Flávio de Carvalho: O Habitar entre o Interior e o Exterior

Page 1

FLĂ VIO DE CARVALHO:

O Habitar entre o Interior e o Exterior



FLÁVIO DE CARVALHO: O Habitar entre o Interior e o Exterior Aluna Bolsista: Giovanna Eidler Moles Orientação da professora Dra Aline Coelho Sanches.

Pesquisa de Iniciação Científica financiada pelo Programa Unificado de Bolsas (PUB), edição 2019/2020, junto ao Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - São Carlos.

São Carlos, Fevereiro 2020



Agradeço: À professora Aline, pela orientação e por ter me estimulado a fazer essa pesquisa. Aos funcionários da A.C.E.S.A. pelo auxilío na visitação da Casa Capuava, em Valinhos. Aos meus pais e Orlando, por sempre me apoiarem e incentivarem em tudo que me proponho a fazer.


01

INTRODUÇÃO

Apresentação

02

OBJETIVOS E METODOLOGIA

Objetivos Gerais Objetivos Específicos Metodologia Atividades Desenvolvidas Cronograma de Atividades

03

TRAJETÓRIA

Uma Breve Introdução Linha do Tempo A Europa de Flávio de Carvalho Contexto brasileiro no retorno de Flávio de Carvalho

04

ESSÊNCIAS Cor, Contraste e Movimento Arquitetura: Expressão Técnica e Artística


05

A OBRA CONSTRUÍDA

06

Vila Modernista Casa Capuava

O IN-BETWEEN Conceituação O In-Between nas Obras arquitetônicas de Flávio de Carvalho O In-Between na Vila Modernista O In-Between na Casa Capuava

07

CONSIDERAÇÕES Uma Reflexão Crítica A Possibilidade: Casa-Museu Conclusões

08

ANEXOS


APRESENTAÇÃO Considerando a grande extensão de publicações já realizadas sobre a obra de Flávio de Carvalho, incluindo os estudos do professor Dr. José Lira, da FAU USP, a respeito de domesticidade e da Casa Capuava - projeto realizado pelo arquiteto, em 1929, na cidade de Valinhos, SP, em 1938 e que serviu de morada para o mesmo até sua morte - essa pesquisa visa iluminar questões outras sobre a obra construída de Flávio de Carvalho. Esse trabalho tem como essência um estudo específico sobre a casa Capuava, focando nos espaços In-Between, na relação do interior com o exterior, da arquitetura com a paisagem assim como da arquitetura com a arte. Considerando-se que a Casa Capuava e o projeto para a Vila Modernista - Conjunto de Casas projetado pelo arquiteto nos Jardins, SP, em 1938 - foram os únicos projetos de autoria completa de Flávio de Carvalho efetivamente construídos, julgou-se pertinente cotejar a Casa Capuava com a análise da Vila Modernista. Apesar do caráter distinto das duas obras -uma implantada em uma fazenda e outra em um contexto inteiramente urbano - acredita-se que o estudo de ambas associado com a leitura dos textos de Flávio de Carvalho e investigação de sua obra artística, permitirá não somente uma análise mais precisa dos espaços entre na casa em Valinhos mas uma melhor compreensão da obra arquitetônica do artista como um todo como. Para esse estudo, ainda, é impossível desconsiderar as questões, contextos e personagens que mais influenciaram Flávio de Carvalho tais quais os debates sobre os rumos da arquitetura no Pós Primeira Guerra na Europa, o Movimento Antropofágico, a disseminação dos ideais corbusianos e especialmente os pontos que o mesmo elegeu como essenciais para a arquitetura moderna que dizem respeito à relação entre o interior e o exterior, que é o cerne dessa pesquisa. Também é relevante trazer o processo da arquitetura moderna no Brasil para a discussão, já que esse teve um relacionamento com a paisagem distinto daquele da Europa. O calor, a vegetação tropical e muito diversa apresentaram um papel significativo na concepção arquitetônica dos arquitetos brasileiros. Por fim, foi considerado relevante fazer um breve comentário sobre o conceito de In-Between, especialmente no que trata dos limites entre arquitetura e arte; arquitetura e paisagem. PALAVRAS-CHAVE: Flávio de Carvalho, In-Between, Arte, Paisagem



OBJETIVOS GERAIS Levantar os valores da Casa Capuava para dar base para futuras intervenções para preservação de sua memória. ESPECÍFICOS -Reconstruir historicamente a Casa Capuava ao longo do tempo desde o uso por Flávio de Carvalho até o seu abandono -Entender as relações entre interior e exterior estabelecidas no projeto da Casa Capuava assim como na Vila Modernista dos Jardins -Entender de que maneira, através do uso, o artista estabelecia as relações entre interior e exterior na Casa Capuava -Entender de que maneiras Flávio de Carvalho propunha, na Vila Modernista, que os usuários estabelecessem as relações entre interior e o exterior -Analisar, a partir dos textos do próprio Flávio de Carvalho, as relações entre casa e cidade e como isso apareceu na Casa da Sede da Fazenda Capuava e na Vila Modernista -Entender as nova dinâmicas de relação entre a casa Capuava e o seu entorno considerando a expansão urbana nas últimas décadas

10


METODOLOGIA Esse trabalho foi realizado através da identificação, levantamento e sistematização de fontes primárias publicadas tais como revistas da época em que Flávio de Carvalho estava vivo e também textos escritos pelo próprio arquiteto. Houve, ainda um estudo e sistematização de fontes secundárias, como teses e livros que tratam da vida e obra de Flávio de Carvalho, das questões de relação entre paisagismo e habitação na arquitetura moderna, tendo como foco o cenário brasileiro. Além disso, foram realizadas visitas in loco e redesenhos como meios de atingir uma melhor compreensão do projeto. O Cruzamento entre as fontes primárias publicadas, fontes secundárias e minuicioso levamento de campo conduziu às conclusões do trabalho.

ATIVIDADES DESENVOLVIDAS 01 | Revisão Bibliográfica 02 | Leitura, análise e sistematização de material 03 | Visitação à Casa de Flávio de Carvalho em Valinhos e levantamento fotográfico 04| Elaboração de paineis- síntese 05| Redesenho de planta da casa Capuava 06| Modelação 3d da Casa Capuava 07 | Desenvolvimento de maquetes de estudo da casa capuava e de sua inserção urbana 08| Elaboração de diagramas esquemáticos 09| Relatório Final

11


CRONOGRAMA DE ATIVIDADES 01. Levantamento e análise da bibliografia relacionada à produção de Flávio de Carvalho e relacionado à casa da sede da fazenda Capuava e Vila Modernista 02. Visitas à casa Flávio de Carvalho e levantamento e análise sobre as relações entre exterior e interior, paisagismo e habitação na arquitetura moderna brasileira. 03. Sistematização do material levantado. 04. Produção de painéis-síntese e desenvolvimento de maquetes físicas e maquete digital. 05. Elaboração de desenhos e análises gráficas das relações interior x exterior na obra de Flávio de Carvalho; 06. Produção do relatório final.

SETEMBRO OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO JANEIRO 01 02 03 04 05 06

12

FEVEREIRO


DURAÇÃO DA INICIAÇÃO CIENTÍFICA A duração da Iniciação Científica contempla os meses detalhados na página ao lado (setembro, outubro, novembro, dezembro, janeiro e fevereiro) enquanto o financiamento PUB teve duração de quatro meses (setembro, outubro, novembro e dezembro) tendo em vista a conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo pela aluna em Janeiro de 2020.

13


TRAJETÓRIA BREVE INTRODUÇÃO Importante personalidade do modernismo brasileiro, Flávio de Carvalho é conhecido pela sua atuação em diversas áreas do conhecimento, abrangendo desde cenografia até cálculo estrutural. Natural do Rio de Janeiro, logo cedo foi estudar na Europa como de costume na elite brasileira do período. Ao retornar ao Brasil, em 1922, se deparou com um cenário dinâmico no universo cultural e artístico nacional. Apesar disso, nos primeiros anos de seu retorno, Flávio de Carvalho atuou principalmente no ramo da engenharia, o que permitiu que o arquiteto trabalhasse no renomado escritório de Ramos de Azevedo (LIRA 2017). Figura muito excluída da historiografia da arquitetura moderna brasileira, Flávio de Carvalho foi responsável por projetar o primeiro edifício moderno do Brasil para um concurso em 1927, segundo Rossetti (2007). O projeto, apesar de não ter sido construído proporcionou grande visibilidade ao artista e serviu de porta de entrada para o mesmo em diversos concursos arquitetônicos. Flávio de Carvalho projetou as mais diversas tipologias ao longo de sua carreira, incluindo tanto urbanismo, quanto edifícios públicos, residências, arranha-céus, universidades e memoriais. De todos as obras arquitetônicas do artista apenas duas foram construídas: A Casa Capuava e o Conjunto de Casas da Alameda Lorena. Ainda assim, a obra descrita e projetada por ele - ainda que majoritariamente no papel - constitui um conjunto rico em pesquisa, ideias, inovação e reflexão, o qual é muito bem apresentado e detalhado por Carolina Rosseti (2017). Para além da arquitetura e engenharia, o arquiteto se envolveu no mundo do teatro, da escrita e das artes plásticas, aproximando-o de importantes personalidades do modernismo, tais quais Oswald de Andrade. O contato com esses indivíduos influenciou a forma do artista perceber o mundo, o qual encontrou muita inspiração no movimento antropofágico. Flávio de Carvalho defendia a busca por uma identidade brasileira, partindo da absorção das dinâmicas da sociedade moderna do século XX somada a um primitivismo (ROSSETTI 2007) - no sentido de homem primitivo, nu, despido de religião, preconceitos, valores sociais e filosóficos. Ainda segundo Rossetti (2007), os anos passados na Inglaterra exerceram grande influência nos pensamentos de Flávio de Carvalho, já que efervesciam na Europa os debates questionando as formas de habitar, de higiene e da eficiência nas cidades modernas. Essa influência foi expressa tanto nos textos quanto na arquitetura do artista, em que a preocupação com as

FIGURA 01: Flávio d

14


de Carvalho

15


questões da modernidade, da máquina, da velocidade, do homem moderno e das problemáticas da cidade diante das novas dinâmicas urbanas e sociais estavam sempre presentes. Isso manifesta uma ambivalência nos posicionamentos de Flávio de Carvalho, em que o primitivo e o moderno aparecem lado a lado de forma constante em sua obra. O artista apresentava-se de forma extremamente polêmica (MEDEIROS, 2012) , chocando a população ainda muito conservadora e familiar de São Paulo. Um dos atos mais ousados foi o desfile realizado pelo arquiteto vestido com o New Look na capital paulista: De saia e meia arrastão, Flávio de Carvalho se propôs a desfilar nas ruas da cidade. O visual tinha como principal intuito ser eficiente do ponto de vista do conforto térmico para um país tropical, mas para além da eficiência, o visual era uma afronta à convenção. O fluminense tratava o mundo como um grande laboratório de experimentações, onde tudo era passível de ser estudado, analisado e explorado, até mesmo o próprio ser humano. Essa essência curiosa do artista pode ser exemplificada através de um episódio descrito por Rosseti (2007): “ Em 1931, apresenta a sua Experiência n°2 (...) realizada sobre uma procissão de Corpus-Christi: Uma Possível teoria e uma experiência. Essa experiência, segundo Flávio, é uma análise da psicologia das multidões. Para a realização dessa análise, atravessou a procissão de Corpus-Christi no sentido contrário usando chapéu.” Desta forma, é perceptível que Flávio de Carvalho tensionava os limites do tradicional e analisava o comportamento humano diante de suas provocações.

LINHA DO TEMPO

FIGURA 02

16


17


A EUROPA DE FLÁVIO DE CARVALHO É impossível desconsiderar a influência do período passado na Europa nos pensamentos de Flávio de Carvalho. De uma infância carregada de experiências internacionais, o arquiteto viveu no Rio de Janeiro apenas até os seus 13 anos quando foi levado por seus pais para estudar na França. Em uma das comuns viagens que a família realizava pela Europa, houve a eclosão da Primeira Guerra Mundial, o que fez com que Flávio de Carvalho ficasse permanentemente na Inglaterra até terminar todos os seus estudos. Na Inglaterra, Flávio de Carvalho cursou engenharia na Universidade de Durham concomitantemente com o curso de Belas Artes, o que expressava desde já um fôlego considerável para um jovem. O contexto histórico que coincidiu com o período de formação do artista era também um dos momentos mais conflituosos da história da humanidade e no qual a Inglaterra entrou como potência militar. Foi na Primeira Guerra Mundial que o homem pôde testar pela primeira vez, de forma abrangente o armamento moderno, resultando em milhões de mortes e na destruição de muitas cidades. Assim, Flávio de Carvalho pôde acompanhar de perto um momento chave na arquitetura: de questionamento do que seria a arquitetura dos tempos modernos, pós revolução industrial e pós guerra. Os problemas da cidade moderna eram especialmente sentidos na Inglaterra, lugar onde Flávio de Carvalho habitou e estudou e também o berço da Revolução Industrial. Dentre as complicações que apareceram juntamente com a modernidade, estavam o crescimento urbano acelerado, condições precárias de moradia, crise habitacional, estrutura urbana ainda muito medieval e não adaptada às novas formas de vida, rios poluídos, pobreza e disseminação de doenças. Além das adversidades, a modernidade trouxe consigo diversas transformações sociais, educacionais, políticas e em áreas distintas do conhecimento. Dentre as muitas mudanças, a impressão de jornais e revistas assim como a fotografia cada vez mais desenvolvida, colaboraram, junto com as exposições internacionais para uma internacionalização e comunicação entre países nunca antes vista. No universo da educação diversas áreas do conhecimento eram desenvolvidas ou aprimoradas tais quais da psicologia e sociologia. Além disso, a mulher também passava a ganhar voz em diversos países, conquistando espaço no trabalho, em universidades e também o direito de voto - na Inglaterra, em 1918 - o que se refletiria na domesticidade e na conformação familiar. Com as numerosas mudanças que ocorriam nas dinâmicas sociais, o ser humano e suas relações tornavam-se o centro das novas discussões a respeito das cidades, deixando sempre a preocupação de como adaptar as estruturas urbanas e domésticas para esse novo cenário. As preocupações modernas e inovações técnicas transformavam tanto as cidades quanto a domesticidade: ventilação, insolação, uso de materiais de fácil limpeza e durabilidade tornaram-se elementos essenciais na habitação. Além da invasão na indústria, a máquina passou a invadir também os canteiros de obra (BENEVOLO 1976), transformando a produção arquitetônica. Dessa invasão, a arquitetura foi sendo modificada, tanto na

18


tentativa de atender às diversas demandas da modernidade quanto pela adaptação à nova forma de se construir possibilitada pela máquina: “A máquina é muito exigente e leva inexoravelmente para soluções menos custosas; por outro lado, as exigências do estilo limitam-se às aparências formais dos objetos e, portanto, tende-se a restringir cada vez mais o conceito de estilo e a considerá-lo, afinal, como uma simples vestimenta decorativa, a ser aplicada a cada vez a um esqueleto de sustentação genérico;” (BENEVOLO 1976) A arquitetura tentou responder às questões da modernidade de diversas formas. Ainda no século XIX, surge uma explosão de utopias a partir dos estudos da cidade, buscando adaptá-la à modernidade. Dentre as propostas utópicas, muitas delas vindas de historiadores, políticos ou economistas (LAGE 2019) estavam os estudos de Robert Owen, Charles Fourier, Étienne Cabet e Godin, os quais propunham desenhos baseados na racionalidade e funcionalidade e traziam fortemente as questões de higiene, das áreas verdes e da cidade moderna. Além das utopias, muitas cidades europeias, na tentativa de melhorias, mudavam suas estruturas urbanas, tais quais Paris, que sofreu intervenções de Haussmann e Barcelona, por Cerdá. Na segunda metade do século XIX, surge também a disciplina de “Town-Planning”, que tem a cidade como objeto de estudo e planejamento. A disciplina buscava regulamentar o crescimento urbano, visando garantir a consolidação de cidades saudáveis com expansão baseada em princípios racionais. Parte da historiografia conta que apesar das transformações urbanas, a produção arquitetônica, do século XIX, apresenta-se de forma eclética. Dentre os estilos recorrentes no século XIX estavam o românico, o bizantino, o egípcio, o árabe e entre muitos outros, também estavam o neogótico e neoclássico, segundo Benevolo (1976). Reagindo ao processo cada vez mais intenso de dissociação entre arquitetura e arte, surge também o movimento Arts and Crafts. O movimento, crítico da industrialização de elementos antes artesanais e defensor do reestabelecimento entre arquitetura, artesanato e design (TAGLIARI E GALLO 2007) lutava pela valorização do trabalho artesanal ao mesmo tempo em que reagia à produção em massa. O movimento diferencia-se na Inglaterra, tomando um rumo peculiar que acaba por influenciar o restante da Europa e não vice-versa (BENEVOLO 1976). O final do século XIX, então, mostrava-se carregado de discussões, ideias e novas teorias tanto nas correntes teóricas artísticas quanto na arquitetura e urbanismo. Na arquitetura havia um certo desconforto com o ecletismo exacerbado e uma vontade, por grande parte dos arquitetos, por uma arquitetura inovadora. Aos poucos as cidades e habitações se adaptavam para o modo de vida acelerado do homem moderno. Em vista desse conjunto de adversidades, inovações e transformações surgiram reformas de moradia, transporte, higiene e educação no final do século XIX. Para além das imitações passadistas, as cidades começaram a ser pensadas como uma grande máquina

19


de morar, o que modificou o modo de produzir cidade. Somado às transformações sociais, havia também inovação das tecnologias de construção, tais quais do aço e do concreto armado, que revolucionaram a forma de se construir, facilitando o surgimento de estações ferroviárias, banhos públicos e diversos equipamentos urbanos. Tudo isso, colaborou para que o século XX se iniciasse efervescente em todos os sentidos: culturais, sociais, políticos e artísticos. Desta forma, Flávio de Carvalho, pôde acompanhar de perto muitas dessas transformações e discussões, as quais apenas se intensificaram com a Primeira Guerra Mundial. Esta, acelerou o processo de modernização que já vinha ocorrendo, consolidando a ideia de cidade como máquina e permitindo, através das trágicas perdas e destruição, construção de novas cidades.

CONTEXTO BRASILEIRO NO RETORNO DE FLÁVIO DE CARVALHO No ano de retorno de Flávio de Carvalho para o Brasil, o país encontrava-se muito distinto daquele que ele havia deixado. Grande parte das transformações e discussões que vinham ocorrendo na Europa, conforme mencionado no item anterior, também ocorreram nas cidades brasileiras, especialmente em São Paulo. Ainda muito rural, o Brasil do início do século XX era extremamente dependente da agricultura, especialmente da produção cafeeira. Por ser o maior responsável pela produção de café do país, São Paulo centralizou o poder, juntamente com Minas Gerais, sobre o regime do Café com Leite até 1930. As exportações brasileiras geraram lucros que possibilitaram, a partir da década de 1920, investimentos em transportes, energia, telefonia e ensino. Além dessas transformações, o início da década de 1920 caracterizava-se por uma São Paulo já repleta de imigrantes, os quais transformaram a economia com plantações variadas e influenciaram na diversidade cultural do país como um todo. A produção cafeeira somada a grande massa de imigrantes que se instalaram em São Paulo no século XIX foram dois fatores que exerceram grande influência para o crescimento do estado e possibilitaram condições ideais para o surgimento de pequenas fábricas, as quais abririam as portas para a industrialização paulistana. A influência estrangeira era perceptível: na arquitetura e na estrutura urbana de São Paulo, elementos estruturais e decorativos característicos da Europa, como a Estação da Luz, o Teatro municipal, o Viaduto do chá e a Santa Efigênia (PROENÇA 2012). Assim, São Paulo se modernizava ao mesmo tempo em que se apropriava da estética urbana de algumas cidades europeias, deixando a desejar quanto a sua própria identidade. São Paulo não era uma cidade nem de negros, nem de brancos e nem de mestiços; nem de estrangeiros e nem de brasileiros; nem americana, nem europeia, nem nativa; nem era industrial, apesar do volume crescente das fábricas, nem entreposto agrícola, apesar da importância crucial do café; não era tropical, nem subtropical; não era ainda moderna, mas já não tinha mais pas-

20


sado. Essa cidade que brotou súbita e inexplicavelmente, como um colossal cogumelo depois da chuva, era um enigma para seus próprios habitantes, perplexos, tentando entendê-lo como podiam, enquanto lutavam para não serem devorados. (SEVCENKO, 2009, p.31).

FIGURA 03: Viaduto do Chá 1920

As modificações urbanas, tais quais implantação de jardins, renovação de ruas, construção de pontes, edifícios públicos e modernização urbana se justificavam tanto pela questão da higiene quanto para o agrado da exigente elite paulistana. A construção das ferrovias foi outro fator cooperante para a modernização de São Paulo - como estado - modificando sua paisagem, colaborando para o crescimento e industrialização e permitindo as reverberações da capital para o interior. Em 1922, no ano em que Flávio de Carvalho retorna ao Brasil, São Paulo encontrava-se nesse dinâmico cenário de modernização, mas também passava por intensas transformações culturais e artísticas. As discussões no campo cultural incluíam ideias de ruptura com o passado, crítica à mímese artística acadêmica e busca por uma identidade nacional (ROSSETTI 2007), as quais foram muito bem representadas na Semana de Arte Moderna. A chegada de Flávio de Carvalho no Brasil pouco tempo após a Semana não o impediu de imergir no conteúdo da mesma: não demorou muito para que o artista se encontrasse completamente envolvido na busca por uma cultura brasileira e posteriormente, no movimento antropofágico que surgiu em 1928. Além disso, se enturmou facilmente com diversas personalidades artísticas do período. Outro fator que agitou o cenário arquitetônico brasileiro foi a vinda de Le Corbusier para o Brasil em 1929, o qual aqueceu os debates a respeito do futuro da arquitetura e influenciou fortemente no surgimento de uma arquitetura moderna brasileira.

21


Na década de 1930, a industrialização brasileira ganhou força com o governo de Vargas, o qual adotou uma política desenvolvimentista visando substituir uma parcela das importações por produções nacionais de bens de base, duráveis e de consumo. Em São Paulo, essa industrialização exprimia uma considerável modernização do estado, o que permitiu que os paulistas permanecessem esperançosos e entusiasmados para o futuro, colaborando para a criação de um espaço propício para a introdução de uma nova arquitetura. A comunicação cada vez mais intensa entre países e continentes, possibilitou que do Brasil, intelectuais pudessem estar a par de muitos dos temas que estavam sendo debatidos na Europa. Assim, haviam discussões pontuais sobre a renovação da linguagem arquitetônica que não contemplavam o todo da produção das cidades brasileiras em processo de modernização, nas quais predominavam a construção de edifícios em estilo. A questão da identidade nacional, na arquitetura, se intensificou com as produções neocoloniais iniciadas em 1914, e sobretudo em 1922, quando ocorreu a exposição do cenário da independência no Rio de Janeiro em que diversos pavilhões nesse estilo foram apresentados. Porém, foi com a contribuição de arquitetos tais quais Flávio de Carvalho, que, ao discutir a renovação da linguagem e singularidades, ajudaram a construir uma identidade brasileira. .

FIGURA 04: São Pau

22


ulo 1920

23


ESSÊNCIAS COR, CONTRASTE E MOVIMENTO Este trabalho visa também expor e sintetizar um pouco da essência de Flávio de Carvalho. É perceptível, ao analisar sua vida e feitos, que a arte - em seu sentido mais amplo e abrangente - era o objeto principal de experimentação para o arquiteto. De forma muito sensível, o artista explorava na sua obra arquitetônica e artística meios de expressão de seus sentidos, personalidade e ideias e por isso sua obra caracteriza-se por uma peculiar originalidade. Tanto na arquitetura quanto na pintura é possível observar princípios e conceitos muito bem definidos pelo artista: contraste, movimento, cor, eficiência, busca por uma identidade brasileira, etc. Assim, serão investigados alguns conceitos e elementos recorrentes na obra do arquiteto. Primeiramente, a cidade. Objeto de diversos estudos do arquiteto, as cidades eram consideradas por Flávio de Carvalho como a casa principal do indivíduo e do coletivo, enquanto a casa, propriamente dita, seria uma extensão dessa cidade. Por ser o espaço do coletivo e da vida, a cidade deveria ser eficiente, com circulações adequadas, organização e simetria em muitos casos - de modo a colaborar para a vida do homem moderno e também do progresso. O progresso era um outro ponto destacado pelo arquiteto: era essencial para a evolução do ser humano, e isso é ele exemplificado pelo homem primitivo, que para que pudesse manter sua existência deveria criar formas para viver e se adaptar. Assim, deveria haver uma “energia primitiva” (ROSSETTI 2007) para criar, ou seja, uma liberdade para descobrir e experimentar sem medo e sem preconceitos. Devido a isso e somado com as ideias do movimento antropofágico, Flávio de Carvalho enxergava nas civilizações indígenas nativas tais como aborígenes, marajoaras, maias, guaranis e astecas, culturas que deveriam ser absorvidas. Tanto a arte, quanto arquitetura e decoração indígena foram muito exploradas por Flávio de Carvalho, e isso se reflete até mesmo na própria casa Capuava, em que a fachada trapezoidal imponente referencia de alguma forma os templos maias e astecas. Além disso na decoração interna da casa havia um contraste entre elementos extremamente modernos como alumínio e peças decorativas aborígenes. O contraste talvez seja o que mais resume a figura de Flávio de Carvalho: O moderno e o primitivo, a cor e a “não cor”, peso e leveza, formas circulares com retas. O contraste aparece no trabalho e na vida do artista constantemente e de formas distintas. Essas dualidades são levadas também para a materialidade na arquitetura: há uma recorrente exploração de texturas e cores. Aliás, a cor é outro elemento extremamente fundamental e constante. Para além de algo que afeta a vista, Flávio de Carvalho afirmava a cor como um elemento que afetava o psíquico do ser humano, como

24


é expresso em seu depoimento comentado por Stigger (2014) no texto “ Arqueologia e contemporaneidade” a respeito da moda: “O uso de uma grande variedade de cores”, explicou Flávio de Carvalho,“tornar[á] os homens menos irascíveis e menos obtusos, mais plásticos e mais capazes de evoluir com maior velocidade.”[15] Ao promover “maior alegria pelas cores e pelos movimentos livres”, o novo traje acaba “afetando a psique do homem e possivelmente afetaria também o fluxo das guerras”.Afinal, “ninguém pode ser alegre enfiado numa roupa cinza, marrom ou azul marinho”

FIGURA 05: Experiência número 3 - New Look

Assim, a cor aparece tanto nas pinturas, quanto na moda, na cenografia e arquitetura. A casa Capuava tinha como um de seus aspectos mais marcantes as cortinas coloridas que dançavam com o vento e contrastavam com a fachada trapezoidal branca. Também aparecia nos elementos decorativos, em algumas paredes, nas esquadrias de todas as aberturas e nos diferentes tipos de piso aplicados na casa, os quais também se destacam pela riqueza em texturas. Na sua pintura é perceptível o uso de cores vibrantes, as quais são usadas sóbrias e também misturadas, gerando movimento e dinâmico nas obras. Tudo isso expressa a grande sensibilidade que Flávio de Carvalho tinha com o mundo que o cercava. Os cinco sentidos eram objeto de exploração e interesse para ele, tanto que o artista desenvolveu um conjunto de ladrilhos hidráulicos representando cada um dos sentidos para a Vila Modernista dos Jardins.

25


ARQUITETURA: EXPRESSÃO TÉCNICA E ARTÍSTICA Durante a vida de Flávio de Carvalho, a arquitetura da Europa e do Brasil sofreram diversas modificações. Com a Revolução Industrial, a Primeira Guerra Mundial, seguida pela Segunda Guerra Mundial, o desenvolvimento de novas tecnologias de construção, e como já mencionado o novo papel da mulher na sociedade e as novas dinâmicas sociais e familiares, a arquitetura teve de se transformar, aos poucos, para se adequar ao modo de vida moderno. Na Europa essas transformações eram percebidas primeiramente, entretanto, com a comunicação intercontinental cada vez mais intensa, com os debates culturais e a reverberação da semana de arte moderna, não demorou muito para que o universo arquitetônico brasileiro também se transformasse. Aos poucos as discussões acerca da arquitetura e de uma necessidade de mudança aumentavam, desencadeando em 1925 a publicação do manifesto “Futurismo?” de Warchavchik, muito inspirado em ideias corbusianas e do manifesto de Rino Levi - ambos defendendo a economia e praticidade na arquitetura (BRUAND). Diante dessas discussões e na busca por opções alternativas à arquitetura acadêmica que vinha sendo produzida, em 1927 Flávio de Carvalho projetou o Palácio do Governo de São Paulo para um concurso, sendo este o primeiro projeto modernista - não construído - do país (ROSSETI 2007). No mesmo ano, o arquiteto Warchavchik, também um dos pioneiros modernos no Brasil, construiu a sua própria residência moderna.

FIGURA 06: Projeto para Palácio do Governo e Primeio projeto moderno do Brasil

Apesar do movimento múltiplo de produção de uma arte e literatura efetivamente brasileiras a partir da semana de arte moderna, a arquitetura ainda não havia passado por uma renovação da linguagem, já que, até a década de 1930 ainda o neocolonial era visto como o estilo que melhor representava a nação. Assim, os arquitetos brasileiros que visavam uma mudança deveriam refletir sobre uma arquitetura não apenas moderna, no sentido de atender às novas exigências de cidade-máquina, mas uma arquitetura efetivamente nacional, que comunicasse as raízes brasileiras. Apesar do primeiro contato do Brasil com a arquitetura moderna através de Flávio de Carvalho e Warchavchik, a vinda de Le Corbusier para o Brasil, em 1929, se mostrou de grande importância para os novos rumos da arquitetura brasileira.

26


Na viagem para o Brasil, Le Corbusier passou tanto por São Paulo quanto no Rio de Janeiro, influenciando, através de palestras e entrevistas, Lúcio Costa, Flávio de Carvalho e muitos outros jovens arquitetos. O arquiteto europeu, ao visitar o Brasil, se encantou pela paisagem fluminense, propondo para a capital um projeto urbanístico que integrasse a arquitetura com a paisagem o que talvez tenha servido para impulsionar uma valorização das paisagens nacionais. Os temas de suas palestras giravam principalmente em torno da vida, da cidade e da habitação modernas. Dentre os muitos contatos com arquitetos e intelectuais brasileiros, Flávio de Carvalho, juntamente com Geraldo Ferraz, pôde entrevistar pessoalmente o europeu e acompanhá-lo na visita de alguns edifícios em São Paulo, como a casa de Warchavchik. A entrevista realizada expôs tanto divergências quanto convergências de pensamento entre Le Corbusier e Flávio de Carvalho, mas a influência desta entrevista na carreira do último é inegável. Diante dessas questões, do cenário conturbado politicamente com a tomada do poder em 1930 por Getúlio Vargas, e a vontade dos cidadãos brasileiros de transformar o país, foi proposta uma renovação da Escola de Belas-Artes no Rio de Janeiro, em que a opção por um ensino de espírito moderno seria possível. A partir da década de 1930 então, lenta e gradualmente as ideias de uma arquitetura moderna foram sendo internalizadas pelos arquitetos mais jovens, os quais produziram uma ou outra obra moderna, como foi o caso de Lúcio Costa, Affonso Reidy, Luís Nunes e Warchavchik. As preocupações das novas obras associavam-se às ideias corbusianas - mas não se limitavam a elas. Havia uma busca pela consideração das questões funcionais, climáticas, sociais brasileiras. Destas preocupações alguns elementos interessantes surgiam, como por exemplo o cobogó, elemento construtivo que auxilia no conforto térmico e que, ao mesmo tempo, trouxe uma originalidade brasileira. É pertinente destacar que nesse intervalo de tempo, entre 1930 e 1935, Flávio de Carvalho manteve sua atividade, com diversos textos e também projetos arquitetônicos que não foram construídos, mas que definitivamente apresentavam uma forma outra de fazer arquitetura. Apesar da produção - mesmo que mais teórica - o engenheiro projetou quase incessantemente ao longo de sua vida e foi pouco valorizado na historiografia que trata da arquitetura moderna brasileira. A nova arquitetura que vinha sendo implantada aos poucos foi se disseminando, levando à proposta do projeto do Ministério da Educação e Saúde em 1935. O projeto, através de um convite feito por Lúcio Costa, trouxe novamente Le Corbusier para as terras brasileiras, sendo ele participante ativo do projeto que seria construído no Rio de Janeiro. Foi nesse ano também que Flávio de Carvalho fez seu primeiro projeto construído, que em realidade foi apenas o projeto de uma fachada, mas que por usar excessivamente o alumínio trouxe muita inovação para a época. Com a construção do Ministério da saúde e da Educação e a segunda vinda de Le Corbusier para o Brasil, a arquitetura moderna passou a ter grande visibilidade e os princípios corbusianos - planta e fachada livres, terraço-jardim, janelas em fita e pilotis - tornaram-se um novo método de trabalho para jovens arquitetos.

27


Outro ponto importante trazido por esse projeto e por Le Corbusier, mas que também era discutido por Flávio de Carvalho antes mesmo de 1936, era a preocupação em valorizar elementos locais, tais quais a vegetação. É possível observar, por exemplo, no Projeto para a Universidade de Belo Horizonte e no projeto da Embaixada da Argentina do Rio de Janeiro, ambos de 1928, de Flávio de Carvalho, desenhos que mostram Varandas e terraços com palmáceas e vegetação tropical, o que expressa a originalidade e prematuridade do artista em relação aos outros arquitetos da mesma geração no Brasil. Talvez a questão principal dos trabalhos de Flávio de Carvalho seja a particularidade que seus projetos tenham em comparação a tudo que estava sendo feito no Brasil. Apesar da arquitetura moderna possuir preceitos bem definidos, existem “modernismos” dentro do movimento moderno, como aponta Rossetti (2007), ou seja, existem diferenças consideráveis entre edifícios do mesmo estilo. Isso é exemplificado pela autora através da comparação da divergência entre as obras de Le Corbusier, Gropius e Mies Van der Rohe, todos essencialmente modernos, mas que produziram uma arquitetura muito distinta. Assim, independentemente da proximidade conceitual, a forma espacial assume configurações diversas e distintas. Então, ainda que a obra de Flávio de Carvalho dialogasse diretamente com a arquitetura moderna discutida por Le Corbusier e com a arquitetura moderna brasileira, os edifícios projetados por ele apresentavam uma peculiaridade do artista. Em suas obras arquitetônicas os contrastes e contradições são internalizados em toda a estrutura, decoração e projeto. Apesar dos edifícios possuírem, como exemplo, terraços, uso de vegetação nativa, fachadas limpas de ornamentos, formas puras, planta livre e modernidade no emprego dos materiais, há uma riqueza formal e estética que torna difícil limitar a obra do arquiteto nos rígidos preceitos modernos. Já dizia a revista Casa e Jardim a respeito da Casa Capuava “ um pouco templo, um pouco monumento, solene e igualmente acolhedora”. Sua obra arquitetônica caracteriza-se, de forma geral, por apresentar monumentalidade, simetria, um visível fracionamento das composições, a busca por uma identidade nacional, pela retomada de peso e elementos primitivos, e uma forte relação com sua produção artística. Diante disso é possível aproximar sua arquitetura com a sua arte e personalidade, como será melhor discutido no capítulo In-Between. Deste modo, apesar das muitas divergências formais e da peculiaridade da obra de Flávio de Carvalho, existem diversas questões importantes traduzidas em seus projetos em comum com arquitetura moderna nacional e internacional. Ao mesmo tempo que o arquiteto se atentava a todos os debates e questões que ocorriam na Europa, também trazia a preocupação de se criar uma identidade brasileira, como um bom defensor do movimento antropofágico. Na busca por uma essência brasileira, o arquiteto encontrou no primitivismo das Américas, nas tribos indígenas do continente e na vegetação nativa nacional, referências. Enquanto, de forma geral, os arquitetos do final da década de 1920 e início da década de 1930 ainda olhavam muito para a Europa como referência máxima da arquitetura, Flávio de Carvalho buscava nas próprias raízes da América essa identidade, tirando partido do passado americano pré-colonização para trazer algo inovador

28


para o presente. Há nesse ponto uma divergência de Flávio de Carvalho em relação ao pensamento moderno por não romper bruscamente com o passado, mas antes por encontrar nele uma forma de produzir uma arquitetura nova. “De fato, desde os concursos que tomara parte na década anterior, Flávio de Carvalho vinha se dedicando a uma pesquisa visual bastante ampla, investindo na atualização de figuras primitivas e modernas, de inspiração orgânica ou mecânica, lançando mão de soluções de empilhamento, contraste e interpenetração de corpos volumétricos regulares, frequentemente salientados pelo jogo de aberturas e planos de luz, sombra e cor diversos.” (LIRA 2015)

FIGURA 07: Projeto para Universidade de Belo Horizonte

FIGURA 08: Projeto para Palácio do Congresso do Estado de São Paulo

Somado a tudo isso, o arquiteto investigava constantemente formas de lidar com a questão do conforto térmico em um país tropical, preocupação que em muito se aproxima com a arquitetura moderna brasileira, a qual é repleta de pátios, terraços e varandas. Também se aproxima dos princípios modernos quando se preocupa em produzir uma arquitetura para o homem moderno, ou seja, uma arquitetura eficiente, racional, com boa circulação e uso de um sistema construtivo moderno. Também se aproxima das ideias discutidas na Europa no tratamento da cidade como máquina e todos as suas estruturas como elementos essenciais para o bom funcionamento dessa grande máquina. Para o artista, a cidade moderna deveria ser adaptada às novas formas de vida que envolviam um rápido crescimento urbano, novos hábitos noturnos, higiene e industrialização (ROSSETTI 2007). E para que tudo isso funcionasse o Estado deveria possuir um poder centralizado e forte, pensamento o qual também é traduzido formalmente em seus projetos para edifícios do governo. “Assim, Flávio de Carvalho acaba tornando-se uma figura a margem de uma “arquitetura oficial”, reconhecida e que opera dentro da lógica do governo em vigor, por não representar uma arquitetura moderna vinculada à política do país. Pois, sua arquitetura discute algumas relações políticas e sociais coerentes com sua visão de “um novo homem moderno”, de uma nova sociedade maquinista, de uma formação de identidade nacional a partir da compreensão entre o primitivismo brasileiro e as influências pertinentes de outras culturas mais solidificadas. Iconoclasta, estava mais preocupado em acabar com os valores consolidados de uma cultura conservadora e de seus mitos do que a busca de novos mitos a serem consolidados, como o projeto moderno, que acabava afirmando novos mitos do governo e a própria figura dos governantes.” (ROSSETTI 2007)

29


A OBRA CONSTRUÍDA A obra construída de Flávio de Carvalho se limitou a dois projetos de habitação, porém com intenções completamente distintas, já que uma se tratava de um conjunto de 17 casas em um meio urbano e outro uma casa para ele próprio em uma área rural. De qualquer forma, para ambos os casos a questão do habitar moderno, apontado por Correia (2004) se fazia presente na medida em que o arquiteto, a partir da reestruturação da família e dos valores tradicionais, propunha diferentes formas de se pensar a domesticidade. “Ao ser restringida a local de vida familiar e repouso - desqualificada como local de trabalho-, a casa limita o acesso de estranhos em seu interior. A redução do acumúlo de pessoas na casa é reforçada pela diminuição da permanência nela dos moradores que trabalham e estudam fora. A estabilização das relações e dos comportamentos da casa é uma das resultantes. Nela uma nova ordem é incorporada no uso, na organização do tempo e na ordenação do espaço doméstico.” (CORREIRA 2004) VILA MODERNISTA DOS JARDINS O conjunto de casas da Alameda Lorena, projetado e construído por Flávio de Carvalho em terreno familiar, teve a construção iniciada em 1934 e foi inaugurado em 1938. De caráter já muito citadino, o conjunto, localizado próximo à Avenida Paulista em São Paulo, foi pensado desde o começo como uma proposta de habitação distinta de tudo aquilo que ainda se produzia na capital paulista. O projeto torna-se extremamente relevante na carreira de Flávio de Carvalho por ser o único projeto inteiramente dele construído no espaço da cidade. Diante disso, o arquiteto pôde exercitar, na prática, tudo que ele havia falado ou escrito a respeito do papel da casa na cidade. A casa deveria ser espaço de repouso e uma estrutura essencial para a eficiência e bom funcionamento da cidade-máquina. “Todos os componentes da casa são funções desse contínuo velocidade-segurança. O homem do século XX utiliza-se da sua casa como ponto de passagem local de repouso na rotina da sua vida diária.” (CARVALHO 1938) Tendo em vista essa relação intrínseca entre casa e cidade, na vila, os espaços privados estariam em função dos espaços coletivos, fazendo com que as casas se abrissem para os espaços comuns através de janelas, terraços e espaços de transição. Deste modo, as dimensões dos ambientes internos são reduzidas tanto para priorizar uma vida coletiva em detrimento de uma individual quanto para abraçar dinâmicas familiares distintas daquela tradicional. “A casa é um equipamento da cidade, da sociedade maquinista, é o reflexo de uma coletividade e não de uma individualidade

30


como a casa burguesa do século XIX. A casa está inserida na cidade, que está mais direcionada para a eficiência e a velocidade da vida moderna. Assim, deve ser reflexo dessa nova sociedade, além de, tornar-se um equipamento para essas novas necessidades do homem. “Todos os componentes da casa são funções desse continuum velocidade-segurança”. ” ( ROSSETTI 2007) Apesar de originalmente no projeto as casas apresentarem uma cerca baixa que dividia o privado e o público, a relação casa-rua é pensada cuidadosamente pelo artista. Os espaços privados se diluem nos públicos e vice versa através do uso de janelas que enquadram a paisagem, terraços que vislumbram as ruas e com a presença, em algumas casas, de um elemento curvo responsável por criar um espaço de transição para a entrada principal da casa aumentando o espaço da calçada. “Suas inovações foram: a gentileza em lidar com o espaço urbano, os múltiplos olhares sobre a cidade e uma sala onde as funções de teatro, galeria, e salão de festas se misturam. Uma arquitetura híbrida de referências e que, ao mesmo tempo, mantém tradições sociais e cria espaços inéditos. “ (LINO 2005)

FIGURA 09: Implantação Vila Modernista

A vila, formada por 17 casas nasce do uso de uma paleta formal construtiva, como afirma Lino (2005), em que, partindo-se de um programa pré-definido de funções são criadas diversas modificações formais. Assim, todas as unidades apresentam uma essência comum, mas são distintas entre si, o que concede a todas um valor arquitetônico único. Dentre as variações, há ainda maior distinção entre as casas externas (faceadas com

31


as vias públicas) e as casas internas (no interior do lote). A maioria das residências externas, por exemplo, apresentam elementos curvos, salas com pé direito duplo e um número reduzido de dormitórios enquanto as internas são retas e possuem maior quantidade de dormitórios. O conjunto foi concebido com uma equilibrada associação entre técnica e sensibilidade: Ao mesmo tempo em que se pensava o bom funcionamento e a eficiência da habitação, os espaços criados não eram frios e sem vida, mas antes cheios de personalidade e arte. As questões de eficiência e estética eram tanto levadas em conta que Flávio de Carvalho desenvolveu um panfleto explicativo para os novos moradores instruindo as formas corretas de se habitar as casas. Dentre as preocupações do arquiteto com o bom desempenho das habitações estão o conforto térmico, circulação e as disposições de móveis e uso de cores. “Tanto que os moradores, no ato da locação, deveriam ser instruídos sobre o “modo de usar” aqueles “novos modelos para 1938 e 1939”: o uso de cortinas, o tipo e a disposição corretos do mobiliário, a divisão eventual dos cômodos, o manuseio de torneiras e ventiladores, o banho de sol ou a disposição de gaiolas de passarinhos nas sacadas.” (LIRA 2015) É visível uma indissociação entre arte do arquitetura pelo cuidado que Flávio de Carvalho demonstrou com os mínimos detalhes: de desenho de ladrilhos hidráulicos personalizados, desenho dos portões metálicos até a minuciosa definição de diferentes texturas das paredes para cada casa, tornando as paredes de cada uma quase um objeto artístico por si só. Ainda a questão do contraste também se apresenta nesse projeto, com o uso tanto de elementos mais característicos da arquitetura tradicional quanto elementos completamente modernos. Por serem ousadas para a época, as casas foram habitadas em sua maioria por intelectuais e não pela população comum, dificultando o desenvolvimento de um novo modo de vida como desejada Flávio de Carvalho: “Flávio de Carvalho apresenta neste projeto sua busca por uma linguagem moderna. Porém, sua busca por um novo modo de vida aqui no Brasil é pouco apreendida, pois o predomínio do gosto burguês dificultava que a população refletisse e aceitasse novas questões sobre o modo de ser e de viver, além da formação de um público para este tipo de arquitetura. Assim, continuava uma repetição dos modos de vida segundo os padrões ainda tradicionais.” (ROSSETTI 2007) A principal questão desse projeto, como aponta Rossetti (2007), é a preocupação de Flávio de Carvalho em propor uma forma de morar outra daquela existente, uma forma de morar que atendesse às necessidades do homem do século XX. Ao propor espaços flexíveis há um intuito de atender as diferentes formas de morar e também os diferentes tipos de família. Ainda, dentre todos os projetos realizados por Flávio de Carvalho, este está

32


FIGURA 10: Folheto para a Vila Modernista

33


entre os que mais se comunicam, formalmente, com a arquitetura europeia do período: “Esses novos elementos que ele traz para a discussão da casa brasileira como: o pé-direito duplo, o solário, as grandes aberturas e a dupla frontalidade, são na verdade um diálogo com projetos de arquitetos europeus contemporâneos a sua arquitetura, como as casas de Pessac (1925) de Le Corbusier e as casas de Weissenholf (1927), de Stuttgart, de diversos arquitetos europeus.” (ROSSETTI 2007) É possível concluir afirmando o valor do projeto tanto em sua dimensão teórica arquitetônica quanto artística. Ao mesmo tempo, é perceptível, a partir de todas as pesquisas realizadas e do estudo da tese de Carolina Rossetti - a qual faz um levantamento da fachada de cada casa - que atualmente as casas encontram-se completamente descaracterizadas. Com exceção de uma casa, as outras 16 casas foram reformadas ou demolidas - como foi o caso da maior casa do conjunto localizada na esquina que deu lugar a um prédio. CASA CAPUAVA A Casa de Flávio de Carvalho, projetada, construída e habitada pelo artista localiza-se em Valinhos, na área remanescente da Fazenda Capuava. Construída também no ano de 1938, apresenta uma situação completamente diversa daquela da Vila Modernista. A residência, implantada na zona rural em uma cidade do interior paulista não impediu que o artista trouxesse de alguma forma a cidade para dentro da casa, tanto pelo programa incomum quanto pela rica vivência repleta de intelectuais, artistas, amigos e modelos. Nessa casa, Flávio de Carvalho não pode colocar em prática suas reflexões a respeito de casa como estrutura de repouso da cidade-máquina, apesar disso, rompeu completamente com a ideia tradicional de casa do campo trazendo para dentro da casa a dimensão citadina: “A resolução da cozinha faz parte deste processo de reorganização e mecanização da casa, e está presente na Capuava, mesmo ela inserida no contexto rural. Na verdade, Flávio de Carvalho constrói a casa a partir dos conceitos de moradia moderna para um contexto urbano, mas agrega as funções sociais e intelectuais.” (ROSSETTI 2007) O local de implantação da casa, a fazenda Capuava, tem uma história rica que se inicia com a produção cafeeira, a qual foi importante para o desenvolvimento de Valinhos e também para o cenário nacional já que foi o principal produto de exportação do país no século XIX. Com a crise do café e intensificação da industrialização a fazenda foi aos poucos reduzindo do seu tamanho original (que inicialmente alcançava os limites entre Valinhos e Campinas) dando espaço à diferentes tipos de ocupação: “bairros residenciais (...) pequenas indústrias, comércio, escolas, igrejas, etc” (Souza 2009). Entretanto foi no século XX, com a compra da fazenda pela

34


FIGURA 11: Casa Capuava com paisagismo de Flávio de Carvalho

FIGURA 12: Implantação da casa de Flávio de Carvalho na área remanescente da Fazenda Capuava. Casa Capuava

35


família de Flávio de Carvalho, que a fazenda ganharia outra vez atenção com a construção da Casa Capuava, um dos únicos projetos construídos do artista. Habitada por Flávio de Carvalho até sua morte em 1973, a casa, apesar de localizada em uma área ainda rural trazia a cultura e arte dignas de uma cidade grande para dentro de si. Personalidades de diferentes áreas do mundo a visitavam, era espaço de arte, cultura, teatro, encontros e convívio. Suas reverberações iam muito além dos limites da fazenda, ganhando importância nacional do ponto de vista cultural. Apesar de ser considerada moderna, a residência, é de difícil caracterização ou qualificação em um estilo específico já que apresenta-se como um objeto arquitetônico ímpar, que traduz muito bem a personalidade complexa de seu autor. “ A solução projetual (...) não se acomoda facilmente às caracterizações disponíveis, modernista, classicista, expressionista, etc. Não tanto pela mobilização de um imaginário de épocas e culturas diversas, mas pela maneira como o faria sem recair em ecletismos de estilo, combinando alusões arcaicas com soluções ora correntes, ora inteiramente inusitadas” (LIRA 2015) Ainda, Pignaton a qualifica: “ No ano da conclusão das obras teria dito que o monumento na arquitetura já não era “um templo para alojar uma perfeição helênica, ou uma pirâmide para conservar vivas almas de faraós, ou um arco do triunfo para enfeitar em glória e saciar em pompas o vencedor pelas armas”. Mas cá estava Carvalho com seu templo primitivo, exibindo traços do pré-colombiano e do egípcio, de um túmulo e de um lugar de culto. Seria ele o herói, o bárbaro a imortalizar seus feitos? Ele bem sabe que o “homem passa” e jamais viveria como cristão que a acredita que a vida é imortal num mundo mortal. A forma piramidal da mastava é aquele elemento do antigo que retorna e reaparece como resíduo ancestral como uma das “formas que indicam traumas”. Como a “coluna clássica partida” e os “templos desgastados”, o elemento clássico no poema plástico de Carvalho reaparece enquanto ruína, oferecendo a mesma “sugestibilidade e profundeza filosófica”. Se a forma primitiva de Carvalho se faz atual como ele a considera, é porque emerge enquanto ruína” (pignaton 2016) Na estrutura da habitação é expressa uma forma de habitar que diverge daquela familiar tradicional. Apesar de se tratar de uma casa para um homem adulto solteiro, como Lira faz questão de destacar, a área da casa e sua estrutura interna sugerem uma ocupação e forma de habitar diversas: apresenta 7 dormitórios, uma cozinha, uma sala ancestral (com objetos e mobiliário da família), uma biblioteca pessoal, 3 banheiros, um pátio interno, uma sala de estar e um enorme salão principal que sugere convívio

36


para um grande grupo de pessoas. “apesar de rural, de modo algum ela poderia entendida como um refúgio onde se lamentar “a simplicidade e ingenuidade perdidas”. Concebida e animada por uma artista de vanguarda cuja atividade foi atravessada pela militância modernista - antropofágica em particular -, o interesse em antropologia e psicanálise e um elevado princípio de prazer, a casa seria inteiramente dedicada à arte de viver, à sensibilidade, à festa.” (LIRA 2015) Há nesta casa a presença de elementos que se repetiram de alguma forma em diversas obras artísticas e arquitetônicas de Flávio de Carvalho, tais quais: Fracionamento da volumetria, contraste de cor e peso, formas puras, presença de varandas, forte relação com o paisagismo e menção dos ideais de cidade moderna e homem primitivo. Ainda, apesar de uma casa que rompe com o tradicional, ela expressa uma composição muito rígida ao ser trabalhada a partir de um forte eixo de simetria. A residência é composta por 5 volumes, dos quais 1 é o salão principal, dois são espaços para dormitórios, banheiros e cozinha, e os dois volumes últimos são uma sala ancestral e uma biblioteca pessoal. “A solução prismática trapezoidal e quase hermética do volume principal da casa, presente também na sua proposta para o Farol de Colombo, teria sido inspirada - conforme o arquiteto declarou na ocasião - nos túmulos dos faraós.” (LIRA 2015)

FIGURA 13: Isométrica Casa Capuava expressando o fracionamento volumétrico, a imponência formal e a simetria

37


Com o falecimento de Flávio de Carvalho a casa original passou por diversas transformações (Souza 2009) até ser tombada como patrimônio arquitetônico pela CONDEPHAAT em 1980. O tombamento, limitado apenas ao edifício e às partes construídas externas - como a piscina - excluiu o entorno verde e rural como parte constituinte do espaço da casa o que manteve o espaço da fazenda ameaçado pelo mercado imobiliário. Aos poucos se tornou visível o desmembramento da fazenda, a qual deu lugar a condomínios fechados, habitações populares e espaços livres não qualificados, reduzindo a área da fazenda para um pequeno sítio. Apesar disso, o sítio ainda possui uma considerável área que poderia ser preservada pelo menos no sentido de constituir parte da paisagem integrante do projeto de Flávio de Carvalho, mas atualmente também encontra-se ameaçada por ocupações que pouco valorizarão a obra.

FIGURA 14: Análise da planta da casa.

Salão Principal Quartos, banheiros, cozinha e sala de estar Biblioteca pessoal e sala ancestral Circulação Espaços In-Between: Pátio e varandas

38


FIGURA 15: Planta da casa e da piscina

39


O IN-BETWEEN CONCEITUAÇÃO São várias as bibliografias disponíveis que tratam do tema do In-Between [“entre”] na arquitetura. Pode-se citar os trabalhos que focam nos espaços de transição físicos, como fez André Balsini; os que buscam um entendimento do próprio conceito de In-Between como faz Van Eyck; ou também os estudos que trabalham o ”entre” no sentido de investigar a intertextualidade entre arquitetura e outras áreas do conhecimento, tais quais arte, paisagem e contexto como é expresso no trabalho de Tschumi. As diferentes formas de abordar o tema expressam a complexidade do mesmo ao mesmo tempo em que permitem uma rica análise das obras de Flávio de Carvalho. Este trabalho, entretanto, terá como enfoque especialmente a investigação do In-Between entre arquitetura e paisagem, explorando tanto as questões mais abstratas que tangem essa relação quanto os espaços físicos de transição existentes entre a arquitetura e o espaço que a contorna. Além disso, tratando-se de um importante artista de artes plásticas também considerou-se pertinente pincelar um pouco a relação entre arquitetura e arte, e como isso se traduz na obra do arquiteto. André Balsini, afirma que na arquitetura a transição pode se dar entre espaços, formas ou lugares e entre elementos distintos. O espaço do “entre” é aquele localizado entre dois pontos principais e caracteriza-se como um limite em que elementos de diferentes naturezas se fundem formando um espaço complexo que nem sempre possui uma qualificação exata. Ainda segundo Balsini, esse espaço de transição expressa a ideia de simultaneidade, coexistência e sucessão. “o limite entre a forma e espaço define uma fronteira, uma passagem, que passa a ter existência própria, além de construir um ambiente próprio em torno de si.” (FOCILLON, 2002, P.22) Segundo Strauven (2007), Van Eyck define o “entre” como o lugar em que elementos distintos se unem e se encontram, criando o Twin-Phenoma, como é chamado pelo arquiteto. O twin-phenomena define-se por propor que elementos considerados opostos não brigam entre si nem se excluem, mas antes se completam e se equilibram, possibilitando a criação de espaços complexos refletindo a natureza ambígua do ser humano. Ao abordar o In-Between como um lugar, é possível identificar, entre arquitetura e paisagem uma dinâmica outra que não seja externa nem interna, como o caso de varandas, pátios e terraços. Nesses espaços há uma sensação de estar dentro e fora ao mesmo tempo, é possível sentir o frio ou o calor externo e o acolhimento do interno. Por outro lado, ao tomar o “entre” como um fenômeno, em que um elemento se dilui no outro a fim de se criar um equilíbrio é possível identificar outras formas de comunica-

40


ção entre o interior e o exterior, como são o caso das aberturas (janelas e portas), da decoração com plantas e uso materiais naturais nos ambientes internos. As janelas, por exemplo, podem enquadrar a paisagem e trazê-la para dentro do ambiente. O uso de materiais naturais no interior é outro elemento que permite que a comunicação com o exterior não seja perdida apesar das paredes que dividem o espaço. Essa segunda interpretação torna-se ainda mais complexa que a primeira, já que não trata especificamente de um lugar “entre” mas de um espaço íntegro que permite a “invasão” de elemento de natureza distinta. O espaço interno decorado com jardins, plantas, muitas janelas não deixa de ser um espaço interno, mas retoma o espaço externo no interior. Já o espaço da varanda, por exemplo, é um interno-externo, é um espaço de transição, é a harmonia e o equilíbrio. Os espaços de transição, como espaço de sucessão, aumentam ou diminuem o grau de privacidade. Segundo Alexander et Al, permitem a geração de um gradiente de intimidade. Os espaços “entre” surgem como uma forma mais suave de “mudar de assunto”, diminuem o contraste entre lugares, ao mesmo tempo em que são repletos de contradições internas. São lugar de adaptação. Quando é feita de maneira adequada, essa interface é uma zona de transição: ela aumenta a conexão entre o interior e o exterior, incentiva a formação de grupo de pessoas cruzando estes limites espaciais, encoraja os deslocamentos (...) e permite que atividades variadas surjam em torno ou dentro da própria zona de transição. (Alexander et Al p.754). Na arquitetura moderna os espaços de transição aparecem principalmente com os terraços e térreos livres - muito explorados por Le Corbusier. Na arquitetura moderna brasileira isso ganha ainda outra dimensão a partir das necessidades de ventilação e iluminação em um país tropical, retomando as varandas usadas de forma recorrente na arquitetura colonial. Além das varandas, as aberturas, a importância dada às belas paisagens nacionais também interferem na forma de se produzir arquitetura no Brasil. A arquitetura nacional, principalmente aquela produzida a partir de meados do século XX, se preocupa tanto com as questões climáticas quanto a integração física com a paisagem, assim, considera-se o relevo, o entorno, o enquadramento e o conforto térmico. A comunicação entre arquitetura e seu entorno é sempre presente. Isso é perceptível na obra de Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Lina Bo bardi, por exemplo. “Espaços de transição diversos irão se configurar como elementos de adaptação a um clima predominantemente quente e sujeito a chuvas. Seus projetos irão propor “interpretações entre o íntimo e o social, (...) jogos de permeabilidade e transição sensorial através de variações de luminosidade, marcando passagens discretas entre ambientes que, no entanto, são nitidamente particularizados” (Ibid, p.38). Costa será um intérprete privilegiado do modernismo, que irá se preocupar com a adaptação da arquitetura

41


racional ao contexto regional” (BALSINI 2014) Outra sutil fronteira importante a ser destacada é o In-Between entre arquitetura e arte. Essa forte associação entre esses dois campos é expressa no trabalho de diferentes arquitetos tais quais Gropius, o próprio Le Corbusier ou mesmo Burle Marx como paisagista. Na arquitetura de indivíduos como estes é possível ver uma associação da arquitetura e da paisagem com a pintura, escultura e artes plásticas. A associação de arte e arquitetura, assim como paisagem e arte, pode ser realizada de diferentes formas. Uma delas é tratando a arquitetura como objeto artístico - como escultura - outra é integrando arte na arquitetura através de elementos tais quais quadros, decoração e design. O IN BETWEEN NAS OBRAS DE FLÁVIO DE CARVALHO A partir da introdução às possibilidades de abordagem do In-Between, as obras de Flávio de Carvalho serão brevemente analisadas a partir: 01) Dos espaços físicos de transição 02) Da conexão visual 03) Das materialidades da paisagem no interior 04) Da diluição entre arquitetura e arte: arquitetura como objeto artístico e arte pensada conjuntamente com a obra arquitetônica Como já afirmado, a obra de Flávio de Carvalho apresenta notável complexidade, contrastes e conciliações entre elementos distintos. A busca pela conciliação entre elementos de diferentes naturezas também foi perceptível na obra de Van Eyck, o qual buscou, ao longo de sua carreira, explorar formas de harmonia entre passado e presente, orgânico e geométrico, clássico e moderno. Assim também, na obra de Flávio de Carvalho há um constante tensionamento entre polaridades: tradicional e moderno, cor e não cor, passado e futuro. No que diz respeito à sua obra arquitetônica, é perceptível, mesmo que prematuramente comparada aos outros arquitetos modernos brasileiros, uma preocupação com as questões da paisagem, clima e identidade brasileira. Conforme os desenhos apresentados a seguir, é perceptível uma forte relação de sua arquitetura com a paisagem: há uma exploração de enquadramento da paisagem, uso de varandas, muitas aberturas, terraços, uso de vegetação nativa, consideração da topografia e térreos livres. Tudo isso expressa o cuidado na relação da arquitetura produzida com ele com o espaço que contornaria essa arquitetura. “Bruand (2010) afirma que o clima tropical é o fator de maiores repercussões na arquitetura brasileira. “O país situa-se quase que inteiramente entre o Equador e o Trópico de Capricórnio, estando sua parte meridional bastante próxima deste, apontando assim temperaturas elevadas durante o verão”(2010, p.12). Conside-

42


rando que a arquitetura deve responder às necessidades de conforto de seus usuários, desde o tempos da colônia se desenvolve, no Brasil, um projeto que busca dotar os edifícios de espaços sombreados, de modo a combater o excesso de luminosidade e o calor intenso. Neste aspecto, apontamos a sombra como um fator que particulariza os espaços de transição na arquitetura brasileira, diferenciando estes espaços de seus correspondentes realizados em território estrangeiro” (BALSINI 2014) Exemplos de In-Between entre paisagem e arquitetura, interior e exterior em algumas obras de Flávio de Carvalho Espaços de Transição Varandas, terraços, projeções Aberturas Vegetação Nativa

FIGURA 16: Edifício de Apartamentos

FIGURA 18:Alojamento de estudantes e Museu FIGURA 17: Paço Municipal de São Paulo

FIGURA 19: Ensaio de Coro e Residência Tipo

FIGURA 20: Igreja

43


Na arquitetura de Flávio de Carvalho é possível, ainda, confundir onde exatamente ele atua como arquiteto e onde atua como artista. Tanto que existem estudos aproximando a arquitetura do engenheiro de um objeto artístico, como faz Lino (2005). Além dos edifícios em si apresentarem uma relação com a arte, também a decoração se torna uma expressão artística: com painéis decorativos elaborados, elementos metálicos cuidadosamente desenhados pelo artista (como guarda-corpos), elementos que dialogavam com o movimento antropofágico e a busca por uma essência brasileira. Dessa forma, arquitetura e arte eram produzidas conjuntamente em uma equilibrada relação. “Flávio de Carvalho, como já foi colocado anteriormente formou-se em artes plásticas e engenharia, portanto, analisar sua obra de arquitetônica, a priori, anuncia a possibilidade do diálogo entre a arquitetura e as artes plásticas.” (LINO 2005) Outra diluição entre arte e arquitetura é na poética que o espaço arquitetônico se permite na obra de Flávio de Carvalho. Lino (2005) exemplifica com as casas da Vila Modernista: “(...) a liberdade dada ao usuário do edifício, a disponibilidade para o acontecimento: a sala que vira, palco, pista de dança, galeria; o solarium, que pode ser decorado com gaiola de pássaros e flores, que se “vestido” com a cortina de lona, vira cabana, senão pode ser usado para tomar um sol no meio da cidade - um espaço livre, para o delírio e a fantasia” (LINO 2005) Além da aproximação entre arquitetura com a arte, é possível observar, nos projetos de Flávio de Carvalho, uma aproximação muito clara entre sua arquitetura e seus textos e palestras. As questões a respeito da cidade, Estado, nova concepção de família e de homem são todas expressas em seus projetos arquitetônicos.

FIGURA 21: Painel para Palácio do Governo

FIGURA 22: Painel para Palácio do Governo

FIGURA 23: Pisos Cerâmicos para Farol de Colombo

44


FIGURA 24: Farol de Colombo da República Dominicana

FIGURA 25: Perspectiva Museu

FIGURA 26: Perspectiva do Hall

FIGURA 27: Painéis para Farol de Colombo

45


O IN-BETWEEN NA VILA MODERNISTA Tratando-se de casas implantadas em meio urbano consolidado, a análise desse conjunto será distinto daquele que será feito para a Casa Capuava. A principal preocupação de Flávio de Carvalho nesse projeto era tratar da casa como elemento pertencente à cidade e que deveria existir em função da mesma. Partindo desse pensamento, o arquiteto preocupou-se em investigar as relações entre público- privado a fim de potencializar as relações coletivas - algo que não poderia acontecer na Casa Capuava por ter sido implantada praticamente isolada em uma zona rural. “(...) Carvalho explora a relação entre o público e o privado (interior e exterior) através da construção de um pátio interno entre as 17 casas como uma extensão da rua. Relação esta também explorada ao elaborar plantas em que os cômodos íntimos têm dimensões mínimas, “contra o desperdício”, uma vez que a morada do homem se estenderia ao âmbito da cidade. Isso aconteceria “ à medida que ela [ a cidade ] fornece coletivamente maior conforto e luxo e a importância da casa como centro único de atividade diminui”. Além disso, a relação público e privado é observada na escolha dos materiais como o vidro dando transparência à fachada, de modo que o homem “da beatitude intrauterina da fortaleza, passa a espiar a paisagem”. Neste conjunto de casas para aluguel, Carvalho adota elementos da cartilha moderna, o que faz do conjunto um exemplar reconhecido da nova arquitetura inserida na cidade” (PINGATON 2016) A partir das considerações de Pignaton é possível atentar ao fato de Flávio de Carvalho propor duas escalas distintas para esse conjunto em relação à cidade. Uma primeira escala é pensada no conjunto como unidade, tratando a rua interna como um pátio interno. A segunda escala é pensar as casas individualmente e sua relação com a cidade e com as demais casas do conjunto. Apesar de apresentar um cuidado também para a relação das casas com o “pátio interno” do conjunto é perceptível que as casas voltadas para as alamedas apresentam um desenvolvimento formal mais chamativo, talvez com o intuito de valorizar ainda mais a cidade. As relações entre Interior e exterior, privado e público, arquitetura e paisagem são passíveis de serem analisadas a partir de: 01)Implantação A primeira instância a ser analisada é a forma como o conjunto das casas é implantado no terreno. Para isso, Flávio de Carvalho considerou a malha urbana existente e tinha como intuito que o conjunto reverberasse pela cidade, fazendo com que o restante do quarteirão desse continuidade ao projeto do conjunto (DAHER 1982). A implantação é um primeiro elemento de diálogo entre o interno e externo, o privado e público. Com isso, Flávio de Carvalho optou por preencher

46


o lote com a maior quantidade possível de casas e ao mesmo tempo voltar essas casas o máximo possível para as agitadas alamedas. Para o melhor aproveitamento do solo, foram implantadas casas no interior do lote, conectadas à cidade através de uma rua interna.

FIGURA 28: Isométrica Vila Modernista

Espaços de Transição Varandas, terraços, projeções Aberturas

Setas que indicam que as casas internas se voltam para o “pátio” do quarteirão

Paisagismo pensado por Flávio de Carvalho

Setas que indicam que as casas externas se voltam para a cidade

02)Aberturas Apesar de apresentarem dimensões reduzidas, se comparadas as aberturas da Casa Capuava, as janelas foram pensadas de maneira a enquadrar diferentes pontos de vista permitindo “espiar” o que ocorria na cidade e na rua interna, ou seja, participar, mesmo que indiretamente da vida coletiva. “Na verdade estas aberturas mostram a preocupação de Flávio de Carvalho com a sociedade, mais do que com a formação da família. A questão para ele era o indivíduo constituindo uma coletividade, indiferentemente de sua origem-família.” (ROSSETTI 2007)

47


As casas externas do lote possuíam aberturas tanto para as alamedas quanto para a rua interna, entretanto, a área social voltava-se para as alamedas e a área de serviços para a rua interna, expressando novamente a valorização da cidade. 03)Terraços e Varandas As casas, de forma geral, apresentavam varandas, terraços e solários (comuns nas casas externas) permitindo não apenas que a cidade entrasse na casa mas também que um pouco da vida privada fosse projetada para a cidade. Nos solários, Flávio de Carvalho pretendia, além da conexão com a cidade, um contato também com o espaço natural, permitindo aos moradores banhos de sol. Ainda, os solários seriam espaços de convivío e festa: “(...)o solário permitiria, além disso, “tomar-se banho de sol nu em pelo, livre dos olhares indiscretos” e “nas noites de verão, pode servir de bar, onde seria agradável tomar uns drinques e conversar”. (LIRA 2015) 04)Projeções no térreo As casas voltadas para as alamedas foram pensadas com a presença de um elemento curvo, o qual cria uma área sombreada no térreo, criando ali um espaço de transição entre público e privado e aumentando, sensorialmente, o espaço da calçada. Já na relação arte x arquitetura também existem alguns elementos que diluem os limites entre as das duas disciplinas expressos nessas casas: 01) Tratamento das paredes Flávio de Carvalho escolheu diferentes texturas para os rebocos das casas, tratando, como afirma Lino (2005), as paredes como superfícies escultóricas. “Para realizá-las usou-se vários tipos de instrumentos, pentes (que segundo Flávio de Carvalho na obra Bailado do Deus Morto, foram feitos a partir do corpo do Deus!), trinchas, espátulas entre outros. Esta diversidade de instrumentos fez que, em cada casa, exista uma textura diferente, dando ao conjunto uma diversidade de elementos.” (LINO 2005) 02) Forma e Volume Em relação à forma, pode-se destacar o elemento curvo presente em algumas casas. O elemento traz dinâmica para a fachada e contrasta com as formas retangulares resultando em composições ricas e diversas.

48


FIGURA 29: Fotografia Vila Modernista

FIGURA 30: Vila Modernista e as paredes com rebocos cuidadosamente pensados

FIGURA 31: AnĂĄlise volumĂŠtrica de uma das casas

49


03)Materiais Para as casas, Flávio de Carvalho desenhou um conjunto de ladrilhos hidráulicos formados por 5 peças, representando os cinco sentidos: Visão, tato, olfato, audição e paladar, o que explicita a vontade de Flávio de Carvalho de trazer os sentidos humanos à tona. A mistura dos materiais, dos ladrilhos, com a madeira, dos elementos metálicos, com as texturas dos rebocos em contraste com a tintura branca cria espaços ricos, que permitem diferentes apropriações. Isso expressa a preocupação para com a estética. O IN-BETWEEN NA CASA CAPUAVA Por se tratar de uma casa do Campo, é possível analisar melhor a relação entre arquitetura e o espaço natural, relação esta que é enfatizada sempre na análise da casa: “Flávio de Carvalho consegue elaborar uma proposta para uma construção no campo sem ter que recorrer a velhos modelos de arquitetura colonial. Ele consegue estabelecer uma relação da casa com a paisagem da mesma forma que na Alameda Lorena ele estabelece entre casa e cidade” (ROSSETTI 2007) “Sua poesia está presente também na exaltação da paisagem. Se ela invade o interior é porque o próprio espaço construído e a natureza se interpenetram, seja nas generosas aberturas existentes em todos os cômodos da casa, seja quando a superície refletora da piscina duplica a semipirâmide na paisagem fazendo da casa uma miragem que confunde o sentido do real”. (PIGNATON 2016) 01) Implantação Um primeiro ponto a ser explorado dos espaços entre na Casa Capuava é a sua implantação, o gesto cria uma comunicação física entre arquitetura e o terreno. Assim, Flávio de Carvalho opta por implantar a casa em um ponto alto do terreno, o qual permite dar à casa um posicionamento estratégico que possibilita ver a paisagem montanhosa dos entornos. “Na escolha do local fugi à prática comum de colocar a casa nos vales. Preferi os morros, com paisagem que o circunda. (...)” (CARVALHO 1958) A casa, como afirma Lira (2015) se insere de forma monumental no terreno: “O projeto define-se na paisagem pela imponente da silhueta trapezoidal do salão principal (...) Situado sobre uma pequena elevação, o imóvel é incapaz de ser apreendido em sua totalidade” (LIRA 2015)

50


FIGURA 32: Ladrilhos hidrรกulicos desenhados por Flรกvio de Carvalho para a Vida Modernista

FIGURA 33: Fotografia Casa Flรกvio de Carvalho

FIGURA 34: Desenho da Casa Capuava

51


02) Aberturas A casa conta com 30 aberturas, sendo que todas, com exceção às 5 pequenas janelas da fachada sudoeste, são tratadas da mesma forma: de dimensões generosas, folhas de vidro e caixilhos metálicos pintados de amarelo. Assim, com a transparência do vidro e com as generosas aberturas, o interior e o exterior da casa formam um corpo único. As aberturas foram idealizadas para faze com que - Usando a frase de Mario de Andrade - “a paisagem, as nuvens, a luz, o ar entrem dentro da casa” (CARVALHO 1958) Das aberturas, 4 são voltadas para o pátio interno, 2 para as varandas e o restante para a paisagem do entorno. Ainda, das 29 aberturas 15 são portas. As janelas e portas desempenham um importante papel na integração visual entre interior e exterior, de tal forma que permitem que a paisagem entre no interior da casa, como afirma o próprio Flávio de Carvalho - pela luz, cores, vegetação, tempo. Assim, do interior da casa pode-se sentir o vento, a chuva, as cores do exterior. “Ao mesmo tempo, por estar no campo, ele dilui a casa na paisagem, abrindo todos os cômodos para o jardim “ (ROSSETTI 2007) Além disso, as portas permitem uma integração física com o lado externo, quando abertas os limites entre um e outro se dissolvem. 03)Varandas A casa apresenta duas grandes varandas externas, as quais são exemplares espaços de transição: São um meio termo entre o externo e o interno. Na varanda é possível estar protegido das chuvas e ao mesmo tempo ouvir seus sons, sentir sua força, seu cheiro e seus ventos. Na varanda é possível estar no conforto da sombra mas contemplar o dia ensolarado e a brisa mansa do verão. “A varanda, além das redes, possui floreiras nas vigas externas da estrutura. A vegetação também procura trabalhar com a questão do tropical, utilizando plantas como cactos, bromélias, palmeiras e coqueiros. Também podemos observar esse tipo de vegetação desde o início de sua trajetória arquitetônica, ao propor plantas tropicais para edifícios monumentais e mesmo na cidade, opondo-se as plantas de topiaria, com influência dos jardins franceses.” (ROSSETTI 2007) Ainda, o uso de poltronas de vime - material natural - também remete à natureza do exterior. O espaço da varanda era, no período habitado por Flávio de carvalho, repleto de redes e mobiliários dispostos de forma des-

52


Aberturas Aberturas pequenas Espaços de Transição Comunicação visual com o espaço externo

FIGURA 35: Análise das relações Interior x Exterior em Planta

53


pojada. Era uma sala de estar ao ar livre. 04)Pátio Talvez o mais contraditório dos espaços da casa, por se tratar de um espaço externo no interior da casa. Na casa Capuava esse entre espaço aparenta ter servido principalmente para iluminação. 05)Materialidade e Decoração Como já afirmado, a materialidade também desempenha um papel de comunicação entre interior e exterior na medida em que, ao trazer elementos naturais para o interior tais quais madeira, pedra e vegetação há uma penetração da paisagem e da natureza, no espaço da casa. “a apropriação da paisagem e da vegetação, o uso de materiais naturais, como pedra nos ambientes externos, madeira nas paredes, cerâmica no telhado e no piso, a planta labiríntica que compõe a ala mais reservada aos fundos, remetem aqui e ali a fontes mais recentes: as casas de pradaria de Frank Lloyd Wright” (LIRA 2015) Lira afirma também que na lareira, Flávio de Carvalho traduz os quatro elementos da natureza - ar, fogo, água e terra - unindo-os em uma harmoniosa composição poética. 06)Uso Como um artista defensor da liberdade, o uso dos espaços da casa e de seu entorno expressavam sua forma artística de habitar. Muitas vezes os espaços íntimos não se limitavam ao espaço interno da casa mas se expandiam para a área da piscina, na qual não era raro Flávio de Carvalho nadar nu na companhia de modelos ou outras personalidades. Além da natação, Flávio de Carvalho também pintava modelos nuas nas áreas externas da casa. Ainda que a fazenda fosse um espaço pouco ocupado, haviam outros moradores e funcionários percorrendo na área, mas isso não impedia que o artista vivesse sua casa e seu jardim como ele desejava. Nesses casos, o arquiteto dispunha de bandeiras na área da piscina para alertar terceiros que havia nudez na região da piscina. Essa liberdade do corpo no espaço externo diluem os limites entre público e privado. Em relação ao In-Between entre arquitetura e arte, a casa apresenta-se carregada de poética, a qual pode ser investigada a partir de: 1)Poética da Concepção “A concepção de toda a casa é um produto puro da imaginação, tentando criar uma maneira ideal de viver. A poesia é, aliás, indispensável à criação arquitetônica, como fator de elevação do

54


FIGURA 36: Fotografia da Varanda, 2019

FIGURA 37: Fotografia do Pรกtio, 2019

FIGURA 38: Fotografia Salรฃo Principal

55


homem. Idealizei a planta em 1929, tendo a casa sido construída no correr de 1930. Foram rápidos os planos, alguns dos quais alterados durante a construção. (CARVALHO 1958) 02) Forma e Volume A forma e a volumetria da casa são dos aspectos mais levantados e discutidos a respeito da mesma. A forma traz à tona, como afirma o próprio Flávio de Carvalho, elementos tanto antigos quanto modernos, tornando-a de certa forma um objeto atemporal. “Lá, o mundo é esquecido, as cores são outras, o espetáculo da palavra é alheio ao vestuário inútil da civilização, os preconceitos, cuidadosamente engavetados, não interferem com a auréola de luz do nascente ao ponto. Como um templo primitivo, saindo das brumas do passado, a sede da fazenda é, ao mesmo tempo, o que há de mais atual em arquitetura. A paisagem invade o interior do templo…” (Flávio de Carvalho 1944) A forma pode ser interpretada como objeto artístico pela carga poética que carrega em sua estrutura: “Inaugurada em 1938, a casa logo se tornou sua primeira residência, afirmando-se ao longo de sua vida como uma plataforma “Suntuosa, lúbrica e dramática”, “misto de templo e aeronave””(LIRA 2015) 03)Decoração Como já mencionada, a lareira dialoga tanto com o espaço natural como torna-se um objeto artístico por si só: “Em relevo no meio da sala, o fogo se faz na cesta de ferro forjado em semicírculo, destacada da parede. Sobre as chamas, uma cúpula de alumínio brilhante com pequeno repuxo iluminado por lâmpadas de diversas cores. Com o aquecimento do alumínio, a água [ que jorrava sobre a cúpula] desprende vapor, dir-se-ia colorido”” (CARNEIRO 2015) A mesa também é um objeto carregado de poesia, e portanto, de arte: “ a mesa de jantar constituía quase um altar: desenhada pelo próprio Flávio em metal cromado e tampo de cristal belga de uma polegada de espessura, acomodava folgadamente catorze pessoas em confortáveis poltronas do mesmo material. Holofotes posicionados embaixo da mesa produziam reflexos inusitados da porcelana, talheres e cristais sobre o espaço e o corpo dos comensais, com frequência obscurecendo os alimentos que comiam e permitindo visao perfeita de suas pernas. A estratégia flertava com o investimento surrealista no trompe l’oeil ou na multiplicação e justaposição de imagens dissonantes, em duas representações do interior doméstico”. (LIRA 2015)

56


Além disso, o uso de uma decoração de “procedências, épocas, formas, materiais, estatutos variados, combinando o popular, o moderno, o bizarro e o ritual, móveis e objetos, densamente acumulados no espaço, parecem interagir uns com os outros para criar uma atmosfera de deslocamento, sensualidade, burburinho e desapego”. (LIRA 2015) 04)Uso O uso da casa trazia uma dimensão artística por ser espaço de performance, de produção artística e de uma vivência fundamentada nos desejos, instintos e na exaltação dos sentidos: “impunha-se a dúvida acerca dos princípios de lógica, eficiência e progresso propalados no confronto com necessidades de ordem psíquica, ligadas aos mundos do desejo e do inconsciente. Talvez por aí compreendamos a aura mítica com que, na Casa Capuava, revestiam-se a tecnologia, os artefatos, a ambientação: eles existiam para serem criativamente apropriados por um pathos erótico que se atualizava no ideal de habitar o mundo artisticamente”. (LIRA 2015)

FIGURA 39: Fotografia da lareira

FIGURA 40: Vivência do Salão Principal

FIGURA 41: Cozinha da Casa Capuava

57


CONSIDERAÇÕES UMA REFLEXÃO CRÍTICA A partir das questões iluminadas neste trabalho é possível compreender o valor único e peculiar da obra construída de Flávio de Carvalho. Apesar dessa importância, o patrimônio desse polêmico artista encontra-se em situações lamentáveis: A vila modernista pela sua descaracterização e a Casa Capuava pelo seu descuido. Em São Paulo, no conjunto, restam poucos vestígios daquilo originalmente pensado pelo arquiteto. E a ideia de que seu projeto iria reverberar pelo quarteirão e pela cidade não só não ocorreu como aconteceu justamente o contrário. A cidade engoliu o patrimônio, as casas, que deveriam servir de espaço de repouso, se tornaram, em grande parte, estabelecimentos comerciais. Os vestígios restantes pouco conseguem comunicar a respeito de Flávio de Carvalho que pensou cuidadosamente cada detalhe a fim de formar uma unidade. Visto a situação da Vila Modernista, é de se questionar as ameaças para a Casa Capuava, que está cada vez mais sufocada pela cidade: cercada de muros de condomínios de alto padrão, loteamentos fechados, serviços de carros e ferrovia a fazenda encontra-se sufocada pela cidade que a envolve e seu acesso consideravelmente limitado. Ainda, dentro da área que ainda resta da fazenda foi construída uma escola para crianças especiais (A.C.E.S.A) nas proximidades da Casa Capuava, existem áreas de equitação e algumas casas dispersas que em sua maioria estão desocupadas. “o parcelamento e o uso das terras da antiga Fazenda Capuava são objetos de estudo acadêmico por possuírem algumas das mais significativas especificidades encontradas no urbanismo moderno brasileiro. Pois que, nela, há habitações para diversos segmentos sociais (população de baixa, média e alta renta), um vazio urbano com mata remanescente, vários equipamentos urbanos que atendem às necessidades locais e que dispensam o munícipe de se deslocar para dentro da cidade, uma sede modernista tombada e com potencial turístico e cultural. Além disso, está situada em local de conurbação e que ainda possui em seu entorno uma Estação de tratamento de esgoto” (SOUZA 2009) Segundo entrevista com Luciana Piton - uma das responsáveis pelos cuidados com a A.C.E.S.A e também por guiar turistas na Casa Capuava - a área remanescente da fazenda já foi vendida para empreendimentos imobiliários de condomínios fechados. O que expressa a desconsideração não somente da importância do entorno para a casa - a qual, com construção dos condomínios muito provavelmente passará a facear muros mas desconsidera o potencial da área como uma estrutura de importância nacional. As paisagens, como já expressos neste trabalho, formam uma unidade com os espaços internos da casa, a relação é intrínseca e está

58


comprometida. “Esse patrimônio, além do risco de ruína, é ameaçado pela crescente especulação imobiliária de condomínios horizontais de luxo, política tomada pela cidade desde meados da década de 1990, enquanto sua população carece de políticas culturais e de espaços públicos de vivência.” (SOUZA 2009) A casa encontra-se atualmente margeada por mato alto, suas paredes já perderam seu aspecto original branco e há uma visível necessidade de restauro. Se inicialmente a casa era usada para atividades da A.C.E.S.A, atualmente encontra-se em estado de abandono. Apesar do descuido, ainda se mantém o peso monumental da casa e a complexidade do artista refletido na obra. Segundo Luciana Piton, o restauro do patrimônio já foi aprovado, no entanto, sem uma revisão do uso do espaço da casa o futuro da mesma continua incerto. A POSSIBILIDADE: CASA-MUSEU “A casa elemento de representação social, quando se transforma em Casa Museu, faz com que seja agregado também o valor de patrimônio e de representação cultural, passa a ser um monumento histórico, marco de uma identidade cultural, parte da memória coletiva de um local, cidade ou região, construindo um sentimento de pertencimento” Scarpeline 2012 Diante de tudo que foi levantado e estudado da obra construída de Flávio de Carvalho, e considerando o tratamento do patrimônio histórico no Brasil, de forma geral, não é errado afirmar que há um descuido tanto do poder público quanto da população brasileira para com a história do país. Ainda que existam, na atualidade, diversos meios e órgãos que buscam defender o patrimônio, as pressões do mercado imobiliário somadas ao crescimento das cidades e a necessidade de utilidade são uma ameaça constante para edifícios subutilizados, degradados ou abandonados. “A cidade moderna onde hoje vivemos foi construída por uma especulação imobiliária descontrolada, que converteu o valor do solo urbano num dos investimentos mais lucrativos. Hans Bernoulli sustenta a tese de que a propriedade privada do solo e sua fragmentação é o mal principal da cidade moderna. O solo, tornando-se mercadoria comercial, torna-se objeto de monopólio econômico”.(TRENTIN 2005) O patrimônio histórico ocupa uma posição relevante nas cidades, pois conta, de certa forma, a história das mesmas. Muito além de serem meros pontos turísticos, os edifícios antigos são um registro físico daquilo que já foi, ainda que abram espaço para diversas interpretações. Essas construções são uma comunicação direta com o passado, o que torna possível afirmar um caráter quase metafísico do patrimônio, na medida em que permite ao indivíduo transcender a experiência sensível. É uma essência

59


do passado que ainda vive no presente, e há nisso uma poética e um valor imensuráveis. “No conjunto de bens culturais produzidos pela humanidade, a arquitetura constitui um testemunho excepcional na formação da memória histórica dos povos e, na formação da identidade. Ela é um testemunho sedimentado e acumulado dos modos de vida do homem, não só daqueles que a conceberam na origem, mas também dos que ali viveram através dos tempos e lhe conferiram novos usos e significados. A arquitetura é carregada de sentimentos de gerações, acontecimentos públicos, tragédias, fatos novos e antigos”.(TRENTIN 2005) Como já mencionado, a Casa de Flávio de Carvalho apesar de tombada pela CONDEPHAAT em 1982, atualmente encontra-se em um estado deplorável. Abandonada, a casa tem a sua relevância não por expressar os valores de uma época, mas justamente por expressar uma vivência que rompia com toda a tradição do período em que foi construída. Além disso, a casa, em sua forma atípica e única é objeto artístico na medida em que possui uma rica exploração formal, compositiva, de materialidade e detalhes. Desta forma, a residência, tanto em sua forma como em seu uso, extrapola os limites e costumes do período e pode ser considerada inovadora até mesmo na contemporaneidade. Ainda, além de ser o único projeto construído por Flávio de Carvalho que ainda permite o indivíduo se aproximar de fato da excêntrica personalidade de um renomado artista brasileiro - por conservar consideravelmente sua originalidade - a casa está implantada em uma área remanescente da Fazenda Capuava. Esta, antiga produtora de café, dialoga tanto com a memória coletiva de Valinhos quanto com a memória do Brasil como um todo por fazer parte da história nacional. Atualmente, com a redução da fazenda e substituição da mesma principalmente por condomínios horizontais fechados, a memória da fazenda vai se diluindo e a Casa Capuava aos poucos perde o entorno que é tão constituinte da casa quanto sua própria estrutura. “Algumas obras arquitetônicas alcançam o valor de monumentos, seja por seu valor intrínseco ou por sua situação histórica (1). Preservá-las e incorporá-las na vida da cidade, no plano urbanístico, é um desafio para os gestores do urbanismo nas cidades.” (TRENTIN 2005) Tratando-se ainda de uma casa, e da morada do próprio artista que a fez, a residência ganha ainda mais valor por contar um pouco da história vivida por Flávio de Carvalho. A casa, como afirma Scarpeline, diferencia-se do espaço público comum, por ser o espaço máximo de intimidade e privacidade. É território da individualidade e portanto, possibilita que nele o ser humano seja puramente aquilo que é: sem as máscaras dos costumes tradicionais e das leis. Não que Flávio de Carvalho em algum momento realmente usasse dessas máscaras, mas na sua casa as suas provocações

60


normalmente discursadas no espaço público são encarnadas na prática. É no espaço da casa, da máxima intimidade, que todos os sentidos e todas as falas de Flávio de Carvalho podem ser experienciadas na carne. Sem julgamentos, sem preconceitos, sem limitações. O espaço da casa traz inserido nele a vida de seu proprietário e de seus familiares, que ali viveram por tempo longo ou curto e construíram um espaço com usos e significados próprios. Abrange também as teias extra familiares composta de amigos, vizinhos, negócios e empregados. Seus hábitos culturais e intelectuais, alimentares e de higiene, religioso e de lazer formando um conjunto de relações que servem de ponte entre o público e o privado. Assim podemos dizer que a casa articula o privado e o público, de acordo com o tempo ou interesse de seu proprietário. (Scarpeline 2012) Atualmente, a casa Capuava, isolada em um sítio encontra-se esquecida pela população valinhense, e mais ainda pela população brasileira como um todo. Esse esquecimento surge como um alerta de que algo deve mudar. A Casa Capuava deveria fazer parte da identidade de Valinhos e colaborar para o desenvolvimento de um sentimento de pertencimento da população. Por ser uma cidade-dormitório, Valinhos carece de laços de afeição entre indivíduo-cidade. Desta forma, o envolvimento da população com a arquitetura da cidade, principalmente o patrimônio faz-se essencial, para que este se torne parte da memória coletiva e assim, seja de fato preservado: “a participação da população é o ponto essencial para que essa política tenha êxito com o tempo. Só se conserva aquilo que se utiliza, e os novos usos dos espaços asseguram a continuidade de respostas adequadas às novas necessidades, dentro da evolução da cidade” (10). A população precisa e deve ser integrada na discussão da preservação para que a mesma construa uma identidade com o patrimônio cultural e conseqüentemente se torne aliada dos gestores na proteção e na vigia dos bens.(TRENTIN 2005 e GUTIRÉRREZ 1989) Com a expansão de Valinhos principalmente no sentido Campinas - onde a casa Capuava está localizada - a urbanização está cada vez mais nas margens da residência do artista, sufocando-a e ameaçando-a. Tendo isso em vista e a necessidade de envolver a população de modo a criar uma afeição pelo espaço, faz-se necessário pensar no reuso adaptivo da casa. Além disso, como a casa de um arquiteto moderno importante nacionalmente,é pertinente pensar no espaço da casa também como um espaço de educar a respeito do artista. Assim, propõe-se neste trabalho uma possibilidade, considerada apropriada, para a antiga Casa de Flávio de Carvalho: Uma Casa-Museu. “a casa museu se propõe a reconstruir um cenário permanente, montado para dar veracidade á biografia de seu proprietário

61


através da experiência de morar, mostrando aos visitantes o “jeito de vivenciar” um determinado modo de vida, dando assim materialidade à memória” (SCARPELINE 2012) Para além de desempenhar um papel de reconstrução histórica - mesmo que não totalmente fiel -, traz o papel de funcionar como elemento chave na construção de uma identidade coletiva e também para homenagear e expressar o valor de um importante artista nacional. A reconstrução de uma vivência nunca é totalmente verídica, mas sim uma interpretação, uma eleição e exposição de elementos específicos que tentam exprimir uma forma de vida. Entretanto, como afirmava o próprio Flávio de Carvalho “o valor da época não é perceptivo dentro da época porque não há ponto de vista, não há contraste, falta comparação, e sem contraste não pode haver julgamento” (CARVALHO 1936). Atualmente, a decoração restante da casa trata-se apenas do mobiliário fixo, tais quais lareiras, algumas bases de cama, banheiras, prateleiras e armários embutidos. Os móveis soltos como poltronas, redes, mesas, aparadores, decorações de parede quase todos não se encontram mais na casa, então a reelaboração dos espaços deveria partir de uma interpretação de fotografias antigas e escritos. Da mesma forma os jardins do entorno imediato encontram-se muito descaracterizados, mas ainda possuem resquícios que permitem uma reconstrução daquilo que já foi. A reconstrução dos espaços e jardins seria pensada de modo a dar conta de expressar a excêntrica vivência de Flávio de Carvalho. A casa-museu essencialmente deve refletir os modos de vida de Flávio de Carvalho, o uso dos ambientes, a forma despojada com que ele dispunha o mobiliário e decoração. Deve também manifestar sua forma de viver carregada de liberdade e arte. É interessante notar também que a proposição de casa-museu dialoga incessantemente com o tema de In-Between também trazido neste trabalho: A casa, o espaço de máxima intimidade e privacidade e o museu, o espaço de máxima exposição. Há nisso um contraste, uma tentativa de harmonizar elementos de diferentes naturezas, uma comunicação constante entre o público e o privado: “as Casas-Museu (...) mesclam o íntimo com o coletivo público, saem da esfera privada para entrar em um espaço de compartilhamento social das suas vivências e memórias pessoais. (AFONSO, 2015) O espaço da casa, como “local de nossas delícias e servidões, de nossos conflitos e sonhos; o centro, talvez provisório, de nossa vida” (PERROT, 2012, p. 7) é o mais íntimo, aquele que expressa toda a essência do morador. Diferentemente da Vila Modernista que expressava Flávio de Carvalho como arquiteto mais como arquiteto do que morador a Casa Capuava é o próprio artista encarnado nas paredes, portas e na decoração. [...] deverá refletir a vivência de determinada pessoa que, de alguma forma, se distinguiu dos seus contemporâneos, devendo

62


este espaço preservar, o mais fielmente possível, a forma original da casa, os objetos e o ambiente em que o patrono viveu, ou no qual decorreu qualquer acontecimento de relevância, nacional ou local, e que justificou a criação desta unidade museológica (PONTE 2007). CONCLUSÕES Por fim, é possível concluir reafirmando uma considerável exclusão de Flávio de Carvalho da historiografia - especialmente da arquitetura moderna - ao mesmo tempo em que se busca, neste trabalho, expressar o valor e unicidade de sua obra e também de sua personalidade. A preocupação em explorar os In-betweens nas obras do arquiteto, especialmente nos projetos que foram construídos, faz-se essencial para levantar a riqueza projetual, arquitetônica e artística constantemente expressa em seus trabalhos. Na Casa Capuava as varandas e a piscina, por exemplo, foram lugares importantes e peculiares da vivência da residência ao mesmo tempo que são, ainda, lugares significativos da relação estabelecida pela casa com a paisagem. Torna-se assim, fundamental, compreender os valores intrínsecos desses espaços e reconhecer neles, espaços reveladores da importância de se preservar o entorno da casa livre de edificações, o qual atualmente encontra-se ameaçado pelos condomínios horizontais fechados. Além disso, a investigação dos espaços de transição proporciona afirmar um diálogo constante do arquiteto com a arquitetura moderna internacional e nacional, apesar do artista por vezes extrapolar os limites do moderno com a sua linguagem própria. Esse anseio por aproximar constantemente o artista do movimento moderno brasileiro é também uma forma de reivindicar o espaço de Flávio de Carvalho na história da arquitetura moderna brasileira. Está também expresso neste trabalho uma inquietação a respeito do tratamento do patrimônio histórico no Brasil à luz do que ocorreu na Vila Modernista e do que vêm ocorrendo na Casa Capuava apesar desta ser oficialmente ser um patrimônio. A falta de atenção e de olhar para a história é muitas vezes inconsequente e traz perdas irrecuperáveis. A casa de Flávio de Carvalho e a área remanescente da Fazenda Capuava são parte da história nacional, da cultura brasileira e da história da arquitetura moderna. Diante disso, esse trabalho manifesta uma forma de resistência ao mercado imobiliário e uma proposição para a casa de um importante artista modernista em Valinhos visando não apenas o seu restauro, mas a sua integração na vida da população valinhense e brasileira.

63


ANEXOS 01 BIBLIOGRAFIA 02 LISTA DE FIGURAS 03 PAINÉIS-SÍNTESE 04 INSERÇÃO URBANA ATUAL CASA CAPUAVA 05 REDESENHO DE PLANTAS CASA CAPUAVA 06 MODELAÇÃO 3D E MAQUETE DA CASA CAPUAVA 07 FOTOGRAFIAS CASA CAPUAVA 08 LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO CASA CAPUAVA 09 FOTOGRAFIAS VILA MODERNISTA

FIGURA 42: Flávio de Carv

64


valho no desfile com a ExperiĂŞncia nĂşmero 3

65


01 BIBLIOGRAFIA AFONSO, Micheli Martins. Uma abordagem brasileira sobre a temática das Casas-Museu: classificação e conservação. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Memória Social e Patrimônio Cultural do Instituo de Ciências Humanas da Universidade Federal de Pelotas como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Memória Social e Patrimônio Cultural. Pelotas, 2015. AZALBEASCOA, Anatxu. Tudo sobre a casa . São Paulo: Editora G. Gili, 2014. BALSINI, André. Espaços de transição: entre a arquitetura e a cidade . São Paulo, 2014. BENEVOLO, Leonardo. História da Arquitetura Moderna. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1976. BRUAND, YVES. Arquitetura contemporânea no Brasil . 2. Ed. São Paulo: Perspectiva, 1991. BUZZAR, Miguel Antonio . João Batista Vilanova Artigas: elementos para a compreensão de um caminho da arquitetura brasileira, 1938-1967. Editora UNESP, 2014 . CARVALHO, F. de. A casa do homem do século XX.(27 de jan. de 1938) in. COHEN, Jean-Louis. O futuro da arquitetura desde 1889: uma história mundial. São Paulo: Cosac Naify, 2013. FRAMPTON, Peter. História Crítica da Arquitetura Moderna . São Paulo: Martins Fontes, 1997. LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. Arquitetura Brasileira . São Paulo: Melhoramentos, 1979. LINO, Sulamita Fonseca. A paleta formal construtiva de Flávio de Carvalho: Arquitetura elaborada como objeto artístico. Atas do I Encontro de História da Arte - Revisão Historiográfica: O Estado da Questão - 2005 LIRA, José Tavares Correia de; NASCIMENTO, Flávia Brito do; SILVA, Joana Mello deCarvalho e; RUBINO. Silvana Barbosa. Domesticidade, Gênero e Cultura Material . 5. ed.São Paulo: EDUSP, 2017. MARTINS, Carlos Alberto Ferreira. Arquitetura e metrópole: alguns elementos para a caracterização do contexto arquitetônico em São Paulo, anos 40 e 50 . II Seminário Docomomo Brasil. Anais. Salvador, 1997. MINDLIN, Henrique. Arquitetura Moderna no Brasil. Aeroplano, Iphan, Ministério da Cultura, Rio de Janeiro; 2ª edição, 2000. MOUCH, Donald L. Magnifying the Interstice: exploring the dialogue between architecture’s in-betweens. 2009. Tese de Doutorado. University of Cincinnati. PEIXOTO, Marta Silveira Peixoto. A sala bem temperada – Interior moderno e sensibilidade eclética. Tese de doutoramento apresentada para a obtenção do título de doutora em arquitetura. Porto Alegre, 2006.

66


PIGNATON, Clara. Flávio de Carvalho: fragmentos sobre a forma e o tempo . Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do título de Doutora em Arquitetura em Urbanismo. Salvador, 2016 POLIZZO, Ana Paula. Paisagem, Arquitetura, Cidade Uma discussão acerca da produção do espaço moderno. (Tese Doutorado em História Social da Cultura). Rio de Janeiro:Departamento de História – PUC, 2016. RICE, Charles. The Emergence of the Interior . Architecture, Modernity, Domesticity. New York: Routledge, 2007. ROSSETTI, Carolina Pierrotti. Flávio de Carvalho: Questões de Arquitetura e Urbanismo. Dissetação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Mestre em Arquitetura. São Carlos, 2007. RYBCZYNSKI, Witold. Casa: Pequena História de uma Idéia . São Paulo: Editora Record, 2002. SAIA, Luís. Morada Paulista . São Paulo: Editora Perspectiva, 2005. SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900 – 1990 . São Paulo: Edusp, 2ª edição, 1999. SCARPELINE, Rosaelena. Lugar de morada versus lugar de memória: a construção museológica de uma Casa Museu. Revista Musear, n. 1, p. 77-91, 2012. SILVA, Joana Mello de Carvalho. O avesso da arquitetura moderna: domesticidade e formas de morar na habitação privada brasileira 1930-1960. Pós Doutorado. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH)da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Campinas, 2013. SOUZA, Rodrigo. A fazenda Capuava em Valinhos: Estudo de Caso da Evolução Urbana. Campinas, 2010 SPARKE, Penny. The modern interior. Londres: Reaktin Books Ltd, 2008 STEVOLO, Pedro. A Casa Modernista de Flávio de Carvalho: Arte, Política e um Território de Disputa? São Paulo: Revista CPC, 2016. STIGGER, Veronica. Flávio de Carvalho: arqueologia e contemporaneidade. Revista Celeuma, n. 4, p. 44-56, 2014. TRAMONTANO, Marcelo. Habitação Moderna: a construção de um conceito . São Carlos: EESC USP, 2011. WORKMAN, Vivian Ann. Mutualism in Architecture: An Architecture of the In-Between. 2004. XAVIER, Alberto. Depoimento de uma geração- arquitetura moderna brasileira. Edição revista e ampliada. São Paulo: Cosac & Naify, 2993, p.52-55

67


02 LISTA DE FIGURAS FIGURA CAPA: Fotografia da autora FIGURA 01 _Flávio de Carvalho - Fonte: http://www.valinhos.sp.gov.br/noticias/espaco-cultural-multiuso-recebe-o-nome-do-artista-flavio-de-carvalho FIGURA 02_Linha do tempo - Imagem produzida pela Autora FIGURA 03_Viaduto do chá 1920 - Fonte: http://smul.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/1920.php FIGURA 04_São Paulo 1920 - Fonte: http://spantiga.folha.com.br/foto_1.html FIGURA 05_Experiência número 3 - Fonte: http://www.nasentrelinhas.com.br/noticias/costurando-ideias/349/o-new-look-de-flavio-de-carvalho/ FIGURA 06_Concurso Palácio do Governo de São Paulo - Fonte: ROSSETI, 2007, p.212 FIGURA 07_Projeto para Universidade de Belo Horizonte - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.227 FIGURA 08_Projeto para Palácio do Congresso do Estado de São Paulo - Fonte: ROSSETTI, 2007, p. 230 FIGURA 09_Implantação Vila Modernista - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.270 FIGURA 10_Folheto Vila Modernisa - Fonte: http://www.saopauloantiga.com.br/a-vila-modernista-esquecida/ FIGURA 11 _Casa Capuava - Fonte: https://www.archdaily.com.br/br/913591/do-ladrilho-hidraulico-ao-aluminio-a-irreverencia-de-flavio-de-carvalho-no-brasil-moderno/5c92772f284dd14c82000770-do-ladrilho-hidraulico-ao-aluminio-a-irreverencia-de-flavio-de-carvalho-no-brasil-moderno-foto?next_project=no FIGURA 12_Implantação Casa de Flávio de Carvalho - Fonte: Google Maps 2019 FIGURA 13_Isométrica Casa Capuava - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.302 FIGURA 14_Análise da Planta da Casa Capuava - Imagem produzida pela autora FIGURA 15_Planta da Casa e da Piscina - Imagem produzida pela autora FIGURA 16_Projetode edifício de apartamentos para Universidade Internacional de música, artes plásticas e cênicas em Guaratinguetá, 1955: ROSSETTI, 2007, p.245 FIGURA 17_Projeto do Paço Municipal de São Paulo: ROSSETTI, 2007, p.239 FIGURA 18_Projeto para Alojamento de estudantes e Museu para Universidade Internacional de música, artes plásticas e cênicas em Guaratinguetá, 1955: ROSSETTI, 2007,

68


p.247 FIGURA 19_Ensaio de Coro e Residência tipo para Universidade Internacional de música, artes plásticas e cênicas em Guaratinguetá, 1955 - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.245 FIGURA 20 _Projeto da Igreja para Universidade Internacional de música, artes plásticas e cênicas em Guaratinguetá, 1955 - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.248 FIGURA 21_Painel Projeto Palácio do Governo do Estado de São Paulo - Fonte: ROSSETTI, 2007, P.211 FIGURA 22_Painel Projeto Palácio do Governo do Estado de São Paulo - Fonte: ROSSETTI, 2007, P.211 FIGURA 23_Pisos cerâmicos desenhados para o Farol de Colombo da República Dominicana - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.225 FIGURA 24_ Farol de Colombo da República Dominicana - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.218 FIGURA 25_ Perspectiva do Museu do Farol de Colombo da República Dominicana - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.224 FIGURA 26_ Perspectiva do Hall de Festas do Farol de Colombo da República Dominicana - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.223 FIGURA 27_Paineis para o Farol de Colombo da República Dominicana - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.221 FIGURA 28 _Isométrica Vila Modernista - Fonte: http://44arquitetura.com.br/2015/07/um-tesouro-arquitetonico-abandonado/ com alterações da autora FIGURA 29_Fotografia Vila Modernista - Fonte: https://vejasp.abril.com.br/blog/memoria/ casas-modernistas-jardins-flavio-de-carvalho/ FIGURA 30_ Fotografia Casas da Vila Modernista com as paredes com reboco trabalhado - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.279 FIGURA 31 _Análise Volumétrica de uma das casas - Imagem produzida pela autora FIGURA 32_Conjunto de Ladrilhos hidráulicos desenhados por Flávio de Carvalho para a Vila Modernista - Fonte: https://www.archdaily.com.br/br/913591/do-ladrilho-hidraulico-ao-aluminio-a-irreverencia-de-flavio-de-carvalho-no-brasil-moderno/5c9276dc284dd14c8200076c-do-ladrilho-hidraulico-ao-aluminio-a-irreverencia-de-flavio-de-carvalho-no-brasil-moderno-imagem FIGURA 33_Fotografia Casa Capuava - Fonte: http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2016/07/ong-acesa-faz-arraial-beneficente-na-fazenda-capuava-em-valinhos-sp.html FIGURA 34_Desenho da Casa Capuava - Fonte: https://i0.wp.com/cartacampinas.com.br/ wp-content/uploads/capuava.jpg

69


FIGURA 35_Análise das relações Interior x Exterior em Planta - Imagem produzida pela autora FIGURA 36_Fotografia da Varanda, 2019 - Fotografia tirada pela autora FIGURA 37_Fotografia do Pátio, 2019 - Fotografia tirada pela autora FIGURA 38_Fotografia do salão principal e suas texturas e cores - Fonte: https://www.nelsonkon.com.br/en/casa-da-fazenda-capuava/ FIGURA 39_Fotografia Lareira - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.310 FIGURA 40_Fotografia da casa em uso - Fonte: ROSSETTI, 2007, p.310 FIGURA 41_Fotografia Cozinha - Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho FIGURA 41_Flávio de Carvalho desfilando com a Experiência número 3 - Fonte: https:// aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/galeria/foto-historia-flavio-de-carvalho-saia-masculina-brasil-moda.phtml

70


71


03 PAINEIS-SÍNTESE

Fonte imagens: ROSSETTI 2007 e http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9016/flavio-de-carvalho

Paineis criados visando sintetizar a essência artística, arquitetônica e a personalidade de Flávio de Carvalho.

72


73


74

Fonte imagens: ROSSETTI 2007 e http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9016/flavio-de-carvalho


75


76

Fonte imagens: ROSSETTI 2007, http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9016/flavio-de-carvalho e fotografias da autora


77


04 INSERÇÃO URBANA ATUAL

Levantamentos cartográficos mostrando a situação atual da Casa de Flávio de Carvalho e da área remanescente da Fazenda Capuava.

Imagem do Google Earth mostrando a inserção da Casa de Flávio de Carvalho no tecido urbano. É perceptível que a área remanescente da fazenda já está cercada por uma intensa urbanização. Fonte: Google Maps

Imagens Produzidas pela autora.

A a área contempla diversos corpos d’água, O Corpo d’água mais a norte está intra-muros do condomínio Terras do Caribe, mas o córrego que se estende para dentro da fazenda está ainda na área da fazenda.

78

O relevo da área remanescente da fazenda é acidentado e está diretamente ligado à forma como a casa foi implantada.


É visível que a área do entorno da fazenda é composta especialmente por uma ocupação residencial.

Como é perceptível a Casa Flávio de Carvalho fica em um grande espaço livre, com floresta remanescente. A paisagem verde é integrante do interior da casa, como manifestado neste trabalho.

A área remanescente da fazenda está cercada por muros de condomínios horizontais fechados e cada vez mais os condomínios se aproximam da casa, invadindo suas paisagens verdes e sufocando os limites da casa.

79


05

REDESENHO DE PLANTAS Redesenho de plantas da Casa Capuava

CAS

A

EQU

EST

ITAÇ

ÃO

CAS

A

ÁBU

A.C.E

.S.A

EQU

ITA

ÇÃO

LOS

CASA CARV FLÁVIO DE ALHO

CAS

A

Implantação Casa Capuava Image produzida pela autora

80


Casa Capuava e Piscina Image produzida pela autora

81


Planta Casa Capuava Image produzida pela autora

82


83


Planta Cobertura Casa Capuava Image produzida pela autora

84


85


Ao visitar a casa é possível reparar na existência de muitos cactos dispersos pelos jardins que contornam a casa. Apesar de não saber a data de plantio, é certo que no projeto original de Flávio de Carvalho havia a presença de muitos cactos e coqueiros. Fotografias da Autora

86


COQUEIRAL

CACTOS Jardim nos terraços

POMAR ATRÁS DA CASA Reconstrução aproximada do Jardim a partir de fotografias antigas e Remanescência de determinadas plantas na área Imagem produzida pela autora

87


06 MODELAÇÃO 3D E MAQUETE

Imagens produzidas pela autora

Imagens da modelação 3d da Casa Capuava e seu entorno imediato e fotografias da maquete de estudo da casa e da sua inserção urbana

88


89


D

A

A

B

B

C

C D

90


CORTE AA

CORTE BB

CORTE CC

CORTE DD

91


Maquete de inserção urbana e relevo Image e Maquete produzidas pela autora

Maquete de estudo Image e Maquete produzidas pela autora

92


Maquete de estudo Image e Maquete produzidas pela autora

Maquete de estudo Image e Maquete produzidas pela autora

93


Fonte: https://i.pinimg.com/originals/7f/ca/3c/7fca3c4ecacbf679e5fba1b1a442a103.jpg

07

94

FOTOGRAFIAS CASA CAPUAVA

Fotografias antigas mostrando o uso da casa, a decoração e os espaços mais bem conservados


95

Fonte:ROSSETTI 2007

Fonte:ROSSETTI 2007

Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho

Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho


96

Fonte: ROSSETTI 2007

Fonte: ROSSETTI 2007


97

Fonte: ROSSETTI 2007

Fonte: ROSSETTI 2007 Fonte: ROSSETTI 2007


98

Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho

Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho

Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho


99

Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho

Fonte: https://www.arquivo.arq.br/residencia-flavio-de-carvalho


08 LEVANTAMENTO FOTOGRĂ FICO

Levantamento realizado pela autora na Casa Capuava em Setembro de 2019

100


101


ENTORNO IMEDIATO DA CASA

Vista da equitação e da rua que liga à Casa Capuava

Equitação em frente à Casa Capuava

102


Vista da Casa Capuava à esquerda e de outra casa da fazenda ao fundo

A.C.E.S.A. à esquerda e espaço com horta nas proximidades da piscina

103


O IN-BETEWEN: ENTRE CASA E PAISAGEM

Fotografias que mostram as aberturas generosas da Casa Capuava e a integração constante entre interior e exterior.

Vista de um dos dormitórios

Vista de dentro da biblioteca para a varanda

Vista de um dos dormitórios. A fotografia mostra também a estrutura fixa da cama.

104

Vista da varanda para o jardim


Vistas das varandas expressando a integração entre paisagem e arquitetura

Vista da varanda

105


O IN-BETEWEN: ENTRE CASA E PAISAGEM

Vista da casa a partir da piscina

Piscina e coqueiral

106


Estrutura que aparenta ser antigo depósito próximo à piscina

Estrutura que aparenta ser antigo depósito e “palquinho” próximo à piscina

Fundo da casa com espaço para fogueira

Banco de pedra no lado externo da casa

107


ESPAÇO INTERNO DA CASA E SITUAÇÃO DE CONSERVAÇÃO

108


109


110

Fonte: ROSSETTI 2007

Fonte: ROSSETTI 2007

Fonte: ROSSETTI 2007

Fonte: ROSSETTI 2007

09 FOTOGRAFIAS E IMAGENS VILA MODERNISTA


111

Fonte: ROSSETTI 2007

Fonte: ROSSETTI 2007

Fonte: ROSSETTI 2007


Fonte: ROSSETTI 2007

112

Página retirada da dissertação “Flávio de Carvalho: Questões de arquitetura e urbanismo”


113


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.