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Cessão, não sessão, seção
163 Cessão, não sessão, seção
Resumo: Feito para integrar uma pesquisa praxiográfica para o mestrado em Psicologia Social e Institucional/UFRGS, o seguinte trabalho fotográfico apresenta Savannah, Dominadora Sádica; centurião, seu submisso; e eu, pesquisadora e fotógrafa cúmplice em uma cena de práticas do universo BDSM combinadas previamente entre nós. Pelo viés feminista proposto por Donna Haraway, a atuação da pesquisadora se mostra como situada e parcial mediante a produção da fotografia como dispositivo de análise reflexiva.
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Palavras chave: sexualidade, fotografia, corpo, BDSM
Cession, not session, section
Abstract: Made to compose a praxiographic research for the mastering degree in Social and Institutional Psychology/UFRGS, the following photographic work presents Savannah, Sadic Dominant; centurião, her submissive; and I, researcher and accomplice photographer in a scene of practices from the BDSM universe previously negotiated between us. Due to the feminist perspective of Donna Haraway, the researcher’s performance is exposed as situated and partial through the production of photography as an apparatus of reflexive analysis.
Key words: sexuality, photography, body, BDSM
1 - Mestranda em Psicologia Social e Institucional/UFRGS e pesquisadora do NUPSEX (Núcleo de Pesquisa em Gênero e Sexualidade), raquelbasilonecel@gmail.com, http://lattes.cnpq.br/6646397186060088, https://orcid.org/0000-0003-0249-9637
O seguinte trabalho fotográfico integra a pesquisa praxiográfica que vem sendo conduzida desde 2017, para o mestrado em Psicologia Social e Institucional/UFRGS, em uma comunidade de praticantes de BDSM em Porto Alegre/RS.
BDSM, cujo acrônimo significa Bondage/Disciplina, Dominação/ Submissão, Sadismo/Masoquismo, tem suas práticas inseridas em um universo mais amplo denominado kinky sex², no qual a hierarquia entre as posições é uma marca distintiva. As negociações, nesse âmbito, ao mesmo tempo em que reforçam a consensualidade, implicam na verticalização da autoridade envolvida, dividindo praticantes entre Tops, bottoms e Switchers³.
Sendo eu adepta de tais práticas desde antes do início da pesquisa, apresento-me como pesquisadora que estuda o assunto a partir de um olhar situado (HARAWAY, 1995). Entendendo que a ciência se faz em uma produção de conhecimento que nunca é neutro, afirmo a parcialidade do saber como visão feminista em que o papel da ética e da responsabilidade na pesquisa implicam em desconstruir a própria dicotomia criada para o papel de pesquisadora. Como participante de comunidades de praticantes, meu acesso a determinadas práticas e conhecimentos como pesquisadora foi facilitada, mas também fez com que a análise precisasse ser instrumentalizada com certas estratégias de modo a produzir estranhamento e deslocamentos da posição de insider. A fotografia foi uma delas, na medida em que atuou como forte dispositivo de análise reflexiva. Como pesquisadora encontro-me, então, convocada a pensar sobre as práticas pesquisadas e minha própria prática de produção de conhecimento.
Na realidade que os cliques da câmera produzem, participam: Savannah,
2 - Kinky sex deliberadamente não traduzido pela insuficiência de uma palavra em português que alcance sua abrangência, poderia ser compreendido como um amplo leque de fetiches, fantasias e/ou perversões. Leite Jr (2000) aborda esse universo de práticas desviantes das “normais” como contraponto às formas de sexo convencionais, denominadas “baunilha”.
3 - Sendo Top quem ocupa a posição de controle (podendo ser Dominador/a, Sádico/a, etc.) e bottom quem o entrega a quem conduzirá as práticas (submisso/a, masoquista, escravo/a, etc.). A grafia em maiúscula e minúscula é demarcadora da diferença hierárquica, sendo que nesse contexto os apelidos também seguem esse padrão. Switcher é quem ocupa qualquer das posições, relacionalmente ao vínculo estabelecido, estando geralmente em apenas uma das posições em uma relação determinada.
Dominadora Sádica; centurião, seu submisso; e eu, pesquisadora e fotógrafa cúmplice na cena combinada previamente entre nós. O nome escolhido para o presente ensaio se compõe com três palavras que, ainda que tenham a mesma sonoridade, multiplicam-se em seus significados: ‘cessão’ evoca a entrega do corpo às práticas e sua plasticidade, não como em uma ‘sessão’, que é como se nomeia a prática “avulsa” no BDSM, (ou seja, sem estar em uma relação de longa duração), ainda que produzido em um trabalho acadêmico para a ‘seção’ de fotografias da dissertação.
Fazer um trabalho fotográfico para a dissertação performou⁴, desde o momento das combinações, uma maneira bastante particular de pesquisar. Dentre os detalhes combinados, destaco o pedido provocativo da Savannah para que eu fosse também participante junto a ela, mesmo que apenas tirando fotografias, reforçando o caráter não neutro da minha presença — o que foi consentido por centurião, tendo como limite sua exigência de anonimato. Nesse sentido, a câmera, acoplada à visão da investigadora, atuou registrando e expondo a cumplicidade da participação da pesquisadora no evento.
A sequência aqui mostrada narra corpos, humanos e não humanos, multiplicados em cada acoplagem. Multiplicam-se por entrarem em cena objetos (chicotes, sapatos, roupa militar e macacão, cordas, pinças, bacia, água e gelo) que passaram por deslocamentos de seus usos e técnicas para performar estímulos no corpo sexuado dentro do contexto erótico (como o spanking⁵, torturas nos mamilos, jogo com temperatura⁶, bondage⁷). (PRECIADO, 2014) Pelo caráter de uma expressão de sexualidade que questiona o convencional, sua política traz também o peso da estigmatização que sofrem, historicamente, seus praticantes. (RUBIN, 2003)
4 -Utiliza-se performar, aqui, como uma tradução possível para enact, termo amplamente utilizado pela autora Annemarie Moll (2002), para indicar que as práticas fazem, bem como são reiteradas iterativamente, o tempo todo.
5 -Spanking é a técnica do espancamento erótico, feito mediante negociações de consensualidade e visando não gerar nenhum dano permanente.

Referências
HARAWAY, Donna. Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, n. 5, p. 07–41, 1995.
MOL, Annemarie. The body multiple: Ontology in medical practice. Duham and London: Duke University Press, 2002.
PRECIADO, Paul. B. Manifesto contrassexual. São Paulo: n-1, 2014.







Postais para outra história da arte
Resumo: Este ensaio busca suscitar reflexões e discussões acerca das relações lésbicas na nossa sociedade e, igualmente, observar como foram retratadas na história da arte. As imagens apresentadas fazem parte de um projeto mais amplo desenvolvido no instagram @lesbicafeminista.
Palavras chave: Lésbicas. História da Arte. Feminismo.
Postcards for another art history
Abstract: This essay seeks to raise reflections and discussions about lesbian relationships in our society and to observe how they were portrayed in art history. The images presented are part of a broader project developed on instagram @lesbicafeminista.
Key words: Lesbians. Art History. Feminism
1 - Mestra em Artes Visuais — História, Teoria e Crítica de Arte / UFRGS bolsa CAPES, conclusão em 2019 liviauler@gmail.com http://lattes.cnpq.br/3315548770040845 https://orcid.org/0000-0002-5484-3295