Como pensar de forma direta e inteligente

COMO PENSAR DE FORMA DIRETA E INTELIGENTE

COMO PENSAR DE FORMA DIRETA E INTELIGENTE

Lições Simples e Criativas para Transformar Nossa

Maneira de Pensar, de Ver o Mundo e Viver a Vida

Tradução

Felipe de Gusmão Riedel

Título do original: Thinking 101 – How to Reason Better to Live Better.

Copyright © 2022 Woo-Kyoung Ahn

Publicado mediante acordo com Flatiron Books.

Agradecemos a permissão para reproduzir a arte na página 196 de: Shali Wu e Boaz Keysar, “The Effect of Culture on Perspective Taking”, Psychological Science 18, no 7 (2007).

Gráficos cortesia do autor.

Copyright da edição brasileira © 2024 Editora Pensamento-Cultrix Ltda.

1a edição 2024.

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópias, gravações ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto nos casos de trechos curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas.

A Editora Cultrix não se responsabiliza por eventuais mudanças ocorridas nos endereços convencionais ou eletrônicos citados neste livro.

Editor: Adilson Silva Ramachandra

Gerente editorial: Roseli de S. Ferraz

Preparação de originais: Danilo Di Giorgi

Gerente de produção editorial: Indiara Faria Kayo

Editoração eletrônica: Join Bureau

Revisão: Claudete Agua de Melo

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Ahn, Woo-kyoung

Como pensar de forma direta e inteligente: lições simples e criativas para transformar nossa maneira de pensar, de ver o mundo de viver a vida / Woo-kyoung Ahn; tradução Felipe de Gusmão Riedel. – 1. ed. – São Paulo: Editora Cultrix, 2024.

Título original: Thinking 101: how to reason better to live better.

ISBN 978-65-5736-296-9

1. Autoajuda 2. Autoconhecimento (Psicologia) 3. Criatividade – Desenvolvimento 4. Desenvolvimento pessoal 5. Emoções - Aspectos psicológicos 6. Pensamentos 7. Psicologia I. Título.

24-192222

Índices para catálogo sistemático:

1. Pensamentos: Emoções: Psicologia 158.1 Aline Graziele Benitez – Bibliotecária – CRB-1/3129

Direitos de tradução para o Brasil adquiridos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA., que se reserva a propriedade literária desta tradução.

CDD-158.1

Rua Dr. Mário Vicente, 368 — 04270-000 — São Paulo, SP – Fone: (11) 2066-9000 http://www.editoracultrix.com.br

E-mail: atendimento@editoracultrix.com.br

Foi feito o depósito legal.

Para Marvin, Allison e Nathan

7.

INTRODUÇÃO

Durante minha pós-graduação na Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, quando fiz minhas pesquisas de psicologia cognitiva, nosso grupo de estudos às vezes saía para comer nachos e tomar cerveja. Era uma ótima oportunidade para fazer ao nosso professor perguntas sobre questões que provavelmente não viriam à tona durante nossas aulas formais. Numa dessas ocasiões, criei coragem para fazer uma pergunta que rondava minha mente havia algum tempo: “O senhor acha que psicologia cognitiva pode tornar o mundo um lugar melhor?”.

Achei minha pergunta um tanto estranha: como já havia comprometido minha vida a esta área de estudo, era um pouco tarde para fazer este questionamento. No entanto, ainda que naquela época eu já tivesse apresentado minhas descobertas em conferências de ciências cognitivas ao redor do mundo e estivesse a caminho de publicá-las em respeitadas revistas de Psicologia, enfrentava dificuldade para explicar as implicações reais do meu trabalho para meus amigos da época do ensino médio. Naquele dia em particular, depois de ter me esforçado para ler um artigo em que o principal objetivo dos autores

era mostrar como eles eram inteligentes ao abordar problemas complicados que não existiam no mundo real, finalmente encontrei coragem para levantar essa questão, com ajuda de algumas cervejas.

Nosso orientador era famoso por seu sarcasmo. Quando eu perguntava a ele: “Devo fazer A ou B na minha próxima pesquisa?”, ele me respondia com um enigmático “sim” ou mudava o sentido da pergunta e dizia: “O que você acha?”. Dessa vez, era uma simples pergunta de “sim ou não”, e ele escolheu uma resposta simples: “sim”. Meus colegas de estudo e eu ficamos em silêncio por um tempo que pareceu ter durado cinco minutos, esperando que ele elaborasse algum raciocínio, mas ele não foi além daquilo.

Ao longo dos trinta anos seguintes, eu mesma venho tentando responder a essa pergunta trabalhando em problemas que tenham aplicação no mundo real. Em minha pesquisa na Universidade de Yale, onde sou professora de Psicologia desde 2003, examinei algumas crenças que podem nos desviar do caminho – e desenvolvi estratégias para corrigir o rumo que podem ser aplicadas diretamente em nossas rotinas.

Além das crenças específicas que escolhi pesquisar, também explorei uma série de outros “problemas de pensamento” do mundo real que podem causar problemas para mim e para aqueles ao meu redor – alunos, amigos, família. Vi como meus alunos procrastinam porque subestimam a dor de fazer uma tarefa no futuro em vez de fazê-la agora. Uma aluna me contou sobre um médico que a diagnosticou de modo errado porque ele somente fez perguntas que confirmavam sua hipótese inicial. Notei a infelicidade das pessoas que se culpam por todos os seus problemas porque só veem um lado da realidade e a infelicidade causada por outras que nunca se veem como sendo responsáveis por qualquer coisa. Testemunhei a frustração de

casais que pensavam estar se comunicando com perfeita clareza quando na verdade mal se entendiam.

Também vi como os “problemas do pensamento” podem causar complicações que vão muito além da vida dos indivíduos. Esse tipo de erro ou crença de pensamento contribui para uma ampla gama de questões sociais, incluindo polarização política, coparticipação nas mudanças climáticas, preconceito racial, violência policial e quase todos os outros problemas decorrentes de estereótipos e preconceitos.

Desenvolvi um curso chamado “Thinking” [“Pensando”] para mostrar aos alunos como a psicologia pode ajudá-los a reconhecer e enfrentar alguns desses problemas do mundo real e tomar melhores decisões em suas vidas. Ele aparentemente atendeu a uma demanda, pois mais de 450 alunos se matricularam no curso, só em 2019. Parecia que eles ansiavam pelo tipo de orientação que a psicologia poderia fornecer, e um foi contando ao outro sobre as aulas. Foi então que percebi algo curioso: alguns familiares de alunos que estavam visitando o campus me contaram que os alunos do meu curso ligavam para casa para falar como estavam aprendendo a lidar com os problemas em suas vidas – e que alguns até começaram a aconselhar outros familiares, inclusive seus pais. Colegas me disseram que ouviram estudantes no refeitório debatendo de maneira acalorada as implicações de alguns dos experimentos debatidos no curso. Em conversas sobre os assuntos abordados nas aulas com alunos de outros cursos, a pergunta onde poderiam aprender mais a respeito daqueles temas era frequente. Tudo sugeria que as pessoas realmente queriam essas ferramentas e precisavam delas, de modo que decidi escrever um livro para tornar algumas delas mais amplamente disponíveis.

Selecionei oito tópicos que achei mais relevantes para nossa vida diária. Problemas que meus alunos e outras pessoas (inclusive eu!) enfrentam no dia a dia. Cada capítulo abrange um deles e, embora

possa ter citado alguma passagem do livro quando achei relevante, os capítulos foram escritos para ser lidos em qualquer ordem. Embora eu aborde erros e vieses de pensamento, este livro não trata do que há de errado com as pessoas. “Problemas de pensamentos” acontecem porque estamos conectados de maneiras muito particulares, e muitas vezes há boas razões para isso. Erros de raciocínio são principalmente subprodutos da nossa cognição altamente evoluída, que nos permitiu chegar tão longe como espécie e sobreviver e prosperar no mundo. Como resultado, as soluções para esses problemas nem sempre estão facilmente disponíveis. De fato, tentar eliminar crenças e vieses de pensamento é algo extremamente desafiador. Além disso, para evitar esses erros e tendências de maneira efetiva, não basta aprender o que são e se esforçar para lembrar que não devemos cometê-los. É como quando temos insônia, sabemos exatamente qual é o problema... não conseguimos dormir. Mas dizer para quem tem insônia que a pessoa deve dormir nunca será a solução para o problema. Do mesmo modo, embora algumas das crenças abordadas neste livro já sejam familiares para você, precisamos de soluções melhores do que simplesmente dizer: “Não faça mais isso”. Felizmente, como um número crescente de estudos atestam, existem estratégias que podem ser adotadas para raciocinar melhor. Essas estratégias também podem nos ajudar a descobrir o que não podemos controlar e até mesmo mostrar como soluções que a princípio pareciam promissoras podem dar errado no final.

Este livro é baseado em pesquisas científicas, principalmente de outros psicólogos cognitivos, mas também de alguns estudos que eu mesma realizei. Muitas pesquisas que cito são consideradas clássicas, que resistiram ao tempo, outras apresentam resultados de estudos mais recentes. Assim como faço em meu curso, dou vários exemplos tirados de áreas muito diferentes de nossa vida para ilustrar cada ponto. Há uma razão para isso, e você vai descobrir por quê.

Então, voltando à pergunta que fiz ao meu professor: “A psicologia cognitiva pode tornar o mundo um lugar melhor?”. Desde que me fiz esse questionamento pela primeira vez, venho cada vez acre-

ditando mais que a resposta é, de fato, aquela que meu orientador nos deu tão apropriadamente: “Sim”. Definitivamente, sim.

A ILUSÃO DA FLUÊNCIA

Por que as coisas parecem ser tão fáceis?

Oauditório Levinson, com 450 assentos, é um dos maiores auditórios da Universidade de Yale, e quando meu curso de graduação intitulado “ Thinking” [“Pensando”] acontece, às segundas -feiras e quartas-feiras das 11h35 às 12h50, quase todos os lugares ficam ocupados. A palestra de hoje sobre excesso de confiança provavelmente vai ser bem divertida, porque quero convidar alguns alunos para virem ao palco para dançarem um vídeo de K-pop.

Começo minha palestra descrevendo o que é o efeito acima da média. Explico a eles usando exemplos reais: quando pediram para um milhão de estudantes do ensino médio para avaliarem suas habilidades de liderança, 70% afirmaram que elas estavam acima da média e 60% se colocaram entre os 10% mais bem classificados em termos de capacidade de liderar outras pessoas. Quando professores universitários foram questionados sobre suas habilidades de ensino, dois terços se colocaram entre os 25% melhores. Depois de apresentar esses e outros exemplos de autoavaliação excessivamente generosa, faço uma pergunta aos meus alunos: “Qual porcentagem de norte-americanos você acha que afirma ser melhor motorista do que

a média da população?”. Os alunos arriscam números mais altos do que os que eu havia apresentado até então, como 80 ou 85%, rindo, porque acreditam serem percentuais exagerados. Mas o que se descobre é que seus palpites ainda estão aquém da realidade: a resposta certa é 93%.

Para ensinar aos alunos sobre os vieses presentes no nosso pensamento, não basta simplesmente apresentar resultados de estudos. Tento fazê-los experimentar esses vieses por si mesmos, para que não sejam vítimas da tendência de dizer “eu, não”, aquela ideia de que, embora os outros possam ter certos vieses cognitivos, nós seríamos imunes a eles. Por exemplo, um aluno pode pensar que não é exageradamente confiante porque às vezes se sente inseguro. Outra aluna pode achar que é uma pessoa realista simplesmente por ter o costume de acertar suas notas nas provas, fazendo com que acredite que também é realista analisar suas habilidades de liderança, relacionamentos interpessoais ou de condução de veículos.

Mostro para a turma um clipe de seis segundos da música “Boy with Luv” do BTS, um vídeo com mais de 1,4 bilhão de visualizações no YouTube. Escolhi propositalmente uma parte em que a coreografia não é muito técnica (se você já encontrou o videoclipe oficial, ela está entre 1:18 e 1:24 minutos).

Depois de reproduzir o clipe, digo aos alunos que quem conseguir reproduzir a dança dessa parte do vídeo vai ganhar um prêmio. Assistimos ao trecho mais dez vezes. Até mostro uma versão mais lenta que foi especialmente criada para ensinar as pessoas a dançar a música. Então solicito voluntários. Dez alunos corajosos caminham para a frente do auditório em busca da fama, enquanto o resto aplaude ruidosamente. Tenho certeza de que centenas deles também pensam que podem reproduzir os passos. Depois de assistir ao clipe tantas vezes, até eu sinto que poderia fazê-lo – afinal, são apenas seis segundos. Não deve ser tão difícil.