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Aula 2 – Autores clássicos em Administração Brasileira
Autores clássicos em Administração Brasileira
Carlos Henrique Berrini da Cunha Alessandra Mello da Costa
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Meta da aula
Apresentar os autores considerados clássicos em Administração Brasileira e as suas contribuições mais importantes para a pesquisa e as práticas de gestão.
objetivos
Esperamos que, ao fi nal desta aula, você seja capaz de:
defi nir a ideia de Administração Brasileira;
identifi car a importância e as principais contribuições dos autores clássicos para o desenvolvimento da disciplina no contexto brasileiro;
distinguir as especifi cidades e particularidades do pensar e do praticar administração no Brasil.
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Administração Brasileira | Autores clássicos em Administração Brasileira
INTRODUÇÃO
Agora que já discutimos o que é Administração, cabe aprofundarmos a discussão indagando o que é Administração Brasileira? Existe uma forma brasileira de planejar, organizar, dirigir, liderar e controlar? Não existem respostas simples a esta pergunta e os debates usualmente nos encaminham na direção de calorosas e polêmicas discussões. Alguns pesquisadores argumentam que sim, ou seja, existe uma forma brasileira de administrar, não sendo possível desvincular um estilo de administração dos seus fatores culturais. Segundo Barros e Prates (1996), as heranças culturais brasileiras causam um estilo próprio, como – por exemplo –, no caso da relação entre líderes e liderados: a concentração de poder, o paternalismo, o personalismo, a lealdade às pessoas, o formalismo, a fl exibilidade e a impunidade aceitável. Outro grupo de autores respondem que não. Nossos cursos, professores e salas de aulas apenas reproduzem um modelo de administração exógeno, não tornando possível desenvolvermos um jeito brasileiro de administrar. Segundo Simões (2006, p. 1), os estudos acerca do tema qualidade expressam bem este posicionamento:
No Brasil, o assunto qualidade vem sendo muito explorado nas últimas décadas, tendo como literatura de base os chamados clássicos da qualidade, cujos autores, americanos e japoneses em sua maioria, são geralmente considerados “gurus”. Nesse mesmo caminho, diversos modelos e programas de qualidade foram chegando ao país e sendo incorporados pelas empresas locais, o que, na maioria das vezes, aconteceu sem a devida adaptação à cultura e à realidade brasileira.
De forma complementar, Davel e Vergara (2001) levantam duas questões importantes: 1. Até que ponto consideramos – quando adotamos novas formas de gestão de origem estrangeira – as condutas e a maneira de pensar e agir tipicamente brasileiras? 2. Até que ponto somos totalmente colonizados por tendências administrativas estrangeiras sem sermos sufi cientemente críticos para analisá-las e adaptá-las às nossas vantagens culturais? Na tentativa de superar este debate, talvez seja possível identifi carmos uma tradição mais autônoma de estudos em Administração Brasileira por meio do entendimento do pensamento de três autores clássicos: (1) Alberto Guerreiro Ramos; (2) Mauricio Tragtenberg; e (3) Fernando Prestes Motta.
Atividade 1
Antes de estudarmos estes três autores clássicos, leia o texto 1 e responda às seguintes questões:
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LEITURA COMPLEMENTAR: Texto 1 – em anexo.
MOTTA, F. C. P ; ALCADIPANI, R. Jeitinho brasileiro, controle social e competição. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 39, n. 1, jan./mar., 1999.
a. De acordo com os autores do texto, o “jeitinho“ acontece todos os dias nos mais diferentes domínios, quer sejam públicos, quer sejam privados. O que é o “jeitinho“?
b. “E o esclarecimento desse fenômeno é de vital importância para se compreender a realidade brasileira, sendo que a compreensão dessa realidade é indispensável para todos aqueles que trabalham e pesquisam as organizações locais.“ Você concorda com esta argumentação? Justifi que a sua resposta.
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Resposta Comentada
De acordo com o texto 01 (anexo), você deve ser capaz de perceber que a cultura brasileira possui especifi cidades e particularidades que interferem tanto no agir dos indivíduos quanto no dia a dia das organizações.
AUTORES CLÁSSICOS
Você, agora, vai conhecer alguns dos principais autores clássicos da Administração Brasileira.
Alberto Guerreiro Ramos
A obra de Alberto Guerreiro Ramos – assim como a sua atuação na vida acadêmica e na vida pública – apresenta-se bastante vasta. Nascido em 1915, na Bahia, já aos 18 anos foi nomeado assistente da Secretaria de Educação do seu estado e aos 22 anos publicou sua primeira obra.
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Formado em Ciências Sociais e em Direito, lecionou em diversas universidades e centros de ensino no Brasil e no exterior. Ao mesmo tempo, sempre esteve ligado à administração pública tendo trabalhado no DASP, na Casa Civil da Presidência da República, no ISEB, entre outras organizações. Suas principais publicações são: • Sociologia do orçamento familiar – 1950. • A sociologia industrial. Formação, tendências atuais – 1952. • Sociología de la mortalidad infantil – 1955. • Introdução crítica à sociologia brasileira – 1957. • A redução sociológica – 1958. • O problema nacional do Brasil – 1960. • A crise do poder no Brasil – 1961. • Mito e verdade da revolução brasileira – 1963. • A nova ciência das organizações: uma re-conceitualização da riqueza das nações – 1981. • Administração e contexto brasileiro – 1983. Ao lermos uma de suas obras, A redução sociológica, encontraremos as diretrizes norteadoras do pensamento deste pesquisadoradministrador: (1) Vivemos necessariamente a visão de mundo de nossa época e de nossa nação. (2) Existem dois tipos de engajamento, o engajamento sistemático e engajamento ingênuo. (3) Deve-se buscar a libertação da servidão intelectual e a condição de mero copista e repetidos de ideias estrangeiras.
(...) a dependência se exprimia sob a forma de alienação, visto que habitualmente o sociólogo utilizava a produção sociológica estrangeira, de modo mecânico, servil, sem dar-se conta de seus pressupostos históricos originais, sacrifi cando seu senso crítico ao prestígio que lhe granjeava exibir ao público leigo o conhecimento de conceitos e técnicas importadas (RAMOS, 1996, p. 10).
Os três sentidos básicos da redução sociológica são: (1) Redução como método de assimilação crítica da produção sociológica estrangeira. (2) Redução como atitude parentética. (3) Redução como superação da sociologia nos termos institucionais e universitários em que se encontra.
De acordo com Guerreiro Ramos, a autoconsciência coletiva e a consciência crítica surgem quando um grupo social põe entre si e as coisas que o circundam um projeto de existência. A consciência crítica surge quando um ser humano ou um grupo social refl ete sobre tais determinantes e se conduz diante deles como sujeito. Em um sentido mais amplo, consiste na eliminação de tudo aquilo que, pelo seu caráter acessório e secundário, perturba o esforço de compreensão e a obtenção do essencial de um dado. Em um sentido sociológico, é a atitude metódica que tem por fi m descobrir os pressupostos referenciais, de natureza histórica, dos objetos e fatos da realidade social. Desta forma, a redução sociológica: • É atitude metódica. • Não admite a existência na realidade social de objetos sem pressupostos. • Postula a noção de mundo. • É perspectivista. • Seus suportes são coletivos e não individuais. • É um procedimento crítico-assimilativo da experiência estrangeira. • É atitude altamente elaborada.
(RAMOS, 1996, p. 105)
Mauricio Tragtenberg
Nascido em 1929 no Rio Grande do Sul, formou-se em História e doutorou-se em Ciências Sociais. Foi professor em diversas instituições de ensino, tais como a Unicamp, a PUC-SP e a Fundação Getulio Vargas. Entre as suas obras mais importantes podemos destacar: • Burocracia e ideologia – 1974. • Pedagogia libertária – 1978. • A delinqüência acadêmica: o poder sem saber e o saber sem poder – 1979. • Administração, poder e ideologia – 1980.
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As suas ideias principais concentram-se em torno da crítica à burocracia organizacional, às teorias de administração e ao sistema capitalista. Tragtenberg compreende o conceito de burocracia como o aparato técnico-administrativo composto por profi ssionais especializados e selecionados segundo critérios racionais que se encarregam de diversas tarefas dentro do sistema. Ao mesmo tempo, ideologia é o conjunto de ideias que sintetizam os interesses de determinado grupo histórico-social e que dirigem as atividades de forma a regular as condutas e manter um estado de ordem desejado. O conceito de ideologia é fundamental para Tragtenberg. Em sua opinião, a ideologia opera escamoteando os verdadeiros interesses e a verdadeira natureza da situação, neutralizando interesses e a verdadeira natureza da situação, neutralizando tais ideias como representativas de interesses classistas. A ideologia promove uma falsa consciência da realidade, o que permite a dominação de uma classe sobre a outra de forma naturalizada e legitimada (através do conhecimento). Garante, desta forma, que o monopólio do poder permaneça intocado e a reprodução das relações de dominação tenha base na harmonização das relações sociais. É, portanto,um instrumento de dominação que aliena a consciência humana e mascara a realidade. Torna as idrias de uma classe em idrias dominantes. Mauricio Tragtenberg possuía ideal libertário e denunciava em seus escritos e em suas aulas a opressão, a dominação e a exploração existentes na complexa relação entre burocracia, ideologia e poder. Em sua opinião, tal relação impedia e difi cultava tanto a democratização do trabalho quanto a busca da emancipação humana na sociedade. Em outras palavras: 1. As teorias da Administração são ideológicas. São produtos de formações sociais, econômicas, políticas e culturais de um determinado contexto histórico e representam interesses de grupos específi cos desta sociedade. 2. Existem relações de poder e de dominação nas organizações.
3. Nas organizações, as pessoas se alienam por meio dos seus papéis burocráticos e normativos. A burocracia apresenta-se como um aparelho ideológico e uma estrutura de dominação. 4. Um primeiro exemplo pode ser quando o funcionário adota os mitos da corporação sem refl exão crítica, constituindo apenas uma atribuição de status e a criação de um jargão administrativo esotérico. 5. Um segundo exemplo pode ser que a decisão burocrática é absolutamente monocrática, havendo apenas um fl uxo de comunicação.
LEITURA COMPLEMENTAR: Texto 2 – em anexo. PAULA, A. P. P. Tragtenberg e a resistência da crítica: pesquisa e ensino na administração hoje. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.41, n. 3, jul./set., 2001.
Fernando Prestes Motta
LEITURA COMPLEMENTAR: Texto 3 – em anexo.
MOTTA, F. P. Organizações e sociedade: a cultura brasileira. O&S, Salvador, v.10, n. 26, jan./abr., 2003.
Atividade 2
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Para resolução da atividade 2, é necessária a leitura dos textos 2 e 3. Os trechos em anexo descrevem um dos aspectos da inserção do indivíduo no contexto organizacional durante o período inicial de estudo da administração das organizações. Em sua opinião, é importante que os estudos considerem a relação entre organizações e os indivíduos que trabalham nas organizações? Justifi que a sua resposta.
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Resposta Comentada
Para responder corretamente o que foi pedido, você deve fazer a leitura dos textos recomendados e escrever um pequeno texto, destacando a complexidade nas relações de trabalho nas organizações.
CONCLUSÃO
O estudo da administração no Brasil é um fenômeno recente e caracterizado pela ocorrência da incorporação de teorias e modelos estrangeiros sem uma preocupação com a adequação destes à realidade brasileira (MOTTA; ALCADIPANI; BRESLER, 2000). Em outras palavras, este processo ocorre sem o que Guerreiro Ramos (1996) denominou de um procedimento crítico-assimilativo da experiência estrangeira. A ideia não é inviabilizar a difusão de procedimentos não brasileiros, mas sim de proceder a uma releitura que considere as nossas particularidades e especifi cidades sociais, econômicas, políticas e culturais. No entanto, como esta situação poderia ser diferente? Existe uma forma específi ca e particular brasileira de administrar?
Atividade Final
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Esta terceira atividade visa à próxima aula. Você deverá refl etir sobre a existência ou não de um jeito brasileiro de gestão e apresentar um exemplo de empresa que justifi que o seu posicionamento.
Resposta Comentada
Você deve fazer uma escolha entre a existência ou não de um jeito brasileiro de gestão e justifi car sua decisão. O exemplo deve ser fruto de uma pesquisa com intuito de apresentar uma empresa com modelo brasileiro de gestão ou uma empresa sendo gerida nos moldes tradicionais de gestão e que não tenha sido aculturada.
RESUMO
Esta aula apresenta os autores clássicos em administração e as escolas que estudam a existência ou não de um modelo brasileiro de gestão. Alberto Guerreiro Ramos e a redução sociológica. Sua obra apresenta as diretrizes norteadoras do pensamento deste pesquisador-administrador. Mauricio Tragtenberg critica a burocracia organizacional e o sistema capitalista. Fernando Prestes Motta dedicou-se mais ao ensino e à pesquisa acadêmica do que ao exercício da profi ssão de administrador. Introduziu no Brasil inúmeros autores estrangeiros, e foi considerado o “sociólogo das organizações” pela abrangência e profundidade de sua obra.
INFORMAÇÃO SOBRE A PRÓXIMA AULA
A próxima aula falará sobre autores contemporâneos em Administração Brasileira.
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