Revista Construir Nordeste Edição 67

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Mas qual é o entrave para o tratamento no Brasil? Além dos custos, a engenheira aponta o problema da falta de capacitação técnica para operacionalização e manutenção de estações de tratamento como um dos fatores impeditivos às práticas de reutilização da água. Uma realidade bem diferente da encontrada na Alemanha, em 2003, ano em que Simone Souza realizou estágio na área de tratamento de esgoto, com ênfase em reúso da água, no país. “Lá, vários prédios comerciais e industriais realizavam o procedimento. A prática já era comum. Por ser um país territorialmente pequeno, uma área do tamanho da Bahia, com uma população que representa a metade da existente no Brasil, com poucos recursos hídricos, o reúso da água virou uma necessidade”, explica. Para se ter uma ideia, os vasos sanitários são projetados com canais distintos para a coleta de fezes e urina, o que facilita o tratamento. O Brasil, de acordo com ela, acomodou-se justamente por ter a maior reserva de água potável do planeta. A isso se soma a questão cultural. Mesmo em zona de conforto, o País começa a acordar para a questão. Com ações ainda consideradas tímidas, iniciam-se os primeiros passos. “Aqui, é muito recente, como tudo na área ambiental”, diz a engenheira. Apesar disso, ela

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elogia as leis ambientais brasileiras, consideradas as mais completas do planeta. Também desmistifica a questão do custo, exemplificando através do caso da popularização das televisões com a tecnologia LED. “Antes eram caríssimas. Agora, como a produção dos equipamentos aumentou, ficaram mais baratas. O mesmo ocorrerá quando começarmos a usar as tecnologias para reutilizar a água”, conclui. Como em qualquer tecnologia, quem sai na frente tem grande vantagem. “Uma construtora que começa a se preocupar com isso vai adquirir experiência e qualificar as pessoas para a reutilização. Além disso, há a questão da sustentabilidade. A população está mais consciente em relação à racionalização dos recursos naturais e, consequentemente, mais exigente”, ressalta. Um projeto brasileiro bem sucedido de reúso de água é o complexo World Trade Center São Paulo (WTC-SP), que realiza o tratamento de efluentes. Desde novembro de 2011, 25% do consumo da água de todo o complexo é reutilizada em descargas sanitárias, espelho d’água, torres de resfriamento do sistema de ar condicionado, limpeza de áreas externas, além da irrigação de jardins. Tudo feito com a água proveniente do esgoto e atendendo todas às normas e padrões de qualidade

necessários para a utilização em fins secundários. O sucesso do inovador sistema de gerenciamento de recursos hídricos, projetado e instalado pela General Water, aliado às ações de implementação dos poços artesianos e sistema de medição de esgoto, foi premiado pela Associação Brasileira de Facilities (ABRAFAC), na categoria Gerenciamento, Manutenção, Operação e Utilidades, um ano depois de entrar em operação, na edição 2012 do Melhores do Ano. Através da iniciativa o WTC-SP, que é autossuficiente em abastecimento de água potável, já colhe resultados, inclusive, financeiros. Houve uma redução significativa no volume de esgoto descartado na rede pública de cerca de 50%; redução no volume de utilização de água potável de 30% e redução no custo mensal na ordem de 30%. “O resultado alcançado com este projeto reflete o comprometimento do complexo com um gerenciamento sustentável, que alcança benefícios econômicos, sociais e ambientais”, afirma o CEO do WTC-SP, Luciano Montenegro. A independência hídrica do complexo que agrupa Torre de Escritórios com 25 andares; D&D Shopping com 95 lojas; Sheraton São Paulo WTC Hotel com 296 apartamentos e o WTC Events Center com 60 espaços de eventos disponíveis, auxilia a concessionária pública, que sofre os efeitos da escassez de água em São Paulo, podendo direcionar o atendimento aos consumidores essenciais, como hospitais, escolas e população em geral. “É uma tendência mundial realizar a própria gestão do uso da água, desde a sua captação e utilização até o tratamento. O complexo se diferencia na relação direta com a sustentabilidade, além do ganho econômico gerado”, é o que diz o diretor comercial da General Water, Ricardo Ferraz. Ele está certo. Os resultados financeiros através das iniciativas voltadas ao uso consciente e sustentável da água devem ficar ainda maiores ao longo dos anos. Afinal, a cada dia, a água se torna um bem mais valioso. Por enquanto, além de sair na frente, o empreendimento nos deixa uma lição de respeito. Os recursos hídricos fazem parte de um ciclo. As torneiras não são fontes mágicas, nem o caminho da água se encerra no ralo ou na descarga.


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