OBRIGADO!
REFUGIADOS EM PORTUGAL
Fotografia © Rui Marques
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Coordenação l Rui Marques Edição l Madalena Saldanha e Francisca Assis Teixeira Redação l Alexandra Ataíde Design l Inês Laureano Fotografia de Capa l Samuel J Rodrigues Revisão l Madalena Saldanha
© PAR 2018
OBRIGADO! Este número da revista Refugiados, da Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), é marcado pelo olhar da gratidão. Em boa verdade, se cultivássemos mais a nossa dimensão de “Homo Gratus”, viveríamos com muito mais qualidade e, seguramente, seríamos muito mais felizes. É essa a aposta para esta publicação que agora lhe chega às mãos. A primeira dimensão em que se foca hoje a nossa gratidão é – e talvez seja surpreendente para alguns – relativa aos refugiados que recebemos.
Rui Marques
partilham, foram fazendo o caminho, com uma generosidade que mostrou o melhor das nossas comunidades. E a cada dificuldade, a grande maioria foi respondendo “presente!”, indo para além do entusiasmo do momento mediático e da comoção epidérmica das imagens fortes. Se casos houve em que o desânimo e a desistência mataram a solidariedade, para quase todos as dificuldades fizeram-nos crescer. Mesmo nos dias mais complicados, em que a perplexidade ocupava todo o espaço, depois de uma partida inesperada ou de uma exigência inaceitável, quem esSim…, enquanto sociedade de acolhimento, teve envolvido no acolhimento, queremos agradecer-lhes o que fizeram por nós. voltou à razão de ser essencial para tudo o que fez. Recordou Estes últimos três anos, com a crise gerada pela chegaque foi gratuitamente, sem esperar qualquer retorno, da à Europa de muitas pessoas à procura de um porto que decidiu ser porto de abrigo. Foi gratuitamente seguro, fizeram-nos despertar de uma longa letargia que escolheu abrir os braços para acolher, mas sem de indiferença. Com algumas honrosas e notáveis prender ou manipular, em tudo servindo e amando. exceções, a maioria de nós estava longe do drama Contudo, também devemos gratidão ao que cada dos refugiados. Foram os que nos bateram à porta que pessoa refugiada nos mostrou de resiliência e coranos acordaram e nos fizeram mobilizar vontades, criar gem. Humanos como nós, cheios de luzes e também redes de resposta comunitária para o acolhimento com algumas sombras, estas pessoas, no lado lumidestas famílias, descobrir recursos e meios que estanoso do seu êxodo, partilharam o seu sonho por uma vam à espera de ser ativados… e algo mudou. De um vida melhor para si e para os seus, como peregrinos país que acolhia cerca de 40 refugiados por ano em de uma esperança por vezes utópica. O facto de como processos de reinstalação, recebemos, em dois anos, foram capazes de correr riscos imensos em busca de 1.600 pessoas, através do programa de recolocação e uma paz ambicionada, faz-nos acreditar que as forças tornamo-nos mais humanos, porque menos indiferentes da natureza humana podem ser extraordinárias. E nos ao sofrimento dos outros. defeitos que evidenciaram, aproximaram-se da nossa Ainda não tinha chegado a primeira família – e a eterimperfeição partilhada. Também nisso somos iguais. nidade que demorou esse período – e já estávamos a A verdadeira gratidão é, no entanto, sempre exigente. beneficiar do bem que os refugiados nos fazem. Pelo Leva-nos a aspirar a ser melhores. Por exemplo, ao SEF lado da PAR, mais de 100 instituições animaram redes ou à Segurança Social, para além da gratidão devida locais de solidariedade que se prepararam e foram pelo que fizeram, é-lhes exigido que façam melhor, na dando o melhor de si. Não temendo a inexperiência forma como servem os refugiados nos seus processos de nunca ter acolhido refugiados ou o constrangide integração na sociedade de acolhimento, cumprindo mento da comunicação difícil entre línguas que não prazos, facilitando o reagrupamento familiar, atendendo diligentemente e dando mostra de uma eficiência da Administração Pública no seu melhor. À PAR, seguramente, também lhe é exigido mais. Mais e melhor acolhimento, mais e melhor defesa de uma sociedade inclusiva em que as pessoas refugiadas sejam bem-vindas, mais e melhores “pontes”. É a isso que estamos convocados. Estamos diferentes. Para melhor. Mas precisamos de continuar a melhorar. E agradecemos por isso.
PS: Sim, as famílias refugiadas também estão agradecidas a Portugal por tudo o que fez, para além de todas as suas limitações. Sabemos disso. E respondemos, com um sorriso: “não fizemos mais do que a nossa obrigação”.
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Salva-Vidas Os últimos anos têm sido muito desafiantes para um conjunto de primados civilizacionais que havíamos dado como consolidados e irreversíveis. Vermos nas fronteiras (desenhadas administrativamente) o regresso dos muros, a separação de crianças dos seus pais ou a deriva sem destino de navios que ninguém quer acolher, não nos pode deixar indiferentes. Num Mundo profundamente marcado por conflitos, desigualdades, perseguições e mudanças climatéricas, os instrumentos de proteção internacional, subscritos voluntariamente por uma maioria de países do Mundo, e logo de aplicação obrigatória, são dos poucos recursos que temos para reequilibrar um mundo polarizado, em que a oferta de refúgio é, por vezes, a única solução. À falta de soluções mais sustentáveis para os seus problemas, as pessoas continuarão a mover-se. E
enquanto não encontrarmos formas mais eficazes de gerir o Direito Humano à mobilidade e à proteção com o Direito nacional de apenas aceitar uns em detrimento de outros, continuaremos a gerir nacional, ou mesmo localmente, um desafio global.
Nos dois últimos anos, Portugal esteve na linha da frente da solidariedade na Europa. Fomos o 6º país da União Europeia que mais pessoas acolheu. Percebemos o desafio que nos foi investido: o de respondermos com generosidade, onde alguns (muitos, infelizmente) responderam com falta de memória, ingratidão e indiferença. Mobilizámo-nos em tempo reduzido, fizemo-lo em profunda cooperação entre administração central, autarquias e sociedade civil, e respondemos onde outros optaram por ignorar.
Pedro Calado
Esta é, contudo, uma corrida de fundo. E nós terminámos apenas os primeiros quilómetros. Muitos estão ainda por percorrer. Esta é a fase em que precisamos de renovar a energia e a esperança. É agora que temos mais de 1000 pessoas refugiadas a viver no nosso país, às quais se juntarão mais 1010 em 2018 e 2019, que precisamos de renovar o ímpeto. Os resultados são animadores. Quase 50% das pessoas acolhidas em Portugal estão já a trabalhar, em formação profissional ou no Ensino Superior e todos têm acesso à educação e à saúde. A língua portuguesa tem hoje uma resposta universalizada e, sobretudo, houve tempo para aprender com o processo anterior. Podemos, agora, fazer melhor.
OBRIGADO!
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Obrigado por fazerem a vossa parte.
Pedro Calado Alto Comissário para as Migrações
Fotografia © Ana Sofia Gonçalves
Mas permitam-me terminar relembrando o essencial. Relembrar o essencial do que temos vindo a fazer e continuaremos a fazer: salvar vidas. É esta a Missão que a PAR tem vindo a apoiar com todas as suas entidades parceiras e que importa relembrar em tempos tão cinzentos em algumas latitudes. Ver esta estrutura a relançar as suas energias para uma nova fase, é algo que só podemos saudar e sinalizar como fundamental para a civilização como a desenhámos até aqui. Estes são tempos em que, no domínio das Migrações, não podemos ficar indiferentes. Não agir, é compactuar com quem procura no Outro o inimigo. Se não respondermos com solidariedade, de forma coletiva, estaremos a corromper os pilares do sonho Europeu e global de um Mundo em paz. Se não salvarmos esta gente (como Nós), não estaremos a salvar os valores mais profundos que nos tornam a todos Humanidade. Em tempos como estes, quem salva uma vida, salva toda a Humanidade. E essa é a magnitude do desafio que temos entre mãos.
André Costa Jorge
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O Sentido da PAR A palavra “obrigado”, como sabemos, tem um duplo em todo o país, entre municípios, paróquias, IPSS e sentido. Um sentido de gratidão e reconhecimento, tal Colégios, que acolheram 144 famílias de refugiados como um sentido de obrigação e dever. O JRS, Serviço (673 pessoas, entre elas 357 crianças) e pudemos Jesuíta aos Refugiados, tem no centro da sua missão, assistir a uma mobilização notável meses antes das desde a sua fundação no mundo em 1980, o dever de primeiras chegadas, que coincidiu com o repto lançado acompanhar, servir e defender os refugiados, deslopelo Papa Francisco para que cada paróquia acolhesse cados à força e migrantes em situação de particular uma família de refugiados. vulnerabilidade. É guiado, também, pelos valores da O sentido de dever permitiu-nos capitalizar recursos compaixão e da solidariedade, o que nos leva a sene reunir competências exclusivamente para a missão tirmo-nos gratos, todos os dias, pelas pessoas a quem da PAR, disponibilizando apoio técnico às instituições, podemos dar a mão e, principalmente, por aquelas com garantindo o seu acompanhamento durante o procesquem podemos aprender. Foi com este espírito que deso de acolhimento e integração e articulando com as cidimos, no final de 2015, aderir à Plataforma de Apoio demais entidades públicas. aos Refugiados (PAR) como um dos seus membros fundadores. O sentido de gratidão permitiu-nos ouvir e responDesde logo, para que pudésseder a muitas dúvidas, procurar respostas, aprender mos partilhar a experiência que desde o primeiro dia e ouvir as histórias que nos já tínhamos desenvolvido em Portugal e, também, capitalizar continuam a animar aquela que recebemos da rede JRS presente em mais de 50 A PAR acolheu cerca de 40% dos refugiados que países do mundo com uma longa história de acompacomeçaram a chegar a Portugal desde 2015, mas mais nhamento da população refugiada. do que um número, recordamos as histórias de todos Era necessário dar uma resposta urgente e, também, aqueles que puderam voltar a viver em segurança e enviar um sinal ao poder político por parte da sociedaa sentir-se de novo em casa; dos que puderam voltar de civil de que esta estava pronta para o acolhimento a sonhar com um trabalho, com uma casa, com a de quem mais precisava com hospitalidade. No total, educação para os filhos e, até, com um novo destino. acompanhamos cerca de 90 instituições anfitriãs A estes últimos, os que saíram de Portugal, sabemos que nunca o fizeram sem sentir gratidão. Recordamos, também, as pequenas conquistas que fomos fazendo, em conjunto, com as instituições anfitriãs. É a elas, que partilharam connosco quer o sentido de dever, quer o de agradecimento, a quem devemos o nosso mais sincero “obrigado”. Pelo espírito de abertura, o trabalho, dedicação e resiliência de dezenas de organizações dispersas pelo país e, também, pelo sinal que enviaram ao mundo, muitas vezes com pequenos gestos. Lembro-me dos vários bebés nascidos já em território nacional e que foram batizados com nomes de pessoas das comunidades de acolhimento. Podia mencionar inúmeros exemplos, mas lembro-me, especialmente, de uma família da República Centro-Africana, com a sua bebé Dalila,
OBRIGADO!
#7 acolhida em Fafe, e de toda a hospitalidade que a rodeou. A biblioteca da cidade instalou computadores com os programas necessários para que pudessem contactar com a sua família, e o supermercado local que empregou o pai da família improvisou uma sala na arrecadação para que pudesse rezar as vezes que fossem precisas durante o dia.
as portas de casa e os seus corações ao estrangeiro. Sem medo. E com a PAR, pudemos testemunhar isto mesmo e, mais importante, ter um papel ativo nesta Hospitalidade em ação. São ações como estas, de dever e gratidão, que dão à existência da PAR os seus múltiplos sentidos. E queremos, por isso, continuar este caminho e provar que a hostilidade só é combatida Defendemos que só a hospitalidade pode com a construção genuína de combater a hostilidade, o medo e a violência. comunidades de hospitalidade. E fazê-lo juntos. André Costa Jorge Diretor Geral JRS Portugal
Fotografia © Cedida pelo JRS Portugal
Este que pode parecer hoje um valor em desuso, renegado para segundo plano, mostrou serenamente que não está esquecido, através destes inúmeros gestos de pessoas e comunidades que continuam a abrir
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Cuidar da Espera
PAR Linha da Frente
Fotografia © PAR Linha da Frente
OBRIGADO!
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Em 2015, mais de um milhão de pessoas procuraram Grécia, o trabalho de intervenção da PAR foi sendo, refúgio na Europa. No ano seguinte, mais 170.000 cada vez mais, consolidado pela intenção de diferenrefugiados chegaram à Grécia. ciação da sua ação, através do foco do trabalho com O programa PAR Linha da Frente@Grécia teve início no jovens e com mulheres, nomeadamente a partir da primeiro trimestre de 2016, no seguimento da campanha dimensão ubuntu, e com crianças, e no estreitamento PAR Linha da Frente@Líbano e de uma visita exploratória de laços com a comunidade e organizações locais. à Grécia, em março de 2016. Configurou-se um prograA Grécia tem, atualmente, mais de 58.000 refugiama de voluntariado ao serviço da crise humanitária de dos e migrantes, de acordo com os dados do Alto pessoas oriundas, maioritariamente, do Médio Oriente Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados e determinou-se o início desta missão com o intuito de (maio, 2018). Numa procura de resposta concertada e dar apoio - em sintonia com autoridades e organismos solidária com esta realidade, responsáveis, organizações internacionais e locais -, ao então programa de “Portugal tem estado na linha da frente, literalrecolocação, contribuindo para a sua mente, mas também a responder, na segunda agilização e melhoria de funcionamento, linha, cá, e é, neste contexto de crise migratóno acolhimento e integração de pessoas refugiadas que chegavam à Grécia. A ria, um país que se afirma como uma referência, missão estabeleceu-se na ilha de Lesbos como exemplo a seguir. e na cidade de Atenas. Através do modelo específico de intervenção da PAR É um grande orgulho continuarmos hoje com vários - modelo assente na proximidade e cuidado junto das voluntários na Grécia, e cá, que envergam o colete, que pessoas refugiadas -, foram sendo construídos e permadiz Portugal nas costas, e que são reconhecidos por isso. nentemente atualizados - de acordo com o contexto, Não só pelas muitas atividades que fazem e pelo que necessidade, público e propósito -, pressupostos de entregam, mas pelo muito que deixam em termos humaintervenção com base numa ação sustentável de construnos, em termos de presença. E esta lógica de intervenção e coesão comunitária, capacitação e apoio interpesção é altamente diferenciadora”, partilha Tiago Marques, soal. Para isso, determinaram-se dois objetivos especícoordenador estratégico das missões da PAR na Grécia. ficos do programa: i) apoio na receção, acolhimento e Assim, procura-se fortalecer o modelo de intervenção da integração de pessoas refugiadas, em colaboração com PAR, que se espera replicável, investindo, além da capaoutras organizações, internacionais e locais, através de citação dos indivíduos e das comunidades, na construção um programa de voluntariado qualificado e sustentável; de um sentido de coesão e de apoio inter e intra pares, ii) serviço de voluntariado especializado em diversas árecom base em valores de solidariedade, humanismo, emas, particularmente numa resposta educativa não-formal patia e justiça social. Acredita-se, assim, que desta forma, e de capacitação, fundamentada nas dimensões do eu, é possível construir a paz e cuidar da espera. da sociedade, da ação cívica e do valor social. Isabel Silva, voluntária da PAR em Lesbos no verão de Estas duas premissas de ação têm vindo a nortear o 2017, partilha, a este propósito, que os/as voluntários trabalho dos mais de dois anos de trabalho na linha escolhem “ser aquilo que, ser realmente humano, exige: da frente e foram sendo adaptadas aos diferentes ser instrumentos de paz”. momentos e acontecimentos de persistente tensão política e resposAo longo dos mais de dois anos de trabalho, fota europeia difusa à chegada e à ram já mais de 110 voluntários/as que ajudaram permanência de pessoas na Grécia. a construir e consolidar a intervenção na linha da Não obstante a contínua chegada de pessoas às ilhas gregas, a saída frente. Este trabalho é, segundo Pedro Amaro de grandes organizações e agências Santos, voluntário da PAR em Atenas entre nointernacionais do terreno e a incapacivembro de 2017 e março de 2018, “de acolhidade de recolocação de várias famílias mento incondicional (...). É ter o amor sem asrefugiadas noutros Estados-Membros, teriscos como forma única de podermos cuidar esta crise humanitária deixou de ser considerada de urgência e passou a desta espera”. ser de permanência e de necessidade de integração. Neste sentido, e num Tânia Neves IPAV / PAR Linha da Frente tempo cada vez maior em que estas pessoas ficam na
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Acolher e Integrar
Um desafio de humanidade
Familia Kayalli
Passado um tempo disposemo-nos a acolher outra família. Desta vez a família Hussein, de 7 elementos - Pais e 5 filhos. Tivemos receio que acontecesse o mesmo. Preparámo-nos para isso. A disposição para acolher foi igual na disponibilidade e no serviço, mas diferente na predisposição de aceitar que OBRIGADO!
Familia Hussein
O Instituto São João de Deus aderiu à PAR desde o seu início. Moveu-nos a vontade de não ser indiferente à tragédia humanitária que se desenrolava diante dos nossos olhos. Preparámos uma casa e uma equipa de acolhimento. Esperámos alguns meses. A burocracia é mais lenta do que o coração. Em março de 2016, recebíamos a família Kayalli na casa de Saúde do Telhal. Ainda hoje recordo o alvoroço de tudo querer fazer bem feito. A família era grande: dois avós, os pais e 3 filhos. Rapidamente se sentiram em segurança e dispostos a começar uma vida nova. As crianças foram para a escola, os pais e avós iniciaram aulas de português para poder arranjar trabalho. Foi uma festa quando Adham arranjou trabalho na equipa técnica de um hotel em Lisboa. Entre os elementos da equipa e a família, foi-se cimentando a amizade e a informalidade. Vibraram com a vitória de Portugal no campeonato da Europa e com os golos de Ronaldo. Tudo corria bem. Muito bem mesmo. Um dia, desapareceram de forma inesperada. Sem aviso, sem sinais. Doeu… porque o teriam feito? Porque desapareciam assim? Houve que ultrapassar a desilusão, a zanga, procurar entender. Meses mais tarde, enviaram fotografias da Alemanha. Estavam bem, junto de familiares. Tinha nascido mais um bebé e estavam felizes. Agradeciam e não esqueciam Portugal. Mas era preciso juntarem-se à família alargada e dar um futuro melhor aos filhos. Entendemos, finalmente. Pois não é isso o que mais importa?
respeitaríamos a vontade da família se quisesse seguir para outras paragens. Chegaram em janeiro de 2017 e ainda permanecem na sua residência da Tapada das Mercês. Passaram já 18 meses. Falta pouco para terminar o apoio. Agora a nossa preocupação não é uma eventual saída, mas a sua autonomia. O pai trabalha como ladrilhador numa empresa de construção, a filha mais velha trabalha como auxiliar na Casa de Saúde do Telhal, o irmão mais velho faz trabalhos na agricultura, as crianças estão na escola. Um dos adolescentes não quis continuar a estudar e procura agora trabalho para ajudar a família. Foram progredindo no português, no uso de transportes, na consciência do valor do dinheiro, no significado das despesas fixas, nos cuidados de saúde, no desempenho escolar, na procura de trabalho. Vivem perto da comunidade islâmica das Mercês e frequentam as suas atividades. As escolas – pública e privada – foram essenciais na integração e tudo têm feito para que as crianças adquiram aprendizagens que não tinham. Também o centro de saúde tem sido um apoio essencial nos problemas de saúde que se têm levantado. O tempo passou bastante depressa. Algumas vezes não foi fácil. Aprendemos que quando surgem dificuldades e problemas, é necessário resolvê-los em conjunto. Quando terminar o programa, continuaremos ligados a esta família. Mais de longe, certamente. Saberemos caminhar lado a lado. Tenho para mim que o acolhimento tem sido mútuo. A instituição também aprendeu, também mudou, também cresceu. E no final – quando e se houver final - seremos nós a agradecer este desafio que se tornou uma experiência de humanidade.
Margarida Gonçalves Neto Pela Equipa de Acolhimento da Casa de Saúde do Telhal/ISJD
“Um país onde não nos sentimos discriminados discriminados” Estávamos quase a afundar quando os soldados da Grécia nos salvaram e nos deram uma nova vida. Esperávamos que a vida na Europa seria um paraíso, onde estaríamos seguros. Quando cheguei, fiquei em choque, sentei-me e senti-me numa prisão, num campo de refugiados sem água nem eletricidade. Fiquei numa tenda com 15 pessoas até encontrar um grego muito simpático que nos arranjou um hotel para ficarmos. Foi aí que encontrei o grupo da Plataforma de Apoio aos Refugiados e nos falaram sobre Portugal. Esperámos 5 meses e nunca esquecerei o dia 23 de setembro de 2016 porque foi quando cheguei a Portugal. Estava com medo do futuro desconhecido, mas sabia que seria o início de uma vida com estabilidade. Quando cheguei cá estava um grupo de portugueses à minha espera que era muito simpático e acessível e que nos deu muito apoio e fez-nos sentir seguros. Esse grupo ajudou-nos bastante e agora eles são a minha segunda família. Arranjaram-nos uma casa que hoje é a minha casa. Entretanto já passou um ano e 7 meses, já pude aprender português e consegui entrar para a universidade, que era o sonho do meu pai: que saísse da Síria e continuasse a estudar. Também a minha mãe já trabalha, num restaurante de comida Síria, o Mezze, onde é cozinheira. E o mais importante de tudo é que hoje vivemos em liberdade e temos paz e segurança num país onde não nos sentimos discriminados. Família Aloush
Em janeiro de 2015, eu e a minha família estávamos em Alepo e começou a guerra na nossa cidade. A nossa casa foi bombardeada e tivemos de fugir para uma cidade no Norte de Alepo, chamada Afrin, que é perto da fronteira com a Turquia. Eu, a minha mãe e o meu irmão decidimos, durante a noite, fugir para a Turquia e o meu pai não pôde vir connosco porque estava a trabalhar numa empresa. Seguimos por um caminho ilegal, no meio das montanhas e onde se sentia o silêncio, o frio, o escuro. Tínhamos medo dos soldados turcos, porque para além de tudo, somos curdos. A certa altura, um soldado viu-nos e quis matar-nos e para que não o fizesse, pagámos-lhe e deixou-nos passar a fronteira. Por sermos curdos, a vida na Turquia era muito difícil e não podíamos ficar lá a viver, sabíamos a língua mas não poderíamos trabalhar nem estudar. Resolvemos ir para uma cidade perto do mar, onde encontrámos um homem que fazia rotas ilegais pelo mar. Pagámos-lhe quase $2000 para entrar no barco de borracha, que tinha capacidade para 15 pessoas, mas onde estavam 60. Estivemos no mar durante 12h com frio e chuva, era tudo muito perigoso e não consigo, até hoje, esquecer esse dia.
Rohaf Aloush Acolhimento pela Unidade Pastoral de Nova Oeiras e São Julião da Barra
Cedido pela CAIS, in Revista CAIS edição de junho 2018
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A importância de conjugarmos o
verbo ACOLHER Ainda hoje me lembro do misto de nervosismo, entusiasmo e emoção que senti na véspera de ir buscar a família Aloush ao Aeroporto de Lisboa. Parecia que ia buscar familiares que não via há muitos anos, vindos de longe, que eu já amava e por quem ansiava, mas que não conhecia! É por isso que neste caminho partilhado nos referimos quase sempre à família que acolhemos como a nossa família, pelo laço que começou antes de nos conhecermos e que perdurará, aconteça o que acontecer no futuro. Antes do dia da sua chegada estava um ano de preparação para o acolhimento por uma equipa que criámos na nossa Unidade Pastoral, com o desejo comum de acolher uma família de pessoas como nós. E para mim estava ainda a experiência intensa e transformadora como voluntária em duas missões com refugiados: uma no Verão de 2015 na Sicília com a Comunidade de Vida Cristã da Europa, e outra no Verão de 2016 na Grécia e ao serviço da PAR – Linha da Frente. As duas missões trouxeram-me a convicção de que era urgente e possível continuar a fazer alguma coisa no nosso país e retirar estas pessoas de acampamentos e centros que deviam ser temporários. E o desafio do Papa Francisco, de que
cada comunidade acolhesse uma família de refugiados, confirmava a chamada à ação e concretizava-se no projeto de acolhimento da PAR. Durante um ano procurámos informar-nos sobre tudo o que poderia ser importante para uma família que vinha do outro lado do mundo, a fugir da guerra e com tudo o que isso implica, sem saber falar português e sem conhecer a nossa cultura. Pensámos onde poderiam viver, estudar, trabalhar, quem lhes ensinaria português, de que cuidados de saúde poderiam precisar e como nos poderíamos dar a conhecer. Desde então, aprendemos, rimos e chorámos em conjunto, partilhámos as nossas vidas, persistimos perante as dificuldades e procurámos acompanhá-los na construção de uma vida em Oeiras. Houve momentos duros, de conversas difíceis, de falhas de comunicação, de fragilidade pelo tanto que íamos aprendendo à medida que íamos avançando, mas superá-los em conjunto fez da experiência aquilo que ela é: uma experiência real de pessoas de culturas diferentes que se procuram conhecer, viver em conjunto e em fraternidade. O acolhimento desta família ensinou-me a importância de conjugarmos o verbo acolher na nossa vida. Aprendi que acolher o outro implica cada um de nós, porque também nós queremos ser acolhidos. É preciso acolher o outro como ele é e está. Temos que estar atentos à tentação de querer acolher uma família como queremos que ela seja, fazendo e sendo o que nós dissermos para fazer e estar. E temos que dar espaço para o outro tomar as suas decisões, dar os seus passos, adaptar-se a uma nova realidade, curar as suas feridas.
Rita Sacramento Monteiro
Acolher não é tolerar. É mais do que isso! Acolher é amar e conjugar incessantemente o verbo amar. É acompanhar e fazer caminho em conjunto.
OBRIGADO!
Equipa de Voluntários e Família Aloush
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Hoje, depois de 3 anos de projeto e de 2 anos partilhados com a nossa família, estou cada vez mais certa deste modelo de integração que desafia uma comunidade a trabalhar em conjunto e a ativar as redes locais. O acolhimento humano e digno com vista à integração não será real e verdadeiro se assentar apenas em processos e prazos legais. São precisos laços afetivos, é preciso pertencer. Pertencer a uma terra, a uma Comunidade, ser reconhecido pelos outros, criar raízes. São precisas mais Comunidades que como nós e tantas, acreditem que abrir as mãos e o coração vale sempre mais a pena do que fechá-los. O terreno fértil para o acolhimento é aquele feito de persistência, coragem, compromisso. E os frutos foram ao longo do caminho todos os momentos de superação, as vitórias, a partilha, e o maior sentido para a vida que fomos descobrindo em conjunto.
Se formos além dos nossos medos e interesses, das dificuldades e dos desafios de acolher o outro, acredito que a paz será possível para todos. Temos hoje a oportunidade de redescobrir a riqueza e a transformação que o outro traz às nossas vidas. Se arriscarmos o encontro, viveremos inspirados pela experiência de como o outro é um bem e de como cada um de nós pode fazer o bem, pode fazer a diferença.
Rita Sacramento Monteiro Voluntária responsável pela Equipa de Acolhimento da Unidade Pastoral de Nova Oeiras e São Julião da Barra
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Novo começo para todos Para quem acolhe também Setembro 2015... O CLIB recusa ficar indiferente à crise de refugiados, pouco a esta ação, que a determinação para acolher provenientes sobretudo da Síria e do Iraque, quer ser mais famílias continuou a crescer. Assim, um jovem casal agente de mudança e mobiliza os seus alunos e famílias sírio com um bebé seguiu-se em setembro de 2016; para que “alarguem o espaço da sua tenda” e acolham outro casal iraquiano com um menino de 3 anos, em nesta comunidade, pelo menos uma família que se fevereiro de 2017; e ainda um outro casal sírio com 2 encontre num campo aguardando alguma boa vontade crianças de 5 e 6 anos, em maio 2017; e mais um com 3 de um país europeu a fim de reiniciar a sua vida, em meninos, o mais velho dos quais portador de grave defipaz, no espaço que para ela sejamos capazes de criar. ciência, em novembro 2017; por último, neste momento, Nesse mesmo momento, a PAR está a ser constituída, um casal iraquiano com 4 crianças dos 4 aos 14 anos foi pronta a dar os primeiros (grandes) passos e anuncia acolhido no CLIB em abril de 2018. por esses dias a assinatura de parcerias com instituições São 10, neste momento as crianças que beneficiam que pretendem ser anfitriãs de famílias refugiadas por de bolsas para frequência do colégio, as suas famílias um período de dois anos. Alinhados, pois, precisamente são apoiadas; os pais trabalham, exceto um, estando no mesmo sentido, a PAR aceita o CLIB como uma destambém em casa as mães que têm bebés, uma delas sas instituições, tendo sido assinado um protocolo que nascida há 2 meses entre nós. se vem a concretizar em maio de 2016 com a vinda da Uma das melhores experiências de vida para todos no primeira família, um casal sírio com 4 crianças dos 6 meCLIB. Nunca tínhamos sonhado poder contribuir com ses aos 6 anos. Estas 3 crianças mais velhas começam a um pequeno gesto que ajudou a reestruturar a vida frequentar o colégio, os pais aprendem português com destas pessoas, injustamente feridas pela imensa malvoluntários mobilizados para o efeito, alunos, pais e dade humana. Um desafio sobretudo para eles, porque professores do colégio, nas suas horas vagas fazem-no as diferenças culturais têm algum peso, bem como o com gosto. Um grupo de alunos que estuda a crise dos modo de vida em Portugal e as despesas inerentes à refugiados mete mãos à obra preparando, a casa que reconstrução de uma vida entre nós. foi cedida por familiares de uma professora, e toda a Estas pessoas tiveram a dose necessária de coralogística necessária à vida gem de fugir em condições tão adversas e correndo destas 6 pessoas como alimentação, vestuário, saúde tantos riscos. Merecem o nosso respeito, paciência e busca de emprego. para enfrentar dificuldades, um dia de cada vez, e A experiência é tão gratimuito afeto, sem qualquer tipo de reservas. ficante, ser parte de uma As crianças abraçam-nos todos os dias e esse gesto ínfima parte da solução para este problema acressignifica tanto para elas e para nós. centa tanto à vida de todos quantos nos dedicamos um
OBRIGADO!
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Helena Pina Vaz Diretora do Colégio Luso Internacional de Braga, CLIB
Helena Pina Vaz e Família Shilash
Estando no seu lugar, o que esperaríamos dos outros seres humanos? Se o mundo encolhe cada vez que um conflito violento impede a vida num país, não teremos de alargar o espaço do “nosso” território para sermos refúgio de algumas destas pessoas?... Sensível a este problema terrível o Papa dizia há dias: “cada um de nós é chamado a estar próximo dos refugiados, a encontrar com eles momentos de encontro, a valorizar o seu contributo, para que também eles se possam inserir melhor nas comunidades que os recebem”. Por pouco que seja, cada um de nós deve fazer a sua parte, porque a nossa missão é guiar jovens e sabemos que uma escola deve agarrar com mãos e coração estas oportunidades de educar em circunstâncias concretas; não é preciso criar experiências de laboratório para ensinar a fazer o bem. As oportunidades estão por aí, multiplicam-se, avolumam-se às nossas portas, basta abrir, agarrar para resolver... e abraçar. Somos tão mais felizes agora, venha a sétima família!
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* *OBRIGADO celestes pedem cooperação e solidariedade para ajudar Não esperávamos que o que aconteceu na Síria atinos outros. Não importa quem está a sofrer com a pobregisse este nível de criminalidade, exterminação, desloza e privação, ou quem sofre o flagelo da guerra. camento da população em massa, diante de máquinas Sabemos que Portugal é um país pobre em comparação de guerra mortíferas. Tudo graças aos desmesurados com outros países europeus. interesses económicos dos países, da vulnerabilidade dos povos, em nome do patriotismo, territorialidade e recursos subterrâneos de petróleo, minerais, O nosso papel aqui é sermos irmãos e estarmos juntos fósforo e de muitos lado a lado, contribuir para encontrar uma solução para o outros minérios. deslocamento de muitas crianças e mulheres, para acabar Nós somos os maioas guerras, amarmo-nos uns aos outros e continuar a vida res derrotados nesta guerra. Os países em com segurança. conflito conseguiram o que pretendiam e os seus povos foram deslocados. Espero por Deus que o que aconteceu no meu país não Ocuparam a terra e obtiveram benefícios através da aconteça em nenhum outro país do mundo, mas se isso assinatura de acordos válidos por centenas de anos acontecer, você saberá o significado de abandonar a sua com aqueles que mataram, e fizeram deslocar mais de 5 pátria e viver como refugiado num país diferente nos milhões de pessoas, para delapidar a riqueza nacional. seus costumes e religiões, numa sociedade completaDe que seremos nós culpados, civis, crianças, idosos e mente distinta. Só então, você compreenderá o que é a mulheres, para suportar toda essa injustiça? nostalgia da sua pátria. Nós perdemos a nossa pátria, a nossa terra e as nossas Agradecemos a todos aqueles que simpatizaram casas. Emigrámos para procurar a segurança que perdeconnosco, nos acolheram, ajudaram e apoiaram como mos.... Acabámos sem lar e emigrámos para outro país, refugiados. Obrigado a todos os que nos ajudaram e Portugal, que não o nosso, para uma pátria que não nos fizeram sentir que somos parte dessa nova sociea nossa. Ficámos surpreendidos com a reação dos portu- dade e nos integraram em todas as esferas da vida. gueses ao descobrirem que vamos partilhar com eles os Obrigado a todos aqueles que nos deram amor grátis. seus direitos, como refugiados de guerra e não como Obrigado àqueles que nos ajudaram a conseguir um vítimas da fome ou da pobreza, queremos que todos emprego neste país, para que possamos viver sem ser saibam que fomos obrigados a fazê-lo. Nós não saímos um fardo para os outros. para obter dinheiro, como dizem algumas pessoas, se A nossa presença aqui, é temporária. Voltaremos às o nosso objetivo fosse esse, teríamos feito isso muito nossas origens e contaremos aos nossos filhos e famíantes da guerra e queremos que todos saibam que lias que nos aguardam, os detalhes da nossa viagem à não viemos para sermos um fardo ou uma causa para Europa e a boa receção do seu povo, que partilhou as perturbação de outros. nossas tristezas e alegrias e aumentou a nossa força e Devemos lembrar que a situação dos refugiados, hoje, determinação. é a mesma dos seus antecessores europeus no Médio Oriente, que procuraram uma vida o mais normal Mahmood Daher e Safaa Ibrahim possível. Nós, como seres humanos, devemos pensar Acolhimento pela Associação COR UNUM dos na humanidade longe do racismo. Todas as religiões Apóstolos do Coração Imaculado de Maria Cedido pela CAIS, in Revista CAIS edição de junho 2018
OBRIGADO!
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Família Daher
...a todos aqueles que nos deram amor grátis”
AMAL SOAP COMO É QUE SE PODEM JUNTAR DOIS MUNDOS? Com a guerra na Síria as famílias de Amal
Meiat e de Maisaa Katef tiveram que deixar irmãos, pais e amigos. Alepo e Damasco ficaram para trás. Seguiu-se um caminho longo e difícil, a pé até à Turquia, de barco de borracha até à Grécia, de avião até um país onde foram recolocados e que não conheciam, Portugal. “Muito contente quando chega em Portugal, porque muito tempo a esperar em Grécia, eu cansada, grávida. Muito gosta Portugal para descansar, para ficar bom”, diz Maisaa descrevendo o momento da chegada com as palavras em português que já aprendeu, a satisfação de chegar. Acolhidas pelo Centro Comunitário de Carcavelos, pouco depois, começam um negócio social com vários jovens universitários. Tudo começou há pouco mais de um ano. Num dia de aulas de português, Maisaa conheceu a Benedita, que a desafiou a integrar o projeto Amal Soap. Projeto esse que nasceu de uma cadeira de empreendedorismo social. “Foi-nos proposto resolver um problema que nos fosse familiar. Uns meses antes tinha conhecido a Maisaa através de um amigo em comum, fiquei sempre com esse bichinho na cabeça, de conseguir ajudar de alguma forma na integração. Como estávamos a estudar gestão surgiu a questão como é que poderíamos juntar estes dois mundos. E foi aí que surgiu o Amal Soap”, conta Benedita Contreras, responsável pela gestão do projeto. Nascia um negócio de comércio justo para empoderar mulheres refugiadas sírias, cujo produto é o Amal Soap, um sabonete natural feito a partir de uma receita ancestral síria, originária de
Alepo. Uma receita de integração e, ao mesmo tempo, de um produto de qualidade. Unem-se dois mundos, o mundo do negócio e a área social.
UMA RECEITA E INOVAÇÃO SOCIAL.
O objetivo da Amal Soap é tornar as mulheres sírias financeiramente independentes, socialmente integradas e acima de tudo esperançosas com o futuro. O projeto cresceu e agora já é Associação “Amal Soap – Hope for a New Home”. Amal significa “Esperança” em árabe, um nome com força e significado, que não podia estar mais bem aplicado. Maisaa e Amal são as responsáveis pela criação, pelo processo e produção de um produto 100% natural. Azeite e óleo de louro são os ingredientes base deste produto milenar de saboaria síria impregnado de histórias. A Amal Soap, por um lado, permite-lhes a ligação às suas tradições e, por outro, partilhar a sua cultura. “Se eu tivesse que descrever a Amal, descreveria como uma lufada de ar fresco, ou uma esperança enorme. Este projeto não só está a ajudar as várias pessoas envolvidas, nomeadamente as famílias da Maisaa e da Amal, como também a nós, estudantes de gestão, pela nossa capacidade em superar os diversos obstáculos que têm surgido ao longo de todo o processo”, afirma Joana Roquette, responsável pela comunicação da associação. “Conseguimos assim cumprir o nosso propósito: produzir um sabonete de qualidade a partir de ingredientes e processos artesanais, ao mesmo tempo capacitar estas mulheres e contribuir para o seu processo de integração.”
Fotografia © Marta D’Orey Photography
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Esperança e Empoderamento de Mulheres Sírias ano e meio tornaram-se empreendedoras e embaixadoras do seu próprio país e cultura. São cunhadas, mães, uma com três e outra com quatro filhos, e que agora trabalham juntas, apesar de ser a meio tempo para poderem cuidar dos filhos e da casa. Têm muitas histórias para partilhar. A Maisaa conta que chegou grávida. Pode dizer-se que chegou “de esperanças” a Portugal. O seu quarto filho, uma menina, nasceu em Lisboa. Ela estava triste porque não tinha a mãe e a irmã para estarem ao lado dela no parto, mas as equipas no hospital trataram-na tão bem, que compensaram a falta da família que ficou em Damasco. A bebé chama-se Rand, nasceu no dia 14 de fevereiro de 2017 na Maternidade Alfredo da Costa, e está ótima. Chegaram a Portugal com as suas famílias vai fazer um ano e meio, e a Maisaa, quando fala de Portugal, dá os melhores elogios e faz muitas comparações com o povo e a terra que ama. “Bonito e pessoas muito bom, pessoas parecidas às pessoas da Síria.” Das dificuldades ao início, refere a aprendizagem do português, a burocracia e usar o lenço e a roupa, por serem diferentes. Para Amal o português também é um desafio, que não vai descurar. “A maior dificuldade é a língua portuguesa, mas eu vou aprender para as crianças e para o trabalho. À pergunta “o que gosta mais em Portugal”, Amal responde “as pessoas”. “Pessoas muito simpáticas, país lindo, calmo. Há palavras portuguesas parecidas com as árabes: azeite, az-zayt; açúcar, as-sukar”. As duas mulheres sírias, empreendedoras, bem-dispostas e determinadas, fazem caminho. “Uma coisa é saber o que se sabe nas noticias e na televisão acerca dos refugiados, outra coisa é conhecer mesmo e sentir este acolhimento tão grande da parte deles. São muito humildes. Aprendemos sempre uns com os outros, a diversidade cultural é muito importante”, diz Joana, que garante que as famílias vão melhorando cada vez mais quer na parte da língua quer da integração. Ali, o marido de Maisaa trabalha numa empresa de construção civil, Mustafa, marido de Amal é condutor numa empresa de transportes infantis. Joana conta que quer um, quer outro, vão sempre aos eventos da Amal Soap com as crianças. “É muito bom, porque vão todos. Valorizam a família. É bom ver a importância que dão à educação dos filhos”, afirma.
Equipa Amal Soap
MULHERES, SÍRIAS E EMPREENDEDORAS. Amal e Maisaa há um
sociais com soluções sustentáveis e sistemáticas. Ligam lucro e impacto social, e abrem as portas da Amal Soap à comunidade envolvente. O espaço e o processo de fazer o sabão foram duas vitórias recentes. “No início estávamos com um tempo de cura de 2 meses, mudámos o processo e conseguimos passar para uma semana, o que nos dá mais capacidade de resposta a encomendas e uma grande vantagem em termos de produção” acrescenta Benedita, que nos conta que o que mais gosta na Amal Soap. “As pessoas à minha volta. A equipa, as pessoas do bairro, as pessoas que vou conhecendo, que partilham e ajudam com contactos e com a própria experiência.” A Amal Soap é recém-chegada a um bairro em Porto Salvo, que tem lojas em piso térreo e algumas delas não estavam a ser usadas. A equipa não quer só trazer um projeto, mas também quer criar relação com as pessoas do bairro. “O bairro tem uma grande predominância de pessoas cabo-verdianas e é muito giro ver esta ligação de culturas diferentes. O nosso objetivo é também reavivar este espaço, criando atividades para as pessoas do bairro. Por exemplo, vamos ter aulas de inglês aqui com uma parceria com o projeto SPEAK e já tivemos um workshop de saboaria para jovens, com a Maisaa e a Amal. O objetivo é assim a interação entre culturas e aceitação para uma melhor integração de toda a gente”. Esperança e entusiasmo na equipa não faltam, que, de forma persistente e enérgica, vai ultrapassando os diversos obstáculos com humor. Juntos trazem cor a esta nova história, a história da Amal Soap, que já é comunidade e mudança. Juntos unem dois mundos, e unem famílias, amigos e vizinhos.
O SABONETE E O BAIRRO. Para lá de um
sabonete tradicional de Alepo, de um negócio social que emprega e empodera mulheres sírias, foi criada uma associação que quer ser parte na resolução de problemas
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Benedita Contreras Associação Amal - Hope For a New Home
Do Iraque a Braga UMA ESCOLA É UMA COMUNIDADE TRANSFORMADORA. No Colégio Luso-
Internacional de Braga (CLIB) os alunos, assim como os pais, os professores e outros colaboradores, são vistos enquanto agentes essenciais na resolução de problemas complexos como a crise dos refugiados. “Para os alunos é também uma forma de se sentirem parte da resolução do problema. É assim que nós funcionamos. Queremos ter os alunos informados acerca do que se passa, do que está bem e do que está mal, do que temos de resolver, e sermos de facto parte da resolução de algumas coisas. E esta é uma experiencia muito concreta. Há dois anos que o colégio acolhe e integra famílias de refugiados, neste momento acolhe e acompanha três famílias. Uma delas é a família Ali do Iraque, do Curdistão iraquiano, que chegou ao CLIB no passado dia 5 de abril.
DESDE O IRAQUE ATÉ BRAGA. Em 2016
Frmesk e Shyda Ali fugiram do Iraque com os quatro filhos, ainda todos crianças, o Deria, a Sham, o Mohammad e a Tablo, e que hoje são todos alunos no CLIB, do pré-escolar ao secundário. “Fugimos da guerra e viemos para Portugal a procurar segurança”, disse Shyda Ali, o pai da família. Os seis fizeram a perigosa travessia do Mediterrâneo da Turquia para a Grécia, onde ficaram mais de um ano até serem recolocados em Portugal. Contudo, o pai contou que, depois da chegada a Portugal, ainda estiveram alguns meses na Alemanha para ele ser operado. Da segunda vez que chegaram a Portugal, foram acolhidos pelo CLIB. Shyda no mesmo mês que chegou a Braga começou a trabalhar na área da construção, para a organização Habitat for Humanity. A área da construção civil não lhe é completamente estranha, porque, no Iraque, Shyda tinha um negócio de revestimento de fachadas de prédios em pedra. “No Iraque trabalhava em cerâmica e mármore. Tinha o meu próprio negócio com uma equipa de oito pessoas. Fizemos revestimentos de edifícios. A minha vida foi boa. Depois veio o estado islâmico da Síria e do sul do Iraque. E começou a guerra no Curdistão, e a vida tornou-se difícil. Eu queria salvar a minha família, e, portanto, saímos do Iraque”, contou Shyda Ali. A mulher, Frmesk também quis começar a trabalhar fora de casa e mostrou disponibilidade para trabalhar em qualquer área. No colégio houve recentemente uma vaga para trabalhar na limpeza e na cozinha, que foi proposta a Frmesk. A jovem mãe iraquiana aceitou de imediato.
JUNTOS CRIAM NOVAS RESPOSTAS. No
processo de acolhimento e integração, a interajuda dos adultos tem movido montanhas. O colégio é, no entender da diretora, uma comunidade em que as famílias acolhidas podem estar todos os dias, inclusive nos fins de semana nas atividades organizadas pela escola. A responsável do CLIB explicou que o contexto da escola, para lá da educação dos filhos, oferece às famílias um apoio mais próximo em que todos se envolvem e interajudam. Muitas das ofertas de trabalho têm surgido do OBRIGADO!
Fotografia © Ricardo A Nascimento
#20
esforço dos pais dos alunos, que procuram ajuda junto das suas redes sociais e entidades empregadoras. Porém, quando fala de integração, a responsável do colégio diz que é um processo difícil, com altos e baixos, sobretudo para os adultos que têm mais dificuldade em aprender uma nova língua ou um novo trabalho. “As principais conquistas são para as crianças felizmente e são elas as que melhor se adaptam. Os adultos têm alguma dificuldade”, afirmou Helena Pina Vaz. A maioria dos adultos chega sem documentos e certificação de habilitações, o que, na maior parte dos casos, significa que terão que aceitar trabalhos para os quais têm mais qualificações do que aquelas que são pedidas ou aceitarem mesmo trabalhos que nunca exerceram.
A CRIATIVIDADE E A EMPATIA PERANTE OS PROBLEMAS. No que diz respeito à integração das
famílias refugiadas, “outra dificuldade é a barreira linguística, que para as crianças é menor. Elas rapidamente conseguem apanhar as línguas do colégio, uma vez que as aulas aqui são em inglês e poucas em português”, disse Helena Pina Vaz, explicando que para os adultos é mais difícil. O colégio organizou aulas de português para os pais, mas eles têm mais resistência em integrar o estudo formal da língua. Esta dificuldade foi o ponto de partida para ser criado um novo modelo de aprendizagem do português enquanto língua estrangeira. A diretora do colégio desenhou um modelo diferente e à medida, que tem resultado muito bem. “É extremamente informal. Um grupo de visitas vai a casa de cada família com o intuito de visitar, algo que por eles é bastante apreciado. Apreciam muito o convívio e esses gestos sociais. Muito informalmente acabam por lhes ensinar algumas palavras, algumas questões do funcionamento da nossa língua. Há um caderno em cada casa partilhado por todos. Cada um vai e escreve de que é que falou nesse dia, o que é que conseguiu ensinar, e as famílias acham piada ao sistema. Sentem que aprendem a brincar e, sobretudo, recebem as visitas. Tem sido o único modelo de ensino de português que nós temos conseguido pôr a funcionar”, revelou Helena. Nem sempre é fácil o processo de integração das famílias. Todavia, perante os problemas, a comunidade educativa do CLIB vê-os como desafios e recorre à criatividade e à empatia para construir novas respostas.
Quando Acolher UMA EQUIPA MULTIDISCIPLINAR DE VOLUNTÁRIOS. Há cerca de dois anos uma equipa
de voluntários, de diferentes áreas profissionais, foi criada na Paróquia de Torres Vedras para acolher uma família de refugiados. A ideia foi do P. Daniel, o pároco, que já tinha liderado outra equipa numa outra paróquia. A família Hassan chegou a Portugal no dia 16 de agosto de 2017 e uma nova fase começou. “Por um lado, tinha muito entusiasmo e achava que era um serviço que era pedido e que eu tinha de aceitá-lo, por outro tinha algum receio de não estar à altura”, conta Marília, uma dos seis voluntários, que acompanha pai e filha, Lazgin e Lava, sobretudo na área da saúde por ser enfermeira. “Eles são sírios, mas são curdos. Segundo Lazgin, o facto de serem analfabetos tem a ver com isso, porque os curdos na Síria não têm acesso à educação. Ele ainda fez o 2º ano. A Lava não tinha escolaridade nenhuma”, explica Marília.
DUAS GRANDES CONQUISTAS PARA A FAMÍLIA HASSAN. Lava começou a ir à escola e
Lazgin conseguiu trabalho. Lava tem 16 anos, é órfã de mãe e tem um problema de saúde que ainda não se conseguiu diagnosticar. Até chegar a Portugal, nunca tinha aprendido a ler e a escrever. Depois de vários obstáculos ultrapassados, desde janeiro faz parte da turma do 3º ano numa escola de ensino básico em Torres Vedras. “A minha professora chama-se Marta. As minhas amigas são a Joviana, Ana, Tecia, Rebeca. Gosto de brincar e da natação. Gosto de tudo na escola”, explica Lava em árabe, uma língua que não domina. A sua língua materna é o curdo. A comunicação e a aprendizagem para Lava e Lazgin é bastante mais difícil sem um intérprete de curdo-português. O desafio, agora, é aprender a ler e a escrever em português. “Eu já aprendi coisas simples como “olá”, “bom dia”, obrigado”. Conheço as letras e consigo escrever o meu nome completo em português. Mas, desde que comecei a trabalhar esqueci-me um bocadinho” afirma o pai, que arranjou trabalho na agricultura no início de abril passado. Para este homem de 48 anos, o dia começa cedo e é passado no campo. “Levanto-me às cinco da manhã e tomo o pequeno-almoço. Saio as sete menos cinco e começo o trabalho às oito. Eu apanho couve-flor e fava numa quinta, é difícil porque as costas ficam curvadas. O meu trabalho é difícil, mas é necessário para a nossa vida. O trabalho serve para assegurar as nossas necessidades” explica Lazgin que em Qamishli, no noroeste da Síria, era taxista e também vendia roupa”.
ESPERANÇA NUM FUTURO MELHOR.
Lazgin e Lava veem Portugal como um país pacífico que lhes abriu as portas e para eles os portugueses são um povo acolhedor. Para trás ficaram os ataques dos grupos extremistas como o Daesh e Jabhat Al-Nusra, assim como dos exércitos sírio e turco. Também a estadia difícil
em três campos de refugiados na Grécia: junto à fronteira com a Macedónia, em Salónica e em Atenas. “A nossa vida melhorou em comparação com a vida na Grécia, que era difícil. Estamos tranquilos, não há problemas”, afirma. No entanto, Lazgin ainda não goza da paz interior que gostava, estão separados da família. Um outro filho seu está na Turquia. Dos oito irmãos que tem, três ficaram na Síria e outros cinco estão em diferentes países da Europa. O reencontro é um dos sonhos de Lazgin. Outro dos seus sonhos é um bom futuro para Lava. “Os meus sonhos estão ligados à minha filha, que ela esteja bem e que ela tenha um bom futuro. Isso e é o mais importante. Eu vim para cá só por causa da minha filha. Tenho que ajudá-la, e também vamos precisar de ajuda por parte dos médicos e da instituição aqui.”
REGRESSAR A CASA POR UM MOMENTO.
“Nós sabíamos que havia um restaurante sírio em Lisboa, um restaurante criado precisamente por refugiados. Por isso, quando fomos com eles ao SEF, decidimos ir ao restaurante. Foi muito bonito, porque foi como se de repente eles se sentissem em casa”, recorda Marília. “Eu calculo que aquilo seja como se nós estivéssemos a viver na Síria e fossemos a um sítio onde houvesse caldo verde e bacalhau cozido com grão”, acrescenta ao contar o momento vivido com a família no restaurante Mezze em Lisboa. Ao fazer uma retrospetiva do acompanhamento de Lava e Lazgin, Marília refere duas principais aprendizagens nestes últimos meses. Uma delas foi perceber a generosidade deles, o gosto que Lava e Lazgin têm em partilhar o que têm, seja um chá, rebuçados ou um prato de doce. A outra aprendizagem foi que a falta de tempo é um mito. No início, os voluntários, todos trabalhadores a tempo inteiro, tinham a sensação de que não teriam tempo suficiente para disponibilizar, mas rapidamente perceberam que juntos e concertados, conseguiam ajudar na integração da família. Sobre a importância e a urgência do acolhimento das pessoas refugiadas, a voluntária deixa a mensagem que acolher é a resposta, e adianta que se fossemos nós, também quereríamos ser acolhidos. “Sempre foi para nós muito claro que é um direito delas, serem acolhidas, e que é um dever nosso acolhê-las”. Fotografia © Samuel J Rodrigues
é a resposta
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PORTUGAL aos olhos de quem acolhe e de quem é acolhido PELO DIREITO À EDUCAÇÃO. A família
Shilash deixou a Síria em novembro de 2013. “Saímos de Alepo por causa da guerra, pois a situação era muito difícil para mim e para a minha família. Mudámos para a Turquia, e vivemos lá 4 anos”, recorda Hassan Shilash, acrescentando “Na Turquia não passámos por muitas dificuldades. Vivia lá toda a minha família e a nossa vida era boa. Tenho cinco irmãos. Os pais da minha mulher também vivem na Turquia”. Estava tudo a correr bem em Istambul até ao momento em que Hassan e a mulher, Reeman, precisaram de inscrever o filho mais velho na escola. Ahmed tem uma deficiência grave. “Precisava de fisioterapia e uma escola especializada. Na Turquia existia a possibilidade de tratamento médico. Mas os sírios não tinham acesso às escolas específicas para deficientes. Por isso, inscrevemo-nos no programa de reinstalação em 2016”, relata o pai. Quando se informou sobre Portugal, disseram-lhe “o povo português é muito simpático, acolhedor e sociável”. Em Portugal Hassan, Reeman e os filhos Ahmed (8 anos), Yasan (4 anos) e Ibrahim (2 meses), foram recebidos pelo Colégio LusoInternacional de Braga (CLIB). Em novembro de 2017 Ahmed começou pela primeira vez a ir à escola.
UM LOCAL IDEAL PARA ACOLHER. “O
CLIB é muito bom e eles ajudaram-nos muito. Em relação ao meu filho com deficiência ajudaram com fisioterapia e educação especial. Ajudaram também com alojamento. O CLIB está a ajudar com diversas coisas”, diz Hassan. A família Ali conseguiu para Ahmed o apoio que ele precisava na instituição anfitriã, o Colégio LusoInternacional de Braga (CLIB). “Deve ser a situação ideal, porque é uma comunidade onde há crianças, onde há adultos, onde há muitas possibilidades de ajudas. Quem acolhe tem a possibilidade de viver esta questão na pele e fazer este esforço de integração cultural. Não é só darmos a conhecer a nossa cultura, mas também
OBRIGADO!
fazermos um esforço de nos adaptarmos a outras culturas”, afirma Helena Pina Vaz. A diretora do CLIB referiu que desenvolvem diferentes atividades de cidadania, solidariedade e interculturalidade na escola. “Por exemplo tivemos aqui a semana da literatura no colégio e, este ano, por sugestão minha e intencionalmente por homenagem a estas famílias, foi escolhido o tema literatura árabe. Correu muito bem. Foi importante para ambos, quer pelo conhecimento adquirido quer pela valorização da cultura, conta a responsável do colégio, para quem uma comunidade educativa é um local ideal para acolher famílias de refugiados.
DAR AUTONOMIA E REUNIR AJUDAS.
Para que cada família se integre melhor, é necessário garantir-lhes alguns meios e acompanhá-las nalguns processos e rotinas essenciais, como nas idas ao hospital, ao centro de saúde, … “Explica-se como é que tudo funciona. Leva-se a todos os sítios a primeira vez. Vai-se explicando como é que funciona, sabendo que temos dois anos para esse processo, e que os dois anos passam muito rápido, e que quanto mais rápido eles perceberem como é que as coisas funcionam, mais suave se torna esta transição”, explica Helena Pina Vaz. Neste processo de acolhimento e integração de famílias, a diretora do CLIB revelou que gosta de educar os jovens para estas ações solidárias e de dar a oportunidade às pessoas do CLIB, e comunidade envolvente, de fazerem alguma coisa com sentido. “Gosto das ajudas surpreendentes que tenho recebido e do apoio das pessoas. E gosto que seja mais uma oportunidade na minha vida de resolver, embora muito pouco, alguma coisa, mobilizando as pessoas.”
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ajuda da instituição anfitriã está à procura de trabalho. Quando era adolescente começou a gostar de pintura e arte na escola. Começou a aprender a fazer gravações em mármore e a desenvolver a técnica com ilustrações. “Eu trabalhava na área de decoração de interiores, mosaico e gravação em mármore. Trabalhei nessa área durante dez anos. Também tenho experiência em mobília de cozinhas, casas de banho e quartos”. Se não encontrar um trabalho nestas áreas, Hassan diz que se vê a trabalhar em fábricas de produtos alimentares ou de roupa, por exemplo. A par do desejo de voltar a trabalhar na área da decoração, Hassan acalenta outros sonhos. “Espero que o meu filho Ahmed melhore, e que ele receba o tratamento médico que precisa. Que
eu encontre uma boa oportunidade de trabalho e que a guerra na Síria termine. Estes são os sonhos dos refugiados. Que a guerra termine para não morrerem mais pessoas”. Em Braga, a família Shilash aos poucos vai-se aculturando, mas com uma preocupação muito forte: o reencontro da família. “Neste momento é difícil, porque não temos a família cá. Espero que permitam aos refugiados visitar as famílias na Turquia e regressar. E que estes procedimentos legais sejam mais simples para as pessoas poderem reunir-se com as famílias”, confessa Hassan Shilah, que sonha um dia voltar ao seu país. Enquanto isso não acontece agradece as oportunidades e o apoio que têm sido dadas à sua família no país, como um dia lhe contaram, das pessoas muito simpáticas, acolhedoras e sociáveis.
Fotografia © Ricardo A Nascimento
À PROCURA DE TRABALHO. Hassan com a
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Podem duas jovens SONHAR UMA FAMÍLIA DE REFUGIADOS POLÍTICOS. A guerra e a destruição escalavam em Alepo em 2015. Os serviços públicos estavam deteriorados, a função pública parada. O Governo de Bashar Al-Assad deu ordem às autoridades para começarem a prender funcionários. Abdulsalam, investigador num laboratório de química, foi libertado ao fim de 15 dias, embora outros colegas e amigos não. Muitos ainda estão presos, outros morreram. Passados seis meses, Abdulsalam é notificado novamente para se apresentar às autoridades. Com a mulher, Gaithaa, e os três filhos toma a decisão de fugir. O filho mais velho, Mohamed, com 20 anos, foi à frente, sozinho. Acolhido na Alemanha, ficou separado da família. “Estou a trabalhar numa fábrica de iogurtes, sem férias, ao mesmo tempo que aguardo os resultados da candidatura ao curso de medicina. Não está a ser fácil.”, disse, em inglês, durante um vídeo chamada para a família, que coincidiu com a entrevista da PAR. O pai, Abdulsalam, a mãe, Gaithaa, e as filhas, Dania e Rama, com 15 e 17 anos, partiram juntos pouco depois. Em fevereiro de 2016, foram a pé até à Turquia e, com outros refugiados dentro de um barco, fizeram a travessia do Mediterrâneo até à Grécia. Passaram 4 meses em Atenas até serem recolocados em Portugal, um país de que tinham ouvido falar por causa do futebol e do Cristiano Ronaldo. 22 de junho de 2016, o dia da chegada, ficou gravado na memória da família.
A PARÓQUIA É A MELHOR COISA QUE NOS ACONTECEU. Coimbra é hoje a cidade desta
família acolhida, há dois anos, pela Paróquia de Sto. António dos Olivais. “O centro paroquial mostrou-se disponível para acolher uma família, qualquer que fosse. Quando chegou fomos buscá-la ao aeroporto de Lisboa. A prioridade foi a legalização, garantirmos que eles podiam estar aqui com os mesmos direitos do que qualquer cidadão, e também com acesso aos cuidados de saúde, porque quer a Gaithaa, quer a Rama precisavam de cuidados médicos”, explica Filipa Vaz Serra, coordenadora da equipa dos voluntários. “Quando chegámos, nós conhecemos a Filipa e o Frei Domingos. Gostámos muito da casa e do local. A paróquia é a melhor coisa que nos aconteceu. Nós aprendemos a língua, eu e a Rama continuamos na escola. E depois o meu pai começou logo a trabalhar”, conta Dania, a filha mais velha. “Para este tipo de situações é muito importante a gratuidade, o fazer sem mais nada, só porque sim, porque é uma responsabilidade de todos nós perante situações destas. Acho que na nossa equipa de voluntários se nota muito isso e orgulho-me muito disso”, afirma Filipa. A articulação do apoio e da ação das entidades e cidadãos faz toda a diferença aos olhos de Sofia Vaz Serra, irmã de Filipa, que também tem acompanhado a família. “Se não fosse a PAR isto não teria acontecido desta forma”, afirma.
OBRIGADO!
Apesar da burocracia e da demora do SEF na emissão das autorizações de residência, Abdulsalam conseguiu trabalho no armazém de uma empresa farmacêutica e o contrato já foi renovado. Em Alepo, ele era um investigador químico, responsável por uma equipa num laboratório de análises de metais, que pertencia ao Estado. Aos poucos está a aprender português para se poder integrar melhor e desempenhar uma função na área que gosta, química. Apoiados por uma equipa de voluntários, e pelos amigos desses voluntários, começaram os quatro a aprender português na Faculdade de Letras e com a associação Apojovi e Aposénior. “Para Abdul não tem sido fácil aprender português, mas o grande sentido de humor do Abdul ajuda”, exclamou Sofia.
A MÚSICA RESGATOU A RAMA. “Eu sou
encarregada de educação da Rama e orgulho-me imenso dos pequeninos passos que a Rama foi dando. A Rama chegou com 15 anos” disse Sofia. “Tem evoluído, tem aprendido, e tem sido uma aluna espetacular face a todas as limitações que ela já teve. Eu admiro-a imenso pela capacidade de dedicação, de estudo, do esforço que está a fazer para aprender uma língua que não conhece, conhecer pessoas novas, de lidar com alguns olhares menos empáticos. Admiro essa faceta dela de agarrar as coisas e de não desistir. Com 15 anos não é fácil.” Tentámos ajudá-la a passar esta fase mais difícil através da música. Começava uma nova história, a história do piano. “Eu sempre tive o gosto de aprender e não tive essa hipótese, porque eu era pequena quando começou a guerra e não havia um lugar perto de casa. Quando cheguei cá, fui a um concerto na Quinta das Lágrimas. A Sofia perguntou-me se eu gostava de aprender a tocar piano, eu disse que sim e depois inscreveram-me”. Pouco depois Rama começava as aulas com o professor Pedro, oferecidas por uma escola de música. Há um ano e meio que toca piano e em abril interpretou pela primeira vez em público “The heart asks for the pleasure first”, de Michael Nyman. Nos tempos livres aproveita para treinar no piano que um voluntário lhe emprestou.
AMOR E O SENTIMENTO DE PERTENÇA À VOLTA DA MESA. A mãe cozinha muito bem. “O
amor que Gaithaa coloca na cozinha uniu e salvou esta família quando ela cá chegou. O facto de a mãe ficar em casa a cozinhar foi importantíssimo para que eles se sentissem um bocadinho mais perto da Síria quando chegavam a casa. A comida teve um papel de ponte, um papel de aconchego para todos eles”, diz Sofia. Os dotes culinários de Gaithaa têm ajudado a quebrar barreiras nos convívios e festas em que têm estado. “As refeições têm esse papel importante de confraternização. As culturas misturam-se e conhecem-se à volta da
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Fotografia © Alexandra Ataíde
...RECONSTRUIR o país onde cresceram?
mesa. Percebes que somos iguais. Gostamos de comer, de conviver e de partilhar experiências à volta disso”, adianta. Gaithaa é formada em Biologia e era professora primária em Alepo. Por cá, começou à procura de trabalho na área da restauração, que lhe poderá ser mais fácil, embora já tenha recusado a oportunidade de trabalhar numa pastelaria, pois teria de retirar o lenço que usa na cabeça. O próximo passo será frequentar uma formação do IEFP para criar um negócio próprio. Um pequeno restaurante de comida árabe em Coimbra, quem sabe. “Quando se conhece, quando se torna próximo, se come à mesma mesa, as barreiras caem, a empatia cresce e percebemos que somos todos iguais apesar das diferenças de cada pessoa, da cultura, da religião”.
PODEM DUAS JOVENS DESEJAR REGRESSAR E AJUDAR A RECONSTRUIR O SEU PAÍS? “Percebemos que eram pessoas com sonhos, que tinham uma vida fantástica, uma família unida, que foi separada por uma catástrofe” diz Filipa, que revela: “uma das coisas que nós notámos foi que a Dania e a Rama tinham uma necessidade incrível de continuar a sua vida”. No que diz respeito às filhas, Sofia confessa que a sensibilizou a atitude dos pais, Gaithaa e Abdulsalam, e recorda quando autorizaram que Rama
frequentasse uma escola católica para se preparar para as provas do 10º ano. O grau de confiança que eles depositaram em nós foi muito grande. Disseram-nos: “vocês é que sabem, se acham que isso é o melhor para ela, é para onde ela vai.” As duas irmãs quando chegaram a Portugal quiseram logo voltar à escola. Para Rama a escola, para além dos estudos, trouxe-lhe amigos e momentos bons que não esquece. “O dia em que dormi em casa de uma amiga da escola, foi a primeira vez, foi muito bom”. “Quero entrar na universidade num curso que depois possa fazer alguma coisa pelo meu país”, afirma Rama. Engenharia civil e informática são cursos que poderá vir a seguir para depois regressar à Síria e intervir na reconstrução do país. Já Dania escolheu uma área ligada à saúde. “No início eu queria ir para medicina, mas aqui foi difícil entrar, por isso escolhi farmácia, mas estou a gostar. Eu gosto de ler e saber coisas novas, aprender”. Dania tem dado testemunho em escolas do que se passa na Síria e do que estão a viver milhares de pessoas. Perderam quase tudo, mas não tudo. Permaneceram a dignidade, o amor e uma vontade incrível de continuar a vida. Têm-se uns aos outros e novos amigos, colegas, casa, escola, trabalho, país. Passos novos foram dados, acompanhados, e um novo caminho está a ser percorrido por esta família.
#26
LONGE da Guerra
começar do zero num novo país
ANTES DE PORTUGAL. A família síria Ombashi
chegou há um ano e meio a Portugal, mais precisamente a Leiria. Hasna Basoon e Kamel Korshed Ombashi para protegerem os filhos e sobreviverem todos à guerra, deixaram a Síria. Em 2015 saíram de Alepo, depois de terem vivido debaixo de bombardeamentos constantes. Perderam tudo. Na Turquia e na Grécia, ao todo, estiveram mais de dois anos. Viveram em campos de refugiados. Em Salónica, perto da fronteira com a Macedónia, e em Atenas, partilharam a tenda com outra família de refugiados. Passaram fome, frio, privação de sono e sem acesso a medicamentos, mês após mês. O que mais custou a Hasna e Kamel foi não terem comida, medicamentos e roupa suficiente para darem aos filhos. “A maior dificuldade que encontrámos foi na Grécia, onde as condições de vida dos refugiados eram difíceis. Ficámos nos campos perto da fronteira com a Macedónia, em Salónica. Não havia casas, só tendas. No campo onde vivemos cada tenda tinha duas famílias. A tenda era pequena, não dava para duas famílias. Foi muito difícil. Não havia espaço suficiente para dormir. Havia muitas pessoas. Não havia comida nem roupa suficiente. Não havia escolas para as crianças.” conta Kamel com tristeza no olhar ao recordar o ano na Grécia. Hasna explica que sofreram muito até serem recolocados em Portugal.
“FINALMENTE ACABOU”.
“A chegada da família Ombashi era aguardada já há muito tempo. Há mais de um ano que nós esperávamos pela família. Chegaram no dia 12 de janeiro de 2017. Fomos buscá-la ao aeroporto. Foi uma espera longa, com um acolhimento difícil no SEF. Era a única família que chegava com muitas crianças, então identificámo-las de imediato.” explica a irmã Maria Engrácia, da Congregação da Irmãs Franciscanas Hospitaleiras. A superiora do Convento de Santa Clara, a instituição de acolhimento desta família, conta que “quando entraram na carrinha, dormiram até casa, porque vinham extenuados. O pai vinha completamente exausto, a mãe também”. A chegada a casa, no terreno do convento, ficou marcada por um momento que a irmã não esquece. “Recordo um pormenor da chegada em que o pai se senta no muro ali antes da entrada e põe as mãos na cabeça e disse qualquer coisa como “finalmente acabou””.
SÃO SETE FILHOS E CADA UM É ESPECIAL. A irmã Maria Engrácia não perdeu tempo, não há tempo a perder quando se trata de restituir vida e
OBRIGADO!
dignidade. A família precisava de cuidados de saúde e dos seus documentos para começarem do zero. Centro de saúde, segurança social, finanças, junta de freguesia, SEF, foram a prioridade. Seguiu-se o desafio seguinte: escola para os seis filhos Ombashi, uma condição determinante para a integração social, desenvolvimento e bem-estar das crianças. “O Ahmad é o mais velho com 18 anos. A Dooa tem 16 anos. O Hussein tem 14 anos. A Ines tem 9 anos. O Mohammed e a Jana têm 4 anos. E vem mais uma a caminho. Vamos chamá-la Maria.”, disse Hasna Basoon, que respondeu prontamente ao pedido de apresentação de cada um dos seus, agora, sete filhos, expressando carinho e admiração. Quando Hasna começou a descrever cada um dos filhos, o rosto dela iluminou-se de doçura, ainda mais do que aquela que já lhe é habitual. “O Ahmad é sociável, ajuda os outros, é bom aluno e tem sentido de humor. Dooa é boa aluna também e ajuda muito em casa. Todos são simpáticos e amáveis. O Hussein é criativo e gosta de representar. É bom aluno. Em relação à Ines, ela estuda bem na escola. O Mohammed e a Jana andam na pré-escola e estão bem. Gostam uns dos outros e ajudam-se uns aos outros, e também ajudam os pais.” Enquanto a mãe trabalha em casa e como ajudante de cozinha no colégio do Convento de Santa Clara e o pai trabalha numa fábrica de mobiliário como carpinteiro, os filhos vão à escola. Os mais novos foram integrados no colégio das irmãs – Colégio Conciliar de Maria Imaculada -, os mais velhos estão a frequentar escolas de ensino público. Já todos têm amigos na escola e sorriem quando lhes perguntamos se têm um melhor amigo. “Sim chama-se Bernardo. Eu gosto muito dele porque ele ajuda-me muito. Quando eu não percebo as coisas, vou perguntar, ele ajuda-me.”, afirma Hussein que quando for “mais grande” quer fazer teatro. A Ines também tem um sonho, ser bailarina. “Gostaria de aprender a dançar ballet, fazer espetáculo. Sinto-me bem a dançar.”, diz Ines que gosta muito de estudar e de brincar com as amigas às escondidas e à apanhada. Entretanto, há um sonho da família Ombashi que acaba de se concretizar. A bebé Maria já nasceu, em Leiria, bem ao centro de Portugal, e tudo correu bem….
CONTINUAR A LUTAR PELOS SONHOS. O pai Ombashi durante a guerra e a destruição em Alepo, trabalhou como fisioterapeuta para o Crescente Vermelho Sírio, uma das delegações do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. Kamel mantém o sonho de voltar a exercer
#27 A ALEGRIA É PARTILHADA. A religião e cultura
diferente nunca foram entrave a uma amizade que é cada vez mais forte entre todos. Para a irmã Maria Engrácia a confiança foi e é um elemento chave. “A forma como eles confiaram em nós. Acho que isso nos tocou a todas, porque, quer queiramos quer não, somos irmãs e isso para eles talvez não lhes dissesse nada. Mas eles confiaram, demonstraram sempre muita confiança em nós.” Sente-se a cumplicidade e a sintonia que existe entre eles. A família Ombashi foi a primeira família de refugiados a ser acolhida pela Congregação das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras e a vida das irmãs também mudou no último ano e meio. “É uma alegria, porque eu tenho 94 irmãs velhinhas e esta família dá-nos muita alegria e torna-nos vivas, mais novas. São a alegria da casa, a correr naqueles corredores.”, afirma a irmã Maria Engrácia, dando conta de que a integração da Família Ombashi é um caso de sucesso que se reflete em todos. Ao longo de ano e meio a felicidade desta família foi conquistada por todos e com todos, uma grande equipa. No dia-a-dia a alegria dos Ombashi é partilhada e faz eco no convento, onde a família começou do zero.
Fotografia © Samuel J Rodrigues
fisioterapia. Na única mala pequena que a família trazia quando chegou a Portugal, vinha a bata que usava enquanto fisioterapeuta. Vai continuar a lutar por este sonho. Com o apoio das irmãs da congregação, a irmã Maria Engrácia tem amparado cada novo passo e cada sonho desta família. A família está cada vez mais autónoma e integrada. Esta é a maior alegria da irmã, uma mulher de fibra com 68 anos. Contabilista de formação, ela mostra que as pessoas valem bem mais do que os números. “O que é que eu aprendi? Aprendi muito. Eles ensinaram-me muito. Principalmente a capacidade de sacrifício, de luta, como conseguiram ultrapassar tantas dificuldades da guerra e como conseguiram chegar cá. Uma família numerosa que não perdeu nenhum pelo caminho. Isso foi aquilo que mais me tocou. Sente-se a união que há entre eles, porque só com esta força de união é que se consegue o que eles conseguiram. Doutra forma seria impossível.”, afirma a irmã Maria Engrácia, e explica que tudo fizeram para que eles se sentissem protegidos e aceites. Para Kamel há muito a fazer nos próximos tempos pela sua família e não só. “Queremos integrar na sociedade e promover cooperação e entreajuda entre pessoas. Somos pessoas muito abertas. E esperamos que o futuro vai trazer coisas mais positivas do que no passado.”
#28
Uma COMUNIDADE em AÇÃO e uma UMA COMUNIDADE, EM AÇÃO. Há um grupo,
Grécia, e finalmente Portugal, Caldas da Rainha. Fugiram do terror e dos bombardeamentos, que “perseguiram” a Amira durante os últimos anos. “A 15 de maio, é a festa da cidade, há fogo de artificio e foguetes. Ela não estava à espera, e nós não nos lembrámos de a avisar. Ela escondeu-se na casa de banho e gritou: “Isabel, pum pum pum! Amira medo! Amira medo!” Depois lá lhe explicamos que eram foguetes e ela lá ficou tranquila”, diz Isabel Lourenço, recordando um dos momentos de sobressalto de Amira.
ou melhor, uma comunidade, em Óbidos que tem o mesmo nome do bairro onde mora, a “Salgueirinha”. Em comum têm o facto de serem grandes amigos, católicos e de há umas décadas terem decidido que queriam viver de uma forma mais saudável. “Achámos que devíamos viver de uma forma diferente, sem ser num andar, tipo gaiola. Queríamos que os nossos filhos tivessem um crescimento diferente” conta Isabel Lourenço, responsável pelo grupo que acompanha uma família de refugiados sírios. Todos com origens rurais, “Quando cheguei a Portugal, tinha muito medo. Até que criaram juntos um projeto percebi que a vida aqui é muito segura, e não tem nada comunitário. Compraram para provocar medo como no caso da Síria. Passado oito lotes e foram criando n’A Salgueira os filhos alguns meses, eu comecei a adaptar-me” explica a jovem e agora os netos, ao síria. Para ela Portugal é o melhor país da Europa. todo já são mais de 60 pessoas. É nesta comu“Portugal é o melhor país da Europa graças ao seu povo. nidade que a família Alandaj, de Damasco, é acolhida As pessoas são muito acolhedoras e amáveis”. O marido em setembro de 2016 e tudo começou num dos cafés concorda e acrescenta “O povo português, isso foi o que que estes amigos habitualmente tomam juntos. “Num mais gostei”, afirma Mohamad Alandaj, que à pergunta sábado em que estávamos a tomar café juntos, os que dificuldades enfrentaram desde que chegaram, dá nossos filhos sensibilizados com estas questões, motiuma resposta surpreendente. “Não encontramos dificulvaram-nos a avançar com o apoio a uma família. Como dades, porque aqui estão a cuidar de nós e a ajudar”. não podia ser do ponto de vista individual, pedimos “Olha, agora a minha mão funciona!” Aos 19 anos a que a Fundação João XXIII nos servisse de “chapéu” de Amira teve um AVC que lhe deixou várias sequelas. enquadramento jurídico e legal para podermos acolher Quando chegou, o grupo do projeto “Acolhe” resolveu a família. Foi isto, e empenhámo-nos todos neste trabaagir rapidamente. “Ela sofreu um AVC ainda na Síria. lho”, explica Isabel Lourenço. Os filhos motivaram e os Veio com uma paralisia na mão direita que nos deixou pais avançaram. Nascia assim o projeto “Acolhe” com a muito preocupados. Diligenciámos logo no sentido de colaboração de muitos: Isabel, Luísa, Hermínia, Lurdes, ela ser acompanhada”, conta Isabel Lourenço, eloAntónio, Alda, São, as professoras Rosa e Isabel, e muigiando os serviços do Centro de Saúde, do Hospital tos mais amigos. Mulheres e homens determinados, de Distrital e do Hospital Termal das Caldas da Rainha, ação, que estão na casa dos 60 a 70 anos e continuam a e do Hospital de Santa Maria em Lisboa. “Tinha um ser mudança onde vivem. problema na minha mão e não podia movê-la. Portanto, “PORTUGAL É O MELHOR PAÍS DA fui com a Isabel e a Luísa ao médico. A médica foi muito EUROPA”. “O nosso acolhimento foi muito bom. boa. Ela ajudou-me muito e até fiquei muito melhor. Enfim, senti que todas as pessoas aqui cuidaram de mim Olha, agora a minha mão funciona. Eu agradeço muito como se fossem a minha mãe. Até cuidam da minha à Isabel, que cuidou de mim e me ajudou” afirma Amira filha tão bem como cuidam de mim”, confessa Amira Al-Taweel comovida, abrindo e fechando a mão. Al-Taweel. Síria, 26 anos, é mulher de Mohamad Khair Alandaj e mãe de uma menina de dois anos e meio, a O QUE MUDOU NA VIDA DA FAMÍLIA Huda. “A vida era boa antes de guerra começar. Mas ALANDAJ. “Eu penso que a vida deles mudou quando a guerra começou, fomos obrigados a sair”, re- bastante. A situação de paz e tranquilidade, dos corda Amira Al-Taweel, que em Damasco estudava no 9º medos que a Amira teve em determinados momentos. ano e, ao mesmo tempo, trabalhava numa ourivesaria. Penso que já está bastante melhor, mas foi complexa Em 2014 começaram a vida como refugiados: foram para esta questão dos medos. Para nós foi aprender uma o Líbano, e lá casaram, depois para a Turquia, onde nas- outra cultura, outra forma de estar, de usar as coisas, ceu a Huda, a seguir fizeram a perigosa travessia até à a casa e os movimentos. Nós achamos que somos
OBRIGADO!
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Fotografia © Samuel J Rodrigues
...FAMÍLIA FAMÍLIA que recupera a FELICIDADE
abertos e nem sempre é assim” diz Isabel Lourenço, sublinhando a importância da integração profissional alcançada para o casal. “Em primeiro lugar consegui um trabalho muito bom, e estou a aprender português, a praticar com as pessoas. Eu trabalho em produção de carne de peru. Na Síria Tinha um supermercado”, diz Mohamad. Um dia ainda vai voltar a ter um negócio próprio. Amira, depois dos exames e da fisioterapia, abraçou a primeira oportunidade de trabalho que lhe foi dada. “Desde o inicio deste ano estou a trabalhar num lar de idosos. Faço várias coisas, trabalho em limpeza e também na cozinha quando precisam da minha ajuda. As pessoas lá são muito amáveis”. Mas nem tudo foi fácil, e por detrás destas
vitórias, foram ultrapassados muitos obstáculos como a burocracia na segurança social, finanças, centro de emprego, entre outros. Mas a família Alandaj, acompanhada pelo grupo “A Salgueirinha”, trabalha para estar autónoma assim que terminem os dois anos do programa de acolhimento. Escusado será dizer que são muitas as saudades da família e da Síria, porém Mohamad e Amira sentem-se felizes, agradecidos e com sonhos para concretizar. “Tenho vários sonhos: ter uma casa e criar um projeto mais à frente. E a minha mão já está melhor. Acho que esta é a coisa mais importante para cuidar da minha filha. E quero voltar a agradecer outra vez, porque estas pessoas cuidaram muito de mim como se fosse a sua filha”.
#30
Um ano em PORTUGAL DE DEIR EZZOR A LISBOA, À PROCURA DE PAZ. “O meu nome é Mohammad Al Alloush, sou
Mohammad recebeu uma bolsa para poder fazer o curso de técnico auxiliar de farmácia. “E isto foi porque nós pedimos. Quando nós pedimos e explicamos, há muita gente a querer de facto colaborar”, explica Inês. A força de vontade e a dedicação foram determinantes nos progressos de Mohammad, que diz ter aprendido muito e ter conhecido muitas pessoas. Considera difícil aprender português, porém com apoio de uma professora na paróquia já se consegue expressar o suficiente na língua de Camões. “O seu grande sonho de começar a trabalhar como farmacêutico em Lisboa realizou-se no passado dia 10 de maio, quando foi admitido numa farmácia na Póvoa de Santo Adrião.”
sírio, tenho 32 anos. Tenho um filho, chama-se Abdullah, agora tem 7 anos.” Mohamed e Abud, o diminutivo para Abdulah, chegaram a Portugal há um ano. Pai e filho conseguiram deixar a cidade de Deir Ezzor, no leste da Síria, uma das cidades mais castigadas pela guerra e que na altura ainda estava cercada pelo Daesh. Mohammad conta que foi tudo muito difícil. A 3 de maio de 2017 chegaram a Portugal, foram acolhidos pela Paróquia S. Tomás de Aquino, em Lisboa, e encontraram a paz que Abud ainda não tinha conhecido. “Abud muito feliz em Portugal. Em Portugal muito bom, pessoas muito bom. Com esperança, persistência, muito trabalho e Ele tem muitos amigos na escola e o apoio de muitos, passo a passo, os sonhos da estudar no 1º ano”, diz Mohammad que pouco a pouco vai aprendendo família Al Alloush vão-se tornando realidade. a língua do país que o acolheu. Abud é um menino cheio de vida, bem-disposto e sociável. Gosta de matemática e de TODOS GANHAM. “Juntámo-nos a partir deles português, que já fala com fluência, de jogar à apanhaos dois. Nós que estamos cá também ganhamos. Alguns da e às escondidas com o Pai, aos polícias, bombeiros de nós não nos conhecíamos, não eramos amigos, e zombies com os amigos da escola. A integração desta embora frequentássemos a mesma igreja, a mesma família tem sido acompanhada e facilitada por uma missa, e agora somos”, afirma Inês. Nos primeiros meses equipa de voluntários da paróquia. Uma equipa que tem os voluntários da Paróquia S. Tomás de Aquino preocutodo o apoio do pároco, o P. Nélio Pita. “Temos que nos param-se em apoiar a família Al Alloush a encontrar uma aproximar das pessoas. Quando conhecemos as suas casa, uma escola que recebesse o Abud, também com histórias, vemos que não há nada determinante que nos a sua integração social, momentos de convívio e alegria. separe”, explica o pároco, dizendo que há preconceitos Um mês depois de terem chegado, juntos organizaram a serem desfeitos. Face à burocracia e às respostas com um fotógrafo amigo, uma exposição com fotograque muitas vezes tardam a chegar, os voluntários fias da Síria. “Foi o primeiro dia de festa com a família. distribuem tarefas, pedem ajuda a amigos, conhecidos O Mohammad pôde ver fotografias dessa viagem e e entidades, e juntos vão dando suporte à família Al fizemos uma exposição aqui na paróquia que se chamou Alloush. “A integração é assim uma palavra grande “Síria revista e aumentada”. Foi muito importante esse para questões muito concretas que não são fáceis. Nem primeiro contacto”, conta Inês, que recorda ainda outro sempre o Estado português responde com a celeridade momento de grande alegria para Mohammad e Abud. e eficiência que deveria. Tivemos dificuldades com o “Houve a possibilidade, oferecida pelo Comité Olímpico SEF, com abrir uma conta no banco, com a escola para Português, do Mohammad e o Abdulah assistirem a um o Abud. Mas a resposta veio sempre da generosidade jogo da Seleção Nacional (Portugal-Suiça) e eles vibraram das pessoas a quem apelamos diretamente”, conta Inês muito. A alegria do Abud quando entrou com os jogadoEspada Vieira, coordenadora da equipa de voluntários. res, é algo que nós não esqueceremos. O Mohammad Uma das aprendizagens que Inês fez neste processo de com o cachecol de Portugal na cabeça, também é uma acompanhamento, foi aprender a não ter medo de pedir imagem que não esqueceremos.” O que Mohammad colaboração e de sensibilizar os outros para colaborar, mais gosta em Portugal, são as pessoas, de passear por porque há muitas pessoas que querem ajudar. Lisboa e do futebol. “Eu gosto muito de ver o Ronaldo no jogo e muito bom Portugal com a Suíça”. Ao longo O SONHO DE MOHAMMAD. A esperança re- do processo de integração, os voluntários seguiram as nasce e acompanha a vontade de viver de Mohammad, orientações da PAR e foram mais além. “Por um lado, as que agora tem o apoio de muitas pessoas. Em Deir Ezzor orientações da PAR foram preciosas desde o inicio, toda estudou farmácia, mas o curso na universidade ficou por a documentação é realista, e por outro, a nossa parte de terminar. O sonho de trabalhar numa farmácia, que tinha criatividade, baseada no fundo, na amizade e no amor, sido interrompido, foi agora, para sua grande alegria, naquilo que gostávamos que fizessem aos nossos”, diz retomado e concretizado em Portugal. A equipa de vo- Inês que termina dizendo “independentemente dos luntários ajudou. Contactaram a Faculdade de Farmácia prazos do programa de acolhimento, o programa tem e a Associação Nacional de Farmácias, e houve resposta. um dia para acabar, mas a nossa amizade não”. OBRIGADO!
Fotografia © Samuel J Rodrigues
...e um SONHO realizado! #31
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Instituições Anfitriãs
Que acolheram ou estão a acolher
• ACRAS - Associação Cristã de Reinserção e Apoio Social • AEFIL - Associação para Educação Filantrópica dos jovens • Associação COR UNUM dos Apóstolos do Coração Imaculado de Maria • Associação de Solidariedade Social Via Nova • Associação dos Proprietários da Urbanização Vila de Este • Associação Ermesinde Cidade Aberta • Associação Juvenil “A Bogalha” • Associação Santa Marinha de Vila Marim • Associação Schoenstatt Lisboa • Câmara Municipal de Alcanena • Câmara Municipal de Fafe • Câmara Municipal de Resende • Câmara Municipal de Santo Tirso • Campos Ferreira, Sá Carneiro & Associados • Cáritas Diocesana de Coimbra • Cáritas Diocesana de Viseu • Cáritas Interparoquial de Castelo Branco • Cáritas Paroquial da Caranguejeira • Casa de Cochêca - Irmãs Reparadoras Missionárias da Santa Face • Casa do Gaiato de Lisboa • CASCI - Centro de Ação Social do Concelho de Ílhavo • CEBI - Fundação para o Desenvolvimento Comunitário de Alverca • CECAJUVI – Centro de Convívio e Apoio à Juventude e Idosos de Santa Leocádia de Baião • Centro Comunitário da Paróquia de Carcavelos • Centro Paroquial e Social São Martinho de Campo • Centro Social Cultural e Desportivo de Sande S. Clemente • Centro Social das Antas - Paróquia de Santo António das Antas • Centro Social de Ermesinde • Centro Social de Santa Maria de Sardoura • Centro Social e Paróquia Senhora da Conceição • Centro Social e Paroquial de Barcarena • Centro Social Paroquial de Nª. Sra. Amparo - Portimão • Centro Social Paroquial de Torres Vedras • Centro Social Paroquial do Padrão da Légua • Centro Social Paroquial Nossa Senhora da Conceição da Costa da Caparica • Centro Social Paroquial São Pedro de Alverca • Centro Social Profª Elisa Barros Silva • Centro Universitário Manuel da Nóbrega (Jesuitas) - ASSIM • CLIB - Colégio Luso-Internacional de Braga • Comunidade Pedro Arrupe - Prov. Port. Companhia de Jesus • Confraria de Nossa Senhora da Nazaré • Congregação das Escravas do Sagrado Coração de Jesus • Congregação das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição • Congregação das Servas de Nossa Senhora de Fátima • Congregação de Nossa Senhora da Caridade do Bom Pastor - Casa de Sant’Ana • Congregação do Santíssimo Redentor • Congregação Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora das Vitórias • Despertar - Formação e Psicologia Unipessoal, Lda. • EJNS - Equipas de jovens de Nossa Senhora • Fábrica da Igreja Paroquial Cristo-Rei de Algés Miraflores • Fábrica da Igreja Paroquial da Freguesia de Nª Srª do Amparo da Silveira • Fábrica da Igreja Paroquial de Santa Maria do Barreiro • Fábrica da Igreja Paroquial de Santa Marinha de Vila Praia de Âncora • Familias Diferentes Associação de Solidariedade Social • Fundação Champagnat • Fundação Claret - Lar Juvenil dos Carvalhos • Fundação COI • Fundação Islâmica de Palmela • Fundação João XXIII • Fundação Maria Dias Ferreira • Fundação Salesianos • Fundação Santa Maria Madalena • Instituto Filhas de Maria Auxiliadora, Província Portuguesa N. Srª de Fátima • Irmãs Doroteias • Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus • Irmãs Reparadoras de Fátima • Junta de Freguesia de Alvarenga • Lar de Sant’Ana • Movimento Graal em Portugal • Obra do Padre Grilo • Obra Promoção Social da S. Familia - Delegação “Casa do Sagrado Coração de Jesus” • Paróquia da Azinhaga • Paróquia de Lourosa • Paróquia de Oiã • Paróquia de Palhais/Santo António • Paróquia de Santa Isabel • Paróquia de Santa Marta de Portuzelo • Paróquia de Santo António dos Olivais • Paróquia de São Miguel de Gualtar • Paróquia de São Tomás de Aquino • Paróquia do Bombarral • Pelo Prazer de Viver / Saúde, Cultura e Vida - Associação de Desenvolvimento Social • Plataforma COMunidade • Provincia Portuguesa da Companhia de Santa Teresa de Jesus • Província Portuguesa da Congregação de S. José de Cluny • Província Portuguesa da Ordem Hospitaleira de São João de Deus • Província Portuguesa das Filhas da Caridade de S. Vicente de Paulo • Reencontro, Associação Social, Educativa e Cultural, IPSS • Santa Casa da Misericórdia de Bragança • Santuário de Nossa Senhora do Rosário de Fátima • Sol dos Pequeninos Creche e Jardim Infancia Lda • Unidade Pastoral de Nova Oeiras e São Julião da Barra
OBRIGADO!
A PAR conta ainda com o apoio de mais de 300 entidades parceiras
Membros Fundadores • Amnistia Internacional • APGES • Associação Guias de Portugal • CAIS • Cáritas Portuguesa • CIRP - Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal • CNIS - Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade • Comissão Nacional de Justiça e Paz • Comunidade Islâmica de Lisboa • Comunidade Vida e Paz • Conselho Nacional de Juventude • Corpo Nacional de Escutas • CPR - Conselho Português para os Refugiados • Cruz de Malta • Doroteias da Província Portuguesa • EAPN Portugal / rede Europeia Anti Pobreza • Escoteiros de Portugal • Fundação Ajuda à Igreja que Sofre • Fundação EDP • Fundação Gonçalo da Silveira • Fundação Montepio • GRACE • IAC - Instituto de Apoio à Criança • IES Social Business School • IPAV - Instituto Padre António Vieira • JRS - Portugal - Serviço Jesuíta aos Refugiados • OCPM - Obra católica Portuguesa para as Migrações • OIKOS • UNICEF Portugal
Apoios • Conferência Episcopal Portuguesa • EY Portugal • Fundação Calouste Gulbenkian • Grupo Jerónimo Martins • Ipsos Apeme • Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados • Sérvulo Correia & Associados - Sociedade de Advogados, R.L. • VdA- Vieira de Almeida e Associados - Sociedade de advogados RL • Volkswagen Portugal