Caderno

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EDITORIAL Seja para ingerir e hidratar o corpo, higiene pessoal ou limpeza, a água tem muitos benefícios e é essencial no dia a dia de todos nós. Por isso, preservá-la é também uma missão, no cuidado e revitalização das fontes para garantir o abastecimento no futuro. Neste terceiro mês de publicação do caderno Projeto Nascentes, promovido pela Folha do Mate e Terra FM, com empresas parceiras, abordamos o processo da água da Companhia Riograndense de Abastecimento (Corsan) até chegar nas torneiras das residências. No interior, o abastecimento das propriedades conta com água captada por meio de poços artesianos, a maioria deles administrados pelas associações hídricas. Nesta publicação, você também pode conferir como funciona o processo de implantação de um poço artesiano e o perfil de um morador preocupado com a revitalização e limpeza do nosso maior potencial hídrico: o Arroio Castelhano. Uma união de esforços para garantir a qualidade dessa preciosidade da natureza. Boa leitura!

EXPEDIENTE EDIÇÃO: Cassiane Rodrigues DIAGRAMAÇÃO: Luana de Andrade CRIAÇÃO DE ANÚNCIOS: Rodrigo Kist DEPARTAMENTO COMERCIAL: Édipo de David, Júlio Hoffmann, Kinha Heck, Lunara Reiter e Paula Carvalho FOTO DA CAPA: Débora Kist REVISÃO: Rui Borgmann Empresa Jornalística Folha do Mate Ltda CNPJ 98.597.719/0001-56

2 OPINIÃO

Uma parceria que deu certo POR VOLNEI ALVES CORRÊA*

Divulgação

Desde 2015, quando transferi minha residência para Venâncio Aires, que tenho me ocupado com a busca de soluções para as grandes questões ambientais a nível municipal. Eu era, na época, presidente do Instituto de Sustentabilidade e Resiliência, uma instituição voltada para estudos, pesquisas e elaboração de projetos que visam à solução dos grandes problemas ambientais. Quando aqui cheguei, o município e todo o Estado do Rio Grande do Sul, estavam em pleno processo eleitoral, o que nos levou a contatar os candidatos postulantes à Prefeitura para que tomassem conhecimento de nossos objetivos. Como estavam em plena campanha eleitoral, procuramos a direção do Jornal Folha do Mate, consultando sobre a possibilidade de integrantes do Instituto participarem de um debate, ao vivo, que se realizaria na sede do referido jornal. Neste encontro, entregamos a cada um dos candidatos ou seu representante uma carta, onde se debateram seis temas de atuação a serem trabalhados: agricultura sustentável, cidades sustentáveis, infraestrutura e integração regional, gestão de recursos naturais, redução das desigualdades sociais e ciência e tecnologia para o desenvolvimento sustentável. Eleito o novo prefeito, sugerimos a criação de um grupo de trabalho integrado por representantes de todas as secretarias municipais, para que se pudesse detalhar quais as ações a serem implementadas para cada um dos temas escolhidos. Todos os temas foram analisados, mas no tocante à Gestão de Recursos Naturais, foi dado prioridade, por escolha do grupo e sugestão do empresário Adilor Adams, da Empresa Redemac, que se procurasse diagnosticar a situação do Arroio Castelhano.

Por que o Arroio Castelhano?

Pelo fato de que este Arroio abastece mais de 90% da população urbana do município de Venâncio Aires, em sua extensão de mais de 105 km. Ele começa em Linhas Data e termina no Rio Taquari, atingindo uma área de 608 km quadrados, abastecendo a população rural e toda sua produção agrícola e pastoril. Feito o primeiro diagnóstico, foi constatado uma grande área de assoreamento, intervenções no sentido direcional do leito, na época visando reduzir o efeito das enchentes, e redução progressiva da Mata Ciliar. A principal causa do assoreamento foi o uso inadequado das margens do arroio, 29 de maio de 2021

O ARROIO CASTELHANO ABASTECE MAIS DE 90% DA POPULAÇÃO URBANA DO MUNICÍPIO

bem como o lançamento de agrotóxicos e outros detritos em seu leito. Já a intervenção foi uma ação do Governo Federal que procurou retificar o leito do arroio, para reduzir as constantes inundações. Finalmente a redução da mata ciliar, além de favorecer o assoreamento, eliminou árvores, cujo grande objetivo é reter em suas raízes água que, posteriormente, em tempos de seca é retorna aos diferentes tipos de leitos de água doce. Apesar destas causas já bastante preocupantes, o que mais nos chamou a atenção foi o fato de o Arroio Castelhano ser alimentado, além da água das chuvas, por nascentes, em sua grande maioria proveniente do Aqüífero Guarani. Sendo os arroios, em sua grande maioria, intermitentes, ou seja passíveis de desaparecimento, pareceu-nos mais importante tratar das nascentes. Segundo estudos já realizados, se aproximadamente 30% das nascentes que abastecem um leito secarem, o mesmo poderá acontecer com o Arroio. O número de nascentes conhecidas, quando começamos o trabalho era em número de oito, localizadas, principalmente em Linhas Data. Contudo, após estudos de mapas hidrográficos, pesquisas bibliográficas e visitas in loco, chegamos a identificar mais de duzentas nascentes. Deste número bastante elevado de nascentes identificadas, já foram devidamente recuperadas dezessete. Como se chegou a este resultado? Através de parcerias público-privadas. Inicialmente foi conseguido um recurso junto a Corsan, através do Convênio Gestão dos Recursos Hídricos. Uma segunda fonte foram recursos conseguidos pelos Rotarys Clube de Venâncio Aires, através da participação

na seleção de projetos ambientais patrocinado pelo Banco Sicredi. A evolução no processo de recuperação, foi o fato de que em duas das nascentes recuperadas com o recurso conseguido pelo Rotary Club Chimarrão, foi incluída a análise qualitativa da água antes e depois da recuperação. Considerando que dois clubes de serviços conseguiram recursos junto à uma instituição bancária, porque não se buscar outras organizações para financiar este projeto? Apenas para citar o ramo do fumo, cinco fumageiras tem suas sedes em Venâncio Aires. O fumo é produzido na área rural do Município, considerado um dos maiores produtores de fumo do Estado do Rio Grande do Sul. Os produtores, provavelmente, têm em suas terras uma ou mais nascentes. Porque não se fazer mais uma parceria, onde os Rotarys seriam os pleiteadores dos recursos, adquirindo os materiais que seriam repassados para a equipe da Prefeitura realizar a recuperação, enquanto as fumageiras seriam as financiadoras? A água também é utilizada pelos arrozeiros, bem como para os demais produtos agrícolas. As grandes empresas de Venâncio Aires são grandes consumidoras de água. Elas pagam, contudo ter um maior volume de água eliminaria a necessidade de abrirem e manterem poços artesianos. Saint Exupery em seu livro Fernando Gaivota, faz um comentário que eu gostaria de repassar neste texto: ’’o futuro não é tanto onde queremos ir, mas o caminho que estamos construindo’’. Identificar as nascentes foi o início, começar a recuperá-las esta sendo o caminho que pretendemos construir. *ADMINISTRADOR E CONSULTOR AMBIENTAL

Folha do Mate


3 CORSAN

O caminho da água potável até chegar nas torneiras Juliana Bencke POR CASSIANE RODRIGUES

Antes de chegar até a casa dos consumidores e estar pronta para o devido consumo - seja para ingestão ou higiene -, a água que chega até as torneiras passa por diferentes processos em um percurso determinado. A Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) conta com 315 quilômetros de rede hídrica em Venâncio Aires. Depois de captada e tratada na Estação de Tratamento de Água (ETA) da Corsan, que fica no bairro Morsch, a água é distribuída para dois sistemas de reservatórios. Quando sai da ETA, vai para os reservatórios que ficam na rua Jacob Becker, próximo ao Colégio José de Oliveira Castilhos. São duas estruturas de 250 metros cúbicos de água. Dali, o percurso segue para o sistema 3, que fica na rua Visconde do Rio Branco, no bairro Cidade Alta. No local, são três estruturas, com 150, 300 e 500 metros cúbicos. Esse sistema também conta com três reservatórios menores que auxiliam no bombeamento da água até as residências: eles têm 30, 10 e 3 metros cúbicos. Marta Fagundes da Silva, agente de tratamento de água da ETA, afirma que toda a água que chega na casa dos consumidores faz este mesmo percurso. “O reservatório da ETA não tem ligação com as casas. Ele só capta e armazena a água que vai para os outros reservatórios para a distribuição”, explica. Folha do Mate

Além desses pontos, a Corsan conta com dois poços artesianos, que ficam na rua Emílio Michels. “Esses dão suporte ao abastecimento, mas o que mantém é a estação de tratamento, que bombeia 160 litros por segundo para abastecer os reservatórios”, garante. Marta afirma que, quando há necessidade de manutenção nos reservatórios, a equipe procura fazer o trabalho durante a madrugada, para que o abastecimento não seja afetado. As estruturas passam por limpeza rotineira e se procura sempre fazer em sincronia, para que o abastecimento não seja afetado. A rede passa por vistoria semanal para análise da qualidade da água. No caso de falta de energia ou parada na captação por algum problema no reservatório 1 da ETA, as residências não são afetadas por pelo menos quatro horas. “Tudo depende do horário, tem alguns horários em que o consumo é bem superior a outros. Por isso, programamos as manutenções para evitar problemas”, observa. Atualmente, a ETA tem parada diária de uma hora, das 4h às 5h, sem prejudicar o abastecimento. O sucesso do processo também depende do nível de água do Arroio Castelhano, que é de onde a água é captada. “No verão, tivemos alguns problemas em virtude do nível mais baixo e não conseguimos bombeamento suficiente”, recorda.

RESERVATÓRIO 1, QUE FICA NA ETA, ABASTECE DEMAIS SISTEMAS DE BOMBEAMENTO EM PONTOS ESTRATÉGICOS DA CIDADE

AUTOMATIZAÇÃO Marta salienta que hoje a Corsan conta com um sistema todo informatizado, o que permite identificar problemas de vazamento, por exemplo, antes mesmo de desabastecer as residências. Com o sistema da telemetria, é possível fazer o monitoramento dos níveis de água em cada reservatório. “Podemos verificar onde está mais baixo e já acionar a equipe de manutenção para identificar possíveis vazamentos e resolver o problema”, esclarece. Ela enfatiza que a automatização veio só para auxiliar, pois antes a falta de abastecimento era descoberta somente quando faltava direto no consumidor final, que entrava em contato. “Isso mudou, e vem melhorando, desde a instalação da ETA convencional, pois conseguimos visualizar muito bem o que acontece pelo sistema”, considera. No mês de abril, a produção de água por meio da estação de tratamento da Corsan de Venâncio Aires foi de 340.506 metros cúbicos. A média diária ficou em 11.350 metros cúbicos. A Estação de Tratamento de Água, no bairro Morsch, é de estrutura ‘convencional’ e está em operação desde 2002. Antes, a água era tratada na antiga ETA, de estrutura ‘compacta’, no Acesso Grão-Pará, junto ao Arroio Castelhano. 29 de maio de 2021


4 POÇOS ARTESIANOS

Associações hídricas abastecem comunidades do interior POR CASSIANE RODRIGUES

Enquanto na cidade a maioria das residências são abastecidas pelo sistema da Companhia Riograndense de Abastecimento (Corsan), no interior a água captada por meio de poços artesianos leva água para as propriedades. A opção do poço artesiano é também muito comum em empresas, que utilizam um volume elevado de água nos processos produtivos e, por esse motivo,

investem no poço próprio. Em Venâncio Aires, segundo dados informados pela Vigilância Sanitária, são 65 redes hídricas cadastradas atualmente, que levam água para utilização de uma população estimada de em torno de 11 mil pessoas. A maioria está localizada no interior e administrada por diretorias eleitas para o desempenho da função.

Associações Hídricas - População consumidora estimada NOME POPULAÇÃO Associação Hídrica de Linha Cecília 120 Associação Hídrica de Linha Duvidosa 105 Associação Grupo Comunitário do Poço Artesiano de Linha Grão-Pará 291 Associação Abastecedora de Água de Linha Tangerinas 197 Associação Abastecimento de Água Linha Cerrito 171 Associação Abastecedora de Água de Linha Rincão de Souza 242 Associação de Abastecimento de Linha Terezinha 197 Associação de Água de Linha Santana 54 Associação do Grupo do Poço Comu. de Vila Teresinha Grupo dos Onze 46 Associação do poço artesiano 25 de Julho - Vila Terezinha 103 Associação dos Agricultores e Agricultoras de São João do Herval 148 Associação Hídrica Arroio Grande 54 Associação Hídrica Canto do Cedro 148 Associação Hídrica Estância São José 314 Associação Hídrica União Sadia 137 Associação Hídrica Água é vida 222 Associação Hídrica Água Viva 111 Associação Hídrica Alto 25 de Julho 74 Associação Hídrica Amizade 83 Associação Hídrica Aparecida 257 Associação Hídrica Centro Linha Brasil 228 Associação Hídrica Cruzeiro do Sul 100 Associação Hídrica de Vila Arlindo 165 Associação Hídrica Estância Mariante 359 Associação Hídrica Flor do Campo 37 29 de maio de 2021

Associações Hídricas - População consumidora estimada NOME POPULAÇÃO Associação Hídrica Florestal 100 Associação Hídrica Herval Mirim 63 Associação Hídrica João Guttenberg 100 Associação Hídrica Linha Andréas 100 Associação Hídrica Linha Herval 519 Associação Hídrica Linha Isabel 114 Associação Hídrica Linha Travessa 268 Associação Hídrica Maria Madalena 162 Associação Hídrica Nossa Senhora dos Navegantes 148 Associação Hídrica Nossa Senhora do Perpétuo Socorro 97 Associação Hídrica Pedro Manoel Dutra 63 Associação Hídrica Picada Castelhano 125 Associação Hídrica Picada Nova 200 Associação Hídrica Primeiro de Março 83 Associação Hídrica Riograndense 97 Associação Hídrica Santa Catarina 137 Associação Hídrica Santa Emília 157 Associação Hídrica Santa Tecla 148 Associação Hídrica São Francisco poço 01 704 Associação Hídrica São Francisco poço 02 470 Associação Hídrica São João Bombeiro 134 Associação Hídrica São João de Santa Emília Capoeira Grande 371 Associação Hídrica São Jorge 143 Associação Hídrica São José 276 Associação Hídrica São Marcos 328 Associação Hídrica São Miguel 123 Associação Hídrica São Pedro 177 Associação Hídrica Serrana Vila Deodoro 165 Associação Hídrica Travessão do Gamba 148 Associação Hídrica União de Linha Sapé 148 Associação Hídrica União Linha Santana 63 Associação Hídrica Unidos de Linha 17 de Junho Alta 117 Associação Hídrica Vertente Natural 63 Associação Hídrica Vila Palanque 656 Associação Hídrica 9 de Junho Picada Tatu 34 Associação Hídrica 22 de Janeiro 94 Associação Hídrica 25 de Julho 120 Hídrica Cerro dos Bois 274 Salta z da Funasa e PMVA 100 Sociedade Hídrica Linha Alegre 103

Folha do Mate


5 HÍDRICA SÃO JORGE

Estrutura completa para garantir água de qualidade para moradores de Linha Travessa POR CASSIANE RODRIGUES

Em Linha Travessa, a Associação Hídrica São Jorge, abastece, desde agosto de 2001, as propriedades da localidade. Atualmente, são 55 associados – sendo que cinco são sócio-fundadores, que pagam mas não usufruem da captação. Os demais sócios pagam R$ 20 por mês para a utilização de até 15 mil metros cúbicos de água em 30 dias. Há 10 anos, a diretoria da associação é composta por Renato Fotos Kinha Heck

TUBULAÇÃO É TODA EM INOX E FICA EM ESTRUTURA DE ALVENARIA

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Sehnem (presidente), Eldo Stertz (secretário) e Holdimar Darci Weber (tesoureiro). “Eu sempre digo que aqui não tem um presidente, mas sim uma diretoria que trabalha junto, e dá muito certo”, destaca Sehnem. O presidente ressalta que logo que assumiu foi feita a obra para construção de uma estrutura moderna e que atendesse os padrões exigidos. “Acredito que é a única do município dessa forma, com a estrutura de captação em inox”, completa. A construção de alvenaria com energia elétrica e piso abriga o motor que bombeia a água, a tubulação de inox e o equipamento injetor de cloro, no qual o dosador insere a quantidade certa de cloro automaticamente. O poço, que fica localizado em espaço cedido na propriedade de Alziro Heinen, tem 65 metros de profundidade. A análise e acompanhamento da qualidade da água é feita pela química Ligiane Weber, que também é moradora da localidade e sócia da hídrica. A água bombeada pelo poço abastece uma caixa d’água que fica próximo do local e depois segue até as residências pela tubulação. “Ter uma água igual temos aqui é um privilégio”, destaca Sehnem. A cobrança da taxa mensal é feita

GERENTE DA CONDUSVALE, LUIS PAULO WITZ, E MEMBROS DA DIRETORIA DA ASSOCIAÇÃO SÃO JORGE DURANTE VISITA NO LOCAL DO POÇO

POÇO ARTESIANO ABASTECE CAIXA D’ÁGUA, QUE TRANSFERE ÁGUA PELOS CANOS ATÉ AS RESIDÊNCIAS

pelo tesoureiro, que também faz a leitura do relógio e fica responsável pelos encaminhamentos de manutenções, quando necessárias. A quantidade estipulada para utilização de cada sócio é de 15 mil metros cúbicos por mês. No caso de exceder essa quantidade, o morador para R$ 1 a cada litro excedido.

VISITA

Nesta semana, a Folha do Mate esteve em Linha Travessa para conhecer a estrutura da Associação Hídrica São Jorge. Na ocasião, o gerente administrativo da Condusvale, empresa apoiadora do Projeto Nascentes, Luis Paulo Witz, acompanhou a visita. 29 de maio de 2021


6 Fotos Débora Kist

PRESERVAÇÃO

O guardião do Castelhano POR DÉBORA KIST

Ele já percorreu os cerca de 100 quilômetros do maior manancial de Venâncio Aires. De ‘cabo a rabo’, conhece todas as curvas naturais e os desvios feitos pela ação do homem. Sabe onde são os pontos mais rasos e os mais fundos. Já pescou, em outros tempos, as traíras mais carnudas e até dourado. Como um pai zeloso que cuida bem do filho, também sugere e já tomou as próprias atitudes quando julgou necessário. Esse é Pedro Paulo Führ, 67 anos, aquele que pode ser considerado um guardião do arroio Castelhano. Pedro ‘Fia’, como é chamado (na pronúncia apressada do sobrenome tremado), nasceu para os lados de outra barranca, de outro arroio. Natural de Cruzeiro do Sul, nos limites do Sampaio, veio para Venâncio com apenas dois anos, depois que o pai, Arlindo, começou a trabalhar na Venax. Na década de 1950, a família se instalou na várzea do Castelhano, local ao norte da rua Sete de Setembro, a última nesse lado da cidade. Hoje, seria nas imediações da rua Getúlio Vargas. Mas, há cerca de 60 anos, onde tudo era só campo, moravam os Führ, os Mayer (que deu origem ao nome Vila Mayer) e a família de Pedro Grünhauser (que hoje é nome de rua no bairro União). Tão logo trouxe a família, Arlindo já tratou de levar o filho 29 de maio de 2021

PEDRO FÜHR: MAIS DE 60 ANOS DE CARINHO PELO CASTELHANO

Pedro dentro de um caíque, uns caniços e passavam horas, todos os sábados, sobre as águas do Castelhano. “Dava piava, jundiá, carpa, traíra e até dourado. Hoje não tem mais nada”, conta o pintor aposentado, saudoso dos tempos de um arroio recheado de peixes e cuja água se bebia direto, com a mão. Vale lembrar que ainda hoje mais de 50 mil pessoas bebem dessa água, mas depois que ela é tratada e distribuída pela Corsan.

PREOCUPAÇÃO

O gosto pela pescaria não foi o único herdado do pai. Pedro conta que Arlindo sempre o aconselhou a

plantar árvores. “A gente comia uma fruta, o pai dizia: vamos largar a semente, que daqui uns anos outros vão poder comer e reflorestar também, daí a beira do arroio fica protegida.” Já adulto, Pedro foi trabalhar em Boqueirão do Leão, oportunidade que conheceu a nascente do arroio, em Linha Datas. Da região serrana até o rio Taquari, onde o Castelhano desemboca, são cerca de 100 quilômetros, já percorridos pelo aposentado de barco. “Mas tem lugar que não tem mais como passar, de tanto galho, entulho ou só cascalho. Onde já tinha seis metros de fundura, hoje tem 30 centímetros”, relata.

PEDRO JÁ ‘CRAVOU’ DEZENAS DE SALSEIROS ÀS MARGENS DO ARROIO

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Respeito pela natureza Pedro estudou só até a quinta série na escola Monte das Tabocas, mas carrega um conhecimento invejável sobre meio ambiente e botânica. Muitas das árvores frutíferas e outras tantas que se identificam na área da várzea, entre o começo do Acesso Grão-Pará até o arroio, foram plantadas por ele. Há espécimes de cedro, pitanga, angico, salseiro, laranjeiras, bergamoteiras, limoeiros e bananeiras. Tem fruta o ano todo Atento à limpeza do arroio, já perdeu a conta de quanto lixo e ‘tudo que se pode imaginar’ tirou ou encontrou na água. “Pneus, plástico, boi, capivara, ovelha, cachorro e gente que morreu, seja afogada ou por outro motivo”, relata.

CURIOSIDADES

um casamento a bordo de um Fusca, bateu na cabeceira da ponte e o veículo caiu dentro do arroio. “Vi uma moça baixando e subindo na água, era fundo, gritando por socorro. Me joguei atrás e consegui arrastar ela até a borda.” Apesar de um ferimento grave na perna, Pedro conta que a mulher lamentou muito outro fato. “Ela tava mais preocupada com o sapato, que perdeu na água”, lembra, entre risos. Há 65 anos morando na parte baixa da cidade, o aposentado destaca que a força do Castelhano o surpreendeu em 1974, quando viu a maior enchente da sua vida. “Foi água até no Clube Leituras.”

“Muita gente me pergunta porque me preocupo tanto com o Castelhano. ‘Tu ajuda e outros destroem’ me dizem. Mas é uma das coisas que mais gosto. Não é pra mim é pra quem vem depois e vai ajudar a cuidar.”

FUTURO

Levado pelo pai, As décadas ao Pedro já navegava no redor do Castelhano Castelhano desde que também guardam aprendeu a segurar histórias curiosas e uma vara de pescar. uma aconteceu nos Assim foi com os filhos PEDRO PAULO FÜHR anos 1970, quando a dele, Marlon (37 anos) Pintor aposentado ponte principal era um e Paulo (que faleceu pouco antes de quem muito jovem, com seguia no sentido sul-norte do acesso. apenas 19 anos). Naquele tempo, o traçado do arroio Agora, ele diz que a meta é levar ainda não havia sido desviado para o afilhado, João Vitor, 6 meses, e o a construção da antiga Estação de primeiro neto, João Pedro, de 3 meses. Tratamento de Água (ETA). “Eu gostaria muito de levar eles. Era uma madrugada de sábado Por mim, assim que eles estiverem para domingo e Pedro e um maiorzinhos, quero levar pra ensinar amigo pescavam no hoje chamado a pescar, plantar umas frutas e cuidar ‘Castelhano velho’, quando ouviram da natureza. Vou ensinar tudo sobre o um estouro. Um casal, que voltava de arroio.” Folha do Mate

LIXO AINDA É JOGADO ILEGALMENTE NA VÁRZEA DO CASTELHANO

NA CURVA DO ARROIO, AO PÉ DESSA ÁRVORE, POR ANOS PEDRO AMARRAVA SEU CAIAQUE QUANDO PESCAVA

29 de maio de 2021


8 Cassiane Rodrigues

ÁGUA POTÁVEL

Processos e exigências para instalação e regularização de poços artesianos POR CASSIANE RODRIGUES

Embora mais comum no meio rural e para abastecimento de empresas, a instalação de poços artesianos é alternativa para quem quer ter captação de água diretamente na residência. Mesmo que pareça algo simples, para que a instalação seja possível é preciso seguir uma série de exigências regulamentadas por órgãos estaduais, que determinam normas que devem ser observadas. Proprietário da RB Poços, Juarez Alberto de Oliveira, o Beto, explica que quando o cliente procura a empresa para a instalação, o primeiro passo é pedir a licença ambiental, que é cedida pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), após cadastro realizado no Sistema de Outorga de Água do Rio Grande do Sul (SIOUT) pelo geólogo, com os dados do cliente e finalidade de uso da água. “Hoje, é tudo feito de forma on-line. Antigamente, tínhamos que ir a Porto Alegre e chegava demorar até seis meses para ter a liberação”, salienta. Oliveira ressalta que a obtenção da licença pela internet foi uma das suas conquistas enquanto presidente da Associação dos Perfuradores de Poços Artesianos e Afins do Rio Grande do Sul. Ele presidiu a entidade por quatro anos e, hoje, é vice-presidente. “Nós questionamos o Governo do Estado sobre a demora. Muitas indústrias precisavam da água e não podiam esperar tanto tempo para conseguir solicitar a captação”, comenta. 29 de maio de 2021

ANÁLISE

Com a licença, a análise do solo é feita por um geólogo, que determina se o local indicado está apto para receber a estrutura para geração de água potável. A equipe também se baseia por dados que apontam os locais mais indicados para captação de água. O Mapa Hidrogeológico do Rio Grande do Sul, que é entregue a todas as empresas habilitadas para perfuração de poços, também indica as especificidades do solo em cada região do território gaúcho. “No mapa, podemos visualizar as regiões para obter melhores resultados, vazões e, até mesmo, a qualidade de água. Uma série de coisas que temos como controlar antes mesmo da perfuração”, enfatiza. O órgão disponibiliza uma licença prévia, para que seja possível fazer a instalação. Depois disso, é feita a análise de qualidade da água, que determina se ela é própria para consumo e, então, encaminhado o pedido de outorga, o que dá direito de utilização ao proprietário do poço. As análises físico-químicas e bacteriológicas testam a qualidade da água são realizadas por algumas universidades e laboratórios credenciados na Fepam. Na RB Poços, o serviço é desenvolvido pelo laboratório Quimioambiental, de Porto Alegre. “São levados em conta 31 parâmetros credenciados e exigidos pela Fepam”, afirma Oliveira, que trabalha há mais de 25 anos no ramo. O resultado da análise

BETO E LIARA COM MAPA QUE ORIENTA PROFISSIONAIS PARA A PERFURAÇÃO

é entregue em cerca de 10 dias, o que também dá agilidade nos processos.

TIPOS

A construção do poço pode ser feita de três formas no Rio Grande do Sul. Em Venâncio Aires e região do Vale do Rio Pardo, a mais comum é a forma sedimentar, que capta a água

em terrenos planos com utilização de revestimentos e filtros na estrutura. Já o poço na rocha é feito com tubo de aço na maioria da estrutura, sem necessidade de revestimento e filtro. O método misto capta tanto a água de formação sedimentar quanto rochosa. O projeto, neste caso, conta com tubo de aço, revestimento e filtros.

SAIBA MAIS • A profundidade média de perfuração para obtenção de água no perímetro urbano de Venâncio Aires é de 70 a 90 metros. Conforme a região - na Serra, por exemplo -, é necessário perfurar mais fundo em virtude da altura. • A RB Poços é uma das 40 empresas do Rio Grande do Sul regulamentadas para o serviço de perfuração de poços artesianos. • O diâmetro de perfuração é de 15 centímetros e, por isso, são diferentes das cacimbas feitas mais usualmente anos atrás. • A água coletada pelos poços não é do lençol freático. Para a obtenção da água limpa e de qualidade para ingestão, é necessário que se faça a perfuração com mais profundidade alcançando a água subterrânea. • Para a realização do serviço de perfuração de poços é necessário seguir as normas

12244 e 12212 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). • A água obtida pertence à União, que repassa ao Estado para gerenciamento, acompanhamento e fiscalização após a obtenção da outorga. Ao Município, cabe a orientação e solicitação de apresentação dos documentos exigidos pelo Estado. • Após a obtenção da outorga, a empresa deve realizar diariamente um acompanhamento dos níveis do poço e trimestralmente as análises exigidas no documento de outorga. Esse acompanhamento pode variar de acordo com cada cliente, anualmente ou semestralmente deve ser feito o encaminhamento de toda documentação em um relatório técnico de monitoramento feito pelo responsável técnico, que no caso da nosso empresa é o geólogo”, ressalta Oliveira. Folha do Mate


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