Tempo Livre Março 2010

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24-02-2010

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Visitas Guiadas

Quanto tempo o tempo tem Visita ao Teatro Maria Matos guiada por Mark Deputter

SÃO QUATRO DA TARDE. Na fachada do Teatro Municipal Maria Matos, em Lisboa, há um grande telão com a fotografia de um cronómetro de cozinha antigo. Mark Deputter está dez minutos atrasado para a visita guiada que me vai fazer do teatro que dirige desde há um ano. É irónico este atraso ocorrer num teatro cuja programação, entre Janeiro e Abril de 2010, é subordinada ao tema do Tempo. Ainda por cima trata-se de um belga que faz esperar um português. Não deveria ser ao contrário? É, afinal, um equívoco. Ingénuo, eu esperava na entrada principal, virada para a Av. de Roma. Mark Deputter estava ao virar da esquina, onde qualquer trabalhador dum teatro combina um encontro: a entrada de artistas. Mark já esperou em muitas entradas de artistas. Durante oito anos, foi responsável por uma geração inteira de artistas europeus terem atravessado pela primeira vez a entrada de artistas do STUC, centro cultural da cidade de Lovaina. Em 96, chegou a Lisboa, com os seus pertences no porta-bagagens do carro, para ajudar na organização do festival Danças na Cidade. Uma década depois, o festival passou a chamar-se Alkantara e é o mais importante evento de artes do palco em Portugal. 42

TempoLivre

| MAR 2010

Mark Deputter

São quatro e um quarto. “Este é o caminho que eu faço todos os dias”, diz Mark, franqueando a porta de correr antiga que sobreviveu às obras de remodelação do teatro, realizadas há quatro anos. Hoje é o dia de folga de Mark Deputter e a directora de cena do teatro, Rita Monteiro, surpreende-se de o ver entrar. “Não há propriamente um horário. É a natureza deste trabalho. Embora haja planos da autarquia para implementar o hábito de picar o ponto nos teatros municipais, o que é absurdo”, desabafa Mark, enquanto galga os três lanços de escadas que levam ao seu pequeno gabinete iluminado por luzes fluorescentes. “É aqui que passo oitenta por cento do meu tempo”. Sorri quando aponta para a mesa onde estão o computador e o telefone, as suas ferramentas de trabalho essenciais, como as de qualquer empregado de escritório. Diz que “as pessoas têm uma ideia um bocado romântica da vida dum teatro” e sorri outra vez. São quatro e meia da tarde. Mark Deputter é um homem de sorrisos. Agora é a vez do sorriso traquina. “Vou mostrar-vos um caminho secreto que só quem trabalha aqui é que conhece. Nem os artistas o podem utilizar”. Saindo do gabinete, percebo que se trata realmente de uma passagem secreta porque todas as setas que dizem “palco”, “camarins”, “sala de ensaios” ou “foyer” apontam para a direita. Nós vamos para a esquerda. Uma porta ao fundo dum corredor dá para as escadas interiores de um prédio e, aí, uma segunda porta oferece passagem para o balcão da plateia do teatro. Num instante, reencontramos o ambiente romântico do teatro. “É mágico, não é?”. Agora é um sorriso de mistura de deslumbre e orgulho. Quinze metros acima da plateia, temos uma vista panorâmica sobre o palco, onde está prestes a começar um ensaio. “Adoro este momento antes de


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