TCC arqurbuvv Requalificação da Zona Portuária de Vitória: O Caso dos Armazéns do Porto

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UNIVERSIDADE VILA VELHA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO

IGOR FABRES DEMARTINI

REQUALIFICAÇÃO DA ZONA PORTUÁRIA DE VITÓRIA: O CASO DOS ARMAZÉNS DO PORTO

VILA VELHA 2020


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IGOR FABRES DEMARTINI

REQUALIFICAÇÃO DA ZONA PORTUÁRIA DE VITÓRIA: O CASO DOS ARMAZÉNS DO PORTO

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Arquitetura e Urbanismo,

da

Universidade

Vila

Velha, com requisito para obtenção do título de Arquiteto e Urbanista. Professora Marconsini Arquitetura.

VILA VELHA 2020

orientadora D.

Sc.

Cynthia

Ciências

da


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DEDICATÓRIA

Dedico estre trabalho principalmente à minha família, minha mãe e minha tia que me apoiaram e incentivaram durante a vida e especialmente durante a faculdade. Também, aos meus amigos que sempre estiveram presentes em minhas evoluções e conquistas durante esses 5 anos. Dedico aos colegas de profissão e todos aqueles que acreditam na arquitetura como uma ferramenta que pode modificar e auxiliar no desenvolvimento da sociedade e na união das pessoas.


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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer principalmente à professora orientadora Cynthia, por sua paciência e esforço durante esse trabalho de conclusão e também pelos ensinamentos. Agradeço à todos os arquitetos que tive contato e pude trabalhar durante o curso, com certeza seus ensinamentos foram essenciais para minha formação. Agradeço aos colegas de curso, que me apoiaram e me incentivaram a seguir, obrigado pela companheirismo e pela amizade.


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Para abraçar o Sol E fechar os olhos Para falar de amor Deitar em seu colo Vim de outra cidade Eu sou da estrada, sou rosa Rosa no céu azul Te beijei os ombros Você que me contou Sobre os seus assombros Assombros de amor De lá do fundo do seu mar E sempre que eu pensar no meu bem Vou colorir o dia Faço o céu de rosa E ninguém vai duvidar da vida Sempre que eu pensar no meu bem Vou colorir o dia Eu faço o céu de rosa E ninguém vai duvidar da vida Para abraçar o Sol E fechar os olhos Para falar de amor Deitar em seu colo Vim de outra cidade Eu sou da estrada, sou rosa Rosa no céu azul Te beijei os ombros Você que me contou Sobre os seus assombros Assombros de amor De lá do fundo do seu mar E sempre que eu pensar no meu bem Vou colorir o dia Faço o céu de rosa E ninguém vai duvidar da vida Sempre que eu pensar no meu bem Vou colorir o dia Faço o céu de rosa E ninguém vai duvidar da vida A Cor É Rosa Silva Homenagem ao meu estado e a cidade de Vitória, ES.


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RESUMO O contexto da zona portuária da cidade de Vitória – ES é um espaço que concentra belezas naturais e históricas, adjacente ao centro urbano. Esta zona possibilitou, ao longo do tempo, o crescimento e desenvolvimento da capital, passando por diversas transformações morfológicas e estruturais. Este trabalho identifica que a atual situação de degradação e pouca utilidade, pode ser revertida com um projeto de revitalização para resgatar a vitalidade urbana do Centro. A utilização de seus armazéns como equipamentos públicos possibilitam diversidades de usos e ocupações, além de promover movimentação, economia, além de preservação da edificação existente, incentivo à cultura, conexão com o contexto urbano existente e com suas belezas naturais existentes. Este trabalho apresenta uma proposta projetual em nível de estudo preliminar para revitalização da zona portuária de Vitória com foco nos armazéns existentes. O resultado pretende fazer parte de um repertório de opções para o município de Vitória valorizar as edificações históricas do porto.


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ABSTRACT The context of the port area of the city of Vitรณria - ES is a space that concentrates natural and historical beauty, adjacent to the urban center. This area has enabled, over time, the growth and development of the capital, going through several morphological and structural transformations. This work identifies that the current situation of degradation and little use, can be reversed with a revitalization project to rescue the urban vitality of the Center. The use of its warehouses as public facilities allows for diverse uses and occupations, in addition to promoting movement, economy, in addition to preserving the existing building, encouraging culture, connecting with the existing urban context and with its existing natural beauty. This work presents a project proposal at the level of preliminary study to revitalize the port area of Vitรณria with a focus on existing warehouses. The result is intended to be part of a repertoire of options for the municipality of Vitรณria to enhance the historic buildings of the port.


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LISTA DE FIGURAS Figura 1: Evolução temporal da cidade portuária industrial ocidental. ......................15 Figura 2: O modelo Anyport de J. Bird. .....................................................................16 Figura 3: Planta baixa da Baía de Vitória, 1985, sem a infraestrutura portuária e aterros. ......................................................................................................................26 Figura 4: Obras dos Armazéns do Porto ...................................................................28 Figura 5: Obras dos Armazéns do Porto ...................................................................28 Figura 6: Localização Zona Portuária de Vitória ........................................................30 Figura 7: Porto de Vitória, implantação .....................................................................30 Figura 8: Porto de Vitória, vista aérea. ......................................................................31 Figura 9: Construção do primeiro armazém no Porto de Vitória, em 1927. ...............32 Figura 10: Construção do prédio 4, ao fundo o armazém e prédio 5, em 1959.........33 Figura 11: Construção do Armazém 4, 1959. ............................................................34 Figura 12: Armazém 4 e 5, sem o anexo...................................................................34 Figura 13: Localização dos Berços do Cais Comercial do Porto de Vitória. ..............37 Figura 14: Projeto do Portal do Príncipe. ..................................................................38 Figura 15: Projeto de BRT para a Grande Vitória. .....................................................39 Figura 16: Implantação do Projeto do BRT na zona portuária de Vitória. .................39 Figura 17: Proposta Conceitual da nova sede da CODESA......................................40 Figura 18: Planta baixa do Projeto do Centro de Memória do Porto. ........................41 Figura 19: Imagem interna do Projeto Centro de Memória. ......................................42 Figura 20: Imagem do projeto da praça em frente ao Armazém 1. ...........................42 Figura 21: Interior da Estação Porto. .........................................................................43 Figura 22: Evento na Estação Porto. .........................................................................44 Figura 23: Poligonal da Operação Urbana Consorciada Porto Maravilha. ................45 Figura 24: Implantação do VLT (Veículo Leve Sob Trilho). .......................................46 Figura 25: Espaços públicos ao longo da frente de mar. ..........................................47 Figura 26: Elevado Perimetral antes da demolição. ..................................................48 Figura 27: Área após a demolição do elevado perimetral, com trilhos do VLT, passeio público. ......................................................................................................................48 Figura 28: Pintura “Todos Somos Um”. .....................................................................49


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Figura 29: Museu do Amanhã, no Píer Mauá. ...........................................................49 Figura 30: Foto aérea de Puerto Madero, em relação à cidade de Buenos Aires. ....50 Figura 31: Área de Puerto Madero. ...........................................................................51 Figura 32: Projeto para Puerto Madero. ....................................................................51 Figura 33: Implantação do projeto de Puerto Madero. ..............................................52 Figura 34: Plano Mestre de Puerto Madero, diagrama de circulação e zoneamento. ..................................................................................................................................52 Figura 35: Divisão do projeto em 4 diques. ..............................................................53 Figura 36: Edificações e tipologias presentes no dique 2. ........................................53 Figura 37: Corte Transversal de Puerto Madero. ......................................................54 Figura 38: Desenho dos galpões do Porto. ...............................................................55 Figura 39: Galpão antes da revitalização. .................................................................55 Figura 40: Galpão após da revitalização. ..................................................................55 Figura 41: Fachada original do Entrepôt Macdonald, possuindo 617 metros de comprimento..............................................................................................................56 Figura 42: Plano diretor urbano que envolvia a região do armazém Entrepot Macdonald. ................................................................................................................57 Figura 43: Fachada do Entrepôt Macdonald, edificações projetadas acima da estrutura existente. ...................................................................................................................57 Figura 44: Salas comerciais no térreo e habitação nos pavimentos superiores. .......58 Figura 45: : Fachada com salas comerciais, edificações estudantis no pavimento superior em balanço. .................................................................................................58 Figura 46: Planta baixa da estrutura do armazém, após o projeto de revitalização. .59 Figura 47: Edificações habitacionais, com terraços jardim. .......................................60 Figura 48: Entrepot Macdonald. ................................................................................60 Figura 49: ZOE 4 – Porto de Vitória e Área de Estudo ..............................................62 Figura 50: Mapa de Zoneamento – Centro de Vitória ...............................................63 Figura 51: Usos Atuais no Centro de Vitória. ............................................................64 Figura 52: Diagnóstico Local. ....................................................................................65 Figura 53: Proposta de Revitalização da Zona Portuária ..........................................67 Figura 54: Implantação ..............................................................................................69 Figura 55: Projeto Aproximado do Parque ................................................................70 Figura 56: Implantação Humanizada Fonte: Autor ....................................................71


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Figura 57: Parque......................................................................................................72 Figura 58: Parque......................................................................................................72 Figura 59: Parque......................................................................................................73 Figura 60: Parque......................................................................................................73 Figura 61: Parque......................................................................................................74 Figura 63: Planta Baixa Térreo Armazém 4 ..............................................................74 Figura 64: Área Externa ............................................................................................75 Figura 65: Biblioteca ..................................................................................................76 Figura 66: Restaurante, áreas de estar, acesso ao mezanino ..................................77 Figura 67: Cafeteria ...................................................................................................77 Figura 68: Recepção, Administrativo, Cafeteria ........................................................78 Figura 69: Cafeteria, Biblioteca, Recepção e Administrativo .....................................78 Figura 70: Planta Baixa Mezanino Armazém 4 .........................................................79 Figura 71: Sala Multiuso ............................................................................................79 Figura 72: Salas Multiuso ..........................................................................................80 Figura 73: Corredor de Exposições ...........................................................................80 Figura 74: Corte Esquemático ...................................................................................81


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SUMÁRIO 1. SUMÁRIO ..........................................................................................................11 1.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS ..............................................................................6

1.1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................6 1.2

OBJETIVOS ......................................................................................................7

1.2.1 OBJETIVOS GERAIS ........................................................................................7 1.2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ..............................................................................7 1.3 METODOLOGIA ...................................................................................................7 1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO .............................................................................8 2. URBANISMO CONTEMPORÂNEO EM ÁREAS CENTRAIS.................................9 2.1

TENDÊNCIAS

NO

URBANISMO

CONTEMPORÂNEO

PARA

A

REQUALIFICAÇÃO DE ÁREAS CENTRAIS .............................................................9 2.2. EVOLUÇÃO DAS ZONAS PORTUÁRIAS ........................................................14 2.3. REQUALIFICAÇÃO EM ZONAS PORTUÁRIAS...............................................20 2.4 USO MISTO COMO POTENCIALIZADOR DE TRANSFORMAÇÕES URBANAS ..................................................................................................................................23 3. CONTEXTO HISTÓRICO......................................................................................25 3.1 CONTEXTO HISTÓRICO DA ZONA PORTUÁRIA DE VITÓRIA .......................25 3.2 REGIÃO PORTUÁRIA DE VITÓRIA E SEUS ARMAZÉNS ...............................31 3.3 PROJETOS PREVISTOS PARA A REGIÃO DE INTERVENÇÃO .....................37 3.3.1 Plano Mestre ...................................................................................................37 3.3.2 Projetos da Prefeitura Municipal de Vitória .................................................40 4. REFERENCIAIS PRÁTICOS ................................................................................44 4.1 PORTO MARAVILHA - RIO DE JANEIRO .........................................................44 4.2 PUERTO MADERO - BUENOS AIRES ..............................................................50 4.3 ENTREPOT MACDONALD - PARIS ..................................................................56


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5. PROPOSTA PROJETUAL....................................................................................61 5.1 ANÁLISE TERRITORIAL....................................................................................61 5.2 POSSIBILIDADES ..............................................................................................66 5.3 PROGRAMA .......................................................................................................67 5.4 CONCEITO .........................................................................................................68 5.5 DECISÕES PROJETUAIS ..................................................................................69 5.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................82 6. REFERÊNCIAS .....................................................................................................83


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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS 1.1 INTRODUÇÃO

As zonas portuárias, desde o primórdio da colonização, foram de extrema importância para a evolução e desenvolvimento das cidades. Essas zonas possibilitaram as trocas comerciais, além da criação de núcleos urbanos em suas adjacências e o intercâmbio cultural entre os povos, permitindo também a expansão populacional. Devido a expansão das cidades, a partir da revolução industrial, essas zonas portuárias acabaram perdendo parte de seu valor comercial e tornarem-se obsoletas, ficaram degradadas, criando uma problemática urbana. Neste cenário, percebemos que urbanismo contemporâneo e a valorização das relações socioespaciais são essenciais para a manutenção da qualidade de vida nas cidades, portanto alguns instrumentos como as reformas urbanas possibilitam a retomada da vitalidade urbana em algumas dessas regiões degradadas. Além disso, essas reformas defendem a preservação de edificações de interesse histórico, o urbanismo sustentável, a diversificação de usos e a densidade habitacional. Alguns desses instrumentos, como a revitalização, requalificação, contribuem diretamente para as melhorias da estrutura urbana, promovendo maior conexão dos usuários com a cidade, valorizando uma região e impulsionando as relações interpessoais. O contexto da zona portuária da cidade de Vitória – ES é um espaço que concentra belezas naturais e históricas, adjacente ao centro urbano. Esta zona possibilitou, ao longo do tempo, o crescimento e desenvolvimento da capital, passando por diversas transformações morfológicas e estruturais. Apesar de sua degradação e pouca utilidade, atualmente, os projetos de revitalização dessa região podem ser essenciais para a retomada das atividades. A utilização de seus armazéns como equipamentos públicos possibilitam diversidades de usos e ocupações, além de promover movimentação, economia, além de preservação da edificação existente, incentivo à cultura, conexão com o contexto urbano existente e com suas belezas naturais existentes.


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1.2 OBJETIVOS

1.2.1 OBJETIVOS GERAIS

O objetivo geral desse trabalho é propor um projeto para requalificação da zona portuária de Vitória e revitalização dos armazéns existentes como uma edificação pública-privada de uso misto que valorize a região e amplifique as relações espaciais com os usuários, além de servir como um equipamento urbano, atração turística e cultural, atraindo diversos setores da sociedade para a zona portuária.

1.2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Estudar o processo de evolução e requalificação das zonas portuárias; investigar o contexto histórico de formação do porto de Vitória; analisar estudos de casos brasileiros e internacionais que proponham a requalificação de áreas portuárias; propor a revitalização da região portuária através de projetos de intervenção.

1.3 METODOLOGIA

A metodologia utilizada para a confecção do trabalho foi a utilização de materiais como livros, artigos, teses e dissertações, além de sites da internet. O livro “Cidade para pessoas”, de Jan Gehl, foi bastante utilizado na confecção dos capítulos com a temática de urbanismo, planejamento urbano e diversificação de usos. Além desse livro, “Morte e vida nas grandes cidades”, de Jane Jacobs, norteou diversas temáticas abordadas, principalmente relacionadas ao uso misto, críticas ao urbanismo moderno e a cidade funcional, além de percepções da autora perante a vivência da cidade. Também foram utilizadas teses e dissertações que embasaram informações sobre evolução das zonas portuárias, a relação entre essas zonas com o contexto


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urbano e seu desenvolvimento, além da evolução da zona portuária de Vitória, em questão. Além desses materiais, também foram consultados legislações específicas relacionadas aos portos, como a Lei dos Portos, Lei nº 12.815/2013, além de sites da internet como Vitruvius, Archdaily. Os estudos de caso de alguns projetos como o de Puerto Madero (Buenos Aires), Porto Maravilha (Rio de Janeiro) e Entrepot Macdonald (Paris), foram utilizados para analisar o contexto de requalificação urbana de diferentes formas e regiões. O diagnóstico da área de estudo foi realizado através da análise de condicionantes urbanos e naturais existentes no contexto da região portuária de Vitória, além de questões socioculturais e de patrimônio. A proposição projetual parte da requalificação das edificações existentes na zona portuária de Vitória, melhorando suas estruturas, incentivando novos e diversificados usos, além de buscar a reconexão dessa área com o restante da cidade.

1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO

O primeiro capítulo apresenta a metodologia, os principais objetivos e justificativas, além do contexto de escolha do assunto abordado. O segundo capítulo contém uma breve passagem sobre a evolução do urbanismo em áreas centrais, também apresenta um estudo sobre a evolução e requalificação das zonas portuárias e o estudo sobre a importância da diversificação de usos e como ela interfere na territorialidade, principais referenciais teóricos para a realização desse estudo e desenvolvimento da proposta projetual. O terceiro capítulo é referente ao contexto histórico da região de estudo, que no caso é o porto de Vitória, contém estudos sobre sua evolução e também projetos de intervenção na área, que foram apresentados por órgãos municipais. O quarto capítulo apresenta alguns estudos de caso, em diferentes regiões do contexto urbano e em diferentes países, fazendo uma análise dos projetos de intervenção e suas características mais relevantes. O quinto capítulo apresenta a análise territorial, conceito e partido da proposta projetual, além da conclusão obtida com este trabalho.


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2. URBANISMO CONTEMPORÂNEO EM ÁREAS CENTRAIS

2.1

TENDÊNCIAS

NO

URBANISMO

CONTEMPORÂNEO

PARA

A

REQUALIFICAÇÃO DE ÁREAS CENTRAIS

No final do século XIX, período pós-Revolução Industrial, surge a necessidade de reorganização estrutural dos centros urbanos, principalmente na Europa, em países como Inglaterra, Bélgica, França e Alemanha, devido a um grande crescimento populacional desordenado que gerou ema expansão urbana sem precedentes. O crescimento populacional, o êxodo rural e a atração urbana gerados pelas grandes oportunidades de emprego e melhoria nas condições financeiras das famílias mais pobres gerou diversos problemas relacionados à infraestrutura das áreas centrais. Questões de mobilidade, saneamento, higiene, foram essenciais para o surgimento de diferentes modelos de desenvolvimento urbano, principalmente os conceitos de urbanismo progressista, culturalista e modernista, que buscaram a adequação e organização nos grandes centros industriais, na tentativa de criar a cidade ideal, vista atualmente como uma utopia (apud Choay, 1965). Essa organização funcional procurou romper com a cidade medieval e barroca existente, definindo diferentes características de edificações, vias, quadras e divisão das funções urbanas. O Urbanismo progressista, segundo Robert Owen (apud Choay, 1965), definem desenhos de quadra com separação de edifícios por função, típico da cidadeindustrial, afastando as zonas industriais, das zonas de comércio, lazer e habitação, com grandes áreas verdes, praças e parques. Os centros das cidades configuravamse em localizações privilegiadas para construção de edifícios públicos, e aglutinavam edificações. Também, por Charles Fourrier (apud Choay, 1965), uma racionalização e classificação sistemática dos lugares e atividades, ideia da Falange, a qual a cidade possui partes fragmentadas e setorizadas por uso. Definiam alturas de edificações, tipos de fachadas, questões estéticas e funcionais em geral, além de defender a dissociação das funções, associação das classes, salubridade e higiene dos espaços.


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O Urbanismo Culturalista, por sua vez, trouxe uma abordagem mais nostálgica da cidade, reflexo da cultura e história de seu povo. John Ruskin, (apud Choay, 1965) defendia a sociedade orgânica e interligada, que necessitava das relações e trocas interpessoais e do real sentido de comunidade, apesar de ser influenciada e ameaçada pelas consequências do desenvolvimento industrial. O contato dos indivíduos e das edificações com a natureza era de extrema necessidade, além de defender a organicidade do desenho urbano e a ideia de que edifícios devem ser tratados como obras de arte, como é dado o conceito de cidade-jardim. Por outro lado, a lógica do Urbanismo Moderno prevaleceu de forma a incentivar as cidades a se desenvolveram numa lógica racionalista de planejamento urbano e reurbanização modernos e ortodoxos. Essa abordagem prevaleceu entre os anos 30 e 40 do século XX. Essa teoria de planejamento urbano priorizava o zoneamento das cidades, criando regiões específicas para cada necessidade, mas segregava os espaços urbanos de uma forma ineficiente e que acarretou diversos problemas sociais e urbanos. Habitar, Circular, Trabalhar, Cultivar o corpo e o espírito, eram principais funções da cidade definidas pela Carta de Atenas (LE CORBUSIER, 1992). A forma da setorização, com imposição social de espaços monofuncionais, caracterizava a cidade como uma máquina e desconsiderava, em grande parte das vezes, a qualidade do espaço urbano e as relações interpessoais. A segregação do espaço urbano em zonas monofuncionais acarretou, ao longo dos anos problemas de mobilidade, bem como afetou a caminhabilidade. Na década de 1960, importante publicação elaborada por Jane Jacobs (2000) ressalta a importância da criação de espaços públicos que promovam o encontro e apropriação dos moradores da cidade. Jacobs ressalta os benefícios do desenho urbano da cidade tradicional, que possuía um centro comum com diversificação de usos e trocas sociais. Critica a segregação funcional do urbanismo moderno, que prejudica os deslocamentos diários afasta as pessoas das relações humanas e gera a degradação urbana (JACOBS, 2000). Gehl (2015) alerta para o fato de que, no urbanismo moderno predominam edifícios isolados e auto suficientes que estratificam as relações sociais e que definem áreas sem vitalidade e interação social, inseguras, sem movimentos durante diferentes horários do dia, negando a dimensão humana. . O primeiro período do Urbanismo Moderno trouxe, à realidade dos centros brasileiros, reformas urbanas que erradicaram, principalmente, a população de baixa


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renda dessa região. Além disso, a lógica modernista, seguia o ideal de renovação urbana em áreas deterioradas e pouco valorizava a preservação de patrimônios históricos e culturais (KRUSE, 2011). Esse fator dificultou a retomada da vitalidade dos centros urbanos, que possuem grande parte dos resquícios da história e cultura das cidades. Com planos provindos da região europeia o Brasil passou a criar planos pontuais de atuação, como alargar determinadas vias, renovar áreas urbanas implementando infraestruturas, como saneamento, atuando com o paisagismo de praças e parques, além de reforma e reurbanização de áreas portuárias (LEME, 1999). A fase do “embelezamento” destruía áreas de cortiços e habitações insalubres, cortando-os com vias largas que conectam as partes importantes da cidade. Logo no segundo período do Urbanismo Moderno, a ideia de “planejar o conjunto” parecia mais interessante e coerente. Os projetos para a cidade eram mais conectados e coesos, levando em conta não apenas um espaço específico e sim a cidade como um todo. A partir desse período foram feitos os zoneamentos urbanísticos e a legislação urbanística, que envolvia taxa de ocupação, uso do solo e outras ferramentas de controle. Apesar disso, os projetos criaram vias mais radiais e perimetrais, criando uma cidade menos coesas como a de antes e dispersando diversas áreas, que ficaram desconectadas e gerou aumento e maior necessidade de automóveis (LEME, 1999). Após esse período, existiu uma ideia de incorporar outros fatores além do físico e territorial das cidades, como a questão social e econômica. Apesar disso, era notável que as reais intenções do planejamento urbano eram cada vez mais distantes do que os projetos previam, impulsionando ainda mais os problemas existentes nos centros das cidades. A administração pública era cada vez mais estratificada, o que dificultou a execução dos planos, que passavam por diversas leis e recomendações do setor Executivo e Legislativo. Por final, acabaram por um planejamento simplório, sem muito diagnóstico e mapeamento das áreas, ignorando a problemática urbana e a diversidade de interesses das diferentes classes sociais relacionadas ao espaço urbano, e da cidade, descreve Flávio Villaça no livro “Uma contribuição para a história do planejamento urbano no Brasil” (p. 221). De certa forma, com os avanços da tecnologia e indústria, os centros urbanos acabaram se tornando obsoletos em questão de acessibilidade, por não conseguirem comportar suficientemente o contingente de automóveis e pessoas, e também de


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infraestrutura, por comportarem edificações mais antigas e desprovidas de instalações adequadas. Esses fatores impulsionaram o deslocando dos centros econômicos e comerciais para regiões mais periféricas, fenômeno notado também pelo surgimento de Shoppings Centers e grandes centros empresariais. O próprio governo contribuiu de forma relevante nesse movimento, transferindo a maioria dos seus serviços públicos para outras regiões da cidade, em locais menos congestionados e que possuíam maior acessibilidade para a população, esvaziando o uso público nos centros urbanos. Essas novas centralidades reduziram, de certa forma, a importância dos centros urbanos originais, gerando a degradação e marginalização, além da ocupação por grupos sociais marginalizados e de baixa renda (KRUSE, 2011). Entretanto a negação do movimento modernista e o período de reinvenção urbana, e influenciado por países europeus como Espanha, foram marcados principalmente pelos conceitos de revitalização e reabilitação urbana, além de um planejamento estratégico para a cidade. Essas tendências possibilitam a valorização das atividades existentes, diversificação dos usos, recuperação física de edifícios e também a retomada da vitalidade nos centros urbanos, antes negados e deteriorados. Buscou-se preservar o patrimônio consolidado e seu valor histórico e cultural, reforçando a função social do espaço urbano como local de encontros, trocas e diversidade. Também, buscou-se criar obras atrativas, para turistas, investidores e para moradores, que gerassem economia para a cidade. O Urbanismo contemporâneo, segundo Jan Gehl em seu livro Cidade para Pessoas (2015), procura criar uma cidade viva, na qual os moradores e visitantes sintam-se à vontade para caminhar e utilizar os espaços públicos; saudável, em que os moradores praticam atividades físicas em espaços públicos, como correr, caminhar, pedalar; segura, focando na diversidade de usos que gera uma vigilância natural a qual o próprio movimento de pessoas intimida atividades criminosas; e sustentável, em questões de mobilidade, transporte, recursos hídricos e energéticos, objetivos os quais as reformas urbanas podem oferecer como produto, principalmente nas áreas centrais. Esse conceito, procura criar áreas fragmentadas no próprio tecido dos centros urbano, referindo-se à uma colagem, um palimpsesto, que une e sobrepõe formas passadas, criando usos coesos e pré-existentes, afirma David Harvey em seu livro “Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural”.


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A partir de 1970, o urbanismo de mercado passa a atuar fortemente nas cidades, criando alguns objetivos que priorizam o crescimento das cidades e desenvolvimento econômico, ideia antagônica ao moderno, o qual controla o crescimento de forma racional e funcional. Adensamento dos centros urbanos, diversificação de usos, investimentos na requalificação de áreas obsoletas e degradadas, como os centros da cidade e zonas industriais, portuárias, deixando de lado a ideia modernista de renovação urbana nessas áreas fragilizadas da cidade. Com esse foco de desenvolvimento econômico e social nos grandes centros urbanos podemos considerar que as cidades se tornaram um produto comercial. Um exemplo disso é o City Marketing, que cria cidades como “cartão-postal”, atraentes para o mercado financeiro, com abrangência de investimento nacional e internacional e que explora principalmente os recursos naturais como orlas e Waterfronts, parques e visuais naturais. Esse conceito, defende a requalificação do espaço urbano da cidade, principalmente dos centros urbanos, gerando uma apropriação espacial do lugar e concentrando valorização financeira, cidade-mercado. A requalificação urbana em áreas centrais no contexto contemporâneo, segundo o manual de reabilitação de áreas centrais do Ministério das Cidades, utiliza as estruturas existentes no espaço urbano e subutilizadas, preservando-as e dando novas

funções

sociais.

As

estruturas

subutilizadas

recebem

novos

usos

principalmente relacionando-se ao patrimônio histórico e cultural existente, praças, espaços públicos livres, zonas e regiões portuárias. Diante desse cenário, não apenas o governo busca incentivar a requalificação dessas áreas obsoletas e degradadas mas também integrar nesse processo o mercado imobiliário. Apesar dessas políticas impulsionarem o desenvolvimento econômico das áreas centrais, algumas possuem impactos sociais como a gentrificação. Esses impactos atingem diretamente os

moradores e frequentadores. Essas reformas

urbanas geralmente patrocinadas pelo mercado privado, são, em geral direcionadas às camadas mais elitizadas, atraindo pólos de comércio, com uso extensivo do lazer e do turismo. O solo é visto como mercadoria. O fenômeno acaba afastando, de certa forma, os antigos moradores, devido ao aumento nos preços dos aluguéis e valor da terra e em muitos casos, a população que frequentava o espaço anteriormente.


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2.2. EVOLUÇÃO DAS ZONAS PORTUÁRIAS

A atração da urbanização próximo às zonas portuárias é uma dinâmica existente desde os primórdios das trocas comerciais. Num contexto global, países da Europa e Mediterrâneo foram pioneiros no capitalismo mercantil, o que influenciou diretamente o crescimento e expansão das suas cidades portuárias. Segundo o autor Brian Hoyle (1989, apud VASCONCELOS, 2014), essa dinâmica levou à concentração da urbe principalmente à beira de mares, rios, cursos d’água e a expansão das atividades de comércio marítimo causaram um enorme crescimento desses centros urbanos. O desenvolvimento e expansão das cidades portuárias modifica as relações entre cidade e porto conforme as dinâmicas sociais, urbanas e tecnológicas se atualizam. Essas dinâmicas provocam transformações estruturais, de logística e modo de funcionamento dos portos, além dos equipamentos necessários para realização das atividades portuárias. Diante desse cenário, existiram diferentes fases de crescimento das cidades e de suas respectivas zonas portuárias. Num primeiro contexto de tecnologia e comércio portuário, as Porto-Cidade Primitivas caracterizam os centros urbanos que mantinham uma sólida ligação com sua zona portuária, estes cresciam de forma correlacionada, mantendo uma relação de dependência e mutualidade. Na Antiguidade Medieval e até parte do século XIX, os equipamentos e estruturas dos portos ainda eram rudimentares e atendiam pequenas demandas de trocas comerciais. Como no Brasil, nos primórdios da colonização, algumas zonas portuárias se formaram por objetivos diversos. Além de interesse econômico, serviam como base militar, de defesa e controle da área costeira, além de ser porta de entrada para a população estrangeira, escravos, imigrantes, mantendo uma intensa relação com essas classes sociais e acompanhando o crescimento do núcleo urbano. À medida que a exploração das zonas portuárias crescia, o entorno dessas regiões também se desenvolvia para comportar a atividade de comércio. De acordo com Brian Hoyle (1989, apud Vasconcelos, 2014), os primeiros núcleos urbanos no Brasil estavam situados nas regiões costeiras devido a questões econômicas, administrativas e militares. Estes núcleos mantiveram intensa relação de dependência com o porto, tratando-o como parte da cidade e não apenas uma zona específica, um setor comercial ou apenas relacionado à indústria. Nas cidades coloniais, os portos


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eram espaços de transição, que relacionavam uma dinâmica local-internacional, como um espaço de união. Essas consistiam em um conjunto de cais, armazéns e terminais de transporte, antes integradas e relacionadas ao restante da malha urbana e aos moradores, comerciantes, visitantes, não possuindo uma delimitação privada do espaço, que então se tornou de uso comum, público. Figura 1: Evolução temporal da cidade portuária industrial ocidental.

Fonte: Hoyle (1989)

Em outro período de evolução da cidade e das zonas portuárias (Figura 01), denominado por Brian Hoyle como Porto-Cidade em Expansão, em seu livro “The portcity interface: trends, problems, and examples” citado pela autora Flávia Vasconcelos (2014), houve a maior intensidade dessa relação de espaços portuários com a malha urbana. A necessidade de matéria-prima, combustível e exportação de manufaturados impulsionou o avanço no transporte marítimo. No século XIX, num período de diversas inovações tecnológicas e avanços científicos, as atividades industriais e de comércio portuário começaram a se desenvolver melhor e serem mais explorados, além de sofrer um processo de modernização. Nesse período também surgiram diferentes


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rotas de comércio com diversos países da Europa e América do Norte, que incluíam atividades como comércio de produtos agrícolas, pesca, fibras têxteis e outros produtos que vinham do campo para a cidade, no processo de urbanização, contexto caracterizado pela Revolução Industrial. Este avanço foi o grande precursor do desenvolvimento econômico mundial e intensificou a circulação de mercadorias na escala local e internacional, período de intensa reorganização do espaço econômico e expansão industrial. O crescimento do cenário mercantil nas zonas portuárias demandou uma intensa modificação estrutural nessas áreas, que precisavam comportar e armazenar um contingente maior de cargas e produtos, ampliar suas instalações existentes. Deveriam possuir equipamentos modernos e estruturas específicas de transporte e logística, além de atender às necessidades de diferentes tipos de embarcações sofisticadas, que também evoluíram no processo de industrialização, deixando de lado a vela e utilizando o vapor. O modelo de Brian Hoyle (1989, apud VASCONCELOS 2014) (Figura 01), neste cenário, caracteriza a etapa da cidade portuária como Porto-Cidade em Expansão, a qual tem seu eixo econômico e urbano voltado diretamente às zonas portuárias. Tornam-se espaços urbanos maiores e que integram diferentes atividades e funções, como habitação para imigrantes e trabalhadores, bares, restaurantes, cafés, desenvolvendo até mesmo o turismo, casas de negócios e serviços diferenciados. Os portos aglutinaram funções que vão além da relação de transporte e circulação de mercadorias, mas também de uma construção espacial que se relaciona ao tecido urbano de nossas cidades. Figura 2: O modelo Anyport de J. Bird.

Fonte: Rodrigue et al (2009)


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As transformações e expansão da economia mundial pós segunda-guerra, período com ideais modernistas de urbanismo, causaram ainda mais mudanças na dinâmica dos portos. Na etapa de Porto-Cidade Industrial Moderno, essas zonas de comércio portuário começaram a se desenvolver de forma independente do restante do núcleo urbano, assim como a cidade também passou a crescer dessa forma, marcando um afastamento e distanciamento da cidade com o porto (Hoyle, 1989). Esse núcleo urbano, passou a ser cada vez mais funcional e individual, servindo apenas como forma de escoamento e recebimento de mercadorias. Esses ideais funcionalistas de setorização e zoneamento

presentes no

modernismo urbano, que atingiram desde os centros urbanos até as zonas portuárias, acabaram criando ferramentas para planejamento, renovação e setorização, que resultaram na separação da administração dos portos da administração pública, causando uma ruptura entre o porto e a cidade. Suas atividades se distanciaram cada vez mais da estrutura urbana (VASCONCELOS, 2014). Além disso, outra transformação notável foi a expansão da habitação no entorno dessas zonas, devido ao grande número de imigrantes que passaram a alojar-se em habitações centrais, perto dos portos, seus principais locais de trabalho. Apesar de grande expansão nessas regiões, a insalubridade era uma questão marcante, que acabou gerando uma fuga da classe média e alta dessas áreas, atraindo para essas cortiços, habitações populares, superlotadas das classes mais pobres, imigrantes, impulsionando ainda mais a ideia de renovação de áreas insalubres e desordenadas - como eram o entorno das zonas portuárias - pelo ideal modernista. Assim como nos centros urbanos, as zonas portuárias também sofreram um processo de esvaziamento e degradação principalmente devido à modernização das formas de transporte e tecnologia dos portos, e falta de infraestrutura para armazenamento, vendo necessidade de transferência para regiões com maior área e estrutura adequada às novas condições de mercado. Relacionando com a dinâmica da expansão das áreas centrais, podemos perceber que as zonas portuárias na maioria das vezes não possuem relação direta com o restante da estrutura urbana, são desconectados, setorizados, além de não permitirem interação entre o indivíduo e a paisagem natural. Além do afastamento do porto com a estrutura urbana pela setorização modernista, as áreas acabaram ficando abandonadas, esvaziadas e sem a


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diversidade de usos e atividades que existia antigamente e passou a ser dominada apenas pelas intenções comerciais de transporte de mercadorias. A deterioração e falta de valorização das zonas portuárias, no que se refere à qualidade do espaço e interação com o meio urbano, era muito perceptível. Tornaram-se zonas obsoletas, sem a dinâmica de diferenciação de usos, esvaziadas.. Essa forma fria de setorizar uma região privilegiada, no caso das zonas portuárias, região litorânea e conectada com o centro das cidades, aconteceu em diversas cidades do país, como no Rio de Janeiro, que futuramente passa pela intervenção do Porto Maravilha. O desenvolvimento que encadeou as transformações estruturais das zonas portuárias também impulsionava a relocação dessas zonas para locais com melhores condições geográficas e que atendessem às novas necessidades da indústria e comércio. Os centros urbanos passaram a ser menos interessantes para locação de estruturas portuárias, visto que não possuíam a infraestrutura adequada para a expansão. Dessa forma, houve uma intensa migração para regiões com maior área e adequadas características para comportar os navios, cada vez maiores e mais especializados. O surgimento da estrutura de “container” impulsionou ainda mais os avanços de transporte e comércio marítimo, os navios deveriam comportar um grande número dessas estruturas para ampliar ainda mais a quantidade de produtos e mercadorias comercializados, o que refletiu diretamente nas estruturas das zonas portuárias, com necessidade de modernização de seus equipamentos e instalações, mão de obra especializada e logística, caracterizando a etapa de Recuo das Frontes Marítimas, a que priorizou o crescimento da indústria separado do crescimento das zonas portuárias. Apesar do movimento de migração das zonas portuárias e exagerado avanço tecnológico da indústria, a competitividade das zonas portuárias nacionais com a de outros países era muito visível, o que acabou gerando uma decadência do modelo econômico, deixando as antigas áreas portuárias obsoletas e degradadas. Tal fato não foi diferente nos centros urbanos, que tiveram suas funções prejudicadas devido aos ideais funcionalistas do modernismo urbano, dividida por funções e com diversas regiões da cidade - e comunidade - segregadas. Com o surgimento de um período crítico ao urbanismo moderno e as ações de planejamento urbano da época, veio à discussão a relação inter-urbana das zonas portuárias e das áreas centrais, com o restante das cidades. Dessa forma, segundo


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Brian Hoyle (1989, apud Vasconcelos 2014), diversas foram as modificações nas políticas públicas do urbanismo, que resultaram em análises mais específicas e detalhadas, estudos técnicos para intervenções em áreas debilitadas, segregadas e obsoletas das cidades, caso de zonas portuárias e áreas centrais. Neste contexto, a administração pública passa a incentivar a revitalização de áreas degradadas, centros urbanos, zonas portuárias, vendo essa alternativa como valorização territorial, apropriação por parte dos moradores e quem utiliza as áreas e como autopromoção das cidades, como está previsto pelo planejamento estratégico. O empresariamento urbano passa a ser uma estratégia nos grandes centros urbanos. Após a crise de 1970, a Remodelação da Frente Marítima foi a etapa que reorganizou a lógica de transporte marítimo e atividade portuária, priorizando o bem estar social e a diversificação de usos, além da valorização e apropriação territorial. Cidades como Boston, Toronto e Montreal são alguns exemplos de projetos em zonas portuárias que incluíram áreas verdes, de praças e parques, de estar e contemplação e de conexão da região marítima com o restante da cidade. Essa forma de revitalização e refuncionalização das zonas portuárias intensificou o comércio, turismo e movimentação nessas áreas antes obsoletas e degradadas e ruínas industriais, criando um modelo de cidade pós-Industrial (Hoyle, 1989, apud Vasconcelos 2014). A economia, através desses projetos em zonas portuárias antigas, ganhou grande impulso principalmente nos chamados Waterfronts, frentes d’água, através das ações de planejamento estratégico e city marketing, políticas que priorizam a imagem da cidade como fonte de desenvolvimento econômico e de turismo, capaz de atrair fluxos de diversas pessoas de todo mundo, além de capital, mercadorias, eventos. As autoridades e o governo buscavam cada vez mais ideais ambiciosos de projetos como museus, aquários, centros de eventos, marinas - para os friches portuários, as ruínas industriais existentes, que gerassem uma movimentação na economia, empregos e desenvolvimento local, conceito do capitalismo neoliberal, e que traz de volta a integração da região com o restante da cidade. Dessa forma, a reforma das regiões portuárias pode causar grande impulso na dinâmica territorial do espaço urbano, retomando a união do porto com a cidade, gerando vínculos de apropriação e valorização da área. É notável a necessidade de políticas de intervenção nestas áreas, o que o urbanismo contemporâneo oferece através da revitalização e requalificação das zonas portuárias. Essa prática pode dar


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prioridade aos aspectos arquitetônicos, conservando a estrutura e adaptando-se ao contexto moderno que leve em conta a estrutura original. Grandes cidades como Barcelona e Londres, no Brasil: Porto Alegre, Salvador e Rio de Janeiro, sofreram esse processo e buscaram alternativas sustentáveis para integração dessas áreas degradadas e obsoletas com o restante da cidade e, principalmente, com os indivíduos.

2.3. REQUALIFICAÇÃO EM ZONAS PORTUÁRIAS

No contexto pós-segunda guerra mundial, existiu um intenso processo de modificações urbanas relacionados às políticas do modelo racional modernista, que buscavam renovação de diversas áreas das cidades, o que prejudicou, de certa forma, questões culturais e sociais dessas regiões devido a remoção de edifícios históricos e de interesse cultural, além de habitação de diversas classes sociais menos privilegiadas (DEL RIO, 2001). Após a crise desse modelo de pensamento, novas formas de planejar as cidades começaram a ser experimentadas, com especial atenção à valorização das questões socioculturais, do patrimônio e da comunidade. A Carta de Lisboa, documento publicado em 1995, constituiu uma grande inovação, em questões de preservação do patrimônio das cidades, estabelecendo diversas diretrizes para as intervenções de reabilitação urbanas integradas, caracterizando as modificações como renovação, reabilitação, revitalização, requalificação. No contexto de renovação, existe a necessidade de demolição das estruturas existentes para a construção de outras, como ocorria no período pósguerra, onde os ideais modernistas influenciavam a dinâmica da infraestrutura urbana. A reabilitação caracteriza estratégias de intervenção que buscam requalificar a cidade e potencializar as questões econômicas e sociais, através de infraestrutura construída, equipamentos, espaços públicos, além de colocar o indivíduo no centro das intervenções, buscando a integração deste com o contexto histórico existente. No ideal de revitalização, buscam retomar a vida e a atividade comercial e social que aconteciam num determinado local, que atualmente está em decadência. No caso da revitalização, o principal objetivo é promover a habitação de uma área da cidade, além de oferecer a infraestrutura suficiente para esse processo, afirma Vicente Del Rio


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(2001). A Carta de Lisboa também analisa essas intervenções em relação

aos

caminhos para suas aplicações. A carta exige estudos históricos e sociológicos para realização de modificações nas estruturas do núcleo das cidades e do patrimônio, além de priorizar medidas sustentáveis de reabilitação nessas operações, racionalizando recursos de construção, aproveitando ao máximo o ambiente construído, evitando demolições e renovação, “a proposta de requalificação deve ser um processo integrado envolvendo todos os agentes interessados”, segundo o documento de 1995. Além das questões apontadas existem outros fatores que influenciam as intervenções. A sociedade do capitalismo neoliberal passou a aproximar sua relação com o patrimônio histórico, principalmente em áreas degradadas e obsoletas como centros urbanos, zonas portuárias, e prever seus potenciais econômicos e de valorização urbana, além disso, Vicente Del Rio (2001) afirma que esse modelo econômico funciona, principalmente, em prol da obtenção de lucros através dessas intervenções urbanas. Dessa forma, esse modelo de urbanismo contemporâneo passou a reabilitar e reutilizar essas áreas vulneráveis, preservar o patrimônio e a identidade cultural existentes, além de recuperar os espaços de vivência dos centros urbanos. Esse potencial de desenvolvimento econômico foi disseminado em diversos países do mundo, principalmente na Europa e América do Norte. As políticas de planejamento estratégico e City Marketing, que tratam das cidades como produto comercial, impulsionaram a requalificação dessas zonas degradadas, através da criação de pólos comerciais, turísticos e culturais. O fenômeno do City Marketing é essencial para o impulso econômico dessas intervenções visto que expressa, através da arquitetura construída, a capacidade expressiva e simbólica dos edifícios de grife, além da promoção da região que sofre a intervenção, afirma Del Rio (2001), Segundo o autor, o turismo recreativo, cultural, de compras e de negócios, são importantes agentes econômicos e sociais nesses projetos de revitalização de áreas centrais, principalmente em áreas portuárias, as quais podem ser explorados visuais naturais, simbólicos que relacionam a cidade com a frente de mar. O contexto de requalificação de zonas portuárias pode ser relacionado diretamente com a revitalização das áreas urbanas centrais e com o processo de globalização nessas áreas. Algumas políticas governamentais, como manuais e projetos de lei, fazem recomendações, incorporando objetivos e diretrizes específicas


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para a reabilitação e reformas nessas regiões. No caso das zonas portuárias, elas apresentam uma dinâmica histórica, cultural e simbólicas para as cidades, além de possuírem ainda uma relação íntima com o mar. Segundo Del Rio (2001), os Waterfronts acabam se tornando locais ideais para especulação e desenvolvimento econômico, além de poder atrair eventos ocasionais e fenômenos midiáticos, devido sua centralidade e acessibilidade no contexto urbano. Cidades como Boston, Baltimore e São Francisco, nos Estados Unidos, são exemplos da reconversão de áreas portuárias, as quais sofreram intensa capitalização e investimentos imobiliários, incremento das infraestruturas de acessibilidade e comunicações, além de projetos de áreas públicas e parques, especialmente para a população, relacionando a região com o restante da cidade e principalmente com a frente de mar. Esse processo de requalificação acaba trazendo para as regiões instalações que favoreçam a cultura e história da cidade, além de promover lazer e turismo para os usuários. No Brasil, segundo a Agência Nacional de Transportes Aquaviários, existem 235 instalações portuárias, fluviais e marítimas, com um litoral de 7.367km (Ministério de Infraestrutura, 2017), grande potencial econômico a ser explorado, este que deve ser integrado à cidade de forma coerente e coesa. Dessa forma, a revitalização dessas áreas pode suprir diversas carências da cidade, como a falta de habitação e equipamentos, espaços públicos, parques e áreas de lazer, além de preservar a cultura da cidade e sua identidade, integrando-se com a malha urbana existente. No caso do Rio de Janeiro, a área da zona portuária passou por um processo de Operação Urbana Consorciada denominada Porto Maravilha, a partir de 2011, o que valorizou a região da intervenção, além de ser uma estratégia de marketing para a cidade do Rio. Houve um intenso processo de renovação de algumas estruturas existentes, definindo um desenho urbano que valorizasse principalmente a cultura local. Também, foram implantados equipamentos como museus (Museu do Amanhã e Museu da Arte do Rio), veículos para acessibilidade (VLT, Veículo Leve sobre Trilhos), além de construção de túnel. Esse ideal de intervenção criou uma imagem de Cidade Espetáculo, a qual o Rio de Janeiro foi submetida, atraindo, principalmente, o mercado imobiliário, turistas, gerou uma marca que serve para divulgar a imagem da cidade para o mundo. Outros projetos para zonas portuárias degradadas no país foram surgindo. O caso da orla de Recife, no Cais José Estelita, é um exemplo. A intervenção acabaria pela renovação dos armazéns, e a região sofreria intensa


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valorização imobiliária através da implantação de diversas torres, divididas entre uso residencial e comercial, extremamente verticalizadas, rompendo com o contexto urbano existente e priorizando os interesses do mercado imobiliário. Nesse projeto, diversas foram as críticas diante das propostas para a região, principalmente vindas da população da cidade, que em sua maioria é contra a descaracterização dos armazéns e implantação das torres super verticalizadas, uma escala desumana e desproporcional dos edifícios (VIEIRA, 2019). Dessa forma, apesar de as requalificações no contexto das zonas portuárias valorizarem intensamente um contexto mais econômico, também devem se relacionar com o restante da cidade, criando espaços e instalações que integram diversos tipos de usuários, usos mistos, dinamizando as relações sociais e principalmente valorizando a beleza natural em questão: o mar.

2.4 USO MISTO COMO POTENCIALIZADOR DE TRANSFORMAÇÕES URBANAS

Dentre as transformações urbanas, a expansão e difusão da cidade, na lógica de ocupações de baixa densidade, são grandes ameaças para o desenvolvimento territorial sustentável. Esse modelo dificulta a acessibilidade aos serviços públicos, gera maior exploração de recursos naturais e sobrecarrega as redes de transportes públicos e privados. A partir disso, no cenário das intervenções urbanas de requalificação, surgem questões como o desenvolvimento urbano sustentável. Esse conceito explora diversas alternativas para a expansão e evolução de tecnologias que favoreçam o crescimento consciente e as transformações que requalifiquem as cidades. Auxiliam na produção de espaços mais permeáveis e que impulsionam as relações sociais, além de incentivar a tipologia mista nos edifícios, quadras permeáveis, fachadas vivas, conceitos de fruição pública e densidade habitacional regulada. A ideia de cidade sustentável, segundo Carlos Leite (2014), envolve diretrizes como o reaproveitamento e racionalização do uso dos recursos naturais, além do planejamento eficiente das cidades. O autor cita que os bairros planejados devem ser compactos, com grande densidade habitacional e extensa diversidade de usos, como habitação, comércio, serviços e escritórios. Também argumenta que as atividades do dia a dia sejam


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realizadas a pé, dando maior autonomia aos indivíduos que circulam na região e reduzindo os deslocamentos por automóveis, liberando o trânsito dos núcleos urbanos e preservando o ambiente. O uso misto e a diversidade urbana relacionam-se diretamente com a cidade viva, citada por Jan Gehl em seu livro “Cidade para Pessoas” (2015). O modelo defendido por Gehl se sobrepõe ao ideal modernista de setorização dos usos. Ao contrário promove a integração social ao incentivar o compartilhamento do espaço urbano, a integração dos edifícios com a paisagem existente, construída ou natural, e atraente à diversos grupos da sociedade. Além disso, o autor cita diversas diretrizes e tendências que as cidades devem seguir para tornarem-se sustentáveis, compactas, como a distribuição consciente dos usos, integração das funcionalidades na cidade, a criação de um espaço urbano convidativo, a promoção da vivência entre os edifícios nas quadra e incentivo à permanência nos espaços públicos. Nesse contexto, a diversificação de usos é uma diretriz citada também pela autora Jane Jacobs (2000), em “Morte e vida de grandes cidades”. A autora se refere ao uso misto como importante fator para gerar movimentação das ruas e calçadas, e criar a diversificação social, trazendo para a região indivíduos de diferentes idades e classes sociais, priorizando a escala do pedestre, do usuário local.


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3. CONTEXTO HISTÓRICO

3.1 CONTEXTO HISTÓRICO DA ZONA PORTUÁRIA DE VITÓRIA

O processo de implantação das zonas portuárias nas cidades se relaciona diretamente com as questões socioeconômicas, que se alteram conforme a evolução da globalização, de tecnologias e da economia (VASCONCELOS, 2014). Ao longo dessas evoluções estruturais e econômicas do capitalismo, os portos normalmente cresceram de forma simultânea aos centros urbanos, e acabaram agregando valor às regiões centrais, o que atraiu a presença de habitação, comércio e serviços nessas áreas, além da modernização e expansão. Em alguns casos, os portos tornaram-se obsoletos, criando áreas degradadas e vazias, sem um uso adequado, passando por processos de intervenção, como requalificação e renovação. No contexto da cidade de Vitória, a zona portuária acompanhou o processo de crescimento do centro urbano, influenciando diretamente na região, de forma a incentivar a permanente reestruturação e expansão territorial, paisagística, econômica e social da cidade. Nos princípios do surgimento das instalações portuárias no centro de Vitória, no século XVI, as estruturas ainda eram precárias, correspondiam a pequenos cais às margens da Baía. A colonização das terras de Vitória, antes chamada Vila Nova, posteriormente Vila da Victoria, aconteceu por Vasco F. Coutinho, enviado de Portugal para promover o desenvolvimento e crescimento da capitania, que distribui terras e ilhas àqueles que auxiliaram na colonização (VASCONCELOS, 2014), e a partir disso os portos passaram a expandir suas estruturas e serem modernizados, para atender tanto questões de exportação dos recursos naturais explorados, quanto oferecer acesso aos colonizadores. O desenvolvimento econômico, a partir do século XVII, se expandiu principalmente no contexto de engenhos e fábricas, além da lavoura do açúcar, produção de arroz, algodão, tabaco, mandioca e milho. Simultaneamente à economia, a expansão populacional foi um cenário presente e importante na expansão da comunidade de Vitória.


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A partir do século XIX, iniciaram algumas obras relacionadas ao contexto urbano, como aterros, calçadas, além da retomada de igrejas, fortes e quartéis, e forte influência da economia cafeeira, principal produto de exportação da província. A Baía de Vitória, com grande vocação portuária, começa a ser mais explorada. A partir do século XIX, a infraestrutura portuária de cais é instalada para auxiliar no processo de transporte e movimentação estrangeira, apesar disso a navegação marítima e comércio no porto de Vitória não eram tão intensos e sim focados na cabotagem, transporte para outros portos mais próximos, como o do Rio de Janeiro. Logo na época da exploração do ouro, principalmente em Minas Gerais, o estado do Espírito Santo e Vitória tiveram importante papel de proteção e escoamento desse recurso e das terras interiores (VASCONCELOS, 2014).

Figura 3: Planta baixa da Baía de Vitória, 1985, sem a infraestrutura portuária e aterros.

Fonte: Arquivo da Prefeitura Municipal de Vitória.

Apenas a partir do século XIX a infraestrutura dos cais de Vitória passa a ter caráter comercial, criando uma zona específica, futuramente denominada de zona portuária. A expansão territorial do centro urbano, e das zonas portuárias, foram impulsionados pela criação de aterros na ilha, que aumentaram a área da cidade, além de criar mais conexões entre o território (FERREIRA, 1959 apud VASCONCELOS, 2014). Nesse contexto, juntamente com a expansão comercial de exportação de ouro e outros recursos naturais, o porto de Vitória começa a se


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consolidar, aprimorando suas estruturas existentes e criando novas, modernizandose. O porto participava do processo de escoamento dos produtos de Minas Gerais para o exterior, além de funcionar como um canal de desenvolvimento da província de Vitória (MAFRA, 1878, apud VASCONCELOS, 2014). As fases da expansão portuária de Vitória podem ser indicadas pelo modelo de Brian Hoyle (1989), que caracteriza a infraestrutura e relações socioespaciais dessas zonas. Num cenário inicial, o porto possui uma relação íntima com o centro urbano. No caso de Vitória, o porto possuía infraestrutura rudimentar, com a presença de alguns cais fragmentados, sem muita movimentação econômica, denominada PortoCidade Primitivo (VASCONCELOS, 2014). No final do século XIX, Vitória consegue maior autonomia política e econômica, o que impulsiona o desenvolvimento do porto e consolidação de suas instalações, além de focar principalmente na economia cafeeira, produto essencial para o desenvolvimento da região. Na segunda fase, a Porto-Cidade em Expansão, a zona portuária começa a se fragmentar e desunir do tecido urbano. O processo de industrialização trata o porto como um meio de transporte, que não precisa ter ligação com o contexto urbano, mas sim atender às necessidades econômicas da cidade. Com esse crescimento do porto, suas instalações e estruturas foram modernizadas, com a criação de armazéns para estocar mercadorias, além de equipamentos que auxiliassem no transporte de cargas. Em Vitória, o porto de Tubarão foi implementado para expandir a economia local, incentivando ainda mais o crescimento econômico da cidade de comércio exterior.


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Figura 4: Obras dos Armazéns do Porto

Figura 5: Obras dos Armazéns do Porto

Fonte: Arquivo da Prefeitura Municipal de Vitória

Na terceira fase do modelo de Brian Hoyle (1989, apud VASCONCELOS, 2014), podemos caracterizar a zona portuária de Vitória como Porto-Cidade Industrial Moderno, devido a maior industrialização dos processos de transporte e a ruptura com o centro urbano existente. Os avanços tecnológicos relacionados aos portos, como o contêiner, trouxeram melhorias nos processos logísticos de transporte, porém criavam a necessidade de mais espaço nas zonas portuárias, o que seria uma dificuldade para o porto de Vitória, que buscou ocupar novas áreas para atender seus interesses de


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comércio e exportação, ampliando seu complexo portuário. Também, essa fase do modelo da relação do porto com a cidade caracterizou um esvaziamento populacional do centro urbano, afirma Hoyle (1989). Dessa forma, o porto existente deixa de ser o principal equipamento e passa a fazer parte de um complexo portuário, e a fragmentação entre ele e a cidade se consolida devido às novas necessidades tecnológicas e espaciais, num processo de Recuo da Fronte Marítima, quarta fase do modelo de Brian, onde a expansão industrial ocorre separada à expansão das zonas portuárias. No contexto de fragmentação da zona portuária e da cidade, surgiram teorias e pensamentos que poderiam retomar a relação entre esses dois elementos. Na quinta fase do modelo de Hoyle (1989), a ideia de Remodelação da Fronte Marítima surge para propor melhorias nessas regiões. As zonas portuárias modernas, passam a ficar obsoletas e degradadas, devido a criação de outras zonas portuárias com maior espaço e tecnologia, deslocadas dos centros urbanos originais. Dessa forma surge um interesse maior no ideal de reconversão e requalificação das áreas obsoletas, tanto no interesse político como no interesse econômico. Em Vitória alguns projetos foram propostos para a região da zona portuária, como o da Prefeitura Municipal de Vitória e o Plano Mestre da CODESA, companhia que administra o Porto de Vitória, objetivando melhorias espaciais e da relação com a cidade, além da requalificação da área e implantação de novos equipamentos, previam instalação de linhas de BRT, incentivando ao transporte público, equipamentos culturais e órgãos públicos e privados, o que será melhor apresentado nos próximos capítulos. O cenário atual do porto de Vitória, apesar de alguns desses projetos previstos, não sofreu modificações significativas de estrutura ou uso que impactassem o entorno, permanecendo como uma região subutilizada e que poderia passar por uma requalificação para melhoria das condições estruturais e de relação com o contexto urbano existente, além de valorização da frente de mar, localização privilegiada.


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Figura 6: Localização Zona Portuária de Vitória

Fonte: Google Maps.

Figura 7: Porto de Vitória, implantação

Fonte: Google Maps.


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Figura 8: Porto de Vitória, vista aérea.

Fonte: Sindimares.

3.2 REGIÃO PORTUÁRIA DE VITÓRIA E SEUS ARMAZÉNS A partir da necessidade de modernização e desenvolvimento do Porto de Vitória, ocorreram diversas obras. Em 1911, iniciou-se o processo de dragagem da baía de Vitória, para aumentar sua profundidade e possibilitar o acesso de navios com maior porte (RM Viação e Obras Públicas de 1911, p. 34 1927, apud DE MORAES, 2014). Simultaneamente às obras do Porto de Vitória, a cidade também passava por diversas mudanças em sua estrutura, tais como criação de aterros, desapropriação e novas construções, alargamento das vias, instalações de água e esgoto, iluminação pública (MONTEIRO, 2008, apud DE MORAES, 2014). As obras de expansão do porto, paralisadas durante anos, foram retomadas principalmente devido à percepção do governo em relação à utilidade da região portuária de Vitória. Este equipamento seria principal fonte econômica para o Espírito Santo, além de que o estado de Minas utilizava o cais como escoadouro dos seus produtos, afirma o presidente Nestor Gomes (1921, apud DE MORAES, 2014), por meio de carta oficial, na época. A partir dessa visão, a necessidade de estabelecimento das estruturas e equipamentos da zona portuária foram notadas, a


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modernização dos cais rudimentares passaria a abrigar plataformas e docas modernas, implementação de armazéns, guindastes. Segundo relatos do Ministro de Viação e Obras Públicas, Victor Konder, (RM, Viação e Obras Públicas de 1927, p. 308, apud DE MORAES, 2014), a construção dos armazéns do porto foi iniciada no ano de 1927. Nesse período foram registradas diversas movimentações relacionadas à construção dessas estruturas, como imagens, orçamentos e prestação de contas.

Figura 9: Construção do primeiro armazém no Porto de Vitória, em 1927.

Fonte: CODESA

A modernização do porto trouxe risco para os indivíduos que circulavam normalmente entre a região devido às suas instalações, que utilizavam maquinário pesado para movimentação das cargas. Dessa forma a região, que ainda era integrada ao contexto urbano, passou por um processo de privatização espacial, com muros e outros fechamentos marcando o afastamento do porto com o contexto urbano existente (DE MORAES, 2014). Os armazéns, nesse processo de modernização, possuíam uma função primordial, eram destinados à estocagem dos produtos que seriam exportados, como café, mas também contribuíram, de certa forma, para o afastamento do indivíduo com a frente de mar, impedindo visualmente essa conexão, afirma a autora Lívia Santos (2014). O processo de evolução econômica e industrial, relatada pela Viação e Obras Públicas (1937, p. 396, apud DE MORAES, 2014), era de extrema intensidade na


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zona portuária de Vitória, que passava por diversas inovações tecnológicas, evoluindo do patamar de Porto Rústico para Porto Moderno e Industrial, dotado de infraestrutura necessária para transporte e exportação nas operações comerciais da época. Dessa forma, surgia a necessidade de maior expansão e armazenamento, o que trouxe a construção do Armazém 5, a partir de 1937 (RM, Viação e Obras Públicas, de 1937, 397, apud DE MORAES, 2014). Posteriormente, em 1950 no governo de Jones dos Santos Neves, o Armazém 4 seria construído, a partir do Plano de Valorização Econômica, e após diversas paralisações em sua obra, inaugurado apenas em 1959 (Relatório de Viação e Obras Públicas, 1958, p. 79, apud DE MORAES, 2014), também construídos os prédios para apoio da administração do porto. .

Figura 10: Construção do prédio 4, ao fundo o armazém e prédio 5, em 1959.

Fonte: Acervo CODESA.


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Figura 11: Construção do Armazém 4, 1959.

Fonte: Acervo CODESA.

Figura 12: Armazém 4 e 5, sem o anexo.

Fonte: Arquivo CODESA.


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Na década de 60, diversas evoluções no contexto portuário foram notadas. A expansão do complexo portuário, com a criação do Cais do Atalaia, Terminal de Tubarão, Terminal de Capuaba e Terminal de Portocel, e no contexto de crise do café, a principal saída foi a industrialização dos processos econômicos, atraindo cada vez mais a população rural para o centro urbano, gerando um grande aumento populacional em Vitória (BITTENCOURT, 1987, apud DE MORAES, 2014). A partir dos anos 70, a cidade de Vitória se incluiu cada vez mais no comércio exterior relacionado à sua zona portuária, os índices de importação e exportação aumentavam cada vez mais, auxiliando na logística de transporte de mercadorias nas regiões. Ao longo da evolução econômica e das tecnologias portuárias, na década de 90, houve um processo denominado globalização dos portos, fato que propiciou a abertura dos portos para a internacionalização e privatização das zonas portuárias, atraindo diversas multinacionais para o cenário local e atualizando a tecnologia existente, seus equipamentos e estrutura dos portos (BITTENCOURT, 2006, apud DE MORAES, 2014). Grande marco dessa globalização das zonas portuárias foi o surgimento dos contêineres, que foram facilitadores do transporte de cargas, por sua estrutura versátil e funcional. Apesar disso, com o surgimento dessa estrutura de armazenamento denominada contêiner, os armazéns existentes na zona portuária de Vitória, e também o próprio porto, tornaram-se obsoletos. O Porto de Vitória não possuía área suficiente para a armazenagem de grande quantidade de contêiners, impossibilitando esse processo logístico. Dessa forma, os armazéns deixam de ser elementos modernos e funcionais, para o cenário atual, e tornam-se objetos históricos, passivos de preservação e refuncionalização (DE MORAES, 2014). Diante desse cenário, diversas discussões foram tomadas em relação à estrutura dos armazéns do porto de Vitória. Alguns, defendiam a demolição dos armazéns 4 e 5 para ampliação do porto, objetivando uma sobrevida à economia dessa zona portuária e ampliando a capacidade de armazenamento de cargas pesadas, esta proposta veio do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), apresentado no Conselho Estadual de Cultura (CEC) por Eduardo Prata, com a justificativa de que o porto era grande responsável pela economia do Estado (apud DE MORAES, 2014). Por outro lado, diversos críticos repudiavam a possibilidade renovação dos armazéns, na época do Plano de Aceleração do Crescimento a


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conselheira Viviane Pimentel, do Conselho Estadual de Cultura, apoia a permanência da estrutura dos armazéns, visto que estes possuem valor histórico e deve ser preservado (SECULT; CEC. 2013, apud DE MORAES, 2014). Dessa forma, a preservação dos armazéns implica diversas teorias e leis de preservação e tombamento. Para o autor Max Dvořák (2008, apud DE MORAES, 2014), a imagem da zona portuária garante uma memória de pertencimento aos moradores e usuários, tratando-o como um monumento a ser preservado. Outro autor, Kühl (2008), defende que a preservação de um monumento histórico deve permitir diversas formas de manifestações do presente, respeitando a diversidade e pluralidade, e permitir que estes monumentos repassem sua memória coletiva (DVOŘÁK, 2008, apud DE MORAES 2014). Algumas leis nacionais garantem a preservação do patrimônio cultural. O Decreto-lei número 25, de 30 de novembro de 1937, caracteriza patrimônio histórico como “[...] o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico [...]” (Artigo 1º, Decreto-lei número 25). Dessa forma, os armazéns podem ser considerados patrimônio histórico devido a seu valor histórico, manifestações públicas que envolvem a preservação, além de possuírem um potencial turístico e cultural devido sua localização privilegiada, afirma Lívia Santos (2014). As edificações que passarem pelo processo de tombamento, não poderiam ser destruídas ou demolidas, nem pintadas ou restauradas sem a autorização do Serviço do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Neste caso, o anexo construído posteriormente, que não é da estrutura original, entre os armazéns 4 e 5 deveria ser demolido, visto que obstrui visualmente e fisicamente essas edificações, segundo o artigo 18 da Lei de Tombamento. Diversas foram as propostas de revitalização dos armazéns do Porto de Vitória. Algumas dessas ideias priorizam a cultura e a preservação do patrimônio histórico existente, criando museus e equipamentos relacionados à cultura, como o projeto de revitalização do Armazém 1, elaborado pela Secretaria de Desenvolvimento da Cidade (SEDEC). Outras propostas foram elaboradas: ligadas ao turismo, como a Estação Porto, espaço cultural especial para turistas dos cruzeiros; relacionadas à mobilidade urbana, como o projeto do BRT pela subsecretária de Mobilidade Urbana


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da Secretaria de Estado dos Transportes e Obras Públicas; projetos da própria concessionária que administra o porto, a CODESA, desenvolvendo um projeto para uma nova sede da empresa.

3.3 PROJETOS PREVISTOS PARA A REGIÃO DE INTERVENÇÃO

3.3.1 Plano Mestre

O Plano Mestre (2015), confeccionado pela Secretaria de Portos da Presidência da República – SEP/PR, Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC e Laboratório de Transportes e Logística – LabTrans, faz uma análise detalhada dos condicionantes econômicos, ambientais e sociais do complexo portuário da Grande Vitória. Com foco no Porto de Vitória, alguns projetos são previstos por esse plano, como dragagem e aprofundamento do canal de acesso, bacia de evolução e berços, para atingir uma maior profundidade do canal, ampliação dos berços 103 e 104 no cais comercial de Vitória.

Figura 13: Localização dos Berços do Cais Comercial do Porto de Vitória.

Fonte: Google Earth e Laboratório de Pesquisa da UFSC (2015).


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Também, previam modificações na infraestrutura de acesso ao porto, como o projeto Portal do Príncipe, inserido no Programa de Mobilidade Metropolitana do governo do Estado (2013), que cria um viaduto de 274 metros de extensão ligando o Porto de Vitória à região da Segunda Ponte, principal ligação da capital com Vila Velha e Cariacica. Figura 14: Projeto do Portal do Príncipe.

Fonte: Fonte: Governo do Estado do Espírito Santo (2013).

Dentro do Plano Mestre, outros projetos relacionados à mobilidade da região foram previstos. A implantação do sistema de BRT, dentro da estrutura dos armazéns do Porto de Vitória, objetivando melhorar a mobilidade urbana da Grande Vitória e promovendo fluidez e sustentabilidade ao meio de transporte, criando vias exclusivas para ônibus, terminais de integração, novas estações e ônibus com maior capacidade e tecnologia.


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Figura 15: Projeto de BRT para a Grande Vitória.

Fonte: Secretaria de Estado dos Transportes e Obras Públicas (SETOP, 2014); Elaborado por LabTrans.

As instalações seriam internas aos galpões do Porto de Vitória, somadas à estrutura viária, lojas de conveniência, museus, atividades sociais e comerciais sob os galpões existentes. Também, foi proposta a criação de uma nova sede da CODESA (Companhia das Docas do Espírito Santo), que utilizaria das estruturas existentes do armazém 5 para sua implantação, contando com 8 pavimentos, fachada de vidro, que abrigaria o setor administrativo da CODESA, auditório, ambulatório, posto bancário, café, estação para embarque de passageiros de cruzeiros, heliponto, estacionamento e instalações da Receita Federal. Figura 16: Implantação do Projeto do BRT na zona portuária de Vitória.


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Fonte: Fonte: Secretaria de Estado dos Transportes e Obras Públicas (SETOP, 2014); Elaborado por LabTrans.

Figura 17: Proposta Conceitual da nova sede da CODESA.

Fonte: Fonte: Porto de Vitória (2014).

A proposta do Plano Mestre tenta integrar, de certa forma, questões urbanas como mobilidade, necessidade de equipamentos públicos de qualidade, visando principalmente a expansão e atualização da economia nessa região, através dos novos projetos. Apesar disso, algumas questões em relação à preservação do patrimônio devem ser levadas em conta. O caso do projeto de BRT, que passaria dentro das instalações dos armazéns, e da criação de viadutos conectando a zona portuária de Vitória com outra parte da cidade, poderia gerar conflitos às condições do patrimônio histórico existente. A nova sede da CODESA, por sua vez, mudaria completamente a questão estética dos armazéns, modificando a fachada de forma radical. Segundo o autor Dvořák (2008, apud DE MORAES, 2014), “Quando esse caráter original é destruído, também se destrói, na maioria dos casos, todo e qualquer efeito que o monumento intocado possa exercer sobre o expectador”. Também, registros do autor Choay (2001, apud DE MORAES, 2014) podem ser exemplos de cuidados a serem tomados em relação à este projeto do BRT nos armazéns do porto, para que estes não possuam sua identidade destruídas e não percam sua memória; “(...) o discurso de proteção são muitas vezes tomados de empréstimo pelos políticos, visando à destruição desse tipo de bem”.

3.3.2 Projetos da Prefeitura Municipal de Vitória


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O projeto pela Prefeitura Municipal de Vitória vem da Secretaria de Desenvolvimento da Cidade (SEDEC), o Centro de Memória do Porto propõe a revitalização e utilização do Armazém 1 como equipamento cultural, promovendo a abertura e interação entre a cidade e o porto e utilização da área portuária por parte da população. Esse projeto foi apresentado para a CODESA. A estrutura do projeto conta com biblioteca, espaços de exposição, sala audiovisual, cafés, lojas, áreas técnicas e administrativas. Apesar desse ideal de ocupação dos armazéns existentes com usos e atividades diversificadas, não foi proposto uma conexão dessas estruturas com o entorno, nem mesmo com a baía de Vitória, principal elemento natural existente.

Figura 18: Planta baixa do Projeto do Centro de Memória do Porto.

Fonte: Acervo da SEDEC.


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Figura 19: Imagem interna do Projeto Centro de Memória.

Fonte: Acervo da SEDEC.

Figura 20: Imagem do projeto da praça em frente ao Armazém 1.

Fonte: Acervo SEDEC.


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Além do projeto do Centro de Memória, houve o projeto Estação Porto. Espaço cultural realizado pela Secretaria de Cultura e de Turismo, que objetivava integrar a cidade, porto e a população. O Armazém 5, seria berço de projetos culturais, lazer e eventos, espaço de arte para exposições, shows de músicas, festival de filmes, oficinas, competições e premiações, integrados à Estação de Passageiros, propostas que também visam a revitalização da área central de Vitória (DE MORAES, 2014). Este espaço seria um atrativo para a região, promovendo eventos e movimentação para o centro de Vitória, no contexto social, econômico e cultural. Apesar do sucesso da iniciativa, não há indícios, atualmente, de seu funcionamento. Atualmente, os armazéns estão em sua maioria desocupados, e alguns deles armazenam equipamentos da CODESA. Suas condições de infraestrutura e conservação estão precárias, com fachadas sem pintura, com infiltrações, rachaduras.

Figura 21: Interior da Estação Porto.

Fonte: Acervo SEDEC.


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Figura 22: Evento na Estação Porto.

Fonte: Luiz Fernando Barbosa Santos, site Overmundo.

Dessa forma, analisando os projetos previstos pela Prefeitura Municipal de Vitória, é notável que há necessidade de reconectar a região portuária de Vitória com o restante do contexto urbano e, principalmente, com a sociedade. As políticas de intervenção relacionadas à revitalização do porto devem envolver a sociedade, de forma a integrar diversas camadas da comunidade, levando em conta questões ambientais, culturais, de patrimônio e de economia, retomando o sentimento de pertencimento do porto, que se perdeu com o tempo e com as evoluções da industrialização (DE MORAES, 2014). 4. REFERENCIAIS PRÁTICOS

4.1 PORTO MARAVILHA - RIO DE JANEIRO

A zona portuária do Rio de Janeiro, assim como diversas outras zonas portuárias, foi essencial no desenvolvimento do centro urbano. Apesar disso, ao longo das evoluções industriais e econômicas, a zona portuária passou por um processo de distanciamento com o restante do contexto urbano. No caso do Rio de Janeiro, a crise econômica relacionada à economia cafeeira, por volta de 1980, prejudicou e diminuiu a atividade portuária na região, o que tornou o porto obsoleto, além de gerar


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ociosidade dos equipamentos e armazéns presentes, juntamente ao contexto do centro da cidade, que passou por um processo de esvaziamento (COLCHETE FILHO, A. F. et al., 2020). Nesse contexto, alguns projetos de reconversão da frente de mar foram planejados ao longo do tempo, como o Plano de Desenvolvimento Portuário (1987/1996), Plano de Estruturação Urbana da Zona Portuária (1992), Projeto Cidade Oceânica do Rio de Janeiro (1994), Plano de Recuperação e Revitalização da Região Portuária do Rio de Janeiro (2001) e então a Operação Urbana Porto Maravilha, lançada em 2009, sua área pode ser visualizada na figura.

Figura 23: Poligonal da Operação Urbana Consorciada Porto Maravilha.

Fonte: Concessionária Porto Novo

A Operação Urbana Porto Maravilha foi principal estratégia para atribuir novos significados ao espaço público, além de incentivo à arte, design, novo mobiliário e equipamentos diversos, valorizando o contexto urbano. Nesse contexto, a renovação da imagem da cidade do Rio de Janeiro foi possível através do seu projeto de reconversão da zona portuária. Com influências de projetos como de Barcelona, São Francisco e Buenos Aires, a cidade do Rio de Janeiro desenvolve a Operação Urbana Consorciada para valorizar as dinâmicas sociais, culturais e econômicas na região da zona portuária. O principal objetivo do projeto foi a inserção competitiva da metrópole na capacidade de atrair capitais, investimentos produtivos, turistas nacionais e internacionais, além de eventos e mercadorias. O apoio aos projetos de intervenção


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nos waterfronts são utilizados pelos governos locais como uma ferramenta para promover a cidade, através da lógica de cidade-espetáculo. Foram realizados investimentos em diversas escalas e algumas dessas intervenções foram a revitalização da Praça Mauá, construção do Túnel Binário, e urbanização do Píer, reurbanização dos bairros inseridos na poligonal, como calçamento, iluminação pública, drenagem e arborização das vias existentes, renovação de alguns edifícios, demolição do viaduto existente, além da implantação de equipamentos culturais como Museu de Arte do Rio, Museu do Amanhã, Museu Olímpico, Aquário AquaRio e diversas outras edificações. Dessa forma, o projeto visou a recuperação da infraestrutura urbana existente, através de melhorias nas redes de transportes, preservação dos patrimônios histórico e cultural existentes, além de preservação do meio ambiente.

Figura 24: Implantação do VLT (Veículo Leve Sob Trilho).

Fonte: Revista Transporte y Territorio

O projeto contou com a criação de diversas praças e espaços livres de uso público, que valorizam a escala humana, além da interação social e priorização do pedestre. Também, destaque desse projeto foram as implantações de equipamentos relacionados ao incentivo à cultura e preservação do patrimônio, criando uma conexão


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maior com o contexto urbano e com a sociedade. Dessa forma a transformação da zona portuária, pelo projeto da Operação Urbana, possibilitou a retomada da vitalidade da região, além de atrair investimentos de diversos setores como habitação, turismo e empreendimentos, reestruturando as dinâmicas sociais e culturais da região, renovando a imagem da cidade do Rio de Janeiro. Figura 25: Espaços públicos ao longo da frente de mar.

Fonte: COLCHETE FILHO, A. F. et al. (2020)

A reconversão da zona portuária contou com alguns marcos importantes relacionado às decisões projetuais, a demolição do elevado perimetral, por exemplo, foi um desses marcos, visto que essa estrutura viária tornou a área um local isolado e identificado como inseguro e desagradável, e sua demolição possibilitou um uso mais adequado da área, definido num amplo passeio público linear, integrado à uma ciclovia e aos trilhos do VLT, com diversas estações de parada em seu trajeto.


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Figura 26: Elevado Perimetral antes da demolição.

Fonte: Juliana Varejão Giese (2017).

Figura 27: Área após a demolição do elevado perimetral, com trilhos do VLT, passeio público.

Fonte: Juliana Varejão Giese (2017).


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Outra ação importante no projeto de reconversão da zona portuária foi a requalificação da Praça Mauá, do Píer e entorno. Nessas regiões foram implantados o Museu do Amanhã e Museu da Arte do Rio, importantes ícones da arquitetura que também contribuíram para valorização espacial e renovação da imagem da cidade, além de criar uma conexão temporal das edificações existentes, como os patrimônios, e as edificações contemporâneas, como os museus. Nesta área da praça, priorizaram a circulação apenas de pedestres, integrando as edificações existentes, como a Casa França-Brasil, o Centro Cultural Banco do Brasil e o Centro Cultural dos Correios, além de criar uma permeabilidade visual, antes impossibilitada pelo elevado perimetral existente e a conexão com a orla marítima, dessa forma, seria restabelecida. Este projeto pode agregar à proposta projetual desde trabalho pois utiliza das estruturas existentes, os galpões, dando um novo uso e ocupação, implantando restaurantes, cafés e comércio, além do projeto paisagístico e de urbanização da área. Figura 28: Pintura “Todos Somos Um”.

Fonte: Juliana Varejão Giese (2017). Figura 29: Museu do Amanhã, no Píer Mauá.

Fonte: Concessionária Porto Novo.


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4.2 PUERTO MADERO - BUENOS AIRES

Puerto Madero é um dos bairros da capital Buenos Aires, localizada na Argentina, país da América do Sul. O bairro é uma ilha e possui 5,03 km², possui grande importância principalmente devido à sua localização, próxima ao centro urbano e comercial da cidade de Buenos Aires.

Figura 30: Foto aérea de Puerto Madero, em relação à cidade de Buenos Aires.

Fonte: Corporação Antigo Puerto Madero S. A.


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Figura 31: Área de Puerto Madero.

Fonte: Google Maps.

Ao longo do tempo, e das evoluções econômicas e industriais, diversos projetos de intervenção relacionados à reconversão de Puerto Madero foram propostos e a maioria destes planos buscava a reintegração da zona portuária com o contexto da cidade. A partir de um concurso realizado pelos órgãos governamentais, criaram uma comissão especializada para elaborar o projeto urbano do bairro, e a revitalização dos 16 armazéns existentes na costa da cidade. Figura 32: Projeto para Puerto Madero.

Fonte: (Case Puerto Madero, apud GIACOMET, 2008).


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A comissão responsável pelo projeto desenvolveu um Plano Mestre, que contava com uma série de diretrizes urbanísticas para a região. Esse plano buscou a integração do bairro com o restante da cidade, além de planejá-lo seguindo características da própria, reproduzindo alguns trechos da cidade dentro do projeto (GIACOMET, 2008). Figura 33: Implantação do projeto de Puerto Madero.

Fonte: Corporação Puerto Madero (apud GIACOMET, 2008).

Figura 34: Plano Mestre de Puerto Madero, diagrama de circulação e zoneamento.

Fonte: Corporação Puerto Madero (apud GIACOMET, 2008).


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Figura 35: Divisão do projeto em 4 diques.

Fonte: Corporação Puerto Madero (apud GIACOMET, 2008).

A partir dessa implantação, foram desenvolvidos diretrizes para as edificações que seriam construídas, além da tipologia e morfologia que poderiam seguir, como gabaritos definidos, uso do solo, entre outros. No projeto do Dique 1, a área foi destinada a edificações de hotel, exposições e eventos, além de moradia e comércio. No Dique 2, existem duas fileiras de quadras separadas por um bulevar, edificações com usos residenciais e com térreo comercial. Os edifícios-quadra costeiros são destinados às atividades comerciais no térreo, ou atividades terciárias e residenciais, no interior de Puerto Madero, neste mesmo Dique, as edificações se diluem até o parque existente. Figura 36: Edificações e tipologias presentes no dique 2.

Fonte: Corporação Puerto Madero (apud GIACOMET, 2008).

No Dique 3, há uma importante conexão com o restante do centro urbano, ligando o bairro à Praça Cólon e à Casa do Governo que, apesar de sua visual ser bloqueada pelos galpões do porto, mantêm acessibilidade através da Ponte de la


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Mujer, projetada em Puerto Madero. Este Dique é ocupado por edifícios-quadra, que ocupam o corpo periférico do lote, possibilitando a abertura de pátios centrais. Também há presença de uma linha de quadras e um bulevar, além do projeto de torres bem verticalizadas para a região. O Dique 4, apesar de possuir menos profundidade em todas as parcelas, é o que mais se conecta com o tecido urbano da cidade de Buenos Aires, visto que possui uma conexão direta através de uma via existente. Seus galpões foram utilizados para fins comerciais e terciários, serviços voltados para a cidade. O Plano Mestre propôs a implantação de torres mais verticalizadas na extremidade do bairro, assim como no Dique 1. A presença dos galpões portuários, no processo de revitalização de Puerto Madero influenciou diretamente no crescimento econômico da região, visto que essas estruturas foram utilizadas principalmente para comportar moradias, restaurantes, universidades, escritórios, os diques de Puerto Madero atraíram diversos empreendedores (GIACOMET, 2008). Os ideais propostos para esse projeto de revitalização podem ser utilizados também nesta proposta projetual, visto que em Vitória também existe uma grande frente de mar utilizável, com galpões que podem ser requalificados com usos e ocupações semelhantes ao de Porto Madero.

Figura 37: Corte Transversal de Puerto Madero.

Fonte: (GIACOMET, 2008).


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Figura 38: Desenho dos galpões do Porto.

Fonte: Corporação Puerto Madero (apud GIACOMET, 2008).

Figura 39: Galpão antes da revitalização.

Fonte: Corporação Puerto Madero (apud GIACOMET, 2008).

Figura 40: Galpão após da revitalização.

Fonte: Corporação Puerto Madero (apud GIACOMET, 2008).


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4.3 ENTREPOT MACDONALD - PARIS

O projeto do Entrepot Macdonald, em Paris revitalizou um antigo armazém existente que foi construído em 1970, possuindo 16 metros de altura e 617 metros de comprimento, uma estrutura modernista linear de 142.000 metros quadrados. Após o armazém existente ser posto à venda, a prefeitura e alguns empreendedores realizaram sua compra. Este projeto de revitalização, em 2007, contou com a participação de diversos arquitetos renomados da contemporaneidade, como Rem Koolhaas, Floris Alkemade e Xaveer de Geyter, e tornou o antigo armazém um complexo micro-urbano, com diversidade de usos e funções, como escritórios, lojas, moradias públicas e privadas, escolas, além de conectar a estrutura existente com o restante da cidade, através desses usos. Figura 41: Fachada original do Entrepôt Macdonald, possuindo 617 metros de comprimento

Fonte: Site Design Curial.

O principal conceito do projeto foi a revitalização do antigo armazém, utilizando da estrutura existente para apoiar os novos edifícios projetados. Dessa forma, o primeiro pavimento foi preservado, além de dar espaço para diversas salas


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comerciais. As estruturas das edificações foram projetadas para serem singulares, através de formas abstratas e que se diferenciavam, fugindo de uma ideia monótona de edificação. Figura 42: Plano diretor urbano que envolvia a região do armazém Entrepot Macdonald.

Fonte: Site Design Curial.

Figura 43: Fachada do Entrepôt Macdonald, edificações projetadas acima da estrutura existente.

Fonte: Site Design Curial.


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A diversificação de usos foi primordial no projeto, que contava com diversas unidades habitacionais, cerca de 74.000 metros quadrados, aproximadamente 1.200 unidades habitacionais, integrando habitação social, aluguel e privada. Possuía cerca de 25.000 metros quadrados de escritórios, 32.000 metros quadrados de salas comerciais,

além

de

estabelecimentos

públicos,

atividade

hoteleira

estacionamentos. Figura 44: Salas comerciais no térreo e habitação nos pavimentos superiores.

Fonte: Site Design Curial.

Figura 45: : Fachada com salas comerciais, edificações estudantis no pavimento superior em balanço.

Fonte: Site Design Curial.

e


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As edificações projetadas acima da estrutura existente utilizaram de formas diferenciadas, além de espaços de terraços, jardins, passarelas, os arquitetos responsáveis puderam utilizar de diferentes linguagens para o tratamento de fachada e revestimentos utilizados. Além disso, a edificação original foi separada por uma linha de trem, que a partir do projeto passa no meio da edificação, separando em dois blocos no térreo. O projeto do Entrepot Macdonald é um elemento chave na reconstrução da cidade e de sua margem nordeste, além de utilizar uma estrutura existente para preservação, propõe usos diferenciados, promovendo a evolução da economia e das questões sociais, movimentando a região e valorizando o território.

Figura 46: Planta baixa da estrutura do armazém, após o projeto de revitalização.

Fonte: Site Design Curial.


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Figura 47: Edificações habitacionais, com terraços jardim.

Fonte: Site Design Curial.

Figura 48: Entrepot Macdonald.

Fonte: Site Design Curial.


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5. PROPOSTA PROJETUAL

Esse trabalho tem como objetivo elaborar uma proposta projetual para a requalificação dos galpões do Porto de Vitória. Para isso foi elaborada uma análise dos condicionantes socioculturais, urbanos e ambientais da zona portuária com a cidade. A partir desse estudo, será proposto um projeto de intervenção para requalificação da zona portuária de Vitória, com foco na refuncionalização das edificações existentes, especificamente os armazéns, de forma a integrar essas estruturas com o restante da cidade, e proporcionar a reconexão dos usuários e moradores com o contexto da frente de mar da baía de Vitória.

5.1 ANÁLISE TERRITORIAL

A região próxima ao Porto de Vitória pertence à Zona de Ocupação Preferencial 5, segundo a Prefeitura Municipal de Vitória na publicação do Plano Diretor Urbano da cidade de Vitória, em 22 de maio de 2018 (Lei 9.271/18). Esta zona engloba, em sua maioria, o Centro da cidade de Vitória e por isso possui exigências e limitações específicas para o uso e ocupação. Uma das exigências é a necessidade de estudo de impacto de vizinhança para novas construções e modificações estruturais em edifícios existentes. Além disso, segundo o Plano Diretor da cidade, a ocupação é especialmente voltada para uso residencial e comercial de baixo impacto, visto que presentes em área histórica e com diversos edifícios com interesse de preservação. O Porto de Vitória está inserido na ZOE 4, Zona de Ocupação Específica 4, dessa forma possui caraterísticas diferentes de uso e ocupação, podendo comportar atividades relacionadas ao comércio, residencial, serviços e diversos outros, além de controlarem altura máxima definida nessa zona. A maior parte dos grupos de atividades e usos é permitida nessa região, possibilitando revitalizar as edificações existentes com usos diversificados e atrativos para promover a vivência na área portuária.


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Figura 49: ZOE 4 – Porto de Vitória e Área de Estudo

Fonte: Plano Diretor Urbano – Prefeitura Municipal de Vitória.


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Figura 50: Mapa de Zoneamento – Centro de Vitória Fonte: Autor.


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Figura 51: Usos Atuais no Centro de Vitória.

Fonte: Plano Diretor de Vitória – Mapa pelo Autor.


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Figura 52: Diagnóstico Local.

Fonte: Autor.

A região do Porto de Vitória possui interessantes conexões com seu entorno, principalmente por edificações de interesse histórico, praças e vias importantes. A região possui proximidade com o Parque Moscoso, principal área verde no centro de Vitória, que atrai um público diverso principalmente aos finais de semana. A Catedral Metropolitana e o Palácio Anchieta são edificações de interesse histórico de extrema importância e devem ser consideradas nessa proposta projetual. O Palácio Anchieta está localizado exatamente em frente a uma região do porto de Vitória. A Praça 7 e Praça 8 de setembro são áreas verdes livres próximas à região portuária, apesar de não manterem uma conexão direta com o Porto.


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As Avenidas que cortam o centro da cidade, passando pelo Porto de Vitória, possuem fluxo intenso, permitindo um acesso facilitado à região e grande movimentação durante diversos horários do dia.

5.2 POSSIBILIDADES

A região da Zona Portuária de Vitória possui grande potencial de transformação e influência nas questões socioculturais e econômicas do centro de Vitória. A proximidade do Porto com o Centro de Vitória consolidado, com marcos históricos e com uma região predominantemente residencial na cidade alta, consolida a possibilidade de um projeto de requalificação que permita aumentar a vitalidade urbana da frente mar. A proposta de requalificação objetiva instalar equipamentos que atraiam públicos em diversos horários do dia, em diversos dias da semana.. Teatros, cinemas, espaços de eventos, de aula, exposições, restaurantes e mercados, são usos que podem colaborar para a dinâmica urbana e a vivência na área, visto que possibilitam as trocas interpessoais, a movimentação de pessoas, promovem o desenvolvimento econômico, cultural e artístico. Os armazéns do Porto de Vitória estão num processo de tombamento e suas estruturas, fachadas serão preservadas. Apesar disso, algumas das possibilidades mais interessantes na revitalização do Porto de Vitória, seria a ocupação desses armazéns existentes, preservando suas estruturas, fachadas e identidade, criando uma maior conexão dessas estruturas com a cidade, além de permitir uma aproximação do usuário com a baía de Vitória, importante beleza natural com potencial turístico e econômico. Algumas propostas como ampliação das aberturas estarão incluídas no projeto, visto que para alcançarmos o conceito de permeabilidade física e visual deveremos modificar alguma parte da estrutura existente.


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5.3 PROGRAMA Figura 53: Proposta de Revitalização da Zona Portuária

Fonte: Google Maps, modificado pelo autor.

A proposta de uso e ocupação dos armazéns existentes mantém relação com as atividades do entorno, possibilitando a conexão com a cidade. Optou-se por manter as estruturas dos galpões e demolir o anexo entre os armazéns 4 e 5, a fim de criar permeabilidade visual para a baia de Vitória, além das edificações vizinhas aos armazéns 1 e 3. O uso destinado ao Armazém 1 será administrativo, chamado Boulevard de Serviços. Comportará a parte administrativa e de serviços da CODESA, além de ocupação pelo Núcleo de Polícia Marítima da Polícia Federal (NEPOM), que já existia no edifício vizinho, a ser demolido. Este equipamento será necessário devido à relocação dos usos existentes do edifício demolido, além de funcionar como parte administrativa de toda zona portuária e de todos os armazéns existentes. O programa do Armazém 2, Boulevard de Eventos, inclui o projeto de estruturas flexíveis para eventos e shows, possuindo as áreas de serviço essenciais como cozinhas e sanitários, depósitos. Com estrutura flexível possibilita diversas modificações e disposições para diferentes eventos. Essa ocupação pretende resgatar as atividades do Estação Porto, movimento artístico e cultural que ocupou o Armazém 5 num certo período, possibilitando o acontecimento de shows e eventos que atraíam grande público para a região, estimulando a diversidade na área.


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O programa do Armazém 3 inclui espaços culturais e de exposição, chamado Boulevard da Cultura. Nesse Armazém serão instalados parte de Museu do Centro de Vitória e Museu do Porto de Vitória, além de exposições temporárias de artistas locais, promovendo a arte regional, com restaurantes e cafés. O programa do Armazém 4, Boulevard das Artes, inclui uma biblioteca pública, além de salas multiuso para aulas de música, dança, teatro, pintura, artes corporais e outros. Essa estrutura ainda comporta restaurantes e cafés, além das estruturas essenciais, sanitários. A estudo/proposta projetual será focada ao Armazém 4. O programa do Armazém 5 inclui estrutura que comporta um auditório multiuso, teatro, chamado Boulevard de Convenções, com a estrutura interna necessária para controle acústico e visual, além de restaurantes e cafés, também com funcionamento noturno. A demolição do Anexo entre os Armazéns 4 e 5 foi planejada para possibilitar a conexão da baia de Vitória com a Praça 8 de Setembro tornando a área permeável ao pedestre e , e possibilitando o acesso direto da Praça com o Porto de Vitória. Essa decisão objetiva compor um eixo visual importante para região. Vale ressaltar que esse anexo não é uma estrutura do projeto original dos Armazéns, o que acaba descaracterizando as estruturas originais existentes.

5.4 CONCEITO

A proposta projetual para requalificação da Zona Portuária de Vitória tem como ideia principal a reconexão dessa área esquecida e ociosa com o restante da cidade, permitindo uma permeabilidade física e visual ao porto de vitória, além da revitalização dos armazéns existentes, ocupando-os de forma racional e sustentável, que priorize o bem estar dos usuários, além de resgatar a movimentação de pessoas e usos nessa área, criando espaços de vivência, proporcionando desenvolvimento sociocultural, econômico e até mesmo turístico. A proposta de revitalização do Armazém é destinada principalmente ao resgate dessa área ociosa, além de promover a pluralidade de usos e atividades e a reconexão da edificação com a sociedade.


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5.5 DECISÕES PROJETUAIS

O ensaio projetual objetiva apresentar uma proposta paisagística para o local e o projeto de arquitetura para o Armazém 4. Objetivou-se desenvolver além do paisagismo, o projeto de um dos galpões, para exemplificar as possibilidades de refuncionalização dos armazéns. O Armazém 4 possui proximidade com a o anexo que será demolido, além de proximidade com o Palácio Anchieta, Praça 8 e Praça 7 de Setembro, com equipamentos públicos como o Palácio da Cultura. Localiza-se próximo ao largo situado em frente ao Palácio Anchieta, local para o qual foi planejado um grande parque para requalificação da área que antes era ociosa e inocupada.

Figura 54: Implantação

Fonte: Autor


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Figura 55: Projeto Aproximado do Parque

Fonte: Autor

O grande parque

projetado possui grandes áreas livres e verdes,

principalmente destinado ao descanso e a sustentabilidade urbana. O parque funcionaria como um pulmão para a Zona Portuária de Vitória, além de contrastar com o cenário industrial moderno dos Armazéns existentes. Neste parque foram propostas áreas elevadas, em madeira, que funcionam como bancos, palcos e decks, podendo comportar diversas atividades, indicado pelo número 05 (Figura 54). A paginação diferenciada propõe caminhos que os usuários podem seguir até acharem diferentes espaços, alguns direcionam para os Armazéns, outros se conectam com as ruas, acessos, faixas de pedestre, as paginações indicadas estão numeradas com 01, 02 e 03 (Figura 54) Foi proposto uma grande área verde e livre, com vegetação diferenciada, alinhada com o eixo do Palácio Anchieta, principal edificação histórica próxima à Zona Portuária, as áreas verdes foram indicadas como 04. (Figura 54)


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Figura 56: Implantação Humanizada Fonte: Autor


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Figura 57: Parque

Fonte: Autor.

Figura 58: Parque

Fonte: Autor.


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Figura 59: Parque

Fonte: Autor.

Figura 60: Parque

Fonte: Autor.


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Figura 61: Parque

Fonte: Autor.

Figura 62: Planta Baixa Térreo Armazém 4

Fonte: Autor


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Conforme estabelecido no programa de necessidades, a edificação comportaria uma biblioteca pública, além de salas multiuso para aulas de música, dança, teatro, pintura, artes corporais, restaurantes e cafés. Na estrutura do Armazém 4 foram propostas três aberturas na parede da edificação, criando passagens e permitindo maior fluxo e conexão entre o espaço externo e interno, que comportará áreas de estar e descanso, além de apoio para os restaurantes e cafeterias. O telhado da edificação, em certas partes, foi substituído por placas translúcidas, que permitem a passagem da luz solar auxiliando na iluminação dos espaços internos. As paredes internas e seus materiais foram conservados e pintados, para preservar a aparência original. Foram instalados brises basculantes, que servem como “toldo” para abrigar mesas dos restaurantes e cafés e também como portas, para fechar as aberturas existentes. Figura 63: Área Externa

Fonte: Proposta Projetual pelo Autor


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Internamente à edificação, foram propostos um térreo e um mezanino, para melhor aproveitamento do espaço e pluralidade das atividades. No piso térreo, foi inserido uma biblioteca municipal, juntamente com a recepção e a parte administrativa. Também, forem instaladas áreas de estar e descanso, além de consumo e apoio para os restaurantes e cafeterias. A principal ideia do projeto não é ocupar totalmente a edificação, mas sim propor atividades pontuais durante um “percurso” que o usuário pode fazer ao entrar no Armazém. O usuário acaba encontrando o que fazer conforme anda no interior da edificação, podendo consumir nos restaurantes, cafés e lojas, descansar nos sofás e mesas existentes, ler ou fazer pesquisas na biblioteca. Figura 64: Biblioteca

Fonte: Proposta Projetual pelo Autor

A proposta de inserir a biblioteca no contexto da edificação é manter a relação histórica e cultural entre os elementos, resgatando e conectando esses valores à sociedade, além de ser um equipamento que vai atrair diversos usuários em vários horários durante os dias da semana.


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Figura 65: Restaurante, áreas de estar, acesso ao mezanino

Fonte: Proposta Projetual pelo Autor

No interior do Armazém foram propostos cafeterias e restaurantes, para atrair maior público à edificação e promover um roteiro gastronômico que valorizasse os pratos típicos da região. Junto a esses espaços estão ás áreas de estar e consumo, integradas entre interior e exterior, com vista para a baía de Vitória. Figura 66: Cafeteria

Fonte: Proposta Projetual pelo Autor


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Figura 67: Recepção, Administrativo, Cafeteria

Fonte: Proposta Projetual pelo Autor

Figura 68: Cafeteria, Biblioteca, Recepção e Administrativo

Fonte: Proposta Projetual pelo Autor


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Figura 69: Planta Baixa Mezanino Armazém 4

Fonte: Proposta Projetual pelo Autor

Na proposta para o pavimento superior, mezanino, foi inserido um segundo andar de biblioteca, com acesso às salas multiuso, que podem ser utilizadas para aulas de artes, pintura, escultura, oficinas de design de produto e moda, possuindo layout modificável. Ao longo do corredor e do percurso nesse pavimento foram instalados totens com fotografias relacionadas à história do Porto de Vitória e do Centro de Vitória, conectando os usuários do Armazém à história e cultura da cidade de Vitória. Figura 70: Sala Multiuso


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Fonte: Autor Figura 71: Salas Multiuso

Fonte: Autor.

Figura 72: Corredor de Exposiçþes

Fonte: Autor


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Figura 73: Corte Esquemático

Salas Multiuso

Circ.

Recepção

Biblioteca. Fonte: Autor

A proposta do pavimento superior como mezanino foi essencial para comportar maior quantidade de atividades e usos no Armazém. Dessa forma, foram propostos vãos que permitissem a passagem da luz solar, vinda das aberturas no telhado da edificação. O piso do mezanino foi afastado das fachadas interiores, o que permite essa iluminação zenital e também a integração entre os pavimentos, existindo certa permeabilidade visual entre térreo e mezanino. Neste corte esquemático é possível observar a parte direita, de frente para a baía de vitória, com a estrutura dos toldos-porta, que servem tanto para o fechamento das aberturas como para proteção do sol e chuva das mesas locadas no exterior da edificação, criando uma varanda. As paredes de vidro no interior da edificação serviram para separar alguns ambientes, porém sem perder a permeabilidade visual prevista pelo conceito do projeto.


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5.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A necessidade de requalificação de áreas obsoletas nos grandes centros urbanos é uma questão muito importante a ser discutida. Essas reformas urbanas auxiliam na sustentabilidade da cidade, utilizando territórios e edificações já existentes implantando diferentes usos e atividades que atraem usuários de diversos tipos. A requalificação da Zona Portuária de Vitória é uma proposta que objetiva alterar a dinâmica territorial da cidade, promovendo a reconexão dessa área obsoleta ao restante da malha urbana, além de impulsionar os movimentos culturais, artísticos e turísticos, geração de empregos e renda. Esta proposta iria valorizar principalmente a história e cultura, preservando a edificação existente e a reinventando, com uma pluralidade de usos que se conecta com os usuários.


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