Report O Silêncio dos Homens | Parte 1

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UMA

PESQUISA COM MAIS DE 40 MIL PESSOAS EM TODO O BRASIL

VOLUME 1

I N I C I AT I VA E

V I A B I L I Z AÇ ÃO

P E S Q U I SA

P R O D U Ç ÃO E X E C U T I VA

L I D E R A N Ç A P E S Q U I SA Q UA N T I TAT I VA

INSTITUTO PDH L I D E R A N Ç A P E S Q U I SA Q UA L I TAT I VA

CO N S U LTO R I A E M M AS C U L I N I DA D E S E G Ê N E R O

J U L I A N A FAVA

G U STAVO V E N T U R I

APOIO


2

3

Metodologia de pesquisa Etapa qualitativa Durante a etapa qualitativa do estudo realizamos conversas em profundidade com dezenas de pessoas. Selecionamos especialistas e também pessoas não especialistas, mas com vivências relevantes no território das masculinidades. Buscamos ampla diversidade considerando as regiões do país, orientação sexual, classe, raça, escolaridade e gênero. Investigamos fontes secundárias, como outros estudos, livros e artigos. Realizamos um monitoramento nacional e internacional de notícias durante a pesquisa. Conduzimos uma roda de conversa com ativistas do campo de masculinidades. Os achados preliminares da etapa qualitativa serviram de base para estruturar o questionário quantitativo. Após a etapa quantitativa, consolidamos os achados quali e quantitativos por meio de reuniões imersivas com o time e diversos colaboradores, sempre nos atentando para termos diversidade nesses encontros, garantindo múltiplos olhares para a construção de nossa análise.

Etapa quantitativa UNIVERSO: população brasileira de

14 ANOS OU MAIS, usuária da internet.

3 A coleta foi realizada durante um mês, entre maio e junho de 2019.

ANÁLISE: realizamos análise descritiva e análise por clusters. Os resultados do estudo serão publicados em volumes. O presente volume apresenta somente parte da análise descritiva relativa ao questionário dos homens.

DISTRIBUIÇÃO: por meio de questionário público na internet (Google Form). A divulgação inicial foi feita por meio das redes e bases do PapodeHomem. Em seguida, a pesquisa foi divulgada por sites diversos e reenviada a outros usuários pelos próprios respondentes iniciais. Como a intenção benéfica e de utilidade pública do estudo foi explicitada desde o princípio, houve grande compartilhamento orgânico. Por fim, realizamos campanhas com anúncios em redes sociais para chegar a determinados segmentos, necessários para equilibrar a amostra.

AMOSTRA INICIAL:

47.002 3 obtivemos um total de

respostas. Desses, 43.153

completaram todo o questionário. Sendo

27.702

15.451

homens

mulheres

3 A pesquisa considera 0.5 pontos percentuais de margem de erro e 95% de nível de confiança.

PONDERAÇÃO: as informações da pesquisa foram ponderadas de modo a representar o perfil da população com acesso à internet, com 14 anos ou mais e escolaridade de nível médio ou superior, segundo idade, gênero, cor/ raça e grandes regiões do Brasil. Foram utilizados como parâmetro de ponderação os dados secundários da PNAD Contínua TIC 2017. Após ponderar por todos esses fatores, isso levou o plano amostral a ser recalculado para representar 7.589 entrevistas respondidas por homens e 3.033 respondidas por mulheres.


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5

Como ler esse relatório Mesclamos texto corrido com infográficos e aspas dos especialistas. Tentamos criar uma lógica que facilitasse a leitura e compreensão do conteúdo.

Aspas: todas as aspas destacadas são fruto das conversas com especialistas, da etapa qualitativa de nosso estudo.

Infográficos: dizem respeito a perguntas feitas por nós na etapa quantitativa. O enunciado no alto das páginas, quando entre aspas, é a frase exata apresentada às pessoas no questionário.

Divisão por volumes:

geramos uma quantidade de

achados impressionante, que certamente tomará bastante tempo até ser digerida. Por isso optamos em dividir os resultados em volumes. O material que lê agora é apenas um fragmento de toda a inteligência gerada. Acompanhe o PapodeHomem e se cadastre no formulário em www.papodehomem.com.br/silencio para ser avisado em primeira mão dos próximos volumes.


— 2

Introdução

A luta das mulheres empurrou nossa conversa — e nós devemos agradecê-las por isso “Sem os homens nós não vamos avançar tanto. Os homens precisam ser – e muitos deles querem ser – aliados nesse processo.”

E

— 3

Esse projeto não existiria sem a luta das mulheres por igualdade de oportunidades, direitos e existência — ou seja, o que entendemos por equidade. O movimento de transformação das mulheres impulsiona o movimento de transformação do homens. Ao não abaixarem a cabeça em sua busca, elas nos trouxeram até aqui e somos profundamente gratos pela coragem de todas elas. Se acredita que hoje vivemos numa sociedade que cada vez mais enxerga homens e mulheres como dignos de oportunidades e direitos iguais, agradeça às gerações de mulheres que (literalmente) deram suas vidas para que isso acontecesse. Caso não tenha nem ideia de quais mulheres estamos falando, recomendamos o livro "Extraordinárias: mulheres que revolucionaram o Brasil".

Sandra Vale, consultora de gestão e

“A gente tem que ter uma forma dos homens tolerarem, permanecerem no campo do diálogo com as mulheres, mesmo que seja um diálogo difícil. Acho que não existe forma de começar o diálogo, sem acolher quando elas gritam. Se elas gritam é porque são séculos de violência que ainda existem pra elas.”

desenvolvimento no Instituto Promundo

— Alexandre Coimbra, psicólogo e facilitador de grupos de homens


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5

O silêncio dos

homens


— 6

Os homens estão em silêncio?

É

— 7

É fácil associar homens a posições de poder em nossa sociedade, basta olhar pro lado. No Brasil, são 85% do Congresso, cerca de 90% do Executivo, mais de 80% dos ministros do STF, além de ocuparem mais de 60% dos cargos de chefia nas empresas e 90% das cadeiras nos comitês executivos das grandes corporações. Entretanto, ao qualificar a masculinidade como gênero no poder, é preciso evidenciar de que homens estamos falando (o que faremos, com dados, a seguir) — os homens negros, por exemplo, não costumam usufruir desse lugar ao pódio. É natural que as pessoas acostumadas a inúmeros privilégios sociais e que estão no controle da política, das leis e da economia tenham mais espaços de fala e favorecimento próprio. Até 1962, as mulheres não podiam sequer trabalhar sem a autorização dos maridos. Duas ou três gerações atrás, seria comum entrar numa casa e ver o pai decidindo se e com quem a filha deveria se casar, além de determinar os rumos da família e o destino do dinheiro ganho.

Eles têm o poder da fala, a qual exercem todo o tempo. Estão nas posições de comando da política, de nosso sistema jurídico e da economia. Se os homens já dominam tantos espaços, de que silêncio estamos tratando?

“O universo da masculinidade é um universo do silêncio. (...) Tem uma construção histórica de silenciamento masculino. Esse silenciamento masculino trata-se da norma, portanto não precisa ser falado, isso é dado." — Paula Pinto, antropóloga

Mas se ao menos parte dos homens já detém tanto poder e podem se expressar quando bem entendem, quais seriam suas queixas e por que estariam silenciados? Isso não seria uma contradição? Parece paradoxal, mas não é. Os homens falam muito, mas pouco sobre o que habita dentro deles e o que realmente sentem. O silêncio dos homens é emocional. É um fechamento de seus corações, que escondem feridas profundas.


— 8

Calma, mas eles não são o gênero no poder?...

F

Falar em dores dos homens não significa vitimizálos ou dar a entender que estamos num cabo de guerra com as mulheres. Compaixão não é um recurso escasso, podemos compreender as dores de diversos grupos, de maneira responsável e sensível. No Brasil, a maioria dos homens no poder são brancos, heterossexuais, de classe alta e com ensino superior completo. Já os homens negros e os não heterossexuais lideram as estatísticas de violências sofridas, ganham menos e estão ausentes da maioria dos espaços de poder, além de enfrentarem maior preconceito profissional e social no cotidiano. Ou seja, os extremos possuem raça e orientação sexual definida. Resumir o masculino a "gênero no poder" ignora essa complexidade. Pois ao mesmo tempo em que dominam a política, o judiciário e a economia, homens lotam os cemitérios e as prisões, estão nos trabalhos com maior taxa de óbito e acidentes, se suicidam em taxas preocupantes e possuem expectativa de vida significativamente menor. Considerando tudo isso, temos investigado uma perspectiva que enxerga o masculino como um gênero de extremos (termo que vimos pela primeira vez no relatório de uma conferência nórdica sobre equidade de gênero, publicado em 1995; no Google Books, procurem por "Towards News Masculinities, report on a conference on men and gender equality".

Talvez seja mais adequado falarmos em um "gênero de extremos"

Esse olhar nos permite compreender outras masculinidades possíveis e suas nuances, desenvolvendo rotas de conexão autêntica e caminhos de mudança mais eficazes. Afinal, se não conheço profundamente o que desejo transformar, é provável que não saiba como ou pra onde direcionar essa mudança.

— 9


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Conhecendo melhor o extremo que não está no poder — dados que exemplificam o racismo estrutural e os obstáculos dos homens negros: 3 Homens brancos

3 Há duas vezes

estudam em média

mais negros

10 anos, homens

analfabetos do

negros estudam 8 anos

que brancos

(IBGE, 2018)

(IBGE)

3 Atualmente,

3 RENDA MÉDIA

de cada

dos brancos X dos negros no Brasil:

100 75

pessoas assassinadas no Brasil,

R$ 1598 x R$ 898 (PNAD 2017)

3 Entre 2006 e 2016, a taxa de homicídios de indivíduos não negros diminuiu 6,8%. No mesmo período, a taxa entre a população negra subiu 23,1%.

(Atlas da Violência 2019)

(Ministério da Saúde, 2019)

mais de 49.000

Segurança Pública)

3

SISTEMA CARCERÁRIO: Temos

726.712 368.049 pessoas presas para

vagas.

40% ainda não foram

3 Entre homens com ensino

mortes por ano.

ISSO SIGNIFICA

(Atlas da Violência 2017, Fórum Brasileiro de

(Atlas da Violência 2018)

Negros e pardos entre 10 a 29 anos possuem 45% mais chances de suicídio do que brancos na mesma faixa etária

são negras.

“Jovens e negros do sexo masculino continuam sendo assassinados todos os anos como se vivessem em situação de guerra.”

3 RAIO-X DE NOSSO

superior, trabalhadores negros ganham, em média, 29% a menos que os brancos. Diferença maior que entre as mulheres. ("O desafio da Inclusão!" Instituto Locomotiva, com base na PNAD 2017)

condenados 95% são homens 64% são negros 55% têm de 18 a 29 anos 40% têm até o ensino fundamental incompleto, são analfabetos ou não têm cursos regulares (Fonte: Instituto Igarapé)


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Um mapa das dores dos homens

Saúde precária, expectativa de vida baixa Sexualidade restritiva e obsessiva por performance A heterossexualidade compulsória As dores dos homens negros O corpo trancado, a fala dura Violência como linguagem A pressão por prover e vencer Os grandes viciados em álcool e drogas O medo das mulheres fortes e independentes Fortes, rígidos, invencíveis! O silêncio dos homens


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E quais são algumas das dores e obstáculos que todos os homens enfrentam?

3 Na faixa de 20 a 24 anos, as mortes por causas externas

3 O desempenho escolar

(homicídios, suicídios, acidentes

assim como a quantidade

de trânsito, etc.) atingiram

de homens que entram nas

11 vezes mais homens do

universidades e concluem os

que mulheres — em especial

cursos de graduação. Hoje,

os homens negros (IBGE)

entre a população brasileira

3 17% deles lida

3 são também a

com algum nível de

maioria dos viciados

dependência alcoólica

nas demais drogas

3 Sofrem duas vezes mais

(LENAD)

(LENAD)

acidentes no trabalho; além

83% das mortes por homicídios e acidentes no Brasil têm homens como vítimas — isso significa mais de 110.000 mortes por ano 3

com acesso à Internet, 29% das

do menor auto-cuidado, ocupam muito mais os trabalhos mais perigosos e sujeitos a mortes, (Ministério do Trabalho)

3 1 em cada 4 homens

3 Homens são cerca de 95%

que as mulheres, no Brasil

afirma estar viciado

da população prisional no país,

3 se suicidam quase

em pornografia

sendo que a maior parte dos

4 vezes mais (IBGE)

(dado proveniente de nosso estudo)

encarcerados são jovens, negros e periféricos (Instituto Igarapé)

3 São 82% dos estimados 110

3 1 em cada 4 homens

mil moradores de rua do país

de até 24 anos afirma se

(Ministério do Desenvolvimento Social e

sentir solitário sempre

(Associação Quebrar o Silêncio)

x 25% dos homens — no Norte e Nordeste, a diferença é maior ainda: 24% delas e 18% deles (PNAD 2017)

3 6 em cada 10 homens afirma enfrentar hoje um distúrbio

3 Vivem 7 anos a menos

3 Quando sofrem um abuso sexual, demoram em média 20 anos até contarem isso pra alguém

mulheres têm superior completo

acidentes graves e amputações

(Ministério da Saúde, 2010)

Combate à Fome, 2008; Ipea, 2017)

dos meninos vem caindo,

(dado proveniente de nosso estudo)

3 Cerca de 11 a 15 milhões enfrentam ejaculação precoce ou disfunção erétil, em algum nível

(OMS)

emocional — vocês podem ver mais detalhes sobre quais são esses distúrbios no capítulo "Um raio-x do mundo emocional (dado proveniente de nosso estudo)

Recortes de raça, classe e orientação sexual atravessam e influenciam todos esses índices, em diferentes medidas. Fazendo com que homens negros, pobres ou LGBTs sintam mais de boa parte disso.

Mesmo diante desse cenário, identificamos em nossa pesquisa que apenas 3 em cada 10 homens possuem o hábito de conversar sobre os seus maiores medos e dúvidas com os amigos.


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Os homens sofrem, mas sofrem calados e sozinhos.

"Converso com amigos sobre meus maiores medos, dúvidas e obstáculos" Concordância por orientação sexual (%) Sempre

Total

Muitas vezes

Às vezes

Raramente

Nunca

10 19 28 27 15 %

%

%

%

18%

28%

29%

16%

24%

28%

21%

12%

Raramente

Nunca

1612 2921 2828 1824 815

Heteros- 8% sexuais

%

Não- 15% Heterossexuais

Concordância por faixa etária (idade) Sempre

Total

Às vezes

10 19 28 27 15 %

%

%

%

%

14 a 17 13%

22%

26%

22%

5%

18 a 24 14%

24%

24%

23%

17%

25 a 39 10%

20%

29%

26%

34%

40 a 59 7%

15%

29%

32%

29%

60 ou mais 2%

17%

34%

29%

15%

517342915 2223263229 2624292934 2224201517 13141072

Mergulhando no silêncio, com cortes por orientação sexual e faixa etária

Muitas vezes


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Concordância por faixa etária (idade)

Total

Concordo totalmente

Concordo em parte

%

%

Nem concordo Discordo nem discordo em parte

Discordo totalmente

20 37 13 15 16 %

%

%

14 a 17 16%

28%

44%

19%

23%

18 a 24 21%

35%

12%

16%

16%

25 a 39 20%

40%

13%

15%

12%

40 a 59 19%

37%

13%

14%

18%

60 ou mais 20%

33%

16%

13%

19%

2316121819 1916151413 4412131316 2835403733 1621201920

Pois aprenderam o código do silêncio na infância e adolescência

"Durante minha infância e adolescência, fui ensinado a não expressar minhas emoções."

3 Os homens de 25 a 39 anos reportam maior concordância com a frase, talvez por terem sido criados de modo mais rígido ou por estarem num período de consolidação como homens, se

6 em cada 10 homens concordam que foram ensinados a NÃO expressar suas emoções

tornando pais, estabelecendo família ou a própria carreira. Notamos que os jovens de até 17 anos são os que mais discordam da frase, sugerindo uma possível maior educação emocional entre os mais novos, o que seria ótimo.


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7 em cada 10 homens concordam que foram ensinados, durante a infância e adolescência, a NÃO demonstrarem fragilidade

Apenas 2 em cada 10 homens tiveram exemplos práticos e boas conversas frequentes sobre como lidar com suas emoções e expressá-las de maneira saudável, durante a infância e adolescência

Concordância por faixa etária (idade) Concordo totalmente

Total

Concordo em parte

Nem concordo Discordo nem discordo em parte

30%

%

10%

11 9 %

13%

%

14%

149888 1311101210 1087714 3032343528 3340413840

14 a 17 33%

%

Discordo totalmente

18 a 24 40% 25 a 39 41%

40 a 59 38%

60 ou mais 40%

32%

34% 35%

28%

8% 7% 7%

14%

11%

10%

12% 10%

9% 8% 8% 8%

Sempre

Total

7

%

Muitas vezes

Às vezes

Raramente

Nunca

12 21 29 30 %

%

%

%

14 a 17 9%

13%

20%

26%

32%

18 a 24 7%

12%

18%

30%

33%

25 a 39 5%

10%

20%

31%

34%

40 a 59 9%

12%

22%

30%

26%

60 ou mais 9%

24%

28%

19%

20%

3233342620 2630313019 2018202228 1312101224 97599

39 33 8 %

Concordância por faixa etária (idade)

3 Os homens 60+ são os que mais reportam terem tido bons exemplos de como lidar com suas emoções. Supomos que talvez possa ser uma espécie de saudosismo ou quem sabe um certo nível de contentamento com uma outra perspectiva de relação com as emoções — que poderia ser vista como rígida ou machista para alguns, mas que é satisfatória e costumeira para eles.


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E só 2 em cada 10 homens tiveram exemplos práticos e boas conversas sobre como assumir seus medos e pedir ajuda, durante a infância e adolescência

A educação emocional segue sendo um ponto cego na maneira como os meninos são criados. O que vemos são o silêncio e a falta de amparo quase como regras na formação dos homens.

Ensinamos os meninos a não expressarem emoções, fragilidades, medos ou pedir ajuda. E depois pedimos a eles, quando adultos, que sejam sensíveis, empáticos e se transformem. Isso cria uma sinuca.

Concordância por faixa etária (idade) Sempre

Total

7

%

Muitas vezes

Às vezes

Raramente

Nunca

13 22 28 30 %

%

%

%

16%

23%

24%

28%

18 a 24 8%

14%

22%

27%

29%

25 a 39 5%

11%

21%

30%

32%

40 a 59 7%

12%

22%

29%

30%

60 ou mais 6%

17%

23%

27%

27%

2829323027 2427302927 2322212223 1614111217 98576

14 a 17 9%

3 Os mais jovens parecem ter ligeiramente mais exemplos positivos de como assumir medos, mas ainda é uma mudança tímida.

“O que vejo, na prática, estando em contato com esses homens é que, em geral, muito pouco foi ensinado. Quando comecei a entrar na adolescência, saindo daquela fase de criança e precisei de uma conversa mais madura, não encontrei. Meu pai era uma criança. Por isso a gente fala muito da falta desses ritos de passagem, desse lugar de amadurecimento emocional dos homens.” — Claudio Serva, Fundador do PrazerEle

3 Observamos consequências dessa falta de educação emocional ao ver cada vez mais homens de 30, 40 e até mesmo 50 anos confusos e incapazes de se adaptar a um mundo que não tem mais o masculino no topo. O que se reflete em suas relações amorosas, profissionais e familiares, pois são homens com dificuldade em compreender e expressar o que sentem, ao mesmo tempo em que são orgulhosos demais pra assumir medos e pedir ajuda. Quase agindo como crianças grandes.


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As armadilhas e desafios de linguagem: um de nossos principais desafios

A

A linguagem pode ser um tremendo obstáculo, capaz de afastar homens e mulheres dessa conversa. Um termo como gênero ou equidade pode deixar uma pessoa animada e empolgada, enquanto gera em outra fechamento e aversão. Diante disso, como podemos desenvolver abordagens adequadas para furar as bolhas e construir pontes com quem está distante de nós? Essa é uma pergunta constante dentro da perspectiva específica com a qual trabalhamos. Mas não estamos dizendo que todos devem construir pontes. Muitas vezes estar numa posição emocional ou social que te permita fazer isso, por si só, é um privilégio. Acreditamos que desenvolver linguagens hábeis será cada vez mais essencial para superar alguns dos principais desafios que identificamos hoje no debate de masculinidades: 3 Como trazer para a conversa e superar a resistência de homens que estão fechados, indiferentes ou com aversão ao tema — em especial aqueles em posições de poder? 3 Como dialogar com quem pensa muito diferente de nós sobre gênero, sejam homens ou mulheres? 3 Como trabalhar masculinidades sem vender modelos fajutos de "novos” e “virtuosos” homens? 3 Como trabalhar as dores e obstáculos dos homens sem roubar espaço das pautas das mulheres? Como fazer isso sem ingenuidade, sendo responsáveis e alinhados com os movimentos e demandas delas?

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"É possível dialogar sobre as dores dos homens, com responsabilidade e sem roubar espaço das mulheres?" Essa pergunta surgiu ao longo das conversas na etapa qualitativa dos estudos e, pelo que escutamos de alguns especialistas, nos parece estar ainda em amadurecimento.

S

Será que é possível ou desejável estabelecer uma perspectiva teórica que nos permita abordar as masculinidades sem que esse diálogo precise se iniciar à partir das falhas dos homens e dores das mulheres, mas não deixe de contemplá-las? Essa é uma questão que surgiu algumas vezes durante a etapa qualitativa de nosso estudo. Quando o diálogo se inicia à partir da hipervalorização e "resgate" do masculino ou de suas dores, ele arrisca vir acompanhado de uma perspectiva machista, um retorno ao tradicional de antigamente e repúdio às movimentações das mulheres. Não apoiamos essa visão de modo algum. Buscamos e sugerimos um caminho complementar, parceiro e empático às mulheres. Uma rota que nos permita falar sobre os sofrimentos dos homens nos contextos e momentos adequados, entendendo que isso pode ser feito sem invalidar, diminuir ou tomar espaço de fala delas. Portanto, é necessário sensibilidade e responsabilidade.

“O debate de masculinidade ainda é uma espécie de subcampo do debate de gênero e do debate das sexualidades. Esse campo do gênero, da sexualidade, das relações raciais, é um campo teórico, mas é um campo político também. E como todo campo político, você tem o embate, tem as demandas, isso aparece muito forte. Então quando o homem aparece, é da figura como opressor, é a figura que está colada ao homem no campo das masculinidades.” — Henrique Restier, professor e pesquisador em masculinidades

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Como dialogar sobre masculinidades em tempos de tamanha polarização, na prática? Realizamos uma pesquisa nacional que escutou mais de 9.000 pessoas para responder essa pergunta, em parceria com o Instituto Avon. O resultado é o projeto "Construindo pontes & Derrubando Muros". Você pode encontrar na url abaixo o livro-ferramenta com os achados do estudo e caminhos práticos de atuação, assim como assistir assistir ao minidocumentário resultante.

“A gente vive um momento político muito conturbado. Então o discurso do medo e da violência, assim como o discurso bélico, se tornaram muito fortes. À partir daí erguem-se líderes políticos, em geral homens, filiados a determinadas características das masculinidades hegemônicas e você tem essa retomada reacionária. É uma reação ao debate de desconstrução e questionamento das masculinidades usuais, algo muito característico do nosso momento político.” — Henrique Restier, professor e pesquisador em masculinidades

"Hoje estamos trocando o lugar do clandestino. Antes era a opressão que ficava na clandestinidade. Agora são os movimentos de ressignificação que estão sendo empurrados pra lá." — Tatiana Moura, diretora do Instituto Promundo

3 W W W. PAP ODE HOM E M .COM . B R /P ONTE S


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Contra o que estamos lutando então? Quais os inimigos a serem vencidos?

A

A barreira enfrentada é o machismo: as noções de que o masculino é superior ao feminino, de que homens são mais aptos e capazes do que as mulheres, de que as mulheres estão a serviço dos homens. Isso se manifesta social e estruturalmente em diversas formas e violências, prejudicando prioritariamente as mulheres, mas também com efeitos colaterais que afetam os homens. Socialmente, preparamos os homens para viverem em pequenas e sufocantes caixas que delimitam o que é ser homem. A primeira camada se inicia por uma incapacidade em compreender o que sente. A segunda camada é a escolha em não falar, mesmo quando há um reconhecimento das emoções e sentimentos. O homem escolhe permanecer fechado. A terceira camada é a censura social sofrida

Defendemos que homens possam viver com mais liberdade, responsabilidade e escolha, em todos os sentidos. E que sua maneira de existir enxergue as mulheres como absolutamente dignas de todos os direitos e oportunidades que eles já possuem de maneira equitativa.

pelos homens ao expressarem sensibilidade. É comum serem ridicularizados ou alvo de piada quando se colocam vulneráveis, expressando medos, dúvidas ou emoções tidas como menos masculinas. Basicamente, raiva é a emoção mais permitida aos homens. Outra reação comum é a vulnerabilidade ser abafada com convites pra "deixar isso de lado", "vamos encher a cara que passa" ou o clássico "vira homem, deixa disso". Por fim, vem a indiferença, que é quando o sujeito se abre e é praticamente ignorado, como se isso não importasse muito.

31


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33

MENININHA

Em todos os casos, a mensagem é clara. Sensibilidade demais e falar de emoções não é coisa de homem. A rigidez é tanta que qualquer mensagem emocional corre o risco de ser interpretada como reclamação, fraqueza e, logo, um sinal de ser menos homem.

BEBEZÃO

FROUXO

GAY

BICHA

Esse conceito

E assim é o revestimento da caixa dos homens.

de ser julgado

resume boa parte do sufocamento da masculinidade: esteja sempre dentro da caixa — ou correrá o risco menos homem

HETEROSSEXUAL CORAJOSO ATIVO

FISICAMENTE APTO

FORTE

NO CONTROLE

SEXUALMENTE EXPERIENTE

PRONTIDÃO SEXUAL

FALA FIRME

NÃO DEMONSTRA EMOÇÕES SABE SE DEFENDER

NÃO CHORA

TRABALHADOR

SEXUALMENTE IMPOSITIVO

A pergunta aqui

NERD

A caixa do homem: viver para vencer

O ciclo se retroalimenta, individual e coletivamente. Homens pouco falam sobre o que sentem. Se ao falar são ridicularizados, tolhidos ou ignorados, passam a ter ainda mais dificuldade em identificar suas emoções. Seguem sentindo, mas expressam ainda menos. Quando falam é comum se atrapalharem. Como raiva é a emoção mais aceita para eles e costumam guardar um turbilhão dentro de si, é comum que suas dores, tristezas e frustrações profundas venham acompanhadas de violência interna e externa.

A caixa do homem:

ESQUISITO

PROVEDOR

NÃO COMETE ERROS

NÃO DESISTE

AGUENTA O TRANCO

COMPETITIVO

BEM SUCEDIDO

BULLY

DOMINANTE EM RELAÇÃO À MULHER

é: como superar a obsessão em estar dentro da caixa e o patrulhamento com quem ousa pisar fora dela?

MARICAS FILHO DA MÃE

COVARDE FRACOTE

CRIADO PELA VÓ


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35

Defendemos que haja mais liberdade e escolha, sem deixar de lado a responsabilização. Para que seja ok ser sensível, ser chucro, ser fraco, ser forte, o que for. Não queremos obrigar ninguém a seguir um padrão de novos homens ou de homens bonzinhos.

Acreditamos em trocar masculinidade, no singular, por masculinidades, no plural. Há várias maneiras de ser homem e ninguém deve ser diminuído, ridicularizado ou agredido pela maneira como escolhe viver sua masculinidade.

“O que influencia muito os meninos é a ideia de um poder sem limites apenas por serem homens. Que se relaciona com uma masculinidade hegemônica, que diz que eu sou o cara e posso realizar qualquer coisa, que nada me atinge. Isso é bem comum, não permitir fracasso, não permitir a dúvida do fracasso, não permitir nem a suspeita da possibilidade do fracasso.” — Sérgio Barbosa, filósofo e facilitador de grupos de homens há mais de 25 anos

“A gente se constrói como menino nessa sociedade que tende muito a dar valor às virtudes percebidas como masculinas. A gente tem que ser sempre forte, sempre bem sucedido, tem que ser sempre comedor, foda, vencedor, conquistador. Tem que viver pra vencer, pra conquistar e isso vai criando uma casca muito dura.” — Leonardo Piamonte, psicólogo, que também trabalha com paternidade e masculinidades


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O machismo contra o qual lutamos é construído e reproduzido coletivamente mas passou da hora dos homens

assumirem sua responsabilidade em também mudar essa realidade

Em nossa pesquisa, vimos que a maioria das mulheres e homens concordam que o machismo é uma construção social conjunta.

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O patriarcado é entendido como uma estrutura de poder existente há milhares de anos e que tem os homens na maioria das posições de comando em uma sociedade. O que, logicamente, tende a beneficiar os homens e gerar sofrimento para as mulheres. E como os homens estão em posição privilegiada, é natural existir maior resistência deles à mudança. Por isso é essencial se responsabilizarem, reconhecerem que são protagonistas da violência — em um perverso ciclo no qual são os que mais matam e mais morrem — e dos privilégios sociais.

Entretanto, gênero é uma construção social e relacional, em constante fluxo ao longo da história. Essa visão ampla é necessária para transformar a estrutura atual e caminharmos rumo a um mundo mais equitativo. Isso vai implicar o envolvimento de todos e todas nós.

“Em 98 a gente já estava propondo que era preciso falar sobre homens. Era preciso pensar que gênero é uma condição relacional, ou seja, você não pode falar na constituição de um gênero sem pensar na outra.” — Paula Pinto, antropóloga


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Quem contribui mais para a existência do machismo em nossa sociedade? O quanto os homens concordam:

Os homens contribuem muito mais do que as mulheres

Os homens contribuem um pouco mais do que as mulheres

Ainda que de formas diferentes, homens e mulheres contribuem com peso similar para a existência do machismo

As mulheres contribuem um pouco mais do que os homens

As mulheres contribuem bem mais do que os homens

Apesar da diferença percentual pequena, enxergamos como positivo mais homens enxergarem que possuem O quanto as mulheres concordam:

33 25 17 16 44 55 22 32 33%

17%

44%

2%

3%

25%

16%

55%

2%

2%

responsabilidade maior do que apontado pelas próprias mulheres. Durante muito tempo nós nos omitimos, usufruindo dos privilégios sociais e de poder.

Assumir responsabilidade é diferente de trabalhar com culpa.

3 Podemos assumir

“O Projeto MEMOH não é pra ficar gerando culpa, mas pra gerar responsabilização. Eu não quero que alguém se sinta culpado depois de um encontro, mas que entenda, reconheça o que fez e se responsabilize a partir dali.”

responsabilidade em reconhecer os erros das gerações que vieram antes de nós e fazer nosso melhor para construir um futuro justo e equitativo para todos e todas. É desconfortável, pode nos fazer sentir vergonha e

— Pedro Figueiredo, fundador do MEMOH,

frustração sim, mas esse

que coordena grupos de transformação

é o processo.

dos homens em várias cidades do país


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Introdução

Últimas palavras, agradecimentos e próximos passos

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Como enfatizamos ao começo, esse é apenas o primeiro volume de uma série de publicações que faremos no contexto do projeto "O silêncio dos homens". Procuramos abrir boas perguntas e jogar alguns fachos de luz com os dados gerados em nosso estudo. Temos consciência de que o campo das masculinidades está em amadurecimento e vai nos alegrar muito poder dialogar e refletir publicamente sobre o que produzimos aqui — com certeza há falhas e limitações em nosso olhar, assim como riquezas fruto da posição específica na qual nossa rede se encontra. Por isso optamos em deixar toda nossa produção pública, para que possa ser avaliada, criticada e para que até mesmo novas análises independentes possam ser feitas com a base de dados gerada. Obrigado pela confiança: todos nas equipes de Natura, Reserva, Monstro Filmes, Zooma Inc. e Estudio Nono. Vocês são maravilhosos. Agradecemos também às mais de 40.000 pessoas que responderam nosso questionário e o divulgaram espontaneamente. Que esse material possa inspirar o surgimento de grupos focados na transformação dos homens por todo o Brasil. Que inspire a realização de mais pesquisas e investimentos no campo das masculinidades. E que todos esses esforços caminhem na direção de um mundo mais equitativo, com direitos e oportunidades iguais para todas e todas.

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Quer receber os próximos volumes de nossa pesquisa "O silêncio dos homens"?

Podemos ajudar sua instituição?

Vamos publicar futuramente volumes contendo:

Análise de perfis mais comuns (clusters) de homens e mulheres na sociedade brasileira Como os meninos estão sendo criados? Um retrato dos adolescentes homens Um breve raio-x emocional dos homens e das mulheres O olhar das mulheres

Temos 12 anos de experiência. Caso deseje atuar no campo das masculinidades e equidade de gênero em sua organização, conte conosco. Realizamos palestras, workshops, formações, em formatos específicos indo do chão de fábrica à liderança. Fazemos eventos customizados sobre temas como paternidade, assédio e saúde do homem. E oferecemos um curso online de paternidade ativa dentro dos requisitos legais que toda Empresa Cidadã precisa atender para oferecer a licença de 20 dias. Somos especialistas em dialogar com os públicos mais difíceis e fechados ao tema. Além de tudo isso, conduzimos consultorias, pesquisas e também criamos projetos do zero. Já trabalhamos com Google, Diageo, GM, Bayer, Natura, Reserva, Boticário, Avon, Gillette, Unilever, Toyota, RedBull, Itaú, Bradesco, Banco do Brasil, Gerdau, White Martins, Serasa, dentre outras.

Como a gente se transforma? Gatilhos, obstáculos e benefícios, decupados em detalhes Se cadastre no formulário em www.papodehomem.com.br/silencio para ser avisado em primeira mão pelo Instituto PdH — Instituto de Pesquisa & Desenvolvimento em Florescimento Humano. A sigla do Instituto não significa "papo de homem" pois nos interessa seguir realizando estudos sobre temas além das masculinidades. O que, na prática, já estamos fazendo há alguns anos. Fiquem de olho, vem coisa boa pela frente.

Vai ser um prazer conversarmos: Guilherme N. Valadares

Felipe Ramos

Sócio e diretor de pesquisa

Sócio e diretor de negócios

guilherme@papodehomem.com.br

felipe@papodehomem.com.br

+55 11 99279-8484

+55 11 97020-9407


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Equipe

envolvida na pesquisa e na produção desse relatório

REALIZAÇÃO DA PESQUISA Instituto PdH

EQUIPE ZOOMA INC. Rodrigo Trevisan | CEO e co-fundador Leandro Tonetto | Co-fundador

EQUIPE INSTITUTO PDH — Instituto de Pesquisa & Desenvolvimento em Florescimento Humano

Priscila Brust Renck | Pesquisadora sênior Kandice Van Gról | Pesquisadora

Guilherme N. Valadares | Diretor de pesquisa

Helena Dias | Gestora de projetos e estratégia

Ismael dos Anjos | Coordenador de pesquisa

Roberta Mandelli | Design e estratégia

Felipe Ramos | Diretor de negócios e operações

Luis Miguel Carvalho | Novos negócios

Luciano Ribeiro | Liderança conteúdo Gabriella Feola | Conteúdo

REVISORES VOLUNTÁRIOS DO QUESTIONÁRIO QUANTITATIVO

Rodrigo Cambiaghi | Mídia

Mais do que conseguimos contar, obrigado a todas e todos :)

Gabrielle Estevans | Relações Públicas Bia Aquino | Financeiro

CONSULTORIA DE PESQUISA EM GÊNERO & MASCULINIDADES

Carol Bambuy | Administrativo

Gustavo Venturi

Rachel Daniel | Comunidade

José Reinaldo Riscal DESIGN DO REPORT DE PESQUISA

LIDERANÇA PESQUISA QUALITATIVA Juliana Fava FILTRAGEM ENTREVISTAS QUALITATIVAS

Estudio Nono APOIO INSTITUCIONAL ONU Mulheres

Caio César

Campanhas #ElesporElas

LIDERANÇA PESQUISA QUANTITATIVA

CONVÊNIO PARA DISPONIBILIZAÇÃO DA BASE DE DADOS

Zooma Inc.

Consórcio de Informações Sociais da USP


I N I C I AT I VA E P R O D U Ç ÃO E X E C U T I VA

V I A B I L I Z AÇ ÃO

P E S Q U I SA

INSTITUTO PDH L I D E R A N Ç A P E S Q U I SA Q UA L I TAT I VA

J U L I A N A FAVA

L I D E R A N Ç A P E S Q U I SA Q UA N T I TAT I VA

CO N S U LTO R I A E M M A S C U L I N I DA D E S E G Ê N E R O

G U STAVO V E N T U R I

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