Favelas e comunidades: O laboratório da necropolítica brasileira

13 DE JULHO DE 2022

FAVELAS E COMUNIDADES O laboratório da necropolítica brasileira

SILVIA IZQUIERDO (AP)

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Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio

RICARDO MORAES / REUTERS

Necropolítica é um termo criado pelo filósofo, teórico político e historiador camaronês Achille Mbembe, que refere-se ao poder de ditar quem pode viver e quem pode morrer (2011). Com base no poder do Estado e suas tecnologias de atuação, o “deixar morrer” se torna algo aceitável, normalizado e cotidiano.

Porém, como acrescenta Mbembe (2011), não são todos os corpos que possuem essa “aceitabilidade”, sendo o corpo “matável” aquele que se encontra em risco de morte a todo momento por consequência do parâmetro diferencial de raça.

Mangueira, Zona Central do Rio

Fabio Teixeira / Agência Anadalu / Getty Images

População do do Rio de Ja

No ano de 2020, a Rede de Observatórios da Segurança destacou o Rio de Janeiro como o estado com mais mortes em ações policiais, contabilizando 1.245 óbitos. Desse total, 86% das

mortes

foram

de

corpos

negros.

Importante destacar que, a população negra no

Rio

representa,

população do estado .

apenas,

51,7%

da Brancos/Não declarados 48.3%

Estado neiro

De 1.245 mortes, 1.070 foram de corpos negros.

Negros 51.7%

A justificativa para eufemizar esse número, é justamente a de combater o “inimigo”, defendendo a população de um perigo maior. Porém, dentro dessa perspectiva, a noção de “segurança” fica subdividida, e pessoas que deviam fazer parte da zona de proteção do Estado, se tornam alvo de sua necropolítica. Assim, a sociedade carioca não é vista como uma população conjunta, mas sim, como um conjunto de grupos subdivididos por seus aspectos sociais, raciais, territoriais e econômicos.

Favela do Jacarezinho, Zona Norte do Rio

CHA Silvia Izquierdo | AP

Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio

CINA Ricardo Moraes | Reuters

É SOBRE QUESTIONAR: O ESTADO POSSUI OU NÃO LICENÇA PARA MATAR EM PROL DE UM DISCURSO DE ORDEM ?

Ricardo Moraes | Reuters

Favela do Jacarezinho, Zona Norte do Rio

Ao construir uma civilização baseada em princípios escravocratas, misóginos e raciais, o Brasil se torna um campo de experimentos sociais onde a violência é vista de forma branda, cotidiana e até mesmo, necessária. E, é exatamente dentro dessa normalização, que a necropolítica atua.

Bruno Itan | Olhar no Complexo

Favela Nova Brasília, Complexo do Alemão

A favela e o povo preto são submetidos hoje ao funcionamento do sistema neoliberal (que também pode ser denominado como necroliberal), o que faz com que as comunidades se tornem um grande laboratório social para o Estado e seus mecanismos de poder e saber.

Favela do Jacarezinho, Zona Norte do Rio

Reginaldo Pimenta | Agência O Dia

Luiz Baltar | Divulgação

Complexo da Maré, Zona Norte do Rio

Sergio Queiroz | Reuters

Favela do Jacarezinho, Zona Norte do Rio

Silvia Izquierdo | AP

Favela do Jacarezinho, Zona Norte do Rio

Complexo do Salgueiro, São Gonçalo

TOMAZ SILVA | EBC Tomaz Silva | EBC

SE GRE GA ÇÃO

Mbembe (2011) afirma que é dever do Estado estabelecer o limite entre os direitos, violência e morte, mas que, ao invés disso, ele utiliza de seu poder e discurso para criar zonas de morte.

Morro da Babilônia, Rio de Janeiro

Favela Santa Marta, Botafogo

AFP/Arquivos

Fabio Teixeira | NurPhoto

"NÃO É SOBRE DEIXAR MORRER,

E SIM, FAZER MORRER TAMBÉM"

Achille Mbmbe

Complexo da Rocinha

Jorge Hely/ FramePhoto/ Folhapress

A pandemia de covid-19, descoberta no Brasil em 2020 e ainda presente em todo o mundo, é hoje o maior agente da necropolítica “não-violenta” nas comunidades do Rio. A atuação do Estado no combate ao vírus, evidentemente, não priorizou zonas de vulnerabilidade como as favelas, o que resultou em números alarmantes de mortes causadas pela doença. Com a falta de um planejamento especial para essas comunidades e a grande subnotificação de dados, não se tem ciência de um número preciso de mortes por covid-19 nesses territórios.

Contudo, para se ter uma noção geral do assunto, o Painel Unificador das Favelas Covid-19 (serviço mantido por uma rede de associações, ONG’s e movimentos sociais) registrou em março de 2021 cerca de 5.855 mortes pela doença desde o início da pandemia. A soma desses óbitos nas favelas do Rio superou números registrados em 166 países, incluindo Venezuela e Paraguai.

LEO CORREA (AP)

Complexo da Rocinha

Fernando Souza / El País

QUANDO O ESTADO SE FAZ AUSENTE, O POVO SE FAZ PRESENTE

Rio On Watch | Divulgação

A necropolítica se sedimenta em todas essas ferramentas estruturais para continuar o seu “dever” de fazer da morte do povo preto, algo cotidiano. Mães, pais, jovens e crianças.

Não há divisões ou distinções. A herança da negritude é por si só, risco constante de morte no Brasil, é oferecer risco aos demais, é carregar consigo toda uma pré-especulação já pronta, estereotipada e enraizada no saber da população. É crescer tentando entender o porquê de tantas diferenças. É ter que conviver com o medo de ser o que se é para os outros e para si mesmo. É entender que a insegurança do outro é a sua existência. É sobre sobreviver a cada dia enquanto os outros vivem.

FONTES SILVIA IZQUIERDO (AP). Manicure Leticia Machado, 31 anos, e com sete filhos, é fotografada em sua casa na favela do Turano, no Rio de Janeiro. Disponível em: https://brasil.elpais.com/opiniao/202004-16/nao-podemos-deixar-a-periferia-apropria-sorte-na-crise-docoronavirus.html

Ricardo Moraes/O Globo. "Operação policial na sexta-feira deixou 13 mortos no Complexo do Alemão". Disponível em: https://oglobo.globo.com/rio/aposoperacao-policial-que-deixou-13-mortosmoradores-do-complexo-do-alemaorelatam-tiros-na-manha-deste-sabado24430974

Fabio Teixeira/Agência Anadalu. "Crianças mostram balas disparadas e toalha manchada de sangue após uma operação policial na favela do Rio de Janeiro em Mangueira em 2017".

Disponível em: https://rioonwatch.org.br/? p=43419

Silvia Izquierdo/AP Photo. Moradores denunciaram que alvos da polícia foram encurralados dentro de casas e executados.

Disponível em: https://www.dw.com/ptbr/moradores-e-ativistas-denunciam-abusosem-opera%C3%A7%C3%A3o-policial-norio/a-57457902

FONTES Ricardo Moraes/Folha de São Paulo.

Operação deixa 10 mortos no Complexo do Alemão, no RJ. Disponível em: https://fotografia.folha.uol.com.br/galeri as/1666793365482602-operacao-deixa10-mortos-no-complexo-do-alemao-no-rj

Ricardo Moraes/Reuters. Policiais civis carregam o corpo de uma pessoa morta durante operação na favela do Jacarezinho. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2021-0506/operacao-policial-mata-25-pessoasno-jacarezinho-em-segunda-maiorchacina-da-historia-do-rio.html

Bruno Itan/Olhar do Complexo.

Moradores carregam os corpos dos mortos em Nova Brasília. Disponível em: https://rioonwatch.org.br/?p=47503

Reginaldo Pimenta/Agência O Dia "OPERAÇÃO POLICIAL NO JACAREZINHO DEIXA PELO MENOS 25 MORTOS". Disponível em: https://goiasatual.com.br/06/05/2021/oper acao-policial-no-jacarezinho-deixa-pelomenos-25-mortos/

FONTES Luiz Baltar/Divulgação. Bala perdida: a violência policial no Brasil e os desafios para sua superação. Disponível em: https://oglobo.globo.com/rio/livrolancado-esta-semana-em-sp-abordaviolencia-policial-no-rio-nas-principaiscidades-do-brasil-16392179

SILVIA IZQUIERDO (AP) / El Pais. "O chão e a cama de uma casa no Jacarezinho aparecem cobertos de sangue, após operação policial nesta quinta-feira". Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2021-0506/operacao-policial-mata-25-pessoas-nojacarezinho-em-segunda-maior-chacina-dahistoria-do-rio.html

Sergio Queiroz/Reuters. Protesto no Rio de Janeiro.

Disponível em: https://www.istoedinheiro.com.br/manif estantes-contra-violencia-policial/

TOMAZ SILVA/EBC. Fogo Cruzado aponta três medidas que precisam ser efetivadas para reverter a letalidade policial no Rio: combate à impunidade, preparo dos policiais e foco na prevenção da violência". Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/politica /2021/11/chacinas-violacoes-salgueiro-riode-janeiro/

FONTES APF/Arquivos. Voluntário desinfeta uma rua na favela de Babilonia, no Rio de Janeiro. Disponível em: https://istoe.com.br/favelas-do-rio-temmais-mortes-por-covid-do-que-14estados-brasileiros/

Maurício Thuswohl/RBA. Moradores de favelas do Rio precisam de ações de prevenção dos poderes públicos para enfrentar pandemia. Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/cidada nia/2020/04/subnotificacao-falta-deinformacao-e-condicoes-precariasaumentam-drama-da-covid-19-nas-favelasdo-rio/

Fabio Teixeira/NurPhoto. Voluntário faz o trabalho de imunização nas vielas da favela Santa Marta. Ausência do poder público na região marcou a pandemia.

Disponível em:https://projetocolabora.com.br/ods3 /poder-publico-nao-fez-nada-para-asfavelas-na-pandemia/

Jorge Hely/ FramePhoto/ Folhapress. Faixa colocada por moradores incentivou o isolamento social na favela da Rocinha, em maio de 2020. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/saude/ultimasnoticias/redacao/2021/10/10/favelas-do-rjlideram-casos-de-covid-durante-avanco-davariante-delta.htm

FONTES Leo Correa/AP. Voluntário entrega sabonete para um morador da favela da Rocinha, Rio de Janeiro, no dia 24 de março.. Disponível em: https://brasil.elpais.com/sociedade/2020 -03-28/sem-acoes-especificas-86-dosmoradores-de-favelas-vao-passar-fomepor-causa-do-coronavirus.html

Fernando Souza/El País. Entrega de quentinhas no Morro da Palmeira no Complexo do Alemão, no Rio. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2020-0816/a-voz-ativa-contra-a-covid-19-nocomplexo-do-alemao-ignorado-pelogoverno-na-pandemia.html

RioOnWatch/Divulgação. ‘Estamos Abandonados ao Nosso Próprio Destino’: Covid Ameaça Favelas do Brasil.

Disponível em: https://rioonwatch.org.br/?p=46576

Alex Ferro/VEJA. SEM SAÍDA - A aposentada Vera Lúcia com a neta: em quarentena, mas com medo de ver a casa alvejada mais uma vez Disponível em: https://veja.abril.com.br/brasil/entre-o-viruse-a-bala-nas-favelas-inseguranca-dentro-efora-de-casa/

Revista Digital desenvolvida para trabalho de conclusão da Disciplina de Introdução ao Fotojornalismo Discente: Gabriella Gomes Marinho do Amor Divino Orientadores: Prof. Micheli Pucarelli e Monitora Luísa Souza Jornalismo - Turma 2022.1