Artigo: Uma mercadoria espetacular

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Uma mercadoria espetacular: Como a saída de oito ministros serviu aos interesses da imprensa e fortaleceu a imagem da presidente Dilma

Israel Dias1

RESUMO

Em 2011 a política brasileira apresentou mais do que um espetáculo eventual, o que se apresentou foi uma narrativa novelística, que trazia um fato revelador a cada capítulo, seguido ou precedido de declarações destinadas a um alvo certeiro, que de contrapartida, devolvia na mesma moeda. Diante deste conhecimento, os políticos usaram as mesmas ferramentas e criaram uma estratégia: sair de cena. Nesse cenário impetrado a partir de um roteiro fraco, quem perde é o interesse público, que fica a mercê de uma realidade criada pelo enquadramento e o construtivismo de um intelectual orgânico. O que se segue não traz nenhuma alegria no capítulo final.

Palavras-chave: Espetáculo; Política; Comunicação de massa; Jornalismo.

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Estudante de jornalismo e fotografia.


Em janeiro de 2011 a sucessão presidencial é consolidada e o Partido dos Trabalhadores (PT) consegue mais quatro anos para prosseguir na presidência da República. Dilma Rousseff é a primeira mulher eleita presidente no Brasil. Nos primeiros meses tudo indicava que seria um ano pouco rentável e de demissões no campo jornalístico, mas as cortinas do espetáculo se abriram, Palocci foi acusado de enriquecimento ilícito. Foi o primeiro personagem de uma história que iria durar até dezembro do mesmo ano. Outros vieram nessa sequência de quedas e denuncias. Mais do que uma narrativa novelística, uma saga se desenvolveu para servir como alimento aos veículos de comunicação e ao público acostumado com este tipo de roteiro típico brasileiro. Declarações assumidas como pseudo-denuncias culminam em narrativas que apontam a crono-dramaturgia com o ápice desse cenário midiático e político que a imprensa construiu. Desde o caso Watergate, muito usado como exemplo nas escolas de jornalismo como exemplo de sequencia jornalística e investigativa que desmascara a corrupção política, assistimos a casos semelhantes, a grande diferença é que agora existem estratégias que anulam o fim da história. Anulam usando os mesmo recursos que os media: o efeito emocional; a diversão e a encenação.

1. O que se enquadra é real Quando se enquadra essa suposta realidade, faz sentido discutir e preencher páginas e vídeos. Muito se parece com capítulos de novelas que se coloca em suspense um fato surpreendente e o deixa para o próximo dia, quando será revelado se a história terá um fim dramático e empolgante. Enquanto isso a história vai se multiplicando e outros temas acabam preenchendo outras pautas que se derivam do assunto principal. Acontece uma fragmentação derivativa.

Graças a essa continuidade, à medida que as posições da indústria cultural se tornam sólidas e firmes, mas ela pode agir nas necessidades do consumidor, conduzindo-o e disciplinando-o. A totalidade do processo social desaparece


irremediavelmente e é ocultada: a apologia da sociedade encontra-se intrinsecamente ligada à indústria cultural (WOLF, 2003:77).

Marcondes (2003) esclarece que o jornalista sozinho não tem o poder para construir este cenário, em alguns sentidos, de fato, jornalistas podem intervir, mas negativamente, isto é, ocasionalmente desinformações que precipitam novas crises políticas.

É natural, que a imprensa não tem essa capacidade de mover as coisas, tão forte não é o seu poder, mas sua imprudência pode, efetivamente, provocar retomada de conflitos e situações de crise (MARCONDES, 2002:83).

Para Wolf (2003), o espectador, mediante o material que observa, é continuamente colocado na condição de assimilar, prescrições e proscrições sem saber. Isso leva a uma outra discussão: os meios de comunicação deveriam servir para emancipar (Ensensberger, 2010) o cidadão, e não para legitimar poderes de uma minoria dominante.

Colocar sob os holofotes A notícia é um fato anunciado. Quando se coloca o holofote sobre uma figura pública o interesse é maior. Um ministro/político, acusado de corrupção sempre infla a ira da população e rende manchetes. Mas se forem oito em sequencia, renderá, além de manchetes, artigos - como este – debates e comoção nacional. O conflito entre o interesse público, a ética e a transparência contra a corrupção de um servidor público seria um enquadramento clichê, mas uma faxina ministerial, a consolidação do estereótipo da mulher moderna que sabe sobre economia mundial, e mesmo assim, sabe fazer uma faxina parece ser uma narrativa muito mais atrativa. Falar de pessoas públicas, que estão sempre em evidência, é um dado de notoriedade e certeza de manchetes quando este personagem-celebridade faz parte da cúpula política nacional. Um acontecimento que coloca em suspeita a integridade de quem deveria transparecer alvura e exemplo chama a atenção, pois serão a referência e a representação para o mundo do que é e como é o Brasil.


Como a notícia foi construída? Não há como saber de o caso se desenvolveu de comum acordo, ou arquitetado, mas não há de se negar que a imprensa soube orquestrar a narrativa desse drama muito bem. A capa de revistas, jornais e a matéria/reportagem principal de vários telejornais noticiavam sem parar: “Mais um ministro cai”, “Dilma faz uma faxina...”, essa construção noticiosa é espetacular, pois destaca a “heroína” que irá salvar a Brasil dos “vilões” ministros.

Da cultura profissional O ethos jornalístico A rede noticiosa A comunidade jornalística Distorção involuntária? Agenda building

Um breve histórico da saída dos ministros Antonio Palocci sai em junho acusado de enriquecimento ilícito; Alfredo Nascimento pede demissão em Julho. Agosto. A saída de Nelson Jobim Agosto. A queda de Wagner Rossi Setembro. Pedro Novais pede demissão Outubro. A saída de Orlando Silva Dezembro. Carlos Lupi pede demissão Fevereiro de 2012. Mário Negromonte pede demissão


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BURNIE, David. Fique por dentro da Ecologia. São Paulo: Cosac & Naify Edições, 2001. COSTA, Antônio F. G. Guia para elaboração de monografias – relatórios de pesquisa: trabalhos acadêmicos, trabalhos de iniciação científica, dissertações, teses e editoração de livros. 3 ed. Rio de Janeiro: Interciência, 2003.

FALADORI, Guillermo. Limites do desenvolvimento sustentável. Campinas. São Paulo: Editora da Unicamp, 2001.

KÜSTEN, Ângela. Democracia e sustentabilidade: experiências no Ceará, Nordeste do Brasil. Fortaleza, Expressão Gráfica e Editora, 2003.

Mauro Wolf, 2003, P.82, 83 - Teorias das comunicações de massa Teorias do Jornalismo Volume I - Porque as notícias são como são - Nelson Traquina A sociedade do espetáculo – Comentários sobre a sociedade do espetáculo Guy Debord Ignácio Ramonet, 2012, A tirania da comunicação.5.ed. Petrópolis, RJ: vozes, 2010. Hans Magnus Ensensberger, Elementos para um teoria do meios de comunicação.São Paulo, Conrad Editora do Brasil, 2003.


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