Ebook Fórum de Advocacy e Impacto 2021

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Direção e Coordenação Cintia Mafei Daniela Castro Deise Nicoletto João Marcelo Borges Luiz Bonvini Vinicius Sousa Conteúdo Textual Hanna Guimarães Diagramação Juliana Simões Apoio de Comunicação Carolina Mendes Guilherme Kamio Juliana Simões Lillian Vidigal

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Introdução Primeiro Dia Sociedade civil: será que estamos provocando mudanças?

Como implementar um pacto setorial: case Pacto pelo Esporte Coalizões e acordos privados: como mantê-los ativos e efetivos?

Litigância estratégica na efetivação de direitos e políticas Segundo Dia Como influenciar o executivo?

Implementação de políticas públicas e Delivery Unit​s Advocacy na Cultura: case Americans for the Arts ​ Comunicação e Advocacy: envolvimento, engajamento e mobilização Da responsabilidade social ao impacto social: advocacy por um novo capitalismo

UMÁRIO

06 10 11

SUMÁRIO

Terceiro Dia Influencia e articulação: negócios de impacto na agenda governamental A agenda de impacto na realidade local Mulheres na liderança de mudanças estruturais Encerramento

70 71 76 82 86

Advocare (v.latin): chamar, convocar

07 Quando a gente para e pensa sobre os grandes problemas do mundo, tendemos a nos sentirmos incapazes de fazer algo em escala suficiente para ocasionar mudanças significativas. Mas a verdade é que os problemas socioambientais, econômicos e políticos que mais afetam a humanidade têm solução. Basta a gente se organizar como sociedade e criar estratégias de longo prazo.

E é aí que entra o Advocacy.

Um país desenvolvido e mais justo precisa de uma sociedade atuante, e que influencie as decisões que afetam a todos. As decisões políticas são tomadas todos os dias, com ou sem a nossa participação, mas para que elas sejam realmente representativas, é preciso se fazer presente e encontrar formas de provocar as mudanças que queremos ver na política, na infraestrutura e nos sistemas.

Diferente de uma ação social direta, mais emergencial, pontual e limitada; o Advocacy faz uso de estratégias que atuam nas causas raízes dos problemas, trazendo impacto com escala. As ações vão desde campanhas de comunicação, acordos entre empresas, coalizões e lobby, até o desenvolvimento de pesquisas e ferramentas sociais para auxiliar atividades governamentais.

Contudo, o sucesso desse tipo de movimentação social exige uma mobilização de atores, tanto públicos quanto privados, em larga escala. Quanto mais pessoas envolvidas, de múltiplos pontos de vista, com diferentes posicionamentos e colaborando para um fim comum, maior e mais rápido é o impacto. Nesse sentido, o Fórum de Advocacy e Impacto surge com o objetivo de difundir esse tema tão importante e fomentar o desenvolvimento de um ecossistema social cada vez mais ativo.

O Impact Hub Brasília e a Impacta Advocacy se juntaram para construir uma programação de mesas e debates sobre variados temas de importância e urgência para a melhoria do país, abordando suas causas raízes, iniciativas nacionais e internacionais, Fórum de Advocacy e Impacto | Introdução

08 ações de advocacy e negócios de impacto. Para isso, reuniram lideranças da sociedade civil e do setor privado, ativistas, investidores sociais, pesquisadores e personalidades de destaque nacional e internacional.

Durante três dias de evento, de 19 a 21 de outubro de 2021, transmitido ao vivo através de plataformas digitais, foram detalhadas estratégias de atuação em advocacy, experiências bem-sucedidas, metodologias, formatos de planejamento, exemplos de acordos e coalizões, litigância estratégica, influência em políticas públicas e a comunicação de causas. Além disso, foram debatidos os desafios para negócios de impacto, assim como os papeis do governo e da sociedade civil.

Como resultado final, este relatório tem por principal objetivo registrar e tornar acessível essa experiência de sucesso, transformando o Fórum de Advocacy e Impacto numa referência para todos que querem efetivamente participar de uma agenda positiva, que trata de problemas complexos, mas que têm solução.

Fórum de Advocacy e Impacto | Introdução

09 Sobre a Impacta Advocacy A Impacta Advocacy é um negócio social que desenvolve e atua em projetos de alto impacto e escala, contribuindo para a solução de problemas socioambientais e econômicos. A Impacta deseja contribuir com relações sociais mais justas por meio do Advocacy, que é um conjunto de estratégias para realizar mudanças políticas, comportamentais ou sistêmicas.

Sobre o Impact Hub Brasília O Impact Hub Brasília faz parte de uma rede global de espaços colaborativos, comunidades empreendedoras e programas que inspiram, conectam e escalam negócios de impacto. Conecta pessoas, marcas e empresas a causas de impacto que ajudam a transformar o Brasil e o mundo através de metodologias de inovação e desenvolvimento de negócios. Os espaços inovadores dos Impact Hubs dão suporte aos programas, ao ecossistema de impacto e geram conexões entre as pessoas, iniciativas e projetos.

11 SOCIEDADE CIVIL: SERÁ QUE ESTAMOS PROVOCANDO MUDANÇAS? O primeiro painel do eixo Impacta Mundo trouxe uma reflexão sobre a atual participação da sociedade civil na solução dos principais problemas do país: estamos realmente exercendo nosso papel enquanto cidadãos?

Segundo Oded Grajew, conselheiro e fundador da Rede Nova São Paulo e do programa Cidades Sustentáveis, eles chegaram ao consenso de que para qualquer coletivo dar certo, é fundamental atuar e buscar combater as injustiças e desigualdades.

“O que causa a desarmonia é a desigualdade, a injustiça e o conflito. Logo, precisamos de uma sociedade menos desigual e mais equitativa”, conta. “O Brasil é uma das maiores economias e, ainda assim, o segundo país mais desigual do mundo, perdendo apenas para o Catar. O nosso papel como sociedade civil é melhorar. Nós sabemos o que temos que fazer para dar certo e temos os recursos para isso. O que falta é a gente tomar essa escolha e se conscientizar de que sem reduzir a desigualdade, qualquer expectativa de um país melhor é sonho de uma noite de verão”, completa.

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MPACTA MUNDO

Temos muito a aprender com relação a mudanças que afetaram a história da humanidade. Há diversos exemplos de mudanças positivas e experiências de países que deram certo, ou seja, aqueles que possuem excelentes indicadores ambientais, sociais e econômicos hoje em dia, eram os mais pobres da Europa até o final do século passado. E como eles conseguiram atingir a superação? Segundo Daniela Castro, diretoria executiva da Impacta Advocacy e moderadora do painel, houve uma atuação da sociedade civil organizada em prol dessas mudanças. “Decisões políticas são tomadas todos os dias, com ou sem a participação da sociedade civil, mas é apenas com uma atuação mais robusta e organizada que é possível modificar indicadores.”

12 Oded explica que a única forma de ocasionar mudanças é se envolver ativamente na política. É por meio dela que se determina o destino do país, as políticas públicas, o direcionamento de recursos, quais serão os atores e movimentos beneficiados, quais setores serão priorizados, enfim, “é lá que se decidem as coisas e é nas escolhas que a gente tem a oportunidade de mudar a vida das pessoas na prática”, conclui. “Eu elenco o papel da sociedade civil em três coisas. Primeiro, escolhas: o que a gente vai escolher como país, como representantes, como política pública. Depois, usar a força da sociedade civil para pautar políticas públicas. E, por fim, pressionar para que essas pautas e essas escolhas realmente sejam implementadas.”

Cumprir com essas demandas exige a conciliação de ações de curto e longo prazo de impacto, buscando agir no agora para conseguir mudar o futuro. Em um plano mais imediato, Grajew acredita que é primordial que as pessoas se envolvam com as eleições do próximo ano e busquem escolher cuidadosamente seus candidatos à presidência, Congresso Nacional, governos estaduais e prefeituras municipais. “É fundamental que cada indivíduo, liderança, organização e coletivo pense sobre como se envolver para que o resultado das urnas reproduza pessoas que vão cumprir com o que queremos para o país”, explica.

Por outro lado, é preciso gerar exemplo para os representantes escolhidos, através do próprio comportamento e da participação em determinados projetos de impacto, fazendo com que eles ganhem escala e inspirem políticas públicas. Nesse sentido, Atila Roque, historiador, cientista político e diretor da Fundação Ford no Brasil, aponta a necessidade de qualificar minimamente de qual sociedade civil estamos falando: “pessoas comprometidas com o bem comum, que orientam suas ações para a defesa e proteção de interesses coletivos. Que são capazes, através da ética de trabalho e através da postura na sociedade, de colocar ou de criar os instrumentos que permitam e que coloquem os objetivos coletivos acima dos objetivos privados”, específica.

Estabelecido o conceito, Roque define duas coisas fundamentais para a discussão das agendas públicas de igualdade, democraFórum de Advocacy e Impacto | Primeiro Dia

13 cia e sustentabilidade. A primeira é a necessidade de trabalhar a transparência e qualidade de informações, para garantir que sejam tomadas boas decisões, com base na realidade. A segunda é a importância de fomentar o debate público sobre as pautas de interesse, a partir de eventos, conferências e campanhas. Em seguida, ele levanta a necessidade de identificar os atores sociais que possuem, historicamente, um papel central nessas lutas e que, pelos seus aspectos radicais, formam a linha de frente da inovação social. Ele cita como exemplo as organizações indígenas, o movimento negro, o movimento feminista, o movimento LGBTQIA+ e o movimento da juventude de periferia de favelas.

“A cooperação, a busca por pares, é absolutamente fundamental para se pensar em escala. E é importante ressaltar que os pares não são nossos iguais, são justamente aqueles que pensam de forma diferente. E talvez, nosso maior desafio seja achar esses desiguais, aqueles que se localizam nas pontas, nos territórios, os protagonistas das nossas lutas, porque sem eles, não vamos chegar a lugar nenhum.” Atila Roque Questões de tamanha complexidade, contudo, exigem flexibilidade e capacidade de ajustar caminhos. Ou seja, é preciso ter disposição para a experimentação, para a escuta, para o risco e para o erro; sobretudo, dialogar para conseguir trabalhar uma maior variedade de indicadores de impacto. “A gente tende a avaliar as coisas apenas de um ponto de vista, excluindo a complexidade dos processos, quando a melhor forma de administrar essa desigualdade é a partir da construção de relações de confiança entre os atores que operam no território”, declara o historiador.

Uma vez que os pares são identificados, é preciso educá-los com uma visão panorâmica do cenário em questão e estabelecer uma conexão de diálogo, na qual seja possível diferenciar as ações e ideias que de fato defendem o bem comum das que funcionam apenas para o benefício de alguns particulares, além de conseguir apresentar as vantagens de colaboração para cada uma das partes. “É uma questão difícil, solidária e permanente, mas a sociedade tem que aprender a fazer esse Advocacy, fazer política, porque isso impacta diretamente na vida da gente” destaca Mario Mantovani, Fórum de Advocacy e Impacto | Primeiro Dia

14 geógrafo, especialista em recur- mais acessíveis é essencial, a sos hídricos e ambientalistas e longo prazo, na atuação com as membro do SOS Mata Atlântica. camadas legislativas mais diretamente ligadas com o fazer das Segundo o ambientalista, tra- políticas públicas: “os agentes balhar as questões com os go- públicos que a gente mobiliza vernos subnacionais tem sido hoje nas frentes estaduais, como uma experiência interessante. prefeitos e vereadores, depois Em alguns casos, por exemplo, se tornam nossos parceiros no o Governo Federal manda derru- Senado Federal ”, acrescenta bar alguma medida e o estadual Mantovani. O judiciário também mantém, inclusive com muitas tem sido um aliado importante, instituições parceiras atuando e servindo como barreira de posdefendendo a causa. Além dis- síveis retrocessos causados por so, esse trabalho com as bases políticas de desmonte.

“Resumindo, o importante é estar sempre fazendo conexões novas. Descobrir possíveis parceiros e fazer esse balanço de como a vida deles é diretamente impactada e do que eles podem ganhar com isso. E se não conseguimos por aqui, tentamos outra porta.”

Mario Mantovani.

Mantovani Mario Mariana Almeida, superintendente da Fundação Tide Setubal e professora do programa avançado em gestão pública do Insper, afirma que para que a sociedade civil consiga fazer a diferença, é de extrema importância que ela seja capaz de reconhecer e entender como funciona a máquina pública, assim como o judiciário e a rede de organizações privadas, identificando papéis e espaços de atuação nos quais ela pode entrar. “É um mix de ousadia e humildade, para entender o

outro lado e saber que seu papel é empurrá-lo, mas que não é de qualquer forma”, descreve.

Uma das agendas que a Tide Setubal trata como prioridade é o direcionamento do investimento público, pois entende que a má distribuição de recursos é uma das principais causas da desigualdade. Mas como direcionar o dinheiro para onde mais precisa?

Bem, em parceria com a Rede Nossa São Paulo e com a presença de diversos funcionários e

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15 gestores da secretaria de fazenda e da prefeitura do município, foi iniciado o projeto (Re)age SP: Virando o Jogo das Desigualdades na Cidade, com o intuito de trazer uma visão mais holística e regionalizada para dentro da dinâmica pública.

Nesse sentido, foram criados indicadores de distribuição para os recursos públicos, para que eles sejam alocados nas regiões que mais precisam, com base em dados concretos, informações

detalhadas e números precisos.

A prefeitura acabou aplicando esse sistema no Plano Plurianual da Câmara, que vai viabilizar os recursos e investimentos dos próximos 4 anos. “Nada garante que ela vai receber, mas pelo menos agora está claro, na proposta de lei, que essa é a escala de recursos que deveria ir para cada um desses lugares, porque são os que mais precisam. Isso dá outra qualidade para o debate”, esclarece Mariana Almeida.

“A gente precisa assumir mais esse lugar de ir juntos para frente, mexendo nas regras do jogo, mexendo no governo, trocando, errando, mas seguindo apostando e acreditando que sim, é nossa responsabilidade fazer melhor e fazer diferente.”

Mariana Almeida Oded Grajew | Atila Roque | Mario Mantovani | Mariana Almeida

16 CHECKLIST: PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL Participar das decisões que acontecem diariamente na política; Escolher os representantes, pautar políticas públicas e pressionar a implementação; Colocar os objetivos coletivos acima dos objetivos privados; Gerar dados e informações de qualidade para pautar as discussões; Fomentar o debate público sobre os temas de interesse; Levantar atores e grupos sociais que são protagonistas históricos das lutas e formam as linhas de frente da inovação social; Entender como funciona a máquina pública, o sistema judiciário e a rede de organizações privadas; Identificar os pares, entender seus pontos de vista e construir argumentos específicos de colaboração.

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18 COMO IMPLEMENTAR UM PACTO SETORIAL: CASE PACTO PELO ESPORTE O segundo painel, no eixo Cases & Causas, analisou a iniciativa Pacto pelo Esporte, que uniu empresários e patrocinadores do setor para definir boas práticas de governança para o esporte brasileiro.

“Quando você fala de sistema, existem sistemas brilhantes no Brasil, como o Sistema Único de Saúde (SUS) e a Previdência Social. E no esporte, a gente tinha alguma regulamentação com a Lei Pelé (Lei 9.615 de 24 de março de 1998), mas não era um sistema que funcionava bem, ele não propiciava o acesso ao esporte”, explica Silvia Gonçalves, diretora de projetos na Impacta Advocacy e ex-coordenadora de advocacy na Atletas pelo Brasil. Segundo a advogada, o documento legal não especificava a responsabilidade de cada ente federativo, ou seja, não deixava claro quais eram as obrigações dos municípios, o que os estados deveriam prover e nem o papel da União; não abordava a origem do dinheiro investido no esporte e nem a atuação da sociedade civil.

“Acho que a importância da Atletas pelo Brasil como organização foi fazer um primeiro planejamento estruturado de advocacy e ollhar Fórum de Advocacy e Impacto | Primeiro Dia

ASES E CAUSAS

O problema de governança no esporte não é algo exclusivo do Brasil. No mundo inteiro, encontramos entidades esportivas que não possuem regras claras de atuação, um ambiente político confuso e desorganizado, e uma falta de padronização das práticas de governança. Esse cenário dificulta bastante a chegada de apoio empresarial, porque não traz a segurança necessária sobre aplicação de recursos e retorno de investimentos; e acaba por impactar diretamente os atletas, que estão na linha de frente dos campeonatos e competições, se dedicando nos treinos e, na maioria das vezes, sem o suporte mínimo necessário. Além disso, o esporte é patrimônio cultural de um país e tem impacto em áreas como saúde, educação, segurança e inspira valores únicos em uma sociedade.

19 para o que queria mudar no esporte brasileiro não só de alto rendimento, mas como a prática beneficia o cidadão, como um direito e ferramenta de desenvolvimento humano”, conta. Com o intuito de ampliar o acesso ao esporte no país, a instituição definiu três metas de impacto: esporte nas escolas; esporte fora das escolas, para todos e em qualquer idade; e um sistema esportivo transparente e eficiente. “A gente via que as crianças, muitas vezes, não tinham uma boa experiência na escola e isso afastava elas de praticar esportes para o resto da vida. Outro problema é que quando você cresce, não tem mais escola e não tem mais projeto social perto da sua casa, então como você mantém o acesso?”, aponta.

O primeiro passo para o cumprimento desse desafio foi a busca por informação: era preciso quantificar as metas e traçar marcadores específicos. “Quando você fala em melhorar o esporte, o que é melhorar? Como ele está hoje? A gente percebe que não está bom, mas o que é bom? O que é ruim? Quais são os indicadores?”, exemplifica Silvia Gonçalves. Em seguida, o plano de atuação se desenvolveu em duas frentes: mexer na Lei Pelé, para garantir um sistema esportivo possível de ser implementado; e atuar diretamente com os municípios. “Percebemos que a chave para melhorar o acesso estava na proximidade com a população, ou seja, a administração municipal. Só fazer programas federais te deixa muito longe do foco de impacto”, acrescenta.

Por um lado, a trajetória de ampliação de acesso ao esporte começou com a movimentação de projetos em parceria com as prefeituras das cidades que seriam sede da Copa de 2014. Por outro, a governança no setor teve seus primeiros sinais de vida com a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), que responsabiliza empresas pelos danos causados à administração pública, e não mais apenas os seus sócios de maneira individual, gerando multas por comportamentos indevidos; e o Artigo 18A da Lei Pelé (Incluído pela Lei nº 12.868, de 2013), que define uma série de pré-requisitos que as entidades do Sistema Nacional do Desporto deveriam cumprir pra receber recursos governamentais. Essa última medida se tornou um grande marco na história do esporte, pois incentivou um movimento espontâneo da classe empresarial do setor, a fim de construir um pacto social.

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20 O Pacto pelo Esporte, como foi chamado, é um acordo entre empresas no qual elas concordam em patrocinar apenas instituições que cumpram com requisitos mínimos de padrões de gestão e governança. “Foi um processo longo, mais de um ano e meio de reuniões e trabalho, as empresas se dedicaram muito para a montagem desse pacto e, hoje, a maioria dos recursos privados do esporte tá dentro dessa regra”, conta João Paulo Diniz, fundador da Componente e um dos criadores do Pacto pelo Esporte, acrescentando a importância desse passo para o setor como um todo: “a gente coloca o dinheiro no esporte com uma expectativa de que aquilo dê certo. Fazemos um planejamento, mas não existe garantia de que o recurso vai chegar no lugar certo ou de que vamos realmente conseguir fazer algo a longo prazo”, declara.

“Uma estratégia que começou a ser adotada no Brasil é a de desenvolver ações coletivas: trazer desafios colocados pelo setor econômico, pelo modelo de negócios ou por temas como, por exemplo, patrocínio, onde haja riscos que podem ser mitigados com uma ação segmentada coletiva”, aponta Caio Magri, diretor presidente do Instituto Ethos. “Esse processo é bastante poderoso e acontece, no meu modo de entender, por um avanço de maturidade da sociedade brasileira. Nós estamos construindo um comportamento, uma atitude com relação à pauta de integralidade e combate à corrupção”, acrescenta.

Contudo, fazer o pacto funcionar vai muito além da predisposição das empresas, é preciso acompanhar os processos, verificar se as organizações estão de fato melhorando, criando condições para ampliar suas capacidades de governança e transparência. A partir dessa necessidade, foi desenvolvido “o que é hoje um dos maiores legados dessa iniciativa: a ferramenta Rating Integra, que possibilita mecanismos de materialidade e concretude para avaliar a melhoria das condições de governança”, descreve. É um sistema simples, que começa com uma autoavaliação, seguida de uma verificação externa de quantificação para accountability e, por fim, a avaliação de um comitê multidisciplinar e multisetorial, composto por atletas, empresários, representantes de organizações e especialistas, que encaixa essas instituições em uma escala de governança.

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21 Isabel Swan, primeira medalha de vela feminina pelo Brasil nas Olimpíadas e coordenadora de esportes femininos no Comitê Olímpico do Brasil, conta um pouco sobre a experiência das confederações com a ferramenta: “não são todas que têm estrutura para chegar em um nível alto de maturidade, mas fazendo uma análise das ações dentro da confederação, é possível medir a escala de evolução e entender qual é o próximo passo”, revela. “O caráter do Rating Integra não é punitivo, é de ensino, de construção de um esporte melhor, e as entidades estão entendendo cada vez mais esse processo, criando ferramentas internas, fazendo perguntas, buscando evidências, desenvolvendo políticas internas... É uma cultura que já está dentro das federações e está cada vez mais forte”, acrescenta.

Alguns desdobramentos foram bem significativos: medidas para ampliar a voz dos atletas nas assembleias gerais; programas de equidade e representação para tornar a presença de mulheres no esporte mais igualitária; um conselho fiscal não ligado à administração e que possa realmente verificar as contas da entidade; comitês para tomadas de decisão cada vez mais coletivas, principalmente em termos de investimento; cursos de prevenção ao assédio, ao racismo e à discriminação no esporte; criação de um conselho de ética, um canal de ouvidoria e um canal de compliance, entre outros. “Eu estou muito feliz de fazer parte dessa história e com a faca nos dentes para trabalhar, agora de uma outra forma, antes nos mares e agora no COB, para dar cada vez mais voz ao esporte e às mulheres no esporte”, conclui Swan.

“Eu acredito que o esporte é uma grande ferramenta de mudança social, com a qual a gente aprende muito. Eu acho que um Brasil mais esportista tem a condição de ser um país onde as pessoas passam a acreditar mais em si. E pra mim isso é combustível, é o que me faz acordar todo dia pra vir trabalhar, acreditando que realmente a gente precisa de um esporte forte pra seguir e ter um país mais forte também.”

Isabel Swan

22 “Todo mundo tem interesses e muitas vezes esses interesses são difusos e contraditórios, mas sempre existe um denominador comum quando se pensa no impacto social positivo. Então, procurar esse denominador, unir forças, parar de fazer coisas repetidas e difusas, olhar quem está fazendo e se unir é fundamental pra gente alcançar impacto em menor prazo. E as empresas estão começando a entender que elas têm uma responsabilidade social que vai além do retorno de marketing.”

Silvia Gonçalves “O Rating é um processo inclusivo, não de exclusão. A responsabilidade cada vez maior está nos agentes, sejam atletas, sejam dirigentes, sejam empresas, empresários e organizações da sociedade civil, de caminhar na direção de um esporte que possa contribuir para criar um ambiente mais íntegro, mais transparente e ético para toda a sociedade.”

Caio Magri Caio Magri | Silvia Gonçalves João Paulo Diniz | Isabel Swan

FUTEBOL X RATING: O QUE ESPERAR? Em seu terceiro ciclo de aplicação, o Rating Integra passou a atrair espontaneamente um público que, a princípio, era tido como improvável: clubes de futebol. “Como operadora de advocacy, eu consigo identificar um problema complexo quando vejo um, e o futebol é um problema complexo”, afirma Silvia

Gonçalves, diretora de projetos na Impacta Advocacy. O cenário inclui dívidas exorbitantes dos clubes, a dependência do direito de transmissão, a disparidade de poder e influência entre os atores e a falta de fomento ao crescimento dos clubes, para terem sustentabilidade e competitividade em campeonatos.n

24 “Agora, sobre o que deve ser feito é o ponto em que todo mundo discorda. É um sistema que tem várias partes, com diversos interesses, muitas vezes conflitantes”, aponta a advogada, “mas existe um denominador comum: se quer um futebol mais competitivo, mais bonito, que traga mais torcedores ao estádio se-

guro, que os clubes não precisem vender seus talentos para sobreviver e nem devam milhões pra União... Agora é preciso unir partes em prol desse denominador”, conclui. Ela acredita que o Rating Integra pode ser uma forma de atrair esses atores para um movimento em torno de causas comuns.

25 “Eu sou otimista em relação ao futebol. A solução é você melhorar a governança dos clubes, nada mais que isso. Assim, a gente vai ter clubes atuando como empresas e seguindo métricas para ter lucro e, efetivamente, resultado”, explica João Paulo Diniz, fundador da Componente e um dos criadores do Pacto pelo

Esporte. “Acho que esse caminho que os clubes querem seguir é muito importante. É falar ‘eu quero ser medido também, quero que meu clube seja avaliado, para saber em que estágio que eu estou e poder evoluir’, e esse é o caminho para a mudança”, acrescenta.

26 CHECKLIST: PACTO SETORIAL Identificar um problema de mercado que tem impacto social público; Definir uma estratégia de solução e traçar metas bem definidas; Levantar informações e definir indicadores quantificáveis; Acionar os diversos atores envolvidos; Promover o debate organizado para atingir um acordo satisfatório às partes.

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27 COALIZÕES E ACORDOS PRIVADOS: COMO MANTÊ-LOS ATIVOS E EFETIVOS? O primeiro ciclo de debates do evento abordou estratégias e metodologias para a manutenção duradoura de acordos privados e coalizões.

Esse modelo de pensamento acaba também por direcionar toda a responsabilidade pela solução dos problemas socioambientais ao setor público, e este, ao mesmo tempo em que precisa planejar e executar soluções para situações complexas, lida constantemente com ações direcionadas à redução do poder do Estado, além de manobras de sonegação e desvio de recursos. Enquanto isso, a classe empresarial e executiva é dotada de autoridade e recursos suficientes para atuar como agente de poder transformador da sociedade, mas seus movimentos nessa direção ainda seguem muito incipientes.

“Há mais de 20 anos, temos procurado traduzir essa inquietude, essa insatisfação, com a combinação de sim, ter um negócio que precisa, para sua sustentabilidade e estabilidade, ser financeiramente consistente, capaz de remunerar o investimento e o risco que está sendo aportado; mas que extrapole em muito a visão do que é Fórum de Advocacy e Impacto | Primeiro Dia

EBATES DEBATES

Ao longo do último século, a definição de sucesso foi atrelada diretamente à quantidade de riqueza acumulada por alguém antes dos 30 anos de idade e, de acordo com Paulo Sérgio Kakinoff, presidente da Gol Linhas Aéreas, essa é a causa de boa parte das mazelas que nós encontramos no mundo hoje.

“As empresas são ranqueadas basicamente por essa régua: quem gerou mais lucro, quem cresceu mais; os empresários ficam famosos pelos seus ganhos financeiros... Não tem nenhum ranking, que rivalize em notoriedade e em apreço público, voltado para mensurar as organizações por outras dimensões que são igualmente importantes”, aponta.

28 o seu papel e a sua missão”, revela Kakinoff. “Penso que temos um número cada vez maior de empresas, agentes, pessoas e organizações envolvidas nesse tipo de visão e abordagem”, acrescenta.

“Aprendi o poder de se fazer o básico. E o que é o básico nesse momento? Chegarmos a conclusões, projetos e opiniões baseados na multiplicidade de visões, gerando-se uma massa crítica em torno da qual as pessoas podem, e muito provavelmente irão convergir, à medida em que elas se abstenham de preconceitos, de visões previamente concebidas, e isso é absolutamente poderoso.” Paulo Sérgio Kakinoff Adam Kahane, diretor da Reos Partners, há 30 anos trabalha auxiliando grupos de pessoas ao redor do mundo inteiro, que desejam trabalhar juntas ou acreditam que precisam trabalhar juntas a fim de progredir em suas questões mais importantes e desafiadoras.

Ele esteve presente em momentos históricos importantes, como o fim do Apartheid e o Acordo de Paz da Colômbia, além de atuar em projetos de educação no México e sustentabilidade na moda no Brasil. De toda essa experiência, ele conclui que é possível trabalhar com pessoas com as quais temos desentendimentos permanentes. É difícil, mas não impossível.

“A primeira coisa que você deve ter em mente é que não é uma tarefa simples e nem garantida, porque envolve, em crítica medida, a junção voluntária de pessoas ou atores, organizações que não estão em uma relação hierárquica entre si e que têm sempre a opção de retirar-se. E isso é intrinsecamente mais desafiador do que em uma relação em que é possível, ou acreditamos que seja possível, fazer com que pessoas ajam como queremos”, descreve. Construir acordos e coalizões exige um espaço seguro de diálogo, capacidade de argumentação e, o mais importante: estar aberto a ouvir.

“O debate mais rico é aquele em que a gente não concorda, mas sobretudo consegue ouvir um ao outro. Acho que essa é a grande riqueza do debate público, dos diferentes atores da sociedade, da intersetorialidade e das coalizões”, acrescenta Mariana Luz, diretora presidente da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. A instituição possui 55 anos de história, dos quais 40 foram voltados para a Fórum de Advocacy e Impacto | Primeiro Dia

29 hematologia e os mais recentes para a primeira infância, sempre trabalhando com estratégias de coalizão. “A possibilidade de mudar de causa significa uma vitória já, pois mostra que o trabalho conjunto surtiu resultados e que a temática inicialmente escolhida não precisa mais da nossa atenção”, conta.

O novo foco foi escolhido devido à sua centralidade na raiz dos problemas nacionais: “a primeira infância é a causa mãe de todas as políticas públicas, porque ela olha para a raiz de todos os problemas que a gente tem na sociedade”, explica. “A criança faz 1 milhão de conexões por minuto e forma 90% do cérebro nesta fase. Se ela tem um desenvolvimento pleno, gera impacto na saúde, na educação, na geração de renda, e tudo mais”, conclui. A atuação da entidade ocorre em quatro frentes colaborativas: ciência, formando equipes de pesquisas e desenvolvimento de materiais sobre educação infantil; parentalidade, com a formação de parcerias para ajudar a qualificar os programas governamentais; avaliação, com a criação de indicadores em conjunto com o IBGE e os Ministérios de Saúde e Cidadania; e comunicação, com a união de autoridades e personalidades para a produção de eventos, programas e campanhas.

Segundo ela, atuar em parceria com a máquina pública e com o setor privado é fundamental para atingir escala e eficiência com a execução dos projetos. É preciso manter um relacionamento próximo, fazer os agentes conversarem e incluir as pautas no orçamento, o que demanda a apresentação de projetos completos, que demonstrem serem possíveis, executáveis e com retornos concretos. Em complemento, Brenda Brito, pesquisadora da Imazon, traz como exemplo um panorama da situação do desmatamento no Brasil, que já chegou a 80% de redução entre 2004 e 2012, mas que hoje, com as medidas políticas de limitação da sociedade civil nas causas ambientais, passa por um processo de aceleração.

“Essa redução começou ao redor do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), que previa muitas possibilidades de coalizões e interações para diferentes ministérios e diferentes níveis de governo”, revela. “Essa questão da integração era a base da discussão, porque a gente entende que o desmatamento é fruto de diferentes atividades econômicas e que Fórum de Advocacy e Impacto | Primeiro Dia

30 você não pode ficar ali dialogando só na agenda ambiental. Você tem que de fato trazer os diferentes atores, dentro e fora do governo que estão lidando com esse problema”, complementa.

Uma das medidas que mais gerou resultados foi a criação do Fundo Amazônia, com um Conselho de direcionamento de recursos que tinha espaço para políticos, pesquisadores, academia, sociedade civil e empresários. “Todo mundo tinha cadeira, e isso trouxe muita credibilidade”, declara Brito. Contudo, a partir de 2019, com fechamentos de comitês, mudança de regras e o fim do diálogo entre as partes, há uma perda da habilidade de inovação e desenvolvimento de ferramentas socioambientais, além da intensificação da atividade de desmatamento.

Christel Scholten, diretora executiva da Reos Partners, afirma que, para um projeto funcionar é preciso ter engajamento genuíno das partes envolvidas, com o compromisso dos convocadores e financiadores para um processo de longo prazo. “Isso tem um impacto significativo, porque mudanças sistêmicas levam tempo. Você movimenta um monte de atores para um objetivo comum e, muitas vezes, as coalizões acabam porque eles não estavam preparados para se dedicar de maneira tão extensa”, pontua. Ela também elenca outros três grandes problemas, que desmotivam os envolvidos e enfraquecem as iniciativas: acreditar que as coisas irão andar sozinhas e não pensar em uma estrutura de encaminhamento e coordenação; ficar só no diálogo, sem mostrar resultado; e, por fim, permitir que o conflito contamine o trabalho, com a ausência de um espaço seguro para a livre expressão das partes.

“Essas iniciativas, na medida em que elas vão conquistando territórios importantes e produzindo efeitos duradouros, justamente por meio de um diálogo amplo, aberto, franco, com diversos agentes da sociedade, com suas respectivas opiniões e buscando a convergência, me faz reforçar que o principal aprendizado é a força e a capacidade de viabilizar construções conjuntas através do diálogo e do engajamento de visões diferentes”, declara Kakinoff. O empresário alerta ainda para a necessidade de acabar com posicionamentos binários, pois eles não são capazes de desenvolver soluções efetivas para problemas complexos.

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31 CHECKLIST: COALIZÕES E ACORDOS PRIVADOS Por Adam Kahane e Christel Scholten, presidente e diretora executiva da Reos Partners Escolher uma temática complexa, uma problemática. E todos precisam ter a compreensão de que nenhum ator sozinho consegue resolver essa situação; Eleger um convocador ou um grupo de convocadores que tenha legitimidade, compromisso e interesse; Formar um grupo que represente a diversidade do sistema que está tentando transformar, com pessoas que cubram todos os pontos de vista e, ao mesmo tempo, sejam interessadas, comprometidas, informadas e também influentes, para fazer a mudança acontecer; Traçar um norte, uma visão comum, uma direção a seguir e desenvolver um olhar sistêmico, que se atente para as causas, não para os sintomas; Planejar uma abordagem multinível: no âmbito dos relacionamentos, gerando confiança, capacidade de escuta e diálogo; no âmbito estrutural, atuando com políticas públicas, distribuição de recursos e desenvolvimento de soluções; e no âmbito narrativo, disseminando a mudança de mentalidades, crenças e valores; Paulo Kakinoff | Christel Scholten | Brenda Brito | Mariana Luz

32 Montar uma estrutura completa, com instrumentos, governança e recursos; Construir um espaço neutro e seguro para os atores colocarem suas posições e questionamentos. E para isso, contar com facilitadores experientes; Aceitar a situação como ela é. Abraçar o conflito e a conexão, olhar para si e experimentar o caminho; Definir metas de curto, médio e longo prazo, efetivas para a transformação do sistema.

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34 LITIGÂNCIA ESTRATÉGICA NA EFETIVAÇÃO DE DIREITOS E POLÍTICAS A segunda rodada de debates abordou o que é essa ferramenta de advocacy e como ela contribui para a efetivação de direitos e políticas públicas.

Litigância estratégica é uma ação de advocacy que ganhou bastante relevância nos últimos anos, principalmente no atual contexto político para influenciar políticas públicas. Na teoria, litígio é uma ação judicial que se origina da contestação de uma demanda, mas na prática, o termo é utilizado de maneira bem mais abrangente. “Eu não gosto desse termo, porque ele é muito restrito a uma parte de uma estratégia que a gente pode chamar de ações estratégicas no Sistema de Justiça”, explica Pedro Hartung, coordenador dos programas Criança e Consumo e Prioridade Absoluta, ambos do Instituto Alana.

Segundo Hartung, o diálogo extrajudicial é muito mais rápido e efetivo do que o litígio propriamente dito. “Temos casos do Alana que demoram 10 anos para ter uma decisão final. Quantas organizações conseguem segurar uma estratégia de advocacy no sistema de justiça por tanto tempo?”, aponta. Processos são caros, além de demandar muito tempo de esforço e dedicação, por isso, é preFórum de Advocacy e Impacto | Primeiro Dia

EBATES

“Nem sempre a gente resolve as coisas por meio do litígio. Ele é uma das ferramentas que o direito tem para debater causas sociais, para discutir os temas, para permitir que a gente possa levar essas causas também para o sistema de justiça, mas não é a única”, acrescenta. A litigância pode ser realizada através de pré-mediações coletivas, audiências públicas, ações públicas, ações populares, questionamento direto aos tribunais, acionando diferentes instâncias do Sistema de Justiça (Defensoria, MPU, PROCON etc.), ajuizando ações, através de amicus curiae (amigo da corte) e a partir de ações educativas e formação profissional de juízes e promotores.

35 ciso pensar o sistema de justiça como um espaço de advocacy e o direito como uma caixa de ferramentas.

torna difícil fecharem as portas para nós, porque aí beira intransigência e podemos repercutir nos meios de comunicação”, afirma.

“O judiciário tem um mito de que ele é neutro, afastado da realidade, da política. O que a gente tem que buscar é dialogar com esses interlocutores trazendo posicionamentos políticos, mas entendendo essa linguagem dos processos pretensamente neutros, com o verniz da técnica”, conclui o advogado. “A gente tem que pensar esses espaços de justiça que vão além do STF e do STJ, lembrando que o advocacy é sobre dialogar”, complementa Silvia Souza, assessora parlamentar na CLDF. “Às vezes, o próprio litígio não tem a finalidade de chegar até o final, ele pode ser usado apenas como uma ferramenta de pressão, através da repercussão na mídia”, exemplifica.

Diego Casaes, diretor de campanhas da Avaaz, entende que o principal desafio com o judiciário é calibrar a pressão e ter criatividade para construir ações que vão garantir que a questão seja levada em consideração e gere mobilização, tanto dos atores quanto da população.

Nesse sentido, ele acredita que a participação em audiências públicas e a formação desses atores são imprescindíveis. “As ações estratégicas envolvendo o judiciário têm que abraçar sua complexidade e participar dessa guerra de narrativas e, no final das contas, o importante é trazer essa percepção para todos os espaços da sociedade”, explica.

“Outro ponto, é que se a gente não consegue encontrar esse espaço de diálogo, nós cavamos ele”, declara. É preciso mapear os atores envolvidos no judiciário, no MPU e na Defensoria, identificando possíveis aliados para cada uma das instâncias. “Às vezes as portas podem não se abrir para mim, mas se a gente faz uma construção coletiva, uma coalizão, se

Contudo, mobilizar o cidadão comum não é uma tarefa fácil quando se trata das instâncias mais baixas do judiciário. “As pessoas entendem muito mais a função de um ministro do STF do que de um juiz de primeira instância, por exemplo, porque são personalidades que não têm uma conexão, não estão diretamente ligadas com a mídia e não fazem parte do debate político atual. Então, obviamente, quanto mais alta a

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36 magistratura, maior a visibilidade”, elucida. Por isso, é necessário possuir um leque complementar de estratégias, tais como ações educacionais e jurisprudência, que complementem as campanhas comunicacionais.

Outro problema muito grande em questão de mobilização é a desinformação. Muitos indivíduos, sejam de perfil público ou político, são alvo de notícias falsas ou deturpadas que prejudicam sua imagem e, consequentemente, seu poder de influência. “O principal desafio é que existe uma exigência de que a pessoa difamada forneça a URL da desinformação, e isso cria uma situação muito dificultosa para quem não tem o conhecimento sobre como funciona o sistema de justiça, não possui os recursos corretos e nem uma equipe de advogados. Então, o que a gente vê são vários alvos que não conseguem remover todo o conteúdo difamatório”, explica Casaes. Por cima disso, existe o debate moral que contrapõe essa necessidade de restrição de conteúdos com a liberdade de expressão.

“Nós estamos em um momento frágil, em que as principais questões democráticas do país estão passando pelo sistema de justiça, algumas crises políticas e econômicas estão afetando o legislativo e o executivo e o que temos visto são diversas políticas públicas que eram certeiras, deixarem de acontecer”, descreve Allyne Andrade, superintendente adjunta da Fundo Brasil. A situação se agrava pelo apagão de dados atualizados sobre a atual situação brasileira, caminhando para o terceiro ano consecutivo que não ocorre o Censo do IBGE, o que prejudica a construção de novas políticas e o monitoramento das que já existem.

“Nesse momento, nós precisamos atacar por todas as frentes”, declara. De acordo com a especialista, é preciso pensar o Estado brasileiro como um todo e não afastar o direito desse lugar de política, porque, no fundo, o judiciário é um palco de política. O planejamento, por sua vez, precisa ultrapassar esse espaço, visto que uma vez que a ação é ganha, é preciso fazer com que ela seja implementada, a partir de constantes articulações com o legislativo, com o executivo e com a sociedade civil, para garantir que ela tenha relevância.

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37 “Ações estratégicas em todos os poderes são essenciais, porque no fundo elas são formas de atuação para o fortalecimento e adensamento da democracia no Brasil.”

Allyne Andrade CHECKLIST: LITIGÂNCIA ESTRATÉGICA Entender o judiciário como parte de uma estratégia geral, que englobe os três poderes e a sociedade civil; Entender a litigância como um conjunto de ferramentas de direito que podem ser utilizadas para criar um espaço de diálogo político dentro do Sistema de Justiça; Pensar em maneiras de envolver o máximo de atores e instituições de cada uma das instâncias do judiciário, formando coalizões; Desenvolver projetos de educação e conscientização para mobilização de atores, e campanhas de comunicação para direcionamento de pressão popular; Pensar o litígio de maneiras criativas, que não necessariamente exijam uma trajetória judicial; Em caso de estratégias que envolvam o sucesso de ações judiciais propriamente ditas, encontrar maneiras de receber apoio para manter recursos humanos e financeiros por longos períodos de tempo.

Silvia Souza | Diego Casaes Allyne Andrade | Pedro Hartung

39 COMO INFLUENCIAR O EXECUTIVO? IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DELIVERY UNIT​S O quadro Impacta Mundo do segundo dia de evento abordou os principais desafios de Advocacy na implementação de políticas públicas e Delivery Units.

“Acertar em política não é fácil, mas mesmo que você consiga, 90% do desafio é levar resultados concretos em cada canto longínquo do país”, acrescenta.

Uma grande dificuldade desse processo são os imprevistos e crises que não são contabilizados no plano de governo inicial. “Nós vimos isso bastante, obviamente, com a pandemia ao redor do mundo, muitos governos lidando com uma série de coisas dando errado. E, a menos que haja uma ciência, antes que a crise aconteça, do que se vai tentar fazer e como, um presidente pode terminar seu mandato de quatro anos tendo apenas apagando incêndios”, conclui Barber.

“Nos meus quase 12 anos de experiência no setor público, fui identificando barreiras que são independentes do sistema de governo.

Se é um sistema republicano ou de autoridade monárquica, se é a nível municipal, estadual ou federal, nada disso faz muita diferenFórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

MPACTA MUNDO

Quando pensamos em influenciar políticas públicas, a primeira imagem que vem à cabeça é a do legislativo: como iremos aprovar leis sobre as pautas em questão? Contudo, no Brasil, por exemplo, já estamos com leis muito avançadas, inclusive aprovadas, mas que não conseguem ser implementadas de maneira adequada, ou seja, não são executadas.

“Em muitos governos ao redor do mundo, os ministros e funcionários públicos acham que decidir a política é a parte difícil e que, depois disso, a implementação cuida de si mesma. Na cabeça deles, é 90% política e 10% implementação, quando, na realidade, é justamente o contrário”, revela Michael Barber, fundador e presidente da Delivery Associates.

40 ça”, afirma Jussara Negromonte, da Delivery Associates. “A gente sempre acha que o problema é falta de recursos, mas não é por aí”, completa. Em seguida, ela faz uma analogia, comparando o sistema de governo com um organismo vivo, que funciona por rotinas, indicando ser necessário criar hábitos saudáveis e fazer com que esse sistema funcione cada vez menos por “espasmos”, ou seja: apenas resolvendo crises e incêndios que demandam picos de atitudes rápidas e imediatas, seguidos de calmaria ociosa.

A gestora pública aponta três grandes barreiras para a execução de políticas públicas. Primeiro, a ausência de um sistema robusto de dados, que tenha granularidade, ou seja, que o nível de informação seja realmente suficiente para auxiliar na tomada de decisões, tanto em especificidade quanto em frequência. A colheita desses dados deve servir para medir o panorama geral da situação, permitir a elaboração de metas específicas e suprir as demandas dos indicadores estabelecidos para cada uma delas. O intuito final é medir a eficiência de cada um dos atores em seus processos com o máximo de precisão e com atualizações que sigam a mesma frequência das tomadas de decisão relacionadas.

O segundo ponto é a ausência de uma definição clara de sucesso: objetivos quantificáveis e temporais, ou seja, possíveis de medir e com prazos estabelecidos. “O que muitas vezes a gente observa são metas justificadas muito no nível de esforço, despesa de recursos, número de licitações contratadas, quantidade de workshops; mas não é apontado qual é o benefício real para o cidadão”, explica. Por fim, é preciso pensar como essa meta é comunicada ao longo de uma cadeia de entrega, quem são os responsáveis por cada tarefa, desde o nível hierárquico mais alto até a ponta de atuação direta com a população. “Justamente por não saber por quais métricas cada um desses atores se responsabilizam, fica difícil saberem o que eles estão entregando no final das contas”, aponta.

Renato Godoy, coordenador de relações governamentais do Instituto Alana, revela que o ciclo de advocacy em políticas públicas da organização durante alguns anos foi inteiramente voltado para o legislativo: “o nosso modelo de atuação, que iniciamos em 2006, possui uma incidência em três etapas. Primeiro, a formação da Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

41 agenda, inserindo temas da infância na ordem do dia do debate público. Depois, na formação de políticas públicas, com a elaboração de posicionamentos, diretrizes e subsídios teóricos e normativos.

Por fim, ocupando o espaço da tomada de decisão, o Congresso Nacional, buscando influenciar os tomadores de decisão do legislativo e do executivo para que passem a levar os direitos da criança e do adolescente como prioridade absoluta”, conta.

Contudo, apesar do sucesso das iniciativas já executadas para manutenção dos marcos legais e sua manutenção, o Instituto sentiu a necessidade de passar para a próxima fase desse ciclo, a implementação em si. “A gente costumava trabalhar muito focado somente no Congresso Nacional e no Executivo Federal, e agora, quando direcionamos esforços para chegar aos municípios, no dia a dia da política pública pronta, percebemos novos desafios”, revela. Uma das principais dificuldades apontadas foi a assimetria burocrática dos processos entre os diversos municípios, principalmente os mais afastados das capitais. “Há essa complexidade e a gente precisa mergulhar em cada uma dessas realidades, e fazer uma análise específica. É uma dificuldade que precisamos superar com trabalho de incidência”, completa.

Godoy elenca como principal desafio a combinação de esforços macros e locais, com a participação ativa dos municípios para uma implementação coordenada e padronizada de marcos legais, da constituição federal, das leis federais e demais medidas aprovadas em âmbito nacional. Ele aponta também para a importância de uma participação ativa nas próximas eleições: “acredito que a gente precisa estar presente, no sentido de trazer um debate qualificado em torno das políticas públicas, para que ele seja centrado em todos esses problemas apontados aqui: burocracia, falta de indicadores, falta de dados, etc... para que isso se torne algo central do processo eleitoral”, defende.

Jorge Gerdau, presidente do Conselho Superior do Movimento Brasil Competitivo, entende que é preciso desenvolver a governança pública simplificando processos para que o governo e a população possam colocar tudo para funcionar harmonicamente.

“Nós temos que sair dessa complicação, o planejamento com as Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

42 equipes técnicas gasta muito papel, precisamos de algo mais simplificado”, declara. “O importante é essa conjugação: definir qual é o maior propósito que queremos atingir e depois desdobrá-lo para cada um dos ministérios, eventualmente gerando subpropósitos”, acrescenta.

Em seguida, ele reitera a necessidade de uma comunicação clara, na qual todas as equipes do governo saibam o que se deseja fazer; de se estabelecer bons indicadores de medição e de ser transparente quanto a eles. “Governança exige domínio dos processos e domínio de processos exige conhecimento desses processos”, afirma, indicando que os atores envolvidos em cada uma das pautas, incluindo organizações públicas secundárias, organizações da sociedade civil e empresas, devem se inteirar e participar ativamente da atividade política, propondo e pressionando melhorias aos processos. “Sem a participação e pressão da sociedade civil, não vamos modificar a visão política do país, e isso pode ser feito pelos empresários, que possuem uma experiência de gestão e sofrem desse tipo de problema”, conclui.

43 Caio Penido, presidente do Instituto Mato-Grossense da Carne (IMAC), levanta a importância de tornar a carreira política mais convidativa para atrair os atores influentes da sociedade civil e do espectro privado, e aponta algumas das dificuldades nesse sentido. “Acho que um dos elementos que dificulta muito é essa questão do jogo pelo jogo. Você entra com uma missão clara, um discurso muito bom, as pessoas votam e, quando entra no poder, começa a ser sufocado por acordos e concessões, o que é desestimulante”, explica.

“Outros fatores são a burocracia, a lentidão para aprovação de projetos e parcerias, e a situação da comunicação: tanto nas redes sociais quanto nas mídias tradicionais, a gente percebe que a polarização e as acusações proliferam muito mais do que uma agenda positiva transformadora”.

Caio Penido

5 Michael Barber, fundador e presidente da Delivery Associates e diretor do gabinete do primeiro-ministro do Reino Unido, levantou um questionário com cinco perguntas que todo(a) gestor(a) deve fazer para garantir que possui um plano eficiente em mãos. “Qualquer governo consegue fazer isso. Não é algo conceitualmente difícil, apenas requer rigor, consistência e determinação”, afirma.

45 O que você está tentando fazer? Quando você terminar essa gestão, o que você quer dizer que alcançou? Ter clareza sobre a missão é muito importante, e ter clareza sobre as prioridades é o caminho para essa resposta. Não basta falar “saúde é a minha prioridade”, é preciso dizer detalhadamente o que se pretende conquistar. É preciso determinar qual será a diferença do serviço de saúde que você vai entregar: haverá menos pacientes com câncer? As pessoas vão esperar menos tempo para fazer uma operação? Qual é o foco?

Como você está tentando fazer isso? Muitos governos, na fase de planejamento, escrevem um documento chamado “O Plano”, que tem uma bela capa e uma bela foto, mas que é publicado, aparece no jornal e depois é esquecido em uma biblioteca. Isso não serve.

Você precisa de um plano real, com as ações que você vai realizar, o prazo para cada uma dessas ações e a pessoa responsável por cada uma delas. Também é necessário mostrar com dados, seja o que for que estiver monitorando, como isso vai mudar durante a implementação. É o que chamamos de trajetória: como os dados mudam com o passar do tempo.

Como você saberá, a qualquer momento, que está no caminho certo? Talvez, as pessoas que você encontra o dia inteiro apenas digam “ah, sim, está indo maravilhosamente bem, ministro, está tudo bem”, mas isso não ajuda em nada. Você precisa de bons dados, vindos de todo o país, regularmente.

Quando você não estiver no caminho certo, o que vai fazer a respeito? É preciso pensar nas possíveis falhas, traçar hipóteses e desenvolver soluções alternativas.

Você está projetando um sistema eficiente de execução? É importante certificar-se de que os dados estão organizados e apresentados de maneira compreensível, que cada departamento tenha planos de entrega adequados e que sejam realizadas reuniões periódicas de avaliação e correção de processos.

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46 O PAPEL DAS DELIVERY UNITS O papel de uma unidade de entrega, ou Delivery Unit, é ter uma atuação organizada e muito próxima ao presidente ou primeiro-ministro, para garantir a execução do plano de governo realizado para o mandato vigente, garantindo que as prioridades do governo serão entregues, independente dos contratempos e imprevistos que ocorram ao longo da gestão. Ela não realiza as entregas, mas checa constantemente os ministros responsáveis por cada uma delas, para recolhimento de dados, verificação de andamento e análise de resultados. Além disso, são responsáveis pela produção de relatórios objetivos, frequentes e com informações constantemente atualizadas, para facilitar a tomada de decisão dos atores políticos envolvidos.

de uma forma que mesmo uma pessoa não estatística possa entender. É injusto esperar que um primeiro-ministro seja um mago da estatística. Então, dados claros, simples e com integridade”, complementa.

Jussara Negromonte, também da Delivery Associates, ressalta que além da qualidade, a atualização constante desses dados também é crucial. “Eu acho que o papel mais importante de uma Unidade de Entrega, no que diz respeito a esse papel de advocacy, é fazer a curadoria dos principais pontos a serem discutidos a cada semana e não a cada semestre ou a cada ano; e levar isso para a atenção da liderança, criando sinergia, cooperação e senso de urgência”, declara. Ela traz como exemplo de entrega efetiva o projeto de auxílio emergencial do Ministério da Economia durante a Covid-19, que tinha Em outras palavras, “é estar sem- por objetivo apoiar financeirapre se certificando que as pes- mente 54 milhões de trabalhasoas estão alocadas e atuando dores durante três meses. na resolução das problemáticas, garantindo que os dados estejam “Eu gosto dessa meta, porque ela chegando e, fundamentalmente, passa pelo que eu chamo de filtro não aceitando desculpas para de três etapas: ela é significativa, não realizar as entregas”, escla- impacta na vida das pessoas; ela rece Michael Barber, fundador e é movível, ou seja, é possível de presidente da Delivery Associa- se chegar no resultado com os tes. “A questão dos dados, aliás, recursos disponíveis; e ela é mené que você deve apresentá-los surável, então é possível coletar Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

47 dados para medir os resultados dela”, explica. Para essa execução, a Delivery Associates trabalhou juntamente com a Secretaria Executiva para desenvolver um sistema simples para apurar os resultados dos indicadores e fazer análises sobre a entrega. Assim, a equipe poderia levantar, a cada semana, quais eram os temas mais importantes para o secretário executivo discutir com o ministro.

Dessa forma, os problemas da implementação eram discutidos com base em evidências e com uma temporalidade suficiente para que a tomada de decisão pudesse ocorrer antes dos problemas evoluírem demasiadamente. “Sobre essas conversas, também é muito importante que elas aconteçam sem apontar dedos, sem fazer o que a gente chama de jogo de culpa, porque a ideia não é decidir qual CPF vai para o Ministério Público primeiro, mas pelo contrário, definir como podemos nos ajudar e trabalhar juntos”, finaliza Negromonte.

CASE: IMPLEMENTAÇÃO DO CÓDIGO FLORESTAL Um dos maiores problemas da promoção internacional da carne brasileira é a constante associação do agronegócio e da pecuária com o desmatamento. Nesse sentido, Caio Penido, presidente do Instituto Mato-Grossense da Carne (IMAC), aponta que sua maior missão é melhorar essa imagem, divulgando um produto com sustentabilidade e rastreabilidade. “Estamos na maior biodiversidade do planeta, nossa produção é carbono eficiente e temos um Código Florestal conservacionista: tanto o Brasil quanto o Mato Grosso têm mais de 60% do território destinado à conservação. Deveria ser fácil promover essa carne”, aponta.

Contudo, apesar de todas as vantagens, a falta de implementação do Código se torna o grande calcanhar de Aquiles e, nesse sentido, o Instituto mapeou duas grandes dificuldades. Primeiramente, a falta de uma base cartográfica única – “você contrata um técnico ambiental para regularizar sua fazenda e ele usa uma base cartográfica. Aí, o analista da Secretaria do Meio Ambiente usa outra, o profissional que vai resolver as pendências usa outra, aí volta para reavaliação e o outro analista usa uma nova base... É muita distorção de informações”, explica. Nesse sentido, o IMAC tem trabalhado em Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

48 um sistema cartográfico único, ao fato de que o gado não morre a ser utilizado por todos os ato- no pasto, ele acaba indo para o mercado de maneira mais inforres envolvidos. mal”, destaca.

Outro problema prático é a falta de mecanismo para reinserção Na busca por resolver essas dede fazendas que desmatavam mandas e conseguir, efetivamenilegalmente, uma vez que elas te, promover o produto brasileifazem as correções necessárias. ro no mercado internacional da “Hoje, as indústrias frigoríficas carne, ficou clara a necessidade promovem a rastreabilidade do de unir o setor produtivo, as ingado que está sendo abatido, fa- dústrias frigoríficas, o governo, zendo uma checagem para ver os pecuaristas e as instituições se tem sobreposição com terras ambientais do terceiro setor em indígenas, unidades de conserva- torno de uma missão comum, ção, e até se tem trabalho escravo que atenda as demandas de seou embargos ambientais”, relata gurança alimentar e atende as Penido. Assim, o Instituto desen- demandas de mudanças climátivolveu um sistema, em parceria cas e preservação ambiental. “A com empresas contratadas de agenda é essa: combater o desmonitoramento, para que, ao se matamento ilegal e autorizar o comprovar que a fazenda irregu- desmatamento legal, respeitanlar cercou a área desmatada e do o Código Florestal aprovado que esta está em regeneração, em Congresso Nacional, porque ela possa voltar a fornecer para essa é a nossa segurança jurídias grandes indústrias, trazendo ca, e incentivar a conservação essa carne de volta para a lega- além das exigências legais”, delidade. “É importante se atentar clara.

Jorge Gerdau | Michael Barber | Caio Penido Renato Godoy | Jussara Negromonte

50 ADVOCACY NA CULTURA: CASE AMERICAN FOR THE ARTS O segundo quadro do eixo Cases & Causas teve como foco apresentar a experiência da organização American for the Arts em seu trabalho de advocacy e discutir a importância do tema no país.

O caminho sugerido é mostrar a real abrangência da força transformadora da cultura, nos mais variados aspectos, como democratização dos direitos sociais, educação, assistência social, segurança pública, saúde, entre outros; para convencer governantes e empresários de que há um efeito muito mais catalizador ao investir em cultura, do que em várias outras áreas. E, para isso, são necessários dados precisos e informações aprofundadas sobre o assunto, ou seja, um incentivo à pesquisa e à organização sistêmica do setor para facilitar os levantamentos. “Por exemplo, estamos falando hoje de 6,1 milhões de pessoas no mundo do trabalho ligado à indústria criativa. A construção civil gera 6,9 milhões de empregos, porém, o seu PIB é 1% maior do que o nosso, então, proporcionalmente, nós geramos mais empregos”, explica Saron.

“Um programa ligado ao Artlift fez uma pesquisa junto ao sistema de saúde inglês, fazendo grupos de controle com pacientes no campo da saúde mental, com questões ligadas a depressão e ansiedade.

Alguns desses grupos interagiram com turmas de artes cênicas e o resultado foi uma redução de 27% na hospitalização dessas Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

ASES E CAUSAS

Trazer a arte e a cultura para a centralidade das políticas públicas é o maior desafio dos atores desse sistema econômico, produtivo, criativo, transformador e de preservação histórica. “Como a gente convence a sociedade de que vai muito além do simbólico?”, indaga Eduardo Saron, diretor do Itaú Cultural.

“Mesmo com o foco apenas no simbólico, já é determinante a necessidade de estabelecer prioridades por parte das três esferas (governo, sociedade e empresas), mas são tempos cada vez mais difíceis e os recursos estão cada vez mais escassos”, complementa.

51 pessoas e de 37% na procura por consultas. Essa redução teve um impacto redutivo no orçamento de saúde do país, de quase £$250 por pessoa. Olha o Impacto que a arte e a cultura geram para a saúde e, portanto, para o sistema como um todo”, enfatiza Saron.

Outra medida importante a ser tomada em direção ao protagonismo da cultura na agenda política é a elaboração de projetos de longo prazo. De acordo com o administrador, todo o setor privado do país se organizou a partir da Lei Rouanet quando o assunto é fomento cultural, o que acaba por trazer o foco de iniciativas todo para a área de eventos.

“Eventos, eu costumo dizer que ficam no vento. Eles fazem girar a economia da cultura, fazem a arte e a cultura acontecer, mas é preciso ter um olhar sob a perspectiva da perenidade do legado”, aponta. Ele acredita que as organizações precisam começar a investir em planos mais ligados aos produtores independentes e direcionados para ações continuadas, principalmente se o objetivo é causar impactos sociais significativos e duradouros.

A Americans for The Arts, organização sem fins lucrativos com o objetivo de promover as artes nos Estados Unidos, é um

bom exemplo de ação continuada. Ela surgiu há 61 anos, em um cenário pós-guerra no qual não havia nenhum financiamento ou política pública positiva direcionados às artes. “Várias cidades do território e organizações artísticas locais se uniram para expressar a necessidade de ter uma organização a nível nacional para advogar por eles, educar as autoridades eleitas e seus funcionários sobre o porquê das artes serem importantes”, conta Jay Dick, diretor estadual de assuntos governamentais da instituição, esta que nasceu com dois princípios básicos intrínsecos: pesquisa e advocacy.

Pela frente de pesquisa, a organização produz relatórios sobre artes e prosperidade econômica, sobre o papel das artes na saúde e sobre a contribuição das artes para assuntos de segurança pública. São abordados temas como o uso da arte para trabalhar traumas de militares recém voltados do exterior e como ela pode ser aplicada em centros de detenção juvenil para ensinar jovens a controlar a raiva e, assim, reduzir a reincidência.

Dick explica que, para ter uma ação de advocacy bem sucedida, é necessário pensar o ecossistema da pauta de forma abran-

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52 gente: “o primeiro pensamento de quem trabalha com isso costuma ser focar nas pessoas eleitas, seja a nível federal, estadual ou local, mas essa é apenas a meta final, porque eles são os tomadores de decisão”, esclarece. “Antes deles, você tem os funcionários das pessoas eleitas, que precisam trabalhar com você; as organizações empresariais que se preocupam com as artes, que você precisa educar e incentivar que elas discutam o tema; a camada das mídias, que são consumidas pelos principais tomadores de decisões e você precisa se inserir na agenda; as pessoas de base, que se unem, se manifestam, ligam e mandam e-mails; e os chamados “topos de base”, que são pessoas, dentre essas últimas, que possuem relação pessoal com o seu representante eleito”, completa.

Formar uma rede de apoio englobando todos esses atores é um processo lento, demorado e contínuo. “A principal lição é que advocacy nunca termina. Sempre há um novo alguém sendo eleito, um novo alguém no controle dos recursos financeiros e é importante continuar a educá-los”, afirma Dick. “Se você esperar até precisar de algo de um representante, já é tarde demais, então dê pequenos passos, pois eles se tornam passos médios, que viram passos maiores. É isso que você precisa fazer: comece em algum lugar e terá sucesso”, conclui.

Uma última dica do diretor é focar nos relacionamentos a nível local, membros de conselhos municipais, por exemplo, porque eles possuem a tendência a se tornarem prefeitos, depois legisladores estaduais, governadores, e, muitas vezes, ascendem ao Senado.

Porém, são muito mais acessíveis em início de carreira.

No Brasil, a Associação Brasileira das Organizações Sociais de Cultura (ABRAOSC) realiza um trabalho parecido. Seu principal objetivo é promover políticas públicas na área da saúde e trazer a sociedade civil para participar da gestão pública de cultura. Hoje, são 4.600 colaboradores e 13 milhões de pessoas atendidas anualmente pelos programas e equipamentos geridos pela instituição.

Segundo Paulo Zuben, diretor presidente, o que começou como uma programação de seminários e desenvolvimento de pesquisas, vem se tornado uma defesa organizada da importância da arte e da cultura na transformação de vida da população.

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53 “Em 2019, houve um risco muito grande de corte de orçamento e as organizações sociais se perceberam enfraquecidas, na medida em que perceberam que não possuíam uma sincronia de práticas e ações capaz de influenciar as políticas públicas”, revela. “A partir daí, entendemos que precisávamos, primeiramente organizar nossos dados: iniciamos um censo, pesquisas sobre o clima entre servidores políticos e servidores públicos, pesquisas com a sociedade civil sobre a questão dos modelos de parceria para a gestão de programas, e começamos capacitações sobre advocacy. Nesse momento, também percebemos o quanto era importante trazer jovens gestores do setor cultural”, acrescenta.

Hoje, a ABRAOSC está direcionando seus esforços principalmente para a questão do aumento de orçamento para a pasta de Cultura, para a transparência na execução desse orçamento e para a defesa do modelo de participação da sociedade civil na execução das políticas públicas, mostrando a arte e a cultura como um trabalho de formação, ligado diretamente às comunidades e que realmente transforma a vida das pessoas. “É uma ação de longo prazo, mas é de dia a dia também. Ela precisa acontecer permanentemente ao longo do ano, não apenas em situações de crise”, afirma. Para facilitar esse trabalho, a instituição tem trabalhado em um mapeamento de quais atores precisam ser acionados e no diagnóstico da melhor forma de contato.

“Eu vejo um amadurecimento de todo o setor, a gente tem um ecossistema cultural, a cultura não é feita apenas pelas grandes organizações, e obviamente a ABRAOSC entende seu papel na defesa dos programas e dos equipamentos geridos em parceria com a política pública. Mas também sabe da importância dos produtores culturais, dos pequenos artistas e dos produtores independentes. Então, a ideia é você ter uma visão sistêmica da cultura e um apoio de todo o setor para editais, para o fomento direto, para as parcerias com a sociedade civil e para outros tipos de ação da política pública cultural.” Paulo Zuben Aline Torres, secretária municipal de cultura de São Paulo, acredita que a grande função da administração pública é promover essas políticas públicas, mas que a relação com as organizações sociais Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

54 é fundamental para que esse trabalho funcione. “A burocracia é muito grande do lado de cá do balcão. Prover um orçamento e fazer uma análise do impacto desse orçamento de fato na comunidade, a gente não consegue sem o apoio dessa estrutura de advocacy das organizações da sociedade civil. Nós não temos essa agilidade”, conta. As duas maiores dificuldades de gestão, nesse sentido, é a luta pela ampliação de orçamento público e a captação de dados do setor, para saber onde a aplicação de verba é mais necessária e efetiva.

“Hoje, a secretaria de cultura tem poucos medidores do quanto é isso, e é uma deficiência da administração. A gente não consegue ter 100% de mensuração. Temos alguns dados, por exemplo dos editais, quem é o público, qual é o perfil, qual é o tamanho do impacto...E estamos começando a fazer agora uma medição desses editais de retomada econômica. O ano de 2022 vai ser basicamente focado na retomada econômica através da cultura”, acrescenta.

Medir com precisão o impacto da cultura nas demais áreas de gestão pública, como a economia, a saúde e a educação, assim como o seu retorno financeiro, é a melhor forma de argumentar por mais investimentos, inclusive através de parcerias com o setor privado.

Eduardo Saron | Jay Dick Paulo Zuben | Aline Torres

CULTUR “Eu acho que a administração pública precisa avançar mais no uso de advocacy e dessas parcerias com as associações. Aqui na gestão, a gente tem um diálogo muito aberto, muito tranquilo com todas as associações e isso é muito importante. Precisamos construir e fazer um movimento de escuta, para a gente conseguir ouvir o outro sem usar a nossa própria régua de medição de necessidade e parâmetros e otimizar todas as necessidades da sociedade.” Aline Torres

56 CHECKLIST: ADVOCACY NA CULTURA Fomentar pesquisas e recolhimento de dados que comprovem, com precisão, a abrangência real de impacto da arte nas questões econômicas e sociais; Mapear atores para a construção de relações estratégicas; Pensar de maneira sistêmica, incluindo funcionários públicos, empresas interessadas, os veículos de comunicação, a própria sociedade civil em volume e seus indivíduos que possuem contato direto com os tomadores de decisão; Encontrar maneiras de educar esses diferentes grupos e estar presente em suas agendas; Utilizar todas as anteriores para pressionar a máquina pública na aprovação e implementação de políticas públicas positivas; Entender que advocacy nunca termina. É um trabalho contínuo pois problemas públicos são de longo prazo e tomadores de decisão sempre mudam.

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58 COMUNICAÇÃO E ADVOCACY: ENVOLVIMENTO, ENGAJAMENTO E MOBILIZAÇÃO Os debates do segundo dia começaram com uma abordagem da comunicação como fator determinante para envolvimento, engajamento e mobilização da sociedade civil; apontando a relação histórica das organizações com essa atividade.

Em 30 anos de história, o Greenpeace, e o setor social como um todo, amadureceu muito o seu olhar para a comunicação, trazendo essa atividade do final do processo, de registro e prestação de contas, para o começo de tudo. “O essencial, aquilo que a gente tem de mais importante, e inclusive o que nos motiva a trabalhar, é a própria pauta. Nós precisamos buscar caminhos para ampliar o debate e efetivá-la”, afirma. Nesse sentido, a instituição pensa a comunicação como uma ferramenta de advocacy, capaz de pautar a agenda pública. Para isso, busca estabelecer canais de diálogo, traça objetivos e metas, define agendas informativas, segmenta públicos e aciona parceiros.

Pasquali levanta a importância de se pensar com muito cuidado a clareza das mensagens, como fator determinante para o sucesso de uma campanha. “Às vezes a gente reclama, no calor do momento, do dia a dia, que ‘ah, isso aqui não engajou tanto, as pessoas não Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

EBATES

A comunicação no âmbito de causas socioambientais era muito vista como uma necessidade de prestação de contas por parte das organizações ativistas, sejam elas empresas ou da sociedade civil, até em nome da transparência do setor. “Então, eu fazia um projeto, executava e, lá no final, eu contava os resultados alcançados”, conta Carolina Pasquali, diretora executiva do Greenpeace Brasil.

“Isso sempre me pareceu um desperdício, porque eu enxergo a comunicação de causas como essencialmente engajadora, mas quando ela é pensada a partir da agenda, da causa, não da instituição”, acrescenta.

59 se importaram’, mas a gente soube pedir? A gente deixou claro exatamente o que queremos que a pessoa faça? E é algo possível dela fazer? Muitas vezes a gente pede coisas grandes demais, e as pessoas recebem aquilo e sentem que não dão conta, outras vezes, a gente expõe uma causa, mas nem pede nada. Falta o famoso Call to Action”, explica. Em seguida, aponta que é preciso pensar jornadas de engajamento para diferentes públicos, entendendo as especificidades de cada um em relação ao nível de informação e às barreiras de mobilização.

Elisa Prado, diretora de comunicação corporativa da Telefônica Brasil, dona da marca Vivo, alerta, contudo, que apesar da necessidade de segmentação, é preciso ter em mente que todas as mensagens chegam para todos os públicos ao mesmo tempo. “Quando você coloca algo para fora, você está colocando para dentro da empresa e para todos os públicos ao mesmo tempo. A nossa comunicação é em rede, e isso é uma responsabilidade muito grande, a comunicação multidirecional tem que respeitar opiniões, receber feedbacks e até mudar a perspectiva estratégica quando necessário”, esclarece. O retorno das redes sociais é quase imediato e é preciso saber ouvir para conseguir melhorar o que for necessário.

Para um bom desempenho nesse ecossistema, é preciso ter um propósito e um posicionamento muito claros, orientando todas as tomadas de decisão, além de garantir a transparência dos processos. “Tem uma frase que eu gosto muito, do Ralph Waldo, filósofo americano: suas atitudes falam tão alto, que eu não consigo te ouvir.

Então, é preciso ter consistência entre as falas e as atitudes, sempre”, aponta. “Quando a gente fala em um programa de comunicação de causa, nós precisamos construir isso dentro de casa primeiro. A gente sabe que uma empresa está em busca de resultados, mas o consumidor hoje só escolhe, trabalha e compra produtos de organizações que tragam valor para a sociedade”, completa.

“Quando a gente pensa em comunicação, por muito tempo dividimos o que as empresas comunicam do que as organizações comunicam, mas a gente vive em uma sociedade que compartilha os mesmos desafios e precisamos entender que todos nós vamos sofrer consequências das ações que tomamos aqui nesse espaço. Então, a Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

60 gente se posicionar sobre isso e fazer uma construção conjunta, eu acho que é o grande ponto”, declara Rodrigo Santini, líder da marca e missão social Ben & Jerry’s Brasil. Em seguida, ressalta que é necessário realizar escutas profundas, não apenas com quem está recebendo as mensagens, mas com as equipes internas e demais stakeholders.

“Também é preciso ter em mente que não vamos agradar a todo mundo, o momento narcísico das empresas acaba por aqui. Nós temos stakeholders que são fundamentais e é preciso pensar quais recursos financeiros e pessoas vamos precisar para atingi-los.

Um ponto muito importante nessa história é entender os limites de atuação. Não podemos fazer o papel do governo e não podemos atuar como uma organização social, essas estruturas devem ser mantidas”, completa. Ele afirma ser preciso entender o contexto, para não tirar a responsabilidade do outro, e estar preparado para não ser necessariamente o protagonista do processo, mas participante de uma rede.

Santini levanta ainda a importância de diferenciar marketing de causa e ativismo. Enquanto o primeiro é mais focado no consumidor e naquilo que ele quer ouvir para criar uma relação mais emocional, com métricas voltadas para o desempenho de marca; o ativismo não olha para o consumidor como aquele que provoca a mudança, as métricas são voltadas para o avanço da causa em si e para as necessidades do território. Montar uma estratégia de ativismo demanda pensar três grandes pontos: se as ações de campanha estão de fato fazendo a causa avançar; qual é o vínculo construído com quem está na ponta, com a sociedade civil organizada; e qual é a argumentação utilizada – ela é baseada em dados e fatos? Tem profundidade? A linguagem está adequada?

Percival Caropreso, fundador da Setor 2 ½ Comunicação, fala sobre como engajar indivíduos para que eles se sintam parte da solução, “o que a gente tentou fazer foi com que as pessoas se apropriassem e percebessem que essas temáticas globais já aconteciam na vida de cada um dos brasileiros, expressando-se materialmente de maneiras diferentes”, completa. Ele acredita que falta um pouco dessa visão de ‘eu também pertenço ao mundo’ e que as nossas Fórum de Advocacy e Impacto | Segundo Dia

61 responsabilidades são do tamanho dos nossos privilégios. “Em um mundo tão injusto, desigual e desequilibrado, quem tem onde morar, comer, estudar e conviver, tem que dar uma contrapartida para o lugar onde ela mora, ser parte da solução e deixar de ser parte do problema”, finaliza.

Seguindo a mesma lógica de raciocínio, as empresas possuem um papel central de colaboração. “Então, companheiro empresário, se você quer que o seu negócio prospere, ajude a corrigir a sociedade da qual ele sobrevive, no ambiente que está sendo dizimado”, expõe. É essa a categoria da sociedade que têm o poder de influenciar o meio político, pois é ela que possui dinheiro, recursos e capilaridade, seus produtos chegam todos os dias a milhares de lares e existe uma proximidade emocional com o consumidor. “Ou seja, eles têm a obrigação de fazer alguma coisa, se não for por consciência, que seja por interesse de negócio”, conclui.

Caropreso levanta, por fim, dois pontos de reflexão necessários para o avanço efetivo das causas socioambientais: “primeiro precisamos nos perguntar onde estamos errando, porque quarenta anos se passaram e nós não conseguimos nada. E em segundo lugar, é preciso entender que a comunicação de advocacy funciona em doses homeopáticas, levam tempo, mas nós não temos esse tempo, as mudanças climáticas estão caindo na nossa cabeça. Ou seja, precisamos encontrar uma forma de ter esse tempo e dar esse tempo, para chegarmos a soluções estruturantes e não pontuais”, acrescenta. “Trabalhar para resolver o problema, e não para apontar o dedo na cara uns dos outros, é um caminho que tem se provado bacana para isso”, encerra.

Carolina Pasquali | Percival Caropreso Rodrigo Santini | Elisa Prado

62 Pensar a comunicação com foco nas causas, não nas instituições, e trazer esse pensar para o início dos processos; Verificar a clareza das mensagens, garantindo um Call to Action efetivo e possível de ser realizado; Segmentar os diferentes públicos de acordo com o nível de informação e as barreiras de engajamento; Ficar de olho nos feedbacks e voltar atrás para melhorar os processos sempre que necessário; Ter um propósito e um posicionamento claros, trabalhando com transparência e iniciando movimentos sempre pelo lado de dentro, para garantir um discurso consistente; Ter em mente que não é possível agradar a todo mundo e focar os esforços nos stakeholders mais centrais e decisivos da causa; Garantir um bom relacionamento com a sociedade civil organizada e a qualidade das informações utilizadas em campanhas; Fazer com que as pessoas e organizações compreendam as suas responsabilidades individuais diante dos problemas globais e incentivar o trabalho conjunto em busca de soluções.

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63 DA RESPONSABILIDADE SOCIAL AO IMPACTO SOCIAL: ADVOCACY POR UM NOVO CAPITALISMO Finalizando o segundo dia de evento, os convidados do último debate discutiram o papel de negócios de impacto na transformação social de países precários e desiguais, cogitando a possibilidade de uma nova forma de capitalismo.

Ela acredita que o novo capitalismo vem com a ressignificação de valor e de sucesso. “Eu acho que o trabalho de todos nós tem sido não só gerar melhores negócios, mas gerar melhores pessoas. A gente como sociedade precisa pensar no que que a gente quer valorizar, no que a gente quer fortalecer, e admitir as coisas que a gente precisa admitir, também, sobre as nossas responsabilidades”, conta. Uma evolução já está acontecendo: até pouco tempo atrás, era comum empreendedores falarem que se interessavam por aplicar negócios de impacto, mas seus investidores não permitiam, e hoje já existem inclusive até fundos dedicados a isso, além de ter sido aprovado um Marco Legal para as startups, um grande passo para a formalização de negócios de impacto.

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EBATES

Quando se começou a falar sobre negócios de impacto há 20 anos atrás, a primeira ideia que se teve foi que eles seriam uma evolução natural das organizações sem fins lucrativos, mas Maure Pessanha, co-empreendedora da Artemísia, acredita que são estratégias bem diferentes. “Dentro de uma estrutura de negócio, os empreendedores têm muito mais controle do capital e conseguem atrair equipes oferecendo recompensas, mas uma organização da sociedade civil consegue chamar a atenção para causas e tem mais facilidade de mobilização”, acrescenta. “Então, acho que são frentes paralelas e que hoje em dia a gente tem atuado muito mais em coalizões, em alianças independentes da estrutura jurídica, e eu acredito que essa é a chave para a transformação”, conclui.

64 Pessanha reitera a necessidade de atuar em rede, em equipe, e afirma que o sucesso desse trabalho depende de um bom alinhamento: um objetivo único para todos os envolvidos, prioridades bem estabelecidas, uma linguagem comum, uma agenda compartilhada e uma comunicação continuada. “Outro fator fundamental é propiciar um arranjo com atividades que reforcem uns aos outros, gestores trabalhando como mentores de empreendedores e vice-versa, uma interação de culturas”, declara. Isso garante a estrutura de governança, o fluxo de informação e a transparência na utilização de recursos.

Mariana Fonseca, cofundadora da Pipe Social, acredita que os dois maiores desafios para esse formato de parceria são: a nomenclatura, ou seja, ampliar o acesso a informações de qualidade e fazer com que as coisas ditas tenham os mesmos significados para todos os envolvidos; e trabalhar os cases de negócios de impacto de ponta a ponta, entendendo como funciona o ecossistema, metrificando ações e entendendo como os variados atores podem apoiar da maneira mais efetiva, sejam eles negócios, institutos, fundações, organizações sociais, grandes empresas, corporações ou pessoas físicas.

“Usando dessa força de inovação que são os negócios sociais e negócios de impacto, acho que a conversa sai da porta para fora e começa a ser da porta para dentro, gerando mais riquezas para o mercado de impacto, ao mesmo tempo em que gera soluções para essas grandes empresas, que têm um desafio enorme, mesmo que seja apenas uma questão de marketing, de inovar nesse sentido”, expõe. “São grandes navios a serem manobrados e acho que a gente que trabalha nesse universo tem um pouco das respostas”, acrescenta. Por fim, aponta que mercados em desenvolvimento são ótimos cenários para desenvolver negócios de impacto. “Se você olhar para a França, para o Canadá e até para os Estados Unidos, você tem alguns micro desafios, ou microproblemas para testar e pilotar.

Mas olhando para o Brasil, onde 85% dos alunos são de escola pública, por exemplo, educar se torna um incrível mercado para testar inovação tecnológica e impacto de ponta”, elucida.

Nesse cenário, Carlos Humberto, CEO e fundador da Diaspora.Black, entende que o Estado tem um papel de incentivar esse setor empresarial de impacto, minimi-

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65 zando as burocracias e sobretudo as tributações. “Tem que haver um fomento para quem gera benefícios sociais e resolve problemas da comunidade. Nós estamos vivendo transformações muito intensas e com uma velocidade muito grande, e essa complexidade gera novos problemas. O mais bacana de tudo isso é que a tecnologia pode ter um papel social na redução dessas adversidades”, afirma.

Ele destaca também a importância de trazer à atenção para as periferias, “porque no meio de tantos problemas sociais, existe um manancial de ideias e iniciativas que podem solucionar não só os problemas vividos na pele, como também trazer benefícios para a economia brasileira”, revela.

Em contrapartida, os empreendedores têm o papel de contribuir com a elaboração de políticas públicas, auxiliando na estruturação de modelos, fornecimento de material de pesquisa, desenvolvimento de fomento às ferramentas disponíveis, acesso a crédito e práticas de governança. Quanto à inciativa privada, ele acredita que cabe o papel de aceleração dos negócios de impacto: “se você é uma grande corporação, você tem o compromisso de promover a economia do país ou território onde você está inserido, para além de gerar o próprio lucro, mas promover a fertilidade dos negócios e do próprio ecossistema empreendedor”, declara.

Nesse sentido, Célia Cruz, diretora executiva do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), dá o exemplo da Política Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto, que foi instituída por Decreto Presidencial em 2017 e teve o envolvimento de mais de 500 pessoas em sua elaboração. O documento especifica como que o governo pode fazer o seu papel de fomento, regulamentação e fiscalização dessas atividades econômicas de impacto. Entre as sugestões, estavam comprar iniciativas, fomentar estruturas de aceleração e incubação, priorizar a pesquisa científica nas universidades, atuar como investidor, através de um BNDS, por exemplo, além de criar programas de instrução para que estados e municípios tenham suas próprias políticas.

“Acho que a gente está vendo crescer essa possibilidade de alocar nossos orçamentos e investimentos em negócios que estejam, de fato, resolvendo problemas sociais”, conta Célia.

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66 CHECKLIST: ECOSSISTEMAS DE IMPACTO Formar coalizões que consigam abranger os mais variados tipos de instituições; Ampliar o acesso a dados e informações de qualidade; Unificar a nomenclatura e garantir que todos estão falando a mesma língua; Explorar as formas mais eficientes de atuação para cada tipo de instituição; Realizar programas de trocas de conhecimento sobre as especialidades dos diferentes atores; Direcionar o governo para uma atuação que reduza burocracias e tributações e auxiliar na elaboração de políticas públicas eficientes; Direcionar esforços de incubação e fomento para as periferias.

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69 DIASPORA.BLACK: UM PRESENTE QUE RESSIGNIFICA O PASSADO “Diáspora, pra gente, representa a ocupação, territorialidade, da população descendente dos africanos que se espalharam por territórios do mundo inteiro, trazendo grandes contribuições na cultura, na língua, nos códigos sociais e nos valores que foram construídos em todos esses países”, conta Carlos Humberto, CEO e fundador da Diaspora.

Black. A empresa é especializada no que ele nomeia afroturismo e tem como principal objetivo reparar o apagamento histórico da memória negra, agregando experiências de turismo, cultura negra, treinamentos e atividades on-line para quem desejar aprender um pouco mais sobre a cultura e o legado da comunidade negra.

O Brasil é o segundo país mais negro do mundo fora da África, e isso traz muitos desafios visíveis e inegáveis de racismo estrutural, mas Humberto acredita que por trás de cada desafio existe uma oportunidade, “não só relacionada à invisibilidade e ao desconhecimento dessa produção cultural patrimonial desses valores e riquezas, mas também existe um contraponto do próprio mercado de turismo, que tende a crescer”, aponta. “O Brasil, hoje, recebe menos turistas do que as Ilhas do Caribe, sendo que o que as pessoas buscam no Caribe nós temos aqui, no litoral continental, somados à riqueza ambiental e cultural. Então, temos a oportunidade de promover o conhecimento e realmente fazer pontes, para que todas as pessoas possam experienciar esses patrimônios e para que esses patrimônios possam dar melhores condições para essa população”, conclui.

Mariana Fonseca | Maure Pessanha Célia Cruz | Carlos Humberto

71 INFLUÊNCIA E ARTICULAÇÃO: NEGÓCIOS DE IMPACTO NA AGENDA GOVERNAMENTAL

A grande premissa para a existência dos negócios de impacto é o fato de que estruturas de mercado podem trazer soluções para problemas sociais e ambientais, sendo protagonistas das mudanças.

“Eu entendo que a atividade econômica não precisa ser enxergada como problema e nem apenas como solução, a solução pode estar dentro do que é enxergado como um problema”, explica Rachel Karam, coordenadora do grupo jurídico do Sistema B Brasil. “Mas precisamos entender também que esse não é um movimento voluntário, principalmente no tempo em que a gente tem e no prazo que precisamos”, acrescenta. O ideal seria que cada empresa do país tivesse, em seu quadro de diretores, alguém com foco em impacto e, atrelado ao comitê administrativo, um comitê de stakeholders consultivo.

“Os instrumentos hoje dedicados a um campo específico precisam contaminar a economia como um todo, para que a gente possa encontrar fontes de recursos voltadas para o bem-estar da sociedade e do planeta”, declara. Uma vez que não é questão de escolha, essa mudança precisa vir com um caminho normativo e firme, para que ela possa acontecer de maneira rápida e efetiva. “É preciso enxergar a utilidade da norma posta, temos que olhar para esse universo, de negócios de impacto, compreendendo qual a importância de se ter uma lei”, aponta.

Primeiramente, não permitir o esvaziamento de conceitos, “quando cada um tem sua versão sobre o assunto, esse conceito se esvazia no tempo, é natural, então a gente precisa de um conceito jurídico, Fórum de Advocacy e Impacto | Terceiro Dia

MPACTA MUNDO

O último quadro do eixo Impacta Mundo abordou o cenário legislativo brasileiro de negócios de impacto, com a apresentação dos principais desafios e estratégias utilizados para trazer esse tema à agenda governamental.

72 para dar segurança pra quem está falando em promover uma infraestrutura normativa para esse desenvolvimento”, elucida.

Em segundo lugar, ela é a ferramenta para corrigir as falhas de mercado, ampliando a transparência, reduzindo a assimetria de informações, padronizando relatórios de impacto e prestação de contas, e até com uma harmonização da forma de entender a atuação das empresas.

“Filosoficamente, a gente tem que olhar a questão normativa sob o aspecto de remover obstáculos e preencher lacunas. Não acho que seja necessário reinventar a roda, não é a experiência que a gente vê em outros países”, coloca. Karam indica que duas ações importantes nesse sentido são: uma qualificação jurídica que, ao mesmo tempo, abarque todos os tipos de sociedades legais existentes e não engesse um campo que está em plena expansão; e a criação de um sistema nacional que sirva como local de integração de todas as estratégias, para potencializar os avanços municipais e estaduais, além de todas as outras frentes.

Sobre a questão tributária, o Sistema B acredita na manutenção de imunidades e isenções tributárias para as organizações da

sociedade civil que queiram ou tenham participação societária em negócios de impacto. “O terceiro setor pode muitas vezes usar os negócios de impacto como fonte de receita e mesmo como um caminho para a realização da sua missão”, afirma. “A gente teve uma resposta negativa, no sentido da não manutenção, mas essa é uma discussão que pretendemos continuar e instrumentalizar cada vez mais as organizações que desejem fazer isso, porque entendemos que esse é um obstáculo que precisa ser removido para abrir toda uma fonte de receita e novos produtos financeiros que envolvam a participação do terceiro setor”, completa.

Marcos Vinicius Souza, servidor do Ministério da Economia e presidente do Conselho de Administração do Instituto de Pesquisa Tecnológica (ITP), aponta três grandes papeis do Estado nessa história: facilitador, criando novas áreas, políticas, órgãos e organizações para apoiar esses negócios e educar os mais variados públicos sobre lógica de impacto, criação de estratégias nacionais e mobilização de ações dentro do próprio governo; participante, investindo em fundos destinados a impacto e

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73 realizando compras públicas ou contratações de ferramentas e negócios; e, por fim, regulador, produzindo normas, leis e regulações para esse setor emergente. “É basicamente se questionar como eu posso transformar essa ideia em uma coisa mais barata, mais rápida, com melhor qualidade, com mais gente sendo atendida e mais usuários satisfeitos?”, esclarece.

Entre os principais desafios enfrentados, estão a falta de conhecimento sobre inovação, que gera uma baixa importância sobre o tema dentro das instituições, e conciliar o alto risco dos projetos com timing político. “Pouca gente entende do que estamos falando. Querendo ou não, a gente tem que fazer um trabalho interno de advocacy, até de evangelização mesmo, porque é preciso mobilizar diferentes áreas do governo que não têm a mínima ideia ou até interesse no que é inovação, às vezes até são negócios de impacto e não sabem”, conta. “Justamente por ser mais novo, é preciso realizar muitos testes, pilotos na hora de desenvolver programas, mas muitas vezes esse desenho não é compatível com as expectativas dos governantes, que querem fazer tudo o mais rápido possível e em larga escala”, conclui.

Medir o sucesso e o avanço do setor como um todo também é muito importante para a efetividade do planejamento, e, para isso, o IPT tem utilizado duas metas: capital e escalação. Por um lado, se calcula quanto que está sendo direcionado para negócios de impacto, seja através de equidade, participação acionária, doação, crédito, documento de dívida ou não reembolsável. Então, você identifica quanto que está disponível e quanto disso está chegando na ponta de atuação, desburocratizado e com eficiência. Já pela outra frente, são contabilizadas as quantidades de negócios de impacto, aceleradoras, incubadoras, instituições de apoio e universidades com pesquisas na área de inovação e impacto. Também são avaliados os números de pesquisas, publicações e treinamentos sobre o assunto.

A ideia é entender o quanto o tema está enraizado na sociedade.

“Enquanto a gente estiver falando de um conjunto de 1.200 empresas, a gente vai ser nicho, e como nicho vamos ser tratados. Por isso, eu acho e avalio que o maior desafio para a agenda de políticas públicas é criar condições para que a quantidade de empreendimentos com Fórum de Advocacy e Impacto | Terceiro Dia

74 propósito social e ambiental aumente significativamente”, reforça Lucas Maciel, coordenador da Estratégia Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto (ENIMPACTO), que atualmente une 16 órgãos públicos e 10 privados. Para auxiliar nessa tarefa, o setor corporativo empresarial necessita de um conjunto de regras que facilitem a questão da comunicação sobre impacto e que seja capaz de influenciar os consumidores no processo de tomada de decisão.

Também é importante padronizar métricas e parâmetros de avaliação de impacto, para facilitar a comparação entre as empresas e conseguir medir com maior precisão a relevância econômica do setor. “Acho que o movimento mais promissor tem sido nessa questão da monetização do impacto, construindo ferramentas que conseguem converter para moeda o impacto socioambiental gerado”, comenta. “O Brasil tem um claro descompasso entre o tamanho da economia e a fatia do nosso Marketing Share: ele está entre as 11 maiores economias do mundo, mas representa menos de 1% do investimento global em impacto, então a gente ainda tem muito espaço para crescer”, completa.

O resultado de todas essas iniciativas é o aumento de capital, o aumento das organizações intermediárias, e o aumento e melhoria do ambiente institucional e normativo. Porém, é preciso ter em mente que é uma tarefa coletiva. “A importância do advocacy, e mais do que isso, da participação social é enorme. Eu acredito que uma política pública legítima é aquela que é socialmente respaldada, e acho que além da questão da legitimidade, o diálogo propicia que o problema seja melhor compreendido e qual é a melhor abordagem de solução. Quando conversamos, erramos menos”, conclui Maciel.

Marcos de Souza | Rachel Karam | Lucas Maciel

75 CHECKLIST: INFLUÊNCIA E ARTICULAÇÃO Fortalecer o setor de negócios de impacto no Brasil exige um trabalho conjunto e organizado, que abarque todas as seguintes frentes: Engajar o setor privado a se comprometer com ações de impacto dentro de suas organizações; Capacitar a sociedade com informações de qualidade sobre inovação e empreendedorismo socioambiental; Direcionar políticas públicas e ações governamentais que conceituem adequadamente a atividade e promovam uma infraestrutura adequada para o desenvolvimento do setor; Avaliar a questão normativa para remover obstáculos e preencher lacunas; Movimentar a máquina pública para a criação de uma qualificação jurídica e um sistema nacional; Garantir que a verba recolhida seja direcionada até as pontas de atuação de maneira eficiente e desburocratizada; Padronizar as métricas e parâmetros de avaliação de impacto; Fomentar a criação de negócios de impacto, aceleradoras, incubadoras e instituições de apoio, assim como incentivar pesquisas, publicações e treinamentos sobre o assunto.

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76 A AGENDA DE IMPACTO NA REALIDADE LOCAL O quadro Cases & Causas do terceiro dia apresentou um panorama da situação regional do setor de impacto no nordeste e no sudeste, além de debater as metodologias de inserção e expansão de atividades.

O Rio de Janeiro, por exemplo, estado em que trabalha, possui grandes ativos ambientais e está economicamente bem centralizado como polo industrial, empresarial, acadêmico e cultural. Porém, quando se trata de indicadores sociais, seu quadro se aproxima muito mais do Nordeste do que da Região Sudeste. “O Rio possui uma taxa de tuberculose dentro da Rocinha, que está praticamente do lado do Leblon, nosso metro quadrado mais caro, e pessoas na cidade com a renda familiar per capita de 37 reais. Tem a questão da milícia e do tráfico em paralelo, a questão política institucional é muito complicada... Então, é um cenário de oportunidades e necessidades, o que, para os negócios de impacto, é a mistura perfeita”, revela.

“Perfeita é um modo de dizer que por trás dos nossos problemas, estão as nossas maiores potências”, acrescenta.

O estado pode contar, por exemplo, com empresários e empreendedores que convivem diariamente com essa realidade, conseguindo trazer soluções mais precisas e ao mesmo tempo com acesso a Fórum de Advocacy e Impacto | Terceiro Dia

ASES E CAUSAS

“A primeira coisa que eu trago aqui é que: apesar de sermos tão distintos enquanto territórios, nós trazemos os mesmos desafios enquanto campo de impacto social”, afirma Carla Panisset, coordenadora de promoção de negócios de impacto social, empreendedorismo na base da pirâmide, inclusão produtiva e apoio às minorias no Sebrae. “Como estamos falando da resolução da sociedade, não dá nem pra deixar ninguém para trás, nem para dispensar novos formatos ou importar práticas que não fazem muito sentido para nós”, completa, apontando que é preciso o envolvimento e engajamento dos três setores - o público, o privado e o 3º setor - na busca pelas soluções mais eficientes para cada cenário.

77 estratégias eficientes para capitação de recursos. Enquanto isso, a máquina pública está acostumada a lidar com atores de pensamentos extremamente opostos e irredutíveis em suas demandas, o que requer um alto nível de diplomacia e moderação, ambos cruciais para a solução das demandas socioambientais. Onde há ecossistemas fortalecidos, o governo está exercendo um papel importante, tanto regulatório quanto investidor. O Rio de Janeiro foi o segundo estado, depois do Rio Grande do Norte, a aprovar uma legislação de investimento em negócios de impacto, inclusive com um plano de metas. “A gente não conseguiu criar o comitê estadual, mas só o fato de a gente ter uma legislação já permitiu a alocação de recursos no setor pelo Fundo Nacional de Pesquisa”, coloca Panisset.

No Nordeste, as principais atividades trabalhadas por negócios de impacto são a escassez de recursos hídricos, a questão dos resíduos, a demanda por energia limpa, a evasão de jovens do mercado de trabalho e o oligopólio agrícola; todas através de iniciativas com economia criativa e cooperativismo. “Acho que o primeiro obstáculo que a gente tem que superar é a questão da comunicação, mostrar para o Brasil e para o mundo essas iniciativas, quem são os dinamizadores, como os governos estão abordando a questão... Porque sem esse conhecimento, fica muito difícil trazer oportunidades e investidores”, aponta Marcello Santo, diretor fundador da Plataforma Impacta Nordeste e cofundador da Motirô.

Em seguida, ele acredita que um segundo passo é estimular novas empresas de impacto na região: “82% desses negócios estão em estágios iniciais, a gente tem o desafio de capacitar esses empreendedores e estimular o surgimento de novos, e também oferecer o investimento semente, porque para a maioria essa não é uma realidade possível”, explica. Por fim, é importante desenvolver uma articulação multisetorial, estimulando parcerias com empresas privadas, diferentes instâncias do governo, organizações do terceiro setor e instituições de apoio. “A gente não faz nada sozinho, então é muito importante esse trabalho de formiguinha, de sensibilização, porque a inovação social como um todo representa o caminho que a gente pode explorar para resolver os desafios do nosso país”, declara.

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78 Virginia Alfenas, cofundadora do Impact Hub Belo Horizonte, conta que, durante o período de pandemia, os municípios de Minas Gerais buscaram entender melhor seus desafios, quais são os setores envolvidos em cada um deles, além de e maneiras de cooperação entre eles. Por outro lado, as empresas tomaram consciência da sua parcela de responsabilidade e vêm direcionando recursos para apoiar as potencialidades locais. O estado também é o que possui a maior concentração de universidades públicas do país, com onze federais e três estaduais e, de dez anos para cá, tem investido no desenvolvimento de centros de inovação; capacitação de mestrandos e doutorandos para o desenvolvimento de tecnologias demandadas pelo mercado; e no diálogo entre empresas e academia.

“Esse ponto do desenvolvimento multisetorial representa muito do que Minas é hoje. Os programas foram desenvolvidos pensando como que a gente encaixa essa estratégia do estado com as nossas deficiências e desafios”, conta. “Muitos negócios de impacto, e aqui eles já se reconhecem assim, estão tendo a oportunidade de medir a abrangência das suas ações, de entender o ciclo social,

o impacto ambiental, como que isso tudo conversa e o que traz de benefício”, acrescenta. O mais importante desses movimentos, segundo Alfenas, é a criação de comunidades e redes que fortalecem as iniciativas. “Aí, pode trocar governo, trocar partido, pode trocar o que seja, que a força do programa continua”, comenta.

“Não é uma opção de governo manter ou não o programa, é uma necessidade da comunidade”, completa.

“Eu acho esse espaço de troca muito necessário, para a gente não precisar perder tempo em reinventar a roda. Então, é importante conhecer o que o outro está fazendo, o que já tem pronto, quais são as experiências...”, acrescenta. Um exemplo de sucesso é o Porto Digital, uma política pública definida por leis estaduais e municipais de Pernambuco e da cidade do Recife, que tem por objetivo criar um ecossistema de negócios de tecnologia de informação de classe mundial e, ao mesmo tempo, recuperar o centro histórico da capital mais antiga do Brasil. As ações também ampliaram a procura por cursos superiores de informática, trazendo as notas de corte do vestibular para valores próximos aos cursos estrelados, como medicina e direito.

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79 “O futuro é mediado por tecnologia e com ele virá um número gigantesco de oportunidades e possibilidades de desenvolvimento pessoal, econômico e social. Hoje, você tem inúmeros setores articulados ao redor disso”, informa Silvio Meira, cofundador da TDS Company e presidente do Conselho de Administração do Porto Digital. O Núcleo de Gestão do Porto Digital faz permanentemente uma articulação com organizações de promoção do setor de tecnologia e inovação e organizações que promovem a criação e evolução de novos negócios digitais. Além disso, realiza um trabalho de atração das universidades para os problemas do Porto Digital e interage com as secretarias de Administração, de Ciência e Tecnologia, de Educação e de Desenvolvimento do estado e do município, tentando levar esse vetor de desenvolvimento para o interior.

“Os fatores críticos para que um arranjo como o Porto Digital dê certo são mutantes no tempo e com partidas extremamente complexas, mas exigem, principalmente, uma coisa que está em

falta no Brasil há séculos: pensar no longo prazo”, defende. “A gente começou o projeto do Porto em 2000 com um plano de 25 anos e ele vai dar errado, o que é fantástico!”, acrescenta. As métricas foram todas traçadas para um cenário de economia deprimida, com grandes desafios estruturais para aquecimento, mas, nesse tempo, Pernambuco redesenhou sua dinâmica muito mais rápido do que o imaginado pelos economistas. Por um lado, as metas percentuais se tornaram inatingíveis, por outro, os montantes de capital financeiro e humano superaram as expectativas.

“A gente saiu do zero para R$2,85 bilhões de faturamento, com 350 empresas, 800 empreendedores, 13.500 trabalhadores e representando 5% do PIB de Recife”, apresenta. E isso, sem contar os avanços educacionais nas escolas públicas da cidade, com a construção de laboratórios de informática e o oferecimento de cursos, para ampliar o acesso dos mais necessitados às faculdades de tecnologia, e a revitalização do centro histórico.

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80 “É tão duro a gente ver negócios que destroem tão intensamente o ambiente ao nosso redor, causando um impacto negativo gigantesco, e por isso a gente tem que entender que é preciso pensar no longo prazo e é preciso pensar em sustentabilidade. Uma das minhas esperanças é que algum dia, a vasta maioria dos negócios será de impacto”. Silvio Meira

EBOOK: O QUE É ESTRATÉGIA Livro escrito por Silvio Meira, cofundador da TDS Company e presidente do Conselho de Administração do Porto Digital. Disponível gratuitamente na Amazon, aborda o que é estratégia e como se deve pensá-la do ponto de vista da sustentabilidade e da economicidade. “É um livro que dá para ler em uma hora, mas não dá para entender em uma hora. É preciso ao menos um ano de prática para entender porque temos que pensar estratégia como sendo o processo de transformação de aspirações em capacidade”, comenta o autor.

Silvio Meira | Carla Panisset Marcello Santos | Virgínia Alfenas

81 CHECKLIST: A AGENDA DE IMPACTO NA REALIDADE LOCAL Divulgar os projetos e negócios de impacto já existentes; Capacitar empresários, funcionários públicos e a população em geral sobre economia de impacto; Incentivar o surgimento de novos projetos; Elaborar uma formalização legal para o setor; Levantar os diferentes setores envolvidos em cada um dos problemas trabalhados pela agenda local, assim como os diferentes atores e instituições que poderiam auxiliar de alguma forma, possibilitando e ampliando o diálogo entre eles; Fomentar pesquisas acadêmicas alinhadas com as necessidades da agenda; Construir redes e comunidades em torno de cada um dos problemas; Elaborar planos de longo prazo, que tenham independência das trocas políticas periódicas.

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82 MULHERES NA LIDERANÇA DE MUDANÇAS ESTRUTURAIS O último debate do evento abordou a importância de se ter mulheres ativas e em cargos estratégicos, tanto na política quanto na liderança de movimentos da iniciativa privada, além de trazer reflexões sobre a participação da população como um todo nas mudanças estruturais do país.

“Só a união entre todos nós diminuirá a desigualdade social. Não adianta só dar cesta básica: é preciso deixar um legado”, declara Luiza Helena Trajano, presidente do Conselho do Magazine Luiza e presidente do Grupo Mulheres do Brasil. Ela aponta que, em uma democracia consolidada, somos todos seres políticos. “É momento de atitude, sair de diagnóstico, de opiniões de um lado ou de outro e lutar pelas coisas que a gente precisa. Eu acho que é muito importante e indispensável essa união entre os dois, o público e o privado, e entre a sociedade civil. Através desse grupo forte que trabalha, que faz acontecer, é que a gente vai poder mudar o país”, acrescenta.

“A pandemia mostrou para os empresários do Brasil a força das empresas brasileiras, porque elas têm”, conta. Ela explica que a maioria dos empresários vieram do simples, enfrentaram a desigualdade social e venceram, mas que é preciso assumir responsabilidades com a sociedade. “Eu não sou candidata a nenhum cargo político, Fórum de Advocacy e Impacto | Terceiro Dia

EBATES

Ao olhar para os desafios de países que sofrem com péssimos indicadores sociais, econômicos e ambientais, fica claro que a solução de problemas estruturais tão profundos e complexos exige a participação ativa da sociedade civil, tanto na discussão política quanto no engajamento de políticas públicas. É preciso entender que é possível realizar mudanças, mas que elas são demoradas e dependem de estratégias conjuntas e de longo prazo, que englobem o máximo de pontos de vista e proporcionem um debate construtivo em busca de objetivos comuns, permitindo o comprometimento de todos os envolvidos na implementação.

83 mas sou uma política desde menina e tenho o maior grupo político apartidário do mundo, com 97 mil mulheres”, complementa. Diante de momentos tão difíceis, como os dos últimos dois anos, fica clara a necessidade de unir forças e agir.

“Essa atitude de ‘é pra já’ vem muito do feminino e está em falta na política. Está dentro de nós, é orgânico, tem a ver com a gestação, os homens são mais mecânicos”, revela. Trajano é a favor da união de forças femininas e masculinas nos conselhos e equipes executoras de projetos, assim como nos parlamentos e cargos decisórios, reforçando que as mulheres precisam se juntar para ocupar esses espaços. “É preciso sair do ‘isso é injusto’ e ir para a prática”, conclui.

“Eu me sinto uma estranha no ninho quando estou fazendo parte de conselhos, o esporte ainda é muito comandado por homens, feito por homens, então, nosso caminhar é muito lento”, compartilha Magic Paula, vice-presidente da Confederação Brasileira de Basquete.

“Assumo que minha experiência foi, no início, desesperadora, mas apaixonante. Acredito muito nessa questão de química, do objetivo rápido do homem e da sensibilidade da mulher, às vezes a gente enxerga questões que eles não visualizam”, acrescenta.

Ela acredita, contudo, que apesar das questões de gênero, o maior desafio da sua pauta é que, quando o problema é ter comida na mesa das pessoas, o esporte acaba perdendo a prioridade na agenda.

“A gente ainda não tem uma política para executar nosso trabalho, muitas vezes tentamos substituir o poder público sobrecarregando as entidades”, explica.

Paula também pontua que é preciso fortalecer os municípios para se ter um país forte, incentivando as pessoas da base, da ponta, a acreditarem nos seus potenciais. “A gente tem que investir nas pessoas, sempre. Se a gente fortalece as pessoas, vamos ter uma nação forte”, complementa Fernanda Camargo, sócia cofundadora da Wright Capital. “Eu ando pelo país pensando em quanta gente estamos deixando para trás. Será que é só o governo mesmo que pode fazer alguma coisa? Será que o privado não pode agir? E eu acho que essa é a nossa batalha, trazer mais gente para ajudar”, conclui.

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84 Ela afirma que é preciso mais compaixão e vontade de olhar para o outro. “Vai fazer 30 anos que estou no mercado financeiro e acho que a gente se afastou do ser humano. A gente vê números, retorno, risco, mas não quer saber o que está acontecendo na ponta”, declara. “Acho que a gente precisa sair desse lugar de achar que podemos ficar preocupados, mas que não tem nada que possamos fazer, porque por menor que seja, tem alguma coisa”, completa.

Camargo reitera que nem sempre o resultado vai ser visível para a nossa geração, mas que mesmo assim é importante se movimentar.

De maneira otimista, ela comenta que tem percebido um interesse maior, tanto das empresas quanto de organizações da sociedade civil, em relação ao envolvimento com a política, perdendo o medo de dialogar com essa esfera.

“Os homens aprendem a disputar o poder e exercer ele de uma maneira que nós não, e nós precisamos aprender a fazer isso também!

O poder é muito bom e pode ser exercido para coisas boas, no setor público você tem essa caneta”, complementa Leany Lemos, diretora-presidente do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). Ela levanta também que o governo de fato é o ator que consegue causar o maior impacto socioambiental, mas que ele não existe sozinho, é formado por representantes para atender as demandas legítimas da sociedade. Por isso, para consolidar a democracia, é muito importante a gente entender o papel do Estado e participar.

“A gente lida muito com o conceito de escassez, de tempo, de ferramentas, às vezes de pessoal, com instituições que precisam ser aperfeiçoadas, tudo em um ambiente onde é necessário saber priorizar, organizar e entregar resultados para a sociedade”, revela, apontando que o importante não é reduzir a rotatividade política, porque isso é necessário para dar voz para quem necessita, mas sim ter constância no corpo administrativo responsável pelas entregas.

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85 Por fim, aconselha mulheres que desejam adentrar a carreira pública: “é preciso enxergar mulheres como pessoas que devem estar no poder tomando decisões, mas ninguém vai colocar o tapete vermelho para a gente passar. Não vamos ser convidadas, e a disputa é assim. Então, se é seu sonho, sua vocação, lute por ela”, conclui.

CHECKLIST: MULHERES NA LIDERANÇA DE MUDANÇAS ESTRUTURAIS Fortalecer movimentos de ação conjunta, trazendo o máximo de participantes das três esferas de atuação: pública, privada e sociedade civil; Incentivar mulheres a perder o medo e se posicionar em papeis de liderança e na política, mesmo em ambientes desfavoráveis à sua presença; Educar a sociedade para enxergar mulheres em posições de liderança e sentir a necessidade de se ter elas por lá; Criar movimentos políticos voltados para mudanças estruturais, ao invés de direcionar esforços para ações e projetos sociais de pequeno porte e impacto imediato; Desenvolver projetos de advocacy para combater problemas estruturais, como a desigualdade.

Leany Lemos | Fernanda Camargo Luiza Trajano | Magic Paula

ENCERRAMENTO O grande objetivo do evento foi unir organizações, pessoas e iniciativas que pudessem chamar para a reflexão de que é preciso agir em conjunto para resolver os grandes problemas que assolam a nossa sociedade. Precisamos recuperar nossa humanidade, sentir indignação e também compaixão pelo próximo e pelo nosso planeta.

Durante as discussões, ficou claro que não são apenas os políticos eleitos que têm a responsabilidade de resolver os problemas socioambientais, nós como sociedade civil também precisamos nos movimentar, através da articulação e construção de redes de atuação nas searas que demandam mudanças estruturais. É preciso ter em mente que problemas complexos não possuem soluções simples e que quanto mais atores envolvidos, se escutando e estimulando o diálogo, mais robustas podem ser as estratégias e ferramentas de transformação. A mensagem que foi passada em todas as mesas é a de que essas discussões são importantes, contudo, o mais importante é trazer para a prática, pois apenas assim será possível atingir uma sociedade melhor.

SAIBA MAIS SOBRE OS CONVIDADOS E MEDIADORES

MEDIADORES Deise Nicoletto | Vitor Oliveira | Duda Scartezini | Inês Lafer João Marcelo Borges | Paula Miraglia | Daniela Castro