Percepção na Estrutural: violência contra crianças, adolescentes e jovens

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Violência contra crianças, adolescentes e jovens Pesquisa de percepção na Estrutural

Local de aplicação: Escola e Feira da Estrutural, Brasília (DF) Responsáveis pelo estudo Coordenação: Márcia Acioli Adolescentes e jovens do projeto Onda participantes do processo de formação, pesquisa e análise dos dados: Amanda Carolina; Beatriz Nery; Cristiany Lima; Fábio William Silva; Gabirela Camota; Israel Victor de Melo; Jéssica Pereira; Júlia Karla C. Perdiz; Leiliane Vieira Miranda;

Realização:

Lucas Daniel R. de Souza;

Inesc / projeto Onda

Lucas Miguel Salomão Meireles; Paula Gabriela Barbosa Castillo;

Apoio:

Paulo Henrique Alves Fonseca;

Pão para o Mundo - PPM

Raquel Rodrigues Ferreira;

Ajuda da Igreja Norueguesa - AIN

Serena Rodrigues;

Fastenopfer

Tatiana dos Santos;

Unicef

Thallita de Oliveira Silva;

Christian Aid

Vinícius da Silva Moreira; Wallison Lopes de Souza.

Parceiro: KNH

Projeto gráfico e diagramação: Lia Magalhães Graça Silva

Brasília (DF)/setembro/2014


1. Introdução O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

para discutir os resultados das pes-

desenvolve dois trabalhos de formação de crian-

quisas de opinião realizadas nas

ças e adolescentes de escolas públicas nas áreas

comunidades;

de direitos humanos e orçamento público: 1º) o

3. investigar o orçamento público das

projeto Onda – Adolescentes em Movimento pe-

políticas públicas mais citadas nas

los Direitos; e 2º) o OCA – Observatório dos Direi-

pesquisas;

tos da Criança e do Adolescente (este último na cidade Estrutural, em parceria com o Coletivo da Cidade e o Movimento Nossa Brasília). Diante da crescente violência contra a juventude no Brasil, o projeto Onda foi provocado a de-

4. promover diálogos com o poder público; e 5. propor encaminhamentos. Os temas tratados na formação no Inesc são os seguintes:

senvolver uma ação de abrangência nacional sobre

• Direitos humanos, conceitos e princí-

o tema em regiões priorizadas pela KinderNotHilfe

pios. Construção coletiva do conceito

(KNH), organização que apoia o projeto do Inesc.

de violência.

O primeiro momento foi dedicado a uma densa formação em direitos humanos aos ado-

• Gênero e raça como fatores que influenciam o cenário de violência.

lescentes e jovens do Onda. No segundo momen-

• Estudos de caso a partir de reportagens:

to, dois representantes do grupo foram para Belo

análise sobre os tipos de violência e as

Horizonte (MG), a fim de desenvolver uma for-

possíveis origens.

mação com adolescentes de vários municípios

• Roda de conversa sobre violência sexual

de outros estados – São Paulo, Rio de Janeiro,

com representante do Comitê Nacional

Minas Gerais. Este último grupo recebeu o nome

de Enfrentamento à Violência e Explora-

de Teia – Rede de Ação por Direitos. No encontro

ção Sexual de Crianças e Adolescentes.

em Belo Horizonte, foi elaborada uma agenda de intervenção em suas respectivas comunidades,

• Participação política. Articulação, mobilização e incidência.

sendo iniciada por uma enquete e por diálogos

• Noções de orçamento e direitos.

com as redes locais, incluindo o poder público e

• Oficina para elaboração de oficinas.

a sociedade civil.

• Ferramentas para se comunicar na

Os primeiros desafios do grupo Teia consistem em:

comunidade e para a articulação à distância.

1. apurar a opinião de moradores das comunidades acerca da violência; 2. convidar diversos atores da sociedade

• Princípios da educação popular. Elaboração coletiva de oficinas a serem desenvolvidas em Belo Horizonte. 3


O grupo de adolescentes do projeto Onda envolvido na atividade teve o maior cuidado para não estigmatizar mais a cidade. Eles e elas gostam de morar na Estrutural e reconhecem a comunidade como um polo de resistência com muitos anos de luta de seus moradores, em especial dos/as catadores/as. Reconhecer a violência e fazer a denúncia significa defender sua cidade como território de cidadania e exigir a presença do Estado não como órgão de repressão, mas de garantia de direitos e promoção de cidadania. A enquete foi aplicada na cidade Estrutural e no Guará (CED 4 — escola de ensino médio que recebe os/as alunos/as da Estrutural) no primeiro semestre de 2014. Já os dados foram sistematizados no início do segundo semestre. Esta pesquisa não pode ser conclusiva. No entanto, ela é importante por provocar um debate urgente. A população jovem tem sido a maior vítima da violência e, assim como a sofre, também a reproduz. O envolvimento de jovens com o contexto da violência não nasce de um interesse pessoal simplesmente, mas de um conjunto de fatores que se entrelaçam na produção da exclusão social, como pode ser resumido na frase de um dos entrevistados: “A violência não é um fato que ocorre do nada, mas sim com a perpetuação da falta de acesso da grande parte da população a serviços básicos, como saúde e educação”. Portanto, as causas da violência são muitas e complexas, e as opiniões da comunidade são importantes para se vislumbrar por onde começar a caminhada para enfrentar a violência contra a juventude.

4


2. Metodologia

Esta pesquisa teve por objetivo realizar um le-

Após a formação, eles e elas elaboraram o

vantamento de opinião de moradores da cidade

instrumento de pesquisa. Evitando tocar nas expe-

Estrutural do Distrito Federal sobre a violência

riências pessoais, a enquete pergunta sobre preo-

contra crianças e adolescentes.

cupações pessoais e não sobre histórias vividas.

O trabalho foi todo conduzido por adoles-

A pesquisa/enquete foi aplicada na feira de

centes e jovens de 15 a 19 anos do projeto Onda.

domingo da Estrutural e na escola em dois dias.

A escolha da Estrutural se deu porque vá-

Os/as adolescentes entrevistaram 106 pessoas

rios adolescentes são moradores da cidade e se

aleatoriamente, todas moradoras da Estrutural.

preocupam com o elevado índice de violência registrado na comunidade.

1. Qual é o tipo de violência contra crianças e adolescentes que mais te preocupa? ☐☐ Violência doméstica ☐☐ Violência sexual ☐☐ Brigas de gangues ☐☐ Violência policial ☐☐ Briga de vizinho ☐☐ Tráfico e uso de drogas ☐☐ Outras 2. Para você, qual é a principal causa da violência? 3. Para você, qual seria uma solução para a violência? 4. Há algum lugar/bairro onde essa violência é mais frequente?

5


3. O contexto da pesquisa Sobre a Estrutural, a Pesquisa Distrital por Amos-

vítimas entre o público infantil e juvenil no Distri-

tra de Domicílios (PDAD), divulgada em 2014,

to Federal, assim como no Brasil todo.

pela Companhia de Planejamento do Distrito

O Mapa da Violência 2014 mostra que o

Federal (Codeplan), revela que a cidade tem, na

Distrito Federal e Goiás apresentam índices alar-

sua composição populacional, 34,12% de crian-

mantes e preocupantes de homicídios de jovens:

ças com idades entre zero e 14 anos, o que revela

74,5 e 87,5 (a cada 100 mil habitantes), respec-

uma parcela bastante significativa de jovens na

tivamente. Comparado com o Rio de Janeiro

cidade, ou seja, mais de 1/3 da população da Re-

(56,5), o Distrito Federal é bem mais violento. Se

gião Administrativa.

a comparação for com São Paulo (24,9), o Distrito

Tal realidade exige uma atenção especial e a elaboração de políticas públicas que atendam

Federal apresenta mais do que o dobro de homicídios de jovens.

prontamente os direitos de crianças e adolescen-

Dados da Secretaria-Geral da Presidência

tes, conforme preconizado no Estatuto da Crian-

da República confirmam as informações da pes-

ça e do Adolescente (ECA).

quisa citada e mostram que os jovens foram ví-

Segundo o estudo “Análise de vulnerabili-

timas de 57,84% dos homicídios registrados em

dades da juventude negra no Distrito Federal: Sub-

2010 no Distrito Federal, sendo que 88,41% das ví-

sídios à implantação do Plano Juventude Viva”,

timas eram negros. O órgão informou ainda que,

realizado pela Seplan/DF, com a leitura dos da-

em municípios de Goiás (Entorno do DF), todos os

dos censitários, foi possível verificar a população

jovens assassinados naquele ano eram negros.

jovem e negra de cada região administrativa. Os

A PDAD também mostra um baixo acesso

maiores percentuais de jovens negros estão nas

à cultura na comunidade, confirmando as vozes

seguintes regiões administrativas: SCIA/Estrutu-

dos/as entrevistados/as, deixando evidente a ne-

ral (79,5%), SIA (72,4%), São Sebastião (71,8%),

cessidade urgente de aquisição de equipamen-

Varjão (70,5%) e Paranoá (70%). Não por coinci-

tos públicos e de implementação de uma políti-

dência, são regiões conhecidas por sua baixa ren-

ca cultural que dialogue com a diversidade e a

da. As que têm menores percentuais, por sua vez,

riqueza cultural da comunidade.

são aquelas onde se concentram as elites do DF: Lago Sul, Sudoeste/Octogonal, Lago Norte, Plano Piloto e Jardim Botânico. Tais dados nos levam a observar mais atentamente a dimensão étnico-racial, considerando que este é um fator determinante das várias modalidades de violência que fazem as maiores 6


4. Uma breve leitura dos dados Focando-se no grupo de 9 a 19 anos, as violências que se destacam são as apresentadas a seguir. Entre os meninos: violência decorrente do tráfico e do uso de drogas e violência policial. Para as meninas: violência sexual em primeiro lugar e violência decorrente do tráfico e do uso de drogas em segundo. O jovem transexual/ transgênero destaca a violência sexual. Os adultos do sexo masculino apontam para uma situação semelhante à verificada para os meninos, mudando apenas a proporção. Entre as mulheres adultas, a situação é diferente. A maioria se preocupa com a violência

“Racismo, pois os ‘cana’ acham que ouvir rap e ter um estilo como o ‘meu’ é errado, é coisa de vagabundo, de malandro”. “Os policiais não gostam deles. Racismo e preconceito contra pessoas da Estrutural”. “Discriminação. A polícia trata todos os jovens como bandidos!”. “Principalmente racismo. Despreparo da polícia e o ‘achismo’ de que todo preto é bandido”. Uma fala mostra uma polícia arbitrária: “A polícia bate em quem não está fazendo nada”.

decorrente do tráfico e do uso de drogas e, em seguida, a violência sexual empata com a violên-

A solução que os entrevistados apontam

cia policial. O que chama a atenção é que, para

para este quesito é tirar os policiais ruins e in-

as adolescentes, a grande preocupação é com

vestir na formação de bons policiais. Apesar de

a violência sexual: 89% das meninas de 14 a 19

constatada a violência, parte da população ainda

anos apontaram para a violência sexual como a

acredita que um melhor policiamento poderia di-

modalidade de violência mais preocupante.

minuir a violência na cidade.

As respostas mudam conforme a catego-

Quanto à violência decorrente do tráfico e

ria raça/cor. Quando se trata de jovens e adultos

do uso de drogas, há duas vertentes de opinião.

brancos, nenhum cita preocupação com relação

Uma atribui a responsabilidade aos próprios

à violência policial, o que nos dá indícios sobre

usuários e à droga em si. Já a outra, de maior

uma dimensão racista deste tipo de violência.

peso, responsabiliza a ausência de políticas pú-

Destacamos aqui alguns depoimentos que citam

blicas para a juventude como causa do elevado

explicitamente a discriminação.

consumo de drogas na região, conforme atestam

“Os policiais acham que todos são bandidos. Racismo”. “O poder deles. Eles consideram os jovens de favela vagabundos. Os negros são as maiores vítimas por conta do estilo (moda, modo de se vestir)”.

alguns depoimentos: “Falta de políticas públicas para a juventude: lazer, cultura, educação”. “Penso que, a partir do momento em que o governo não cumpre as políticas públicas, 7


as pessoas ficam marginalizadas e, a partir disso, ocorrem vários tipos de violência”. “Porque a cidade não possui lazer”. “Falta de lazer, educação e outros direitos para os jovens. Por isso, [os jovens] encontram nas drogas esse ‘lazer’”.

“Não podemos usar roupa curta [por]que as pessoas olham para o nosso corpo. Impunidade”. Outro ponto de vista considera a incapacidade das famílias de proteger suas filhas e educar seus filhos. “Os pais não terem o controle sobre os filhos”.

“O governo não se preocupa, e a sociedade é desigual”. “Falta de oportunidade de estudo. Tráfico é dinheiro fácil”.

“Descuido dos pais/responsáveis”.

“Falta de cultura na cidade e falta de emprego”.

“Pais que não cuidam direito dos filhos”.

“Falta de oportunidades para a juventude”. “Falta de gestão por parte da Administração da cidade”.

“Pais que bebem e batem nos filhos e nas esposas”.

“Mães que abandonam as filhas e as pessoas que aproveitam”. Observamos que as políticas públicas destinadas às crianças não se adéquam à jornada de traba-

O que se constata é uma espécie de abandono

lho das mulheres, o que não permite que existam

da cidade pelas políticas públicas. Quando os

condições de combinar trabalho e cuidados com

jovens citam oportunidades, podemos observar

a família. Um exemplo disso é a Vila Olímpica, que

que, na verdade, se trata é de direitos. A cidade

oferece atividades educativas e desportivas, mas

tem baixa cobertura de políticas públicas para a

com restrições de horário. As mães não têm como

juventude nas áreas de cultura, lazer, educação e

interromper seus trabalhos para levar e buscar as

formação profissional. Também fica claro que as

crianças no meio da tarde, por exemplo.

instâncias de poder não dialogam com a população local e que desconhecem os problemas ou os desprezam. No que diz respeito à violência sexual, há algumas percepções. Uma delas atribui o problema a fatores pessoais do agressor, tais como: “Falta de vergonha, falta de ética, de amor pelo próximo ou distúrbios mentais”. “Problemas psicológicos. Ele [o agressor] deve ter sofrido isso quando criança”. “Porque as pessoas são safadas, não têm capacidade de encontrar um amor”. Um olhar importante de se levar em conta é a ideia de que o modo de vestir das meninas provoca reações invasivas e agressivas esperadas.

Também é destacada a falta de capacidade do Estado de proteger as crianças. “Falta política relacionada à educação. Descuido do governo e da sociedade com os cuidados com as crianças”. “Falta de creches, que poderiam ajudar na formação da criança, e sempre irei tocar na educação de qualidade”. E, por fim, alguns depoimentos citam problemas culturais da violência contra a mulher, como o machismo. Mesmo sem o uso da terminologia, interpretamos como o machismo está presente em algumas de suas falas. “Safadeza do homem, falta de caráter”. “As pessoas que usam roupas curtas e homens que fazem a agressão”. 8


“No mundo tem muito homem safado e crianças [que] se sexualizam cedo demais”. O que chama a atenção é a voz das meninas

é bem-vindo. Por isso, educação é uma solução viável”. “Educação de meninos contra o machismo”.

adolescentes. Foram muito poucas as que não ci-

O conhecimento, a informação, a

taram a violência sexual. Observa-se, portanto,

responsabilidade por mudanças cultu-

que este é um dos maiores problemas temidos

rais são citados como essenciais para

por elas ou vivenciados, inclusive pela pessoa

se enfrentar a violência. Os jovens re-

transexual/transgênero.

clamam por escola com educação de

Quando a pesquisa pede para os/as entre-

qualidade e atividades de educação

vistados/as citarem as regiões onde a violência

não formal que contribuam para a for-

mais ocorre na cidade, as pessoas citam as re-

mação de novas consciências. Há tam-

giões mais pobres.

bém demanda por creches públicas

Ao analisar as percepções sobre os proble-

para proteger as crianças e para asse-

mas, podemos sistematizar as propostas de solu-

gurar às mães condições para que elas

ção em 6 categorias:

trabalhem sem aflição, seguras de que

01. Educação formal e não formal

seus filhos estão bem protegidos, esti-

Muitas respostas apontam para a área

mulados e livres de violência.

da educação como uma das mais importantes para a promoção de direitos e de

02. Maior presença do Estado

uma sociedade mais protegida. Tanto

Há quase um consenso de que a ausên-

a educação formal como a não formal.

cia do Estado causa a marginalidade da

Citam a falta de informação como fato

população mais jovem. Ausência que

que vulnerabiliza as pessoas, como esta

se reflete na falta de direitos à forma-

entrevistada, que aponta para o desco-

ção, à saúde, à educação, ao lazer e à

nhecimento como fator que fragiliza:

cultura, assim como na inexistência de

“Falta de informação, deficiência na parte da educação das pessoas”. “Falta de oportunidade de estudo”.

uma política de formação profissional de qualidade e universalizada. É muito importante que se perceba que algumas

Outras pessoas citaram a educação como

políticas públicas pouco priorizadas fa-

parte importante da solução do quadro

riam muita diferença, como as de lazer

de violência na cidade e sugerem:

e cultura.

“mais desempenho do governo. mais educação”. “mais investimentos em escolas, em coisas para tirar esses grupos da rua”. “mais investimentos em lazer e educação”. “O conhecimento de algo em uma sociedade — seja ela qual for — sempre

“Porque faltam coisas básicas na cidade: educação, lazer, cultura”. “Políticas efetivas para as crianças e os adolescentes da cidade”. Embora a demanda maior dos/as entrevistados/as seja por políticas públicas para a juventude, muitos clamam por 9


políticas públicas que contemplem a comunidade inteira. Eventos — como o

“O governo [deve] dar mais qualificação para a polícia e mais educação para os jovens”.

fato de uma ambulância não entrar na

Nesta linha, uma pessoa problemati-

cidade por medo da violência — já evita-

za a questão da segurança pública com

ram que fossem salvas as vidas de mui-

uma percepção mais complexa, levan-

tas pessoas da Estrutural.

do em conta as políticas públicas numa perspectiva de conjunto.

03. A urgência de se investir em políticas públicas para a juventude (especialmente a negra) Ficou nítida a ideia de que a falta de políticas públicas para a juventude (para

“O simples investimento em mais policiais é muito superficial, sendo necessária uma reestruturação dos serviços públicos, além de uma atenção maior para a reinserção de criminosos na sociedade”.

lazer, cultura, educação...) é uma violência em si que sujeita as pessoas a uma

05. Melhorar o diálogo entre o

ausência de perspectivas. O direito não é

poder público e a comunidade

exercido e, no lugar dele, existe um con-

Não basta criar políticas públicas para

texto de violações.

a comunidade. É preciso estreitar o diá-

“Falta de políticas públicas para a juventude: lazer, cultura, educação”. “Falta de lazer, educação e outros direitos para os jovens”. Chama a atenção o número de vezes em que o lazer e a cultura são citados. Observa-se daí uma grande demanda da comunidade. 04. Melhorar a atuação da polícia Apesar de muito citada por um com-

logo para que as demandas populares sejam consideradas para ajustar a ação do Estado com o objetivo de realizar direitos. “Somente a verdadeira ação do governo e da população em conjunto [pode mudar a realidade]”. “As pessoas que nos representam poderiam ter uma forma de melhorar as coisas”. “Oportunidade de falarmos e expressarmos”.

portamento que não inspira confiança e indica práticas racistas, a população

06. Mais afetividade social

percebe a polícia como importante.

Esta é uma proposta para se acabar

Respostas interessantes sugerem que o

com a violência: é melhorar a com-

governo:

preensão do outro, é acolher as dife-

“[Deve] melhorar a formação dos policiais. [Precisa] tirar os maus profissionais e desmilitarizar a polícia”. “E os policiais não possuem preparo”. “[Precisa] tirar as ‘polícias’ ruins e colocar melhores”.

renças, exercer a afetividade e a gentileza no dia a dia. “Você pensar no próximo, se colocar no lugar das outras pessoas”. “Cada um com respeito ao próximo seria uma boa solução”. 10


5. O que diz o orçamento público sobre a Estrutural? Analisamos dois documentos: o Quadro de Deta-

do Milho de uma igreja evangélica local. Nesse

lhamento de Despesas (QDD) do GDF e o QDD por

documento, a soma dos valores autorizados é

Regionalização, no qual é possível verificar o que

de R$ 200 mil; no entanto, até julho, nada havia

há de específico para cada Região Administrati-

sido liquidado. A festa aconteceu e ainda não se

va. Curiosamente, há ações de cultura que apare-

sabe o quanto foi gasto. A nossa grande crítica é

cem no QDD do GDF e que não aparecem no QDD

que essas ações do GDF relativas à cultura são,

Regionalizado.

em geral, eventos religiosos. Poucas ações do

Acompanhando o QDD por Regionalização

orçamento são destinadas de modo que toda a

2014, vemos que, para a RA XXV (que contempla a

comunidade sinta que tais atividades são parte

Estrutural), até julho, apenas 15% do orçamento

de uma política cultural e não só de um evento

havia sido liquidado, evidenciando uma baixíssi-

passageiro. Não existe uma ação executada de

ma execução. Acontece que o orçamento dessa

algo que realmente fique para a comunidade jo-

regional é dividido com a Cidade do Automóvel

vem em geral.

e não fica claro o que se gastou com a comuni-

Nas áreas de esporte e lazer, não foi possí-

dade da Estrutural. Uma demanda apontada pe-

vel visualizar a Estrutural no orçamento. Existem

los adolescentes do projeto Onda é a separação

muitas ações para a construção de quadras de

dessas regiões (a Estrutural e a Cidade do Auto-

esporte, pontos de encontro, revitalização de par-

móvel) para melhorar as condições de monitora-

ques e praças, mas o QDD revela que o orçamento

mento das políticas públicas e do orçamento.

não foi liquidado ou foi muito pouco liquidado.

Como na pesquisa a comunidade chama a

Os gráficos 20, 21 e 22 mostram o quanto

atenção para a necessidade de políticas para a ju-

foi inexpressivo o gasto do GDF nessas ações. O

ventude, destacando esporte, lazer e cultura, in-

gráfico 20 faz um comparativo do investimento

vestigamos com maior atenção o orçamento des-

público entre diferentes Regiões Administrativas

tinado a essas políticas públicas para a cidade.

(não todas), e o que se constata é que tais áreas

Quanto a eventos culturais, aparece uma

não são prioritárias.

dotação inicial de R$ 23.500,00 para a Estrutural

Houve a construção de um parque próximo

no QDD Regionalizado. Porém, até julho de 2014,

da Vila Olímpica, mas tal ação não aparece no or-

todo o recurso foi contingenciado, ou seja, foi

çamento. Aos poucos, a comunidade ocupa esse

bloqueado.

espaço.

Já no QDD do GDF aparecem duas ações

É possível constatar, nesta pesquisa, que

de cultura para a cidade, ambas para a Festa

existe de fato uma não priorização de ações para 11


crianças, adolescentes e jovens, o que contraria

não aparece. Quando muito, surge a palavra ado-

o Estatuto da Criança e do Adolescente, que – no

lescente nas medidas socioeducativas como se a

seu artigo 4º – diz:

sua cidadania começasse no ato infracional. Em

“É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

ano de Copa do Mundo, a expectativa era outra. Todos/as esperavam pelos tão falados legados sociais da Copa: esporte seguro e inclusivo para todas as crianças e todos os adolescentes. O desafio ainda é a universalização de todos os direitos.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude”. Não é preciso ir até o orçamento para perceber que a lei não se cumpre, especialmente no que diz respeito à prioridade para a formulação e a execução das políticas públicas. A ideia de proteção integral, que se refere à soma de todos os direitos, não se realiza para todas as crianças e os/as adolescentes. Esta violação de direitos favorece a ocorrência de outras práticas de violações e violências, como o trabalho infantil – que ainda é muito comum no lixão. Na Estrutural, as crianças e os/as adolescentes não estão protegidos, como preconiza a lei. O orçamento nos oferece argumentos irrefutáveis sobre prioridades políticas e, no caso das populações mais jovens de comunidades populares (maioria pobre e negra), a prioridade 12


6. Anexo: tabulação dos Dados Faixa etária Gráfico 1: Distribuição dos entrevistados por faixa etária

Gráfico 2: Distribuição dos entrevistados

Gráfico 3: Distribuição dos entrevistados

do sexo masculino por idade

do sexo feminino por idade

Total do sexo masculino: 46 pessoas

Total do sexo feminino: 59 pessoas

Total transgênero Idade (de 9 a 19 anos): 1 pessoa 13


Raça/cor Gráfico 4: Distribuição dos entrevistados por raça/cor Total: 106 pessoas

Gráfico 5: Distribuição dos entrevistados do

Gráfico 6: Distribuição dos entrevistados do

sexo masculino por raça/cor

sexo feminino por raça/cor

Total: 46 pessoas

Total: 59 pessoas

Transgênero (1 pessoa): cor preta

14


Gráfico 7: Distribuição dos tipos de violência

Gráfico 8: Distribuição dos tipos de violência

indicados pelos meninos de 9 a 19 anos

indicados por jovens e adultos do sexo

Observação: houve quem apontasse para mais de

masculino com idades acima de 19 anos

uma violência como as mais importantes Total: 19 pessoas

Total: 27 pessoas

Gráfico 9: Distribuição dos tipos de violência

Gráfico 10: Distribuição dos tipos de

indicados pelas meninas de 9 a 19 anos

violência indicados por jovens e adultos do sexo feminino com idades acima de 19 anos

Total: 34 pessoas

Total: 25 pessoas

15


Gráfico 11: Tipos de violência indicados pelos

Gráfico 12: Tipos de violência indicados pelas

meninos de 9 a 19 anos

meninas de 9 a 19 anos

Total: 19 pessoas

Total: 34 pessoas 16

6 5 4 3 2 1 0

Branco

Preto

Pardo Indígena

6 5 4 3 2 1 0

Branco

Preto

Pardo Indígena

Total masculino Gráfico 13: Distribuição das causas da

Gráfico 14 : Distribuição das causas da

violência (tráfico) por entrevistados do sexo

violência (v. sexual) por entrevistados do

masculino

sexo masculino

Total: 46 pessoas

Total: 46 pessoas

16


Total feminino Gráfico 15: Distribuição das causas da

Gráfico 16: Distribuição das causas da

violência (tráfico) por entrevistados do sexo

violência (v. sexual) por entrevistados do

feminino

sexo feminino

Total: 59 pessoas

Total: 59 pessoas

Gráfico 17: Tipo de violência por sexo/gênero Total: 106 pessoas

17


Gráfico 18: Solução para a violência por sexo/gênero Total: 106 pessoas

Gráfico 19: Onde mais ocorre a violência na Estrutural? Total: 106 pessoas

18


Gráfico 20: Execução Orçamentária até julho de 2014 QDD — Execução da Despesa por Regionalização 2014 – julho/RA XXV (Estrutural)

Gráfico 21: Comparativo do QDD — Ações de esporte e lazer, julho/2014 (A Estrutural não aparece)

GDF Plano Piloto Gama Taguatinga Planaltina Ceilândia Guará SobradinhoII

19


Gráfico 22: QDD — Orçamento nas áreas de esporte e lazer no DF até julho de 2014

20


7. Considerações finais A pesquisa nos surpreendeu. Os olhares da co-

de seu funcionamento não for de turno inteiro,

munidade sobre a violência são bem complexos.

fica difícil para as mães levarem e buscarem suas

É interessante notar que, mesmo que a pesquisa

crianças que fazem atividades no espaço. Não

tenha dado enfoque nos direitos das crianças e

há possibilidades de que elas interrompam suas

dos adolescentes, a juventude foi citada com ên-

jornadas de trabalho em horários muito restritos.

fase. Percebemos, a partir disso, que a comuni-

Muitas são trabalhadoras domésticas e têm em-

dade não vê o público específico isolado do todo,

pregos fora da cidade. Outras trabalham no lixão

mas parte de uma realidade em que diversos seg-

e não dispõem de condições para essa atenção.

mentos estão inseridos.

Muitos/as entrevistados/as falam sobre as

Ao refletirem sobre a violência, as pessoas

desigualdades e apontam para as regiões mais

não se restringem a uma única abordagem. Ci-

pobres da Estrutural como lugares onde a vio-

tam muito as políticas públicas como necessá-

lência é mais frequente. Mas as meninas adoles-

rias para assegurar uma vida mais protegida para

centes citaram que a violência sexual pode acon-

a infância e a adolescência. Destacam o papel

tecer nas ruas, no ônibus, em casa... E o clamor

da educação para uma sociedade que respeite

geral é por educação contra o machismo, que

e acolha todas as pessoas, para uma sociedade

agride não só meninas, mas também mulheres,

livre do machismo e do racismo.

homossexuais e pessoas transgêneros.

Muitos mencionaram a incapacidade do

A violência policial apareceu fortemente

Estado e das famílias de proteger as crianças e

nas falas dos jovens negros e nem uma vez nas

os adolescentes, mostrando, sobretudo, a impor-

entrevistas dos não negros. Portanto, a dimen-

tância de uma verdadeira articulação entre todas

são racista desta violência fica evidente. Mesmo

as instâncias do Sistema de Garantia de Direitos

reconhecendo uma atuação de ética duvidosa, a

para assegurar a proteção integral.

população ainda quer uma cidade mais policia-

No contato com as pessoas, ao longo da

da, com profissionais com melhor formação.

aplicação da pesquisa, vimos que não basta rea-

Enfim, o que esperamos com esta provo-

lizar políticas públicas: é necessário que o pla-

cação é construir um diálogo entre todos os seg-

nejamento seja dialogado com a comunidade.

mentos envolvidos, para operar mudanças em

Há descompassos entre o que se pensa como

favor da realização plena dos direitos e para o

o melhor para a comunidade e o que a própria

fim das violências que afetam a comunidade da

comunidade pensa que é melhor para ela. Um

Estrutural, especialmente contra crianças, ado-

exemplo disso é a Vila Olímpica, uma bela estru-

lescentes e jovens.

tura capaz de atender a muitas crianças e adolescentes, mas que, no entanto, enquanto o horário 21


EQUIPE INESC

Conselho Diretor

Auxiliar de Serviços Gerais

Adriana de Carvalho Barbosa Ramos

Juliana Maria de Lima

Barreto Caetano Ernesto Pereira de Araújo Guacira Cesar de Oliveira Márcia

Assistente de Contabilidade

Anita Sprandel Sérgio Haddad

Miria Thereza Brandão Consíglio

Conselho Fiscal

PRESTADORES DE SERVIÇOS:

Sílvia Ramos de Souza

Contabilidade

Armando Martinho Bardou Raggio

LC Mangueira Contabilidade

Iliana Alves Canoff

Prestadora: Rosa Diná Gomes Ferreira

Suplente: Kelly Kotlinski Verdade

Assessoria de Comunicação Colegiado de Gestão

Comunicação

Iara Pietricovsky de Oliveira

Empresa Vértice

José Antonio Moroni

Associada: Gisliene Hesse - jornalista responsável

Coordenadora da Assessoria Política

Informática

Nathalie Beghin

Leal Tecnologia Responsável Thiago Leal - 01621751163

Gerente Financeiro-Administrativo e de Pessoal

Técnico: Leandro Pereira Rodrigues

Maria Lúcia Jaime

Projeto específico Assistente do Colegiado de Gestão

Working – Associação de Integração profissional

Ana Paula Felipe

Prestadora: Ana Júlia Barros Farias Zacks

Assessores(as) Político(as)

APOIO INSTITUCIONAL:

Alessandra Cardoso

Charles Stewart Mott Foundation, Christian Aid, Em-

Carmela Zigoni

baixada do Reino dosPaíses Baixos, Fastenopfer, Fun-

Cleomar Manhas

dação Avina, Fundação Ford, Institute of International

Márcia Acioli

Education (IIE), Instituto C&A, Instituto Heinrich Böll, KinderNotHilfe (KNH), Norwegian Church Aid, Oxfam,

Auxiliares Administrativos

Pão pars o Mundo (PPM), Secretaria de Estado de De-

Adalberto Vieira dos Santos

senvolvimento Social e Transferência de Renda (SE-

Eugênia Christina Alves Ferreira

DEST), Institute for Research in Economics and Busi-

Isabela Mara dos Santos da Silva

ness Administration (SNF), Unicef, World Wide Web

Josemar Vieira dos Santos

Foundation.

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