Confluências1

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Vestir a camisola na meia maratona do Porto

Hélder Silva 29 anos. Licenciado em Análises Clínicas e Saúde Pública, e Mestre em Microbiologia pela Universidade de Aveiro. Exerce profissionalmente num laboratório onde é responsável pela validação técnica na área de Microbiologia.

O início desta aventura surgiu no décimo aniversário da Associação Portuguesa de Gagos realizado em Alqueidão, Figueira da Foz. Após muitos cumprimentos e confraternização com as diferentes pessoas presentes surgiu uma t-shirt com o emblema da Associação no valor de 5€. Infelizmente, no momento, não tinha os 5€ para a comprar, contudo lancei em tom de brincadeira com a minha namorada “Se tivesse aqui dinheiro comprava e levava na próxima semana à meia maratona do Porto”. Cinco minutos mais tarde, aparece ela e diz “Aqui tens! Agora na próxima semana quero verte com ela”. Após meses de treino chegou o grande dia. O dia que tinha tanto de importante para superação desportiva como de pessoal. A superação desportiva seria correr a minha primeira meia maratona, mas a superação pessoal era testar a minha aceitação da gaguez, um tema tão amplamente discutido nos nossos fóruns online e nos grupos presenciais. Depois de entrar no autocarro com a camisola tive um misto de sensações. Orgulho por representar e divulgar a associação do qual orgulho-me de fazer parte e, por outro, apreensão ou desconforto por ter “colado” para toda a gente ver que era uma pessoa com gaguez (apesar de o facto de usar uma camisola da associação não ser obrigatoriamente sofrer de qualquer patologia mas foi o que senti naquele momento). Quando o autocarro chegou à partida, tinha cinquenta mil pessoas à “minha espera”. Inicialmente senti-me um pirilampo no meio do escuro, toda a gente olhava. Talvez pelo desconhecimento da existência da associação, pela ignorância do que se trata, pela coragem de envergar ou simplesmente a minha cabeça a pensar. Vinte minutos de exposição serviram para serenar e as pessoas olharem já não fazia qualquer confusão. Nesse momento pensei “Sim, sou uma pessoa que gaguejo e não tenho de ter receio de mostrar mais uma das minhas caraterísticas. Hoje posso ajudar alguém que gagueje a encontrar uma associação que lute pelos seus direitos e a educar todas as pessoas que me vêm que nós existimos e “temos voz.””. Percorri cerca de 21km com a camisola da Associação Portuguesa de Gagos e antes de começar senti que já tinha conseguido ultrapassar o maior desafio para aquele dia. Eu desafiei-me a mim mesmo mas a maior medalha talvez fosse conseguir ajudar uma pessoa que gagueja a sentir-se melhor e a procurar apoio. Eu tive o maior gosto de “vestir a camisola” e dei a conhecer a nossa

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