Revista por um mundo melhor edição 10

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ANO IV jan/fev/Mar 2020 BRASÍLIA-DF books maze publishing house EDITORA COLÔNIA INDEPENDENTE ISSN: 2358-3207

WFP/ONU: EXCELÊNCIA NO COMBATE À FOME

Escola Maria Teixeira: A ÉTICA DO AMOR PROTEÇÃO ANIMAL: EM DEFESA DOS VULNERÁVEIS

PORQUE O MUNDO TAMBÉM É REPLETO DE BOAS NOTÍCIAS E PESSOAS EXTRAORDINÁRIAS 1



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| editorial O QUE FAZER PELA FOME NO MUNDO? Em todos os setores da vida, os extremos resumem a condição humana no planeta. Em relação à alimentação não seria diferente. Tão prejudicial quanto a obesidade – considerada a segunda principal causa de mortes em todo o mundo –, estudos mostram que a desnutrição é igualmente uma calamidade em âmbito mundial. A ONU estima que, atualmente, 821 milhões de pessoas – mais de uma em cada nove pessoas – não têm acesso a comida suficiente para se alimentar. Além disso, uma em cada três pessoas no mundo está desnutrida. Em breve, isso pode mudar para uma em duas pessoas se os impactos negativos na saúde e no bem-estar das populações continuarem. A situação é especialmente grave em áreas de conflito e nas regiões afetadas por situações climáticas extremas, como longos períodos de seca. Para detalhar assunto tão importante, publicamos como matéria de capa as atividades do Escritório do Programa Mundial de Alimentos da ONU em Brasília (WFP), abordando seus esforços para ajudar a sanar talvez uma das maiores e mais emergenciais situações em âmbito mundial: a crise alimentar global. Tão relevante quanto esse assunto é a lamentável condição animal no planeta, que conta com diversos fatores – culturais (violência tradicional: rodeios, vaquejadas, touradas, rinhas de cães e de galos etc.), familiares (violência doméstica), econômicos (indústria), sanitários (centros de zoonoses), científicos (laboratórios de vivissecção e biotérios) e com a contravenção (tráfico de animais silvestres) – para se perpetuar, deixando um rastro de dor e vidas perdidas. Para tratar do assunto, entrevis-

tamos a advogada Ana Paula de Vasconcelos, que realiza dura luta profissional e de vida em defesa dos seres mais vulneráveis do planeta. Nas seções de cultura, apresentamos duas matérias que mostram a importância da arte tanto para a luta pela equidade social quanto para ajudar a desvelar a importância do inconsciente humano em serviço à vida: a notável trajetória artística e docente da artista plástica Lêda Watson e um estudo sobre a importância dos quadrinhos para a denúncia sobre a ausência da garantia de direitos nas sociedades globais. Na seção de educação, abordamos a magnífica iniciativa docente da Escola Maria Teixeira (EMT), no Jardim Ingá, em Luziânia (GO), que ampara alunos especiais e investe no seu desenvolvimento humano a partir da inusitada e louvável pedagogia da Ética do Amor. Por fim, em tempos de xenofobia em escala mundial, falamos de uma família italiana que abriu mão de grande parte de sua fortuna para equipar um barco de resgate a refugiados no mar Mediterrâneo. Conheça a atuação da Moas (Migrant Offshore Aid Station), a primeira ONG do mundo criada para realizar resgates humanitários no mar. De 2013 (ano de fundação da iniciativa) até 2020, a ONG contabiliza milhares de vidas salvas. É isso aí. Apreciem esses destaques e muito mais nesta edição, que preparamos com muito carinho para vocês. Esperamos que vocês gostem. Até a próxima edição.

expediente | A revista Por Um Mundo Melhor é uma publicação trimestral da Books Maze Publishing House e da Colônia Editora Independente e não tem fins lucrativos. Todos os recursos advindos da comercialização de seus anúncios se destinam à sustentabilidade do periódico, à remuneração de seus profissionais e ao apoio a projetos sociais, ambientais e de defesa dos vulneráveis. Books Maze Publishing House - CNPJ: 19.920.208/0001-57 Fundador e editor-chefe: Paulo Henrique de Castro e Faria / RP MTb: 4136/DF Projeto gráfico, Ilustração e Diagramação: Léo Silva Assistente editorial: Neuza Castro e Silva Foto de capa: Nyani Quarmyne/WFP

Contatos: 55 61 99819 9828 / 99964 7263

Representação comercial, consultoria em produção gráfica: Cleber de Albuquerque | Colônia Editora Independente Eirelli CNPJ: 24.206.387/0001-03 coloniaeditora.com.br Tel.: (61) 99964-7263 Impressão: Qualidade Gráfica e Editora Tiragem: 3.000 exemplares ISSN: 2358-3207 Distribuição gratuita

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SUMARIO | 6

EXCELÊNCIA NO COMBATE À FOME

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O MODELO PEDAGÓGICO DIFERENCIADO DA ÉTICA DO AMOR

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LÊDA WATSON: A ARTE FALA PELA PRÓPRIA ARTISTA

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EM DEFESA DOS VULNERÁVEIS

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CONTRA A GLOBALIZAÇÃO DA INDIFERENÇA

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A ARTE A SERVIÇO DA GARANTIA DE DIREITOS

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cultura, ações sociais, direitos dos animais e responsabilidade socioambiental. Em reconhecimento a todos os apoiadores e patrocinadores que tornam possível o sonho deste projeto, deixamos nosso mais sincero Acesse o nosso site: www.revis agradecimento. revistaporummund Sem vocês, não teríamos chegado até aqui. 55 61 99819 982 Cada um de vocês, à sua maneira, também contribui Por Um Mundo Melhor.

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MATÉRIA DE CAPA

EXCELÊNCIA NO COMBATE À FOME

Do pequeno agricultor à alimentação escolar, saiba o que faz o Escritório do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas em Brasília e como você pode ajudar no combate à fome no mundo

DA REDAÇÃO

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WFP/MARIANA ROCHA

WFP (Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas) é a maior agência humanitária do mundo. Oferece assistência a 86,7 milhões de pessoas em 83 países. E o escritório do WFP Brasil, em Brasília (DF), é também sede do Centro de Excelência contra a Fome, um hub global de diálogo para a formação de políticas públicas, aprendizagem, desenvolvimento de capacidades e assistência técnica Sul-Sul para promoção de ações contra a fome. O Centro de Excelência é o resultado de uma parceria que existe desde 2011 entre o WFP e o governo do Brasil. O escritório apoia governos da África, da Ásia e da América Latina no desenvolvimento de soluções sustentáveis, programas e políticas públicas contra a fome que sejam geridos por governos nacionais. O maior objetivo do Centro de Excelência é aproximar países que enfrentam desafios similares nas áreas de segurança alimentar e nutricional, com foco especial em programas de compra local para alimentação escolar ligados à agricultura familiar e à nutrição. Outro braço importante do

Foto tirada por Mariana Rocha, Oficial de Programas do WFP Brasil, em visita técnica feita a Moçambique

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WFP/PATRICK NJAWALA

WFP/NYANI QUARMYNE

Alimentação escolar em Gana

trabalho é o projeto Além do Algodão, que é uma parceria entre o Centro de Excelência, a Agência Brasileira de Cooperação e o Instituto Brasileiro do Algodão. O Centro de Excelência fortalecerá sua atuação em nutrição em 2020, com um novo projeto voltado especificamente ao fortalecimento das ações nacionais de combate à má nutrição e de promoção da alimentação adequada e saudável, compartilhando a ampla experiência brasileira na redução da insegurança alimentar e nutricional. O algodão é um dos produtos agrícolas mais importantes do mundo e sua produção é significativa para a geração de emprego e renda. É também uma alternativa para superar a pobreza rural. Cerca de 350 milhões de pessoas em todo o mundo realizam atividades econômicas relacionadas ao algodão, que é uma das 20 commodities mais importantes do mercado mundial em termos de valor. No entanto, o principal desafio de muitos pequenos produtores é encontrar mercados estáveis para os subprodutos do algodão e alimentos associados, diferentemente da fibra de algodão, para a qual o mercado já está definido e garantido. E é aí que entra o trabalho do Centro de Excelência. O projeto conecta subprodutos de algodão – como óleo e farelo – e culturas consorciadas – como milho, sorgo e feijão – a mercados estáveis, incluindo programas de alimentação escolar. A iniciativa con-

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Vinicius Limongi, Oficial de Programas do WFP Brasil, interage com crianças em escola do Maláui

tribui para a geração de renda dos agricultores familiares e aumenta a segurança alimentar e nutricional nas áreas rurais. O projeto Além do Algodão apoia pequenos agricultores e suas famílias, bem como instituições públicas em países como Benin, Moçambique, Quênia e Tanzânia, em uma iniciativa conjunta entre o governo brasileiro – representado pela Agência Brasileira de Cooperação (ABC), do Ministério das Relações Exteriores (MRE) – e outros escritórios locais do WFP.

Fome no mundo: o que vem sendo feito? Atualmente, 821 milhões de pessoas – mais de uma em cada nove pessoas – não têm acesso a comida suficiente para se alimentar. E uma em cada três pessoas no mundo está desnutrida. Em breve, isso pode mudar para uma em duas pessoas se os impactos negativos na saúde e no bem-estar das populações continuarem. A situação é especialmente grave em áreas de conflito e naquelas regiões afetadas por situações climáticas extremas, como longos períodos


de seca. Um relatório recente do WFP descreve emergências alimentares projetadas para o primeiro semestre de 2020 em todo o globo. Desafios relacionados à fome devem persistir e as necessidades alimentares na África Subsaariana são especialmente preocupantes.

WFP/NATAN GIULIANO

A comunidade internacional, mediante órgãos das Nações Unidas, está trabalhando para alcançar os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que se subdividem em 169 metas. O trabalho do WFP concentra-se especialmente nos itens 2 (acabar com a fome) e 17 (revitalizar parcerias globais para o desenvolvimento sustentável). A contribuição do Centro de Excelência, em Brasília, está focada em alimentação escolar, nutrição, desenvolvimento social, agricultura familiar, agricultura comercial com impacto social, fortalecimento de capacidades e pesquisa.

• Todos os dias, cerca de 5 mil caminhões, 20 navios e 92 aviões levam alimentos e outros tipos de assistência a algumas das regiões mais remotas e desafiadoras do planeta. • 16,4 milhões de crianças recebem merenda escolar do WFP, o que melhora tanto a nutrição quanto o acesso à educação. • 44 países gerenciam seus próprios programas de alimentação escolar. • 52% dos beneficiários que recebem assistência do WFP são mulheres e meninas, enquanto 1,3 milhão de mulheres participam de treinamentos sobre projetos de assistência alimentar. • O WFP conecta agricultores familiares de 40 países. Em 2018, o WFP comprou o equivalente a US$ 31 milhões em alimentos da agricultura familiar.

Alimentação escolar: criando pontes para o desenvolvimento Dado o aumento acentuado do duplo fardo da desnutrição entre crianças em idade escolar (coexistência de sobrepeso e obesidade, juntamente com a desnutrição), as escolas representam um importante ponto de entrada para uma melhor nutrição. Os programas de alimentação escolar oferecem uma grande oportunidade para transformar os sistemas alimentares, ajudando a estabe-

Aluna apresenta uma horta escolar para a vice-ministra de Serra Leoa, Emily Kadiatu Gogra

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WFP/NATAN GIULIANO

Workshop ministrado pelo WFP Brasil na visita de estudo da delegação de Uganda

Alimentação escolar em Salvador (BA)

As merendeiras possuem um papel essencial na alimentação escolar

WFP/NATAN GIULIANO

Parte do trabalho do WFP Brasil é conectar países com experiência em nutrição, alimentação escolar e políticas sociais – como o Brasil – e outros que estão iniciando essa jornada. Somente em 2018, 17 países receberam assistência do Centro de Excelência, o que inclui workshops nos países, apoio remoto e visitas técnicas ao Brasil.

A mais recente visita foi da delegação de Uganda, em novembro do ano passado. O objetivo do grupo foi aprender mais sobre o Programa Nacional de Alimentação Escolar do governo brasileiro, que é reconhecido internacionalmente. O país veio também em busca de estratégias de planejamento para superar alguns dos desafios locais, como a fome entre estudantes durante o horário letivo e as altas taxas de evasão escolar,

WFP/NATAN GIULIANO

lecer hábitos saudáveis entre as crianças, fomentando, assim, cadeias sustentáveis.

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WFP/NATAN GIULIANO WFP

Avião do WFP distribui comida em região de emergência

o que resulta em baixa transição para o ensino médio, especialmente para meninas. Em 2018, autoridades de Serra Leoa e Senegal vieram conhecer a experiência brasileira. Na ocasião, Serigne Mbaye Thiam, ministro senegalês de Educação, afirmou que tais visitas serviam de importante inspiração. “Com essa vontade política forte e com esse apoio do WFP Brasil, nós teremos um programa de alimentação escolar que cobrirá todas as crianças do Senegal de forma universal. É algo possível de se fazer”, declarou. Representantes de países de outras regiões também buscaram inspiração na experiência brasileira, como Bangladesh, Filipinas, Timor Leste e Paquistão. Em 2017, o governo de Mianmar enviou uma delegação para uma visita de estudo ao Brasil e um plano de ação foi preparado. Quer conhecer mais sobre o trabalho do Centro de Excelência contra a Fome do WFP Brasil e contribuir para acabar com a fome no mundo?

Serviço Joélcio Carvalho, Oficial de Programas do Projeto Além do Algodão, em visita ao Benin

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EDUCAÇÃO

O MODELO PEDAGÓGICO DIFERENCIADO DA ÉTICA DO AMOR A Escola Maria Teixeira, no Jardim Ingá, educa crianças e adultos especiais com uma proposta inovadora e revolucionária: a metodologia educacional da ética do amor, fazendo jus à frase: “a melhor maneira de ensinar uma criança a amar é amando-a” PAULO CASTRO

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EMT

ma convicção muito difundida nas escolas que têm uma proposta pedagógica de vanguarda em relação aos colégios tradicionais é que uma criança amada é um ser completamente diferenciado em relação às demais. Ela tem um preparo muito maior para a vida, ao contrário dos jovens educados apenas para compor o mercado

A cooperação é outra base pedagógica da escola

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de trabalho e alimentar o sistema. (Detalhe: “criança amada” não quer dizer “criança mimada”, muito pelo contrário). A diferença é abissal: de um lado, um modelo educacional majoritário que apenas prepara as pessoas para que sejam bons profissionais, mas não exatamente pessoas conscientes para o convívio social e nem


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prontas para dar sua parcela de contribuição para a transformação da sociedade. Do outro lado, pessoas que têm o firme propósito de deixar sua marca de mudança social.

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Parafraseando o educador argentino Pablo Lipnizky, todo mundo fala de paz, mas poucos educam para a paz. A maioria educa apenas para a competição (profissional, social etc.), que é o princípio originador das guerras. Foi por isso que o Dalai Lama afirmou: “A importância da educação já foi compreendida, mas cérebros brilhantes também podem produzir grandes sofrimentos. É preciso educar os corações”.

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Inserida numa realidade social desafiadora, de baixíssima renda e estatísticas preocupantes, com reduzido índice de desenvolvimento humano, em plena zona rural do Jardim Ingá, em Luziânia (GO), está um estabelecimento educacional que faz justiça à citação do lama tibetano: a Escola Maria Teixeira (EMT), que educa pessoas especiais com base no princípio didático original da ética do amor.

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Estruturada em formato de vila, como um vilarejo acolhedor, a EMT não tem fins lucrativos e oferece educação infantil e ensino fundamental, atendendo gratuitamente 270 alunos, entre crianças e adolescentes de baixa renda no ensino comum e especial. Atende ainda alunos com síndrome de Down, autismo, deficiências cognitivas, motoras, visuais e auditivas, entre outras, além de alfabetizar adultos, atuando nas três pontas: os filhos, os pais e os avós, pois a instituição entende que a educação é uma construção social que deve abarcar toda a família. Também são atendidos bebês especiais na estimulação precoce. A maior riqueza da escola: seus alunos

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EMT

PAULO CASTRO/BOOKS MAZE PUBLISHING HOUSE

Pedagogia pelo amor: professora Silvana Vasconcelos

Plantando árvores: aula de conservação da natureza EMT

Uma escola para todos “A EMT é uma escola de pensamento, que acredita que é possível educar as pessoas para a vida. A escola é uma prova disso. Além das matérias comuns da grade curricular tradicional, temos outras três disciplinas obrigatórias: ‘Ética do Amor’, ‘Respeito à Natureza’ e ‘Libras’, que é a segunda língua da comunidade”, explica a professora Silvana Vasconcelos, diretora-fundadora voluntária da entidade. As disciplinas mencionadas evidenciam a marca registrada da escola: a inclusão pelo amor. “A entidade nasceu para ser uma escola para todos”, completa a professora. A escola é um verdadeiro oásis para as famílias que vagavam no deserto de não saber o que fazer com seus filhos especiais, recusados pelos colégios tradicionais. Como se não bastasse conviverem com as dificuldades inerentes às suas deficiências, muitos desses alunos ainda vêm de lares complicados (com violência doméstica, abuso sexual, desestrutura familiar, rejeição etc.), motivo pelo qual a escola procura apagar marcas difíceis da memória, com uma pedagogia baseada na compreensão, no respeito e na aceitação amorosa das

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Sala Sorriso de Algodão: consultório odontológico da escola


PAULO CASTRO/BOOKS MAZE PUBLISHING HOUSE

Um convênio com a prefeitura garante transporte para as crianças

diferenças. Hoje, a EMT atende a segunda geração de alunos, filhos de ex-alunos. Por causa do modelo da escola, que inclui a defesa do cerrado e o respeito à natureza em seu currículo, em 1994 a EMT entrou com um pedido na justiça para que a área em torno da vila fosse considerada a 1ª Unidade de Conservação do Entorno. Não por acaso, todas as salas de aula da escola têm nomes que remetem à natureza. A EMT tenta também salvar o rio Palmital, que passa nos fundos da vila e foi poluído por uma empresa de detergentes. Por causa disso, a empresa foi acionada judicialmente e, como contrapartida pelos danos ambientais, acabou ajudando também a escola.

À mestre com carinho: multiplicando as lições de amor “Tenho minha vida marcada pelo diferencial pedagógico da escola. A EMT é um mundo que vive o resultado inovador que a conexão pelo amor traz”, afirmou Jessé Cantanhêde, ex-aluno da vila e atualmente formando em Pedagogia. Hoje com 29 anos, Jessé chegou

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à escola em 2003, aos 13 anos, juntamente com os outros oito irmãos e os pais, que também foram abraçados pela entidade. Ele afirma que, quando se tornou adulto e saiu da escola, teve um choque de realidade na comunidade do Jardim Ingá e no mundo afora. “Antes e depois da escola, eu e meus irmãos passamos por todo o tipo de assédio da sociedade. Foi a base que recebi da escola que me fortaleceu e me fez mais preparado para a vida”. Jessé reafirma que foi a proposta inovadora da escola de respeitar as diferenças de cada aluno – e de amá-los como eles são – que tornou sua conscientização social possível. Graças a tudo o que viveu e aprendeu na EMT, Jessé decidiu que – depois de formado – irá voltar à escola, mas agora como professor, para replicar o modelo pedagógico e multiplicar o amor recebido. “Na sociedade, nós somos muitas vezes excluídos por querermos e escolhermos o caminho certo. Aqui, aprendi que o amor é a base de tudo.


EMT

Se a base está bem assentada com os fundamentos do amor, podemos erguer qualquer edifício em cima. Com o indivíduo também é assim. Se a criança tem essa base, tudo é possível ao adulto que ela irá se tornar”, raciocinou Jessé.

Em busca da sustentabilidade do projeto social

Certo dia, a professora estava em um laboratório, quando viu um pacote de pão de queijo, que a clínica fornece aos clientes, e teve uma revelação. Viu no pacote o mesmo símbolo da escola (o desenho amarelo de uma casinha sorrindo). Achou que aquilo era um sinal e que eles deveriam fabricar pão de queijo, que seria a forma de tirar a escola da situação difícil. Surgiu, assim, a fábrica. Foi só um dos muitos auxílios inusitados que a escola recebeu em 25 anos de atividades. Apesar disso, a escola ainda não é sustentável e carece muito de doações. “Existe uma lista imensa de espera de novas crianças, que ainda não temos condições de atender”, explica a professora Silvana.

Sala Vagalume: sala de informática EMT

A vila tem 23 funcionários e emprega mão de obra para dois estabelecimentos industriais da entidade: uma fábrica de doce de leite e outra de pão de queijo, que produz uma tonelada por dia, constituindo uma linha de produção para comercialização por outra empresa. A professora Silvana explica que, entre 2014 e 2015, a EMT viveu sua pior crise, quando quase encerrou suas atividades. Foi quando pediu em orações uma solução para as dívidas financeiras da instituição.

EMT: de braços abertos para acolher as diferenças

Temos a certeza de que, assim como o amor pode brotar do ofício de lecionar aos mais vulneráveis, a Escola Maria Teixeira ainda terá muito a ensinar ao sistema educacional, mostrando como a pedagogia tradicional está longe de edificar um ser humano preparado para tornar o planeta um lugar melhor para se viver.

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PERFIL

LÊDA WATSON: A ARTE FALA PELA PRÓPRIA ARTISTA “O inconsciente é tudo. Não se podem ditar regras ao inconsciente. O eu interior tem que ser respeitado”.

DA REDAÇÃO

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nanimidade: é assim que 10 entre 10 artistas plásticos conceituam a vida e a obra de Lêda Watson, em uma trajetória de 51 anos dedicados à arte e, em especial, à gravura em metal, além de 30 anos como docente e mais de 400 alunos formados por suas mãos. Carioca de berço e brasiliense de coração, a artista conheceu o mundo e extraiu dele o sumo da técnica, mas foi bem perto de si, no próprio interior (no seu inconsciente, como ela diz), que encontrou o elã para sua notável arte, tendo o cerrado de Brasília como inspiração. Foi observando essa vegetação castigada pelo causticante clima, mas resiliente, plena de ensinamentos, que ela percebeu como a arte poderia servir como um espelho interior. Como aluna de Gotthard Friedlaender, Orlando Dasilva e Oswaldo Goeldi, Lêda Watson precisou aprimorar sua técnica, para perceber que bastava unicamente dar voz ao seu eu interno, rico de belezas, mas

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FOTO E IMAGENS: NEWTON SCHEUFLER/DENISE MACEDO/A CASA DA MÃO

“No impulso de buscar questionar as coisas com as quais você não concorda, saem maravilhas”.

também de angústias, para dar à luz a quintessência de sua criação.

“A arte é necessária para nos fazer resistir e levar o estímulo contra as coisas do mundo que são contrárias à arte”. 19

Como um resumo das mais de cinco décadas dedicadas à arte e a multiplicar o ofício de ser artista, amalgamando o próprio coração e tornando-se parte indissociável da cultura da cidade que aprendeu a amar e viu nascer, como uma filha nascida de suas próprias entranhas, Lêda Watson costuma dizer que “a arte é a manifestação da sensibilidade humana. A sociedade não vive só de raciocínio. A cultura existe para confrontar o endurecimento do coração e dos sentimentos”.


PROTEÇÃO ANIMAL

ANA PAULA DE VASCONCELOS:

EM DEFESA DOS VULNERÁVEIS Ela se notabilizou por sua luta ferrenha em defesa dos animais. Advogada do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, ONG que atua em todo o país, ela é também vice-presidente da Comissão de Direitos dos Animais e Ambientais da Subseção de Taguatinga da OAB/DF e faz parte da Diretoria da Comissão Nacional de Proteção e Defesa Animal da OAB Nacional. Nesta conversa, ela conta os percalços que os defensores dos animais enfrentam para criminalizar agressores e conscientizar a autoridades sobre o tema

PAULO CASTRO

Desde que nossa civilização existe, vivemos a banalização da violência e a desvalorização da vida. Se a própria vida humana é colocada em patamar tão indigno, como considerarmos os direitos dos animais?

ACERVO PESSOAL

Infelizmente, a violência sempre existiu em diversas civilizações e sempre irá existir. Acredito que isso faça parte das relações e do con-

vívio em sociedade. O homem ainda não conseguiu viver em paz nem com os seus e nem com os de outras espécies. Em relação ao crime de maus-tratos aos animais, vejo que nossa sociedade vem evoluindo muito, não da maneira e nem com a velocidade que gostaríamos, mas vem, sim, se conscientizando e percebendo que os animais precisam de nossa proteção. Os debates que temos hoje não tínhamos há 10 anos. Então, vejo que estamos em um processo evolutivo, mesmo que lento, para que, cada vez mais, os direitos dos animais fiquem em evidência e sejam respeitados. Mas como toda transformação de sociedade, isso leva décadas. Porém, vejo de forma positiva o momento que estamos atravessando como uma constante de crescimento. A lei brasileira tem regras claras que se aplicam aos animais domésticos. Mas como os animais não domésticos podem ser amparados pela legislação brasileira vigente? A Lei nº 9.605, em seu art. 32, protege animais silvestres, domésticos, domesticados, nativos ou exóticos. Ou seja, a nossa lei federal, que criminaliza as condutas de abuso, maus-tratos e ferimentos a animais, não faz qualquer distinção entre as espé-

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ACERVO PESSOAL

Movimento de protetores de animais, em protesto contra o caso do cão Luke

cies. Também a Constituição Federal, em seu art. 225, não faz tal distinção. Todos os animais são protegidos pela lei brasileira. Há muitas décadas, grupos dos direitos dos animais constantemente enfatizam que animais criados para o consumo humano (como porcos, vacas, peixes e frangos, por exemplo) devem ter os mesmos direitos dos animais domésticos (como cães e gatos). Isso pode ocorrer no futuro? Seria o ideal caminharmos para um mundo de respeito a todas as espécies de vida, não só animais silvestres, domésticos ou domesticados, mas também os animais de produção. Mas, infelizmente, estamos ainda muito aquém do que gostaríamos. Hoje, seria muito mais justo se vivêssemos em um mundo vegano, pelo menos em um país vegano. Todavia, acredito que nunca conseguiremos um tratamento igual, porque se trata de questões culturais, de hábitos milenares e de algo que mexe muito com a economia de qualquer país. Porém, dentro do possível, é necessário assegurar, cada vez mais, o mínimo de direito para os animais. O Ministério da Agricultura tem algumas regras, com as quais não concordo, como o abate humanitário, porque não há humanidade nenhuma nisso. Aliás, talvez até haja mesmo muita humanidade, muita maldade, em como esses animais são tratados. Não vejo pelas próximas décadas uma segurança razoável de direito à vida para os animais, que é algo de que precisaríamos hoje. Isso pode

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ocorrer mais pela conscientização das novas gerações, para que se tornem veganas, e – talvez – daqui a uns 300 anos a gente tenha um mundo sem exploração animal. Não consigo ver isso com muito otimismo, não. Por outro lado, vejo que as novas gerações têm uma visão totalmente diferente. Infelizmente, a gente tenta, hoje, mais ou menos, conter as barbáries, basta ver o que acontece por aí em rodeios, vaquejadas, touradas, exportação de gado vivo... São coisas absurdas que a gente tenta conter e, mesmo assim, é bem complicado. A invasão do Instituto Royal (2013) e o PL do deputado Ricardo Izar [que retira os animais da categoria de coisas e os qualifica como seres não humanos] mostram que nossa percepção sobre o tema tem mudado. Como conciliar a dicotomia insolúvel entre a perspectiva econômica (que vê os animais simplesmente como um indicador do PIB) e a visão humanista estendida aos animais (que também são merecedores do mesmo respeito que se deve ter pelos humanos)? O episódio da invasão do Instituto Royal prova que a sociedade não consegue mais conviver com essa crueldade, porque é inadmissível usar seres sencientes como se fossem máquinas, como já foi comprovado por neurocientistas. É muito cruel e medieval tal


temos lutado, para uma mudança de entendimento. Se um agressor maltratou 40 animais e outro maltratou apenas um, os dois vão responder pelo mesmo crime, com uma pena de três meses a um ano de prisão, um absurdo. Buscamos aplicar a tese do concurso de crimes, para o agressor responder por cada animal maltratado. Nossa fiscalização também é ineficiente, porque existem poucos fiscais no Ibram. Os debates públicos são importantes para trazer o tema à tona. A educação também é fundamental. Há pouco, algo me chocou muito: em uma palestra que ministrei em uma escola em Ceilândia, de 30 alunos em uma sala, pelo menos 28 encaram os maus-tratos aos animais como algo banal ou engraçado. São adolescentes de 17 anos que já são potenciais agressores, que não respeitam de forma alguma outras espécies de vida. Eles crescem vendo o pai batendo na mãe, o irmão mais velho sendo preso por tráfico, e a agressão animal se torna natural para eles. Precisamos mudar isso. Quando você se sensibiliza com o sofrimento de um ser vulnerável, você leva isso para toda a sua vida. É uma luta árdua da qual não podemos desistir.

prática. O PL nº 27, do deputado Ricardo Izar, é um grande avanço no nosso ordenamento jurídico, pois – além de nossos animais deixarem de ser considerados “coisas” – nos possibilita um grande leque de discussões. Mas sabemos da resistência do Congresso, principalmente porque a bancada ruralista é muito forte. Toda vez que se fala de direitos dos animais, eles tentam, de todas as formas, excluir da lei os animais de produção, para evitar que seus lucros absurdos sejam atingidos de algum modo, para que essa exploração absurda não seja nunca colocada em risco. Isso faz parte da mudança social da qual lhe falei. A lei não conseguirá amparar todos os animais, pois o PL deve, no máximo, se estender aos animais domésticos e domesticados. Se não for assim, o Congresso não aprovará. A gente não vai conseguir todos os direitos de uma vez só, mas não podemos desperdiçar cada pequeno avanço em prol dos animais, porque isso abre a possibilidade de discussão jurídica, de levar vários casos aos tribunais e de positivar, cada vez mais, os direitos dos animais no nosso ordenamento jurídico. Qual é o principal obstáculo que a lei enfrenta para ser cumprida no tocante ao trato dos animais no Brasil? São vários os entraves. Primeiro, nossa legislação é branda. Na prática, não traz nenhuma punição aos agressores dos animais. Tudo termina em apenas um acordo, com o pagamento de cesta básica ou a prestação de serviço comunitário. Outro problema é a falta de efetivo nas delegacias e nos batalhões. Falta, ainda, sensibilidade aos policiais. Está provado que quem maltrata um animal maltrata também um ser humano. Quando atendemos denúncias, vemos que onde ocorrem maus-tratos a animais também ocorrem abusos à mulher e às crianças, porte de arma ilegal, tráfico de drogas... A violência no lar atinge não só o animal, mas também toda a família. O Ministério Público também trata esse tipo de crime de forma muito banal. Para muitos promotores, é suficiente um agressor pagar R$ 200,00 por ter quebrado as duas patas de um cachorro, enforcado e arrastado o animal. Isso não tem caráter educativo, não tem o mínimo de punição possível. O Judiciário também trata isso como crime continuado, que é algo contra o qual

Entrevista com a advogada Ana Paula e o comandante do BPMA, major Souza Jr.

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BPMA

BATALHÃO DE POLÍCIA MILITAR AMBIENTAL

‘’SE VOCÊ NÃO GOSTA DE ANIMAIS O PROBLEMA É SEU! MAS SE VOCÊ MALTRATÁ-LOS, O PROBLEMA É NOSSO’’

DENUNCIE! 61 99351 5736 OU 23 190 CENTRAL

Batalhão de Polícia Militar Ambiental


SOLIDARIEDADE

CONTRA A GLOBALIZAÇÃO DA INDIFERENÇA Em tempos de recrudescimento da xenofobia na Europa, família italiana usa a própria fortuna para resgatar refugiados no Mediterrâneo DA REDAÇÃO

O

ano passado foi um exemplo de como a Europa vive, ainda, uma dura queda de braço entre a xenofobia e a solidariedade. Na Itália, um confronto político e social, tendo a audiência de vasta plateia estrangeira, foi presenciado entre ONGs de apoio a refugiados e setores da extrema-direita do governo contrários à imigração. Em maio, em decisão inusitada até então, a justiça italiana autorizou o desembarque de imigrantes em solo nacional, resgatados na costa da Líbia. Na época, a deliberação irritou Matteo Salvini, então ministro do interior, que havia proibido o desembarque. Demonstrando que as intenções de Salvini não representavam a opinião pública majoritária na Itália, moradores da ilha de Lampedusa, na Sicília, saudaram a chegada dos 47 imigrantes no navio Sea-Watch 3, de bandeira alemã, com cartazes e mensagens como: “bem-vindos a Lampedusa” e “quem salva uma vida salva o mundo inteiro”. A iniciativa popular italiana não é um fato isolado de solidariedade explícita na península. Há cinco anos, inconformada com alto número de migrantes e refugiados que perdem a vida ao tentar cruzar o mar Mediterrâneo rumo à Europa, uma família com cidadania italiana

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e americana gastou metade das suas economias para comprar um barco de resgate e, desde então, tem sido considerada uma inspiração para organizações humanitárias mundo afora. Em vez de doar recursos para ONGs que prestam ajuda, o casal Christopher e Regina Catrambone empregou aproximadamente US$ 7 milhões para criar sua própria ONG e equipá-la com um barco para resgatar náufragos no mar. “Já havia instituições ajudando os migrantes na Europa, mas as pessoas estavam morrendo no mar e ninguém estava fazendo nada. Se os governos não agem, é responsabilidade da sociedade civil responder. A Moas [Migrant Offshore Aid Station] foi a primeira ONG a ir ao mar resgatar pessoas”, declarou Regina Catrambone em 2015, em entrevista à BBC Brasil, falando de Malta, onde a família vive e mantém a sede da organização. No momento da entrevista, Regina contou que havia acabado de retornar de duas semanas no mar, acompanhando uma missão de resgate. Ela disse que faz questão de estar a bordo, atuando como ponte entre a equipe de técnicos, médicos e os refugiados resgatados.


GILES CLARKE/GETTY IMAGES

de barco no mar e fomos para Lampedusa. De lá, partimos para Túnis. No meio do caminho, avistamos pedaços de roupas no mar. Provavelmente de alguém que cruzava o Mediterrâneo no sentido contrário, tentando chegar à Europa. Foi o primeiro encontro concreto que tivemos com a questão”, explicou Regina. Mais tarde, a tragédia de outubro de 2013 na ilha de Lampedusa (quando 400 migrantes morreram afogados no mar) e o apelo do papa Francisco pelo fim da “globalização da indiferença” foram decisivos para o casal criar a Moas em 2014. No mesmo ano, a ONG colocava em operação no Mediterrâneo uma embarcação de 40 metros, a Phoenix, equipada com botes infláveis, satélites, dois drones, clínica médica e coletes salva-vidas. Só nos primeiros seis dias de operação, 3 mil pessoas foram resgatadas.

O casal no barco Phoenix

3 mil vidas salvas em menos de uma semana O casal se conheceu em 2006 na Itália. Christopher tinha retornado ao país de seus avós após a devastação do furacão Katrina no sul dos Estados Unidos. “Ele morava e trabalhava no Caribe naquela época. Foi um choque para toda a região a passagem do furacão”, diz Regina. Em Malta, a família abriu uma empresa de seguros, assistência emergencial e inteligência, a Tangiers. Antes de criarem a Moas, Regina era o braço direito do marido nos negócios da família, cuidando da parte financeira da empresa.

MOAS

Mas outros fatos mudariam drasticamente a vida do casal. “Tudo começou quando, em 2013, decidimos passar um final de semana passeando

Até 2015, a Moas já contabilizava o resgate de cerca de 11 mil pessoas no Mediterrâneo. O custo de manter a Phoenix no mar supera os 500 mil euros por mês. Mas, no mesmo ano, a iniciativa do casal ganhou apoio de peso, após fechar uma parceria com os Médicos Sem Fronteiras (MSF), para ampliar os resgates no Mediterrâneo. Foi só o início de parcerias e doações promissoras para a ampliação das atividades da Moas, que se expandiram para ações também em terra entre 2017 e 2020, como a construção de abrigos e hospitais de campanha para refugiados da guerra no Iêmen e para os rohingyas, expulsos de Myanmar.

Regina grava depoimento para vídeo da Moas em Unchiprang, no Bangladesh, onde a entidade construiu campo de ajuda humanitária para a etnia rohingya

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WIKIPÉDIA

Olhos como estrelas Entre tantos resgates no mar, as memórias mais caras de Regina são justamente as de crianças acolhidas no Phoenix. “Lembro-me perfeitamente de um menino chamado Hani [resgatado em 2014]. Desesperada, sua mãe nos entregou o menino, que fervia de febre, não comia e não bebia havia dias. Eles eram da Eritreia. Após horas tomando soro e sendo atendido pelos médicos a bordo, ele se recuperou. Quando ambos desembarcaram, a mãe tinha os olhos como estrelas, muito brilhantes e emocionados”, conta Regina. A Moas conta com a ajuda de uma equipe com técnicos e médicos. Enquanto esperam para desembarcar, após os primeiros socorros, ela e os voluntários do MSF brincam com as crianças a bordo. “As pessoas que resgatamos no mar são pessoas como nós. São médicos, advogados, professores, cabeleireiros. Poderiam ser eu ou você”, diz Regina, conversando com uma repórter.

refugiados e migrantes que o resgate e o desembarque em terra são apenas o começo de suas jornadas e de novas vidas”, diz Regina. Em 2015, a organização passou a receber jornalistas a bordo. “Podemos salvá-los no mar, mas é muito importante dar voz a essas pessoas, contar suas histórias para o mundo. Queremos partilhar uma mensagem de solidariedade em relação aos migrantes e refugiados. Não é um problema apenas europeu. É por isso também que é preciso continuar falando e debatendo o assunto”, conclui ela. ALLIED NEWSPAPERS LTDA.

Grande parte dos desembarques da Moas ocorrem na região de Reggio Calabria, no sul da Itália. “Foi ali que nasci e fui criada. Digo aos

Regina, tendo o barco Phoenix ao fundo

Migrantes resgatados pela Moas

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Se a natureza não tiver futuro, nós também não teremos.

NOS AJUDE A

PROTEGER A VIDA O WWF-Brasil desenvolve, há mais de 20 anos, projetos e iniciativas de conservação do meio ambiente para que a sociedade brasileira conviva em harmonia com a natureza, em benefício das gerações 27 atual e futura.

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CULTURA

A ARTE A SERVIÇO DA GARANTIA DE DIREITOS Nos países do Terceiro Mundo, é inegável a falta de garantia dos direitos mais básicos e essenciais dos indivíduos. Para reivindicar tais direitos, diversos atores sociais no Brasil e no mundo usam os quadrinhos para trazer visibilidade ao assunto e suscitar debates sobre temas cruciais a muitas vidas, como o preconceito racial e social, o feminicídio, a marginalização de contingentes majoritários da nossa população e o resgate da dignidade humana. Com isso, saem de cena os super-heróis mascarados da indústria americana e compõem o cenário pessoas da vida real, retratadas no traço. Conheça o perfil e a obra desses artistas e saiba o que eles têm a dizer em prol das pessoas que não têm voz e nem direitos reconhecidos por governos em todo o mundo PAULO CASTRO

“Seria um tanto óbvia a afirmação de

que as histórias em quadrinhos refletem aspectos da realidade. Refletem, claro. Assim como o fazem todos os demais produtos artísticos que se valem ou não da narrativa como meio de expressão. Mas há graus de como isso pode ocorrer”, afirmam Waldomiro Vergueiro, Paulo Ramos e Nobu Chinen na apresentação do livro “Enquadrando o Real: Ensaios sobre quadrinhos (auto)biográficos, históricos e jornalísticos”.

Joe Sacco: olhar humanista sobre os conflitos do mundo

Como o mesmo texto detalha, as obras que mais alcançam esses graus de aproximação com a realidade são aquelas que mais tocam, remexem e desnudam as feridas que o real abre nas vidas das pessoas. Com esse viés, diversas são as HQ que fogem dos estereótipos do mundo da fantasia (popularizados por Marvel e DC) e encaram o real sem retoques, mostrando suas dores, exigindo justiça para elas e reivindicando legítimos direitos negados. Um dos gêneros que mais propicia esse mergulho no caos social que o homem criou para si é a seara do jornalismo em quadrinhos. E, quando se fala nessa varian-

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Coletânea de trabalhos mais representativos e atuais de Joe Sacco: “Notas sobre Gaza” e “Reportagens”


Trabalhos mais representativos e atuais de Joe Sacco

te inusitada – mas rica – do jornalismo, é inegável falar do seu maior expoente, talvez um dos criadores da grife: o quadrinista e jornalista maltês Joe Sacco. Como já mostramos na nossa 5ª edição (https://bit.ly/2AH5Uir), com uma matéria especial sobre o tema, Joe Sacco foi o que mais levou o jornalismo em quadrinhos ao patamar de excelência que ele justamente reivindica, mostrando ao mundo as populações excluídas de seus direitos. Seu último trabalho é, também, um dos mais emblemáticos: “Reportagens”, que traz seu olhar humanista sobre alguns povos desassistidos que ele conheceu e cujas dores buscou reportar graficamente.

Artistas brasileiros: o traço como denúncia Em solo natal, as denúncias sobre racismo, exclusão social, mentalidade colonialista, corrupção institucionalizada e preconceitos em geral, que estão na base de formação do nosso país, são bem representadas pelo quadrinista e militante do movimento negro Marcelo D’Salete, principalmente em “Angola Janga” (2017), que aborda curtas histórias relacionadas ao Quilombo dos Palmares, tendo como cenário a então capitania de Pernambuco do fim do século XVI, obra gráfica que deriva de profunda pesquisa sobre o nosso nefasto e vergonhoso passado escravista.

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“Angola Janga”: Marcelo D’Salete resgata o contexto histórico do escravismo brasileiro


Na mesma vertente vai o impressionante trabalho: “Chibata! João Cândido e a Revolução que Abalou o Brasil” (2009), dos cearenses Olinto Gadelha (roteiro) e Hemetério (arte), uma investigação riquíssima sobre os antecedentes e os destinos (trágicos) dos envolvidos na revolta de marujos (1910) que marcou a luta por tratamento mais humano na marinha brasileira, até então afeita a práticas e castigos medievais. A ilustração feminina nacional também tem dignas representantes, como bem evidencia Edna Lopes, pioneira na criação de novelas gráficas no país, criadora de “Amana ao Deus-

“Chibata!”, de Olinto Gadelha e Hemetério: maus-tratos e protagonismo negro

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“Amana ao Deus-Dará”, de Edna Lopes: violência e feminismo

-Dará” (2004), “uma das primeiras narrativas quadrinísticas brasileiras a dar voz a uma protagonista feminina, na qual a violência se destaca como um dos principais motes”, afirmam Ediliane de Oliveira Boff e Waldomiro Vergueiro, no artigo: “Histórias em Quadrinhos como Espaço Privilegiado para Afirmação de Gênero”. Outra quadrinista brasileira que mantém o mesmo tom de denúncia, qualidade editorial e

“Beco do Rosário”, de Ana Luiza Koehler: a mulher negra e pobre como protagonista da própria história

argumento é Ana Luiza Koehler. Arquiteta e artista gaúcha radicada no mercado de quadrinhos europeus, Ana Luiza é criadora do romance gráfico “Beco do Rosário” (2015), “uma rara construção envolvendo uma protagonista negra nos quadrinhos, Vitória Azambuja”, completam os referidos autores. Empregando técnicas de ilustração com bico de pena e aquarela, além de um argumento pulsante, Ana Luiza desenvolve uma história que tem como cenário a Porto Alegre dos anos de 1920. Na trama, Vitória é uma jovem e humilde moradora do Beco do Rosário (atual avenida Otávio Rocha), cujo maior sonho é se tornar jornalista e sente na pele as dificuldades inerentes à sua condição social e racial.

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Releitura histórica magistral O recorte e o resgate histórico da igualdade de gênero e da equidade social encontram, também, na obra da britânica Kate Evans, uma rara e feliz combinação entre pesquisa biográfica, conteúdo acadêmico e argumento gráfico, em especial na sua magistral grafic novel “Rosa Vermelha” (2017), que traduz e contextualiza, em brilhante releitura histórica, a vida e o pensamento da militante judia polonesa Rosa Luxemburgo (1871-1919). Mulher em uma época cujo único destino feminino era o matrimônio, a maternidade e a submissão ao consorte, revolucionária em um contexto político cujo inevitável desfecho era a forca, deficiente em uma sociedade que repudiava os ditos “incapazes”, Rosa rompeu com todos os estereótipos e pagou com a própria vida a ousadia de lutar por igualdade e por garantia de direitos, como bem Kate Evans soube narrar e ilustrar com admirável sensibilidade. São obras que evidenciam, às vezes de forma crua, em outras de modo direto, como as histórias em quadrinhos podem estar a serviço de quem não dispõe do artifício da arte para se fazer ouvir e necessita, com dor copiosa, fazer valer sua garantia de direitos ignorados.

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“Rosa Vermelha”, de Kate Evans: a força histórica da mulher vulnerável em luta pela equidade social


O leão também tem coração!

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Vamos salvar

uma vida hoje?

Mesmo que você não possa adotá-los, o apadrinhamento também é uma opção. Apadrinhando um animal você pode colaborar com um maior bem-estar do bichinho, contribuindo assim nas necessidades especiais dele.

Os cães e gatos do Gatil Luz Violeta precisam de um lar definitivo antes de terem o seu abrigo fechado em maio, e a adoção é a melhor forma de juntos salvarmos todas essas vidas. Atenção: Por ordem judicial, o abrigo está

proibido de abrigar novos animais.

(61) 98321-8683 (Dona Fátima) (61) 99964-7263 (Cléber) TAC-MP/GO: 201900253949

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