Dos rios ÀS PISCINAS
a água como centro de sociabilidade e lazer na cidade de São Paulo
Gabriela Duarte Navajas orientadora Ligia Miranda Escola da Cidade 2019
D os rios à s pisci n a s : a á g u a co mo ce ntro d e socia bi l id a d e e l aze r n a cid a d e d e S ã o Pa u l o Gabriela Duarte Navajas Orientadora: Ligia Miranda
Trabalho de Conclusão Associação Escola da Cidade Faculdade de Arquitetura e Urbanismo São Paulo 2º semestre de 2019
para Omar
S u má rio 7 I ntro d u çã o 8 So b re a p esq u i sa 1 4 O p a p e l d a foto g ra f i a n a cr ia çã o d o
i m a g i n á r io so b re a á g u a n a cid a d e
29Ó cio e l aze r 33 As re l a ções soci a i s d a p o p u l a çã o co m os r ios d e S ã o Pa u l o
3 7 Sociabilidade e lazer nos rios e represas de São Paulo 41 R i o Ta m a n d u a te í 47 Va l e d o A n h a n g a b a ú 5 1 R i o T i etê 5 7 B a c i a H i d ro g rá f i c a d o R i o P i n h e i ro s
65Pa rq u es d a ci d a d e
7 1 Pi sci n a s p ú b l ica s d e S ã o Pa u l o: d a s pi sci n a s o lím pica s à s pi sci n a s re cre a ti va s
7 3 Piscina do Complexo Esportivo do Pacaembu: um projeto de construção de uma identidade nacional no esporte 7 7 Piscina coberta da Água Branca: um incentivo à prática de esportes aquáticos competitivos 8 1 Piscina do Parque CERET: a maior piscina pública de São Paulo 8 5 CEUs e a implantação de centralidades de educação e lazer acessíveis para a população das periferias
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Sesc
9 1 S e s c P o m p é i a 9 5 S e s c 24 d e M a i o
1 0 1 C o ns i d e ra ções f i n a i s 1 0 5 Refe rê n ci a s
110
103 105 106 106
Bibliografia A u d i ov i s u a l S i te s c o n s u l ta d o s Ac e r vo s C o n s u l ta d o s
Ag ra d e ci m e ntos
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I ntro d u çã o Esta pesquisa busca investigar um panorama histórico sobre espaços que contenham água como elemento central de sociabilidade e lazer na cidade de São Paulo, resgatando um retrato do passado com abundância dos recursos hídricos naturais, até os dias de hoje, com piscinas e parques públicos que possuam algum elemento d’ água que promovam a convivência entre as pessoas e o ócio. O trabalho se estrutura em quatro principais grupos que por vezes se cruzam: no primeiro um histórico sobre os corpos d’ água da cidade como os rios e represas com uma investigação sobre as atividades sociais nos mesmos, sobretudo o ócio; o segundo sobre parques públicos que contenham alguma relação com a água, o terceiro uma análise sobre a evolução da implantação das piscinas públicas em São Paulo, da Piscina do Pacaembu até os CEUs; e o quar to sobre o SESC e sua iniciativa de trazer à população espaços de lazer e sociabilidade de qualidade. Foram escolhidas imagens ao longo da pesquisa que desper tem o imaginário da população sobre a água na cidade e que transmitem visões sobre sociabilidade e lazer, através da representação dos espaços com a apropriação das pessoas. Como São Paulo pode ser vista hoje através das paisagens urbanas e de suas infraestruturas com água que retomam — como veremos adiante — o caráter social tão presente em seu passado com os rios, sobretudo em espaços voltados para lazer, o encontro e espor te?
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So b re a p esq u isa Esta pesquisa se orientou primeiramente a par tir de um mapeamento de lugares na cidade de São Paulo que possuem inter face com água cujo principal intuito é o lazer/sociabilidade/espor te/contemplação, que fazem ou faziam par te do cotidiano dos paulistanos. Assim, foi feito um levantamento histórico sobre os recursos hídricos da cidade de São Paulo, sobretudo sobre a presença de interação social nos mesmos, no começo do séc. XX . Para tal, foi realizada também uma pesquisa iconográfica, com fotos que permitem compreender melhor essa conjuntura, e também uma linha do tempo que resgata fatos impor tantes que nos trazem até o momento presente da formação da cidade. Foram levantados lugares que possuem caráter público ou semi-públicos, que permitem um maior número de pessoas usufruírem e uma convivência entre diferentes grupos. Esse mapeamento possui as seguintes categorias: Centros Espor tivos (CE) com piscinas, de administração da Prefeitura; piscinas estaduais; SESCs com piscina; CEUs com piscinas; Parques Municipais e Estaduais que contenham algum corpo d’ água – seja este uma nascente, um lago, um espelho d’ água, etc. A par tir desse levantamento foi criado um novo agrupamento desses lugares de forma a entender a cronologia de acontecimentos e qual era o contexto de implementação de cada equipamento, para assim compreender o desenvolvimento da idéia de lazer na cidade, e como se tornou mais acessível à população ao longo dos anos. Durante o ano de 2019 foram realizados dois eventos que contribuíram para este trabalho que têm um olhar para os espaços do cotidiano na cidade que prezam pela convivência e lazer ou lugares simplesmente para se “estar”: a Bienal de Arquitetura de 2019 em São Paulo e a exposição “Access for all – São Paulo Architectural Infrastructures”, realizada no Museu 10
de Arquitetura da Pinacoteca de Munique. Segundo o organizador da exposição Andres Lepik, em tradução livre, [...] a mega-cidade de São Paulo cria um excedente para seus habitantes com esses projetos que oferecem uma compensação necessária pelas condições urbanas extremas de densidade espacial e social. Ao mesmo tempo, esses projetos são representativos do caráter da cidade em geral. São espaços de inclusão, que nutrem encontros entre habitantes de situações econômicas e sociais diferentes, e acrescentam um valor social que excede os programas individuais oferecidos. (LEPIK, 2019, p. 7)
A cidade de São Paulo possui uma população de mais de 12 milhões de pessoas, distribuída por uma extensão de mais de 1500 km² e apesar de numerosos os equipamentos de lazer e espor te disponíveis para a população, são insuficientes para a alta demanda desta, especialmente nas periferias da cidade. Há uma per tinência e urgência para se discutir e manter os lugares existentes, recuperar os que estão esquecidos e pensar em novos. Serão investigados, então, lugares com essas condições que trazem maior acessibilidade e possibilidade de interação com a água, resgatando a memória e história da cidade em relação a sua constituição com foco em sua rica malha hídrica e os episódios que nos trazem até a atual conformação de São Paulo.
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Es p a ç o s d e l a ze r c o m á g u a e m S ã o P a u l o
Rio Tietê
Rio Pinheiros
Rio Tamanduateí
Represa Guarapiranga
Represa Billings
0
12
5
10km
Parques Municipais Parques Estaduais SESCs com piscina CEUs com piscina Piscinas Públicas Municipais Piscinas Públicas Estaduais
Parques Municipais Parque Ibirapuera Parque Cantinho do Céu Parque da Aclimação Parque do Carmo Parque Cidade Toronto Parque da Juventude Parque Linear Água Vermelha Parque Água Parque Alfredo Volpi Parque Anhanguera Parque Linear Aricanduva Parque Guarapiranga Parque Buenos Aires Parque Burle Mar x Parque Linear bananal Canivete Parque Linear Castelo Orla da Represa de Guarapiranga Parque Municipal Chácara do Jockey Parque Linear Consciência Negra Parque Municipal Cordeiro (Mar tin Luther King) Parque Linear Fogo Parque Ecológico Chico Mendes Parque Linear Feitiço da Vila Parque Guarapiranga Parque Linear Guaratiba Parque da Independência Parque Linear Invernada Parque Jardim da Luz Parque Linear Ipiranguinha Parque Itaim Paulista Jardim Felicidade Jardim Herculano Parque Leopoldina - Orlando Villas -Boas Parque M ’Boi Mirim Parque Linear Mongaguá - Francisco Menegolo Parque Nebulosas
Parque Linear Nove de Julho Parque Linear Parelheiros Parque Pinheirinho d’Água Parque Piqueri Parque Natural Municipal Bororé Parque Colônia Parque Natural Municipal Fazenda do Carmo Parque Natural Itaim Parque Natural Jaceguava Parque Varginha Parque Praia do Sol Parque Jd. Prainha Parque Prof. Lydia Natalizio Diogo - Vila Prudente Parque Linear Ribeirão Oratório Parque Linear do Córrego do Rio Verde Parque Santo Dias Parque São Domingos Parque Linear do Sapé Parque Severo Gomes Parque Shangrilá Parque Linear Tiquatira - Eng Eugenio Werner Zulauf Parque Vila Guilherme Vila Rodeo Parque Vila dos Remédios Vila Jacuí - Unidade de Lazer Engenheiro Antonio Arnaldo de Queiroz e Silva
Parques Estaduais Parque Ecológico do Tietê Hor to Florestal Jardim Botânico Serra do Mar
< Mapa da cidade de São Paulo sobre as sub -bacias hidrográficas per tencentes a Bacia do Alto Tietê, com as 8 regiões e corpos d’ água e áreas verdes destacados. Fontes: SVMA , FCHT, SMUL .
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Sesc com piscina
CEUs com piscina
Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc Sesc
CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU CEU
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24 de Maio Vila Mariana Pompéia Consolação Belenzinho Itaquera Ipiranga Pinheiros Santana Bom Retiro Interlagos Santo Amaro
Alvarenga Anhanguera Aricanduva Butantã Caminho do Mar Cantos do Amanhecer Casa Blanca Feitiço do Vila Guarapiranga Jaçanã Jaguaré Meninos Parque Bristol Parque São Carlos Parque Veredas Pêra Marmelo Quinta do Sol Rosa da China Tiquatira Vila Atlântica Vila Curuçá Vila do Sol Campo Limpo Inácio Monteiro Jambeiro Uirapuru Heliópolis Navegantes Vila Rubi Cidade Dutra Três Lagos Paraisópolis Alto Alegre A zul da Cor do Mar Capão Redondo Formosa
Piscinas Públicas Municipais
Piscinas Públicas Estaduais
CERET Tatuapé CE Casa Verde CE Ermelino Matarazzo CE Mandaqui CE Vila Cubuçu CE Vila Mateus CE Sabará CE Campo Limpo CE Ipiranga CE Vila Carioca CE Vila Santa Catarina (Balneário Jalisco) CE Butantã CE Cambuci CE Barra Funda CE Vila Guarani CE Lapa CE Vila Maria CE Santo Amaro CE Mooca CE Pirituba CE Jardim São Paulo CE Vila Manchester CE Guarapiranga CE Ibirapuera CE Pacaembu CE Santana (Balneário Geraldo Alonso) CE Mário Moraes (CE Jardim Celeste)
CEPEUSP Complexo Espor tivo Baby Barioni Conjunto Despor tivo Contâncio Vaz Guimarães
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O p a p e l d a foto g ra f ia n a cr ia çã o d o i m a g i n á r io sob re a á g u a n a cid a d e As inúmeras fotografias que retratam os rios em São Paulo no final do século XIX e início do século XX são ora documentais como as fotos de paisagens de Militão Augusto de Azevedo, ora retratam pessoas nadando, remando ou saltando na água– em sua maioria associadas a algum clube. Poucas fotos retratavam o cotidiano das populações mais humildes da cidade ou por vezes apareciam ao fundo. A fotografia estava majoritariamente reser vada a uma parcela ínfima privilegiada que tinha acesso ao equipamento da câmera de foto. Apenas a par tir dos anos 50 as câmeras começaram a se popularizar, e assim, a fotografia passou a ser um meio de expressão mais presente. Essas clássicas imagens do passado no qual ainda havia vida – das mais diversas formas – nos rios em São Paulo hoje veiculam a Internet em páginas como “são paulo in foco”, “Sampa histórica” ou “são paulo são”, derivadas principalmente dos acer vos digitais como o Instituto Moreira Salles e o Acer vo Histórico de São Paulo e causam reações de surpresa, nostalgia e comoção. “A cidade de São Paulo é um palimpsesto - um imenso pergaminho cuja escrita é raspada de tempos em tempos, para receber outra nova”, escreveu Toledo. Assim ele explicava como a capital paulista, ao crescer, se modifica de tal forma e a uma velocidade tão grande que, de uma geração a outra, os jovens não conhecem arquitetonicamente a cidade onde viveram seus antepassados, mesmo os mais recentes. 1
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Trecho de reportagem de Edison Veiga publicada no jornal O Estado de S. Paulo em 31 de julho de 2019. Fonte: VEIGA, Edison. Morre Benedito Lima de Toledo, o arquiteto que melhor compreendeu e explicou SP. Disponível em: <https://brasil.estadao.com.br/noticias/ geral,aos-85-morre-benedito-lima-de-toledo-o-arquiteto-que-melhor-compreendeu-eexplicou-sao-paulo,70002949028>. Acesso em: 4 de nov de 2019.
A São Paulo dessas imagens quase não é reconhecível, principalmente quando se trata de seus córregos e rios, hoje completamente desnaturados ou enterrados. A cidade se tornou uma abstração de seu território original e, por tanto esse grupo de fotos cria um imaginário na mente das pessoas de uma São Paulo que parece outro lugar, em um tempo muito distante. [...] a imagem visual da cidade é par te integrante de um modo de ex teriorização da “ felicidade” social, revestindo os objetos de uma aura democrática aparentemente realizável, e sendo ela mesma (a imagem) uma das categorias de objetos que se oferece como produto passível de apropriação (e fruição visual) em contrapar tida a uma restrição da prática urbana. (Baudrillard 1991 apud LIMA; CARVALHO, 1997, p. 219)
Esta citação de Baudrillard extraída do livro “Fotografia e cidade: Da razão urbana à lógica do consumo - Álbuns de São Paulo (1887-1954)” de Solange Lima e Vânia Car valho, quando relacionada às fotos que apresentam as atividades que aconteciam nos rios, sobretudo em situações que hoje entendemos como “lazer” traz uma reflexão sobre uma impossibilidade de retomar esse tempo nostálgico, pois a camada temporal em que estamos é completamente diferente da camada da cidade de quando essas fotos foram tiradas. Existe uma idealização das fotografias do passado, como se fosse um tempo mais feliz que não é possível no presente. No entanto hoje é possível obser var uma produção de fotos que registram a população da cidade em diversas situações de lazer em algum equipamento em São Paulo que, de cer ta forma, possui uma vivacidade próxima a que se assimila nas clássicas fotografias dos rios. Obser vam-se nesses dois diferentes grupos temporais de fotos interações sociais, pessoas em movimento, crianças brincando, momentos de ócio, contemplação e o elemento da água que permeia o espaço, como se fosse o elemento instigante para todas essas atividades ocorram.
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As imagens da água são igualmente variadas e poeticamente evocativas. A água é, ao mesmo tempo, a imagem da vida e da mor te; também é um elemento feminino, maternal – que pode, porém, em suas formas mais potentes, adquirir características masculinas. Mais impor tante que isso: junto com o imaginário do fogo, a água é a imagem mais potente da imaginação. Bachelard fala de uma “poética da água” e sobre os “poetas da água”. “ Talvez mais que qualquer outro elemento”, escreveu ele, “a água é uma realidade poética completa”. Joseph Brodsk y também escreveu repetidas vezes sobre o poder associativo específico da água: “ Simplesmente acho que a água é a imagem do tempo” e “a água equivale ao tempo e gera beleza com seu duplo”. (PALL ASMAA , 2013, p.50)
No livro “Guia Fantástico de São Paulo”, a autora Angela León imagina novas situações para locais pré -existentes em São Paulo, como uma piscina no Elevado Presidente João Goular t ou Minhocão, como é popularmente conhecido, e tal situação foi reproduzida na realidade com a instalação da Piscina no Minhocão da arquiteta Luana Geiger em 2014 para a 10ª Bienal de Arquitetura de São Paulo. Em uma palestra organizada pelos arquitetos Abí lio Guerra e Mar ta Bogéa em junho de 2019 intitulada “Os quatro elementos: encontros da ar te e arquitetura no meio urbano”, Luana foi a representante do elemento da água, e explicando sobre sua instalação da piscina no centro, comentou sobre a idéia de “elevar os rios que estão submersos”.
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^ Piscina no Minhocão. Foto da instalação de Luana Geiger em 2014 e ilustração de Ángela León.
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A par tir de uma seleção de algumas imagens, podemos obser var que a interação das pessoas com a água esteve sempre presente na cidade das mais variadas formas, do uso cotidiano dos rios para transpor te, comércio e banho até para espor te nos clubes, das primeiras piscinas privadas como a da Vila Itororó até as piscinas públicas, das grandes competições espor tivas até um dia de ócio sob o sol.
v Mergulhadora no Rio Tietê. Autor desconhecido.
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> Rio Tietê na cidade de São Paulo. Foto: Hildegard Rosenthal. Acer vo LIFE.
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< Garoto na Praça da Sé (1986). Foto: Rosa Gauditano.
22
> Piscina na cober tura do Sesc 24 de Maio (2019). Foto: Daniel Car valho.
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v Enchente no Rio Tietê, entre 1943 e 194 4 . Foto: Benedito Junqueira Duar te. Acer vo Fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo.
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^ Piscina do Clube Ă&#x2030;den Liberdade, na Vila ItororĂł, nos anos 80. Acer vo Benedito Lima de Toledo.
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< Protesto no Rio Tietê. Autor desconhecido.
> Raia Olímpica da USP. Foto: Eloísa Ikeda
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< Peça BR -3, do Teatro da Ver tigem, encenada no Rio Tietê em 2006. Foto: Rio Encena.
v Enchente no Cambuci, em 1935. Autor desconhecido.
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< Parque infantil Dom Pedro II , em 1937. Foto: Benedito Junqueira Duar te.
V Apresentação do grupo Aqualoucos na Piscina Cober ta da Água Branca. Imagem do documentário “Aqualoucos”.
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^ Colagem sobre um futuro distópico do Vale do Anhangabaú em 2084 . Autor: Otávio Melo.
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^ Piscina da Vila Itororรณ, abastecida com o cรณrrego Itororรณ, em 1929. Acer vo Milu Leite.
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Ó cio e l a ze r Os conceitos de ócio e lazer por vezes estão associados, porém possuem diferentes definições. Surgiram para definirem atividades que sempre existiram, no entanto foram “institucionalizadas” após a Revolução Industrial. O ócio é tão antigo quanto o trabalho, porém, somente após a Revolução Industrial, com o surgimento do chamado tempo livre, que representa uma conquista da classe operária frente à exploração do capital, é que foi evidenciado, ocorrendo a nítida separação entre tempo -espaço de trabalho (produção) e lazer (atividades contrárias ao trabalho) enquanto tempo para atividades que se voltam para a reposição física e mental. (AQUINO; MARTINS , 2007, p.5)
Nas sociedades pré -industriais, as práticas laborais estavam associadas à subsistência e/ou possuíam intrínseca relação com o criativo e o lúdico. Assim as atividades trabalho e ócio não eram tão delimitadas e, por tanto mais fluidas temporalmente. Contudo, após a industrialização, o trabalho passou a voltar-se não para si próprio, mas para o outro, e o tempo livre surge como um momento voltado para si. Daí surge o conceito de lazer, que preenche esse espaço temporal do não -trabalho. O lazer deveria ser um direito de todas as pessoas, porém sabemos que “o caráter liberador do lazer é resultado da livre escolha, embora esta não exista de forma absoluta, uma vez que a livre escolha está marcada por condicionamentos diversos, sobretudo os socioeconômicos.” (Ibidem, p.6). Assim percebemos que as disparidades sociais definem quanto tempo livre uma pessoa tem, e quanto ela demora em chegar a um equipamento ou lugar da cidade gratuito ou de baixo custo em que se possa usufruir desse tempo com atividades de lazer. Muitos desses lugares são espaços que unem o lazer e a sociabilidade, ou seja, a possibilidade de interação social entre as pessoas, por serem 31
espaços coletivos, que promovem o encontro entres essas. Locais que possuem um corpo d’ água para ser compar tilhado entre um grupo de pessoas, como uma piscina pública, por exemplo, exigem primeiramente um convívio/interação com o outro para depois poder ser usufruída individualmente. Em São Paulo, as atividades de lazer e ócio que ocorriam num tempo e espaços específicos no cotidiano da população da cidade se popularizaram a par tir dos anos 70, com iniciativas privadas como o Sesc, ou públicas da Prefeitura, como o Centro Cultural São Paulo e as chamadas Ruas de Lazer, as quais eram fechadas para carros e aber tas para pedestres aos finais de semana. É um recurso utilizado até hoje em grandes vias centrais como a Avenida Paulista e o Minhocão ou em pequenas ruas das periferias.
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< Rua de lazer com piscinas dos moradores no bairro de Sapopemba. Autoria desconhecida.
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As re l a ções socia is d a p o p u l a çã o com os rios de S ã o Pa u l o
A água é tal qual a terra por onde ela corre.2 Plínio, o Velho
A fundação da cidade de São Paulo (originalmente São Paulo de Piratininga 3 nome anterior do Rio Tamanduateí 4), em meados do século XVI, se deu entre rios. Entre os rios Tamanduateí (antigo Piratininga) e Anhangabaú 5 , que por sua vez se localizam entre outros dois rios, Pinheiros e Tietê 6 . As águas dos inúmeros rios e córregos faziam par te do cotidiano da cidade e eram utilizadas para consumo, fonte de renda/subsistência como a pesca -, como transpor te, para comércio, como local para lavar roupas, para banho e como lazer. Como relata o historiador e professor da UNIFESP Janes Jorge, no documentário “São Paulo, a cidade dos rios invisíveis”:
< Mapa de São Paulo em 1930, realizado pela Società Anonima Rillevamenti Aerofotogrammetrici de Roma’ (SARA) Fonte: SMUL Esc.: 1:100000 2
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Frase original em latim que se encontra na Fonte Gioconda, na zona norte de São Paulo. Fonte: NASCIMENTO, Douglas. Fontes Abandonadas em São Paulo. Disponível em: <http:// www.saopauloantiga.com.br/fontes-abandonadas-em-sao-paulo>. Acesso em 10 de set 2019. Do tupi guarani, pira = peixe, tininga = seco. Do tupi guarani, tamanduá = tamanduá, y,í = rio Do tupi guarani, anhangaba = almas, espíritos, ú = rio Do tupi guarani, tietê = caudaloso, volumoso
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Os rios de São Paulo foram, até os anos 40, sem dúvida, rios vivos. Vivos do ponto de vista social. Então havia pessoas que iam aos rios para trabalhar, as pessoas podiam ir aos rios para se diver tir, por exemplo, havia competições de natação, travessia de São Paulo a nado, os clubes de remo, que usavam o Tietê como arena espor tiva. E depois tiveram que abandonar, embora tenham resistido ao máximo, quando as águas ficaram substancialmente poluídas. 7
Os rios da área urbanizada da cidade não estão totalmente mor tos, pois de alguma forma ainda resistem, mas perdeu-se o uso social e o contato direto com a população da cidade, tornando -se apenas uma infraestrutura de drenagem e uma cicatriz urbana que lembra esse passado para alguns e passa despercebida por outros. As inter venções urbanas durante o século XIX trouxeram inúmeras consequências negativas à cidade de São Paulo e outras que estão relacionadas a esses rios. As perdas da possibilidade de subsistência, da opção de locomoção, de lazer e espor te, de fonte de água, mudaram completamente a relação dos habitantes paulistanos com a água, que a longo prazo foi se transformando em uma relação distante, de repulsa às águas poluídas ao esquecimento de sua própria existência, muitas vezes invisíveis, enterradas abaixo de nossos pés. São Paulo tornou-se, assim, uma cidade que nega seus rios como recurso natural e uso social, e transformou-os em bens privados, longe dos interesses populares. Como analisa José Paulo Gouvêa em sua disser tação de doutorado: Entretanto, a história da canalização dos rios Tamanduateí, Tietê e Pinheiros e a supressão das suas várzeas não explicita o processo que transformou os
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ZATZ, Diana; Borges, Adolfo. São Paulo, a cidade dos rios invisíveis. São Paulo: Rios e Ruas, 2014. 9’55’’. Disponível em: <https://youtu.be/ifUkXKEGfyQ >. Acesso em 2 de set. de 2019.
rios de São Paulo de recursos naturais em recursos econômicos. Essas obras aconteceram em um momento em que os rios, suas terras e suas águas já estavam comprometidas e praticamente não existiam mais formas de subsistência pelos rios. A água para ingestão era vendida através do ser viço de distribuição encanado, pago em mensalidades e já não era mais possível encontrar água gratuita em chafarizes nem ingerir águas poluídas dos rios e córregos da cidade. Ainda que as várzeas não estivessem ocupadas, esses espaços já possuíam proprietários legalmente estabelecidos. Dessa forma, na ocasião da realização das obras de retificação e canalização dos rios Tamanduateí, Tietê e Pinheiros, terra e água já estavam incorporadas aos processos produtivos e de urbanização. Já eram, por tanto, mercadorias. 8
O direito ao acesso à água limpa para a população da cidade é retirado devido a interesses privados, e assim perde -se o contato natural e cotidiano com a água em São Paulo. A par tir daí a cidade se constituí de forma muito próxima como a conhecemos hoje, na qual os espaços públicos são escassos para a proporção da cidade e são lugares que estão sempre em disputa com interesses privados. Por anos a relação de São Paulo com a água se reduz às chuvas e garoas, enchentes e inundações. Quando ocorrem alagamentos na cidade a memória dos rios é tragicamente retomada. Inúmeras e custosas obras foram feitas pelo poder público para conter essas inundações, como os piscinões (reser vatórios de águas pluviais subterrâneos de alta capacidade), mas ainda é um problema cotidiano na cidade. A falta de áreas permeáveis, a ocupação de várzeas e o tamponamento dos rios e
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GOUVÊA, José Paulo Neves. A presença e a ausência dos rios de São Paulo: acumulação primitiva e valorização da água. Tese (Doutorado em Tecnologia da Arquitetura) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo. São Paulo. 2016. P.26.
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córregos impedem que a água complete seu ciclo e assim causa imensos danos toda vez que chove em maior quantidade. Surge, por volta de 2010, um grupo que assume os recursos hídricos de São Paulo, rios e represas, como infraestrutura urbana e propõe devolver o caráter de transpor te para os rios, principalmente transpor te de carga, criando o chamado Hidroanel. O Grupo Metrópole Fluvial - Grupo de Pesquisa em Projeto de Arquitetura de Infraestruturas Urbanas Fluviais faz par te do Laboratório de Projeto do Depar tamento de Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, formado por professores, alunos e técnicos. No documentário “Entre Rios”, um dos professores coordenadores desse grupo, Alexandre Delijaicov, afirma que “A espinha dorsal dessa arquitetura da cidade são os rios. Os rios urbanos. Se a gente realmente quer resolver o problema do rio, nós temos que resolver o problema do deslocamento. É impossível fazer com que a cidade esteja de frente para o rio, se nós não resolvemos o problema de deslocamento de 20 milhões de pessoas na cidade.” 9 Assim, entendemos que a necessidade de resolver o transpor te da população, que está diretamente relacionado à priorização do veículo motorizado individual em São Paulo e à lógica da maior ofer ta de empregos no centro e a locomoção dos trabalhadores em massa da periferia para os bairros centrais. Se o transpor te de carga fosse realizado através de hidrovias e ferrovias, desafogaria a quantidade de caminhões na cidade; se houvesse maior investimento em transpor te público e deslocamentos não -motorizados, como a bicicleta, a cidade poderia ter menos vias para carros, e assim poderíamos aos poucos, retomar os rios que estão abaixo de avenidas. Nas últimas três décadas também surgiram iniciativas que visam à recuperação dos rios, como a operação Defesa das Águas (2007), que 9
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FERRAZ, Caio Silva. Entre Rios. São Paulo: Senac, 2009. 25’16’’. Disponível em:<https://vimeo. com/14770270>. Acesso em: 5 de jun. de 2019. 18’03’’.
abrange medidas da Prefeitura e Estado e Obser vando os Rios (1991), da Fundação SOS Mata Atlântica. Principalmente após a crise hídrica de São Paulo em 2014, foram criados também grupos independentes que discutem os rios da cidade, e que fazem inter venções para desper tar a consciência da população como o Rios e Ruas, fundado pelo geógrafo Luiz de Campos e pelo arquiteto José Bueno; e até blocos de carnaval temáticos de rios de São Paulo, que realizam cor tejos seguindo os caminhos dos rios, como o caso do Bloco Fluvial do Peixe Seco (desde 2014) que segue pelo Saracura (atual Avenida 9 de Julho) e o Anhangabaú, e o Bloco do Água Preta, que acompanha o córrego homônimo, na zona oeste. O trabalho desses grupos é de extrema impor tância para uma futura reincorporação dos rios na vida cotidiana na cidade, pois enquanto houver desconhecimento acerca da história e do valor das águas de São Paulo por par te da população, não haverá reivindicações populares para demandar mudanças ao poder público.
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^ Cochos no rio Pinheiros, em 1889. Autoria desconhecida.
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S o c i a b i l i d a d e e l a ze r n o s r i o s e r e p r e s a s d e S ã o P a u l o Muito antes dos colonizadores chegarem à região que hoje é a cidade de São Paulo, comunidades indígenas já habitavam o local e atribuíram nomes em tupi à diversas localidades, cuja maioria fora incorporada na língua que viria a ser o por tuguês brasileiro. “Piratininga”, “Tamanduateí ”, “Anhangabaú”, “Ipiranga”, “Tietê ”, “Saracura”, entre tantas outras denominações. Essas palavras explicam através da sua sintaxe características inerentes a esses locais, sobre sua geografia, animais que frequentavam o rio, volume de água, etc. Como afirma Ber ta de Oliveira em sua disser tação de mestrado, “a impor tância da oralidade para os povos indígenas perpassou o tempo, as fronteiras culturais e linguísticas, tendo resistido em diversas palavras e nomes como o do rio Tamanduateí e tantos outros. Os significados e origens revelam nesse caso aspectos fundamentais na constituição meândrica do rio, nas relações com as cheias, as secas, a pesca, a caça, o viver e o habitar nesse lugar.” (p.14) São Paulo, a cidade que poderia ser a cidade dos rios, da água, hoje é majoritariamente uma cidade seca e árida, a par tir de inúmeras inter venções e planejamentos urbanos que colocaram os interesses privados, a locomoção através de veículos motorizados e a política higienista acima dos interesses da população. A água toma a cidade em forma de chuva e a cidade naturalmente se alaga, por não possuir mais a área natural de drenagem que existia antes. As inundações naturais das áreas de várzea dos rios foram transformadas em enchentes, causando ao longo do último século inúmeros danos à população e à cidade em geral. Muitos não compreendem essa situação pela falta de conscientização da população sobre essa situação da cidade, por não possuírem conhecimento sobre os rios tamponados de São Paulo, e consideram os que não estão tamponados apenas como barreiras e lugares inóspitos a serem evitados. A relação da cidade de São Paulo com as águas se deteriorou ao longo da segunda metade do século XX . As pessoas que habitavam a cidade 41
naquela época já se esqueciam do passado dos rios, ou sequer tinham conhecimento sobre ele. Aos poucos São Paulo se tornava a famosa “ terra da garoa”, mas não se tinha consciência que essa água fazia par te de um ciclo maior que fora interrompido. A chuva em demasia causava enchentes que marcaram a história da cidade, e que ocorrem até hoje. As pessoas aprenderam a ver a água natural do território como algo negativo, sejam os rios associados a esgoto e barreiras físicas - como, por exemplo, a própria pejoração do termo “córrego” -, sejam as chuvas associadas a desastres ambientais. Hoje a abstração dos rios é tanta que os significados dos seus nomes perderam o sentido. Mas antes que ocorresse essa transformação, as águas que pulsavam por São Paulo eram presentes no cotidiano de todos. Para melhor entender essa relação, investigaremos brevemente o histórico dos rios mais expressivos entre os quais a cidade se desenvolveu: Tamanduateí (ou Piratininga), Anhangabaú, Tietê e a bacia hidrográfica de Pinheiros.
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^ Barcos no Rio TamanduateĂ, 1910. Foto: Vicenzo Pastore. Acer vo IMS .
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R i o Ta m a n d u a te í Durante os primeiros séculos de ocupação e formação da cidade de São Paulo, o rio Tamanduateí - anteriormente conhecido como Piratininga-, que nasce no atual município de Mauá, foi essencial para o desenvolvimento da cidade de São Paulo. A região da Várzea do Carmo, que é a planície de inundação do rio, era palco das atividades cotidianas, sendo utilizado como fonte de água, transpor te, para banho, lavagem, escoamento de produtos e também para despejos em geral. No final do século XIX , era palco de uma intensa atividade comercial, que se dava por seus mercados, como o Mercado Grande e o Mercado Caipira, cujos produtos eram provenientes dos sítios ribeirinhos transpor tados através das embarcações que serpenteavam o curso do rio, sendo escoados nos por tos ali presentes, como o cais do Tamanduateí, do Tabatinguera e Figueira. Com o início das obras de retificação do rio, a par tir de 1848, os por tos foram fechados e o rio já não faria mais par te dessa atividade comercial da cidade no final do século XIX . Juntamente com a obra de canalização do rio Tamanduateí, foi criado um Parque com ares europeus ao longo de sua várzea, chamado de Dom Pedro II, por uma junção entre a iniciativa privada com as gestões municipal e estadual da época, que justificavam as inter venções por questões sanitaristas e de enchentes, quando havia também interesses mercantilistas ao lotear as terras “ganhas” a par tir da retificação dos meandros do rio, como explica o arquiteto José Paulo Gouvêa, O crescimento populacional agravava a condição do rio e epidemias se tornaram frequentes. Nesse momento, o conhecimento científico se estabelecia como o responsável pela solução dos problemas de saúde pública. Apesar do avanço nas descober tas da microbiologia, a utilização da ideia de salubridade teve
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grande utilidade nas inter venções realizadas dos rios paulistanos. Esse discurso, tornado uma ideologia, foi muito bem explorado pelo mercado imobiliário. (p.19)
O Parque, que apesar da inter venção radical na Várzea do Carmo, alterando costumes locais e afastando a população ribeirinha, ainda mantinha o rio de alguma forma acessível até os anos 30. Encontrava-se ali a popular Ilha dos Amores, uma par te de terra que ficou ilhada durante um dos processos de retificação do rio e tornou-se um ponto de lazer no meio do Tamanduateí. Com as altas do rio e inundações ela deixou de existir. A par tir de 1930, com os projetos do Plano de Avenidas desenvolvidos pelos engenheiros Francisco Prestes Maia e João Ulhôa Cintra, e os interesses privados acima dos interesses do povo, o parque iria sofrer inter venções profundas e nunca mais seria o mesmo. O Plano consistia em implementar um urbanismo rodoviarista na cidade, propondo uma malha radial concêntrica de vias para automóveis, marginais expressas ao longo dos rios e avenidas que ocupavam fundos de vales, priorizando o transpor te individual motorizado. Antes das inter venções definitivas no Parque Dom Pedro II, houve um projeto naquela área que fazia par te de um conjunto de Parques Infantis, idealizados por Mário de Andrade durante sua gestão como diretor do Depar tamento de Cultura de São Paulo, entre 1935 e 1938 . Esses parques consistiam em locais de recreação para crianças pequenas, em especial filhos de operários e trabalhadores fora do horário escolar. Contavam com atividade de desenho, atividade física, brincadeiras e nados em piscinas. Os outros parques se encontravam na Lapa e no Ipiranga, tantos outros foram planejados e não executados. [...] aproximadamente 450 mil crianças frequentavam os Parques Infantis do Parque Pedro II , e dos bairros da Lapa e Ipiranga, onde além de assistência médica e
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“ indumentária” – isto é, distribuição de roupas entre os par ticipantes que precisassem -, eram oferecidas jogos infantis, excursões, leituras coletivas de historinhas, aulas de tricô, modelagem de argila, xadrez, entre outros. Centrado na necessidade de repensar o lazer como par te de um projeto educativo, mas também imprescindível para o for talecimento do crescimento econômico, o discurso explicita a função que o Estado deveria cumprir na provisão de espaços para a recreação e a atividade física.” (VALDES , 2019, p. 243)
O Rio Tamanduateí atualmente se encontra numa situação de completa canalização e é comprimido pela Avenida do Estado, ganhando maior aber tura na altura do Parque Dom Pedro II, até chegar à sua foz no Rio Tietê. O canal possui arrimos muito inclinados, e não há nenhuma possibilidade de se aproximar do rio, como no Rio Sena em Paris, onde há uma via para pedestres e ciclistas mais próxima a cota do rio, acessível através de rampas e escadas. As transposições são quase exclusivamente para veículos, e raras são as passarelas ou pontes para pedestres, e quando existem, são lugares inóspitos. Poucos se acercam ao rio, e poucos lembram-se dele. Um projeto de destaque que propõe uma melhor ar ticulação espacial da área do Parque Dom Pedro II, resgatando a conexão com a água, e implementação de novos equipamentos como um Sesc e um Senac, foi desenvolvido em 2011 pelo escritório UNA Arquitetos, H+F Arquitetos e Metrópole Arquitetos, juntamente com o grupo de pesquisa FAU FUPAM (Fundação para Pesquisa Ambiental FAU USP). A par tir de algumas condicionantes propostas pelo poder público municipal realizadas parcialmente como o rebaixamento da Avenida do Estado ao longo desse trecho e demolição do viaduto Diário Popular (ainda não executados), e
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a implosão dos edifícios São Vito e Mercúrio 10 , foi idealizado um projeto urbanístico que realoca o Terminal de ônibus Parque Dom Pedro II para próximo à estação de metrô homônima criando uma estação intermodal, repensa os principais eixos através de pontes para veículos e pedestres e assim, com o terreno “ganho”, cria-se grandes lagoas de drenagem, para tratamento da água do rio Tamanduateí e criação de uma grande esplanada ao longo desses lagos que permitem convivência e maior aproximação com a água do rio. Como é explicado no memorial do projeto: “Através da criação de uma infra-estrutura coerente que é a lagoa de retenção, o plano retoma, guardando os traços contemporâneos do parque, a função da várzea, criando um lugar de fruição e lazer único no Centro da cidade de São Paulo.” 11
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A expulsão dos moradores dos edifícios São Vito e Mercúrio se deu durante os primeiros anos da década de 2000, e a demolição dos prédios foi finalizada em 2011 de forma manual a um custo muito elevado, pois não era possível sua implosão, pelo impacto que seria causado no entorno. Plano urbanístico Parque Dom Pedro II. Disponível em: <http://www.unaarquitetos.com.br/site/ projetos/detalhes/188/plano_urbanistico_parque_dom_pedro_ii>. Acesso em 2 de dez de 2019.
Nesta fotografia de autor desconhecido, de 1915, por exemplo, a bacia à esquerda indica a presença de lavadeiras, o mesmo ocorre com a presença de panos nas margens dos rios em outras imagens. Ao fundo, também é possível obser var cerca de quatro pessoas banhando -se no rio. Por tanto, assim como a ex tração e a canoagem coexistiam, o mesmo ocorria entre as lavadeiras e banhistas.
^ Várzea do Carmo, 1915. Autor desconhecido.
(MARTINS, p. 32)
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^ Vale do Anhangabaú com o ribeirão canalizado a céu aber to e fazendas de chá (1897). Foto: Gaensly & Lindemann.
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Va l e d o A n h a n g a b a ú Anhangabaú12 Letra: Milene Valentir e Diga Rios (Bloco Fluvial do Peixe Seco) Quando a Cantareira ressecou Piratininga despertou É juruá com escopeta Borba Gato na cabeça É o tiro que voltou Mamãe Oxum foi desprezada Nhanderu se Revoltou Nessa terra tão banhada que seus rios canalizou Bem que Saturnino alertou Mas Prestes Maia asfaltou É juruá com motorneta O progresso na cabeça É o tiro que voltou Anhangabaú O vale das almas Ribeirão sufocado De uma selva sem calma Anhangabaú De margens tão lindas Ribeirão libertado É cidade com vida
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Enredo de Carnaval em 2015 do Bloco Fluvial do Peixe Seco
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Os córregos Augusta, Saracura, Bexiga e Itororó juntos formam o Ribeirão Anhangabaú, que por sua vez deságua no Rio Tamanduateí. O vale do Anhangabaú era visto como um obstáculo para a expansão da cidade no final do século XVIII em São Paulo, assim o primeiro viaduto da cidade, o Viaduto do Chá, foi construído em 1892, para facilitar a conexão e travessia entre os atualmente chamados Centros Novo e Velho. Durante a gestão do prefeito Antônio Prado (entre 1898 a 1911), através da recémcriada Superintendência de Obras Públicas, o córrego foi canalizado. O local desde então sofreu inúmeras inter venções, sendo a primeira delas a criação de um parque por volta da década de 1910, inspirado nos bulevares franceses, que apagava a memória do rio que passava por lá. Em 1930, o parque foi removido para dar lugar a uma via expressa que fazia par te do Plano de Avenidas de Prestes Maia. Na década de 80, a Prefeitura de São Paulo lançou um concurso para a criação de um novo parque no Anhangabaú. O projeto vencedor foi o da parceria entre os arquitetos Jorge Wilheim, Rosa Kliass e Jamil Kfouri, que propunha rebaixar as avenidas e criar um novo passeio para pedestres arborizado e com três fontes. Hoje, em 2019, o Vale do Anhangabaú é palco outra vez de uma inter venção, cujos estudos e projetos foram iniciados durante a gestão Fernando Haddad (2012-2016) e que está sendo executada na gestão Bruno Covas (2017-2020), que sem diálogo com o projeto dos arquitetos anteriores, já iniciaram as obras de demolição e implementação de um novo projeto. Desenvolvido pelo escritório SPUrbanismo, da Secretaria de Desenvolvimento Urbano, o projeto teve consultoria do escritório Gehl Architects em 2013. A nova proposta mantém o uso para pedestres, revendo os caminhos e ligações diretos entre as saídas das ruas e escadarias, sem passeios cur vos, e nas intersecções propõe “ áreas molhadas” com jatos de água iluminados. Além disso, conta com duas faixas longitudinais arborizadas e delimitadas, mantendo o meio por onde correria o córrego sem sombra. Apesar de incorporar o elemento da água, que o projeto anterior já havia feito através das fontes, não propõe trazer o córrego à super fície, e o Anhangabaú continuará canalizado embaixo da terra. 52
^ Vale do Anhangabaú em 2006. Foto: Sérgio Savarese.
^ Vale do Anhangabaú em obras (2019). Acer vo próprio.
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< Primeira Travessia de São Paulo à nado no Rio Tietê, no Clube Esperia, em 1924, que marcou a par ticipação inédita de mulheres.
> Competição de natação no Rio Tietê, no começo do séc. XIX . Autor desconhecido.
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R i o T i e tê Água do meu Tietê, Onde me queres levar? - Rio que entras pela terra E que me afastas do mar... É noite. E tudo é noite. Debaixo do arco admirável Da Ponte das Bandeiras o rio Murmura num banzeiro de água pesada e oliosa. É noite e tudo é noite. Uma ronda de sombras, Soturnas sombras, enchem de noite de tão vasta O peito do rio, que é como si a noite fosse água, Água noturna, noite líquida, afogando de apreensões As altas torres do meu coração exausto. De repente O ólio das águas recolhe em cheio luzes trêmulas, É um susto [...] Mário de Andrade (trecho do poema Meditação sobre o Rio Tietê, de 1945)
O rio Tietê, cuja nascente brota em Salesópolis, serpenteia por uma extensão de mais de 1000 km até desaguar no Rio Paraná. No começo do século XX o rio ainda mantinha sua forma natural, mas com a expansão da cidade se aproximando do Tietê, o rio era visto como uma barreira, e as discussões e justificativas sanitaristas para canalizá-lo para assim lotear as terras marginais eram cada vez maiores pelas autoridades da época, juntamente com interesses especulativos, elitistas e estrangeiros — representados pelas Companhias City e Light and Power, principalmente. Porém, esse processo não levou em conta as questões naturais de alagamento do rio, tão estudadas pelo engenheiro Saturnino de Brito e a Companhia de Melhoramentos do Rio Tietê, que tinha em mente outro projeto para as várzeas do rio, ocupando -as com áreas verdes e não avenidas impermeáveis como foram decorrente do Plano de Avenidas.
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O Tietê atravessava o município de São Paulo na direção leste para oeste. Nos anos 1920, antes de ser retificado, seu leito menor variava de 24 a 50 metros de largura, e possuía, em média, de 2 a 3 metros de profundidade. Devido à pequena declividade, suas águas percorriam lentamente 45 quilômetros entre a Penha e então bairro paulistano de Osasco, em uma várzea larga e inundável, formando inúmeros meandros divagantes, lagoas e brejos. Durante a época das chuvas suas águas subiam 5 metros acima do nível de estiagem. (JORGE, p. 35 -36)
Antes das inter venções radicais, havia algumas pontes que permitiam a conexão entre as áreas ao nor te da cidade e o centro, com destaque para a Ponte Grande, per to da qual estavam localizados o Clube de Regatas Tietê e o Clube Esperia. Da ponte e das margens era possível obser var as competições e uma grande platéia se formava para o rio. “Obser var calmamente o rio e as várzeas era algo que ocorria não só na Ponte Grande, mas em todas as pontes da cidade. Mas, em um período no qual o espor te alterava as sensibilidades, adequando -as aos ritmos e valores da vida urbana que nascia em São Paulo, o Tietê era cada vez mais, não local de contemplação, mas sim de ação, pois se transformava em gigantesca praça espor tiva [...].” (JORGE, p. 118). Uma das competições mais famosas que ocorriam no Rio Tietê atraía centenas de competidores e espectadores, era a “Travessia de São Paulo” à nado, na primeira metade do século XX . [...] a natação e o futebol, ao contrário, ganhavam rapidamente adeptos por toda a cidade, tanto praticado nos inúmeros clubes que surgiam por toda a par te, quanto nos campos, várzeas e rios, tomados pela população, incluindo -se a negra. Competindo no Rio Tietê, nadadores e nadadoras absor veram muitas atenções e receberam aplausos entusiasmados, especialmente nas disputas da “ Travessia de São Paulo a Nado”, realizadas entre 1924 e 194 4 . Percorrendo as sinuosidades do rio numa distância de 5.500 metros,
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entre a Ponte da Vila Maria e a Ponte Grande, nessa competição considerada a “ São Silvestre da Água”, equipes masculinas e femininas, em trajes especiais, atraíam uma quantidade enorme de fer vorosos torcedores, que se ajuntavam às margens do rio. (RAGO, p. 16)
Além das atividades espor tivas dos clubes como natação, pólo aquático e remo, havia pessoas que não eram sócias, em geral trabalhadores, que nadavam nas águas do rio e organizavam piqueniques e eventos às margens em seus poucos dias de folga. [...] fora dos clubes e associações bem estruturados, multiplicavam -se as práticas recreativas e espor tivas informais e improvisadas da população. Quem não podia praticar a natação nos clubes ou nos espaços destinados ao lazer nas represas, nem por isso ficava sem nadar. A natação, além de prazerosa era uma atividade muito útil na medida em que rios, córregos, lagoas faziam par te do cotidiano de todos. (JORGE, p.122)
A par tir dos anos 40, o rio passou a ficar cada vez mais inacessível à população. Com a poluição em excesso, as inter venções de retificação e posteriormente as vias expressas para carro em suas marginais terminaram por afastar completamente o Tietê da cidade. Os clubes passaram a se voltar para dentro, construir piscinas para substituir a falta do rio e as pessoas que não tinham acesso a essas associações perderam um dos maiores bens da cidade, que era um dos poucos locais de ócio acessíveis à população até então.
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C l u b e d e R e g a ta s T i e tê/ At u a l C e nt r o Es p o r ti vo T i e tê O Clube de Regatas Tietê foi fundado às margens do rio homônimo próximo à Ponte Grande em 1907. O foco inicial da agremiação era regata, mergulho e nado. Contava com trampolins e uma estrutura de madeira que era chamada de cocho, que resguardava o espaço para natação. Com o passar do tempo e devido às inter venções e poluição do Rio Tietê, as atividades foram aos poucos realocadas para o terreno adjacente que existe até hoje. Foi construída uma piscina olímpica de 50 metros de comprimento com uma torre de mergulhos em 1934. Esse espaço foi muito frequentado durante décadas, principalmente pelos membros do clube, que per tenciam às classes sociais mais abastadas da época. Em algumas ocasiões ocorriam eventos aber tos ao público mediante ingresso, como os espetáculos do grupo de mergulhadores conhecido como “Aqualoucos” 13 , que a par tir dos anos 50 faziam apresentações na piscina do Clube que mesclava saltos ornamentais com comédia e atraíam centenas de espectadores. Chegaram até a se apresentar no lago do Parque Ibirapuera e na piscina cober ta do Parque da Lapa. O clube funcionou até 2012, quando foi à falência e cedido à Prefeitura de São Paulo. As cinco piscinas presentes no espaço foram completamente destruídas em 2016, alegando que possuíam rachaduras, e no lugar foi instalado um campo de futebol com grama sintética e pista de corrida. Hoje o Clube de Regatas Tietê é um parque público com estrutura de clube aber to à população, chamado Centro Espor tivo Tietê, porém sem as saudosas piscinas. < Grupo “Aqualoucos” faz apresentação
para público na piscina do Clube de Regatas Tietê. Acer vo: Estadão.
13 Para conhecer mais sobre a história do grupo, assistir o documentário “Aqualoucos” (2017) dirigido por Victor Ribeiro.
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Bacia Hidrográfica do Rio Pinheiros O rio Pinheiros, proveniente da junção dos rios Guarapiranga e Jurubatuba (ou rio Grande), antes desaguava no rio Tietê. Quando a ocupação da cidade começou a se aproximar do rio Pinheiros e o crescimento populacional demandava maiores infraestruturas de abastecimento de energia e água em São Paulo, se iniciaram os planos de inter venções radicais na paisagem. A companhia Light and Power Company, responsável pelo fornecimento de energia elétrica da cidade iniciou obras de represamento do rio Guarapiranga em 1906, com objetivo de atender a Hidrelétrica de Parnaí ba. Uma segunda inter venção, encabeçada pelo engenheiro Asa Billings, propôs e realizou, a par tir de 1928, a retificação do rio, a inversão do seu curso e o represamento do rio Jurubatuba para a criação da Represa Billings, que funcionaria como um reser vatório. Foi criada a usina hidrelétrica Henr y Borden em Cubatão, cuja intenção era aproveitar a queda da Serra do Mar, direcionando a água da represa serra abaixo para gerar energia. Nesse mesmo ano a Represa Guarapiranga passou a funcionar como abastecimento de água potável para a cidade de São Paulo. Previamente a essas obras que modificariam a natureza do rio Pinheiros completamente, suas margens e meandros eram ocupados por pequenas olarias, algumas chácaras e clubes, como o Espor te Clube Pinheiros (originalmente conhecido como Spor t Club Germania). Assim como os clubes no Tietê, havia estruturas de madeira ao longo da margem do Rio Pinheiros para acessar o rio, como escadas, cochos e trampolins, utilizados pelos frequentadores. Na década de 1930 foi construída uma piscina ar tificial dentro do Clube Pinheiros, coincidindo com os últimos anos de rio limpo. < Imagem aérea da Espor te Clube Pinheiros, por volta dos anos 30. Acer vo: Fundação Energia e Saneamento.
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Hoje o Rio Pinheiros permanece entre marginais expressas e uma ferrovia, porém desde 2010 foram construídos mais de 21 km de ciclovia ao longo de sua margem entre o rio e o Linha 9 da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), sendo a única infraestrutura que permite uma maior aproximação da população com o rio, apesar de isolada. Semelhante aos clubes em rios, surgiram clubes de veraneio e espor tes náuticos nas represas Guarapiranga e Billings, frequentado pelas elites paulistanas, como o Yacht Clube Paulista em 1932, e o Yatch Club Santo Amaro em 1930, na época em que Santo Amaro era um município
^ Car tão Postal da Represa Guarapiranga, chamada de Riviera Paulista, no então Município de Santo Amaro.
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independente de São Paulo, e o Santapaula Iate Clube, na década de 60, famoso por sua Garagem de Barcos projetada por Vilanova Ar tigas e Carlos Cascaldi. Os dois primeiros ainda estão em atividade, porém o último encontra-se abandonado. Hoje as represas ainda possuem muitos terrenos privados e clubes ao longo de sua costa, porém existem também reser vas, parques públicos e as chamadas praias urbanas, frequentados principalmente pelos moradores da região. Durante os anos 80 e 90, o crescimento populacional exponencial da cidade de São Paulo, o elevado custo de vida em regiões centrais, a desigualdade social e a “ausência de políticas claras de uso e ocupação do solo por par te da Prefeitura do Município de São Paulo e dos municípios vizinhos” 14 causaram a expansão em direção às periferias extremas da cidade, e assim “braços” da represa, considerados áreas de proteção ambiental, foram ocupadas de forma irregular por populações carentes, muitas vezes enganadas por grileiros que cobravam pela venda de tais terras. Por falta de infraestrutura de esgoto, essas ocupações passaram a causar um grande impacto ambiental nas represas, que somado à poluição geral dos rios que as alimentam, causaram uma diminuição do abastecimento de água da Billings e Guarapiranga. Quando há risco de enchente do rio Pinheiros - que está isolado entre duas compor tas em suas extremidades – a compor ta para a Represa Guarapiranga é aber ta para vazão da água, e vice -versa. Apesar de existirem políticas com intenções higienistas através de justificativas ecológicas, com propostas extremas de total remoção da população humilde ribeirinha das represas, esforços têm sido feitos para encontrar soluções de trazer infraestrutura e qualidade de vida para esses habitantes, através de uma política habitacional que regularize as famí lias que moram junto às margens, encontrando um meio termo.
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Um pouco de História: Guarapiranga. Disponível em: <https://www.prefeitura.sp.gov.br/ cidade/secretarias/subprefeituras/capela_do_socorro/noticias/?p=7350>. Acesso em: 2 de dezembro de 2019.
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Um exemplo bem-sucedido é o projeto de urbanização do Cantinho do Céu na Represa Billings, desenvolvido pelo escritório Boldarini Arquitetos. Segundo o arquiteto Pablo Hereñu, “O projeto é fruto de uma política de recuperação urbana e ambiental das áreas de proteção dos mananciais Guarapiranga e Billings iniciada na década de 1990. A premissa fundamental dessa reformulação é qualificar os assentamentos precários por meio da implantação de infraestruturas e ser viços urbanos, da eliminação de situações de risco, da regularização fundiária e da criação de novos equipamentos e espaços públicos.” (VALENTIM , 2019, p. 398)
O projeto, cuja primeira etapa foi concluída em 2012, obteve êxito ao implementar uma rede de esgoto para os moradores da região, sendo necessária a remoção de algumas casas que estavam em áreas de risco e onde não era possível recolher o esgoto devido ao desnível insuficiente. Assim, foi criado um parque ao longo da margem que traz equipamentos de lazer como decks que permitem uma maior aproximação com a água.
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^ Cantinho do Céu. Foto: Daniel Ducci.
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^ Praia do Sol na Represa Guarapiranga (2019). Foto: Fรกbio Tito/ G1 .
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Pa rq u es d a cid a d e Dos mais de 107 Parques Municipais, que se dividem entre parques urbanos, lineares e naturais, pelo menos 65 deles possuem alguma relação com a água. Seja pela presença de uma nascente de um córrego/rio, lago/ represa, espelho d’ água ou balneário. Os parques são administrados pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA), que durante a gestão do secretário Eduardo Jorge, entre 2005 e 2012, propôs a criação de 100 parques como meta. Dos mais expressivos Parques Municipais em questão de área e de freqüência da população, estão o Parque Anhanguera, o maior de São Paulo, o Parque Ibirapuera (com um lago central que reúne o encontro dos córregos do Sapateiro, Boa Vista e Assembléia), o Parque do Carmo, Parque da Aclimação (lago abastecido pelo córrego da Pedra Azul), Parque da Juventude (córrego do Carandiru). Os lagos dos parques — geralmente represamentos em menor escala de córregos — tornam-se centralidades desses espaços públicos, que se voltam para esse corpo d’ água. No Parque do Ibirapuera inúmeras pessoas se sentam ao redor do lago contemplando -o ou no Parque da Aclimação as pessoas caminham de forma cíclica em volta da água, por exemplo. Na Represa Guarapiranga existem dezoito parques com praia urbana, sendo um dos mais populares a Praia do Sol, que chega a reunir 5 mil pessoas por final de semana 15 , além do Parque Ecológico da Guarapiranga, impor tante reser va ecológica e espaço público verde de qualidade para a população. Na Billings, há inúmeros parques públicos distribuídos por todos os municípios que a abarcam (São Paulo, Santo André, São Bernardo do
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PAULO, Paula Paiva. Conheça a praia da cidade de São Paulo que reúne até 5 mil pessoas aos finais de semana. Disponível em: < https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/01/25/ conheca-a-praia-da-cidade-de-sao-paulo-que-reune-ate-5-mil-pessoas-aos-finais-desemana.ghtml>. Acesso em 4 dez 2019.
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Campo, Diadema, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra), além das reser vas indígenas e chácaras privadas. Em São Paulo, estão o Jardim Prainha e Parque Natural Bororé, por exemplo. Ao sul da represa Billings, nos distritos de Parelheiros e Marsilac, há uma Área de Proteção Ambiental (APA) chamada Capivari-Monos, nomes dos dois rios que por ali passam, e são considerados os “ últimos rios limpos de São Paulo”. São utilizados para lazer pela população principalmente os pontos com cachoeiras, mesmo em áreas privadas que são aber tas ao público. 16
< Placa em área de banho no Rio Capivari. Foto: Marcelo Brandt/G1 .
São Paulo é hoje uma cidade com uma variada ofer ta de equipamentos de lazer que contenham água para banho ou para contemplação, como piscinas públicas, praias urbanas na represa, lagos provenientes 16
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REIS, Vivian. São Paulo tem dois rios de água limpa onde dá para nadar; veja vídeoDisponível em: <https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/sao-paulo-tem-dois-rios-de-agua-limpaonde-da-para-nadar-veja-video.ghtml>. Acesso em 4 dez 2019.
do represamento de córregos, etc. A cidade é consolidada e, por tanto, sabemos que seus rios nunca mais serão os mesmos e não retornarão as suas formas originais meândricas. Porém existe a possibilidade que vem sendo trabalhada há anos em São Paulo e outras cidades do Brasil e do mundo, que é incorporar trechos de córregos canalizados e/ou enterrados em projetos de paisagismo de parques urbanos, como os parques lineares, em diversos locais espalhados pela metrópole. Um bom exemplo é o projeto para o Parque do Bixiga, anexo ao Teatro Oficina, cuja proposta é desenterrar o córrego do Bixiga que por ali passa, e torná-lo palco e protagonista do espaço, voltando os olhares da população para a água, através de arquibancadas em suas margens.
^ Croqui para o Parque do Bexiga com trecho do Ribeirão do Bixiga aflorado. Fonte: Teatro Oficina.
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Há também quatro principais Parques Estaduais em São Paulo que incorporam o elemento da água, são eles: o Parque Ecológico do Tietê, o Hor to Florestal, o Jardim Botânico e o Parque da Serra do Mar. O Parque Ecológico do Tietê (PET), na divisa entre a zona leste de São Paulo e a cidade de Guarulhos e é um impor tante ponto de lazer da região e de preser vação de um trecho significativo da margem do rio Tietê. Segundo o arquiteto Alvaro Puntoni, no livro “Um guia de arquitetura de São Paulo”, Esse parque remonta às teses de Saturnino de Brito (1864 1929), engenheiro sanitarista que propôs em 1926, em seu relatório para melhoramentos do rio Tietê, a preser vação da orla de forma que garantisse uma área de expansão para as águas no período de chuvas, na faixa do leito maior. Esse espaço, com mais de 600 m de largura, se configuraria em um parque de caráter metropolitano. O Parque Ecológico do Tietê foi criado quase 50 anos após a tese de Saturnino ser refutada para a implantação do Plano de Avenidas, que acabou por moldar a São Paulo que conhecemos hoje — na qual o principal rio está comprimido por um sistema viário que o apar ta definitivamente da cidade.
Para resgatar a área de várzea original, a Marginal Tietê, que se transforma na Rodovia Ayr ton Senna, é deslocada consideravelmente para abarcar o parque. Esta área seria o começo de um parque linear maior chamado de Várzeas do Tietê, que acompanharia as margens do rio até chegar a sua nascente em Salesópolis, unindo -se ao Parque Nascentes do Tietê. Este projeto, coordenado pelo órgão estadual DAEE (Depar tamento de Águas e Energia Elétrica), teve início em 2011 e está ainda em desenvolvimento. O primeiro projeto para o PET foi desenhado por Rober to Burle Marx em 1974, encomendado pela Prefeitura, porém foi inaugurado somente em 1982, com um novo projeto de do arquiteto Ruy Ohtake. O parque, além de incorporar a área de várzea do Tietê e aproximar o rio dos frequentadores, também possuía um complexo aquático de piscinas muito utilizado pelos 70
moradores da região principalmente, que foi destruído em outubro de 2019. O governo estadual alegou que o estado da piscina não era passível de restauro, porém estava sem manutenção e fechada por anos 17 .
^ Foto aérea do Parque Ecológico do Tietê. Autoria desconhecida. 17
Piscinas do Parque Ecológico do Tietê são aterradas e moradores da Zona Leste de SP lamentam: ‘Lazer que faz falta’. Disponível em <3https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/ noticia/2019/10/03/piscinas-do-parque-ecologico-tiete-sao-aterradas-e-moradores-dazona-leste-de-sp-lamentam-lazer-que-faz-falta.ghtml>. Acesso em 2 de dez de 2019.
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^ Manifestação pela revisão da concessão da piscina pública do Pacaembu. Foto: Denise Boschetti.
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Pisci n as p ú b l ica s d e Sã o Pa u l o: d a s pisci n as o lím picas às pisci n as re cre ativas Nos últimos cinquenta anos principalmente, a água começa a ser reintegrada na metrópole de forma ar tificial, incorporada principalmente aos projetos de arquitetura e infraestrutura da cidade, em alguns casos retomando seu caráter positivo e social. A água foi resgatada através das mais diferentes tipologias: monumentos com fontes, espelhos d’ água em espaços públicos ou projetos arquitetônicos e paisagísticos modernistas, os lagos e represas ar tificiais dos parques, piscinas privadas, os primeiros complexos aquáticos públicos da cidade, as piscinas dos SESCs e mais recentemente dos CEUs. Cria-se inconscientemente um paralelo entre a água “planejada”, “ domada”, própria para banho, contemplação e consumo, e a água originalmente natural associada a esgoto, inacessível, reduzida à infraestrutura urbana pluvial e residual, sem qualquer caráter social, como transpor te e/ou lazer. As piscinas públicas de São Paulo começam a ser implantadas nas décadas de 40 e 50, com o Complexo Espor tivo do Pacaembu, projetado pelo Escritório Técnico Ramos de Azevedo - Severo e Villares e a Piscina Cober ta da Água Branca, projetada pelo arquiteto Ícaro de Castro Mello. São piscinas olímpicas que visam principalmente o desenvolvimento de atletas brasileiros, para competições nacionais e internacionais. Durante décadas as piscinas públicas ser viam prioritariamente a esse propósito, e somente a par tir dos anos 70 que começam a serem pensadas piscinas mais voltadas para o lazer da população como o CERET e os Centros Espor tivos (CE) da Prefeitura de São Paulo, com diferentes tipologias, as vezes formas orgânicas, e com uma profundidade menor, tornando -as mais acessíveis. A par tir dos anos 2000 são criados os CEUs, que trazem complexos aquáticos para a população das periferias, e que mudam o cotidiano dessas pessoas que nunca tinham tido acesso a um equipamento de lazer de tamanha proporção e qualidade.
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^ Salto ornamental na piscina do estรกdio do Pacaembu. Sรฃo Paulo, 1945. Foto: Thomaz Farkas. Acer vo IMS
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P i s c i n a d o C o m p l exo Es p o r ti vo d o P a c a e m b u : u m p r o j e to d e c o n s t r u ç ã o d e u m a i d e nti d a d e n a c i o n a l n o e s p o r te O Complexo Espor tivo do Pacaembu foi inaugurado em 1940, no Pacaembu, bairro nobre recém-inaugurado na época em São Paulo. Era uma região de várzea da bacia do córrego do Pacaembu, que foi canalizado como par te das obras de saneamento. Sua piscina olímpica de 50x25 metros foi a primeira piscina pública da cidade e palco de diversas competições de nado, como a dos Jogos Pan-americanos de 1963. A obra foi iniciativa da Divisão de Educação e Recreio, do Depar tamento de Cultura, que “[...] era então dirigido por Mário de Andrade e o objetivo básico de sua atuação estava voltado para a ‘Educação Social’ sobretudo de populações carentes e marginalizadas.”, segundo o estudo do tombamento do Complexo e Bairro do Pacaembu pelo CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Ar tístico e Turístico). O documento também informa que: O Pacaembu foi concebido sob o propósito do desenvolvimento e da afirmação sociocultural brasileira: um complexo poliespor tivo com as finalidades de promover a educação e prática espor tivas, sobretudo da comunidade paulistana sem acesso aos clubes privados; realizar competições e campeonatos espor tivos em escala nacional; possibilitar grandes solenidades cívicas e atividades culturais diversas, por exemplo, concer tos.
O complexo, inaugurado em plena ditadura varguista, teve um grande evento de inauguração que contou com a presença do próprio Getúlio Vargas. Começaria a par tir daí em São Paulo a criação de espaços para treino olímpico, cuja intenção era a formação de atletas, que representassem o Brasil no exterior em competições espor tivas e assim colocar o Brasil numa posição de destaque nos espor tes. Dentro do
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complexo, estava uma reprodução da estátua de David de Michelangelo 18 , como um símbolo do culto ao corpo. Além disso, as fotografias da época ressaltavam esse fator dos corpos atléticos. Na época, apenas os clubes e residências privados ofereciam equipamentos de lazer e espor te, cujo acesso era restringido àqueles mais abastados. A piscina do Pacaembu foi a primeira a ser aber ta ao público e hoje faz par te dos quase 30 Centros Espor tivos (CE) realizados e mantidos pela Prefeitura até hoje. O Complexo ainda hoje é aber to à população e sua piscina é de uso público, mediante criação de uma car teirinha que exige apresentação do RG e comprovante de residência. Porém durante a gestão João Dória (2016-2018), iniciou-se uma série de concessões de equipamentos públicos, incluindo o Estádio do Pacaembu, que está sob concessão à empresa Patrimônio SP 19 . Um movimento formado pelos frequentadores da piscina, intitulado “Paca Livre” surgiu em oposição à concessão, em defesa da continuação da gratuidade de uso e caráter público da piscina. Hoje a piscina do Pacaembu é utilizada mais para uso individual ou em pequenos grupos, visando convivência, espor te e lazer do que grandes competições como se faziam antigamente. Porém devido à profundidade de 2 metros em toda a extensão da piscina, não é ideal para crianças
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“A construção de um novo volume de arquibancadas, conhecido como o “tobogã”, fez com que a estátua do David fosse retirada dali e colocada na Praça Charles Miller, o que pode ser interpretado como um apelo à origem do esporte no mundo clássico. Em 1974, a Prefeitura transferiu a obra para o acesso principal do Centro Educativo, Recreativo e Esportivo do Trabalhador (CERET), um parque inaugurado esse mesmo ano no bairro Tatuapé. Como hipótese, podemos dizer que quem decidiu o traslado pode ter associado a estátua do David com a fachada do Parque, composta por arcos que relembram a alguns projetos arquitetônicos do fascismo italiano, como o Palazzo della Cività Italiana ou o Foro Mussolini.” (VALDES, 2019 , p. 236) PIU (Projeto de Intervenção Urbana) Pacaembu. Disponível em: <https://gestaourbana. prefeitura.sp.gov.br/estruturacao-territorial/piu/piu-pacaembu/>. Acesso em: 6 de out de 2019.
ou pessoas que nĂŁo sabem nadar. As arquibancadas sĂŁo locais onde as pessoas se deitam para tomar sol ou apenas para conversar ou contemplar a piscina.
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^ Competição na piscina cober ta da Água Branca. Fonte: DEFE Água Branca.
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P i s c i n a c o b e r ta d a Ág u a B r a n c a : u m i n c e nti vo à p r á ti c a d e e s p o r te s a q u á ti c o s c o m p e ti ti vo s Existem três complexos de piscinas administrados pelo Governo do Estado de São Paulo de destaque: o CEPEUSP (Centro de Práticas Espor tivas da Universidade de São Paulo) e os Conjuntos Despor tivos Horácio Baby Barioni na Água Branca (ao lado do Parque da Água Branca) e Constâncio Vaz Guimarães, no Ibirapuera. A piscina cober ta do Conjunto Despor tivo Baby Barioni foi projetada pelo atleta e arquiteto Ícaro de Castro Mello inaugurada em 1953, iniciativa do DEESP (Depar tamento de Educação Física e Espor tes do Estado de São Paulo), chefiada por Ícaro. O novo natatório, o primeiro complexo público para espor tes aquáticos de água aquecida, era um grande desejo da comunidade espor tiva paulista, que, no entender dos especialistas, mudaria o rumo da natação estadual e nacional. No inverno, os nadadores paulistas só conseguiam fazer “ treinos intensos de ginástica ou quando o permite a temperatura, batida de pé na borda da piscina”, o que os deixava em desvantagem frente aos espor tistas de outros estados mais cálidos do país, que podiam treinar o ano todo. A piscina pública era também, tal como assinalou Magalhães Padilha, uma fórmula de popularização dos espor tes aquáticos entre “as massas”, antes quase exclusivos para “um grupo de privilegiados” – apesar do fato de que a cidade já tinha piscinas de acesso aber to à comunidade, como a do Estádio Municipal do Pacaembu, e que vários clubes já tivesses seus próprios complexos aquáticos, como era o caso do Corinthians, o Paulistano e o Pinheiros, entre outros. (VALDES , 2019, p. 280).
Tanto a piscina do Pacaembu quanto a da Água Branca, as duas piscinas públicas de São Paulo até então, possuíam uma extensa arquibancada, 79
sendo a segunda com maior capacidade, para assistir a eventos e competições espor tivos. Apesar de serem ambas piscinas olímpicas, cujo principal intuito era ser vir de local para atletas treinarem natação, pólo aquático e saltos, as arquibancadas eram por sua vez o local de lazer e sociabilidade, que permitia com que espectadores fossem presenciar as competições e torcer. Ao longo das próximas décadas a Piscina da Água Branca contou com programação de aulas e atividades gratuitas voltadas para a população em geral que eram muito frequentadas por idosos e a piscina era, por tanto, um grande centro de convivência. Atualmente a Piscina da Água Branca encontra-se abandonada e sem manutenção assim como outros equipamentos do complexo há anos.
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^ Dia ensolarado na piscina do Parque CERET. Acer vo prรณprio.
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Piscina do Parque CERET: a maior piscina pública de São Paulo A par tir dos anos 1970, as reivindicações populares e sindicais por melhores condições de trabalho e qualidade de vida cresciam consideravelmente na região metropolitana de São Paulo, em contraste com a repressão da Ditadura Militar. Com a luta dos sindicatos começaram a implementação aos poucos de centros de espor te, cultura e lazer voltados para os trabalhadores, como os SESI (Ser viço Social da Indústria), os SESC (Ser viço Social do Comércio, e outros espaços independentes, como o CERET (Centro Espor tivo, Recreativo e Educativo do Trabalhador). É por volta dessa época que começaram a se popularizar e serem consideradas para os balneários públicos tipologias de piscinas distintas das olímpicas, as vezes com formas orgânicas como as chamadas piscinas feijão, e com menor profundidade, visando o lazer mais que o nado atlético e uma maior acessibilidade. Segundo o engenheiro de infraestrutura do Sesc, Amí lcar Filho, sobre a evolução das piscinas no Caderno Sesc de Cidadania – Lazer, Educação e Sociabilidade nas Piscinas: “Imagino que há 40 anos tentava-se reproduzir o que era um rio ou um lago sem ter a preocupação se as pessoas sabiam ou não nadar. Isso foi se transformando. Eu percebo que até em clubes isso evoluiu. A maioria dos parques aquáticos tem evoluído para equipamentos de uso geral e irrestrito, pensando em um uso mais democrático, com exceção daqueles que são voltados aos saltos ornamentais.” (2019, p10). O parque CERET - hoje denominado Parque Espor tivo do Trabalhador após mudança de gestão para o SEME em 2008 - fica no bairro do Tatuapé, na zona leste paulistana, e foi inaugurado em 1975, proveniente de um acordo entre Sindicato dos Trabalhadores com o governo de São Paulo para utilizar uma extensa área de reser va ambiental. A intenção era criar um “centro destinado à valorização do trabalhador e sua formação integral” (HIRAI, 2009, p. 65). O parque possui diversos equipamentos espor tivos, sendo de grande destaque a piscina principal, que é considerada uma das maiores do Brasil, por possuir 100 por 50 metros. É uma piscina de pequena 83
profundidade, e sua extensão e paisagismo fazem lembrar uma praia, com inúmeros frequentadores durante o verão e dias quentes, acessível de crianças a idosos. O balneário, que além da piscina principal possui duas infantis e uma semi-olímpica, faz par te da categoria de Centro Espor tivo Municipal e, por tanto é aber ta a todos, mediante uma criação de car teirinha apresentando documento e comprovante de residência.
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< Vista aĂŠrea da piscina do Parque CERET. Foto: Gabriel Cabral/Folhapress.
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^ Domingo no CEU Jambeiro. Foto: AndrĂŠ Rosso.
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C E U s e a i m p l a nta ç ã o d e c e nt r a l i d a d e s d e e d u c a ç ã o e l a ze r a c e s s í ve i s p a r a a p o p u l a ç ã o d a s p e r i fe r i a s Os Centros de Educação Unificados são complexos que englobam educação, recreação, espor te e atividades culturais, construídos a par tir de 2001 nas periferias de São Paulo, para atender a população que não tinha acesso a esse tipo de equipamento próximo às suas casas. Foram inicialmente concebidos pela EDIF (Depar tamento de Edificações/PMSP) e as 45 unidades planejadas foram divididas em duas fases de construção: na primeira durante a gestão da Mar ta Suplicy (2001 -2004), foram construídos 21 CEUs, e na segunda durante a gestão Gilber to Kassab (20072012), foram 24 CEUs. Na gestão de Fernando Haddad (2012-2016), foram construídos os CEUs Heliópolis I e II . Segundo Alexandre Delijaicov, professor da FAU USP e arquiteto do EDIF, a concepção do CEU tem origem nas Escolas -Parque, projeto de ensino do educador Anísio Teixeira nos anos 50. Apesar de serem implementados somente a par tir dos anos 2000, a criação dos CEUs já vinha sendo discutida desde a gestão de Luiza Erundina na Prefeitura de São Paulo, quando Paulo Freire era o Secretário de Educação. 20 Hoje, mais de 40 CEUs possuem piscinas coletivas em funcionamento para uso da população, basta fazer uma car teirinha da instituição levando documento de identificação. O CEU levou a possibilidade de usufruir de piscinas para a população das periferias, que antes eram somente atendidas por alguns Centros Espor tivos da Prefeitura ou poucos SESCs, como o Itaquera e Interlagos.
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Fonte: Alexandre Delijaicov: o projeto original dos CEUs (Centro Educacional Unificado). Disponível em: <https://youtu.be/Z6gWMbkqZLw>. Acesso em 26 de nov. 2019.
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Numa coluna publicada na Folha em 2003, o jornalista Alcino Leite Neto escreve:
“ Há poucas semanas, os meninos de Guaianases pularam de roupa e tudo na piscina do primeiro Centro de Educação Unificado (CEU), no dia da inauguração da escola pela prefeita Mar ta Suplicy. Foi uma festa e tanto. Alguns deles nunca tinham entrado numa piscina, como tem gente que jamais pôs os pés no mar ou se banhou num rio.” 21
O CEU é um projeto bem-sucedido de implantação de uma centralidade em regiões periféricas carentes de equipamentos básicos de educação e lazer, tornando -se uma referência na paisagem e um impor tante local de encontro. A piscina ou conjunto de piscinas simbolizam esse caráter democrático de centralidade e apresentam uma possibilidade e experiência pouco acessível antes dos CEUs às populações locais. Como explica Marcos Rosa, Como um implante, ele se torna o ponto de contato e reorganiza as relações humanas presentes em seus arredores: “o CEU constrói uma referência simbólica de identidade iconográfica do lugar público.” Insere o que até então não existia nos bairros periféricos: “a opor tunidade de você encontrar o outro, de passar da contemplação à ação. (2011 , p. 31)
Assim o conjunto de equipamentos presentes dentro dos CEUs se ar ticula ao redor de uma praça central, ocupada muitas vezes por um elemento de água como a piscina ou até um lago, como o caso do CEU Butantã, cujo projeto de implantação desenvolvido pelo escritório VD Arquitetura incorporou um córrego local, criando uma área verde onde as pessoas se reúnem em volta.
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NETO, Alcino Leite.Piscinas de Guaianases e de Hockney. Disponível em: <https://www1.folha. uol.com.br/folha/pensata/ult682u83.shtml>. Acesso em: 15 de nov de 2019.
Destaca-se a priorização da criação de espaços com água mais voltados para o lazer, principalmente através de piscinas menores e menos profundas, para uma maior acessibilidade das crianças.
v Lago do CEU Butantã. Foto: Nelson Kon.
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^ Piscina do Sesc Belenzinho (2019). Acer vo prรณprio.
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S esc O Sesc, Ser viço Social do Comércio, surge na década de 1940 como uma instituição que visa tornar acessíveis uma série de benefícios nas áreas de educação, lazer, cultura, espor te e saúde, para a população em geral das cidades, sobretudo para os trabalhadores do comércio de bens, ser viço e turismo. Dois marcos foram decisivos para o modelo de programa de Sesc que conhecemos hoje em São Paulo: a criação do Sesc Consolação, inaugurado em 1967, e o Sesc Pompéia, inaugurado em 1982. De acordo com Danilo Miranda, diretor do Sesc São Paulo, no “Caderno Sesc de Cidadania sobre Lazer, Educação e Sociabilidade nas Piscinas”, Ao longo de mais de 70 anos de existência, o Sesc ajustou suas premissas de trabalho alicerçadas em bases educativas, atento às transformações históricas, socioculturais e tecnológicas. Para cumprir tal missão, foi sendo concebida uma proposta arquitetônica que busca privilegiar os lugares de encontro e convivência, de fruição e diversidade de exercício da autonomia, entre os quais incluem -se piscinas, parques aquáticos e brinquedos molhados. (2019, p. 3)
As unidades do Sesc em São Paulo se tornaram referência por serem grandes centros de cultura e lazer com um programa diversificado acessíveis ao público, e suas piscinas se tornam referência em cada projeto, tanto pela questão do desenho quanto pelas possibilidades de lazer e sociabilidade. Dependendo das regras determinadas pela gestão do Sesc, as piscinas podem ser acessadas não só por aqueles que possuem a Credencial Plena (trabalhadores e estagiários do comércio, ser viço, turismo e dependentes), mas também para a população geral, mediante a criação da car teirinha de usuário, política que não está em vigência desde 2014, devido à alta demanda. 91
No livro “As Imagens da imagem do Sesc”, a autora Solange Ferraz de Lima faz uma investigação extensa à respeito da construção da imagem da instituição Sesc e em um subcapítulo dedicado às piscinas analisa como as mesmas eram representadas ora vazias para “enaltecer” a arquitetura, ora cheias de frequentadores (2014, p. 173). Além disso, Lima constata a impor tância do Sesc para tornar esse equipamento de espor te e lazer mais acessível para a população; Se a piscina está presente no imaginário popular associada a prazer e ócio, privilégio apetitoso para o tempo livre, também se mostrou escassa na realidade urbana paulistana para a grande maioria. A ofer ta de espaços públicos com piscina em uma cidade como São Paulo, de verões rigorosos, sempre ficou aquém das demandas. O Sesc figura como exceção ao prover, desde o Centro Social Carlos de Souza Nazareth, praticamente todas as suas unidades com esse equipamento. A representação fotográfica nos livros institucionais do Sesc guarda as características formais das imagens de piscinas presentes no cinema e nas propagandas e estabelece, por essa via, a empatia necessária à valorização positiva das realizações institucionais. A diferença fundamental dessas imagens de piscinas em relação àquelas veiculadas no cinema e nas propagandas é o referente concreto. De fato, as unidades Sesc podem oferecer, para uma ampla parcela da população urbana paulista, acesso a esse sonho de consumo. (LIMA , 2014, p. 17 7)
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^ Croqui de Lina Bo Bardi do Sesc Pompéia, com a adição de uma piscina a céu aber to no terreno anexo. Fonte: “ Lina Bo Bardi - Sutis Substâncias da Arquitetura”, de Olivia de Oliveira.
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Sesc Pompéia O Centro de Cultura e Lazer Sesc Fábrica da Pompéia é criado em 1977 pela arquiteta Lina Bo Bardi com os arquitetos Marcelo Ferraz, André Vainer e Marcelo Suzuki, e inaugurado em 1982. Este Sesc ocupa um antigo conjunto de galpões industriais, muito comuns a par tir dos anos 40 no bairro da Pompéia, num terreno de 16500 m² adquirido pela instituição nos anos 70. A fábrica possuía uma ruela interna que foi mantida, com uma inclinação natural em direção ao córrego da Água Preta, que hoje passa canalizado no final do terreno. Marcando o trajeto do córrego está uma galeria de águas pluviais que é tamponada por um deck de madeira utilizado como solário. No livro “Lina Bo Bardi – Sutis Substâncias da Arquitetura” de Olivia Oliveira, é possível encontrar concepções iniciais do Sesc Pompéia que incorporavam o córrego no projeto. Segundo a autora, Em 1978 , o conjunto espor tivo vinha pensado como uma ilha, cercado de águas por todos os lados. Numa planta geral, duas flechas indicam o caimento das águas, recolhidas pelas canaletas laterais da rua central, que irão desembocar no córrego das Águas Pretas, agora alargado e transformado em “rio”. Uma frase de Lina esclarece sua intenção: “O rio São Francisco é cheio de ilhas”. A forma e tratamento dado ao bloco espor tivo nesses primeiros estudos, com o edifício rodeado de água, também sugerem a de um navio, mais especificamente ao “Gaiola”, cujo nome alude tanto à típica embarcação a vapor que navega pelas águas do rio São Francisco como à idéia de armação feita com rede metálica utilizada por Lina. (2006, p. 225)
Essa ideia, se concretizada, contribuiria para o reconhecimento do córrego e resgate da interação com a água do rio, que está hoje esquecido por grande par te da população. Além disso, traria o elemento água disponível para o público, como permite o espelho d’ água do Sesc 24 de Maio — que será discutido mais à frente —, no terreno árido do solário. 95
Desde os primeiros desenhos, diversas passarelas ondulam por todo o edifício reafirmando o movimento da água presente em todo o conjunto, como se todo ele fosse líquido. Como cachoeiras, essas passarelas escorrem de cima a baixo no interior dos galpões e seguem a correnteza do rio através das ruas entre os galpões, desembocando numa grande piscina ao ar livre. Lembremos que apesar de a piscina não ter sido construída, esse mesmo lugar será mais tarde batizado por Lina de “praia”. (Ibidem, p. 222)
Diversas idéias de incorporar o elemento água foram cogitadas para o Sesc Pompéia, além do córrego. Lina imaginou uma grande piscina ao ar livre que mimetizasse as cur vas de um rio no terreno contíguo ao atual, caso fosse anexado. Também foi pensada uma parede de cascata próxima ao deck e a torre da caixa d’ água, local hoje conhecido como “praia urbana”. Porém entraram no projeto final de fato apenas o espelho d’ água - alegoria do Rio São Francisco - dentro do galpão de convivência, e a piscina fechada dentro do edifício de conjunto espor tivo. Apesar da água não ficar tão evidente no projeto final do Sesc Pompéia, ela esteve presente em sua concepção. “Água como elemento fer tilizante que refresca, purifica e traz vida. A água aqui parece ainda cumprir um papel metafórico do sangue que circula, irriga e traz vida ao corpo humano, esse vermelho -sangue também sempre acumulado nas gárgulas e nos elementos de passagem dos edifícios de Lina que se apresentam como reser vas inesgotáveis de vida.” (Ibidem, p. 233). Vida essa que é expressa pelos freqüentadores, principalmente através das crianças que brincam nos diversos espaços do Sesc. Crianças são essenciais quando se pensa em espaços lúdicos e de lazer, e a água propulsiona essas atividades. “Água e criança são duas palavras que caminham de mãos dadas no imaginário de Lina. São inúmeras as referências encontradas em textos e obra: o rio São Francisco ser ve para que as crianças brinquem de pescaria; o chuveiro ao ar livre e a grande roda d’ água refrescam os dias de calor e são desenhados em movimentos, com crianças ali se diver tindo.” (Ibidem, p.232). Talvez se o espelho d’ água do Sesc Pompéia 96
fosse ao ar livre como o do Sesc 24 de Maio, veríamos uma situação parecida com adultos e crianças molhando seus pés e se entretendo com a água. O Sesc Pompéia consolida-se então como um dos mais expressivos centros de convivência, cultura e lazer que emana vida e ar te,tornando -se o “Centro de Lazer – Fábrica da Pompéia” em sua inauguração e “Cidadela da Liberdade”, nome oriundo da exposição homônima sobre o mesmo em 1999. Sua criação foi um divisor de águas na concepção de novas unidades do Sesc e na filosofia e propósitos da instituição como um todo. v Crianças brincando de “pesca” no espelho d’ água do Sesc Pompéia (197 7). Foto: Antonio Saggese.
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v Piscina na cober tura do Sesc 24 de Maio. Foto: Ciro Miguel.
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S e s c 24 d e M a i o No ano 2000, Paulo Mendes da Rocha propôs um projeto de piscina pública suspensa que ocupasse a Praça da República no Centro Novo de São Paulo, que não chegou a ser aplicado. “Como obser vado por Guilherme Wisnik, [...], a ideia presente na Proposta para a Praça da República tomou forma, de cer ta maneira, na cober tura do novo Sesc 24 de Maio.” 22
> Concepção de Paulo Mendes da Rocha para seu projeto de piscina pública que ocupasse a Praça da República.
Com a inauguração do Sesc 24 de Maio – fruto da parceria entre Paulo Mendes da Rocha e o escritório MMBB – em 2017, consolida-se no Centro Novo de São Paulo um impor tante marco para as infraestruturas de lazer aquáticos. Independente da estrutura pré -existente do antigo edifício ocupado ergue -se uma piscina na cober tura, sustentada por quatro grandes pilares que chegam até as fundações. Essa piscina, de uso reser vado para aqueles que possuem a credencial do SESC (funcionários de ser viço e comércio e seus dependentes), possui 25x25 metros com um círculo vazado no centro, por onde a água cai para o piso inferior com a movimentação da água. Como um oásis no meio do centro árido, a
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Cidade para Todos. Disponível em: https://www.itaucultural.org.br/ocupacao/paulomendes-da-rocha/concepcao-de-cidade/. Acesso em 23 de nov de 2019.
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piscina se destaca entre as cober turas dos vizinhos, e funciona como uma rara fonte de água própria para banho. O andar que se encontra abaixo, denominado “Jardim da Piscina”, possui um espelho d’ água - de 15cm de profundidade aproximadamente - que acompanha todo o perímetro da fachada de esquina do edifício, funcionando como uma barreira para que as pessoas não se aproximem do guarda-corpo. A questão é que desde que esse SESC foi inaugurado, as pessoas passaram a se apropriar desse espaço para molhar os pés no espelho d’ água, ou até para “mergulhar” no caso das crianças. Em uma entrevista para o site Galeria da Arquitetura, Paulo Mendes da Rocha reflete: “O que interessa mesmo na arquitetura é amparar a imprevisibilidade da vida, entende? Eu estou vendo, por exemplo, uma criança pulando dentro d’ água de um lugar que não era pra pular na água. Mas tudo isso tem sua graça.” 23 Em dias quentes os espelhos d’ água tornam-se um refúgio para se refrescar, acessível a qualquer pessoa que subir naquele andar. A escassez literal de espaços com contato direto com a água no centro e na cidade em geral torna-se clara a par tir dessa apropriação pelos usuários. Mendes da Rocha comenta em outra entrevista: “Esse andar, ao contrário, é todo livre. É continuação da piscina. O mais interessante na minha opinião de tudo isso, como diversão e educação, é como se você estivesse flutuando dentro da cidade, não é? ” 24 A contemplação da cidade através da combinação entre o usufruto da água e altura é algo que só é possível através da ver ticalização dos espaços. No Sesc 24 de Maio é possível nadar nas alturas no meio de São Paulo. As piscinas em cober turas de edifícios não são novidade no centro, a primeira provavelmente foi o Edifício Louvre, de Ar tacho Jurado, nos anos
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Entrevista SESC 24 de Maio - Paulo Mendes da Rocha + MMBB Arquitetos | Galeria da Arquitetura. 2018 (4m40s) Disponível em: <https://youtu.be/VfkeBvKc_iI>. Acesso em 10 de set de 2019. 24 Entrevista Tour Paulo Mendes da Rocha pelo SESC 24 de Maio - Casa Vogue Brasil. 2018 (5m48s). Disponível em <https://youtu.be/mLrsQT0SxTw>. Acesso em 10 de set de 2019.
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50 e depois dele tantos outros empreendimentos par ticulares fizeram o mesmo. Porém o Sesc 24 de Maio com sua piscina e espelho d’ água se destaca por tornar essa experiência mais acessível à população.
v Espelho d’ água do Sesc 24 de Maio. Acer vo próprio.
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Consid e ra ções f i n a is Muito foi lido, escutado e vivenciado para que este trabalho pudesse ser desenvolvido, e parte do que foi assimilado durante essa trajetória não entrou no corpo do texto, mas trouxe muitas reflexões, aprendizados e novas percepções. Uma piscina suspensa como um oásis no meio do centro árido de São Paulo — a piscina do Sesc 24 de Maio — foi o ponto de partida para investigar o tema das águas na cidade de São Paulo. A partir daí o rumo da pesquisa se direcionou para investigar locais acessíveis que proporcionam a aproximação e interação com a água para lazer e convivência entre as pessoas, tanto através de pesquisas e fotografias, quanto visitas à campo. Essas vivências atravessaram uma gama diversa de lugares: os Sescs 24 de Maio, Belenzinho e Pompéia, a Praça Clóvis Beviláqua, o Parque CERET, o Vale do Anhangabaú, a piscina do Pacaembu, a exposição Jardinalidades (2019) no Sesc Parque Dom Pedro II, entre outros. Como parte da programação desse projeto Jardinalidades, a equipe educativa propôs uma expedição pela Várzea do Carmo, que levantou questionamentos sobre como a cidade se transformou em relação à seus rios e quais intenções e acontecimentos estavam por trás disso. Este Trabalho de Conclusão proporcionou uma compreensão mais ampla sobre a cidade de São Paulo sob a ótica dos corpos d’ água presentes em sua geografia, clarificando a formação e desenvolvimento da metrópole guiada a partir de lógicas político-econômicas cujas intenções sempre estiveram alinhadas com interesses das elites econômicas e que trouxeram graves consequências até os dias atuais. À medida que a cidade se expande com o crescimento populacional exponencial e por conta dos interesses imobiliários, espaços para ócio, sociabilidade e lazer, que muitas vezes se dão em áreas verdes, começam a ser limitados e reduzidos. Com as reivindicações e conquistas trabalhistas e populares presentes nas últimas décadas aumentaram o número de espaços desenvolvidos e criados cujo propósito é trazer uma melhoria na qualidade de vida da população, que anseia por locais de encontro, de lazer, de esporte e de respiro na cidade. 103
Foi preciso entender que lugares são esses e como se dão as interações e apropriações dos espaços especialmente para sociabilidade e lazer. A intenção foi buscar as raízes das relações da população com a água através de estudos e fotografias sobre o tema, com a tentativa de compreender o imaginário que existe sobre uma imagem de São Paulo com uma relação mais harmônica para com os rios presentes, onde as pessoas podiam usufruir das suas águas. A partir daí foi feita uma investigação sobre a evolução urbana que constrói a cidade atual, os equipamentos e infraestruturas criados ao longo do último século em São Paulo, que se tornam espaços muito requisitados de lazer e sociabilidade, e sobre as livres apropriações e manifestações da população para reivindicar mais lugares como esses ou recuperá-los. Nesse sentido, as piscinas abertas à população são espaços que resistem numa cidade que constrói cada vez mais condomínios fechados com piscinas particulares. São lugares onde é possível vivenciar a água coletivamente nos espaços públicos, nos quais a convivência e respeito às diferenças entre os cidadãos são essenciais para usufruir o espaço. A cidade ainda está de costas para seus rios e córregos, e só haverá mudanças nessa lógica quando a população reivindicar esses espaços novamente, e para isso são necessárias tanto ações de conscientização quanto à existência, valor e importância desses corpos hídricos — como as realizadas por coletivos independentes — quanto o incentivo político e econômico, para realizar projetos que incorporem os elementos de água tanto em escalas pontuais como urbanas, para que a população possa usufruir desses espaços e compreender os benefícios que trazem à cidade em geral. Só assim a população como um todo se voltará de frente para as águas. Os espaços públicos de acesso democrático são uma verdadeira ferramenta de transformação social, e a água é um elemento potencializador desses espaços, contribuindo tanto para a convivência entre as pessoas e melhoria na qualidade de vida, quanto para uma melhor condição e preser vação ambiental da cidade. 104
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A g r a d e c i m e n to s às minhas famí lias argentina e brasileira, em especial à minha mãe Alicia; à minha orientadora e professora Ligia; a meus professores que me acompanharam nesse TC, Amália, Glória, Pedro, Eduardo e Giulia; a meu companheiro, Andre; à amiga e revisora do texto, Gabriella; aos queridos Ana, Camila, Pedro, Larissa, Paula, Uli, Mariana, Luiza, Otávio, Diego, Leandro, Allan, Camila, Yumi, Brunna, Débora, Natália, Eduardo, Mably, Breno, Paloma, Julia, Laís, Conrado, Maria Clara, Pedro, Stella, Graziela, Giulio, Diogo, Rafaela, Guilherme, Gabrielli, André, Clarissa, Thiago, Sergio, Annabel, Rogério, Marina, Thais, Mateus, Alexandre, Ricardo, Zilda, Edinalva, Paulo, Toto, Fifi e Liz; aos colegas, professores e funcionários da Escola da Cidade, Unibo e Mackenzie; e à todos que ajudaram e contribuíram com esta pesquisa, seja com alguma conversa, imagem ou informação; com vocês completar essa trajetória e concluir este trabalho foi mais leve, gratificante e enriquecedor. Obrigada pela companhia, compreensão, apoio e encorajamento - com isso me ajudaram a tornar tudo isto possível.
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Capa F o to a c i m a : R i o P i n h e i ro s , e m 1 9 2 6 . A u to r d e s c o n h e c i d o . A c e r vo : At h l e t i c a d e S ã o P a u l o . R e p ro d u ç ã o : A c e r vo M I S . F o to a b a i x o : P i s c i n a d o S e s c B e l e n z i n h o . F o to : a c e r vo p ró p r i o . F o n te s d a c a p a : Love l o e N u n i to S a n s F o n te d o m i o l o : P o p p i n s To d o s o s e s fo rç o s fo ra m fe i to s p a ra i d e n t i f i c a r o s d i re i to s a u to ra i s e d e i m a g e m n e s te Tra b a l h o d e C o n c l u s ã o d e C u r s o . D e ze m b r o d e 2 0 1 9 .