendo a distribuição de pesos bastante mais equilibrada do que é norma nas berlinas contemporâneas, quer fosse um rival tudo à frente com motor colocado na orientação Oeste/Este quer com motor Norte/Sul atracado à caixa de velocidades e tração traseira, a suspensão traseira de ponte De Dion com paralelogramo de Watt muito boa a manter as rodas traseiras paralelas ao asfalto e a evitar movimentos de alteração de convergência em apoio com efeitos direcionais indesejáveis, e a aerodinâmica bastante mais eficiente do que as linhas aparentam (a traseira alta ajuda e o pequeno aileron na tampa da mala também não prejudica, com o valor do Cx a ser de 0,36, contra os mais de 0,40 do BMW E30), é natural que o 75 seja bastante estável a alta velocidade e em zonas de bom piso, com boa tração e aderência. O problema são os pisos mais deformados, onde o eixo De Dion acusa alguma inércia de movimentos e pode fazer com que as rodas saltitem, mesmo que os discos colocados à saída do diferencial ajudem a reduzir a massa não suspensa das rodas traseiras. Da mesma forma, se quisermos uma inscrição rápida e precisa em curvas lentas não basta virar o

volante, já que o resultado mais provável é subviragem. Não, para entramos em curva depressa e onde queremos, o 75 exige ser manipulado com os travões e a direção, colocando assim o peso onde queremos e incentivando a rotação; a boa distribuição de pesos faz com que o aliviar do pé ou a travagem em apoio resultem num rodar progressivo da traseira, ao passo que o autoblocante facilita o controlo dessas derivas com o acelerador. Aliás, em asfalto seco de elevada aderência, é quase impossível conseguir deslocar a traseira só de acelerador, necessitando essa atitude de ser induzida por uma prévia manipulação do binómio peso/inércia; já com fraca aderência, é natural que uma aceleradela mais generosa em 2ª ou 3ª seja brindada com um início de power slide, que se pode optar por manter (novamente, o autoblocante e a boa tração conferida pelo peso da caixa traseira ajudam) ou anular, consoante seja mais adequado face à situação e à inspiração. Todavia, para além destas diabruras, com a potência e o conforto que possui, outro palco onde o 75 2.0 TS brilha é em estrada e autoestrada, conseguindo manter rirmos modernos sem qualquer dificulda-

Carros com História 76

O ALFA ROMEO 75 FOI UM VERDADEIRO

SUCESSO COMERCIAL: MAIS DE 230 MIL UNIDADES VENDIDAS EM APENAS TRÊS ANOS E PERTO DE 390

MIL UNIDADES ENTRE 1985 E 1992

de, estando, pois, especialmente adaptado e recomendado para quem queira descobrir o universo dos encontros de clubes Alfa Romeo internacionais. Em resumo, o 75 2.0 Twin Spark é uma excelente escolha para entrar no mundo dos clássicos moder-nos e nas sensações de condução de um verdadeiro Alfa Romeo, tanto em matéria de soluções mecânicas únicas como da tração traseira.

O QUE DIZ O MERCADO

Por enquanto, tirando as versões com o Busso V6 e os 1.8 Turbo, que já começaram a disparar, os ou-tros 75 ainda possuem um preço mais dependente do estado (a corrosão num pais como Portugal não é tão relevante como nos carros das décadas anteriores, mas isso e sinais de acidentes mal reparados valem a pena verificar), dos quilómetros e do historial (manutenção, número de proprietários, se habitou perto do mar, enfim, o normal…) do que se é um 1600 ou um 2000. É claro que um 2000 TS com o desejável autoblocante e injeção como este pode ficar entre os 12 500 e os 15 000€, enquanto um excelente 1600 a carburadores da Série I só muito dificilmente ultrapassa os cinco dígitos. //

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo 4 cil. em linha, bloco em ferro e cabeça em alumínio, 16V DOHC, injeção eletrónica, dupla ignição

Cilindrada 1962 cc

Potência 148 cv/5800 rpm

Binário 186 Nm/4000 rpm

TRANSMISSÃO

Tração traseira c/autoblocante, ransaxle, caixa manual de 5 velocidades

CARROÇARIA/CHASSIS

Aço/aço

DIREÇÃO

Pinhão e cremalheira com assistência hidráulica

TRAVAGEM

Discos ventilados de 265 mm à frente Discos internos de 250 mm atrás

DIMENSÕES

Comprimento 4330 mm

Largura 1660 mm

Altura 1400 mm

Distância entre eixos 2510 mm

Peso 1160/1195 kg

Mala 500 litros

Depósito de combustível 49 litros

Pneus 195/60 HR 14

PRESTAÇÕES

Velocidade 205 km/h

0-100 km/h 9,0 seg.

CONSUMOS DIN

8 a 15 l/100 km

PREÇO

Novo -

Cotação 9 000 a 15 000€

AVALIAÇÃO AUTO DRIVE
ALFA ROMEO 75 2.0 TWIN SPARK 77

Lancia Rally 037

HÁ 40 ANOS, O LANCIA RALLY 037 DEU À MARCA ITALIANA O ÚLTIMO TÍTULO DE CONSTRUTORES NO WRC CONQUISTADO POR UM CARRO DE TRAÇÃO ATRÁS.

UM FEITO INCRÍVEL, SE NOS LEMBRARMOS QUE O SEU GRANDE RIVAL ERA O REVOLUCIONÁRIO AUDI QUATTRO

O grupo Fiat ainda estava a utilizar o 131 Abarth no campeonato do mundo de ralis no início dos anos 1980, quando a Audi chegou com o “quattro” e mudou os ralis para sempre. Com tração às quatro rodas e um motor de cinco cilindros em linha turbcomprimido, o quattro rapidamente mostrou qual era a melhor receita para dominar o mundial de ralis nos mais diversos tipos de superfícies, sobretudo na terra e na neve, ou gelo. Nesta altura, ainda o regulamento técnico vigente usava as regras do Grupo 4, mas o Grupo B estava anunciado para entrar em vigor em 1982, com vários carros a transitar de um regulamento para o outro, incluindo o próprio Audi quattro que tem homologação em ambos. Quanto ao grupo Fiat, a administração tinha que tomar algumas decisões difíceis relacionadas com a sua permanência no WRC. Depois de ter mandado o Lancia Stratos HF para a reforma precocemente em 1976, dando lugar ao Fiat 131 Abarth por motivos de marketing, agora a decisão foi no sentido oposto. A Lancia ia regressar aos ralis. Mas os italianos não estavam prontos para seguir a Audi com um carro de quatro rodas motrizes, por isso decidiram tomar um caminho diferente: um carro desportivo de dois lugares, leve, com motor central e tração atrás. A Abarth estava pronta para começar a trabalhar, mas era preciso encontrar uma base. Olhando para o catálogo da Lancia na altura, o coupé de motor central Beta Montecarlo foi escolhido como o ponto de partida mais adequado. Na verdade, esse modelo, que a Lancia usava como base para as sua participaçõs no mundial de resistência, também serviu para fazer uma versão para o Giro de Itália, uma prova que incluia classificativas de rali e provas em circuito. Por isso já havia algum trabalho feito para adaptar o carro a utilização em estradas de afalto. Mas o novo modelo para o WRC, que recebeu o código interno Abarth SE037, tinha que passar por um pormenorizado programa de desenvolvimento para a condução em pisos de terra e neve ou gelo.

COMPRESSOR MECÂNICO

Assim, do Beta Montecarlo original apenas foi aproveitada a célula central em aço do habitáculo e foi escolhida a versão descapotável, com teto targa. Por uma razão simples: os pilotos da equipa eram altos e foi preciso fazer um tejadilho com duas bossas, ao melhor estilo Zagato, para que Alén e Röhrl lá conseguissem caber. Depois, a Abarth teve que desenhar dois subchassis tubulares em aço cromo-molibdénio, um dianteiro e outro traseiro. No da frente foi ancorada a suspensão de triângulos sobrepostos, direção, radiador e ainda sobrou espaço para uma roda suplente. Atrás, o subchassis suportava o conjunto motor/transmissão em posição longitudinal (menor distância entre-eixos e mais agilidade) e a suspensão, que tinha dois amortecedores por roda atrás O motor foi desenvolvido a partir do quatro cilindros 2.0 litros de 16 válvulas do 131 Abarth, um motor atmosférico que recebeu um compressor mecânico do tipo Roots. O engenheiro-chefe Aurelio Lampredi acreditava que este tipo de sobrealimentação era uma solução mais adaptada ao 037, pois não tinha o tempo de resposta dos turbos desta altura. O ponto negativo era que o compressor, ao ser acionado pelo motor, acabava por limitar a potência máxima que se podia extrair do motor. Nos anos seguintes, isso ficaria bem claro, com o desenvolvimento dos turbocompressores e com a Lancia a juntar os dois sistemas no modelo que sucederia ao 037, o Delta S4. Para compensar o efeito de “roubo” de potência do accionamento do compressor mecânico, a Abarth instalou um sistema de injeção de água na admissão antes do compressor, para baixar a temperatura do ar, aumentar a densidade e maximizar a potência. Ainda foi estudada a hipótese de usar um intercooler, nos anos seguintes, mas acabou por ser considerado demasiado complexo, para aquilo que poderia trazer de positivo.

Magazine 78
Texto — Francisco Mota

DEPOIS DE TER MANDADO O LANCIA STRATOS HF PARA A REFORMA

PRECOCEMENTE, EM 1976, A DECISÃO DA ADMINISTRAÇÃO DA FIAT PARA O

GRUPO B FOI NO SENTIDO OPOSTO: A LANCIA IA REGRESSAR AOS RALIS!

ESTILO PININFARINA

O estilo do Rally 037 foi um trabalho de Pininfarina, condicionado pelas formas da célula central do Beta Montecarlo e pelos chamados “hard points” fornecidos pelos engenheiros da Abarth. A Pininfarina só teve que “vestir” a estrutura com um estilo que tivesse alguma coisa a ver com outros modelos da Lancia, nomeadamente o Beta Montecarlo. A grelha era a tradicional, ladeada por quatro faróis, uma linha de perfil muito baixa e com um óculo de “plexiglas” sobre o motor que deixava a mecânica bem à vista. Para tornar o acesso à mecânica o mais simples possível nas zonas de assistência, toda a frente e toda a traseira eram formadas por dois enormes “capots”, que se levantavam para os mecânicos trabalharem. Todos os painéis exteriores eram feitos de materiais compósitos, para manter o peso o mais baixo possível. A Dalllara construíu o primeiro chassis em setembro de 1980 e a Abarth montou a mecânica a tempo de fazer o primeiro “shake down” em dezembro, ainda com uma carroçaria provisória. A necessidade de uma grande asa traseira foi uma conclusão tirada dos primeiros testes.

Várias asas rudimentares foram testadas até que uma forma final foi encontrada e fabricada em fibra de vidro. Os 200 carros de estrada que tinham de ser construídos para poder homologar um novo modelo em Grupo B, tinham quatro faróis dianteiros de pequeno diâmetro e luzes traseiras de forma trapezoidal, além de vidros das portas de descer, com manivela. A pedido da FIA, a asa traseira era fornecida aos compradores como um acessório, com todas as peças necessárias à sua montagem, caso o cliente assim o desejasse. Quando montada, retirava toda a visibilidade através do retrovisor interior. Enquanto a equipa de competição da Abarth continuava ocupada com as participações do 131 Abarth em algumas das provas do campeonato de 1981, tendo o modelo ganho a sua última prova precisamente no rali de Portugal de 1981, com Markku Alén ao volante, a equipa de desenvolvimento tinha outras preocupações. O ano foi gasto a desenvolver a versão de ralis do Rally 037. Foram feitos testes em túnel de vento, testes de pneus em asfalto e terra e até testes de baixa temperatura, usando uma câmara de frio do grupo Fiat. No final do ano, alguns testes foram repetidos, já com a carroçaria final instalada, só para ter a certeza que estava tudo como devia.

LANCIA RALLY 037 79

DO BETA MONTECARLO ORIGINAL APENAS FOI APROVEITADA A CÉLULA CENTRAL

TETO TARGA. POR UMA RAZÃO SIMPLES: OS PILOTOS DA EQUIPA ERAM ALTOS E FOI PRECISO FAZER UM TEJADILHO COM DUAS BOSSAS

FEITAS 220 UNIDADES

O trabalho da Pininfarina foi feito em estreita ligação com a engenharia e algumas coisas tiveram de ser alteradas desde o primeiro desenho. Por exemplo, as “orelhas” atrás das portas só apareceram depois de terem sido testadas entradas de ar mais baixas. Mas estas deixavam entrar demasiada sujidade, lançada pelas rodas da frente em pisos de terra ou mesmo neve.

Por esta altura, o Beta Montecarlo estava prestes a ser retirado de produção. A Abarth teve que se apressar e pedir à linha de produção da Lancia para lhe entregar as 220 células centrais de que necessitava para construir as 200 unidades de venda ao público e as 20 unidades de evolução, previstas no regulamento, que eram os verdadeiros carros de ralis. O primeiro “shake down” tinha sido feito a 23 de dezembro de 1980 por Giorgio Pianta, o famoso engenheiro e piloto de testes da Abarth. O teste do 037-001 foi feito em Campo Volo, um aeródromo vizinho das instalações da Abarth em

Corso Marche, o que era o procedimento habitual para todos os carros de competição concebidos pela Abarth. O desenvolvimento da versão de estrada e da versão de ralis foi feito em paralelo, a primeira foi apresentada no salão de Turim de 1982. Anunciava 205 cv de potência máxima e uma aceleração 0-100 km/h em 7,0 segundos com velocidade máxima de 220 km/h. O peso era de 1170 kg, para um comprimento de apenas 3915 mm e altura de 1254 mm. A primeira versão de ralis foi homologada a 1 de abril de 1982, mesmo a tempo de se estrear no rali do campeonato da Europa, Costa Esmeralda, na Sardenha. Foram inscritos dois carros, para Alén e Bettega e andaram de imediato muito depressa. Mas ambos tiveram que abandonar com problemas de caixa de velocidades. Poucas semanas depois, o 037 fez a sua estreia no WRC, no rali Tour de Corse. Bettega teve um acidente grave e partiu as pernas, o que o afastou da competição durante vários meses. Alén terminou em nono e recolheu informação preciosa para o desenvolvimento do carro. A prova seguinte do 037 no WRC foi o rali da Acrópole, na Grécia,

Magazine 80
EM AÇO DO HABITÁCULO E FOI ESCOLHIDA A VERSÃO DESCAPOTÁVEL, COM

A PEDIDO DA FIA, A ASA TRASEIRA ERA FORNECIDA AOS COMPRADORES COMO UM ACESSÓRIO, COM TODAS AS PEÇAS NECESSÁRIAS À SUA MONTAGEM, CASO O CLIENTE ASSIM O DESEJASSE. QUANDO MONTADA, RETIRAVA TODA A VISIBILIDADE ATRAVÉS DO RETROVISOR INTERIOR

onde Alén deu ao 037 a sua primeira vitória numa classificativa do WRC e liderou durante pouco tempo a classificação, até que a dureza do terreno acabou por partir o chassis do 037. Adartico Vudafieri, chamado a substituir Bettega, abandonou com uma avaria no compressor.

O RALLY 037 EVO1

De volta a Itália, a Abarth já trabalhava na evolução 1 que incluia várias melhorias importantes. O motor passou de alimentação por carburadores para a injeção mecânica Bosch-Kugelfischer e o sistema de injeção de água para arrefecer o compressor foi finalmente instalado. A carroçaria também foi modificada: os quatro faróis passaram a ter maior diâmetro, foi desenhado um bloco de quatro faróis suplementares de fácil montagem e o spoiler da frente recebeu um “splitter”. Na traseira, as luzes passaram a ser redondas e muito mais pequenas, originárias da Ferrari e uma grelha muito mais aberta cobria toda a traseira. Nesta

configuração Evo 1, o 037 foi homologado a 1 de agosto de 1982, pronto para ser estreado no rali dos 1000 lagos, na Finlândia. O carro de Alén durou apenas quatro classificativas, até o motor ceder, mas ainda ganhou uma delas. No rali de Sanremo, Alén liderou a prova durante algum tempo, até que o motor voltou a ceder. Para preparar o rali RAC, no Reino Unido, a Lancia inscreveu um carro para Alén no Pace Petroleum National Rally Wales e o 037 conquistou a sua primeira vitória. Este treino ajudou Alén a garantir o quarto lugar no RAC, após liderar durante dez classificativas e ter ganho seis.

Em Itália, o piloto privado Tognana venceu o rali de San Marino e conquistou o campeonato nacional, se bem que nas provas anteriores tenha pilotado um Ferrari 308 GTB.

A primeira temporada do Rally 037 Evo 1 tinha terminado e a Lancia estava pronta para um ataque total em 1983. Tanto mais que se apressou a contratar o campeão mundial de pilotos de 1982, Walter Röhrl, que tinha derrotado Michele Mouton e o seu Audi quattro ao volante de um “convencional” Opel Ascona 400.

LANCIA RALLY 037 81

WALTER RÖHRL E O 037 DERAM-SE BEM DESDE O PRIMEIRO TESTE E VENCERAM O RALI DE MONTE CARLO DE 1983. FOI A TERCEIRA DE QUATRO VITÓRIAS DO ALEMÃO NO RALI MAIS FAMOSO DO MUNDO, TODAS COM MARCAS DIFERENTES

GLÓRIA EM 1983

Na sua segunda temporada, o Lancia Rally 037, o primeiro carro projetado inteiramente segundo as regras do Grupo B, foi usado no WRC, mas também no ERC e em vários campeonatos nacionais. Ter o máximo de carros a correr era uma boa maneira de recolher informação e ajudar ao desenvolvimento, além dos lucros das vendas a privados.

Walter Röhrl e o 037 deram-se bem desde o primeiro teste e venceram o rali de Monte Carlo. Foi a terceira de quatro vitórias do alemão no rali mais famoso do mundo, todas com marcas diferentes. Claro que a equipa Martini Lancia, liderada pelo carismático Cesare Fiorio, não deixava nada ao acaso, com uma organização muito superior à das outras equipas, nomeadamente a Audi. Helicópteros, assistências rápidas, aviões com relés para comunicação permanente com os pilotos, nada faltava. Nem alguns expedientes que ficaram célebres, como a contratação dos serviços de lançamento de sal nas estradas nevadas do Monte Carlo, para fazerem uma passagem

suplementar nos troços nevados, poucas horas antes do rali por lá passar.

A equipa tinha decidido concentrar os seus esforços no campeonato de marcas, marcando presença apenas em oito provas, das 12 que faziam parte do campeonato. Deixou de fora as duas que só contavam para o campeonato de pilotos e também não foi ao rali Safari, pois a versão especial reforçada do 037 para África ainda não estava pronta. E também não foram ao RAC pois, por essa altura, já tinha conquistado o título. A Audi foi a todas. Contudo, a Lancia venceu o Tour de Corse e o Sanremo, com Alén, e o Acrópole e Nova Zelândia, com Röhrl, batendo a Audi por dois pontos. Röhrl tinha decidido que não lhe interessava lutar pelo campeonato do mundo e não alinhou em todos os ralis em que a Lancia esteve presente, uma decisão de que se viria a arrepender anos depois. Isso deu hipótese a Hannu Mikkola de se sagrar campeão em 1983, ao volante do Audi quattro. A Lancia conseguia assim o seu quarto título mundial, depois dos três conquistados com o Stratos HF e foi a última marca campeã do mundo com um carro de tração às rodas posteriores.

Magazine 82

PARA 1984, A EQUIPA PASSOU PARA O RALLY 037 EVO 2, COM O MOTOR A PASSAR DE 1995 CC PARA 2111 CC E A POTÊNCIA A SUBIR DOS 270 PARA OS 320 CV. A PRESSÃO DE SOBREALIMENTAÇÃO SUBIU DE 0,7 PARA 1,0 BAR

O INÍCIO DO DECLÍNIO

Para 1984, a equipa passou para o Rally 037 Evo 2, com o motor a progredir de 1995 cc para 2111 cc e a potência a subir dos 270/300 para os 320 cv. A pressão de sobrealimentação subiu de 0,7 para 1,0 bar e foram introduzidas várias outras evoluções de detalhe. O para choques traseiro foi cortado, porque acumulava muita terra e porque dificultava a ação dos mecânicos na assistência, quando o “capot” era levantado. A rigidez do chassis foi aumentada, mas mantendo uma vantagem de peso de 300 kg face ao Audi quattro e um centro de gravidade muito mais baixo. A versão específica para o Safari foi terminada, com maior altura ao solo, suspensão mais resistente e as proteções exteriores necessárias.

Mas o Audi quattro estava mais forte e surgia também o novo Peugeot 205 T16, dificultando a vida ainda mais ao Rally 037 que apenas conseguiu uma vitória no WRC durante todo o ano, por Markku Alén no Tour de Corse, com Biasion a completar um resultado 1-2. Além terminou o Safari num honroso quarto lugar e a equipa conseguiu outros lugares de pódio. Röhrl tinha passado para a Audi e foi substituído

por Henri Toivonen. A Audi venceu ambos os títulos, com Stig Blomqvist a ser o melhor entre os pilotos. Por esta altura, a Abarth já estava profundamente concentrada no desenvolvimento do seu modelo de tração às quatro rodas, o Delta S4 que se estrearia com uma vitória no rali RAC de 1985. Por isso, a época de 1985 foi feita a meio gás pela Lancia, que não marcou presença em todas as provas do WRC. Pior ainda, Attilio Bettega teve um acidente fatal no Tour de Corse, o que afetou a imagem de fragilidade do 037. O melhor resultado do ano foi o segundo lugar de Mikki Biasion no Rali de Portugal. A carreira do Rally 037 tinha chegado ao fim, mas o modelo ainda fez mais uma prova a nível oficial, o Safari de 1986, pois o Delta S4 não foi considerado suficientemente resistente. Alén levou o Rally 037 Evo 2 ao terceiro lugar, atrás dos dois Toyota Celica TCT, que dominavam as provas africanas nessa altura.

Na contabilidade final, o Lancia Rally 037 ganhou apenas seis provas do WRC e um campeonato de marcas, entre 1982 e 1986. Mas também venceu o ERC em 1983 e 1984 e 1985. No total conquistou 274 vitórias, nos vários campeonatos em que participou, garantindo assim um lugar de destaque na história da Lancia no WRC e nos ralis. //

LANCIA RALLY 037 83

Mercedes-Benz 190 (W201)

NO FINAL DE 1982 E MERCEDES-BENZ APRESENTOU AQUELE QUE MUITOS (INCLUINDO NÓS NA AUTODRIVE)

CONSIDERAM O MELHOR MERCEDES DE SEMPRE, O “BABYBENZ“ 190 W201, UM CARRO QUE ESTAVA MUITO À FRENTE DO SEU TEMPO E QUE OBRIGOU A INDÚSTRIA TODA A

ELEVAR OS PADRÕES

O revolucionário Mercedes-Benz 190 W201, também conhecido por “baby-Benz“, foi apresentado aos concessionários a 8 de dezembro de 1982, mas as primeiras entregas em Portugal só aconteceram já em 1983, pelo que não fica mal esta comemoração tardia dos 40 anos do melhor Mercedes de sempre. Porém, a história do “baby-Benz“ começou ainda na década anterior, até porque, nessa altura, um carro novo demorava cerca de cinco anos a passar dos cavaletes do gabinete de desenho às prensas da fábrica. Apesar da crise petrolífera de 1973 e de alguma instabilidade governativa, agravada ainda por reivindicações dos poderosos sindicatos, terrorismo de extrema esquerda e manifestações ativistas dos movimentos verdes, a verdade é que a economia Alemã estava a crescer rapidamente e existia uma classe

média com poder de compra para adquirir carros mais caros, carros melhores, mais rápidos, confortáveis e seguros, para explorarem as autobahn sem limite de velocidade; a BMW, com o sucesso dos 02 e com os primeiros Série 3 (E21), provou que existia um mercado que estava a escapar à Mercedes, pelo que a administração da marca de Estugarda deu luz verde para a o projeto W201, o Mercedes-Benz que não podia falhar! Os estudos inicias foram aprovados em 1974 pelo Professor Hans Scherenberg, um dos membros da administração, e a decisão final de ir em frente foi tomada em outubro de 1978 com um caderno de encargos simples e direto: “Este carro tem de ser um verdadeiro Mercedes, sem quaisquer concessões ao nível das qualidades de condução, do conforto ou da segurança típicos da marca“.

Once Upon a Drive 84
Texto — Pedro Silva

O CARRO MAIS AVANÇADO DO MUNDO

Assim sendo, para o desenvolvimento do 190 W201 a Mercedes não poupou em nada, investindo até na modernização das instalações de produção na fábrica de Sindelfingen, em Estugarda, e construindo uma nova fábrica em Nordwerk, Bremen. Esta ex fábrica da Bogward, em que a Mercedes investiu 1,4 mil milhões de marcos, era na época a mais avançada do mundo, sendo, por exemplo, a primeira em que os eixos eram montados automaticamente. O 190 W201 foi lançado com o moderno quatro cilindros M102 de 1997 cc introduzido em 1983 no W123, nas versões 190 (carburador) e 190 E (injeção eletrónica), ambas a gasolina. A versão a carburador tinha 90 cv e a de injeção atingia os 122 cv, sendo que ambas estavam acopladas a uma caixa manual de quatro velocidade ou, em opção, de cinco velocidades; na prática as quatro primeiras relações eram

iguais às da caixa de 4 e a 5ª uma espécie de “overdrive“ para reduzir os consumos, o nível sonoro e o desgaste do motor a elevadas velocidades de cruzeiro. Durante o ano de 1983 surgiu o mítico 190D com 72 cv, um carro que ganhou a fama de indestrutível em que o primeiro milhão de quilómetros era considerado a rodagem e que até, à chegada dos baratos e económicos Dacia Sandero, dominou por completo o mercado dos Táxis em Portugal, com o maior concorrente a ser o Mercedes 200D W124.

Em suma, o 190 W201 era o carro mais avançado no Mundo quando foi lançado, contando com uma carroçaria integralmente galvanizada (até à ferrugem resistem) muito aerodinâmica (cx de 0,34) e especialmente cuidada ao nível da segurança ativa e do comportamento em colisões (zonas de deformação programada e uma das primeiras aplicações de aços de alta resistência na indústria automóvel), incluindo um subchassis dianteiro em formato de garfo de aço de alta resistência que permitia controlar com

O MERCEDES-BENZ 190 W201 FOI O CARRO QUE TROUXE DE VOLTA A ESTRELA ÀS COMPETIÇÕES AUTOMÓVEIS A NÍVEL OFICIAL, PARA ALÉM DE A CORRIDA DE ESTREIA DA VERSÃO

190E 2.3-16 TER SIDO A PRIMEIRA DAS VITÓRIAS DE

UM

TAL SENNA, FRENTE AOS SEUS RIVAIS PILOTOS DE F1

precisão a deformação em caso de acidente e ainda poupava 8 kg ao peso final; neste como noutros aspetos o 190 W201 foi o modelo para a geração seguinte de todos os Mercedes-Benz. Ainda em matéria de segurança, tinha o sistema ABS em opção e uma inédita suspensão traseira multibraços de cinco braços capaz de guiar as rodas com extrema precisão ao longo de todo o seu curso. Ou seja, todas as variações de camber, convergência, largura de via e movimento longitudinal das rodas foram estudadas para que a influência direcional desses movimentos fosse nula, preservando uma direção neutra (sem necessidade de correções ao pisar irregularidades, por exemplo) e uma enorme estabilidade; esta arquitetura seria mesmo uma solução que viria a ser

adotado por quase todos os construtores. Conforto, qualidade, segurança, fiabilidade e performance, o 190 W201 tinha tudo. E ainda ia ter mais!

Em 1984 surge a versão desportiva, o 190E 2.3-16 com 2302 cc de cilindrada e 185 cv em cujo motor a Cosworth teve importante colaboração; no final dos anos setenta o V8 Ford Cosworth de F1 era o motor de competição com mais vitórias e a empresa de engenharia inglesa reconhecida como o especialista nos motores de 4 válvulas por cilindro, também pelo trabalho realizado nos vários blocos Ford de 4 cilindros dos Escort RS de ralis e velocidade, motores de F3, F2, Indy e montanha. Aliás, ainda durante a ano de 1983 e como parte do seu programa de testes de fiabilidade, o 190E 2.3 16V iria bater vários

Once Upon a Drive 86

recordes de velocidade e distância na pista de Nardo, incluindo o dos 25 000 km, das 25 000 milhas, dos 50 000 km (percorridos em 201 horas, 39 minutos e 43 segundos, o que dá uma média de 247,94 km/h) e mais nove recordes da sua classe. E os carros do recorde tinham apenas ligeiras adpatações face aos de série que elevavam ligeiramente a potência útil nas rodas e melhoravam a aerodinâmica. Em concreto, dado que conduzir na oval de Nardo é como ir numa longa reta (pelo menos até à velocidade de equilíbrio, que na pista exterior é de 240 km/h), os carros do recorde dispensavam direção assistida e a ventoinha de refrigeração (como a bomba da direção e atuação da ventoinha vão buscar a força ao motor, este assim conseguia enviar mais 2 ou 3 cv para as rodas), já que a elevada velocidade garantia fluxo de ar mais do que suficiente. Na realidade, até fluxo de ar de refrigeração em excesso para a mais fresca noite, pelo que,

para evitar que o motor arrefecesse e perdesse eficiência, os carros foram equipados com um sistema de cortinas controlado do habitáculo que permitia fechar até 2/3 da área do radiador (hoje normal), o que reduzia o arrasto e melhorava de forma significativa a já impressionante performance aerodinâmica do 190E; a grelha em si tinha uma cobertura de rápida substituição antimosquito, para que estes não causassem uma obstrução do radiador, e os faróis uma proteção usada durante as horas de sol.

E outra bem conhecida ação de lançamento do Mercedes 190E 2.3-16 foi a corrida da inauguração do circuito moderno de Nürburgring em outubro de 1984, uma corrida em que Alain Prost fez a pole position e Ayrton Senna ganhou a corrida na frente de Niki Lauda; curiosamente, Prost e Senna foram os pilotos que dominaram a F1 enquanto o Mercedes-Benz 190 W201 esteve em produção.

MERCEDES-BENZ 190 87

O 190E 2.5-16 EVO II FOI FEITO PARA VENCER NO DTM, PELO QUE VESTIA UM FATO AERODINÂMICO IMPRESSIONANTE, COM UM AVENTAL DIANTEIRO DE ALTURA REGULÁVEL, APÊNDICE NO VIDRO TRASEIRO, ASA TRASEIRA

REGULÁVEL E DEFLETOR DE EXTENSÃO DA TAMPA DA MALA

GLÓRIA NAS CORRIDAS

É claro que, com todos estes predicados, logo houve quem quisesse correr com o 190E 2.3-16. De resto, o 190 W201 foi mesmo o carro que levou a Mercedes-Benz a voltar à competição de forma oficial, algo que a marca tinha abandonado desde a tragédia de Le Mans em 1955. O 190 2.3-16 foi homologado nos grupo N e A em 2 de maio de 1985 com a ficha de homologação Nº5269; ao longo dos anos esta ficha foi crescendo e existem nove extensões de evolução. Os primeiros 190 2.3-16 de corridas competiram no Campeonato da Europa de Turismo na Divisão 2 (até 2500 cc), com a Dany Snobeck Racing, e logo se revelaram superiores aos BMW 323i/325i E30 e Alfa Romeo GTV 2.5 que dominavam a categoria.

Todavia, a glória só chegaria com o posterior 190 2.5-16 de 195 cv lançado em 1988 e o DTM. De resto, foi precisamente por causa do DTM que foram produzidas 502 unidades dos 2.5-16 Evo I de 1989 (com a mesma potência e modificações no chassis e suspensão) e outras 502 unidades do imponente 2.5-16 Evo II de 1990, este com 235 cv e uma carroçaria adornada de vistosos apêndices aerodinâmicos, dos quais se destaca a enorme asa traseira regulável.

11 ANOS DE PRODUÇÃO

O 190 W201 estava tão na frente do seu tempo que a Mercedes-Benz só lançou o seu sucessor, o W202 que viria a ser o primeiro Classe C, em 1993, uns enormes 11 anos após o início de produção do W201 e depois de terem

Once Upon a Drive 88

A VERSÃO CABRIO DO 190 W201 NUNCA CHEGOU A SER PRODUZIDA, MAS FOI MAIS UM DOS INTERESSANTES PROTÓTIPOS, DOS QUAIS

TAMBÉM FAZ PARTE UM 190 250 CDI COM O 2.0 DIESEL BITURBO

sido produzidos um pouco mais de um milhão de unidades. E entre essas unidades existem algumas curiosidades, como os 190 elétricos experimentais, uma versão cabrio que nunca chegou à produção e até um curioso (e tardio) 190 250 CDI equipado com o 2.0 Diesel biturbo de 204 cv e 500 Nm, que graças ao reduzido peso do W201 (inferior a 1100 kg com este motor) tinhas prestações e consumos absolutamente fenomenais. E para terminar, por serem tão duráveis e terem uma manutenção extremamente barata ainda muitos deles estão presentes na estrada, até porque os níveis de conforto e qualidade de condução são (ainda) bastante atuais, com destaque para a excelente estabilidade a alta velocidade; como curiosidade, a enorme amplitude de viragem das rodas dianteiras não só autorizava excelente brecagem,

como permitia recuperar a traseira de ângulos de deriva impossíveis. Em concreto, as versões Diesel, incluindo os 250TD, são todas lentas pelos padrões atuais; são mais do género ir andando do que andar. Os preços variam entre os 2000 e os 10 000€ para os modelos a 190D 2.0, 190D 2.5, 190E 1.8, 190E 2.0 e 190E 2.3. Os mais raros seis cilindros em linha 2.6 podem atingir o dobro desse valor, ou um pouco mais, sendo os mais interessantes se optarmos por uma unidade com a caixa automática de 4 velocidades, enquanto os 2.3-16 começam nos 20 000€ e vão por ai acima. Os 2.5-16 normais andam pelos mesmos valores, pois, como possuem catalisador e são mais pesados, acabam por ter uma performance equivalente aos primeiros 2.3-16, enquanto os Evo I estão a começar a disparar e os Evo II podem atingir os seis dígitos. //

MERCEDES-BENZ 190 89

O “Passeio dos ingleses” do ACP Clássicos

O MEDIÁTICO ENCONTRO DO ACP CLÁSSICOS É O MAIOR EVENTO DO GÉNERO NA EUROPA E REUNIU MAIS DE 250 AUTOMÓVEIS NO NORTE E SUL. NESTA 19ª

EDIÇÃO,

O PASSEIO DOS INGLESES FEZ JUS AO ESTATUTO DE MAIOR PASSEIO EUROPEU DE AUTOMÓVEIS BRITÂNICOS, FAZENDO DESFILAR OS BELÍSSIMOS EXEMPLARES. FOI SÁBADO DIA 21 DE JANEIRO, EM LISBOA E NO PORTO

O evento do ACP Clássicos, que este ano fez um tributo à Rainha Isabel II, voltou a atrair uma legião de entusiastas de diferentes proveniências e gerações, unidos pela paixão dos automóveis britânicos. Aliados ancestrais, Portugal e o Reino Unido partilham um legado histórico e cultural que se estende aos automóveis. A fascinante produção automóvel britânica granjeou adeptos no nosso país ao longo do século XX, um entusiasmo que se mantém bem vivo e que fica visível, todos os anos, no “Passeio dos ingleses”, o maior passeio de clássicos britânicos em território europeu. Mais uma vez, a experiente equipa do ACP Clássicos organizou um evento em duas localizações no mesmo dia, com partidas de Lisboa e do Porto, reunindo um total de 256 automóveis. Oportunidade ideal para proprietários e acompanhantes partirem à descoberta do território nacional, ao volante de autênticas preciosidades da indústria automóvel, modelos intemporais de marcas como Bentley, Jaguar, Rolls-Royce, Aston Martin, MG, Triumph, Lotus, Morgan, Vauxhall ou Austin-Healey, e de outros emblemas eventualmente menos conhecidos, mas igualmente relevantes, como a Standard ou a Reliant. Este ano, a Rainha Isabell II foi recordada no evento, pois era bem conhecida a paixão pelos automóveis e gosto da condução da mais famosa monarca do mundo, falecida em setembro de 2022.

O apelo do “Passeio dos ingleses” leva, inclusivamente, alguns entusiastas a prepararem automóveis especificamente para um evento, que, tradicionalmente, abre a temporada dos passeios de clássicos em Portugal. Em muitos casos, um passeio em família, como foi o caso de João Matos e da sua mulher Maria Pinheiro, que fi-

zeram questão de participar este ano com um belís-simo Bentley MK6 de 1950. No banco de trás do Bentley seguiam os dois cães whippet (apropriadamente, uma elegante raça britânica que se pode caracterizar como: um galgo de porte médio).

TODOS QUISERAM PARTICIPAR

Nuno e Sofia Geada, um jovem casal, adquiriram há 15 dias o seu primeiro clássico, um MG, a pensar na participação no Passeio dos Ingleses, em Lisboa, e… logo se mostraram surpreendidos pela quantidade e diversidade de automóveis que se concentraram no Parque Eduardo VII. Até o embaixador do Reino Unido em Portugal, Chris Sainty, marcou proverbial presença no “Passeio dos ingleses”, participando no convívio e descobrindo o percurso ao volante de um Bentley, marca patrocinadora do evento. “Nem eu fazia ideia de que tínhamos tantos automóveis britânicos verdadeiramente deslumbrantes nesta zona! É realmente entusiasmante... Temos uma longa tradição de amizade e parceria entre os dois países, e é muito reconfortante saber que os automóveis também são parte desta ligação entre Portugal e o Reino Unido”, referiu o representante de Sua Majestade.

No Porto, sob as palmeiras da Avenida Dom Carlos I, no emblemático cenário da Foz do Douro, concentraram-se mais de 70 automóveis britânicos, incluindo o exemplar mais antigo do evento: um Standard 14 de 1946, uma raridade criteriosamente mantida e assistida pelo seu proprietário, José da Silva Santos, há 55 anos! A ligação emocional a estes automóveis é um elemento comum a muitos

Event Drive 90

ATÉ O EMBAIXADOR DO REINO UNIDO EM PORTUGAL, CHRIS SAINTY, MARCOU PRESENÇA NO PASSEIO DOS INGLESES, PARTICIPANDO NO CONVÍVIO, E DESCOBRINDO O PERCURSO, AO VOLANTE DE UM BENTLEY

participantes do “Passeio dos ingleses”. Sérgio Lopes repetiu presença no Porto com um Vauxhall Cresta de 1957, um modelo totalmente personalizável e que pertenceu a David Francis, cônsul inglês na Invicta na década de 1950. O pai de Sérgio Lopes adquiriu e restaurou este Cresta, que o diplomata inglês tinha encomendado à Vauxhall com uma pintura especial, para realçar o famoso grifo (ave) da marca britânica.

PELOS CAMINHOS DE PORTUGAL

Durante a manhã do sábado dia 21 de janeiro, as duas caravanas de automóveis partiram de Lisboa e do Porto para um programa simultâneo e dividido, nos dois casos, em Grupo Turístico e Grupo Desportivo, cada um deles, bem entendido, com percursos próprios.

A sul, os 185 participantes começaram por se concentrar no Parque Eduardo VII, em Lisboa, atraindo a atenção de largas centenas de adeptos e curiosos. O extenso grupo rumou depois ao concelho de Mafra, onde o almoço seria

servido em Enxara do Bispo, mas a meio do percurso dividiu-se em dois programas distintos: o Grupo Turístico visitou o Palácio Nacional de Mafra, onde foram recebidos por figurantes históricos, assistindo depois à atuação de um grupo lírico, que realçou o ambiente único do Palácio; enquanto o Grupo Desportivo pôde acelerar no Kartódromo da Lourinhã, numa prova de Regularidade que elevou as rotações e a emoção.

A norte, a partida da Foz do Douro levou os participantes rumo à região do Minho, onde o destino final seria Geraz do Lima, local do almoço. Antes disso, o Grupo Turístico visitou a vila mais antiga de Portugal, desfrutando da beleza de Ponte de Lima, enquanto o Grupo Desportivo estreou-se no Kartódromo de Viana do Castelo, que fez as delícias dos pilotos de ocasião.

Um dia marcado pelo convívio, pelo glamour dos automóveis ingleses e pela descoberta do território nacional.

Pelo 19º ano, a fórmula do ACP Clássicos foi um sucesso e promete regressar em 2024, com novos motivos de interesse, para comemorar duas décadas de história do “Passeio dos ingleses”. // ACP

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QJ Motor SRK400

A CHINESA QJ MOTOR SRK400 MOSTRA AO QUE VEM E É CLARA A INTENÇÃO DE SE BATER COM AS MELHORES DO

SEU SEGMENTO. TRAZ UM EXCELENTE DESEMPENHO DO SEU MOTOR, E RESTANTE CICLÍSTICA, E ANIMA PELA DIVERSÃO PROPORCIONADA PELO CONJUNTO. O PREÇO DE 5.790 EUROS É UM EXCELENTE ARGUMENTO POSICIONANDO-A

NO CENTRO DA OFERTA DO SEU SEGMENTO

No final de 2022 fomos até Málaga para testar a nova SRK400 da recém-chegada a Portugal QJ Motor, uma marca chinesa que promete muito. A SRK400 é uma moto de estilo Naked que representa a imagem com que a marca pretende afirmar-se no mercado Ibérico pois reúne todos os atributos que definem o seu posicionamento, jovem, divertida, irreverente, atrativa e desafiante.

Por tudo isto, a expectativa face ao seu real desempenho era grande já que num segmento tão desejado e disputado não basta parecer é preciso ser… e como poderão constatar mais adiante a SRK 400 surpreendeu, tudo e todos, com um desempenho que superou todas as expectativas.

Há que pensar que, apesar da a QJ Motor ser uma nova marca no mercado, o certo é que quem está por detrás da mesma, a empresa Quianjian Motorcycle do Grupo Geely, fabricante líder no sector dos automóveis, tem mais de 30 anos de experiência na produção de motos, sobretudo para o mercado asiático, mas também com marcas como a Benelli para o mercado europeu.

A evolução da qualidade dos produtos originários dos fabricantes chineses é notória e a importância do reconhecimento do mercado europeu para a qualidade dos mesmos é, do ponto de vista estratégico, um objetivo das marcas, realidade que inclusivamente estava bem patente na dimensão e qualidade dos espaços de exposição que os mesmos detinham na última EICMA em Milão, o certame mais importante a nível mundial do sector das duas rodas.

Mas centremo-nos na divertida SRK400 da QJ Motor que nos levou ao sul de Espanha para a conhecermos.

ESTÉTICA E EQUIPAMENTO QUE SÃO REFERÊNCIA

A sua estética é bastante impactante, sem ser rebuscada, com um bom equilíbrio dos seus elementos, moderna e com pormenores de qualidade, seguindo um estilo marcadamente europeu, de design inspirado em referências do sector e com detalhes que incluem por exemplo elementos aerodinâmicos, como as aletas nas laterais e a estética traseira do assento ao estilo “Panigale”. As cores selecionadas para fazer “bandeira” deste modelo são duas, uma versão em preto com jantes douradas e outra em cinza com o quadro verde fluo e jantes pretas. As duas funcionam muito bem, destacando as linhas agressivas do modelo, sendo a versão cinza, na nossa opinião, aquela que do ponto de vista estético nos parece mais interessante pelo impacto da originalidade da combinação de cores.

Com iluminação Full LED, a SRK400 exibe um farol dianteiro com duas óticas, contornadas por elementos de iluminação diurna. Os intermitentes são de dimensão reduzida contribuindo para a sua imagem cuidada e moderna e o farol traseiro destaca-se pelo seu formato original, a fazer lembrar a sigla de uma das marcas que lideram o sector dos automóveis elétricos, muito bem integrada numa traseira limpa e minimalista com o apoio de matrícula colocado no suporte do guarda-lamas traseiro, junto ao pneu, que está unido ao braço oscilante.

Destaque para o painel TFT a cores de 5”, de boa leitura,

Moto Ride 92
Texto — Pedro Rocha dos Santos

DISPONÍVEL EM DUAS OPÇÕES DE TOM, PRETA COM JANTES DOURADAS E QUADRO NEGRO OU

CINZENTA COM JANTES PRETAS E QUADRO VERDE FLUO, A SRK400 JÁ ESTÁ DISPONÍVEL

QJ MOTOR SRK400 93

que alterna entre fundo branco e fundo preto em função da luminosidade, onde podemos obter toda a informação relevante de forma clara e precisa nomeadamente a velocidade, rotação do motor, nível de combustível, relógio e mudança engrenada…

O assento mostra excelentes acabamentos, é constituído por duas peças, sendo a dianteira muito confortável pois terminámos o trajeto de 200 quilómetros pelas serras de Málaga, realizado apenas com breves paragens para fotografar, sem cansaço aparente. Já na parte traseira exibe uns elementos estético-dinâmicos “à la Panigale” que contribuem para alguma exclusividade estética do modelo e também para a sua estabilidade. A nível de equipamento a SRK400 conta ainda com manetes ajustáveis e ficha usb para ligação de equipamento eletrónico.

A SRK 400 monta um motor bicilíndrico de 41 CV que nos surpreendeu a todos pelo seu desempenho brilhante. Com injeção eletrónica e um binário de 37 Nm às 7.500 rpm, o motor entrega potência desde os regimes mais baixos quase parecendo de uma cilindrada superior. Aqui há que destacar verdadeiramente o som que emite o escape da pequena SRK 400, colocado numa posição inferior do lado direito, um som grave que diríamos que de uma 600 ou 700, realidade que marca a presença e o carácter da atrevida naked da QJ Motor.

Mas surpeendente mesmo é ainda a sua elasticidade e praticamente ausência de vibrações, tornando a condução da SRK muito divertida e mesmo entusiasmante. O binário nos baixos regimes torna a sua condução em cidade fluida e a elasticidade e progressividade da entrega de potência nos médios e altos regimes torna a sua pilotagem muito divertida…

Depois de cerca de 200 quilómetros realizados em percurso de montanha e já no regresso, a organização optou por fazer um direto em auto-estrada de cerca de 50 quilómetros. Aqui a tentação de testar os limites do bicilíndrico 400 da SRK falou mais alto e “off the record”, disseram-nos que… a SRK 400 superava, em reta, com al-

guma facilidade os 180 Km/h colocando em risco a nossa legalidade, realidade para a qual logo a seguir tememos ao sermos confrontados com um controlo em plena auto-estrada, pensando tratar-se de algum radar colocado no trajeto… mas não, era um controlo por outra espécie de meliantes que, pelo aparato militar, deviam certamente transportar algum tipo de “ mercadoria” ilegal.

CICLÍSTICA COM NOTA ALTA

Tendo o motor as características atrás referidas não faria sentido que a ciclística não acompanhasse o seu desempenho e assim se mostrou de facto. O percurso, criteriosamente definido pela organização, pretendia de forma intencional mostrar as qualidades da SRK quando levada numa condução mais desportiva por gente com experiência e conhecimento.

A Costa del Sol, assim é designada a região sul da Andaluzia que inclui a costa de Málaga e que se estende até Estepona, onde encontramos locais tão emblemáticos como Marbella, Puerto Banus e Torremolinos, é conhecida também pelo complexo montanhoso do Parque Nacional de Las Nieves. O percurso contemplava estradas com muitas curvas, mas de bom asfalto, passando pela espetacular cidade de Ronda, conhecida pelas suas vertiginosas gargantas talhadas pelo rio Tejo.

As suspensões dianteiras invertidas, apesar de não serem ajustáveis, mostraram um comportamento que em simultâneo oferecia estabilidade e conforto. O amortecedor traseiro mostrou-se algo brando na afinação de origem (que obviamente não contemplava o meu peso de 95 Kg) pelo que merecia algum ajuste de pré-carga, no entanto o mesmo exigia ferramenta, razão pela qual não o realizámos. Compensámos, porém, com o ajuste do hidráulico de extensão, esse sim possível realizar com o simples rodar de um disco na base do amortecedor.

Moto Ride 94

Quadro e suspensões mostraram um enorme acerto garantindo estabilidade e firmeza a rodar rápido sendo apenas penalizado pelo tato algo esponjoso do travão dianteiro, vendo-nos obrigados muitas vezes a compensar com um pouco de travão traseiro, sobretudo na abordagem mais rápida de algumas das curvas mais fechadas. Sem dúvida um tema a melhorar apesar da SRK 400 montar duplo disco lobulados de 260mm, assistidos por ABS.

O comportamento em curva é notável, com a moto a desenhar trajetórias com enorme estabilidade e com notória aderência graças a um bom comportamento das borrachas montadas, uns também surpreendentes Maxxis MaxSport, na dimensão 150/60-17 na traseira e um 110/70-17 na dianteira.

Em reta a proteção aerodinâmica é logicamente nula mas a estabilidade é absoluta, mesmo em velocidades que ultrapassam em muito a legalidade, certamente graças a alguns apêndices aerodinâmicos que a moto inclui na frente a na traseira (estes no assento) realidade que contribui definitivamente para esse comportamento neutro. Nesta matéria nunca é demais destacar a enorme elasticidade do motor nos regimes mais altos que nos surpreendeu a todos pela ausência aparente de stress dinâmico, ou seja, sem sequer parecer que vai em esforço, sensação certamente causada pela ausência de vibrações e equilíbrio global do conjunto. No global representa uma excelente opção para quem venha por exemplo de uma 125cc e que queira evoluir antes de passar para motos de maior cilindrada ou que entenda que, para a utilização que realiza no dia a dia, os 400cc com uma boa ciclística sejam suficientes. Uma outra realidade temos que levar em conta são os 6 anos de garantia que marca oferece nos seus modelos. Para quem ainda tenha dúvidas sobre a qualidade e fiabilidade das marcas chinesas o representante desmistifica definitivamente este argumento oferecendo uma garantia única que nenhuma outra marca proporciona.//

FICHA TÉCNICA

MOTOR

Tipo Bicilíndrico em linha DOHC

CILINDRADA 400 cc

POTÊNCIA MÁXIMA (CV/RPM)

41 @ 9000 rpm

BINÁRIO MÁXIMO (NM/RPM)

37 Nm @ 7500 rpm

DISTRIBUIÇÃO

2 árvores de cames à cabeça, 4 válvulas

QUADRO

Multitubular Trelissa

SUSPENSÃO

Suspensão dianteira Forquilha invertida de 41 mm, 125 mm de curso efetivo

Suspensão traseira Amortecedor único colocado lateralmente. Curso total 125 mm

TRAVAGEM

Travão Dianteiro : Disco duplo lobulado de 260 mm pinça de 2 pistões (ABS )

Travão Traseiro: Disco (240 mm), pinça de 1 pistão (ABS )

DIMENSÕES

Comprimento 2080 mm

Largura 820 mm

Altura Máxima 1085 mm

Altura do Assento 785 mm

Distância entre Eixos 1425 mm

Capacidade do depósito 13,5 l

DIMENSÕES DOS PNEUS

110/70-R17”

150/60-R17”

PESO (KG)

186 Kg

PREÇO 5 790€

QJ MOTOR SRK400 95

Top Gear Temporada 32

ESTE MÊS, NO DIA DE SÃO VALENTIM, DEPOIS DO JANTAR À LUZ DE VELAS, CHEGA-NOS A NOVA TEMPORADA DO TOP GEAR. EM 2022 AS PERIPÉCIAS DO TRIO BRITÂNICO

PASSARAM TAMBÉM PELOS EUA E EM PORTUGAL O CANAL

AMC BREAK MOSTRA-NOS AGORA TUDO EM 2023!

Quando Jeremy Clarkson e ‘sus muchachos’ tiveram que sair do programa que tanto elevaram, muitos pensaram: é o fim do Top Gear. E quase foi. Atores, comediantes e diversas soluções foram testadas quase em vão. Todavia, quando o atual trio foi encontrado, rapidamente os telespectadores sentiram que havia química para mais três décadas de histórias, aventuras e ensaios de carros no ecrã.

Freddie Flintoff, Chris Harris e Paddy McGuinness prendem-nos à televisão e, desta vez, foram também fazer uma visita que nunca falha e que já havia sido feita pelos seus antecessores dada a bizarria do parque automóvel norte-americano.

Este mês, vamos poder ver no AMC Break (NOS - 114,

MEO - 107; Vodafone - 135 e NOWO – 29) três novos episódios. A temporada 32 conta com cinco novas aventuras, algumas das quais passadas por “terras do Tio Sam”, para ver às terças-feiras, pelas 22h00. No primeiro episódio, intitulado “Top Gear na Florida”, Paddy veste-se à reformado veraneante, o trio arranja uma autocaravana antiga, e bem usada, semelhante à de Walter White em “Breaking Bad” e parte para uma viagem pelo estado sulista conhecido como “o estado das laranjas” (com grafismo fixo ao centro de todas (!) as matrículas dos automóveis emitidas neste estado – por curiosidade, espreite no Google “Florida Licence Plate”) e por lá, os três, depararam-se com… uma série de corridas cujos protagonistas são veículos muito ‘sui generis’. Num dos casos partem

Drive TV 96
Texto — João Santos Matos

ESTA TEMPORADA O TOP GEAR TRAZ-NOS MAIS UM LOTE DE CARRITOS

GIROS: MASERATI MC20, RIVIAN R1T, FORD PUMA ST OU LOTUS EMIRA, POR ENTRE UM EXTENSO ENREDO DE “OS CARROS DE POLÍCIA DA TV”

de uma base Jeep Wrangler transfigurada e adaptada a anfíbio, sendo a corrida…dentro de água, com caudal até à cintura. Depois, já em pista, os carros de corrida são… Ford Crown Victoria que é como quem diz: antigos táxi e carros de polícia. Mas isto por entre vários “testes” e ensaios que logo no primeiro episódio se podem testemunhar.

No segundo episódio, que estreia este mês no dia 21 à noite, o mote é muito interessante: ensaios individuais aos carros da polícia que serviam as séries de TV. Neste lote cabem: um Ford Gran Torino (foto em cima: note bem o tamanho das rodas de trás!); um Ferrari 308 GTS, claro; um Jaguar Mark 2; um Dodge Charger SRT Hellcat Widebody; uma bem-amada Ford F-150 Raptor e… um Audi RS 3 (foto à esquerda). Ainda neste segundo episódio, a equipa tenta transformar um pequeno veículo monolugar elétrico (Sinclair C5) num trenó para numa pista norueguesa se divertirem a fundo. Será que conseguem?

A terminar o mês, no dia 28, o AMC Break estreia o episódio “Heróis dos Pesados de Mercadorias” que pelo título quase que explica por si só o que vai acontecer. De volta à Grã-Bretanha testam em pista um Scania 770S, um Mer-

cedes-Benz Actros e um DAF XG+. Ainda neste episódio um Lotus Emira (upa upa, isso sim!)

Em março, esperam-se um bom rol de carros em cena: Maserati MC20; Rivian R1T; Ford Puma ST vs Ford Puma Rally1 e ainda carros fiáveis por menos de 500 libras (Mini Cooper, Volvo V70, Mercedes C220 CDI, Honda Civic, Toyota Celica e Mazda 323F) e ainda uma retrospetiva do desporto automóvel dos anos 20; também pela história dos “M” e… pelo “futuro dos combustíveis”. Não perca esta temporada, assim como a não perder são, possivelmente (e se não viu) as repetições dos Top Gear Especial no Nepal e na Birmânia, assim como alguns outros episódios soltos (de várias temporadas) que vão estar na grelha do AMC Break este mês, em repetição, e para aguçar o apetite aos novos episódios da temporada 32.

A terminar referir que em filmagens já neste ano de 2023, Freddie Flintoff teve um enorme acidente e apesar de estar a recuperar bem coloca-se a hipótese de não voltar aos ecrãs tão cedo, isto depois de já em 2019 ter escapado à morte num acidente em que tentava bater um record de velocidade num “triciclo-foguetão”. Vamos esperar para ver, e desejar-lhe as melhoras!//

TOP GEAR 97

O meu primeiro Lancia

E… de volta ao 037 e aos seus 40 anos! O meu primeiro Lancia também está prestes a fazer quatro décadas. Foi uma prenda por ocasião do meu primeiro dia de escola, em setembro de 1983. Aliás, o meu Amor pela Lancia começou quando recebi o meu primeiro Bburago, este Lancia Rally 037 (1/24). E não só me fascinou o tamanho do carro como, ao abrir a porta do lado esquerdo, o volantezinho funcionar e fazer as rodas girarem. Tinha quatro anos e até então só conhecia os mais vulgares Majorette (suspensão mole) ou os mais sólidos Matchbox (suspensão firme – o…pessoal dos anos 80 sabe do que estou a falar). Tinha uns 100 carrinhos desses, e obsessão por todos. Mas… nas minhas pequenas mãos, este Bburago parecia gigante e era outra coisa. Sendo que, e aliás, é uma prenda que até tem uma história por trás. É que apesar de este presente ter sido uma surpresa, fui… eu que o escolhi! Eu explico. Ao ir-me buscar à escola (num Visa cheio de estilo), o meu pai levava-me a surpresa de um Bburago que logo encontrei no banco de trás. Mas, todavia e contudo, este era um Rolls Royce Silver Shadow II. Tudo bem! Abria as portas e o capot e… era enorme (aos meus olhos). Ao chegar a casa é que o meu pai viu que, ao contrário do que lhe disseram na loja, este oneroso carrinho não incluía a particularidade (sofisticadíssima) de virar as rodas através do volantezinho já referido. Foi assim que demos um salto até à loja para escolher outro que “fizesse tudo”. E ali, à minha frente, e pela primeira vez, eis que estava um Lancia Rally 037. Não era um “Martini”, era um “Pioneer azul” e foi logo o que eu quis! Ainda o tenho, mas está tão vivido e foi tão usado que… fosse um automóvel verdadeiro teria (pelo menos) 2 milhões de quilómetros. Como referi, este tal meu primeiro Lancia foi também o meu primeiro Bburago. E a coleção que o meu pai me proporcionou, repleta de carrinhos (1/24 em metal) de rali, Fórmula1, Dakar ou simplesmente da vida real, ainda

hoje a tenho toda. Alguns em casa, outros na redação. São dezenas e alguns são já raridades.

Tal como uma música antiga, ou perdida, e há muito não ouvida, nos transporta a outro tempo, eis que quando paro, olho e agarro um destes meus Bburago, consigo ser teletransportado por uns minutos até outra era, nos anos 80. E de repente, tudo muda ali um bocadinho, e dá-se uma paz infantil. Talvez seja por isso que tantos de nós aqui na autoDRIVE ainda hoje gostamos tanto de carrinhos ou de, pelo menos, os nossos carrinhos de juventude. E este 037 (da foto) ainda hoje mexe comigo.

Por tão usado, a dada altura a tampa traseira do motor, que já havia sido presa com uns arames improvisados pelo meu pai, partiu-se de vez. Tivemos que… a soldar. Espero bem que o motor não gripe, pois… já não conseguimos ter acesso a ele. Mas… brincadeira à parte, há a dizer que por me ser tão especial, até tenho andado no eBay a ver se arranjo um em estado “nunca brincado”.

A terminar dizer que… este carrito azul foi de facto o meu primeiro Lancia, aos quatro anos. Mas depois aos 18… o meu primeiro carro… foi… também um Lancia, também azul. Um Ypsilon novo cheio de Alcantara no interior e com os, míticos, 86 cv do motor 1.2 16V do Punto Sport. Que beleza! Não se agarrava (nada) ao chão, mas andava tão depressa! Já não o tenho há duas décadas mas ainda hoje o admiro!

CRÓNICA 98
Editor-Geral / Diretor Comercial
JOÃO SANTOS MATOS

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