ROR DE COISAS #9

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Publicação Bimensal Reservado a Sócios

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Mai | Jun 2016


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Ficha Técnica Propriatário: Associação INDIEROR NIPC 513588019 Rua da Laranjinha, nº14 5400-792 Soutelo Diretor: Diogo Martins Martins Diretor Adjunto: Tiago Ribeiro Subdiretor: Rúben Sevivas Editor: Marta da Costa Redação: Diogo Martins Martins | Marta da Costa | Rúben Sevivas | Tiago Ribeiro Colaboradores (Residentes): Manuela Rainho | Paulo Coimbra | Tânia Santos | Wilson Pinto | David Sarmento | Marta S. G. Dias | Manuel António Araújo Colaboradores (Convidados): Maria João Palavras Design: INDIEROR Grafismo: Tiago Ribeiro | Diogo Martins Martins Revisão: Marta da Costa Impressão: Gráfica Sinal | Rua Doutor António de Carvalho e Sousa 5400 - 570 Chaves Tiragem: 50 9ª Edição | 2016

A ROR DE COISAS é propriedade da INDIEROR. O conteúdo apresentado é da inteira responsabilidade dos seus autores. É proibida a reprodução total ou parcial de textos, fotografias ou ilustrações da revista ROR DE COISAS para quaisquer fins, incluido comerciais, sem autorização expressa da Direção. Revista isenta de registo na ERC ao abrigo do Decreto Regulamentar nº 8/99 de 9 de junho, artigo 12º, ponto 1, alínea a)


Índice

Missivas Fora das Quatro Linhas

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Transmontanos pelo Mundo

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A Travessia pela Ponte Escrita

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Entrevista a Fernado Dadim

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Pensamento Sobre as Palavras

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Era Uma Vez um Cineteatro

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O Misticismo de uma Terra Prometida

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Viagens na Minha Terra | Castelo de Vila Pouca de Aguiar

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Entre Aspas “ ”

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Miasmas

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Palavras Moucas, Ouvidos Loucos

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Agenda Cultural

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Carabunha | s.f. substantivo feminino caroรงo de um fruto; carunha.


Missivas Fora das Quatro Linhas

Quem vive na cidade de Chaves, nas últimas semanas, viu-se obrigado a sobreviver a um ataque futebolístico como há muito não se via. Os bombardeios ecoaram pelas ruas da cidade, entre cânticos de festejo pela subida do Grupo Desportivo de Chaves à primeira liga; e picardias entre sportinguistas e benfiquistas pela conquista do titulo pelo clube encarnado. As armas? O som ensurdecedor das buzinadelas dos carros ou um simples comentário (em jeito de “quero opinar, mesmo que não saiba bem o que dizer”) nas redes sociais. Este último, na maioria dos casos, assume um papel bem mais aniquilador e letal do que qualquer buzinão aos ouvidos. É uma mania do ser humano. Não deverá haver qualquer réstia de espanto perante esta afirmação, mas o hábito de opinar

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sobre tudo (e todos) é feio, deselegante e ridículo. Sobretudo porque, em muitos dos casos, os comentários proferidos (ou redigidos) são um verdadeiro remate para canto. Estamos rodeados de treinadores de bancada, de pessoas que, por espetarem penas no traseiro, pensam que são galinhas. Simultaneamente, enquanto esta nuvem de agitação avassala as nossas vidas, a Cultura persiste e insiste na educação do público. É saudável ter opinião e trocar ideias com quem nos rodeia. Contudo, é doentio não admitir que não se conhece e não estar predisposto para aprender. O futebol joga-se em campo, dentro das quatro linhas. Talvez a próxima época traga algumas mudanças.



Transmontanos Por Maria João Palavras pelo Mundo 25 anos Santiago de Compostela | Espanha Fotografia | Maria João Palavras

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Voltando há 7 anos atrás, quando o meu ano-tropa começou, precisamente dia 14 de Setembro de 2009 às 8h00. Não foi de maneira alguma um ano militar no sentido literal, mas sim a nível pessoal. Dava, então, início no curso de Ciências Farmacêuticas na Universidade do Porto, e eu, Maria João Palavras, era pela primeira vez caloirinha. Infelizmente esperavam-me 9 meses de sacrifício porque não era o curso dos meus sonhos.

entrar em Medicina em Portugal, mas foi quando ligeiramente levantei a cabeça e vi uma mão estendida como que para me ajudar a levantar: era Espanha! E foi quando a grande aventura começou.

Algo dentro de mim falava mais alto, algo que se chamava Medicina. Foi então que arregacei as mangas e fui à luta! Mais uma vez voltei a cair porque não consegui

Falando em Santiago de Compostela, a primeira imagem que me vem à cabeça é de 1001 guarda-chuvas, e não sei quantos pares de galochas. É uma cidade onde

Eu, transmontana de gema, dediquei 6 anos da minha vida a Espanha, nomeadamente Galiza, mais concretamente Santiago de Compostela. E não me arrependo nem um segundo.

começam a cair as primeiras gotinhas de chuva em Outubro e duram até Maio. São muitos meses para uma pessoa se habituar à chuva e ir provando diversos guardachuvas: em forma de ovo, com forma aerodinâmica, resistentes ao vento… Contudo, por mais sofisticados que fossem, acabavam por ficar encostados a um canto na praça do Obradoiro, pois em dias de temporal, não havia guarda-chuva que resistisse à junção dos 4 ventos naquela praça. Nem tudo foi chuva! Também houve dias de sol intenso, e de esplanadas que chamavam por mim a gritos e me


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convidavam a uma cerveja com uma tapa. Tapas que normalmente eram batatas fritas, milho frito, amendoins, ou até gomas. A isto juntavam-se os amigos. “Hablan, hablan…”, contavam piadas típicas galegas e eu, novata por terras galegas, sorria como se estivesse a entender. Os minutos passavam, não tinham pressa de chegar a casa, os copos de cerveja multiplicavam-se em cima da mesa até que chegavam as 21h. Por fim, levantavam-se para regressarem a casa, depois de um dia de trabalho, e alguém dizia “Hoy se sale, no?”. Sair? Mas então, não são horas de ir para casa jantar e depois dormir? Aí está a diferença entre

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o português e o espanhol. Não há o café das 21h com os amigos até à meia-noite e depois casa. Em Espanha há festa! Em Espanha às 23h é hora de vestir o vestido mais justinho, calçar os sapatos altos e voltar a casa ao amanhecer. Claro, isto se és estudante. E por falar em café e em cerveja! Durante seis anos, sempre que queria café, tinha que pedir “café solo”, caso contrário serviam-me um café com leite. Sempre que queria uma Super Bock tinha que me contentar com uma Estrella Galicia, que com o passar do tempo comecei a gostar. E aquele raminho de salsa que se

vai pedir à vizinha do andar de cima? Ou até mesmo aquela colherzinha de sal? E aquele cheirinho a pão centeio quentinho que só dá vontade de cortar uma fatia de lado a lado e barrar com manteiga? É tão português… é tão nosso! E só nos lembramos quando não estamos em Portugal. Depois havia dias em que a saudade levemente batia no coração. Não havia Amálias, nem Marizas, nem Carlos Paredes que pudessem preencher aquele calor português que tanto fazia falta. Por mais parecidos que somos aos galegos, o vinho tinto não é o mesmo, a lareira


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não é a mesma e as chamadas para Portugal tornam-se insuficientes (e é quando passas a usar mais o Skype que o telemóvel). Felizmente, como são muitos os portugueses que estudam em Santiago de Compostela, fazíamos jantares. Não faltava o vinho do Douro e da Régua, os pastéis de Chaves, o folar da avó de Bragança, as chouriças e os bons bifes para fazer as francesinhas... e tantas outras coisas que se tornam tudo quando estás longe. Para além dos estudos, também houve tempo para conhecer e apaixonar-me pela costa galega. São paisagens e praias lindíssimas, como por exemplo as Ilhas Cies que ficam ao lado de Vigo. Um bocadinho mais a norte, o Grove, onde

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se come um marisco divinal. Um sabor inesquecível. Continuando a subir no mapa, está A Coruña, onde não se pode passar sem visitar a Torre de Hércules. E já que falo em trilhos e caminhos, não me poderia esquecer de Finisterra onde acaba o caminho de Santiago de Compostela. Toda esta costa galega, marcada pelas ondas fortes e pelo vento do norte, a meu ver, não há outra beleza natural em Portugal, que seja equiparável. Os 6 anos chegaram ao fim, sei que terei saudades da Galiza e de todos os amigos que fiz, mas volto com um sonho realizado. E como diria Roberto Leal em Verde Vinho “bom português, regressa breve e vem de vez!”. Oxalá, não tenha que voltar a partir!


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A Travessia Por Marta da Costa Fotografia | Tiago Ribeiro pela Ponte Escrita

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No passado mês de abril a cidade de Chaves escreveu-se numa grande Ponte que uniu portugueses e espanhóis. “Ponte Escrita”, I Encontro Luso-Galaico de Escritores, ganhou forma enquanto proposta do Orçamento Participativo de Chaves, tendo Altino Rio e Sílvia Alves como mentores. A travessia desta ponte fez-se com 17 escritores convidados que, entre os dias 15 e 17 de abril, deambularam pela cidade de Aquae Flaviae. A organização fez questão de estender a “ponte” à cidade, num evento de e para os flavienses. O programa incluiu a visita dos escritores a algumas escolas da cidade, a participação

da livraria vila-realense “Traga Mundos”, a conversa sobre a cidade no Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso ou um serão cultural na emblemática Adega do Faustino. O feedback dos convidados foi marcadamente positivo e os elogios fizeram ouvir-se na troca de impressões realizada no Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso, sob a moderação de João Morales. A beleza da cidade encantou os visitantes, que destacaram ainda a ambiência histórica que se sente a cada esquina. Reunir um leque tão variado de escritores

no mesmo espaço resultou também numa extensão da conversa até à própria arte da escrita e à procura da inspiração. Cristina Carvalho, filha de António Gedeão, realça que tem um prazer enorme em escrever e que escreve quando quer. Quanto à inspiração, a escritora não acredita na busca desenfreada da mesma, mas sim num “evacuar de inspiração: a pessoa tem a ideia e a ideia sai”. Seguindo a mesma linha de pensamento, o carismático escritor José Fanha desvendou o segredo da inspiração, explicando que se trata de uma “pombinha que anda no céu, que tem diarreia e que só faz caganitas em cima dos escritores e artistas”.

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Quando questionado sobre o que faz para encontrar a inspiração, o escritor revela: “vou para a rua e olho para o céu”. A conversa fez-se a duas línguas, ao som de fortes gargalhadas, com os escritores galegos a traçar largos elogios à organização do evento. Para estes, a “Ponte Escrita” demonstrou que a raia não existe. Anton Cortizas Amado afirmou também que “os galegos são os portugueses do norte e os portugueses são os galegos do sul”. Um evento destas proporções traz inúmeras vantagens para uma cidade como Chaves, cujas potencialidades foram muito elogiadas. Herculano Pombo, um

dos escritores convidados, ressalvou que o último esquisso da matriz da língua portuguesa se encontra em Chaves, numa alusão à originalidade da língua que a própria “Ponte Escrita” pretende exaltar. Para o escritor com fortes ligações ao concelho de Chaves, portugueses e galegos ambicionam encontrar uma definição para quem é quem, apesar de falarem a mesma língua – “Todos aqui dizemos «Tchabes»”. A Ponte não se limitou aos três dias do encontro de escritores. Em novembro será apresentado o Livro de Contos, fruto da atribuição de pontos da cidade de Chaves a cada um dos escritores, para que estes escrevam um conto alusivo a essa escolha:

Manuel Araújo atravessa a Rua do Poço, João Madureira a Rua Direita; Herculano Pombo começa na Praça Camões, Francisco José Viegas no Forte de São Francisco; Paulo Moreiras vai descortinar segredos da Rua dos Gatos, Rui Vieira da Ilha do Cavaleiro; cabe a Cristina Carvalho fazer história da Ponte Romana, Rita Taborda Duarte do Museu Nadir Afonso; as Poldras serão contadas por Nuno Camarneiro, as Termas por Tiago Salazar; a Biblioteca Municipal assombrará José Fanha, a Rua dos Dragões Elena Gallego Abad; a Madalena espera por Inma López, o Jardim Público por Anton Cortizas Amado; Olinda Beja parte da Fronteira e José Carlos Barros do km0.

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Sílvia Alves, uma das mentoras do projeto, afirma que “muitos pontos de partida mais serão ainda os de chegada, num longo caminho”. Esse caminho para a segunda edição do encontro de escritores está já a ser delineado. “Para o ano queremos contar as histórias escondidas nas ruas e nas casas da cidade”, revela Sílvia Alves, “tal como, fortuitamente, aconteceu este ano com a Dona Laurinda dos chapéus, com a barbearia “Corte Implacável” ou com a “Casa da Ponte - Cambêdo”, que já aguarda o regresso do ilustrador Richard

Câmara para continuar a desenhar a cidade em tons de azul-água”. A edição de 2017 pretende envolver ainda mais a cidade de Chaves, atraindo mais público para ouvir as histórias da cidade e estreitar laços.

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Entrevista a Por Manuela Rainho Fernando Dadim Fotografia | Tiago Ribeiro

Dadas determinadas condicionantes, a presente entrevista não foi presencial. No entanto, pretendemos partilhar com o autor a opinião de um dos escritores mais interessantes da nossa praça, Fernando Amado Morais Castro, cujo pseudónimo é Fernando Dadim. Natural de Angola, de formação académica em Direito, o escritor escreve poesia que se encontra espalhado em jornais e revistas com que colaborou, nomeadamente a revista RISCO e a ZUT em Viseu. É ainda romancista. Segundo o próprio, o romance é uma consequência da necessidade física e anímica que tem de escrever.

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Manuela Rainho: representa escrever?

Para si o que

Fernando Dadim: Para mim, é participar no «Agir Comunicacional», contribuir para aquilo que Hegel designava por «Espírito comum». Por outras palavras: o terceiro mundo para Karl Popper, tudo quanto a ciência e a cultura produziram ao longo da história de uma dada comunidade mais a sua interação com outras culturas e civilizações. Logo, escrever literatura é uma forma de fuga à alienação, à exclusão. É receber o

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aconchego do grupo, da comunidade mediante apreço que ela nos dedica; ou não dedica. Se este for o caso só nos resta protestar pateticamente por o pelotão levar o passo trocado relativamente a nós. E então seremos o centro do mundo tragicamente e teremos o indivíduo «contra mundo.».

M.R.: Como decorre o seu processo criativo?

M.R.: Considera-se um ser crítico?

A poesia: escrever um poema, por exemplo, isso faz-se de um jato. Porém relativamente a um longo poema como os Lusíadas as coisas já não se processarão dessa maneira. Aqui já estaremos

F.D.: Se não o fosse para quê entrevistarme?

F.D.: Há que discernir os vários e diferentes processos de produção de cultura consoante estejamos no registo da poesia, ou da literatura, da pintura, do cinema, do teatro e da música.


mais próximos da literatura. Isto é, vai-se escrevendo, andando, indo: muita persistência, muita transpiração. Por outras palavras: Combinar «aquilo que não faz sentido» que é a poesia no dizer de Barthes; Com aquilo que tem um discurso lógico, aquilo que faz sentido que é a obra literária.

tenho a dizer que, embora não se trate propriamente de culinária, que a obra literária assim como toda a obra de arte se produz do fim para o princípio: Reconheço que é pouco mas ter talento já é uma boa ajuda...

palavras: o sermos contra o «estabelecido» porém não lhe devendo nada para podermos falar de alto!

M.R.: O que é para si criatividade?

Como pode constatar, tento fugir a essa questão, na medida em que não desejaria fulanizar excessivamente à minha resposta. Em todo o caso, se alguém desejar escrever uma obra de ficção, só

F.D.: Criatividade é dar uma gargalhada perante esta entrevista: É ser contra o que está estabelecido como cultura. O rirmo-nos da sociedade sem temermos a solidão ou o ostracismo. Por outras

F.D.: Primeiro de tudo para que pudesse merecer uma resposta a esta pergunta, seria necessário saber no que a cultura transmontana consiste para além de aspectos etnográficos mais ou menos folclóricos. Não existe uma cultura transmontana distinta da cultura

M.R.: Pensa que existe uma crise de identidade cultural transmontana?

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nacional, as outras regiões do nosso país já tinham sido, no antigamente, muito semelhantes às de Trás-os-Montes, era o nosso arcaísmo; os grandes vultos da cultura com raízes locais são grandes dinossauros das letras nacionais: Veja-se Torga. No referente a uma crise identitária transmontana. Só lhe tenho a dizer que a modernidade acelerada pela emigração para a Europa trouxe consigo a destruição de tudo quanto era arcaico com a consequente perda de sentido da vida do antigamente, do tempo em que o dinheiro

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quase não entrava, não era tido em conta no quotidiano das pessoas, passava-se bem sem ele. Era o tempo da permuta de coisas por serviços, de produtos agrícolas por outros do mesmo teor, de horas de trabalho por horas. Ora isto dava uma consistência à vida das pessoas: Uma espessura que por isto ter desaparecido; o carácter das pessoas das nossas aldeias corre o risco de não se reproduzir por as condições antropológicas e de produção se terem alterado radicalmente e em poucos anos.

transmontano, o condiciona e ou integra?

M.R.: De que forma o ser do norte,

F.D.: Uma merda até duas!

F.D.: Quer pergunta mais chocha do que esta? Então não sabem que sou um solitário? Faz-me lembrar aquela anedota que, estando Adão e Eva no jardim do Éden, esta sorrateira, apanhando Adão distraído, lhe cerrou os olhos com ambas as mãos e lhe perguntou, «coquete», “Quem é?”. M.R.: Como definiria Fernando Castro, enquanto pessoa de cultura e de escrita?


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Pensamento Sobre Por Manuel António Araújo as Palavras Ilustração | Marta S. G. Dias

“Amava-a como a uma amiga inteligente, fiel, insubstituível, não como a uma amante.”

- O Livro do Riso e do Esquecimento, Milan Kundera

Há uns tempos, estava eu sentado num sofá de napa, numa imobiliária, à espera de ser atendido. À minha frente, em pé, dois jovens namorados, presumo eu, esperavam também. De mão dada, levemente encostados um ao outro, numa leveza incendiada. Ela usava o cabelo curto e um vestido bastante por cima do joelho, que deixava ver as pernas esguias e muito

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morenas, ele usava também o cabelo curto e uma barba de três dias. Não teriam mais de vinte e oito anos.

a ver o corpo dela a entrar, com lentidão, no mar, acordei atrozmente para um ambiente eunuco!

Sentado no sofá ordinário, pude imaginá-la a entrar na água e a sair da água, com o vestido, transparente, colado ao corpo, ou a enrolar-se na areia, de tanga, ou a…… quando o agente imobiliário sai do gabinete, se dirige a eles e profere a palavra assassina: - Muito boa tarde! Em que podemos ser útil ao casal?

De dentro do gabinete continuou a chegar até mim essa palavra castradora: “O casal deseja vivenda ou apartamento?”, “O casal tem filhos?”… Tapei os ouvidos. E quando saíram do gabinete vi dois corpos fraternais e amigáveis de mão dada. As pernas esguias pareceram-me dum moreno tão casto!, o cabelo curto dava-lhe um lamentável ar de rapazinho, e a barba de três dias dele pareceu-me um sinal de baço desleixo.

Onde está a palavra assassina? Ora nem mais: “casal”. Regalado no sofá de napa,


São como um punhal as palavras! diz Eugénio. Um punhal castrador, direi eu. É por isso que gosto de palavras ambíguas. A ambiguidade tem a notável característica da escapatória, enquanto que as palavras sem conotação são pobres e perigosas na sua pobreza. A um homem e a uma mulher que vivem juntos chamam um casal. O agente imobiliário usou a palavra “casal”, uma palavra educada, pertencente à ortodoxia linguística. E sabe-se como a ortodoxia é avessa a desvios e a desinquietudes. Se dissesse: Muito boa tarde! Em que podemos ser útil aos amantes? - violaria a ortodoxia e não me acordaria do sonho. Porque um jovem com barba, cuidadosamente, de três dias e uma jovem sensual, a roçarem-se levemente, não são um casal. São dois amantes. “Casal” remete para a harmonia do cansaço, para a ausência da ambiguidade, para a lassidão da corda. Dois jovens numa imobiliária, tensos, cheios de pequeninas infidelidades por cumprir, não podem ser um casal.

“A Escuridão de Maria Luísa” é o mais recente trabalho do escritor Manuel António Araújo. O livro conta a história de uma médica oncológica a quem foi diagnosticada uma leucemia. Maria Luísa refugia-se nos chats da internet e lá encontra um homem por quem se apaixona. Há palavras que nos fulminam, outras que nos motivam, outras ainda que nos salvam. Outras… e outras….. e há palavras que nos castram.

Manuel António Araújo, vencedor do Prémio Revelação APE “Prémio Nacional de Conto Eça de Queirós”, partiu de um caso verídico que culminou em “A Escuridão de Maria Luísa”.

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Era Uma Vez Por Tânia Santos

Obra | Antigo Cineteatro Arquiteto | Bruno Alves Reis / Nadir Afonso Projeto | 1963

um Cineteatro

Chaves guarda no seu centro histórico um tesouro bem escondido que, uma vez fechado à chave, nunca mais se voltou a abrir. O antigo cineteatro, que recebeu cinema, peças de teatro, concertos e até Assembleias Municipais, torna-se o ponto de encontro social e cultural dos flavienses durante quase duas décadas. Contudo, o início dos anos 80 dita o fecho da então única sala de espetáculos da cidade. No início da década de 60, os proprietários da empresa “Madureira & Xavier. Lda” convidam o arquiteto (e futuro pintor) Nadir Afonso para desenhar um novo cineteatro. Desde logo, Nadir entendeu

o potencial do lugar de implantação deste edifício em gaveto, com uma fachada voltada para a Rua de Santo António e outra para a antiga Travessa do Olival. Respeitando o alinhamento das fachadas em ambas as ruas, Nadir resolve subtilmente a dificuldade de integrar um equipamento público (com capacidade para 754 lugares sentados) numa malha urbana formada fundamentalmente por edifícios de dimensões mais reduzidas (destinados sobretudo à habitação e ao comércio). Dada a generosidade das dimensões do terreno de construção, o arquiteto opta ainda por libertar a área posterior para dar lugar a um agradável

espaço exterior privativo (um logradouro ajardinado), do qual os espectadores poderiam usufruir durante os intervalos dos espetáculos. Já depois de concluir o desenho do projeto, surge um novo pedido dos proprietários da mesma empresa, que pretendiam construir também, naquele mesmo terreno, um hotel (Hotel Trajano). As modificações propostas foram tantas – nomeadamente a eliminação do pátio ajardinado, ganhando assim espaço para o hotel –, que Nadir, já estafado com todo o processo, decide abandonar por completo o projeto.

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Para dar seguimento ao processo, os proprietários contratam o arquiteto portuense Bruno Alves Reis. Embora se sujeite ao pedido do cliente (cineteatro e hotel no espaço do logradouro), o novo arquiteto decide, curiosamente, respeitar as principais orientações do desenho de Nadir Afonso para o edifício do cineteatro. A logística do funcionamento do edifício (programa, circulação e acessos), a expressão formal na marcação da divisão espacial entre palco e plateia (altimetria) ou no desenho sinuoso em planta (espécie de ferradura), a poética nos planos curvos inclinados da cobertura da sala de espetáculos ou no duplo pé direito

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do vestíbulo, iluminado por uma grande claraboia, comprovam que Bruno Reis aproveitou a sensibilidade artística e o conhecimento construtivo revelados pelo seu antecessor para resolver um programa de elevado grau de complexidade. Assim sendo, o cineteatro foi finalmente construído e abre ao público em 1963. Poucos anos depois, também se assiste à inauguração do Hotel Trajano. Restam as memórias de agradáveis noites de convívio a quem teve oportunidade de frequentar esta sala de espetáculos. É dramático pensar que, numa cidade

onde a cultura estagnou durante longos períodos (também pela falta de oferta de equipamentos culturais), exista um espaço magnífico, outrora construído para receber uma multidão de espectadores, mas que se encontra encerrado há mais de 30 anos (!). Estranhamente poucos flavienses (reservando aqui algumas exceções) lutaram pela sobrevivência deste cineteatro, poucas vozes se ouviram e se revoltaram (que não é postura usual dos flavienses quando se trata de preservar as “relíquias” do passado) e julgo que, por essa razão, parte da população (sobretudo


a mais jovem) até desconhece a sua existência. O edifício caiu simplesmente em esquecimento, foi abandonado, quase enterrado. Também é facto que, nestes últimos anos, as entidades municipais procuraram uma solução para o renascimento do cineteatro e talvez não a encontraram, apenas por culpa dos elevados (e excessivos)

requisitos técnicos e consequentes gastos financeiros que a atual legislação de obra obriga. Mesmo assim, neste caso particular, a cidade, a população, a arquitetura e a cultura mereciam outro desfecho. Entretanto a Câmara Municipal optou por uma solução (alternativa), que projeta a transformação do antigo cineteatro numa nova Loja do Cidadão. A previsão de

abertura aponta para 2017 e cujo objetivo, segundo os responsáveis da Câmara, passa por promover “uma maior dinâmica do centro comercial ao ar livre do Centro Histórico”. Enfim, mudam-se os tempos, mudam-se as dinâmicas. Era uma vez um cineteatro...

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O Misticismo de Uma Por Rúben Sevivas Terra Prometida

Pare, Escute, Olhe (2009) Argumento: Jorge Pelicano; Rosa Teixeira Silva Assistente de Produção: João Pelicano Fotografia: Jorge Pelicano Mistura de Som: Miguel Lima Montagem: Jorge Pelicano Música: Manuel Faria; Francisco Faria Produção: SIC - Sociedade Independente de Comunicação Produtor: Jorge Pelicano Realização: Jorge Pelicano Som: Jorge Pelicano

“Em nome de um povo esquecido”, é com estas palavras em fundo negro que se inicia o filme Pare, Escute, Olhe (2009) de Jorge Pelicano; e com esta pequena frase, envolta em luto, se estabelece o tom de todo o documentário. Para, Escute, Olhe é um filme sobre quem fica; sobre os que resistem numa região cada vez mais esquecida; sobre os que realmente têm de lidar com as decisões políticas e governamentais estabelecidas a centenas de quilómetros de distância. Pare, Escute, Olhe é um filme sobre pessoas!

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Quando se ouve falar no documentário, premiado em diversos festivais, incluindo o Doclisboa (talvez o festival que melhor tenha entendido a situação retratada), pensa-se na linha do Tua e na sua degradação e desaparição. Contudo, Jorge Pelicano, repórter de imagem da SIC e realizador do anterior Ainda Há Pastores? e do mais recente Pára-me de Repente o Pensamento, decide focar-se nas incongruências políticas, nas causas das suas decisões e naqueles que por elas são afetados. Em Pare, Escute, Olhe, os políticos são intervenientes assíduos e frequentes. Algo raro no documentário nacional. Os seus discursos são mostrados

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a par com as imagens captadas em Trás-os-Montes. Sendo assim, Pare, Escute, Olhe tem um sentido político muito forte. Não no sentido partidário e clubístico do termo, mas sim no seu sentido literal. O propósito do filme é ser interventivo e espelhar uma situação que precisa de ser discutida. Distingue-se da escola portuguesa de cinema por não representar a poética que cineastas usaram ao retratar Trás-os-Montes. Talvez a formação jornalística de Jorge Pelicano seja aqui um ponto-chave para entender as suas intenções. Contudo, tal não invalida o seu

contributo artístico nem cinematográfico. Muito pelo contrário! Pare, Escute, Olhe tem a mesma função que muitos outros documentários e filmes filmados em Trásos-Montes, que é retratar o esquecimento de um povo que vive limitado geográfica e politicamente. Todavia, usa uma outra forma de o fazer. É um filme que vive do poder da montagem e de todas as suas especificidades e potencialidades. É um filme com valores cinematográficos garantidos por prémios nacionais e internacionais. É, também, um filme que desponta raiva e desconforto a quem o assiste.


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Ora bem, o filme começa com uma montagem inteligentíssima com depoimentos e imagens de arquivo de vários dirigentes políticos sobre a Linha do Tua e a região em que esta está inserida, desde Mário Soares a Cavaco Silva. São discursos deveras inspiradores e reconfortantes para os que para cá do Marão habitam, contudo, sabe-se que é conversa fiada e que não passa de paleio político. Se alguma dúvida restar, no decorrer do filme será desfeita. Seria bom assistir a este documentário com um dos políticos intervenientes no filme! Assim, poderiam relembrar-se do que

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defenderam nos seus discursos, mas que assassinaram nas suas ações. Também é preciso destacar, neste contexto dos depoimentos políticos, que a montagem do filme é assertiva, comovente e irónica, fortemente irónica. Por exemplo, vemos o deputado eleito pelo distrito de Bragança na Assembleia da República; este atende uma chamada e, do outro lado, fala uma senhora idosa que precisa de um favor: que lhe tragam os medicamentos porque já não tem o metro para os ir buscar.

Mas o filme é também sobre as outras pessoas. Aquelas que resistem no rigor dos montes. Essas indignam-se, ainda que se ache que não; essas gritam, ainda que os seus berros sejam abafados; essas revoltam-se, ainda que o seu punho seja cortado; essas emigram… porque o seu país lhes vira as costas. E há ainda aqueles que não emigram, mas que “ficam sentados à lareira, esperando pela morte”, pois, derrotados, nada podem fazer. Pare, Escute, Olhe é um filme obrigatório para todo o cidadão português! É revoltante a forma como os sucessivos


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governos reivindicam interesses económicos e esquecem os valores humanos. O interior não foi sentenciado pelos que lá vivem ou pelos que de lá se viram obrigados a não viver, mas sim pelos sucessivos governantes que, lavando o sangue de incontáveis mortes, continuam a fechar linhas de comboio porque não há passageiros; continuam a fechar escolas porque não nascem crianças;

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continuam a fechar hospitais, centros de saúde e serviços de saúde, porque não há população suficiente que os justifique; e continuam a prezar o valor económico da vida humana, quando tanto cidadão português é o lisboeta como o flaviense, tanto vale a vida de um portuense como a de um eborense. Mas aparentemente tudo isto é uma utopia. E desde que me lembro que o ciclo é vicioso e que quanto mais se

tirar, mais se perderá. Por isso, na reflexão de Jorge Pelicano, peço a todos os leitores deste texto, ou aos espetadores do filme, que parem, que escutem e que olhem! É hora!


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Viagens Na Minha Terra Por David Sarmento Castelo de Vila Pouca de Aguiar

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Rua de Santo Antรณnio, 37 5400-069 Chaves Tel. 276 318 460 | Fax. 276 318 461 email: opticaliachaves@gmail.com

Av. 25 de Abril, 42 5430-420 Valpaรงos Tel. 278 714 093 | Fax. 278 714 094 email: opticaliavalpacos@gmail.com

Av. Nuno ร lvares Pereira, 498 5470-203 Montalegre Tel. 276 518 097 | Fax. 276 518 098 email: opticaliamontalegre@gmail.com

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Entre Aspas “ Por Manuela Rainho ”

“Os escritores são os exorcistas dos seus próprios demónios.” - Mário Vargas Llosa De acordo com as leituras que fiz de alguns dos romances de Fernando Dadim, penso que esta citação que pus em epígrafe se adequa lindamente ao que este autor escreve.

“Eu não peço nada a ninguém! Só quero respeito para quem trabalha!“ Um outro que se situava à ilharga do que contestava Humberto Delgado disse: “Liberdade para o trabalhador, para emigrar! Eu não sou comunista, mas, enquanto não concederem isso, a opressão não acaba!”. E o jovem que acabara de falar terminou dizendo: ”Abaixo Salazar! Viva a república! Viva Humberto! ( Hoje há Circo em Torgo - pp. 48 )

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Infelizmente ainda não li o seu romance “O Enjaulado”, dado à estampa em 2007. Mas li “Hoje há Circo em Torgo”, romance publicado em 2011, que nos fala da vida dum Portugal salazarista e bolorento. É uma obra onde perpassa uma fina ironia, que retrata de fora excelente a mentalidade puritana e de fachada das sociedades inerentes às cidades de interior. Simultaneamente, evoca travessuras duma infância que me parece ser feliz.

Até que Hermengarda pôs a interrogação: “Alguém já praticou adultério em pensamento?”. E o copo rodopiou de um lado para o outro sem sentido, apontando em todas as direcções e para nenhuma. Alguém exclamou: “todos e todas!”

( Hoje há Circo em Torgo - pp. 115/116 )


Também li e apresentei, penso que em 2012, o seu terceiro romance “O Suicídio dos Pássaros”. Não resisto a registar um incidente que suscitou em todos os presentes um sorriso inesperado. Ao dissertar sobre o título desta obra, realcei a metáfora que, segundo o meu imaginário, alia «pássaro» a «liberdade» e o facto dessa mesma liberdade ter vindo a ser sistemática e pertinentemente atropelada pela humanidade. Muito pragmaticamente, o autor referiu que o título fora escolhido por ter lido a expressão e a considerar surpreendente. Desta dualidade de abordagens ao título e ao que o mesmo sintetiza relativamente ao conteúdo do romance se pode inferir que, enquanto o autor buscou no título a sonoridade e o inesperado dos vocábulos que o integram, o crítico encontrou no título o eco do que o romance aborda: a problemática da liberdade numa perspectiva de género, de geração.

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Mal entrou teve a sensação de ter penetrado na antecâmara da morte à qual tinha sobrevivido graças a uma divinal coincidência, um acaso: O esquecimento do seu telemóvel num camarim! Como nós somos frágeis e dependentes de pequenos nadas, pormenores por vezes inócuos que só fazem sentido quando os olhamos retrospectivamente a partir do nosso presente; A unidade da nossa vida psíquica, da nossa personalidade, da nossa consciência: o centro de nó próprios a partir do qual nos gerimos no mundo, e que por isso o absolutizamos. ( O Suicídio dos Pássaros - pp.235 )

Penso que este autor, através dos romances que já publicou, nos oferece a oportunidade de nos revermos ou identificarmos através das suas personagens com a sociedade em que estamos inseridos. Todos nós conhecemos uma Dª Pulquéria ou uma Laura; uma Hermengarda ou um Gualter… é esse jogo de espelhos onde nos movimentamos na narrativa de Fernando Dadim, que se torna apaixonante e nos leva a concluir que apesar de sermos cada um de nós um ser único e irrepetível temos muito mais em comum com os outros do que à partida gostaríamos de ter. Essa consciência de pertencer ao todo tornase inquietante e confortadora. E isso é possível experienciar, ao ler os romances de Fernando Dadim.


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Miasmas Por Wilson Pinto



Palavras Moucas, Por Diogo Martins Martins Ouvidos Loucos

Para ser escutado. Lá dentro, cá fora ou na rua.

Voa Pé

Retimbrar (2015) Género: Tradicional

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“Retimbrar no chão! Retimbrar no chão!”. Foi o que mais ouvi quando cheguei a meio daquele que viria a ser o meu primeiro concerto da banda. Quinze minutos passados os Retimbrar já estavam a juntar-se ao público numa gigante roda pelo recinto. As danças de roda, os cantares e as percussões fundiram-se com aqueles que pensavam ter ido assistir a um concerto normal. Mas os concertos de Retimbrar não são concertos normais. São acontecimentos. Talvez por isso tenha recebido de pé atrás a notícia de que preparavam um disco.

Não me interpretem mal mas gravar um disco, só por gravar um disco, é algo que por si só não tem grande relevância. Para ser honesto, pensei cá para com os meus botões o que lhes teria passado pela cabeça. O registo é importante, sim. Mas ninguém espera de Retimbrar aquela definição no áudio, aquela produção fantástica ou aqueles temas limpinhos preparados para serem ouvidos enquanto estamos ao volante. Deles esperamos a festa, as percussões que se fundem numa só, as vozes honestas e sobretudo a performance que sai naturalmente a músicos fabulosos. Um concerto deles é uma experiência enriquecedora que se faz entre pessoas, algo que seria dificilmente reproduzido através de um registo discográfico.


Fotografia | Jorge Almeida

E porque soa a Retimbrar? Porque o álbum é uma mescla das maravilhas que só o estúdio pode dar, com a energia que só um concerto pode transmitir. Literalmente. De alto a baixo. Em casa ou na rua. Cá dentro ou lá fora. Voa Pé é um resumo de todas as experiências dessa estrada que já lhe vai em cima. É um entendimento

profundo da sonoridade que a banda tem e uma reprodução fiel da energia que esta transporta, mesmo estando em constante mudança. Começamos Ao Alto com as percussões e ao alto ficamos no Voa Pé. O single que para os mais desconfiados como eu pode não parecer convencer à primeira audição (há outro Voa Pé neste álbum que mais me enche as medidas, já lá chegaremos), mas que se mostra enquadrado no álbum e uma escolha inteligente para chegar a um público diferente. Deixai o menino divide-se em duas faixas

Fotografia | Jorge Almeida

Fotografia | Jorge Almeida

Mas vamos ao Voa Pé que é isso que interessa. Ouvi a primeira vez e respirei de alívio. Soa a Retimbrar e é Retimbrar. Notou-se arrumação na casa, sim. Mas sem esquecer a sua identidade, algo que já parece ser intrínseco a uma banda com a experiência que esta tem.

(como muitas neste álbum). A segunda parte é a parte que tem o verdadeiro conteúdo, se é que assim posso resumir. Mas para mim é na primeira parte que realmente reside a prova de que nada neste disco foi deixado ao acaso. Lembro-me de uma edição do Flaviaefest em que os Retimbrar tocaram. Após o concerto e já noite dentro estávamos a preparar-lhes uma entrevista em vídeo e, enquanto os acertos técnicos estavam a ser ultimados, os Retimbrar foram eles próprios. Uma família reunida em torno de música. Se vasculhar os meus aquivos de áudio dessa noite, vou ouvir

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Fotografia | Jorge Almeida

algo muito parecido como essa primeira parte de Deixai o menino. É uma janela escancarada para o ambiente que se vive nos Retimbrar. Para quem ouvir o disco pode pensar que estou a tirar demasiadas conclusões de uma faixa de apenas 20 segundos que até pode não parecer nada demais. Mas nesta faixa percebi que estava a ser arrogantemente errado ao partir do princípio que um registo discográfico era um passo em falso para os Retimbrar. Faixas como esta ou como outras de igual sinceridade que se alongam ao longo do disco (Tracanhola Crocodeúlica e m.f.p. são mais dois bons exemplos) transformam o intransponível e reflector plástico do CD, num vidro transparente e que não esconde segredos.

Só há uma maneira de uma banda como Retimbrar poder funcionar em álbum: com transparência. Escusado será dizer que Voa Pé é do mais honesto que podemos ouvir por aí. O que me leva aos meus comentários finais e à referência daquela que para mim é a cereja no topo do bolo – Voa Pé (cá dentro). Tudo está no ponto nesta música. É simples, está magicamente bem interpretada e consegue realmente chegar a nós pela sinceridade. Não há artimanhas complexas nem fogo de artificio. Foi, para ser sincero, o tema que me fez recomeçar a escutar o álbum por me fazer aperceber o quão bonitas as vozes estavam a soar. Algo que foi impossível de ignorar na segunda vez que escutei todas as músicas (confesso

que fiquei com pena de não as ouvir mais vezes). Em resumo, este é definitivamente um trabalho a ter em atenção. Não só porque já era tempo de os Retimbrar terem um lugar merecido de maior destaque no nosso panorama musical, mas também porque, tal como todo o trabalho da banda, este álbum é uma experiência completamente diferente. Uma obra que para mau entendedor pode parecer fragmentada, mas que está unida com a autenticidade de um grupo que sabe muito bem o que faz. Voa Pé merece estar em destaque nas prateleiras junto com outros nomes grandes da música Portuguesa.


Agenda Cultural

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Exposição Coletiva de Fotografia “CUT-OUT” 3 a 30 de junho Biblioteca Municipal de Chaves Chaves

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Cineclube de Chaves

Chaves Mágico 5º Encontro Internacional de Magia

14 e 28 de junho | 21h00 Cine Teatro Bento Martins Chaves

8 a 11 de junho Chaves

Trata-se de uma exposição coletiva de fotografia de vários membros da Lumbudus. Fábio Cunha, Fernando Ribeiro, Humberto Ferreira, Lamartine Dias, Miguel Santos, Pablo Serrano, Paula Dias, Tânia Oliveira, Sergio Crespo.

Apresentação e exposição de filmes, projeção, debate e convívio. Apareça e inscreva-se.

Apresentação a cargo de Vitor Mendes. Bilhetes à venda no Centro Cultural de Chaves (5€ adulto | 2,5€ criança) Cristovão Lima - 969 228 286 cristovaodelima@gmail.com Cesár Augusto - 917 515 702 flavihotel@gmail.com

Org.: Lumbudus Fotografia e Gravura

Org.: Cineclube de Chaves

Org.: Clube Amigos da Magia e Município de Chaves

Associação

de


“O Outro Lado do Silêncio: Antologia Poética” de Gilberto Bandeira

“ As Minhas Flores” De Pablo Serrano

9 de junho | 18h00 Biblioteca Municipal de Chaves Chaves

9 a 30 de junho | 18h30 Adega do Faustino Chaves

Apresentação do livro a cargo da escritora Lynda de Carvalho Sinopse: “Do «O Outro lado do silêncio» o trovador indigna-se, dói-se com a guerra, fere-se com a injustiça e quer ser arma nos poemas (…)” Org.: Município de Chaves

Cinema “Má Vizinhança” 10 e 12 de junho | 21h30 e 15h30, 18h00, 21h30 Cine Teatro Bento Martins Chaves

Exposição de fotografia da autoria de Pablo Serrano, primeiro associado galego da Lumbudus, Org.: Lumbudus Fotografia e Gravura

Associação

de

Agora que Mac (Seth Rogen) e Kelly Radner (Rose Byrne) têm um segundo filho a caminho, estão prontos para dar o último passo para a vida de adultos: os subúrbios. Mas quando achavam que tinham reclamado o bairro e estavam a salvo para vender a casa, descobrem que os novos vizinhos são uma irmandade ainda mais descontrolada do que a de Teddy (Zack Efron) alguma vez sonhou ser. Org.: Teatro Experimental Flaviense

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15º Festival Infantil da Canção

Cinema

11 de junho | 21h00 Praça General Silveira Chaves

17 e 19 de junho | 21h30 e 15h30, 18h15, 21h30 Cine Teatro Bento Martins Chaves

As escolas do município de Chaves brindam os flavienses com mais uma edição do aclamado festival infantil da canção. Org.: Junta Freguesia Santa Maria Maior Colaboração: Município de Chaves e A Voz da Juventude

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Feira das Varandas

“X-Men Apocalipse”

Depois do sucesso mundial aclamado pela crítica X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, o realizador Bryan Singer retorna com X-MEN: APOCALIPSE. Desde o início da civilização, ele era adorado como um deus. Apocalipse, o primeiro e mais poderoso mutante do universo X-Men da Marvel, acumulou os poderes de muitos outros mutantes, tornando-se imortal e invencível. Org.: Teatro Experimental Flaviense

18 de junho | 09h00 às 17h00 Largo do Arrabalde Chaves

Feira de Produtos Regionais. Org.: AmoChaves – Ass. de Moradores do Centro Histórico de Chaves Apoio: Município de Chaves


Cinema “O Gelo”

18 de junho | 21h30 Cine Teatro Bento Martins Chaves

Concebida a partir do ADN de um cadáver com mais de 20 000 anos, Catarina cresce encerrada num palácio isolado, sob a tutela de Samuel, um investigador da vida futura que a usa como cobaia num projeto sobre a imortalidade humana. Uma jovem estudante de cinema, Joana, apaixona-se por Miguel um colega mais velho obcecado pelo Gelo, uma paixão que acaba súbita e tragicamente durante uma viagem iniciática de ambos ao cume de uma montanha nevada. Org.: Cineclube de Chaves e Teatro Experimental Flaviense

Música no Museu 2016 Pela Academia de Artes de Chaves

Cinema “Alice do Outro Lado do Espelho”

23 de junho | 21h00 Museu da Região Flaviense Chaves

24 e 25 de junho | 21h30 e 15h30, 18h15, 21h30 Cine Teatro Bento Martins Chaves

A música volta ao Museu! Em mais uma parceria do Museu da Região Flaviense com a Academia de Artes de Chaves, os grupos de música de câmara da AAC apresentam-se em recital na sala de visitas da cidade, rodeados pela nossa história. Com grupos de diferentes tipos e de diferentes níveis, este recital envolverá os alunos da AAC no mundo da música de conjunto e será o culminar de uma semana de trabalho intensivo. Sintam-se convidados!

A doce Alice cai em sono profundo e, quando acorda, descobre que está de volta ao País das Maravilhas. Lá, ela é informada de que terá de viajar para o universo paralelo de um misterioso espelho, comandado pelo terrível Senhor do Tempo, que planeja transformar o País das Maravilhas numa terra sem vida. Reencontrando velhos amigos ela tem ainda que descobrir uma forma de parar a malvada Rainha de Copas que se quer aproveitar da situação para voltar ao trono.

Org.: Academia de Artes de Chaves

Org.: Teatro Experimental Flaviense

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