Folha do Sul Gaúcho Ed. 1093 (29/11/2013)

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GERAL Crônica

Antônio Almeida

As Vozes Que Ouvi Toda a história precisa ser recuperada independentemente da sua maior ou menor importância. É com o resgate dos fatos, fragmentos e momentâneos que efetivamente se pode lançar novos olhares e entender a dinâmica das engrenagens que movimentam o mundo. Olhar, perceber e entender aquilo que em determinado momento foi presente, nos torna críticos. Ali estão escritos os hábitos, os costumes, a moda, a política, a literatura e todo um mosaico de acontecimentos que adornam essa gigante tela chamada mundo. Trazer a tona esses fatos é como abrir a tampa de uma panela na qual está sendo preparada deliciosa iguaria. Recentemente, através da mágica experiência do cinema, pude me dar esse luxo. Com a parceria do Edison Larronda, Paulo Renato Pinheiro e Tom Peres, corri atrás de algo que sempre me encantou, o rádio. Dessas reminiscências todas, vindas da quase remota infância, trago dentro da memória músicas, narrações de futebol, notícias e comerciais. Creio ter sido nessa época que comecei a desenvolver a soberana arte da imaginação onde, a todo custo, tentava descobrir o cheiro que tinha a alma, nesse caso o sabonete Alma de Flores. Preocupava-me também o destino que certos personagens tomavam durante o curso das rádionovelas, o prenuncio de tempestades com intensos trovões e o acelerado tropel de cavalos. Intrigava-me sobremaneira como uma caixinha tão pequena podia conter tanta diversidade de vida. Assim, movido por singular desejo, saí à caça desses raros sobreviventes de uma época encantada onde as facetas artesanais, por necessidade, se sobrepunham à escassa tecnologia. Aos poucos, fomos descobrindo coisas, mergulhando na mente de cada um desses personagens que, efetivamente, nos deram mais atenção do que aquela que merecíamos. Ouvir Mário Lopes, Mário Codevila, Edegar Muza, Sebastião Pereira, Vacionir Lopes, Alcides Martins, o professor Tidão, Sivaldo Souza, Claudiran Nunes, Aristides Kucera e tantos outros por eles resgatados, nos fez bem. Recuperamos um fragmento da história do rádio em Bagé, um presente que deixamos, porque As Vozes Que Ouvi podem, agora, para sempre serem ouvidas. av_almeida@yahoo.com.br

SEXTA-FEIRA 29 de novembro de 2013

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Filme Ricardo Belleza

Serra Pelada (Brasil-2013)

Drama brasileiro com toques de filme de gangster, dirigido por Heitor Dhalia. Dois amigos decidem deixar São Paulo para se aventurarem em busca de fortuna no garimpo amazonense de Serra Pelada, no final da década de 70. Eu realmente curti este filme. Primeiro, porque sempre tive curiosidade sobre o que acontecia nesse famoso garimpo. Na época, lembro-me das capas das revistas estampando aquele formigueiro humano, aquele caos. E, segundo, porque se sabia que tinha muita bandidagem lá e prostituição também, um garimpo daquela magnitude era o inferno na terra, pior que aquilo só uma guerra. Neste filme tudo isso é mostrado, e do jeito que eu gosto, com realismo. Os dois antagonistas vividos por Matheus Nachtergaele (Coronel Carvalho) e Wagner Moura (Lindo Rico) dão show de interpretação deixando os protagonistas Juliano Cazarré (Juliano) e Júlio Andrade (Joaquim) meio ofuscados. O grande porém deste filme está na falta de originalidade do roteiro que, embora siga muito os passos do ótimo “Cidade de Deus” (2002), de Fernando Meirelles, dando a dinâmica necessária para contar a epopeia no garimpo, lembra em muito a clássica versão de Brian de Palma para “Scarface”. Deixando de lado esses deslizes, o filme realmente me encantou por trazer uma violência forte, digna de clássicos exploited que, infelizmente, estamos acostumados aqui no Brasil. Outro ponto alto de “Serra Pelada” é a música brega da época, os carros setentistas com placas amarelas, o dinheiro inflacionado daquele tempo e o figurino. A brasilidade étnica de Sophie Charlotte, que interpreta a personagem Tereza com longos cabelos cacheados, talvez faça com que aumente o número de “gringos” lotando os voos internacionais para o Brasil. Serra Pelada é isso: garimpo, prostituição e bandidagem, um retrato meio hollywoodiano para ser exportado exatamente para eles, basta saber a classificação que será dada para o filme lá na terra do tio Sam.


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