Leite Quente Nº 1 - março de 1989

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PAULO LEMINSKI


FOT O DA CAPA : Au lio Costa Zambenedetti Cri sti na Yamada

Prefeit ura Muni cipal d e Curitiba Jaime Lerner - Pref eito Municipal Secret ari a Municipal d a Cult ura/Fundação Cult ural de Curit iba Direto ria d o Patrimô nio Cult ural/ Casa da Memória Endereço:

Rua 13 de Maio, 57 1

80.410 - Fone: (041) 223-2733 Per iodicidade irregu lar


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Curitiba do muito pinhão. Curitiba cidade-teste. Curitiba aldeia de ares provincianos. Curitiba urbe de 296 anos. Curitiba modelar em planejamento urbaoo. Curitiba ponto de luz universal. Curitiba das tantas sociedades filosóficas, operárias, beneficentes, culturais. Curitiba dos imigrantes múltiplos, dos migrantes sem fim Curitiba dos curitibanos. É da Curitiba de seu povo, que fala "leite quente ", escandidamente, com peculiaridade única, que tratam as Edições Leite Quente. No lançam ento, o tema é "Nossa Linguagem", neste tempo em que linguagem é modo de se expressar e de se comportar. Quando linguagem é tudo. Quem trata do assunto é Paulo Leminski, curitibano e polaco, poeta e lingüista, talento múltiplo de muita perseverança e autodidatismo - completando ou substituindo o saber formal. Leminski o faz como "viagem de leve, em asas de andorinha", isto "antes que o leite esfrie". Edições L eite Qu ente são ensaios sobre o caráter curitibano. São formas de desvendar o mistério das singularidades com que se processa a vida nesta mui leal Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, recém-dita como das três melhores cidades do mundo para o ato de viver com qualidade. Leminski passeia pela nossa linguagem, contrapondo o velho e o novo, brincando - e inventando nomes de época - com as poses das gerações dopassado e da contemporaneidade. Outros "Leite Quente" virão, explicando à luz de elementos históricos e de percepções individuais o singularíssimo modo de ser curitibano. Quando não por mais, para que todo forasteiro seja bem vindo e possa penetrar com maior facilidade no mistério desta Curitiba de 296 anos. Maí Nascimento Mendonça Diretora de Patrimônio Cultural

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Criação: Casa da Memória/ Diretoria do Patrimônio Cultural Tema e textos deste volume: Paulo Leminski Fotografias: Arquivo da Casa da Memória Arquivo do jornal "O Estado do Paraná" Departamento de Programação Visual: Responsável: Vivian S. Schroeder Programação Visual : Ana Lúcia S. Verdasca Revisão : Carla Anete Berwig Operador de Composer : Reinaldo Cezar Lima

Ed. Leite .Ou ente . Curitiba 1 ( 1) Mar. 1989

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IMPRECISA PREMISSA . .... .

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CURITIBA: O QUE A GENTE FALA, O QUE A GENTE CALA

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FALA, CURITIBA . . . . . . . . . . . . .

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COM OU E ROUPA NÓS V AMOS . ...... .

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O QUE É OUE OS OUTROS VAO DIZER.? . . ....... ....... .

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NOSSA EXPRESSÃO ....... .. .. .

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LER UMA CIDADE: O ALFABETO DAS RUfNAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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Ed. Leite Ou ente. Curitiba 1 ( 1) Mar. 1989


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Lá se vão longe os bons velhos tempos quando linguagem designava apenas as palavras e fra ses da I íngua materna. Hoje, o conceito de lingua gem se ampliou para todos os lados, incluindo desde os gestos e os costumes até a culinária, o vestuá rio, da etiqueta na mesa ao comportamento sexual, dos ritos de cortesia aos mitos diretores, do urbanismo às práticas políticas. Hoje, linguagem é tudo . E tu do é linguagem. Os pontos de referência. Atrações e rejeições. Superstições e preconceitos. Preferências e repugnâncias. Silêncios, ausências e distâncias. Uma ordem

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simbólica . Burgo de 296 anos, a capital do Paraná tem e mostra uma linguagem própria, estabilizada, em todos os aspectos : nossa singularidade, intransferível. Aqui, uma viagem de leve, em asas de andorinha, pelas várias linguagens desta cidade de nome tupi, ouro de ipê pelo chão, onde se diz "leite quente", não "leitchi quentchi ". Vamos lá, antes que o leite esfrie. Hoje-nos, Curitiba, tu que, um dia, fostes a plácida Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, hoje, modern idade e modelo.

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Os parnanguaras, a boa gente da cidade mais antiga do Paraná, mãe de Curitiba, falam cantado, cantado como a fala bonita do povo de Florianópolis. Quem sabe é a música da fala dos Açores, açorianos são pioneiros na costa Su I do Brasil. Os baianos também falam cantando, um outro canto, porém . Menos agudv, mais mansu, mais mole que azeite de dendê. A gente do litoral, em geral, canta falando e fala cantando, ecos da onda do mar quebrando nos sons da nossa boca e da nossa garganta. No interior do Paraná, Ponta Grossa, Castro, Tibagi, o Grande Norte, Londrina, Apucarana, Ma ringá, outros lugares de nós mesmos, ainda se ouve aquele erre enrolado, o erre gostoso como ovo caipira que se ouve no interior de S. Paulo. Aliás, já está na hora de acabar com os preconceitos de linguagem. Só um gesto político de imperialismo político decide que um certo jeito de dizer o erre é arcaico, rural, ridículo, enquanto outro erre é elegante e portador de "status". Podemos ter os pensamentos mais sutis e as idéias mais iluminadoras falando à moda caipira . Curitiba, cruzamento de muitas etnias, européias e asiáticas, 6

além do aporte constante de brasileiros de todos os quadrantes, é o lugar democrático para reconhecer a grandeza e a beleza de todos os jeitos de falar, a dignidade das diferenças : qualquer maneira de dizer vale a pena. Mas não se pense que curitibano fala como todo mundo. Curitibano fala diferente . Uma mús ica diferente, outra harmonia, um modo outro de dizer e falar. Não me refiro ao vocabulário. O e lenco de palavras curitibanas coincide, raras singularidades, com o vocabulário brasileiro ma is geral. Cidade sobretudo administrativa e cultural, Cur itiba, toda no setor terciá rio, não tinha como cu ltivar as r icas diferenças da fala rural, altament e diferenciadas por região. O universo de Curitiba é urbano. Mas a nossa fala guarda muito do passado tropeiro, quando Cu ritiba era um entreposto entre as tropas que vin!··!am de Viamão, no Rio Grande, com destino à grande feira em Sorocaba, São Paulo. Mas é um produto próprio. O jeito de falar curitibano não se confunde com o jeito espalhafatoso e soberbo da fala gaúcha (embora haja coincidências no jeito de dizer certos sons: Rio Grande, não Riu Grandji) . Nem praticamos o erre enrolado próprio do paulista do interior.

Ed . Leite Qu ente. Curitiba 1 (1) Mar. 1989

Curitibano fala di feren te. Uma música d iferente.. .


"Conservamos um modo de falar "sui generis", calmo, escandido e correto que nos foi legado pelos nossos avós de mui tas gerações'', no dizer de um sábio local. A fala curitibana é desornada de aparatos musicais berrantes, é seca e· concisa, como o conjunto de pertences de um tropeiro, como a araucária imóvel ao vento como o gosto do pinhão, nossa fruta totêmica. Numa mesa de amigos, impossível confundir a fala de um parnanguara ou de um londrinense com a fala de um curitibano . Mas a linguagem não é só palavras. É também o jeito corporal de dizê-las, o estoque de gestos . O curitibano não é abundante em gestos. E nossa fala raramente transforma-se em grito . Uma certa sobriedade exata nos caracter iza . Mais do que a uma intenção de produzir prazeres musicais '(baianos e cariocas) ou a uma intenção teatral (gaúchos), a fala curitibana visa a eficiência, asceticamente desnuda, herança de t ropeiros e imigrantes, gente voltada para os afazeres simples e regida pela mística do trabalho. Curitiba não fala bonito . Fala exato. I

Mas a linguagem

não é só palavras.

Ed. Leite Quente . Cu ritiba 1 (1) Mar. 1989

Ou como diz o orgulho local da cidade que teve a primeira Universidade do país : a gente fala como se escreve. Isso se deve, em parte, talvez ao fato de que, realmente, boa parte da massa imigrante aprendeu português em livros, mais lendo do que escutando. A presença de várias etnias na formação da cidade dá um certo polilingüismo a Curitiba, que já começa pelos sobrenomes estrangeiros. Há palavras, expressões e saudações em várias Iínguas entend idas em amplos círculos . Palavras em alemão: alies blau, aufwiedersehn, prost. Em italiano : tutti buona gente, arriveder:ci, buona sera. Em polonês : doi"ra noch, panhe, pirogue, pim na zdrowy. Em hebraico, em árabe : shalom, saiam aleikum. Em japonês : arigatô. Restaurantes de várias etnias trazem cardápio na Iíngua original. E acaba de n3 sc~r u!"!'! ha r da noite com cardápio em latim. Onde dá para "bitrucar" em paz (o verbo é um curitibanismo de origem alemã, de "betrunken", particlpio passado do verbo "trinken", " beber") .

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Vestir é dizer. A ·que classe çou a mudar. Mas os primeiros pertencemos. Qual é nossa idade. que se atreveram a usar blusão verQue tipo de vida desejamos. A ves- melho pagaram a ousadia com timenta é uma palavra dita com o olhares de esguelha e sorrisinhos zombeteiros dos transeuntes. corpo todo. É célebre a preferência pelos Hoje, já há muito mais cores tons cinza, marrom ou azul-escuro na vestimenta do curitibano. E as na roupa do curitibano, avesso a curitibanas já usam modelos mais escândalos e exageros. Chamar a ousados, blusas transparentes, geatenção pela bizarria da roupa pa- nerosos decotes e joelhos à mosreceria a um curitibano t/pico um tra, sem correrem sérios riscos na truque fácil, um lance muito ele- sua reputação. Costuma-se atribuir a linguamentar. Ainda se ouve em Curitiba, gem curitibana do vestuário ao em certas rodas, a piadinha que frio e aos invernos rigorosos. Mas castiga uma camisa masculina mais a verdade é que, por algum fe· nômeno climatérico, os invernos atrevida ou mais colorida: - Onde você comprou essa de Curitiba andam muito mais amecamisa tem também camisa pra nos, de anos para cá. Os mais velhos asseguram que aqui não faz homem? Cores de homem, cores de mais frio, como antigamente. mulher, a roupa serve sobretudo Curitiba, a única capital do Bra· para marcar com máxima clareza si/ onde neva, raro, mas neva. No calçado, o curitibano aina diferença de papéis entre hoda é muito conservador, sapatos mem e mulher. Em Curitiba, mesmo a comu- de couro, preto ou marrom. Sannidade ngay" (sobretudo ela!) ves- dálias, só nos fins de semana, na te-se, com masculina sobriedade, churrascada na chácara do comnos tons bege, marrom ou cinza padre ou na praia. de praxe. Vamos ver os curitibanos e Nos anos 60, com a libertação sua linguagem vestida, ao longo dos costumes, a contracultura, o das décadas deste século. rock-and-ro/1, o panorama comeO desfile vai começar.

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Ed. Leite Quente. Curitiba 1 (1) Mar.1989

A vestimenta é uma palavra dita com o corpo todo


Bons tempos aqueles quando não havia "punks", "darks" nem "skin-heads". Em compensação, proliferavam almofadinhas, "dandies" e poetas simbolistas. Escolham à vontade. (Curitiba: 50.000 habitantes)

1900

1920 Vovó Amélia chega mais perto para ver o que é que a flor do vovô Ernesto tem que as outras flores não têm. Casamento na certa. Ousad lssima, vovó Amélia usa a saia quase à altura do jelho. O friso da calça de vovô, impecável (Curitiba: 79.000 habitantes)

Ed. Leite Quente. Curitiba 1 (1) Mar. 1989

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COM QUE ROUPA , NOS VAMOS 1930 Depois do piquenique/pescaria/ cervejada, o clã se reúne para o "flash" que os levará até a posteridade. A gravata borboleta já dá lugar à gravata comprida de hoje. O chapéu das tias Eudóxia, Arminda e Etelvina dá o toque de ousadia. Na cabeça dos homens, os chapéus já começam a perder a hegemonia para os bonés.

(Curitiba: 100.000 habitantes)

1940 A família reunida capricha para o fotógrafo. Tio Gustavo, lá no fundo, arrisca um topete, ele que sempre foi o mais atrevido da família. (Curitiba: 150.000 habitantes)

1950 Acabou a guerra, todo m"undo já se veste que ne111 americano. O bigodinho do primo Inácio é uma homenagem a Clark Gable. Tio Antero olha para o futuro, preocupado com o rumo que as coisas estão tomando. Tia Lúcia aguarda os acontecimentos. (Curitiba: 180.000 habitantes)

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Ed . Leite Quente. Curitiba 1 (1) Mar. 1989


COM QUE ROUPA NÓS·V1\MOS

1960 Enfim, os anos 60 chegaram. Cabelos compridos, camisas descontraidas, a barba por fazer, os rapazes mais ecidos com as moças. A Vânia está meio pensativa, mas o Fábio quer uma resposta para ainda hoje. (Curitiba: 357.000 habitantes)

1980

O grande consumo chegou. A moda internacional. A cultura do corpo. Família i uma boa. Os pés em liberdade, com sandálias ou tênis. E óculos escuros para ver o mundo da cor que a gente quiser. (Curitiba: 1.200.000 habitantes)


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Gerações de curitibanos cresceram sob a sombra dessa frase que. dirige nosso recato, nosso excesso de discrição, nossa aversão natural a transbordamentos desnecessários. Discreto, comedido de gestos e efusões, observador atento do seu interlocutor, o cur itibano médio passa por f, ;u. O afeto de um curitibano não é mercadoria de pronta entrega. Mas é um fato atestado por gente de todos os lugares que, uma vez conquistada, a amizade de um cidadão da Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais é coisa sólida, de ped ra e cal. Nosso comportamento coti diano constitui uma verdadeira linguagem, gestos, modo de ouvi r e falar, volume de voz, grau de aproximações e distâncias, velocidades de relacionamento e temperatura de manifestações de apreço e estima. Todos os povos têm um estilo de se relacionar, e isso obedece a um código, tácito, impl ícito, mas claro, para quem está por dentro do código. O curitibano médio não pratica o relacionamento instantâneo dos litorâneos, de pronta chegada, rápida abordagem e intimidades súbitas. O jeitão "tudo-bem" de cariocas e baianos, por exemplo . Nem é nossa a empáfia gaúcha de 12

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quem chega dizendo: "no más, e me espalho, nos baizinhos, dou de prancha, nos grandes, dou de talho" . O curitibano é cauteloso, meio arisco. Mas não tímido: analítico. Muita coisa do nosso modo de ser, nossa linguagem global, pode ser explicada pela distância do ma r e pela ausência de pra ia, t ransformando o corpo em mistério, a nudez em rito secreto, sempre uma roupa entre a minha pele e o outro. Explica muito nosso modo de ser a multiplicidade de etnias e raças que compuseram a cidade, a desconfiança em relação ao estranho, a incompreensão da Iíngua e das linguagens do outro. Aqui, é um lugar onde foram (e são) vizinhos sírios e italianos, polacos e alemães, judeus e portugueses da velha estirpe. O curitibano típico é o produto final de uma série de incompreensões e suspeitas, desconfianças e preconceitos raciais. "Polaco é preto do avesso" , "todo alemão é nazista", "italiano, a gente joga na pa rede, se grudar, vai ser cantor, se cair, vai ser ladrão" , há todo um vasto anedotário dos preconceitos raciais que, às vezes, ainda, vêm à tona. Nesta altura do campeonato, porém, a intensidade da miscigenação tende,

Ed . Leite Quente. Curitiba 1 (1) Mar. 1989

Discreto, comedido de gestos e efusões...

... o curitibano médio passa por frio.


cada vez mais, a diluir esses preconceitos que a nova geração já não herda. Mas, quem sabe,. o grande explicador do nosso modo de ser seja a mística imigrante do trabalho. Nas áreas mais ao norte do país, por causa da presença mu 1ti-secu lar da escravidão, o trabalho dcgrJda. No su I, no Paraná e em Curitiba, especialmente, há um verdadeiro culto do trabalho, em detrimento dos aspectos mais lúdicos da vida. "Aqui se trabalha" já foi o "slogan" de um dos governos do Paraná. Freqüentes as decalcomanias em automóveis pregando: "só pelo trabalho se atinge a felicidade", "não me inveje, trabalhe como eu". Com a mística do trabalho, vinda do imigrante, mão-de-obra, veio o culto da economia. O imigrante poupa. E se poupa. Guardar todo dia um pouco para ter alguma coisa no dia da necessidade, é a fi toso fia de gente que veio de mui to longe só tendo como seu a força e a determinação de trabalhar, a coesão familiar e clânica ligada, no fundo, ao trabalho, agrícola, fabril ou comercial. Essa mística produz abundância de bens e solidez econômica. Por outro lado, tira muito do lado erótico e lúdico, brincalhão e leve, que a vida deve ter. Diminui a dimensão do gratuito, do jogo, do "irresponsável". Su I, Paraná e Curitiba não são compreensíveis sem uma noção

bem clara do que significa a m ística imigrante do trabalho. Novos tempos, a TV, a pos-. sibilidade de viajar, é claro que diminuem esse rigor. Mas o caráter da cidade já foi dado para sempre. Um sempre que muda a cada dia, a cada novo recém-chegado, a cada curitibano que volta. Como todas as linguagens, nosso modo de ser está em constante ebulição.

Ed. Leite Quente . Curitiba 1 (1) Mar. 1989

O curitibano é cauteloso, meio arisco. Mas não timido: anal rtico.

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Ontem, tinha espetáculo? TiNo setor, uma menção obr iganha, sim, senhor. tó ria ao Padre José Penalva, comGraças à presença de imigran- positor e promotor incansável da tes europeus (alemães e polone- nobre arte. ses, sobretudo), desde finais do séA saudade vai para o mestre culo passado, Curitiba sempre cul- Bento Mussurunga, compositor e tivou com muito carinho a música mentor de várias gerações · de múerudita. sicos cur itibanos. A Escola de BePianos e pianistas, instrumen- las Artes inclui um curso de mútos e instrumentistas, nunca falta- sica muito concorrido. ram na cidade que encenou, na A Orquestra Sinfônica mandécada de 10, uma ópera inteira- tém uma programação constante mente feita aqui, lib reto e música. onde a única coisa a lamenta r é a Essa tradição nunca se per- pouca presença de música do sédeu. Hoje~ Curitiba, além de uma culo XX. É uma orquestra voltada Orquestra Sinfônica altamente para a execução da grande música profissional, abriga grupos como a do século X IX. Mas, enfim, músiCamerata Antiqua, dedicados à ca não tem idade ... prática da mais pura de todas as No t erreno da mús ica popuartes. lar, as coisas são mais complicaNa área criativa da composi- das. ção de música erudita, o destaque Cidade basicamente de classe vai para o cu ritibano Henrique méd ia, a Curitiba lhe falta o húMorozowicz. Filho de um desta- mus da criatividade popula r, único cado bailarino da Ópera de Var- lugar donde pode nascer uma forsóvia, que trocou a Polônia nata I te música popular. A quase nula por Curitiba, Henrique De Curiti- p resença do elemento negro deve ba Morozowicz, como se assina, é ser lembrada: em toda a América, irmão de Norton Morozowicz, a riqueza da criatividade musical flautista respeitado e regente. A popular coincide com a presença obra de Henrique é ampla, abran- negra (R io, Bahia, Jamaica, Carigendo mumeros gêneros, com be, Sul dos USA). Curitiba e o interior mais anmuita criatividade (suítes, prelúdios, sonatas, concertos) . Várias tigo (Castro, Tibagi) apresentaobras de Henrique foram executa- vam, no século passado, uma fordas a primeira vez nos Estados te concentração de afr icanos e Unidos, onde completou seus es- seus descendentes. A documentação atesta a tudos iniciados em Curitiba. 14

Ed . Leit e Quente . Curit i ba 1 (1) Mar. 1989

Ontem tinha espetáculo?


existência de- quilombos nos arredores de Curitiba, em meados do século passado. Mas com a proibição do tráfico de escravos pela Inglaterra, a mão-de-obra escrava ficou muito mais difícil. Grandes contingentes de escravos paranaenses foram vendidos para as lavouras de café de S. Paulo. O Paraná branqueou. Rosy Greca saiu com um belo LP, "Vitrais", sensibilidade à flor da pele. Celso Loch, José Oliva, Hilton Barcellos, vida criativa na música local. Na novíssima geração, Grafite (filho de Lápis) e Pimenta, jovens profissionais que atuam na noite curitibana, nos bares de som ao vivo que se multiplicaram nestes últimos anos (a noite curitibana, hoje, oferece muitas opções) . Imperativo reconhecer a força criativa de um rock-curitibano, que começou nos anos 70 com o conjunto "A Chave" e continuou depois com "Blindagem", em ambas o talento do guitarrista Pau linho e de Ivo Júnior, cantor e compositor, a voz masculina mais ~onita de Curitiba. Da geração mais recente, as bandas "Beijo à Força", "ldolos do Matinê", "Tessália" ... Ligados ao "Beijo ·à Força", o grupo de poetas e letristas composto por Tadeu Wojcechowsky, Marcos Pra-

do, Del Grossi, que trabalham em equipe e criam coletivamente. Paulo Leminski tem 24 músicas, suas ou com parceiros, gravadas por Caetano Veloso ("Verdura"), Moraes Moreira, Guilherme Arantes, Ângela Maria, ' Pau linho Boca de Cantor, A Cor do Som, MPB-4, Ney Matogrosso, Itamar Assunção, Arnaldo Antunes dos Titãs e grupo Clínica. A distância das gravadoras e do aparato promocional das TVs nacionais dificulta a continuidade do trabalho dos músicos curitibanos, apesar do bom número de teatros e bares de música ao vivo. Dentre as salas de teatro, avulta o gigantesco Teatro Guaíra, o maior da América Latina, abrigando uma escola de teatro e uma equipe de Ballet, conhecida nacionalmente. Em matéria de cinema, Curitiba já tem uma história, começando com os pioneiros Requião e Groff, dos anos 20, continuando depois com a obra de Sílvio Bac.k, Frederico Fullgraf, Berenice Mendes e Sérgio Bianchi, indo desde documentários a longas-metragens, com premiações nacionais e inter nacionais. O movimento cineclubista dos anos 60 foi importante no despertar de uma consciência cinematográfica, com a criação da Cinemateca do Museu Guido Viaro, em 1975, uma das três cinema-

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tecas bras ilei ras. Uma nova geração de curtametragistas e documentaristas já anda exibindo talento por aqui. Em artes plásticas e gráficas, com longa tradição em Curitiba, vários nomes são conhecidos nacionalmente. No cruzamento dessas manifestações todas, viva, a nossa linguagem, nosso jeito superior de ser. Mais recentemente, tem crescido a presença negra, vinda de todos os Estados, na periferia da cidade. Mas são pessoas e famílias ainda isoladas, sem gestos coletivos de resistência cultura I e criação (escolas de samba, afoxés, núcleos de candomblé, blocos carnavalescos). Há escolas de samba na cidade, rivais no carnaval (Não Agite, Mocidade Azul, O. Pedro 11). Apesar dos esforços oficiais, o verdadeiro carnaval, o de rua, não empolga o curitibano, que prefere pu lar nos seus clubes e salões. Nas venerandas Actas de Vereança da Vila de Curitiba, lê-se que, em 1837, o Procurador da Câmara foi denunciado por ter dado em sua olaria batuques sem licença prévia. Nesse mesmo ano fatídico, encontramos a proibição de fandangos dentro da povoação de Curitiba. Essa lei, provavelmente, matou nosso carnaval, na casca ... Mesmo assim, não faltam 16

bons compositores e letristas. No princípio, era a dupla Belarmino e Gabriela. O casal é o mais puro produto da música cai pira do Paraná e de Curitiba. Durante décadas, Belarmino e Gabriela encantaram o lado rural da cidade, compondo, se apresentando em shows de circo, rádio e, por fim, TV. O grande clássico da dupla "As Mocinhas da Cidade", conhecida por todos os curitibanos, é a música tocada por um sanfoneiro no final do fi lme "O Beijo da Mulher Aranha", de Hector Babenco, que concorreu ao Oscar. Música caipira curitibana, em Ho ll ywood ... Muita luz também merece a obra do compositor e violonista Lápis (Palminor Rodrigues Ferreira), falecido em 78. Com o natural talento negro para a música, Lápis, em poucos anos, produziu um rosário de canções, sozinho ou com parceiros. Sua presença boêmia pelos bares da cidade, vio lão debaixo do braço, a inda é mui to lembrada, junto com músicas como " Vestido Branco" e seu a lto momento, "Onde Ela Mora" . Belarmino e Gabriela deixaram vários LPs (criaram um selo loca I para gravar música sertaneja). Lápis teve algumas canções gravadas no Rio. A obra de Belarmino e Gabriela e, mais recente, de Lápis

Ed. Leite Quente. Curitiba 1 (1) M ar. 1989


não tiveram continuidade. Com a chegada da civilização de consumo, capitaneada pela TV e a explosão da música "pop" estrangeira e brasileira, via disco, fita e rádio, alteraram um futuro possível. A música que se faz em Curitiba acabou, musical e poeticamente, mais ligada à música de consumo do que a uma tradição popular que ma I chegamos a ter.

Boa música e boa poesia fazem pessoas como Pau lo V ítola, com LPs gravados em Curitiba, com toda a qualidade técnica. V ítola é responsável por vários musicais e mantém uma producão . constante, sempre inquieto e criativo. Vítola, parceiro de Lápis em inúmeros momentos memoráveis, tem uma produção importante com Marinho Gallera, músico de altos dotes.

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,/ Henrique "de Curitiba" Morozowicz, ecos eslavos e novos sons nos espaços sem fim da grande música.

Os lendários Belarmino e Gabriela. De pé, Leminski, Vftola, Marinho Galera e Ivan, filho do casal. Duas gerações de música curitibana. i: a última foto de Belarmino. 17 Ed. Leite Quente . Curitiba 1 (1) Mar. 1989


Ivo JĂşnior, uma voz excepcional no rock curitibano, a chama da "Chave" e do "Blindagem".

Palminor Rodrigues Ferreira, o LĂĄpis, afro-ritmos na noite curitibana.

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Ed. Leite Quente. Curitiba 1 (1) Mar. 1989


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I

De todos os tipos de edift'cios, só um me interessa, a rut'na. É a rut'na que dá sentido à cidade. Mateus Leme, esquina com Muricy. Ora, direis ler cidades, certo perdestes o senso. Visconde de Guarapuava com Pedro Ivo. A Marechal dá mão para a esquerda? Esquerda de quem vem ou de quem vai? Vai para a Praça Osório ou para o Alto da XV? Uma cidade se lê com o corpo. Atrás da Igreja do Cabral. Uma cidade não se lê com os olhos. Duas quadras acima da Praça Zacarias. Uma cidade não se lê com o corpo. Uma cidade se lê com a vida. A viria sabe ler? No cruzamento da Kennedy com a Vicente Machado. Detesto cidades fáceis de ler. Só amo cidades que já sei de cor. João Gualberto, no prolongamento da Coronel Dulcídio, por favor. Só sei uma cidade de cor. Minha vida sabe de cor uma cidade. Cada rua, cada rut'na. Uma rua, ruina de milhões de passos e pegadas, de encontros fortuitos. Melhor mudar de calçada. E de pontuais desencontros. Uma transversal da como é mesmo o nome daquela que passa atrás do campo do Atlético? Rut'nas imateriais. Tem noites que sonho passar por lugares que não existem mais. Do lado do Colégio Santa Maria, onde hoje é um banco, em meados dos anos 60, havia uma gráfica. Ainda ouço as máquinas. Ruinas de sons, rut'nas de lembrança. Era ali que a gente se reunia para discutir os filmes do momento. Não admito viver numa cidade artificial. Todas as cidades que nasceram na maquete do arquiteto e do engenheiro são fascistas. Uma cidade tem que nascer sozinha, em espontâneo brotar. Não se pode dizer, eu quero uma árvore ali, me tire essa praça daqui. Eu quero aquela aldeia que mora em Nova Iorque. Eu leio através das rut'nas. A rut'na é clara, limpa lente de microscópio. Já tirei para dançar todas as ru(nas de Curitiba. As mocinhas da cidade são bonita, e dançam bem. Bonita. Não bonitas. Eu quero o erro. Erro é que nem mãe. Sem mãe, não vai. Sem erro, não dá pra continuar vivendo. Me deix e na esquina da General Carneiro com a Pedro Ivo. O quê? Essa esquina não existe? lmposst'vel. Ainda ontem havia uma esquina ali. Tiraram? Tudo bem. Toca pro Centro. Não, Centro Ct'vico, não. Centro da cidade, qualquer lugar. lpiranga, Avenida S. João. O quê? Aqui não tem Avenida lpiranga? Meu Deus, toca pro aeroporto depressa, que eu tenho que pegar o trem das onze com destino a Miami, Dal/as, S. Francisco, Osaka. Tenho que estar na Água Verde, ao meio-dia de amanhã. Uma cidade se lê com tudo. Uma cidade se lê em todas as direções. Uma vida é muito curta

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"Não admito v1ver numa cidade artificial"

Ed. Leite Ou ente. Curitiba 1 ( 1) Mar. 1989

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para que se saiba de cor mais de uma cidade. Urbanogramas, uma urbano gramática: as cidades egipcias estavam escritas em hieroglifos, as cidades babilônicas em cuneiforme, as cidades chinesas em ideogramas, mas nossas cidades são escritas em alfabeto? Por que é que a maioria das mulheres é tão ruim no volante? O trânsito é uma gramática, uma sintaxe dos fluxos. O uso do mecanismo da cidade nos torna conformistas. Mesmo que seja para fugir da cidade, você tem querespeitar os sinais. O risco real e permanente de ser atropelado transforma a cidade num show continuo de emoções fundamentais, indispensáveis ao macaco caçador que o homem foi durante milênios? O campo, a aldeia, é o chiqueiro, o curral, o aprisco. Só na cidade você pode morrer a qualquer momento. Não há sinônimo para cidade. Cidade não tem substituto nem alternativa. A cidade é o colo de mamãe, o leite do peito, o cheiro da velha. Uma paralela entre a João Negrão e a Lamenha Lins. A cidade é o mercado, a supercidade, o supermercado. Um ABC, onde cada letra pode significar, ao mesmo tempo ABCDEFGH/JLMNOPORSTUVXZ. Viva o K. Viva o Y. Viva o W. Curitiba : uma cidade que nunca pára de se fazer, feita pela gente e fazendo a gente.

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Curitiba é uma das melhores cidades do mundo, diz arquiteto Ao lado de Roma , na Itália, e São Fra ncisco, nos Estados U nidos, Curitiba é uma das três melhores cidades do mundo. A opinião é do arquiteto e professo r Alan Jacobs , da U niversidade de Berkeley. Jacobs está participa ndo em Porto Alegre de um congresso internaciona l de urban ismo . Para ele, "o mais importante e m pl anejamento urbano é co nst ruir uma cidade agradável de se viver'' .

(jo rnal "O Es tad o do Paraná", 5/3/89)


prefeitura municipal de curitiba secretaria municipal da cultura fundação cultural de curi tiba


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