MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA
PETIÇÃO Nº 10.405/DF –AUTOS FÍSICOS E SIGILOSOS
RELATOR : MINISTROALEXANDRE DE MORAES
REQUERENTE : SOB SIGILO
REQUERIDO : SOB SIGILO
PETIÇÃOGABSUB48-LMANº 374308/2023
Excelentíssimo Senhor Ministro Relator,
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Vice-Procuradora-Geral da República, no exercício de suas funções constitucionais e legais, vem à presença de Vossa Excelência, respeitosamente, expor e requerer o que segue, em atenção à decisão prolatada aos 20 de abril de 2023 (fls. 2.087/2.101), que determinou: (1) o compartilhamento integral dos autos com o Inquérito nº 4.923/DF, mantendo-os em anexo sigiloso àquele, de modo que a efetiva remessa de cópias será feita oportunamente, após a análise das medidas cautelares; e (2) a abertura de vista à Procuradoria-Geral da República, para se manifestar quanto aos pedidos de busca e apreensão e de prisão preventiva, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.

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Trata-se de representação oferecida pela Polícia Federal: (i) pela busca e apreensão, a ser realizada concomitantemente com diligências policiais – nisso, incluída a autorização de acesso imediato e de exploração do conteúdo dos aparelhos celulares e daqueles armazenados “em nuvens” –, em desfavor de JAIR MESSIAS BOLSONARO, MICHELLE DE PAULA FIRMO

REINALDO BOLSONARO, MAURO CESAR BARBOSA CID, GABRIELA
SANTIAGO RIBEIRO CID, LUIS MARCOS DOS REIS, FARLEY VINICIUS
ALCANTARA, EDUARDO CRESPO ALVES, AILTON GONÇALVES
MORAES BARROS, JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, MAX
GUILHERME MACHADO DE MOURA, SERGIO ROCHA CORDEIRO, MARCELO COSTA CAMARA, CLAUDIA HELENA ACOSTA RODRIGUES
DA SILVA, MARCELO FERNANDES DE HOLANDA, MARCELLO MORAES
SICILIANO, CAMILA PAULINO ALVES SOARES e GUTEMBERG REIS DE OLIVEIRA; e (ii) para que seja decretada a prisão preventiva de MAURO
CESAR BARBOSA CID, LUIS MARCOS DOS REIS, AILTON GONÇALVES
MORAES BARROS, JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, MAX
GUILHERME MACHADO DE MOURA e SERGIO ROCHA CORDEIRO.
A presente Petição foi autuada a partir dos relatórios de análise do material colhido por força da quebra de sigilo telemático dos dados armazenados em nuvem das empresas Google (Google Drive) e Apple (Icloud),
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em poder de MAURO CESAR BARBOSA CID, consoante determinada nos autos do Inquérito nº 4.878/DF1, no dia 2 de maio de 2022.
A isso sucederam diversas medidas cautelares de afastamento dos sigilos bancário, fiscal, telemático e de dados de inúmeras pessoas físicas e jurídicas, culminando com o encaminhamento do Relatório de Análise Parcial nº 049/2022 (fls. 1.700/1.755), em que a Polícia Federal apontou para a possível prática de ilícitos pelo então Chefe da Ajudância de Ordens do ex-Presidente da República MAURO CESAR BARBOSA CID, pelo, à época, integrante da Ajudância de Ordens SGT LUIS MARCOS DOS REIS, pelo médico FARLEY
VINICIUS ALCANTARA, pelo militar EDUARDO CRESPO ALVES e pelo advogado e ex-militar AILTON GONÇALVES MORAES BARROS, supostamente com o objetivo de inserir dados falsos de doses de vacina contra a Covid-19, em nome de GABRIELA SANTIAGO CID, esposa de MAURO CID, no sistema do Ministério da Saúde (ConecteSUS) e de confeccionar cartões de vacinação físicos, contendo dados falsos sobre doses de vacina, também em nome daquela.
1 O objeto do Inquérito nº 4.878/DF é a apuração de supostas condutas do então Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO, do Deputado Federal FILIPE BARROS e do Delegado de Polícia Federal VICTOR NEVES FEITOSA CAMPOS, relacionadas à divulgação de dados de inquérito sigiloso da Polícia Federal, por meio de perfis nas redes sociais, com o objetivo de expandir a narrativa de fraude no processo eleitoral, atribuindo caráter duvidoso à lisura do sistema de votação no Brasil.

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Com base em representação da Polícia Federal fundamentada em tais informações (fls. 1.757/1.781), no dia 26 de janeiro de 2023, foram deferidas novas medidas cautelares de quebra de sigilo de dados telemáticos, para o acesso ao conteúdo de dados armazenados em nuvem (cloud storage), aos extratos telefônicos e de Estação Rádio Base (ERB), bem como aos dados constantes em sistemas e bases de dados do Ministério da Saúde (fls. 1.783/1.809).

Em seguida, a Polícia Federal atravessou manifestação, remetendo notícia de fato oriunda da Controladoria-Geral da União (CGU), relatando a possível ocorrência de inserção de dados falsos no sistema de informação do Ministério da Saúde sobre vacinação contra a Covid-19, em nome do exPresidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO (Ofício nº 681717/2023 – fls. 1.830/1.854).
No que pertine a estes autos, os elementos coligidos foram objeto dos Relatórios de Análise de Polícia Judiciária nº 1205992/2023 (fls. 1.891/1.910) e 1205994/2023 (fls. 1.911/1.964), bem como ensejaram a instauração do Registro Especial (RE) nº 2023.0004076 (fls. 1.965/ 1.971), servindo de base para a presente representação policial (Ofício nº 1365408/2023 – fls. 1.972/2.085), que aponta a existência de indícios de um complexo esquema de inserção de declaração falsa de vacinação contra a Covid-19, em documento público
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(carteira de vacinação emitida por Secretarias de Saúde) (artigo 299 do Código Penal), de inserção destes dados falsos nos sistemas de informação do Ministério da Saúde (artigo 313-A do Código Penal) e, eventualmente, do uso dos documentos ideologicamente contrafeitos (artigo 304 c/c 299, ambos do Código Penal), envolvendo os alvos das cautelares requeridas.
Após, vieram os autos à Procuradoria-Geral da República, nos termos da decisão epigrafada. É
1 – PRELIMINAR DE IRRAZOABILIDADE DO PRAZO DE 24 HORAS PARA MANIFESTAÇÃO DO DOMINUSLITIS
Em primeiro lugar, saliente-se que a abertura de vista para manifestação no exíguo prazo de 24 (vinte e quatro) horas foi determinada à revelia dos preceitos constitucionais do devido processo legal material e do próprio sistema acusatório.
Não se ignora a possibilidade do estabelecimento de prazo judicial, quando a lei for omissa, levando-se em consideração a complexidade do ato
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(artigo 218, § 1o, do Código de Processo Civil2, c/c artigo 3o do Código de Processo Penal3) e, em situações excepcionalíssimas, a urgência do provimento jurisdicional. Inclusive, sem tais circunstâncias, o menor prazo para a prática de ato processual a cargo da parte seria o de 5 (cinco) dias (artigo 218, § 3º, do Código de Processo Civil4, c/c artigo 3o do Código de Processo Penal).
Isso, contudo, não autoriza o raciocínio diametralmente oposto, fixando-se prazo divorciado de disposições legais e/ou regimentais, em nítida desproporção com as peculiaridades dos autos, com o fim de incutir uma suposta inércia do Ministério Público em analisar o cabimento de medidas cautelares, relativamente a nada menos que 17 (dezessete) pessoas, supostamente envolvidas num emaranhado de fatos e de elementos oriundos de dezenas de cautelares pretéritas, compartilhamentos e providências afins.
2 – CONDUTAS DOS REPRESENTADOS: NÚCLEO ASSOCIATIVO DA
FALSIDADE IDEOLÓGICA, DO PECULATO ELETRÔNICO PARA
VIABILIZAR O USO DE DOCUMENTO FALSO
2 Art. 218. Os atos processuais serão realizados nos prazos prescritos em lei. § 1º Quando a lei for omissa, o juiz determinará os prazos em consideração à complexidade do ato.
3 Art. 3o A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como suplemento dos princípios gerais de direito.
4 Art. 218. (…) § 3o Inexistindo preceito legal ou prazo determinado pelo juiz, será de 5 (cinco) dias o prazo para a prática de ato processual a cargo da parte.

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De acordo com as apurações realizadas (RAPJ nº 049/2022), o CEL MAURO CESAR BARBOSA CID, então Chefe da Ajudância de Ordens da Presidência da República, solicitou ajuda do SGT LUIS MARCOS DOS REIS, integrante de sua equipe, para obter um cartão de vacinação ideologicamente falso em benefício da esposa do coronel, GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID.
O SGT LUIS MARCOS DOS REIS acionou seu sobrinho FARLEY VINICIUS ALCANTARA, médico, que conseguiu um cartão de vacinação da Secretaria de Saúde do Estado de Goiás do município de CABECEIRAS/GO em nome de GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID, carimbado e assinado por aquele profissional de saúde. Em seguida, o SGT LUIZ MARCOS DOS REIS transmitiu o arquivo em “PDF” - “CARTÃO ARQUIVO DE VACINAÇÃO” para o CEL MAURO CID em 22/11/2021, às 19h11, constando no documento que ela teria sido vacinada com duas doses do laboratório BIOTECH, respectivamente, em 17/08/2021 e 09/11/2021 nas Unidades Básicas de Saúde do município de Cabeceiras/GO.
Diligências realizadas com autorização judicial descortinaram que GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID não possui vacinas administradas nas Unidades Básicas de Saúde do município de Cabeceiras/GO, informação
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corroborada pelos extratos das estações de rádio base (ERBs), os quais revelam que o terminal telefônico da esposa do CEL MAURO CID (24-99261-4781)
somente foi utilizado em Brasília/DF nos dias indicados no cartão falsificado como de vacinação naquela cidade, em 17/08/2021 e 09/11/2021.
Visando conferir autenticidade ao conteúdo ideologicamente falso, o médico FARLEY VINICIUS ALCANTARA inseriu sua assinatura no cartão de vacinação com o carimbo e os dados de seu registro no CRM.
Esses elementos indicam que MAURO CESAR BARBOSA CID, LUIS MARCOS DOS REIS e FARLEY VINICIUS ALCANTARA, em unidade de desígnios, praticaram o delito de falsidade ideológica, ao inserirem declaração falsa de vacinação contra o COVID-19 em documento público em benefício de GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID, conduta tipificada no artigo 299 do Código Penal.
As investigações elucidaram que objetivo precípuo de MAURO CID era inserir os dados da vacinação no sistema ConecteSUS do Ministério da Saúde a fim de obter o certificado eletrônico de vacinação de sua esposa, GABRIELA CID, razão pela qual requisitou o auxílio do 2º SGT do Exército EDUARDO CRESPO ALVES com o qual manteve diálogos em aplicativo de mensagens entre os dias 22 e 24 de novembro de 2021 para tal desiderato.

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EDUARDO CRESPO ALVES disse a MAURO CID que não seria possível a inserção dos dados do cartão de vacinação de GABRIELA CID porque os lotes das vacinas indicadas no documento não foram distribuídas ao Estado do Rio de Janeiro, local em que se tentou lançar os dados da vacinação nos sistemas do Ministério da Saúde.
Nos dias 24 e 25 de novembro de 2021, o SGT LUIS MARCOS DOS
REIS e o CEL MAURO CID trocaram arquivos de imagem relativas aos prints das conversas entre o SGT e seu sobrinho, o médico FARLEY VINICIUS, cujo diálogo mostra a impossibilidade de inserção dos dados da vacinação no Rio de Janeiro, tendo em vista que o lote das vacinas supostamente aplicadas não foram enviadas para aquele Estado. Para superar o impedimento, o SGT LUIS
MARCOS DOS REIS solicitou ao médico FARLEY VINICIUS novo cartão de vacinação, desta feita em branco, emitido pela Secretaria de Saúde do Estado de Goiás, para permitir a inserção das informações de vacinação no Rio de Janeiro, conforme evidenciam os prints da conversa encaminhados ao CEL
MAURO CID:





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As mensagens trocadas entre LUIS MARCOS DOS REIS e FARLEY VINICIUS ALCANTARA evidenciam a consciência de que as informações falsas do cartão de vacinação de GABRIELA CID – emitido no Estado de Goiás – seriam lançados no ConecteSUS no Estado do Rio de Janeiro.
Esses elementos enunciam que MAURO CESAR CID, LUIS MARCOS DOS REIS, FARLEY VINICIUS ALCANTARA e EDUARDO
CRESPO se encontram em tese incursos no artigo 313-A c/c o artigo 14, inciso II5, na medida em que agiram em unidade de desígnios para inserir os dados falsos nos sistemas informativos do Ministério da Saúde (RNDS e SI-PNI), cuja tentativa só não se consumou porque os lotes de vacinas contra o COVID-19 que seriam inseridos nesses sistemas não foram distribuídos para o Rio de Janeiro, local onde se intentou perpetrar o delito de peculado eletrônico em benefício de GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID.
Frustrada a tentativa de inserção dos dados de vacinação nos
5 Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000))
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Art. 14 - Diz-se o crime:
II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.
Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.

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sistemas informativos do Ministério da Saúde pela via intentada pelo 2º SGT
EDUARDO CRESPO ALVES, MAURO CESAR CID solicitou o auxílio do advogado e militar da reserva AILTON GONÇALVES MORAES BARROS para essa finalidade em 29/11/2021, a partir de quando mantiveram diálogos frequentes.
As investigações retratadas no Relatório de Análise de Polícia

Judiciária nº 049/2022 desvendam que, entre 29/11/2021 e 30/11/2021, MARCELO FERNADES DE HOLANDA foi o responsável pela recuperação de acesso da senha de usuário e pelo respectivo acesso em nome de GABRIELA
SANTIAGO RIBEIRO CID ao ConecteSUS, a partir de endereço de IP a ele relacionado (Av. Chrisostomo Pimentel de Oliveira, 2183, casa 13, Pavuna –Rio de Janeiro). Todavia, os sinais de estação rádio-base indicaram que o terminal telefônico da beneficiária estava em um condomínio situado no bairro da Tijuca, distante cerca de 32 km do bairro da Pavuna.
MARCELO FERNADES DE HOLANDA, por sua vez, no período de recuperação da senha de acesso ao ConecteSUS e o ingresso no sistema, ligou 04 vezes para AILTON GONCALVES BARROS, que, na ocasião, estava no bairro de Bangu, 16 km de distância do local em que foi acessada a conta de GABRIELA CID.
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Restou apurado que a primeira e da segunda dose da vacina da Pfizer (lotes “FD7210” e “FG3530”) teriam sido aplicadas, respectivamente, em 25/08/2021 e em 15/10/2021 no posto médico sanitário de Xerém, localizado na cidade de Duque de Caxias/RJ, pela servidora CAMILA PAULINO ALVES
SOARES que inseriu nos sistemas de informação do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI) e da Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDs) no mesmo dia 30/11/2021 às 16h23 e às 16h24 – intervalo de 1 minuto – a informação de que ela própria administrou as duas doses da vacina do COVID-19 em GABRIELA CID em agosto e em outubro de 2021.
O êxito da empreitada delitiva foi ratificada a partir do envio da foto do cartão de vacinação físico com a logomarca do município de Duque de Caxias-RJ por AILTON BARROS a MAURO CID em 13/12/2021 via aplicativo de mensagens, que convergem com os dados lançados nos sistemas SI-PNI e RNDS do Ministério da Saúde, consoante se depreende da imagem trocada:

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Esses elementos descortinam que MAURO CESAR CID, AILTON GONÇALVES BARROS, com a participação de MARCELO FERNANDES DE HOLANDA, e CAMILA PAULINO ALVES SOARES conseguiram inserir dados falsos de vacinação contra COVID-19 nos bancos de dados do Ministério da Saúde, incidindo na conduta tipificada no artigo 313-A do Código Penal, bem como lançaram dados ideologicamente falsos na carteira de vacinação emitida pela Prefeitura de Duque de Caxias-RJ (documento público), tudo em benefício de GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID (CPF: 099.447.567-50), incorrendo na conduta tipificada no artigo 299 da Lei Penal.

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Segundo as mensagens trocadas entre AILTON BARROS e MAURO CID no dia 30/11/2021, o sucesso da “missão” contou com a intermediação de MARCELLO MORAES SICILIANO, ex-vereador do Rio de Janeiro/RJ, tendo como contrapartida que o ex-Chefe da Ajudância de Ordens ajudasse a resolver um problema dele com o visto de entrada nos Estados Unidos da América, ocorrido em decorrência do envolvimento de seu nome no caso do assassinato de MARIELLE FRANCO. Nessas mensagens, AILTON BARROS afirma saber quem foi o mandante do crime.

Após a inserção de dados falsos nos sistemas SI-PNI e RNDS do Ministério da Saúde e a falsificação de dois cartões de vacinação emitidos pela Secretaria de Saúde do Estado de Goiás e pelo município de Duque de CaxiasRJ, as informações oficiais contidas no controle imigratório brasileiro mostram que GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID saiu três vezes do território nacional com destino aos Estados Unidos da América em 30/12/2021, 09/04/2022 e 21/12/2022.
A Secretaria de Governo Digital relatou que o usuário GABRIELA
SANTIAGO CID acessou o ConecteSUS e emitiu o certificado de vacinação às 16h10 e às 16h21 do dia 30/12/2021, utilizando endereço de IP vinculado a seu irmão GILBERTO SANTIAGO RIBEIRO e, nesse mesmo dia embarcou para a
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cidade de Houston, no Estado do Texas, nos Estados Unidos pela UNITED AIRLINES, tudo confirmado pela triangulação das ERBs de GABRIELA CID, ao acionar a conexão de dados no endereço de seu irmão e no Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim (Galeão).
Em 09/04/2022, GABRIELA SANTIAGO CID realizou nova viagem para os Estados Unidos, agora para a cidade de Miami no Estado da Flórida, retornando no dia 21/04/2022, todos os trajetos realizados pela companhia COPA AIRLINES.
Outrossim, GABRIELA SANTIAGO CID viajou novamente em 21/12/2022 para os Estados Unidos da América pela GOL LINHAS AÉREAS com indícios de que ela tenha utilizado o cartão de vacinação falsificado, na medida em que consta seu acesso ao sistema ConecteSUS às 23h43 do dia 14/12/2022, mesmo dia em que emitiu o certificado de vacinação às 23h44, uma semana antes da viagem.
O cenário fático revela que GABRIELA SANTIAGO CID utilizou, em três oportunidades distintas, o certificado de vacinação ideologicamente falso necessário para entrar nos Estados Unidos da América, país que exigia, desde o ano de 2021, que os estrangeiros comprovassem a imunização contra o vírus da COVID, achando-se incursa nas iras do crime de uso de documento falso,
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por três vezes, conduta tipificada no artigo 304 c/c art. 299, ambos do Código Penal.
Conquanto a autoridade policial atribua a GABRIELA CID o crime de falsidade ideológica6, não há nenhum elemento indicativo de que ela tenha realizado ou participado da contrafação, mas há forte indícios de que se valeu do documento falsificado para sair do território nacional e ingressar em solo estrangeiro7, ao menos em três ocasiões distintas.
Ademais, a lista encaminhada pelo Ministério da Saúde revelou que MAURO CESAR BARBOSA CID e suas filhas BEATRIZ RIBEIRO CID, GIOVANA CID e ISABELA RIBEIRO CID teriam tomado as três doses da vacina contra o COVID-19 em 22/06/2021 (terça-feira), 08/09/2021 (quarta-feira) e 19/11/2021 (sexta-feira) no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias/ RS, sendo as primeiras duas da PFIZER e a terceira da JANSEN.

Ocorre que a quebra do sigilo temático de MAURO CID revela que
6 Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.
7 Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:
Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.
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ele, BEATRIZ RIBEIRO CID e GIOVANA RIBEIRO CID estavam nos dias 22/06/2021 e 08/09/2021 em Brasília-DF, onde residem, realizando atividades do cotidiano, não havendo referência de qualquer viagem para o Rio de Janeiro ou conversas sobre serem imunizados em Duque de Caxias-RJ.
Os dados telemáticos desnudam ainda conversa travada entre MAURO CID e sua cunhada LILIANE CID, no sentido de que “Eu não vou tomar vacina mesmo. Eu e ninguém aqui (sic) casa” (…) Eu não vou tomar….. nem as crianças….. As vacinas estão em fase de teste….. To fora…..”, indicando a postura contrária a vacinação contra a COVID-19.
A terceira dose da vacina contra a COVID-19 aplicadas em MAURO CID e suas filhas teriam sido igualmente administradas no dia 19/11/2021 no município de Duque de Caxias-RJ, mas seu terminal telefônico apenas registrou conexão entre as estações rádio base de Brasília-DF, de sorte a demonstrar que nem ele nem suas filhas estiveram naquela cidade da baixada fluminense.
De mais a mais, os dados relativos a todo o esquema de vacinação com três doses dos imunizantes contra a COVID-19 de MAURO CID e de suas filhas foram inseridos no sistema SI-PNI em 17/12/2022 por JOÃO CARLOS
DE SOUSA BRECHA, Secretário Municipal de Governo do Município de
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Duque de Caxias-RJ.
A partir dos dados constantes do Sistema de Tráfego Internacional –STI da Polícia Federal, apurou-se que ISABELA RIBEIRO CID e GIOVANA

RIBEIRO CID embarcaram com sua mãe GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO
CID, em 21/12/2022, no Aeroporto de Brasília com destino a Miami, no Estado da Flórida, nos Estados Unidos da América, regressando no dia 20/01/2023.
Todos os trajetos foram realizados pela GOL LINHAS AÉREAS. No dia anterior, 19/01/2023, MAURO CID retornou de Miami nos Estados Unidos com destino a Guarulhos.
Os dados encaminhados pelo Ministério da Saúde descortinam que os usuários GIOVANA RIBEIRO CID e ISABELA RIBEIRO CID emitiram seus certificados de vacinação contendo as três doses de vacina contra a COVID em 17/12/2022, respectivamente, às 13h18 e 15h08, no mesmo dia e algumas horas depois da inserção dos dados falsos no sistema SI-PNI pelo Secretário Municipal de Duque de Caxias JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, quatro dias antes de viajarem para os Estados Unidos.
Em 10/02/2023, MAURO CESAR BARBOSA CID, GABRIELA
SANTIAGO CID, ISABELA RIBEIRO CID e GIOVANA RIBEIRO CID embarcaram no Aeroporto de Guarulhos com destino a Bruxelas na Bélgica,
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com conexão em Madrid na Espanha, retornando no dia 23/02/2023 ao Brasil pelo mesmo aeroporto.
A Polícia Federal pontua que, de acordo com as regras sanitárias vigentes no período dos fatos investigados, o Estado brasileiro exige de brasileiros e estrangeiros como requisito de ingresso no país a apresentação de certificado de vacinação completa contra a COVID-19 ou comprovante de realização de RT-PCR, com resultado detectável para COVID-19, realizado um dia antes do embarque.

Nesse cenário, MAURO CESAR BARBOSA CID e GABRIELA
SANTIAGO RIBEIRO CID fizeram uso de certificado de vacinação falso nas viagens realizadas em dezembro/2022, em janeiro e fevereiro/2023, incidindo nas penas do artigo 304 c/c o artigo 299 do Código Penal.
MAURO CID e GABRIELA CID ainda sujeitaram, no exercício do poder familiar, as suas filhas menores ISABELA RIBEIRO CID (5 anos) e GIOVANA RIBEIRO CID (14 anos) a utilizarem certificados de vacinação ideologicamente falsos, o que lhes torna incurso nos crimes de uso de documento falso na condição de partícipes e de corrupção de menores, nos termos dos artigos 304 c/c o artigo 299 do Código Penal e 244-B da Lei nº 8.069/90.
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Vislumbra-se, portanto, a ocorrência de, ao menos, a prática dos crimes de associação criminosa (artigo 288 do Código Penal) por MAURO
CESAR BARBOSA CID, ex-Chefe da Ajudância da Presidência da República; LUIS MARCOS DOS REIS, um de seus auxiliares no exercício de seu mister;
FARLEY VINICIUS ALCANTARA, médico e sobrinho de LUIS MARCOS
DOS REIS; e EDUARDO CRESPO ALVES que tentou inserir os dados falsos nos sistemas do Ministério da Saúde para emissão de certificado de vacinação no ConecteSUS.
Com a dificuldade encontrada, a associação incorpora novo integrante, qual seja AILTON GONÇALVES MORAES BARROS, advogado e ex-militar, que finalmente obteve êxito na inserção de dados falsos no sistema SI-PNU e RNDS em nome de GABRIELA SANTIAGO CID, tendo argumentado que o sucesso da empreitada delitiva contou com a intermediação de MARCELLO MORAES SICILIANO, muito embora não haja nenhum elemento concreto de atuação desse indivíduo para o atingimento dos fins associativos.

A associação criminosa contou ainda com a atuação de MARCELO
FERNANDES OLIVEIRA, responsável pela recuperação da senha e do acesso ao ConecteSUS de GABRIELA SANTIAGO CID, e de CAMILA PAULINO
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ALVES SOARES, responsável pelos registros das inserções falsas no sistema de SI-PNI bem como pela emissão do cartão físico ideologicamente falso.
Esse cenário fático evidencia toda a estrutura criminosa engendrada para beneficiar GABRIELA SANTIAGO CID e incrementada ao longo dos intentos necessários para o cumprimento da finalidade almejada – emissão de certificado digital ideologicamente falso para permitir a realização de viagens internacionais –, protraindo-se no tempo com adesão de novos agentes que se associaram de forma estável, sólida e segura para a prática de crimes.
Além da associação criminosa, MAURO CESAR BARBOSA CID, LUIS MARCOS DOS REIS, AILTON GONÇALVES MORAES BARROS e JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA se acham incursos nos crimes de falsidade ideológica (artigo 299 do Código Penal) e peculato eletrônico (artigo 313-A do Código Penal).
Em relação a MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA CORDEIRO, assessores do ex-Presidente da República, consta que foram beneficiados pela inserção de dados falsos nos sistemas SIPNI do Ministério da Saúde promovida mais uma vez por JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA em 22/12/2022 e, com isso, puderam emitir seus certificados de vacinação ideologicamente falsos em português e em inglês antes de

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viagens internacionais, partindo do Brasil ou com retorno a ele, para viabilizar o cumprimento de regras sanitárias de entrada e saída dos territórios nacionais e estrangeiros.
Como se percebe, os elementos angariados na investigação desvelam que MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA acessou o aplicativo ConecteSUS e emitiu 03 certificados de vacinação contra o COVID-19 em datas distintas, ao passo que SÉRGIO ROCHA CORDEIRO também acessou o aplicativo e emitiu 05 certificados de vacinação contra a COVID-19, com o propósito de utilizá-los nas repartições migratórias do país de origem e de destino em atendimento as regras sanitárias em vigor à época das viagens pelas respectivas autoridades.
3 – NECESSIDADE DAS PRISÕES TEMPORÁRIAS
O cenário criminoso desenhado revela que a representação policial pela decretação da prisão preventiva não ostenta contemporaneidade, uma vez que os delitos foram praticados em sua maioria no ano passado quando os agentes envolvidos tinham o poder de influenciar e tumultuar as investigações, destruir provas e encobrir os ilícitos praticados em decorrência da estreita ligação mantida com o então Presidente da República.

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O uso de documento falso realizado após a contrafação e a inserção fraudulenta dos dados vacinais de MAURO CESAR BARBOSA CID, GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID, BEATRIZ RIBEIRO CID, GIOVANA CID, ISABELA RIBEIRO CID, MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA CORDEIRO nos sistemas SI-PNI e RNDS não justifica a prisão preventiva dos agentes envolvidos nos delitos de associação criminosa, peculato eletrônico e falsidade ideológica.
Todavia, no contexto examinado, a prisão temporária, medida cautelar penal de caráter pessoal e instrutório se revela necessária apenas em relação a MAURO CESAR BARBOSA CID, LUIS MARCOS DOS REIS, AILTON GONÇALVES MORAES BARROS e JOÃO CARLOS DE SOUSA
BRECHA, com vistas a assegurar o resultado útil da investigação criminal e, em última análise, da própria persecução penal em sua fase processual.
De acordo com a redação do art. 1º da Lei nº 7.960/1989, caberá a prisão temporária:
I – quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;

II – quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade;
III – quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:
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(…)
l) quadrilha ou bando (art. 288), (…) do Código Penal; (…)
Recentemente, ao julgar as Ações Diretas de Inconstitucionalidade n os 3360/DF e 4.109/DF, o Supremo Tribunal Federal julgou parcialmente procedentes os pedidos para dar ao art. 1º da Lei nº 7.960/1989 interpretação conforme a Constituição Federal, fixando o entendimento de que é autorizada a decretação de prisão temporária quando, cumulativamente:
(a) for imprescindível para as investigações – periculum libertatis (art. 1º, inciso I, da Lei nº 7.960/1989), constatada a partir de elementos concretos, e não meras conjecturas, vedada a sua utilização como prisão para averiguações, em violação ao direito à não autoincriminação, ou quando fundada no mero fato de o agente não possuir residência fixa (inciso II);
(b) houver fundadas razões de autoria ou participação nos crimes previstos no art. 1º, inciso III, da Lei nº 7.960/1989 (fumus comissi delicti), vedada a analogia ou a interpretação extensiva do rol previsto no dispositivo legal;
(c) for justificada em fatos novos ou contemporâneos que fundamentam a medida (art. 312, § 2º, do Código de Processo Penal);
(d) a medida for adequada à gravidade concreta do crime, às circunstâncias do fato e às condições pessoais do agente (art. 282, inciso II, do Código de Processo Penal);
(e) não for suficiente a imposição de medidas cautelares diversas, previstas nos arts. 319 e 320 do Código de Processo Penal (art. 282, § 6º, do Código de Processo Penal).

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Todos os requisitos estão presentes, sendo providência imperiosa a prisão temporária de MAURO CESAR BARBOSA CID, LUIS MARCOS DOS
REIS, AILTON GONÇALVES MORAES BARROS e JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA.
Conforme prova admitida na legislação penal, há fundados indícios de materialidade e autoria do crime permanente de associação criminosa, taxativamente enumerado no rol da Lei nº 7.960/1989 (fumus comissi delicti).
Não obstante a simples alteração do nomem iuris do tipo penal de “quadrilha ou bando” para “associação criminosa” com a edição da Lei nº 12.850/2013, o delito do art. 288 do Código Penal continua contido no rol taxativo da Lei nº 7.960/1989, cuja constitucionalidade do permissivo legal autorizativo da decretação de prisão temporária quando presentes fundados indícios da prática desse delito foi expressamente reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal que enfatizou cuidar-se “de opção do legislador, dentro do seu legítimo campo de conformação, com o escopo de conferir especial atenção a determinados crimes que em seu entender merecem maior necessidade de prevenção”8 .

A excepcionalidade da medida decorre da imprescindibilidade da custódia temporária para a apuração e da própria fase preliminar da
8 ADI 4109, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 14/02/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-075 DIVULG 20-04-2022 PUBLIC 22-04-2022
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persecução penal dos graves atos delituosos aparentemente em andamento, cuja prática sobressai dos elementos concretos existentes nos autos.
A estabilidade do vínculo associativo e a facilidade encontrada para fraudar sistemas destinados a armazenar dados para permitir a extração de certificados de vacinação, bem como para conseguir cartões falsos de vacinação sem que sequer o interessado tenha estado no local respectivo de aplicação, mostram a necessidade da custódia temporária para resguardar as evidências e identificar possível envolvimento de terceiros.
Somente com a prisão cautelar será possível, de um lado, paralisar os atos praticados pelos investigados, permitindo a apuração de suas condutas, e, de outro, ouvir terceiros que estão sendo arregimentados sem que sofram interferência ou coação do investigado, identificando-se, inclusive, a origem das possíveis fonte de financiamentos dos delitos.
Em liberdade, o investigado poderá encobrir os ilícitos e alterar a verdade sobre os fatos, sobretudo mediante coação a testemunhas e agentes arregimentados, ocultar documentos que revelem a ligação com terceiras pessoas constitutivas da associação criminosa e provas alusivas aos crimes investigados.

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No caso, há elementos de convicção que justificam, com segurança, a medida postulada pelo Ministério Público Federal, não sendo suficientes, neste momento, a imposição de cautelares diversas da prisão para a tutela de bens jurídicos tão caros à sociedade.
Tem-se como evidenciada a necessidade da custódia temporária, sabidamente menos gravosa do que a segregação preventiva, medida que, se for o caso, será postulada no momento adequado, balanceando devidamente os interesses do investigado e os anseios da persecução penal e da sociedade, sem sacrifício de um em detrimento do outro, com a menor onerosidade possível na limitação dos direitos fundamentais e na exata suficiência para resguardar os bens jurídicos penalmente tutelados.
À luz dos elementos apresentados, a decretação da prisão temporária é medida que se impõe a MAURO CESAR BARBOSA CID, LUIS MARCOS DOS REIS, AILTON GONÇALVES MORAES BARROS e JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, por integrarem associação criminosa para inserir informações falsas nos sistemas informatizados do Ministério da Saúde relacionado ao Programa Nacional de Imunização, bem ainda para lançar em cartões de vacinação dados inverídicos.

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De outra borda, não há evidência de liame associativo entre tais indivíduos e MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO
ROCHA CORDEIRO, cujos elementos angariados revelam apenas o uso de documento falso em três e cinco, respectivamente, ocasiões distintas, mostrando-se inviável o decreto de prisão temporária à falta dos pressupostos legais autorizativos constantes do artigo 1º, inciso I, II e III da Lei nº 7.960/1989.
Entretanto, pugna-se pela decretação de medidas cautelares diversas da prisão, qual seja a suspensão dos certificados de vacinação contra a COVID19 em nome de MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA CORDEIRO.
4 – JAIR MESSIAS BOLSONARO E MICHELLE DE PAULA FIRMO
REINALDO BOLSONARO: AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES PARA A
No que diz respeito ao ex-Presidente da República JAIR MESSIAS
BOLSONARO, partindo das informações remetidas pela CGU (Ofício nº
681717/2023 – fls. 1.830/1.854), a representação foi fundamentada na existência de indícios de inserção de dados falsos sobre vacinação contra a Covid-19, em
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nome daquele, considerando-se que: (i) no Sistema da Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS) constam os registros de que, no dia 13/08/2022, teria recebido a primeira dose da fabricante PFIZER-COMINARTY (lote PCA0084, profissional aplicador 704002319705268 – DIEGO DA SILVA PIRES), no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias/RJ e, no dia 14/10/2022, a segunda dose da mesma fabricante (lote FP7082, profissional aplicador
7000072511358036 – SILVANA DE OLIVEIRA PEREIRA), no mesmo estabelecimento; (ii) os dados de ambas as vacinas foram inseridos no sistema
SI-PNI apenas no dia 21/12/2022, em sequência, às 18h59min e às 19h00min, pelo operador JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, Secretário Municipal de Governo de Duque de Caxias/RJ; sendo que (iii) no dia 27/12/2022, foram excluídos do sistema pela operadora CLAUDIA HELENA ACOSTA RODRIGUES DA SILVA, por “ERRO”; (iv) a CGU teria colhido elementos de que JAIR BOLSONARO não esteve no Município de Duque de Caxias/RJ, no dia 13/08/2022, permanecendo no Rio de Janeiro/RJ até seu retorno para Brasília/DF, às 21h25min; e (v) também segundo a CGU, apesar de JAIR BOLSONARO ter comparecido a uma caminhada em Duque de Caxias/RJ, às 11h do dia 14/10/2022, não haveria nenhum indicativo que tenha comparecido a mencionada unidade municipal de saúde para se vacinar, mesmo porque teria embarcado para Belo Horizonte às 13h40min.
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Além disso, a representação tomou como base a relação de todas as inserções e exclusões realizadas por JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, nos anos 2021 e 2022, conforme documento encaminhado pelo Ministério da Saúde, do qual constou que: (i) LAURA FIRMO BOLSONARO, filha de JAIR
MESSIAS BOLSONARO, teria recebido a primeira dose da vacina contra a Covid-19, no dia 24/07/2022, da fabricante PFIZER-COMINARTY (lote FP0362), no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias/RJ e a segunda dose da mesma fabricante (lote FP7082), naquele mesmo estabelecimento, no dia 13/08/2022 – mesma data e local em que seu pai teria recebido a primeira dose; (ii) os dados de ambas as vacinas foram inseridos no sistema SI-PNI apenas no dia 21/12/2022, em sequência, às 18h59min e às 19h00min, pelo operador JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, Secretário Municipal de Governo de Duque de Caxias/RJ; sendo que (iii) no dia 27/12/2022, foram excluídos do sistema pela operadora CLAUDIA HELENA ACOSTA
RODRIGUES DA SILVA, por “ERRO”; (iv) pesquisas em fontes abertas não trouxeram elementos que indiquem que LAURA tenha acompanhado seu pai nos compromissos relacionados ao cargo presidencial, no dia 13/08/2022, no Rio de Janeiro/RJ, tampouco que tenha se deslocado até Duque de Caxias/RJ para se vacinar; (v) inexistem elementos que indiquem que LAURA tenha ido a Duque de Caxias/RJ, no dia 24/07/2022, mormente porque, à época, tinha 11 (onze) anos de idade, residia “obviamente”, com seus pais em Brasília/DF,
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“não fazendo qualquer sentido ter que se deslocar até o município de Duque de Caxias para se vacinar”; e (vi) publicações jornalísticas expuseram declarações do ex-Presidente da República JAIR BOLSONARO, nas quais foi contrário à vacinação de crianças e adolescentes e afirmou, de forma categórica, que não vacinaria sua filha.
Por fim, a Polícia Federal consignou que: (i) o Ministério da Saúde encaminhou os dados relacionados à emissão de certificados de vacinação contra a Covid-19 gerados por usuários associados a JAIR BOLSONARO e sua filha, por meio do aplicativo Conecte-SUS, nos dias 22/12/2022 às 8h (endereço de IP: 170.246.252.1019, porta lógica: 58750 e IP da rede interna: 10.79.40.86), 27/12/2022, às 14h19min (endereço de IP: 170.246.252.101, porta lógica: 37500 e IP da rede interna: 10.79.40.83), 30/12/2022 às 12h02min (endereço de IP: 187.25.42.110, porta lógica: 2659) e 14/03/2023 às 8h15min; (ii) bem como que a Secretaria de Governo digital informou que a conta do sistema “GOV.BR” de JAIR BOLSONARO, utilizada para acessar o aplicativo Conecte-SUS e gerar os certificados, tinha inicialmente o email de cadastro mauro.cid@presidencia.gov.br, associado à conta na data de 27/12/2021, pela Central de Atendimento do “GOV.BR”, tudo indicando que pertence a

9 Pertencente à Presidência da República, cadastrado no Palácio do Planalto.
10 Utilizado pelo terminal telefônico (24) 99264-3302, cadastrado em nome de MAURO CESAR BARBOSA CID.
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MAURO CESAR CID, e, posteriormente, na data de 22/12/2022, às 8h20min, teve alteração cadastral para o e-mail danmarcamara70@gmail.com (endereço de IP: 170.246.252.101), o que indica pertencer a MARCELO COSTA CAMARA, então Assessor Especial do Presidente da República JAIR BOLSONARO e nomeado aos 27/12/2022 para exercer o cargo de Assessor de ex-Presidente da República.
Como será adiante explicitado, o quadro fático-probatório delineado pela Polícia Federal não permite concluir pela existência de causa provável a legitimar e autorizar a realização de buscas e apreensões direcionadas ao exPresidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO e à sua esposa, MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO.

Os elementos de informação incorporados aos autos não servem como indícios minimamente consistentes para vincular o ex-Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO e a sua esposa, MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO, aos supostos fatos ilícitos descritos na representação da Polícia Federal, quer como coautores quer como partícipes.
Os indicativos existentes sinalizam que o investigado MAURO
CESAR BARBOSA CID teria se unido a outros agentes, em unidade de
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desígnios, para inserir dados falsos de vacinação contra a Covid-19 nos sistemas SI-PNI e RNDS do Ministério da Saúde, em benefício de JAIR
MESSIAS BOLSONARO e de sua filha LAURA FIRMO BOLSONARO, tal como reconhecido por essa Relatoria na decisão proferida na data de 26.02.2023:
Vislumbra-se, neste caso, que as infrações investigadas, notadamente a suposta inserção de dados falsos, por MAURO CID, em nome de GABRIELA SANTIAGO CID (sua esposa) e JAIR MESSIAS BOLSONARO (ex-Presidente da República, de quem era ajudante de ordens), no sistema do Ministério da Saúde (ConecteSus), estão profundamente relacionadas, de modo que a sua prova, ou ainda, suas circunstâncias elementares, influem diretamente na investigação conduzida neste SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (fls. 1.863/1.864).
Contudo, diversamente do enredo desenhado pela Polícia Federal, o que se extrai é que MAURO CESAR BARBOSA CID teria arquitetado e capitaneado toda a ação criminosa, à revelia, sem o conhecimento e sem a anuência do ex-Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO.
Não há lastro indiciário mínimo para sustentar o envolvimento do ex-Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO com os atos executórios de inserção de dados falsos referentes à vacinação nos sistemas do Ministério da Saúde e com o possível uso de documentos ideologicamente falsos.

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Alguns aspectos das investigações merecem ponderação.
Ao Presidente da República, ao seu cônjuge e aos seus dependentes conceder-se-á passaporte diplomático, de acordo com o disposto no artigo 6º do Decreto nº 5.978/200611
Cumpre pontuar que, de acordo com as exigências sanitárias vigentes para a entrada e a saída nos Estados Unidos da América, as pessoas em viagens diplomáticas ou oficiais de governos estrangeiros estavam incluídos na categoria de não cidadãos não imigrantes que atendiam aos critérios para uma exceção sob a Proclamação e a Ordem Alterada do Centers for Disease Control and Prevention (CDC). 12
Partindo dessa premissa, em tese, o ex-Presidente da República JAIR
MESSIAS BOLSONARO e a sua filha LAURA FIRMO BOLSONARO sequer teriam sido demandados a apresentar comprovantes de vacinação em viagens aos Estados Unidos da América.
11 Art. 6o Conceder-se-á passaporte diplomático:
I - ao Presidente da República, ao Vice-Presidente e aos ex-Presidentes da República; (…)
§ 1o A concessão de passaporte diplomático ao cônjuge, companheiro ou companheira e aos dependentes das pessoas indicadas neste artigo será regulada pelo Ministério das Relações Exteriores.
12 Disponível em: <https://br.usembassy.gov/covid-19-information/> e <https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/travelers/proof-of-vaccination.html>. Acesso em: 21 abr. 2023.

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Em outras palavras, a despeito da emissão de certificados de vacinação contra a Covid-19 por meio do aplicativo ConecteSUS, não há, no arcabouço informativo, nenhum indicativo de que, de fato, JAIR MESSIAS BOLSONARO orientou-se e atuou em benefício próprio ou de sua filha

LAURA FIRMO BOLSONARO, em relação a fatos e situações que necessitavam dos referidos comprovantes de vacinação.
Todas as informações levantadas convergem para a atuação apartada do ex-Chefe da Ajudância de Ordens da Presidência da República
MAURO CESAR BARBOSA CID, que, ao tempo dos fatos investigados, mantinha a gerência da conta do sistema “GOV.BR” de JAIR MESSIAS
BOLSONARO, utilizada para acessar o aplicativo do ConecteSUS. Tanto é assim que os acessos partiram de IPs cadastrados em nome do próprio MAURO CESAR BARBOSA CID ou no endereço do Palácio do Planalto, que lhe era de amplo acesso, por ser seu local de trabalho.
Some-se a isso serem de amplo conhecimento público as manifestações do ex-Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO acerca da sua convicção pessoal contrária à ampla e irrestrita vacinação contra a Covid-19, parte da ordinária concepção de mundo com que, concordando-se ou não, conquistou seu eleitorado.
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Não é demais repisar que o então Chefe do Poder Executivo Federal foi duramente criticado na esfera da política de saúde pública e, em razão de suas declarações, foi alvo de inúmeras investigações instauradas para apurar o suposto cometimento dos mais variados ilícitos penais (infração de medida sanitária preventiva, epidemia majorado por resultado morte, charlatanismo, incitação ao crime, emprego irregular de verbas públicas, prevaricação etc.) e, inclusive, da Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia instalada no Senado Federal.
A aquiescência de JAIR MESSIAS BOLSONARO à inserção de dados falsos nos sistemas do Ministério da Saúde, além de desnecessária – como acima demonstrado –, seria absolutamente paradoxal e, caso desvelada, acarretar-lhe-ia prejuízo político irreparável, justamente no ano em que concorreria a um novo mandato como Presidente da República.
Em relação a MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO
BOLSONARO, para além de incomum, a medida cautelar é absolutamente descabida e desarrazoada, pautada em elemento único de vinculação aos possíveis ilícitos cometidos: o fato de ser genitora e responsável legal de sua filha LAURA FIRMO BOLSONARO.
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Para a exata compreensão, destacam-se os únicos excertos em que o nome de MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO é citado na descrição fática constante da representação da Polícia Federal:

(…) Semelhantemente aos fatos investigados relacionados a JAIR BOLSONARO, os elementos informativos colhidos demonstraram coerência lógica e temporal desde a inserção dos dados falsos no sistema SIPNI até a geração do certificado de vacinação contra a Covid-19. A contextualização dos dados apresentados, considerando as manifestações públicas do ex-Presidente da República JAIR BOLSONARO de que não vacinaria sua tilha, LAURA FIRMO BOLSONARO, contra a Covid-19, demonstram fortes indícios de que as inserções falsas podem ter sido realizadas com o objetivo de gerar vantagem indevida para a adolescente, por determinação de seus pais. Obviamente, JAIR MESSIAS BOLSONARO e MICHELLE FIRMO BOLSONARO têm plena ciência de que os dados de vacinação em nome de sua filha menor de idade são ideologicamente falsos. Ainda assim, o certificado digital de vacinação contra a Covid-19 foi emitido no dia 27/12/2022, em língua inglesa, na véspera da viagem da adolescente para os Estados Unidos da América.
(…)
Diante do exposto, os dados apresentados até o presente momento trazem indícios de que JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, CLAUDIA HELENA ACOSTA RODRIGUES DA SILVA, JAIR MESSIAS BOLSONARO e MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO se uniram, em unidade de desígnios, e, de forma exitosa, conseguiram inserir dados falsos de vacinação contra a Covid-19, em benefício da adolescente LAURA FIRMO BOLSONARO, nos sistemas SIPNI e RNDS do Ministério da Saúde, incidindo na conduta tipificada no art. 313-A do Código Penal. Da mesma forma, configurando-se o uso de certificado de vacinação contra a Covid-19 ideologicamente falso pela menor LAURA FIRMO BOLSONARO e, considerando suas condições de inimputabilidade, vulnerabilidade e submissão ao poder familiar de seus pais, não se desconsidera a possibilidade de que JAIR MESSIAS
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BOLSONARO e MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO incidiram no crime de uso de documento falso, como autores mediatos, em concurso forma) como o crime de corrupção de menores, previstos respectivamente nos arts. 304 do Código Penal e 244-B da Lei 8069/90.
(…)
Esse argumento isolado não é bastante para divisar possível adesão subjetiva de MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO, tampouco para funcionar como fundada razão a autorizar a drástica medida cautelar de busca e apreensão para a colheita de subsídios complementares da prática de crimes.
As demais afirmações constituem meras conjecturas e presunções da autoridade policial acerca de prática de crimes, as quais, ao que tudo indica, não ocorreram no plano da realidade.
No caso, não há nenhum elemento de convicção que justifique, com segurança, a postulação da medida cautelar de busca e apreensão de natureza domiciliar e/ou pessoal pelo Ministério Público Federal, não sendo suficientes, para tanto, as presunções suscitadas pela Polícia Federal em relação ao exPresidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO e à sua esposa, MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO.

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Meras conjecturas apresentadas pela Polícia Federal, sem base probatória mínima, não servem para fundamentar a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da decretação dessa medida cautelar penal mais drástica, como meio de obtenção de fontes materiais de prova.

Não se pode olvidar que o regime geral de medidas cautelares demanda a observância do fumus comissi delicti, ou seja, de um juízo de probabilidade e profundidade suficiente, em sede de cognição sumária, acerca da prática de delito pelo investigado. Trata-se de um juízo do provável e não de um juízo do possível, já que deve prevalecer a verosimilhança e não a incerteza. O possível abrange até aquilo que rarissimamente acontece, enquanto o juízo do provável é aneutral, em que há mais elementos em uma direção do que em outra.13
Também não se pode perder de vista que a Constituição Federal, no artigo 5º, inciso LVII, consagra o princípio da presunção de inocência, o qual deve ser ponderado e considerado na análise dos elementos probatórios que integram uma investigação e na fundamentação das decisões judiciais, ainda mais quando se está diante de decretação de medidas restritivas de direitos fundamentais. 13
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Ademais, as medidas cautelares em geral devem ser adequadas para fins de atingir o resultado almejado e neutralizar o risco existente, bem como devem implicar a menor onerosidade possível na restrição dos direitos fundamentais, desde que suficientes para proteger o bem jurídico. Tais medidas também devem ser proporcionais, protegendo os cidadãos contra os excessos estatais.
O princípio da proporcionalidade, em sua faceta da proibição de excesso (“Übermassverbot”), apresenta-se como fator de contenção e conformação da intervenção estatal materializada em medidas cautelares, proibindo a intervenção lesiva em direitos fundamentais (“Eingriffsverbote”).14
Nesse panorama, eventual busca e apreensão de natureza domiciliar e/ou pessoal poderá configurar a prática denominada de “fishing expedition”15 , que consiste em uma persecução penal especulativa indiscriminada, sem objetivo certo ou declarado, com a esperança de buscar quaisquer provas que embasem eventual futura acusação contra os investigados.
14 Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus nº 109.135/PI, Órgão Julgador: Segunda Turma, Relator: Ministro Celso de Mello, julgamento: 14 mai. 2013, publicação: DJe de 24 set. 2014.
15 Prática ilícita reconhecida na jurisprudência do STF, conforme acórdão proferido no Habeas Corpus nº 201.965/RJ, Órgão Julgador: Segunda Turma, Relator: Ministro Gilmar Mendes, julgamento: 30 nov. 2021, publicação: DJe nº 58, de 28 mar. 2022.
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A título ilustrativo, consta do voto do Ministro Gilmar Mendes na RCL 43.479/RJ, quanto à prática de fishing expedition, inadimitida não só no Brasil como em outros países democráticos:
Discorrendo sobre os requisitos necessários à busca e apreensão nos Estados Unidos, Viviani Ghizoni, Philipe Benoni e Alexandre Morais da Rosa escrevem que:
“No sistema estadunidense, quando a promotoria ou a política entende necessária a investigação, deve requerer o mandado mediante apresentação de evidência bastante para embasar a atividade pretendida, visto que o juiz somente expedirá a ordem caso repute que exista base factual suficiente. No caso de requerimento de mandado de busca e apreensão, avalia-se a aptidão do que foi apresentado para estabelecer a chamada ‘causa provável’, a probabilidade de que dada infração foi cometida e que provas dessa infração podem ser encontradas no lugar específico onde se pretende realizar a busca” (DA SILVA, Viviani Ghizoni; SILVA, Phelipe Benoni Melo e; ROSA, Alexandre Morais da. Fishing Expedition e Encontro Fortuito na Busca e na Apreensão: Um dilema oculto do processo penal. 1ª ed. Florianópolis: Emais, 2019. p. 39). De acordo com os autores, desde o precedente firmado no caso United States v. Nixon (1974), a Suprema Corte norte-americana submete os pedidos de busca e apreensão a um “teste” formado pelas seguintes etapas, no qual os órgãos de persecução devem demonstrar: (1) que os documentos almejados constituem prova relevante; (2) que não é razoavelmente possível a sua obtenção por outros meios; (3) que a parte não consegue preparar-se propriamente para o julgamento sem essa prévia produção e inspeção, e que o insucesso em obter essa prova pode atrasar de forma desarrazoada o julgamento; (4) que a solicitação é feita de boa-fé e que não se pretende empreender em uma genérica fishing expedition. (DA SILVA, Viviani Ghizoni; SILVA, Phelipe Benoni Melo e; ROSA, Alexandre Morais da. Fishing Expedition e Encontro Fortuito na Busca e na Apreensão: Um

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dilema oculto do processo penal. 1ª ed. Florianópolis: Emais, 2019. p. 39-40)
(…)
Registre-se que essas regras e orientações dos tribunais nacionais e estrangeiros devem ser objeto de constante atenção e preocupação por parte dos operadores jurídicos, em especial quando se compara as esferas do âmbito normativo com a realidade da persecução penal no Brasil, no qual notícias divulgadas pelos meios de comunicação e pelos canais das instituições oficiais noticiam a existência de amplíssimos arquivos de documentação e monitoramento de cidadãos.16
O exame de uma infração penal realizado de maneira ampla e genérica, para buscar evidências sobre prática de crimes, não pode ser aceito no ordenamento jurídico brasileiro, sob pena de malferimento das balizas de um processo penal democrático e constitucional.

Dessa forma, não existindo indícios de autoria de JAIR MESSIAS BOLSONARO e MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO, a continuidade da investigação com autorização para a realização das buscas e apreensões e a análise de elementos probatórios colhidos com inobservância à legislação processual penal e aos preceitos constitucionais são passíveis de configurar persecução penal especulativa indiscriminada, que afronta o sistema processual acusatório.
16 Supremo Tribunal Federal; Reclamação nº 43.479/RJ; Órgão Julgador: Segunda Turma; Relator: Ministro Gilmar Mendes; julgamento: 10 ago. 2021; publicação: DJe nº 215, de 3 nov. 2021.
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Como destacado pelo Ministro Gilmar Mendes, em seu voto na Reclamação nº 43.479, “o eventual encontro fortuito de provas não exclui a ilicitude da pescaria probatória. Na verdade, a proibição do fishing expedition busca exatamente coibir essa conduta dos agentes públicos de buscar provas relativas a fatos não investigados com base em medidas de disfarçada ilegalidade”.
5 – EXECUTORES MATERIAIS
Situação diversa é a dos executores materiais, em relação aos quais há elementos concretas das fundadas razões que justificam o pedido de busca e apreensão.
FARLEY VINICIUS ALCANTARA
Conforme relatado ao analisar as condutas de MAURO CESAR
BARBOSA CID e LUIS MARCOS DOS REIS, verifica-se que FARLEY VINICIUS DE ALCANTRA, identificado como sobrinho deste último, na qualidade de médico, concorreu para a falsificação ideológica do cartão de vacinação da Secretaria de Saúde do Estado do Goiás, em nome de GABRIELA
SANTIAGO CID, na medida em que inseriu dados falsos de imunização.
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Os diálogos entre FARLEY VINICIUS e LUIS MARCOS, extraídos de aplicativos de conversas, revela que o referido médico teria copiado os dados de vacinação de uma enfermeira não identificada, registrados na cidade de Cabeceiras/GO, conduta descrita como crime de falsidade ideológica no art. 299 do CP.
Ainda, diante da dificuldade de inserir os citados dados no sistema de saúde do Rio de Janeiro, FARLEY VINICIUS, posteriormente, teria fornecido cartão de vacinação em branco para preenchimento com dados relativos ao Rio de Janeiro, a fim de possibilitar o registro no citado sistema.
Assim sendo, o quadro fático-probatório indica a necessidade, a utilidade e a pertinência de que o investigado seja alvo de buscas e apreensão pessoal e domiciliar, para os fins previstos no art. 240.
EDUARDO CRESPO ALVES
Segundo se verifica das mensagens trocadas entre MAURO CESAR
BARBOSA CID e EDUARDO ALVES CRESPO, segundo sargento do Exército, este último teria agido para tentar inserir dados falsos de imunização no Sistema de Saúde, em favor de GABRIELA SANTIAGO CID.
Contudo, a conduta só não teria se consumado, em razão de obstáculos apresentados pelo próprio sistema, visto que se tentou registrar

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através do Sistema de Saúde do Rio de Janeiro informações de doses de vacina
Confira-se a transcrição de áudio encaminhado por EDUARDO
Diante desse fatos, revela-se a necessidade e pertinência seja alvo de buscas e apreensão pessoal e domiciliar, para os fins previstos no art. 240.

CLAUDIA HELENA ACOSTA RODRIGUES DA SILVA
CLAUDIA HELENA seria a responsável por excluir os dados falsos de imunização de JAIR BOLSONARO e sua filha, LAURA BOLSONARO, dos sistemas governamentais de saúde.
Segundo noticiado pela Polícia Federal, o DATASUS informou que os dados das duas doses da vacina da PFIZER, que teriam sido aplicados nas
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mencionadas pessoas, na cidade de Duque de Caxias/RJ, foram transmitidos em 21/12/2022. No entanto, no dia de 27/12/2022 foram excluídos do sistema
pela operadora CLAUDIA HELENA ACOSTA RODRIGUES DA SILVA, sob a justificava de “ERRO”.

A referida também teria sido a responsável por inserir informações falsas relativas ao Deputado Federal GUTERMBERG REIS DE OLIVEIRAS, conforme relatado em tópico específico.
Diante do exposto, considerando a necessidade de compreensão da inteireza dos fatos, também no caso, revela-se a necessidade e pertinência seja alvo de buscas e apreensão pessoal e domiciliar, para os fins previstos no art. 240.
MARCELO FERNANDES DE HOLANDA
Colhe-se dos autos que MARCELO FERNANDES DE HOLANDA
seria o titular do endereço de IP utilizado para acessar o conta do sistema ConectSUS de titularidade GABRIELA SANTIAGO CID, em 29/11/2023, a pedido de AILTON BARROS, quando teriam sido iniciados os atos para inserção de dados falsos de imunização em nome de GABRIELA CID no sistema de saúde.
Sobre o caso, a autoridade consignou que:
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Reforçando a possível participação de MARCELO HOLANDA nos fatos investigados, a análise do histórico de ligações telefônicas de AILTON GONC^ALVES BARROS constatou que na data de 29/11/2021, o terminal telefônico (21) 99425-1U3 ligou quatro vezes para o telefone utilizado por AILTON GONCALVES BARROS (21-98168-6526) no intervalo de tempo compreendido entre 08h45min e 09h27min. É possível observar que essas ligações ocorreram exatamente no período em que o usuário de GABRIELA SANTIAGO CIO foi utilizado poro acessar o sistemo ConecteSUS. por meio do endereço de IP: 179.158.80.105, cadastrado em nome de MARCELO FERNANDES DE HOLANDA, fato ocorrido às 09hl9min39seg do dia 29/11/2021.
O terminal telefônico (21) 98168-6526, utilizado por AILTON GONCALVES BARROS, no memento das ligações, estava conectado à Erb: 724-110600252-004, localizada no endereço; RUA CAJEI8A, 245, Bangu, Rio de Janeiro/RJ. O referido endereço está cerca de 16 km de distância do local em que foi realizado o acesso ao sistema ConecteSUS, com as credenciais de GABRIELA SANTIAGO CID, fato que reforça a possibilidade de AILTON GONCALVES BARROS ter repassados as credenciais de GABRIELA para outra pessoa, no caso, MARCELO FERNANDES DE HOLANDA, quern efetivamente realizou o acesso.
Nesse contexto, mostra-se razoável a realização de busca e apreensão em face do referido, para fins de colher informações complementares convenientes à instrução criminal.
MARCELLO MORAES SICILIANO
Conforme dados fornecidos pela Polícia Federal, há indícios da participação de MARCELLO SOARES SICILIANO, ex-vereador do Rio de Janeiro, na inserção de dados falso de imunização em benefício de GABRIELA
SANTIAGO CID.

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Os diálogos mantidos entre AILTON BARROS e MAURO CID, indicam que MARCELLO SICILIANO se comprometeu a intermediar a inserção das informações no Sistema de Saúde do Rio de Janeiro, sendo que, em troca, MAURO CID atuaria para possibilitar uma reunião o ex-vereador com o cônsul americano, para fins de regularização de visto dos Estados Unidos.
Nesse contexto, mostra-se adequada a busca e apreensão em face do referido, haja vista a apuração dos fatos em toda a sua extensão depende da colheita de elementos complementares, como a arrecadação de provas que possam estar em poder dos investigados e em suas residências e devam ser imediatamente acautelados, no interesse da persecução penal.
CAMILA PAULINO ALVES SOARES
Conforme dados prestados pelo Ministério da Saúde, CAMILA PAULINO ALVES SOARES foi a servidora responsável por registrar, nos sistemas do Ministério da Saúde, os dados falsos de vacinação contra a Covid19 em nome de GABRIELA SANTIAGO CID, o que configura a prática do delito descrito no art. 313-A do CP.
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Nessa toada, justifica-se a realização de busca e apreensão em desfavor da referida servidora, para fins identificação clara dos envolvidos, bem como do possível proveito auferido.
6 – BENEFICIÁRIOS
MAX GUILHERME MACHADO e SERGIO ROCHA CORDEIRO
Conforme representação da Polícia Federal, a partir dos dados encaminhados pelo Ministério da Saúde, verificou-se que MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA CORDEIRO, Assessores de Jair Bolsonaro, também teriam sido imunizados contra a Covid-19 no Município de Duque de Caxias/RJ, e que as informações teriam sido inseridas no Sistema do Ministério da Saúde pela mesma pessoa, JOAO CARLOS DE SOUSA BRECHA. Eis o que foi descrito na representação:
MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SERGIO ROCHA CORDEIRO teriam sido vacinados contra a Covid-I9, recebendo duas doses da vacina da fabricante PFIZER. A primeira dose, de lote FP7082, teria sido aplicada em ambos na data de 13/08/2022 no Centro Municipal de Saúde de Duque de Coxias/RJ. Já a segunda dose, de lote PCA0084, foi registrada como sido aplicada aos dois assessores na data de 14/10/2022, também no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias/RJ. Ou seja, MAX GUILHERME e SERGIO CORDEIRO teriam sido vacinados no mesmo local e nas mesmas datas em que o ex-Presidente da República JAIR BOLSONARO tendo tomado as duas doses da vacina contra a Covid-19 da fabricante PFIZER. Igualmente aos fatos anteriormente descritos, as inserções no sistema SI-PNI do Ministério da Saúde foram realizadas pelo

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Secretário Municipal de Governo do Município de Duque de Caxias/RJ, JOAO CARLOS DE SOUSA BRECHA. A única diferença e que desta vez os dados não foram excluídos dos sistemas SI-PNI e RNDS.
Diante dessas informações, a autoridade policial fez pesquisas em fontes abertas, com fins de verificar a possível inserção fraudulenta de dados no sistema governamental de saúde, relativas a MAX GUILHERME e SERGIO ROCHA, do que se concluiu pela ausência de indícios do deslocamento de ambos ao Município de Duque de Caxias, nas datas apontadas como de ocorrência da imunização.
Outro ponto destacado para corroborar com a suspeita de falsidade dos dados é o fato de as informações terem sido registradas no sistema apenas em de 22/12/2022, quatro meses após a data de aplicação da primeira dose.
Posteriormente, MAX GUILHERME teria emitido, via aplicativo do ConecteSUS, certificados de vacinação digital, contendo dados, em tese, ideologicamente falsos – nas datas de 26/12/2022, 29/01/2023 e 13/03/2023
que, conforme Polícia Federal, possivelmente foram utilizados para possibilitar o trânsito internacional, pelo menos nas viagens oficiais, ocorridas em 27/12/2022 (Brasil-Orlando), 29/01/2023 (Orlando-Brasil) e 13/03/2023 (Brasil-Orlando).

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Outrossim, SERGIO ROCHA teria emitido, via aplicativo do ConecteSUS, certificados de vacinação digital, contendo dados, em tese, ideologicamente falsos – nas datas de 23/12/2022, 14/01/2023, 29/01/2023 e 08/03/2023 – que, conforme Polícia Federal, possivelmente foram utilizados para possibilitar o trânsito internacional, pelo menos nas viagens oficiais, ocorridas em 30/12/2022 (Brasil-Orlando), 29/01/2023 (Orlando-Brasil) e 13/03/2023 (Brasil-Orlando).
Para a autoridade policial, as condutas elencadas comprovam que os investigados, reuniram-se, em unidade de desígnios, com JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, para a prática do crime de inserção de dados falsos em sistema de informações (art. 313-A do CP), bem como praticaram as condutas tipificadas como crime de uso de documento falso e de falsificação ideológica, em concurso material (art. 304 c/c art. 299 ambos do CP).
Nesse cenário, a Polícia Federal representou pela prisão preventiva de MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA

CORDEIRO nos seguintes termos:
[…] os indícios de que SERGIO CORDEIRO e MAX GUILHERME estão fazendo uso reiterado dos documentos ideologicamente falsos, comprovando a necessidade da medida cautelar de prisão preventiva para garantia da ordem pública. Além disso, o fato de serem assessores diretos do ex-Presidente da Republica, integrando a comitiva que viajou e acompanhou o ex-Presidente da República em sua estadia
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nos Estados Unidos, assinala a possibilidade de possuírem elementos informativos relevantes que permitam esclarecer o grau de participado de JAIR MESSIAS BOLSONARO no esquema criminosa, [...]. Diante do contexto apresentado, há séries risco de que SERGIO CORDEIRO e MAX GUILHERME, da mesma forma, ao se verem confrontados com a apoio estatal, ajam para suprimir elementos de prova relevantes, possam se comunicar com outros membros da associação criminosa, inclusive pessoas ainda não identificadas, ou simplesmente perturbem os rumos da investigação criminal que ora se desenvolve, fatos que atestam a necessidade da prisão preventiva como forma de acautelar a instrução criminal.
A prisão preventiva é uma medida excepcional, a ultima ratio na busca da eficácia e efetividade da persecução penal, de maneira que deve estar baseada em elementos concretos que individualizem a necessidade da segregação cautelar, em observância aos princípios da legalidade e da não culpabilidade17 .

Nessa senda, o princípio da legalidade impõe que sua decretação somente possa ocorrer se preenchidos os pressupostos do fumus comissi delicti e do periculum libertatis, ou seja, da existência de elementos objetivos e concretos que comprovem a materialidade e autoria delitivas, assim como do risco concreto que a liberdade do investigado implica à ordem pública, à conveniência da instrução criminal e à aplicação da lei penal (art. 312, CPP).
Ao analisar preliminarmente dos elementos coligidos nos autos, observa-se que, embora os investigados tenham possivelmente se beneficiado dos dados registrados em sistema, não há elementos concretos de que tenham
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concorrido para materializar a inserção de dados falsos no sistema governamental do Ministério da Saúde.
Também, deve-se reconhecer, por ora, a ausência de indícios sólidos do uso de documento falso, haja vista que a suposta utilização teria ocorrido em razão de viagens oficiais aos Estados Unidos e, conforme regulamentação do governo do referido estado Estrangeiro, pessoas a serviço de governos
estrangeiros, comprovada essa condição, são excepcionadas de apresentação comprovante de vacinação18
No caso dos referidos, aponta-se a reiteração de uso de documento falso como um dos fundamentos para a prisão preventiva, todavia, é necessário considerar a possibilidade de se estabelecer medida diversa, suficiente para obstar a possível continuidade delitiva e menos gravosa, qual seja, suspensão dos certificados de vacinação contra covid-19 em nome de MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA CORDEIRO.
Ainda, em relação a justificativa de possível interferência na instrução criminal por parte dos investigados, fundamentada na eventual posse de documentos que comprovem a participação de JAIR BOLSONARO
18 Disponível em: <https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/travelers/proof-of-vaccination.html>. Acesso em 21 abril.2023.
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na prática de crimes, não se justifica, tendo em vista a possibilidade de realização de busca e apreensão, inclusive, requerida no caso.
É cediço que não se pode decretar a prisão preventiva com fundamento na conveniência da instrução criminal, apoiando-se genericamente na possibilidade dos investigados intevirem na apuração.
No caso, considerando que MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA CORDEIRO não ocupam cargos na atual gestão, ou posições que possam exercer influência concreta no caso, não é possível vislumbrar o risco específico que representam para o êxito da investigação.
Não se justifica, portanto, o estabelecimento de prisão preventiva com fundamento no risco à ordem pública ou à conveniência da instrução criminal, bem como há os requisitos para a decretação da segregação temporária, sendo suficientes, neste momento, a imposição de cautelares diversas da prisão, como a suspensão dos certificados de vacinação.
Por outro lado, o quadro fático-probatório indica a necessidade, a utilidade e a pertinência de que os investigados sejam alvo de buscas e apreensões pessoal e domiciliar, para os fins previstos no art. 240, § 1º, alíneas “b”, “c”, “d”, “e”, “f” e “h”, do Código de Processo Penal.

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A apuração dos fatos em toda a sua extensão depende da colheita de elementos complementares, como a arrecadação de provas que possam estar em poder dos investigados e em suas residências e devam ser imediatamente acautelados, no interesse da persecução penal.
GUTERMBERG REIS DE OLIVEIRAS
Consta da representação da Polícia Federal o que se segue:
Em complementação à análise dos dados encaminhados pelo Ministério da Saúde, a equipe de investigação produziu a Informação de Polícia Judiciária - IPJ n° 1488909/2023 CGCINT/DIP/PF, em que constatou que GUTEMBERG REIS DE OLIVEIRA, CPF 077.333.41736, Deputado Federal pela MDB do Rio de Janeiro, teve seus dados relativos à vacinação contra a COVID-19 inseridos no sistema Novo PNI, e com isso na RNDS – Rede Nacional de Dados em Saúde, por CLAUDIA HELENA ACOSTA RODRIGUES DA SILVA. [...]

De acordo com os dados fornecidos, GUTEMBERG REIS DE OLIVEIRA teria sido vacinado com a 1ª dose da vacina da PFIZER no dia 16/06/2022. Todavia, os dados foram lançados no sistema somente no dia 18/11/2022, data da suposta aplicação da 2ª dose, também da PFIZER.
Além do lapso temporal entre data de aplicação da 1ª dose e a data de registro no sistema SI-PNI, chamou atenção o fato de o profissional, em tese responsável pela aplicação da vacina no Deputado Federal, o servidor JOSE WELLINGTON PEIXOTO LIMA, ter vacinado no dia 16/06/2022 (1ª dose), apenas GUTEMBERG REIS DE OLIVEIRA, em contraste com as diversas pessoas vacinadas em outras datas pelo referido profissional.
As buscas realizadas em fontes abertas ainda revelaram que Deputado Federal GUTEMBERG REIS DE OLIVEIRA, no dia em que teria tornado a 1ª dose da vacina contra a covid-19(16/06/2022), fez
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diversas postagens em suas redes sociais, afirmando que passou a semana na cidade de Brasília/DF, no exercício de sua atividade parlamentar na Câmara dos Deputados.
Da leitura atenta da narrativa, não é possível identificar a existência de indícios de que o Deputado Federal teria participado ativamente da inserção de dados falsos no sistema de saúde, não havendo sequer elementos comprobatórios de que o parlamentar teria consciência dos referidos registros.
No caso, diferentemente dos casos envolvendo MAX GUILHERME MACHADO e SERGIO ROCHA CORDEIRO, não há informações de que o parlamentar tenha acessado a conta do ConecteSUS e emitido certificados de vacinação contra a Covid-19, a fim de demonstrar a ciência sobre o registro dos dados falsos.
Além disso, não foram apresentados quaisquer elementos de prova que comprovem a existência de vínculo entre o congressista e a responsável por incluir os dados de vacinação no sistema governamental.
Portanto, o quadro fático-probatório delineado pela Polícia Federal não permite concluir pela existência de causa provável a legitimar e autorizar a realização de buscas e apreensões direcionadas ao Deputado Federal GUTERMBERG REIS.

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7 – PEDIDOS
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL encampa parcialmente a representação da autoridade policial e requer o seguinte:
a) a decretação das prisões temporárias de MAURO CESAR BARBOSA CID, LUIS MARCOS DOS REIS, AILTON GONÇALVES MORAES BARROS e JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, pelo prazo inicial de 5 (cinco) dias;
b) autorização para que os representados MAURO CESAR BARBOSA CID, GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID, LUIS MARCOS DOS REIS, AILTON GONÇALVES MORAES BARROS, JOÃO CARLOS DE SOUSA BRECHA, GABRIELA SANTIAGO RIBEIRO CID, FARLEY VINICIUS

ALCANTARA, EDUARDO CRESPO ALVES, CLAUDIA
HELENA ACOSTA RODRIGUES DA SILVA, CAMILA
PAULINO ALVES SOARES, MARCELO FERNANDES DE HOLANDA, MARCELLO MORAES SICILIANO, MARCELO COSTA CÂMARA, MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA e SÉRGIO ROCHA CORDEIRO sejam alvo de buscas e apreensões pessoal e residencial, inclusive nos
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endereços profissionais, observados os pedidos de acesso e demais consectários acima apontados;
c) o indeferimento da medida cautelar de busca e apreensão domiciliar e/ou pessoal em relação ao ex-Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO, à sua esposa, MICHELLE DE PAULA FIRMO REINALDO BOLSONARO, e ao Deputado Federal GUTEMBERG REIS DE OLIVEIRA;
d) autorização para a imediata realização das OITIVAS dos investigados que serão alvo das medidas cautelares penais, observadas suas garantias constitucionais e legais, assim como dos profissionais que teriam aplicado as duas doses da vacina contra a Covid-19 no ex-Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO, identificados como DIEGO DA SILVA PIRES e SILVANA DE OLIVEIRA PEREIRA (fls. 2.033/2.034);
e) identificação e oitiva de outros agentes com os quais o representado tenha interagido;
f) seja determinado à autoridade policial que promova a análise do material e do conteúdo eletrônico apreendidos de forma

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prioritária, apresentando relatório parcial no prazo máximo de 10 (dez) dias;
g) a intimação do Ministério da Saúde para que proceda com a suspensão do certificado de vacinação contra a Covid-19 em nome de GABRIELA SANTIAGO CID, MAURO CESAR BARBOSA CID, BEATRIZ RIBEIRO CID, GIOVANA RIBEIRO

CID, ISABELA RIBEIRA CID, JAIR MESSIAS BOLSONARO, LAURA FIRMO BOLSONARO, MAX GUILHERME MACHADO DE MOURA, SÉRGIO ROCHA CORDEIRO e GUTERMBERG REIS DE OLIVEIRAS.
Brasília, data da assinatura digital.
LINDÔRA MARIAARAUJO
VICE-PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA