
7 minute read
Bordamos para incidir arpillera como expressão política de mulheres no Brasil e no Chile
131
Bordamos para incidir: arpillera como expressão política de mulheres no Brasil e no Chile
Advertisement
Resumo: Mulheres de diferentes lugares vêm utilizando costuras e bordados como forma de se expressar politicamente. Em Altamira, Brasil, e em Santiago, Chile, grupos se dedicam à criação do bordado arpillera. As peças são expostas com o intuito de provocar reflexões. Mas, é no momento de sua criação que debates de gênero mais profundos são travados. Trago, neste ensaio, um olhar angulado e focado nos detalhes de algumas arpilleras que acessei na realização de pesquisas de campo.
Palavras chave: mulheres, bordado arpillera, Brasil, Chile.
We embroider to focus: arpillera as a political expression of women in Brazil and Chile
Abstract: Women from different places use embroidery as a form of political expression. In Altamira, Brazil, and in Santiago, Chile, groups create arpillera embroidery. The pieces are exposed to provoke reflections. But it is at the time of its creation that deeper gender debates are waged. In this essay, I present an angled look and focused on the details of some arpilleras that I accessed in the course of my research.
Key words: women, arpillera embroidery, Brazil, Chile
1 - Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS-Unicamp) Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) ralyanara@gmail.com http://lattes.cnpq.br/8913197481120011 http://orcid.org/0000-0002-4650-391X
Linhas, tecidos, agulhas e tesouras. Estes materiais relacionados à costura e ao bordado compõem minha trajetória de vida e orientam meu olhar. Quando criança, eu costumava auxiliar minha mãe nas atividades que ela desenvolvia com a costura e com o bordado, e compartilhava da alegria que ela sentia ao ver as peças, manualmente produzidas, serem trocadas por dinheiro. Ainda jovem, me tornei uma costureira ágil e muito requisitada na confecção que minha mãe gerenciava ali mesmo, no quintal de nossa casa. Sempre encarei a costura e o bordado como atividades laborais que exigem destreza, agilidade e continua resistência física. As seguidas horas sobre uma desconfortável cadeira, atrás de uma máquina e sob o som orquestrado de seu motor me apresentou uma perspectiva singular da vida. Já adulta, cursando mestrado e doutorado, procurei me dedicar ao pensar-fazer da costura e do bordado bem como da antropologia, me aproveitando então dessa perspectiva.
Neste movimento, ampliei alguns sentidos que extrapolavam minhas experiências e meu modo de compreender tais atividades. Comecei a pesquisar costuras e bordados com conteúdo artístico e político. Desde 2016, acompanho mulheres que se expressam, através do bordado, contra os prejuízos que a Usina Hidrelétrica de Belo Monte provocou no médio/baixo Xingu, especialmente na cidade de Altamira — PA. Elas vêm transformando retalhos de tecidos com criatividade, agulha e linha em narrativas sobre o cotidiano. Tais narrativas denunciam experiências de violência, assim como perdas socioambientais diretas ou provocadas indiretamente pela construção de grandes barragens.
Ao se reunirem para bordar, elas elaboram o trauma da perda e deslocamento forçado — refletindo sobre sua nova condição de vida em áreas de reassentamentos coletivos; fortalecem sua coesão enquanto grupo; e alimentam a consciência de sua condição de gênero. Esses processos acrescentam aos bordados, enquanto objetivação de seu modo de expressão, o sentido de denúncia feminina. Em face dessa realidade, venho pesquisando sobre os usos e sentidos da arpillera, tal como vem sendo praticada por mulheres impactadas por barragens no Brasil.
Ressalto que tais peças criadas no Brasil, adotam a linguagem do bordado homônimo chileno. Ele surgiu em Isla Negra, Chile, por volta de 1960 e poucos anos depois se tornou uma das expressões artísticas e políticas adotadas por Violeta Parra. Posteriormente, no contexto de repressão militar no Chile, instalada por Augusto Pinochet em 1970, grupos de chilenas encontraram na arpillera uma forma de denunciar as violências sofridas, fazendo do bordado uma ferramenta política para dar visibilidade às vítimas daquela ditadura e denunciar a repressão. Muitas vezes, munidas com retalhos retirados das roupas de seus familiares desaparecidos, vítimas do regime denunciavam os abusos através do bordado (BASIC, 2012).
Atualmente, o coletivo de mulheres ativistas que formam o “Memorarte: arpilleras urbanas” segue bordando. Por meio delas, o grupo denuncia experiências de violências de gênero, violações ambientais e de Direitos Humanos que ocorrem no Chile, no Brasil e na América Latina em geral. Enquanto forma de expressão considerada historicamente feminina, as costuras e bordados são ressignificadas e se tornam ferramentas políticas de denúncia feminista.
Conheci o grupo Memorarte em agosto de 2019 no Chile, quando participei do II Encontro de Arte Têxtil organizado por ele — ocasião em que realizei breve incursão de campo. Nesse momento, discutimos sobre as peças de arpilleras que estão sendo criadas no Brasil a partir do viés feminista e de luta política contra a Belo Monte e demais empresas energéticas, bem como o histórico de resistência chilena denunciado em formato de bordado.
Esse texto foi criado a partir dos impactos que as arpilleras causaram em mim. As peças de bordado são repletas de detalhes e, para ver e compreender cada uma delas, considero que é preciso olhar bem de perto. Por isso, optei por uma construção narrativa que apresenta as minúcias do que eu vi e vivi quando estive entre as bordadeiras do Memorarte, e atingidas por Belo Monte. Trago esses detalhes na escrita desse texto, pois minha condição de costureira foi muitas vezes acionada em ambos os
espaços. Por outro lado, ativo os detalhes dos bordados destacados nas fotografias como um convite para olhar grandes projetos, como ditaduras e empreendimentos hidrelétricos, a partir do bordado e das bordadeiras.
Destaquei esses detalhes, por intermédio da fotografia, durante as pesquisas de campo realizadas em 2019 e 2020. Eles mesclam o que se chama de artesanato, arte, linguagem e técnica, com política e feminismo. As arpilleras são expostas a grandes e pequenos públicos, sempre com o intuito de provocar reflexões e discussões. O chamado empoderamento feminino, e o fim das violências de gênero são pontos relevantes e sempre presentes nas peças e exposições.
Por outro lado, as arpilleras são sempre criadas coletivamente, pelo pensar-fazer de muitas bordadeiras. Por vezes, há mais que duas mãos tocando, furando e costurando os tecidos. Mediadas pela temática de cada peça, é no momento de realização dos bordados que as mulheres, em seus corpos interseccionados, expõe angústias, perdas e traumas vividos. No momento da concepção dos bordados, os mais variados debates ocorrem. Tais momentos podem ser lidos como terapêuticos. Sobretudo, enfatizo que a criação coletiva das arpilleras é capaz de cerzir os rasgos feitos no tecido social, provocando emancipação, consciência de gênero e engajamento político.














144 Narrativa visual sobre o parto humanizado: “O renascimento de Dany” — Empoderamento feminino através da fotografia de parto. Leila Patricia de Lima Irineu ¹ Co-autora: Sabrina Ruiz Bronzatto ²
Resumo: O ensaio visual apresentado surge como resultante de parcerias estabelecidas durante uma pesquisa que está sendo realizada sobre a fotografia de parto humanizado em Natal/RN. juntamente com o trabalho fotográfico de Sabrina Bronzatto, a proposta é observar o parto humanizado e, através de uma estética alternativa, entender como se dá a autonomia das mulheres em relação às suas escolhas no momento do parto.
Palavras chave: humanização. Parto . Fotografia, empoderamento
Visual narrative about humanized childbirth: “Dany’s rebirth” — Women’s empowerment through childbirth photography.
Abstract: The visual essay presented appears as a result of partnerships established during a research that is being carried out on humanized birth photography in Natal / RN. With the photographic work of Sabrina Bronzatto. The proposal is to observe humanized childbirth and, through an alternative aesthetics, understand how women are empowered in relation to their choices at the time of childbirth.
Key words: humanization, childbirth. Photography, empowerment.
1 - Núcleo de Antropologia Visual — NAVIS/UFRN Mestranda PPGAS UFRN limalpatricia@hotmail.com http://lattes.cnpq.br/1050798726417715 https://orcid.org/0000-0002-6194-0368
2 - Graduada em Ciências Biológicas (UFRGS), Mestra em Psicobiologia — Estudos do Comportamento (UFRN), Doula e Fotógrafa de parto e de família na Equipe Moara — Gestação e Parteria sabrinabronzatto@yahoo.com.br http://lattes.cnpq.br/1830269930449413 https://orcid.org/0000-0002-5473-5278