Hoje Macau 11 ABR 2014 #3069

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PERFIL

hoje macau sexta-feira 11.4.2014

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HOJE MACAU

DOMINGOS CHEONG

O SENHOR ALFAIATE FAZ fatos há 51 anos, todos os dias da semana. A julgar pelas memórias fotográficas penduradas à porta, toda a gente parece ter lugar na Alfaiataria Domingos, ali mesmo ao pé do centro, na Rua Doutor Mário Soares. Conhecido como o “Senhor Domingos”, abriu a loja de costura nos inícios da década de 60 e vestiu vários nomes sonantes da esfera social e política do período da administração portuguesa LEONOR SÁ MACHADO

leonor.machado@hojemacau.com.mo

A

Alfaiataria Domingos é de pequena dimensão e está localizada na zona central de Macau, perto do conhecido Hotel Metrópole e a dois passos do Rio das Pérolas. O aspecto da loja faz jus à sua história. Sente-se o cheiro dos tecidos e o peso das memórias a cada passo dado. Os panos, de todas as cores, feitios e texturas, (re)vestem os cantos à casa, dando-lhe uma aparência reconfortante. A Alfaiataria Domingos é uma das poucas reminiscências de Macau antigo, aquele que já só existe nos postais que mandamos para o estrangeiro,

para explicar como foi, um dia, a actual “Las Vegas da Ásia”. Corria o ano de 1963. Domingos Cheong abriu portas pela primeira vez, numa Macau (ainda) colonial. Mesmo ali ao lado, na Rua Doutor Mário Soares, a dois passos da San Ma Lou, o senhor Domingos tirava medidas aos portugueses dos anos 60. A sua infância foi passada com os seus três irmãos mais novos, tendo frequentado o colégio salesiano, Dom Bosco. Aos 16 anos começou a interessar-se pelo negócio do corte e costura, tendo, por três anos, sido aprendiz de um alfaiate italiano. Em 1941, quando o Japão ocupou Hong Kong, a fome e a miséria eram problemas constantes, pois Macau estava a ficar sobrelotado e com falta de alimento e alojamento para todos os emigrantes que tentavam fugir do poder nipónico. Ainda assim, Domingos teve sorte, uma vez que parece nunca ter-lhe faltado comida e um tecto durante a adolescência, inteiramente passada em Macau. Durante os anos de administração por-

tuguesa em Macau, foram várias as figuras políticas que vestiram a etiqueta da Alfaiataria Domingos. O seu primeiro grande cliente surgiu ainda na época de Salazar e foi o ex-ministro do Ultramar, Adriano Moreira. E como a memória não falha, Domingos recorda-se de medir e vestir outras personalidades como o último governador português de Macau, Rocha Vieira, o ex-Presidente Jorge Sampaio, ou Mário Soares. A transferência de poderes veio, sem dúvida, alterar o modo de ser deste território a quem tantos chamam de “único”. A partir de 1999, o Clube Militar foi deixando de ser paragem obrigatória e o antigo Istmo teria pouco tempo antes de se transformar no Cotai. A transição de Macau trouxe consigo menos clientes portugueses e mais gentes de fora. Chineses endinheirados, prontos para gastar a sua fortuna em produtos de qualidade. Se assim for, que seja nos fatos do senhor Domingos. De mãos atrás das costas, este chinês octogenário sorri quando olha para a colecção

de memórias, cuidadosamente penduradas por cima do balcão de atendimento e que são quase como o relato de uma vida. Enfim, recordações de uma vida de verdadeiros cortes em casacas, camisas, camisetas, calças e saiotes. Hoje em dia, Domingos queixa-se da “confusão” de Macau, que “anda muita gente na rua”. Gosta de Macau e não sabe se conseguiria viver noutro sítio. Diz que se acostumou a viver na nova RAEM. Afinal de contas, nasceu e cresceu aqui. A família divide-se entre Macau e Hong Kong, mas Domingos não gosta muito da antiga colónia britânica, diz que “é ainda mais caótico do que Macau”. Nunca quis que a alfaiataria se transformasse num negócio de família, porque sabe – e por experiência própria – que a profissão não é fácil. No entanto, nunca quis reformar-se e não pensa sair de Macau, fazendo com que a Alfaiataria Domingos fique por terras Di Macau, lembrando-nos outros tempos, outras danças, os mesmos fatos e vestidos.

Propriedade Fábrica de Notícias, Lda Director Carlos Morais José Redacção Joana Freitas (Coordenadora); Andreia Sofia Silva; Cecilia Lin; José C. Mendes; Leonor Sá Machado Colaboradores António Falcão; António Graça de Abreu; Hugo Pinto; José Simões Morais; Marco Carvalho; Maria João Belchior (Pequim); Michel Reis; Rui Cascais; Sérgio Fonseca; Tiago Quadros Colunistas Agnes Lam; Arnaldo Gonçalves; Correia Marques; David Chan; Fernando Eloy ; Fernando Vinhais Guedes; Isabel Castro; Jorge Rodrigues Simão; Leocardo; Paul Chan Wai Chi; Paula Bicho Cartoonista Steph Grafismo Catarina Lau Pineda; Paulo Borges Ilustração Rui Rasquinho Agências Lusa; Xinhua Fotografia Hoje Macau; Lusa; GCS; Xinhua Secretária de redacção e Publicidade Madalena da Silva (publicidade@hojemacau.com.mo) Assistente de marketing Vincent Vong Impressão Tipografia Welfare Morada Calçada de Santo Agostinho, n.º 19, Centro Comercial Nam Yue, 6.º andar A, Macau Telefone 28752401 Fax 28752405 e-mail info@hojemacau.com. mo Sítio www.hojemacau.com.mo


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